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Introdução à Virologia: Estrutura e Importância Médica dos Vírus

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VIROLOGIA 
 
1. Introdução aos Vírus 
 
Vírus são entidades acelulares compostas basicamente por um invólucro 
protéico denominado capsídio que confina o genoma viral, constituído 
exclusivamente de DNA ou RNA que podem ser de cadeia única ou dupla e 
estarem presentes como uma única molécula contendo todo o genoma ou 
em múltiplas moléculas nas quais se distribui o genoma. 
 
A partícula viral individual completa é denominada vírion. 
 
 
 
A complexidade estrutural tanto do capsídio quanto do genoma varia 
grandemente conforme a família viral, existindo vários tipos morfológicos 
que variam em tamanho e complexidade. 
 
 
 
 
 
Vírus Influenza H1N1 
 
Vírus da AIDS 
 
 
Vírus HPV 
 
 
Vírus da Hepatite b 
 
 
Vírus da Hepatite c 
 
As dimensões da maioria dos vírus conhecidos variam entre 10 a 250 nm e 
seus genomas variam de mil pares de base a 400 mil pares de base. 
 
Tais partículas virais só podem ser visualizadas através de microscopia 
eletrônica. 
 
Os vírus podem ser encontrados em todos os ambientes do planeta, com 
grande importância nos oceanos, onde compõem o reservatório da maior 
parte da diversidade genética. 
 
Os vírus ocorrem em todos os domínios da vida havendo vírus específicos 
para arqueas, bactérias, fungos, protozoários, algas, plantas, animais e 
humanos. 
 
Ainda não foram encontrados vírus de procariotos termófilos ou 
hipertermófilos, mas talvez seja apenas uma questão de tempo. 
 
Recentemente, foi descoberto um vírus que infecta a ameba Acanthamoeba 
polyphaga, cujo capsídio tem um diâmetro de 400 nm envolvido por longas 
fibrilas de 80 nm de comprimento. 
 
O seu genoma, composto de uma molécula de DNA de cadeia dupla 
circular de 1,2 milhões de pares de base, contendo pelo menos 911 genes é 
o maior de todos os vírus caracterizados até então e é mais extenso que o 
genoma de algumas bactérias. 
 
Esse vírus foi denominado Mimivirus e parece ser membro de uma nova 
família viral. 
 
 
Outros vírus de DNA de cadeia dupla com capsídios variando entre 200 nm 
e 600 nm com genomas variando de 300 mil pares de base a 1,2 milhões de 
pares de base estão sendo descobertos em números cada vez maiores em 
amostras de água do mar e água doce, associados a microrganismos 
planctônicos. 
 
Os maiores vírus conhecidos têm dimensões aproximadas às das menores 
bactérias e podem inclusive serem visualizados com microscopia óptica. 
 
O capsídio tem duas funções básicas: 
 
(1) proteger o ácido nucléico viral contra injúrias causadas por fatores 
ambientais e 
(2) permitir a adsorção do vírion à membrana da célula hospedeira, o 
primeiro passo para a infecção viral. 
 
A maioria dos genomas virais é muito pequena e geneticamente limitada. 
 
Os genomas dos menores vírus podem conter de 3 a 7 genes, enquanto que 
os genomas dos vírus maiores podem conter entre 150 e 911. 
 
Os genes virais contêm informação exclusiva para a síntese de vírions 
completos, incluindo algumas enzimas virais que possibilitam sua entrada e 
saída da célula hospedeira e, também, para programar a maquinaria 
sintética da célula hospedeira para a replicação de componentes do vírus. 
 
Por causa de sua limitação genética, os vírus não apresentam uma estrutura 
celular com sistema enzimático próprio para síntese de proteínas e 
obtenção de energia e, portanto, não realizam nenhuma das funções 
metabólicas usuais das células vivas, ou seja, são metabolicamente inertes e 
não se reproduzem. 
Os vírus são parasitas intracelulares obrigatórios e essencialmente 
infecciosos, pois sua multiplicação e continuidade dependem exclusiva e 
inteiramente da maquinaria enzimática de uma célula viva que lhes sirva de 
hospedeira. 
 
São, também, denominados "parasitas informacionais" por transportarem 
informação genética para sua replicação. 
 
Pelo fato dos vírus serem metabolicamente inertes e não se reproduzirem, 
as partes constituintes do capsídio e do genoma são sintetizados pela célula 
hospedeira e depois montados em vírions completos que são liberados da 
célula. 
 
Considerar os vírus como seres vivos representando os mais simples 
microrganismos ou matéria inanimada na forma das mais complexas 
entidades moleculares é objeto de controvérsia e depende do conceito de 
vida adotado. Alguns vírus podem ser cristalizados sem perder seu poder 
infeccioso. 
 
2 – Importância médica dos vírus 
 
Os vírus causam diversas doenças em humanos variando de infecções 
brandas e benignas como o resfriado comum, herpes simples e gripes até 
enfermidades graves e potencialmente fatais como hepatite, febre amarela, 
dengue, poliomielite e varíola. 
 
 
 
Pela vacinação em massa da população mundial, doenças virais tais como a 
poliomielite e a varíola foram erradicadas. 
 
 Vírus da varíola Vírus da Polimielite 
 
Alguns vírus causam quadros clínicos agudos facilmente reconhecidos 
como gripes e resfriados; outros causam doença e parecem desaparecer, 
permanecendo latentes por muitos anos, e então se manifestam causando 
formas mais severas da doença como acontece com o vírus varicela-zoster 
que, em um primeiro momento, na infância, causa a varicela (popularmente 
conhecida como catapora) e anos após a cura da doença pode reaparecer na 
forma de herpes zoster. 
 
Alguns vírus, denominados oncovírus, não matam suas células hospedeiras, 
mas induzem sua multiplicação descontrolada originando tumores 
cancerosos. 
Estudos epidemiológicos mostram que em países desenvolvidos as 
infecções virais são a causa mais comum de doenças agudas de evolução 
benigna e que normalmente não requerem hospitalização. 
 
Por outro lado, em países em desenvolvimento, as doenças virais são 
importantes causas de mortalidade e invalidez permanente, notadamente 
entre crianças. 
 
Enquanto que infecções por bactérias e por protozoários podem ser 
relativamente bem controladas, as infecções virais representam uma 
ameaça relativamente maior e menos controlável à saúde humana. 
 
Infecções virais emergentes e re-emergentes, tais como as causadas por 
linhagens altamente virulentas do vírus Influenza (vírus da gripe), ocorrem 
periodicamente e representam sério risco à saúde pública. 
 
Os vírus são altamente específicos quanto aos seus hospedeiros. Uma 
espécie ou grupo de vírus pode ser capaz de infectar e causar doença em 
uma única espécie de hospedeiro como o vírus da varíola, que só ataca 
humanos ou em um grupo de espécies relacionadas como o vírus da raiva 
que ataca mamíferos. 
 
Os vírus de eucariotos multicelulares infectam tecidos específicos de um 
determinado hospedeiro, fenômeno denominado de tropismo de tecido. 
 
Essa especificidade de hospedeiros advém do fato de os vírus terem que se 
aderir à superfície da célula hospedeira para poder infectá-la. 
 
Quadro 1: Algumas viroses humanas com agente causador, as formas de infecção e de 
prevenção. 
VIROSE VÍRUS CARACTERÍSTICAS INFECÇÃO PREVENÇÃO 
Catapora ou 
varicela 
Varicella zoster 
virus (VZV) 
Envelopado, DNA 
cadeia dupla 
Vias respiratórias 
DNA incubado 
gânglios nervosos 
espinhais 
Vacina e 
Evitar 
contato 
Herpes labial Herpes simplex 
tipo 1 (HSV-1) 
Envelopado, DNA 
cadeia dupla 
Por contato 
DNA viral incubado 
gânglios do nervo 
trigêmeo 
Evitar 
contato e 
Higiene 
Herpes 
genital 
Herpes simplex 
tipo 2 (HSV-2) 
Envelopado, DNA 
cadeia dupla 
Por contato 
DNA viral incubado 
gânglios do nervo 
sacral 
Evitar 
contato e 
Higiene 
Rubéola Rubella virus Envelopado, RNA 
cadeia simples(+) 
Vias respiratórias 
ou gotículas de saliva 
Vacina 
tríplice e 
Evitar 
contato 
Sarampo Morbillivírus Envelopado, RNA 
cadeia simples(-) 
Vias respiratórias ou 
gotículas de saliva 
Vacina 
tríplice e 
Evitar 
contato 
Varíola Orthopoxvirus 
viriolae 
Envelopado,DNA 
cadeia dupla 
Vias respiratórias ou 
gotículas de saliva 
Vacina e 
Evitar 
contato 
Poliomielite Enterovirus 
Grupo 
Poliovírus (3 
sorotipos). 
Não-envelopado, 
RNA cadeia 
simples(+) 
Ingestão de 
alimentos, água 
contaminados com 
fezes e pela saliva de 
portadores 
Vacina e 
Evitar 
contato 
Raiva Lyssavirus Envelopado, RNA 
cadeia simples(-) 
Pelo contato com 
saliva de animal 
infectado na mordida 
ou em ferimentos 
Vacina de 
animais 
domésticos 
e Evitar 
contato 
Dengue Flavivirus 
(arbovírus) 
Envelopado, RNA 
cadeia simples(-) 
Picada de mosquito 
Aedes aegyoti 
Eliminar 
criadouros 
do mosquito 
Febre 
amarela 
Flavivirus 
(arbovírus) 
Envelopado, RNA 
cadeia simples(+) 
Picada de mosquito 
Aedes aegyoti 
Eliminar 
criadouros 
do mosquito 
Gripe Influenza A 
virus (H1N1) 
Envelopado, com 8 
moléculas de RNA 
cadeia simples(-) 
Vias respiratórias ou 
gotículas de saliva 
Vacina e 
Evitar 
contato 
Resfriado 
comum 
Rhinivirus e 
Coronavirus 
Não-envelopado, 
RNA cadeia 
simples(+) e 
Envelopado, RNA 
cadeia simples(+) 
Contato com 
secreção nasal ou em 
ambientes 
contaminados 
Evitar 
contato 
Caxumba Paramyxovirus Envelopado, RNA 
cadeia simples(-) 
Vias respiratórias ou 
gotículas de saliva 
Vacina 
tríplice e 
Evitar 
contato 
Gastrenterite 
rotaviral 
Rotavirus Não-envelopado, 
com 11 moléculas 
RNA cadeia dupla 
Ingestão de 
alimentos, água 
contaminados com 
fezes 
Higiene 
Saneamento 
básico 
Hepatite A e 
E 
Hepatitis A 
(HAV) e 
Hepatitis E 
(HEV) 
Não-envelopado, 
RNA cadeia 
simples(+) 
Ingestão de 
alimentos, água 
contaminados com 
fezes 
Vacina 
hepatite A e 
Evitar 
contato 
Higiene 
Saneamento 
básico 
Hepatite B Hepadnavirus Envelopado, DNA 
cadeia dupla 
Transfusão de sangue 
. gestação, parto, 
amamentação e 
relações sexuais. 
Contato com fluidos 
corporais (saliva, 
Vacina 
hepatite B e 
Evitar 
contato 
leite, sêmen) 
contaminados 
Hepatite C Hepatitis C 
(HCV) 
Envelopado, RNA 
cadeia simples(+) 
Transfusão de sangue 
. gestação, parto, 
amamentação e 
relações sexuais. 
Contato com fluidos 
corporais (saliva, 
leite, sêmen) 
contaminados 
Evitar 
contato 
Hepatite D Hepatitis D 
(HDV) ou vírus 
delta 
Sem envoltório 
protéico associado 
ao HBV 
Transfusão de sangue 
. gestação, parto, 
amamentação e 
relações sexuais. 
Contato com fluidos 
corporais (saliva, 
leite, sêmen) 
contaminados 
Vacina 
hepatite B e 
Evitar 
contato 
Condiloma Papillomavirus 
(HPV) 
Não-Envelopado, 
DNA cadeia dupla 
Relações sexuais, 
parto e objetos 
contaminados 
Vacina e 
evitar 
contato 
Hantavirose Hantavitus Envelopado, RNA 
cadeia simples(-) 
inalação de 
aerossóis da urina, 
da saliva e das 
fezes de ratos 
silvestres 
Evitar 
contato 
Higiene 
Saneamento 
e higiene 
Ebola Ebolavirus Envelopado, RNA 
cadeia simples (-) 
Contato com 
pessoa infectada 
 
AIDS Lentivirus (HIV-1 
e HIV-2) 
Envelopado, RNA 
cadeia simples (-) 
Contaminação por 
relações sexuais e 
pelo sangue. 
HIV ataca 
Linfócito T CD4+ 
(T4) 
Sexo seguro 
Evitar 
contato 
com sangue 
 
 
3 – Importância ambiental dos vírus 
 
Os vírus podem ter representado – e ainda representar – um importante 
fator de seleção natural de espécies animais. 
 
Um exemplo clássico é a seleção natural de coelhos resistentes ao vírus do 
Mixoma durante epidemias induzidas como forma de controle biológico 
das populações de coelhos da Austrália. 
 
Evidências indiretas sugerem que a mesma ação seletiva foi desempenhada 
pelo vírus da varíola em populações humanas. 
 
Nos oceanos, os vírus – de DNA e de RNA – constituem parte significativa 
da biomassa das águas costeiras em números de até 50 milhões de 
partículas por mililitro, atingindo um total estimado de 25 a 270 
megatoneladas. A maioria dos vírus oceânicos não foi caracterizada. 
 
As infecções por vírus oceânicos são principal causa de mortalidade desde 
microrganismos a grandes mamíferos. 
 
Como resultado, influencia as composições das comunidades marinhas e os 
ciclos biogeoquímicos. 
 
Os microrganismos compõem mais de 90% da biomassa viva dos mares, 
sendo importantes componentes do fitoplanctôn e do bacterioplâncton. 
 
Estima-se que os vírus matem cerca de 20% dessa biomassa por dia. 
 
Portanto, os vírus desempenham a principal forma de controle das 
populações de microplâncton e, conseqüentemente, sobre a produção de 
oxigênio e de dimetilssulfeto atmosférico, um fator importante na 
regulação climática. 
 
 
4- Importância Científica 
 
Os vírus representaram e ainda representam instrumentos importantes para 
o desenvolvimento da pesquisa científica, tanto acadêmica quanto aplicada. 
 
Os bacteriófagos, podem, ao serem liberados de uma célula bacteriana 
infectada, transportar fragmentos do cromossomo dessa bactéria para outra, 
a qual, se sobreviver à infecção viral (fase lisogênica) poderá recombinar 
seu material genético com o fragmento de DNA trazido pelo vírus. 
 
Este fenômeno, conhecido como transdução, foi amplamente utilizado 
experimentalmente nos primeiros estudos de genética de bactérias. 
 
Anteriormente à descoberta e o amplo uso dos antibióticos na terapia das 
doenças causadas por bactérias cogitou-se na administração de 
bacteriófagos na prevenção e tratamento das infecções bacterianas. 
 
Com a descoberta dos antibióticos e de sua eficácia no tratamento dessas 
infecções, os estudos clínicos utilizando bacteriófagos como agentes 
antibacterianos não tiveram continuidade no Ocidente, mas esses vírus 
continuaram sendo utilizados na ex-União Soviética e na Europa Oriental. 
 
A emergência de bactérias patogênicas resistentes a múltiplos antibióticos é 
um dos mais críticos problemas da prática médica moderna, 
particularmente por causa do concomitante aumento de indivíduos 
imunossuprimidos. 
 
O risco de a humanidade voltar à era pré-antibióticos é real e o 
desenvolvimento de formas alternativas de tratamento de infecções 
bacterianas tornou-se uma das maiores prioridades da medicina moderna e 
da biotecnologia. 
 
A “bacteriofagoterapia” ressurge no campo da saúde pública como uma 
dessas alternativas. 
 
Outros vírus são extensivamente utilizados na engenharia genética para 
transferir material genético entre diferentes espécies de hospedeiros. Por 
exemplo, genes virais têm sido utilizados na obtenção de alimentos 
transgênicos. 
 
Vírus que parasitam insetos têm grande potencial para o controle biológico 
de pragas agrícolas, atuando como inseticidas biológicos. 
 
Uma vez que os vírus são específicos para seus hospedeiros, o uso de vírus 
como controladores biológicos é considerado seguro para o ecossistema e 
para o homem. 
 
Por exemplo, os vírus do gênero Nucleopolyhedrovirus (família 
Baculoviridae) são utilizados no controle biológico da lagarta da soja 
(Anticarsia gemmatalis). 
 
A origem dos vírus é uma incógnita. Os vírus não representam a forma de 
vida mais primitiva por dependerem de células vivas para sua replicação. 
Não há registro fóssil de vírus. 
 
2. Estrutura viral 
 
 
Um vírus, durante seu ciclo infeccioso, assume várias formas e 
manifestações tais como uma partícula viral completa ou um ácido nucléico 
em replicação no hospedeiro. 
 
A partícula viral individual ou vírion é caracterizada por propriedades 
intrínsecas tais como forma, massa, composição química, tipo de 
genoma e subunidades protéicas, entre outras. 
 
A complexidade estrutural de um vírion varia conforme a família viral. 
 
Existem famílias cujas partículas virais apresentam estruturas simples 
como o vírus da poliomielite e há aquelas com vírions exibindo uma ultra-
estrutura complexa como acontece com o vírus da imunodeficiência 
humana (HIV). 
 
O tamanho e a forma de um vírion, o tipo de ácido nucléico que transporta 
e a presençaou não de envelope, são características constantes e utilizadas 
na classificação dos vírus. 
 
 
 
 
2.1 Capsídio 
 
2.1.1 Organização do capsídio 
 
O invólucro protéico, denominado “capsídio”, pode ser simples ou 
complexo, envolvido ou não por um envelope lipídico. 
 
O capsídio determina a forma do vírion e é formado pela agregação 
espontânea e organizada de múltiplas subunidades protéicas denominadas 
“capsômeros”. 
 
O capsídio pode ser constituído por um único tipo de proteína ou por várias 
proteínas diferentes. 
 
O número de proteínas e o arranjo espacial dos capsômeros são 
características específicas de cada família viral e são utilizadas na 
identificação e classificação dos vírus. 
 
O capsídio tem duas funções principais: 
 
(1) proteger o ácido nucléico viral contra injúrias causadas por fatores 
ambientais e 
 
(2) permitir a ligação do vírion a receptores específicos presentes na 
superfície da célula hospedeira, no processo da infecção viral. 
 
Sem a proteção do capsídio, a carga negativa da superfície da membrana 
plasmática repeliria o ácido nucléico que também possui carga negativa. 
 
A organização do capsídio em subunidades protéicas repetitivas (estrutura 
polimérica) decorre da quantidade exígua de material genético disponível 
nos vírus e é um meio de resistência a mutações, pois algumas subunidades 
sintetizadas erroneamente não são incorporadas ao vírion evitando a 
montagem de partículas defeituosas. 
 
A natureza particulada dos vírus reflete duas grandes propriedades: 
 
(1) Especificidade: composição química bem definida capaz de determinar 
respostas imunológicas identificáveis; 
 
(2) Plasticidade: capacidade de sofrer alterações antigênicas durante sua 
passagem de um hospedeiro para outro. 
 
2.2 Envelope viral 
 
Dependendo da família viral, os vírions podem possuir um envoltório 
membranoso, denominado “envelope”, constituído por uma porção de 
membrana plasmática que o envolve ao emergir da célula hospedeira em 
um processo denominado “exocitose” ou “brotamento”. 
 
Na estrutura do envelope encontram-se tanto proteínas codificadas pelo 
genoma da célula hospedeira quanto proteínas codificadas pelo genoma 
viral. 
 
O envelope protege o vírion da ação do sistema imunitário por ter 
composição semelhante às membranas celulares do hospedeiro e auxilia na 
infecção por conter as proteínas de ligação virais que reconhecem 
receptores específicos na superfície celular. 
 
Em alguns vírus, como o HIV, por exemplo, além de o envelope conter 
proteínas de ligação, este se funde à membrana plasmática da célula 
hospedeira introduzindo o capsídio em seu interior. 
 
A presença ou ausência de envelope classifica os vírions em “envelopados” 
e “não-envelopados”, respectivamente, e está associada a aspectos 
epidemiológicos relacionados com a transmissão dos vírus (uma de suas 
propriedades relacionais) e, neste contexto, o termo vírus pode ser 
empregado, como nos exemplos: os vírus envelopados são transmitidos por 
via respiratória ou contato direto e os não-envelopados são transmitidos por 
via oral. 
 
Estas características estão relacionadas com a termolabilidade e fraca 
resistência do envelope às enzimas do trato digestivo. 
 
Os vírions envelopados podem ser inativados por quaisquer agentes 
químicos e físicos que danifiquem membranas celulares como cloro, 
peróxido de hidrogênio, fenol, solventes lipídicos (detergentes e álcool), 
luz ultravioleta, temperatura (calor, congelamento e descongelamento) e 
pH (menor que 6 e maior que 8). 
 
Por outro lado, os não-envelopados são mais resistentes às condições 
ambientais, detergentes e desinfetantes. 
 
A presença de um envelope é uma característica comum nos vírus de 
animais, mas incomum em vírus de plantas. 
 
2.3 Proteínas de ligação 
 
Todos os vírions contêm em sua superfície externa, um ou mais tipos de 
proteínas ou glicoproteínas, denominadas proteínas de ligação ou ligantes 
que interagem com receptores específicos presentes na superfície da célula 
hospedeira e que propiciam sua anexação à mesma. 
 
A aderência de um vírion à superfície da célula hospedeira é denominada 
“adsorção” e é o primeiro passo tanto para a sua penetração na célula 
hospedeira quanto para o estabelecimento de uma infecção viral. 
 
Algumas proteínas de aderência são denominadas “espículas” por se 
projetarem diretamente da superfície do capsídio ou do envelope, 
facilitando o contato com os receptores celulares. 
 
Nos vírions envelopados, as espículas são chamadas de “peplômeros”. 
 
Pelo fato de serem específicos para seus receptores celulares, todos os vírus 
têm um espectro limitado de hospedeiros. 
 
Mesmo dentro de um hospedeiro particular, os vírions se adsorvem e 
invadem apenas os tipos celulares que possuam receptores específicos para 
as suas proteínas de aderência. 
 
Por exemplo, o vírus da varíola e o HIV atacam apenas humanos, o vírus 
da gripe aviária infecta aves em geral, mas potencialmente humanos, os 
vírus da raiva ataca mamíferos, enquanto que os bacteriófagos atacam 
unicamente procariotos. 
 
2.4 Morfologia 
 
 
A estrutura da maioria das partículas virais reflete duas propriedades 
fundamentais do processo de organização morfológica: 
(1) as subunidades protéicas do capsídio, codificadas pelo genoma viral, 
correspondem a cópias idênticas de um número reduzido de proteínas e 
 
(2) a organização morfológica final dos vírus mais complexos resulta da 
organização de cada um dos componentes do vírion. 
 
Os vírus apresentam uma ampla gama de tipos morfológicos sendo a 
grande maioria de morfologia regular com seus elementos organizados 
segundo estruturas helicoidais ou icosaédricas. 
 
Nos helicoidais, os capsômeros organizam-se segundo simetria helicoidal e 
o ácido nucléico viral associa-se à parte interna das subunidades protéicas 
como acontece, por exemplo, no vírus do mosaico do tabaco (TMV). 
 
Nos icosaédricos, os capsômeros organizam-se formando um corpo 
simétrico de vinte faces triangulares eqüiláteras, 12 vértices e 30 arestas, 
como ocorre, por exemplo, nos vírus da Família Adenoviridae. 
 
A organização icosaédrica é possível pela existência de hexâmeros (grupos 
de seis capsômeros) que ocupam as faces triangulares ou arestas e de 
pentâmeros (grupos de cinco capsômeros) que ocupam os vértices. 
 
Dentre os menores vírus icosaédricos conhecidos estão os da Família 
Picornaviridae cujos capsídios são constituídos por doze capsômeros e 
dentre os maiores encontra-se o vírus do díptero Tipula iridescent, cujos 
capsídios são formados por 1500 capsômeros. 
 
As vantagens das estruturas helicoidais e icosaédricas residem no fato de as 
subunidades se auto-agruparem sem a participação de enzimas ou outros 
agentes. 
 
Nos vírus de estrutura mais complexa (por exemplo, os bacteriófagos) há 
síntese prévia de enzimas que participam do reagrupamento das 
subunidades, mas o processo de automontagem é condição básica para o 
reagrupamento enzimático. 
 
A grande maioria dos vírions conhecidos tem dimensões entre 10 e 250 nm 
podendo ser visualizados somente pela microscopia eletrônica. 
 
Dentre os vírus humanos, os da família Picornaviridae (por exemplo, o 
vírus da poliomielite e o rinovírus) estão entre o menores vírions 
conhecidos com capsídios icosaédricos de 27 a 30 nm de diâmetro. 
Até recentemente, os maiores vírions conhecidos eram os pertencentes à 
família Poxviridae (por exemplo, o vírus da varíola humana) com 
morfologia complexa, ovalada ou assemelhando-se a um paralelepípedo de 
140 a 260 nm de diâmetro e de 220 a 450 nm de comprimento. 
 
Mas, em 2003, um grupo de pesquisadores franceses isolou e caracterizou 
vírions encontrados na ameba de vida livre Acanthamoeba polyphaga, cujo 
capsídio – aparentemente icosaédrico – tem um diâmetro de cerca de 400 
nm envolvido por longas fibrilas de 80nm de comprimento. 
 
Esse novo vírus foi denominado Mimivirus e parece ser membro de uma 
nova família viral. 
 
Outros vírus com capsídios variando entre 200 nm e 600 nm estão sendo 
descobertos em números cada vez maiores em amostras de água do mar e 
água doce, associados a microrganismos planctônicos. 
 
Os maiores vírus conhecidos têm dimensões aproximadas às das menores 
bactérias e podem inclusive serem visualizados com microscopia óptica. 
 
2.5 Genomas virais 
 
Os genomas virais são extremamente diversos. Os vários grupos de vírus 
possuem tipos característicos e específicos de ácidos nucléicos: 
A) DNA de cadeia dupla, 
B) DNA de cadeia única, 
C) RNA de cadeia dupla ou 
D) RNA de cadeia única. 
 
Quando o genoma é de RNA de cadeia simples, este pode ser “positivo” ou 
“negativo”. 
 
Um RNA genômico de cadeia simples positiva tem uma seqüência de 
nucleotídios idêntica àquela do RNA mensageiro viral e um RNA 
genômico de cadeia simples negativa tem uma seqüência de nucleotídios 
complementar à do RNA mensageiro viral. 
 
O genoma viral pode ser composto por uma única molécula do respectivo 
ácido nucléico (genoma não-segmentado) ou por mais de uma molécula 
(genoma segmentado). 
 
Quando o genoma é segmentado, cada molécula de ácido nucléico contém 
apenas uma parte dos genes virais e o genoma se distribui nas múltiplas 
moléculas. 
 
A maioria dos vírus conhecidos contém genomas compostos por moléculas 
lineares, mas alguns vírus possuem genomas compostos por moléculas 
circulares. 
 
O tipo de genoma transportado por um vírion reflete o modo de o vírus 
transmitir sua informação genética de uma geração para outra e seu modo 
de expressar essa informação na célula hospedeira. 
 
A diversidade observada nos genomas virais e nas suas formas de 
replicação pode refletir as possíveis múltiplas origens dos vírus durante a 
evolução. 
 
A estratégia de replicação de um vírus depende da natureza de seu genoma. 
 
Os genomas dos menores vírus são constituído por cerca de mil bases 
podendo conter de três a sete genes, enquanto que os genomas dos vírus 
maiores podem conter entre 400 mil e 1,2 milhões de bases contendo de 
150 a mais de 900 genes. 
 
Por exemplo, o genoma do Mimivirus, composto por 911 genes é o maior 
de todos os genomas virais caracterizados até então e é mais extenso que o 
genoma de algumas bactérias. 
 
Os genes virais contêm informação exclusiva para a síntese de vírions 
completos, incluindo algumas enzimas virais que possibilitam sua entrada e 
saída da célula hospedeira e, também, para programar a maquinaria 
sintética da célula hospedeira para a replicação de componentes do vírus. 
 
Por causa de sua limitação genética, os vírus não apresentam uma estrutura 
celular com sistema enzimático próprio para síntese de proteínas e 
obtenção de energia e, portanto, não realizam nenhuma das funções 
metabólicas usuais das células vivas, ou seja, são metabolicamente inertes e 
não se reproduzem. Isto lhes condiciona o parasitismo intracelular 
obrigatório. 
 
 
Multiplicação Viral 
 
a) Adsorção 
 
A infecção de uma célula viva por um vírus ocorre após a interação de 
proteínas do capsídio viral com receptores específicos presentes na 
superfície celular, fenômeno denominado "adsorção" e que constitui o 
primeiro e crucial evento da infecção viral. 
 
A interação do capsídio viral com receptores celulares é altamente 
específica e por isso todos os vírus têm um espectro limitado de 
hospedeiros. 
 
Mesmo dentro de um hospedeiro particular, os vírus só reconhecem e 
invadem tipos celulares nos quais encontrem receptores específicos. 
 
b) Penetração 
 
Após a adsorção, ou o vírion insere seu genoma através da membrana 
plasmática, permanecendo o capsídio vazio e sem função sobre a superfície 
celular ou o vírion penetra inteiro na célula. 
 
c) Desnudação 
 
No último caso, em seguida à penetração do vírion, dá-se a exposição do 
genoma viral pela remoção do capsídio. 
 
d) Transcrição 
 
Em ambos os casos, o genoma viral passa a dominar as funções normais da 
célula. 
Ocorre a síntese de m-RNA, os mecanismos de biossíntese da célula 
hospedeira (energia, moléculas precursoras e enzimas) são utilizados pelos 
vírus, iniciando a síntese viral. Uma célula infectada produz mais proteínas 
e ácidos nucléicos virais que seus próprios produtos. 
 
 
e) Tradução 
 
O m-RNA viral liga-se aos ribossomos da célula, codificando a síntese das 
proteínas virais. 
 
f) Replicação 
 
Os vários componentes do vírion são sintetizados separadamente pela 
célula hospedeira e então montados para formar novas partículas que são 
liberados por lise da célula ou por brotamento de vírions completos através 
da membrana plasmática. 
 
Os novos vírions estão prontos para infectar novas células. 
 
A replicação por montagem de componentes pré-formados é exclusiva dos 
vírus e os distingue de todas as outras formas de parasitas intracelulares. 
 
Alguns vírus podem permanecer latentes em suas células hospedeiras por 
longos períodos de tempo sem causar nenhuma alteração óbvia nas funções 
celulares. Este estado é conhecido como "fase lisogênica". 
 
Quando um vírus latente é ativado, este inicia a "fase lítica", com a 
formação e liberação de novos vírions como acontece com os 
bacteriófagos, o vírus da herpes e o vírus da imunodeficiência humana 
(HIV). 
 
 
 
 
A replicação viral no interior de células hospedeiras depende, também de 
outros fatores, tais como a temperatura. 
 
Por exemplo, os rinovírus, causadores do resfriado comum, requerem uma 
temperatura que não exceda a 34ºC, o que restringe seu crescimento apenas 
em células da camada mais fria da mucosa nasal evitando sua disseminação 
para tecidos mais profundos onde as temperaturas são maiores. 
 
O conhecimento das propriedades dos vírus e das relações que estabelecem 
com seus hospedeiros é crucial para uma investigação bem sucedida e para 
uma administração clínica dos processos patológicos. 
 
Do ponto de vista evolutivo, os vírus representam uma modo de uma 
determinada quantidade de informação genética, na forma de moléculas de 
DNA ou RNA, garantir sua perpetuação. 
 
Por isso a maioria dos vírus não matam seus hospedeiros. 
 
O fato de sua manutenção ser absolutamente dependente da sobrevivência 
de seu hospedeiro cria um dilema evolucionário para os vírus que matam 
seus hospedeiros, tais como o HIV, o Ebola, o Hantavirus, o vírus rábico e 
o vírus da varíola. 
 
A multiplicação viral causa injúria e destruição das célula hospedeiras e 
como os vírus delas dependem inteiramente, estes tendem a estabelecer 
infecções brandas nas quais a morte do hospedeiro é mais uma exceção que 
uma regra.

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