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As Ferramentas Perdidas da Aprendizagem

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Título original: The Lost Tools of Learning 
Por Dorothy Sayers.
Traduzido por Cipriana Leme com permissão da gbt@gbt.org 
Revisado por Marili Gomes
©Old School Editora | Todos os direitos reservados
www.oldschooleditora.lemeinc.com
mailto:gbt@gbt.org
http://www.oldschooleditora.lemeinc.com/
 
 
 
Título original: The Lost Tools of Learning
Por Dorothy Sayers.
Traduzido por Cipriana Leme com permissão da gbt@gbt.org
Revisado por Marili Gomes
Old School Editora
www.oldschooleditora.lemeinc.com
Todos os direitos reservados.
 
Conteúdo
 
Nota da Tradutora
Introdução
Por que a educação clássica?
Sobre a educação clássica
Como aplicar a educação clássica
Estados de desenvolvimento e o Trivium
Palavras Finais
Sobre a autora
 
Nota da Tradutora
 
Esta é uma tradução livre do discurso da Dorothy Sayers na
Universidade de Oxford, em 1947, sobre os benefícios da educação
clássica. A primeira vez que li este discurso, senti que todas as dúvidas que
tinha sobre a educação clássica e seus benefícios haviam sido respondidas e
que não poderia seguir outro caminho dali em diante.
Como mãe educadora naturalizada brasileira e tradutora há mais de
25 anos, confesso que este foi um dos textos mais difíceis de traduzir,
considerando que meu idioma nativo não é o português. Mesmo assim,
estou convencida de que muitos pais poderão se beneficiar desta
maravilhosa introdução à educação clássica e como este método pode ser
aplicado nos dias de hoje.
Espero que sirva de inspiração para todos os educadores e, para que,
finalmente, possamos melhorar a educação de todas as crianças e resgatar
as ferramentas tão valiosas e elementares que se perderam ao longo do
caminho.
Cipriana Leme
Introdução 
 
Para que alguém como eu, cuja experiência em lecionar é
extremamente limitada, possa discutir a educação é algo que certamente
merece uma apologia. É uma conduta para a qual, o atual clima de opinião é
inteiramente favorável. Os bispos dão as suas opiniões sobre a economia; os
biólogos sobre metafísica; químicos inorgânicos sobre teologia; as pessoas
mais irrelevantes são designadas para ministérios altamente técnicos; e
homens toscos e comuns escrevem para os jornais para dizer que Epstein e
Picasso não sabem desenhar. Até certo ponto, e, contanto que as críticas
sejam feitas com modéstia razoável, estas atividades são louváveis.
Especialização demais não é uma coisa boa. Também existe um motivo
excelente para o qual um total amador possa sentir que tem o direito de
opinar sobre a educação. Pois se não somos todos professores profissionais,
todos fomos, em algum momento ou outro, educados. Mesmo que não
tenhamos aprendido nada—talvez em especial se não tivermos aprendido
nada—nossa contribuição à discussão ainda pode ter um valor potencial.
Não obstante, é altamente improvável que as reformas que proponho
sejam de fato postas em prática. Nem os pais, nem as faculdades
qualificadoras, nem as bancas examinadoras, nem os conselhos de
governantes, nem os ministérios de educação as tolerariam por um segundo
sequer. Pois elas se resumem assim: se formos produzir uma sociedade de
pessoas educadas, aptas a preservar sua liberdade intelectual em meio às
complexas pressões da sociedade moderna, devemos retroceder no ciclo do
progresso uns quatrocentos ou quinhentos anos, até o ponto onde a
educação começa a perder de vista seu verdadeiro objetivo, perto do final
da Idade Média.
Antes de rejeitar-me com a frase apropriada—reacionária, romântica,
medievalista, laudator temporis acti (aclamadora de tempos passados), ou
qualquer rótulo que vier à cabeça—eu peço que considere uma ou duas
perguntas miscelâneas que perduram nas mentes, talvez de todos nós, e que
ocasionalmente surgem para nos preocupar.
Por que a educação clássica?
 
Quando pensamos na idade incrivelmente precoce na qual os jovens
ingressavam na universidade, vamos dizer, nos tempos dos Tudor, e logo
após considerados aptos para assumir a responsabilidade por seus próprios
atos e negócios, estamos inteiramente confortáveis com aquela prolongação
artificial da infância e adolescência intelectual para os anos de maturidade
física que é tão marcada em nosso tempo? Adiar a aceitação da
responsabilidade para uma idade mais avançada traz uma série de
complicações psicológicas que, embora possam interessar aos psiquiatras,
são pouco benéficas para o indivíduo ou para a sociedade. Um robusto
argumento a favor do adiamento da idade de deixar a escola e a
prolongação do período de educação, costume ser que, agora temos muito
mais a aprender do que na Idade Média. Isto é verdadeiro em parte, mas não
inteiramente. O menino ou a menina moderna certamente devem estudar
mais matérias—mas isso sempre significa que eles realmente aprendem
mais?
Nunca achou estranho ou desafortunado que hoje, quando a
proporção de alfabetização na Europa Ocidental é maior do que jamais foi,
as pessoas tenham se tornado tão susceptíveis à influência da propaganda e
publicidade em massa do que jamais imaginamos ou pensamos? Você
atribui este fenômeno ao fato meramente mecânico de que a imprensa e a
rádio e outros meios tenham facilitado a divulgação da publicidade por uma
área tão extensa? Ou as vezes tem a desconfortável suspeita de que o
produto dos métodos modernos de educação é pior do que ela ou, ele possa
ser em desembaraçar os fatos das opiniões ou o comprovado do plausível?
Alguma vez, ao ouvir um debate entre pessoas presumidamente
adultas e responsáveis, se incomodou com a extraordinária incapacidade de
um argumentador comum em falar sobre o assunto ou ir ao encontro ou,
refutar os argumentos dos oradores contrários? Ou alguma vez pensou sobre
a extrema alta incidência de matérias irrelevantes que surgem em reuniões
de comitê, ou sobre a assombrosa raridade de pessoas capazes de atuar
como presidentes dos comitês? E ao pensar sobre isto e sobre o fato de que
muitos dos nossos assuntos públicos são resolvidos em debates e comitês, já
sentiu um certo desapontamento?
Você alguma vez seguiu uma discussão no jornal ou em outro meio e
percebeu a frequência com que o autor falha em definir os termos
utilizados? Ou a frequência, quando um escritor consegue definir os termos,
em que outro possa assumir em sua resposta que estava usando os termos
no sentido oposto ao sentido em que já foram definidos? Já se sentiu
levemente incomodado com a quantidade de sintaxe descuidada que tem
por aí? E se esse for o caso, sente-se incomodado porque é deselegante ou
porque possa levar a mal-entendidos perigosos?
Já sentiu que os jovens, após terem deixado a escola, não somente
esquecem quase tudo que aprenderam (o que é esperado), mas também
esquecem ou evidenciam que nunca realmente souberam como aprender um
assunto novo por conta própria? Se incomoda ao conhecer homens e
mulheres adultas que parecem incapazes de distinguir entre um livro que é
extensamente, academicamente e corretamente documentado e, um outro
que não é, para qualquer olho treinado, visivelmente qualquer uma destas
coisas? Ou que possa lidar com um catálogo de biblioteca? Ou que, quando
confrontados com um livro de referência, demonstram a curiosa
incapacidade de extrair dele as passagens relevantes a uma determinada
questão que interessa a eles?
Já se deparou com pessoas para as quais, durante todas as suas vidas,
o “sujeito” permanece como “sujeito”, dividido por anteparos impenetráveis
de todos os outros “sujeitos”, fazendo com que tenham grande dificuldade
em fazer qualquer conexão mental imediata entre, vamos dizer, álgebra e
ficção policial, eliminação de esgoto, e o preço do salmão—ou, de forma
mais geral, entre as esferas de conhecimento como filosofia e economia ou
química e arte?
Sente-se ocasionalmente perturbado pelas coisas escritas por homens
e mulheres adultas para a leitura? Nos deparamos com um biólogo
renomado escrevendo um artigo semanal no sentido de que: "É um
argumento contra a existência deum Criador (acredito que tenha sido mais
enfático; mas já que, desafortunadamente, perdi a referência, colocará sua
afirmação no nível mínimo) “um argumento contra a existência de um
Criador de que o mesmo tipo de variação produzida por seleção natural
pode ser produzida sem restrições por criadores de gado”. Podemos ser
tentados a dizer que é, de fato, um argumento a favor da existência de um
Criador. Evidentemente, não é nem uma coisa nem outra; simplesmente
prova que as mesmas causas materiais (recombinação de cromossomos, por
meio do cruzamento de raças, e assim por diante) são suficientes para
justificar todas as variações observadas – assim como a variação de
combinações da mesma dezena de tons é materialmente suficiente para
justificar a sonata do luar de Beethoven e o ruído que o gato faz ao andar
sobre as teclas do piano. Mas o desempenho do gato não prova nem
desaprova a existência de Beethoven; e a única coisa que o argumento do
biólogo consegue provar é que ele é incapaz de distinguir entre uma causa
material e uma causa final.
Vemos aqui uma frase de uma fonte não menos acadêmica do que
um artigo de primeira página do suplemento literário do Times: “O Francês,
Alfred Epinas, apontou que uma certa espécie (por ex. formigas ou vespas)
só pode enfrentar os horrores da vida e da morte por meio da associação. ”
Eu não sei o que o Francês realmente disse; o que o Inglês disse que ele
disse é evidentemente sem sentido. Nunca saberemos se a vida é
considerada um horror pela formiga ou, de qual forma a vespa isolada que
você esmaga na janela, pode “enfrentar” ou não, os horrores da morte. O
tema do artigo é o comportamento em massa dos homens; e as motivações
humanas têm sido inoportunamente transferidas da proposição principal
para a instância de suporte. Assim, o argumento, de fato, assume o que
procura provar – um fato que seria imediatamente aparente se fosse
apresentado em um silogismo formal. Isto é só um exemplo pequeno e
aleatório de um vício que permeia livros inteiros – principalmente livros
escritos por homens da ciência sobre assuntos metafísicos.
Outra citação da mesma questão do TLS se encaixa perfeitamente
aqui para resumir esta coleção aleatória de pensamentos inquietantes—
desta vez da avaliação do Sir Richard Livingstone “Some Tasks for
Education”: “Mais que uma vez o leitor é relembrado do valor de um estudo
intensivo de, pelo menos, uma matéria para aprender o significado do
conhecimento e quanta precisão e persistência são necessárias para alcançá-
lo. Porém, há o reconhecimento pleno do fato desesperador de que o
homem pode ter o domínio de um campo e não mostrar melhor juízo do que
seu vizinho em qualquer outro lugar; ele lembra o que aprendeu, mas
esquece completamente como o aprendeu”.
Eu gostaria de chamar a atenção particularmente para a última frase,
a qual oferece uma explicação daquilo que o escritor corretamente chama
de “fato desesperador” que as habilidades intelectuais concedidas a nós
através da educação não são prontamente transferíveis para outras matérias
além daquelas para as quais adquirimos estas habilidades: "...ele lembra o
que aprendeu, mas esquece completamente como o aprendeu".
Não seria o grande defeito da nossa educação hoje—um defeito
passível de rastreamento todos os sintomas inquietantes de perigo que tenho
mencionado—que, embora consigamos ensinar aos alunos “matérias”,
falhamos lamentavelmente no todo ao ensinar a eles como pensar: eles
aprendem tudo menos a arte de aprender. É como se ensinássemos uma
criança mecanicamente e por princípio básico, a tocar “The Harmonious
Blacksmith” no piano, mas nunca tivéssemos ensinado a escala ou como ler
música; para que, após ter memorizado "The Harmonious Blacksmith," ele
ainda não tivesse a menor noção de como proceder para aprender “The Last
Rose of Summer”. Por que digo, "como se"? Em algumas artes, às vezes
fazemos exatamente isto—pedimos à criança que “se expresse” na pintura
antes de ensiná-la a lidar com as cores e o pincel. Há uma escola de
pensamento que acredita que esta é a forma correta de iniciar o trabalho.
Mas observe: não é a forma que um artesão treinado aprenderá sobre um
novo meio. Ele, tendo aprendido por experiência a melhor forma de
economizar mão de obra e assumir o assunto da forma correta, começará
por rabiscar e brincar com uma peça velha de material para “aprender a
manusear a ferramenta”.
Sobre a educação clássica
 
Vamos olhar agora para o esquema medieval de educação—a grade
curricular das Escolas. Não importa, por enquanto, se foi criado para
crianças pequenas ou alunos mais velhos ou por quanto tempo as pessoas
deveriam concluí-la. O que importa é o entendimento sobre as coisas que os
homens da Idade Média acreditavam ser o objeto e a ordem correta do
processo de aprendizagem.
A grade era dividida em duas partes: o Trivium e o Quadrivium. A
segunda parte—o Quadrivium--consistia em “matérias” e, não precisa ser
discutido por enquanto. O mais interessante para nós é a composição do
Trivium, que precede o Quadrivium e era a preliminar disciplina para ele.
Consistia em três partes: Gramática, Dialética e Retórica, nesta ordem.
Agora, a primeira coisa que notamos é que duas destas “matérias”
não são de fato o que devemos chamar de “matérias”: são meramente
métodos para lidar com matérias. A Gramática é, de fato, uma “matéria” no
sentido de que definitivamente significa aprender um idioma—nesse
período significava aprender Latim. Mas o idioma em si é meramente um
meio pelo qual expressamos o pensamento. O propósito total do Trivium
era, de fato, ensinar ao aluno o uso correto das ferramentas do aprender
antes mesmo que começasse a aplicá-las às “matérias”. Primeiramente, ele
aprendia um idioma; não só como pedir uma refeição em um idioma
estrangeiro, mas a estrutura do idioma em si—o que era, como era
estruturado e como funcionava. Segundo, ele aprendia como usar o idioma;
como definir os termos e montar frases corretamente; como construir um
argumento e como detectar falácias no argumento. Dialética, por assim
dizer, abraçava a Lógica e o Debate. Terceiro, ele aprendia a expressar-se
no idioma-- como dizer o que precisava dizer de forma elegante e
persuasiva.
Ao final do curso, ele precisava compor uma tese sobre algum
assunto definido por seus mestres ou escolhido por ele, e logo defender essa
tese contra a crítica de uma mesa ou corpo docente. Até este momento, ele
teria aprendido—ou estaria em sérios apuros-- não somente a escrever um
ensaio sobre papel, mas a falar de forma audível e inteligível de uma
plataforma e usar sua inteligência com agilidade quando interrogado.
Haveria também perguntas, coerentes e perspicazes, daqueles que já
tivessem enfrentado o desfio do Debate.
É, evidentemente, verdade que partes e traços de uma tradição
medieval ainda perduram, ou têm sido ressuscitadas, no currículo da escola
comum de hoje. Algum conhecimento da gramática ainda é necessário
quando ao aprender um idioma estrangeiro—talvez até diria, “é novamente
necessária”, já que durante minha vida, passamos por fases onde o ensino
de declinação e conjugações foi considerada bastante repreensível, e é
considerado melhor adquirir este conhecimento quando surgir a
necessidade. As sociedades que discutem a escola, florescem; ensaios são
escritos; a necessidade de “autoexpressão” é enfatizada e talvez até
exageradamente. Mas estas atividades são cultivadas mais ou menos em
separado, como pertencentes a matérias especiais onde são estereotipadas
em vez de formar um esquema coerente de treinamento mental para o qual
todas as “matérias” têm uma relação subordinada. “Gramática” pertence
especialmente à “matéria” de idiomas estrangeiros e a composição de
ensaios à “matéria” chamada “Inglês”; enquanto que a Dialética ficou quase
que totalmente divorciada do restante do currículo e é frequentemente
praticada não-sistematicamente e fora do horário escolar como um exercícioseparado, vagamente relacionada ao negócio principal de aprender. Em
geral, a grande diferença de ênfase entre os dois conceitos mantém a
vigência: a educação moderna se concentra em “ensinar matérias” deixando
o método de pensar, argumentar, expressar conclusões para ser adquirido
pelo estudioso no decorrer do tempo, enquanto que a educação medieval se
concentrava primeiramente em forjar e aprender a usar as ferramentas do
aprender, utilizando a matéria que fosse útil como material para realizar os
desenhos necessários até que o uso da ferramenta fosse quase instintivo.
“Matérias” de alguma forma devem existir, evidentemente. Não
podemos aprender a teoria da gramática sem aprender o idioma, ou
aprender a argumentar e discursar sem falar sobre algo em particular. As
matérias de discussão da Idade Média foram em grande parte extraídas da
teologia, da ética ou da história da antiguidade. De um modo geral, elas
foram estereotipadas, especialmente perto do final de uma época, e as
absurdidades exageradas dos argumentos escolásticos afligiram Milton e
oferecem motivos de alegria até os dias de hoje. Se realmente forem algo
mais banalizados e triviais do que as matérias usuais de hoje para a
“composição de ensaios”, eu não gostaria de dizer: podemos ficar fartos de
“Um Dia das Minhas Férias” e todo o resto. Mas a maior parte da alegria é
inapropriada porque a meta e o objeto de debater a tese já foram perdidos
de vista.
Um orador volúvel, no Brains Trust certa vez, entreteve seu público
(e levou o falecido Charles Williams a um ataque de raiva ao assegurar que
na Idade Média era uma questão de fé saber quantos arcanjos poderiam
dançar na ponta de uma agulha. Nem preciso dizer, espero, que nunca foi
uma questão de fé"; era simplesmente um exercício de debate, cujo tema
estabelecido era a natureza da substância angelical: se os anjos eram
matéria, e se sim, ocupavam espaço? A resposta geralmente julgada correta
é, acredito que os anjos são puras inteligências; não matéria, mas limitados,
de modo que possam ter lugar no espaço, mas não extensão. Uma analogia
pode ser traçada a partir do pensamento humano, que é da mesma forma
não-material e limitada. Assim, se o seu pensamento concentra-se em uma
só coisa—como ponta de uma agulha—está focada lá no sentido de que não
está em outro lugar; embora esteja “lá”, não ocupa nenhum espaço lá, e não
há nada que impeça que um número infinito de diferentes pensamentos de
pessoas esteja concentrado sobre a mesma ponta de agulha ao mesmo
tempo. O assunto apropriado do argumento é assim visto como a distinção
entre a localidade e a extensão no espaço; a matéria sobre a qual o
argumento é exercido passa a ser a natureza dos anjos (embora, como
vimos, pode igualmente ter sido outra coisa; a lição prática a ser tirada do
argumento é não utilizar palavras como “ali” no sentido literal e não-
científico, sem especificar se queremos dizer “localizado ali” ou “ocupando
espaço ali”.
Muito desprezo tem sido derramado sobre a paixão medieval pela
crítica minuciosa; mas quando observamos o abusivo descaso que tem sido
praticado, em publicações e na plataforma, de expressões polêmicas com
conotações ambíguas e mutáveis, podemos sentir em nossos corações o
desejo de que todo leitor e ouvinte possa ser tão defensivamente blindado
com sua educação para assim ser capaz de dizer: “Distingo”.
Pois permitimos que nossos jovens saiam desarmados num dia onde
a armadura nunca foi tão necessária. Ensinando-os a ler, os deixamos à
mercê da palavra impressa. Com a invenção do cinema e do rádio, nos
asseguramos de que nenhuma aversão à leitura possa protegê-los da
incessante bateria de palavras, palavras, palavras. Eles não sabem o que as
palavras significam; eles não sabem como evitá-las ou minimizar seu
impacto ou lançá-las de volta; eles são reféns das palavras em suas
emoções, em vez de serem os mestres delas em seu intelecto. Nós, que
fomos escandalizados em 1940, quando os homens foram enviados para
lutar contra tanques blindados com rifles, não ficamos escandalizados
quando jovens, homens e mulheres, são lançados ao mundo para lutar
contra a propaganda em massa com um punhado de “matérias”; e quando
classes inteiras e nações inteiras ficam hipnotizadas pelas artes do orador
cativante, temos o atrevimento de nos surpreender. Falamos muito sobre a
importância da educação—falamos em agir e, apenas ocasionalmente,
concedemos um pequeno investimento; adiamos a idade de conclusão dos
estudos e planejamos escolas maiores e melhores; os professores
conscientemente trabalham como escravos dentro e fora do horário escolar;
e mesmo assim, acredito, todo este esforço dedicado é, em grande parte,
frustrado porque perdemos as ferramentas da aprendizagem e, na sua
ausência, somente conseguimos fazer um trabalho remendado e
fragmentado.
Como aplicar a educação clássica
 
O que, então, devemos fazer? Não podemos voltar à Idade Média. É
um pedido para o qual estamos acostumados. Não podemos voltar—ou
podemos? Explico. Eu gostaria que cada termo nessa preposição fosse
definido. “Voltar” significa um retrocesso no tempo ou a revisão de um
erro? O primeiro é claramente impossível por si só; o segundo é algo que os
sábios fazem todos os dias. “Não é possível”-- não significa que o nosso
comportamento é determinado de forma irreversível ou, simplesmente que
tal ação seria muito difícil, tendo em vista a oposição que provocaria?
Obviamente, o século XX não é e não pode ser o décimo quarto; mas se a
“Idade Média” é, neste contexto, simplesmente uma frase pitoresca que
denota uma certa teoria educacional, parece não haver uma razão a priori
pela qual não devemos “voltar” a ela—com modificações—considerando
que já “voltamos” com modificações, para, por assim dizer, a ideia de
encenar peças do Shakespeare como ele as escreveu, e não as versões
“modernizadas” do Cibber e Garrick, que certa vez pareciam ser a última
moda em progresso teatral.
Vamos, só por um momento, imaginar que tal retrocesso progressivo
fosse possível. Vamos fazer uma varredura de todas as autoridades
educacionais e usar escolares a quem possamos experimentalmente equipar
para o conflito intelectual segundo as regras escolhidas por nós mesmos.
Daremos a eles pais excepcionalmente dóceis; equiparemos nossa escola
com professores que estão perfeitamente familiarizados com os objetivos e
métodos do Trivium; teremos um edifício e um quadro grande o suficiente
para permitir um número pequeno e gerenciável de alunos; e vamos
postular uma Mesa de Examinadores disposta e qualificada para testar e
avaliar os produtos que formamos. Assim preparados, vamos tentar esboçar
um plano de estudos—um Trivium moderno “com modificações” e
veremos onde conseguimos chegar.
Mas primeiro: qual deve ser a idade das crianças? Bem, se devemos
educá-los com métodos novos, seria melhor que não tivessem nada que
precise ser desaprendido; não se pode começar uma coisa boa cedo demais,
e, por sua natureza, o Trivium não é aprendizagem, mas uma preparação
para a aprendizagem. Vamos, portanto, “capturá-los quando jovens”, e
exigir do nosso aluno que seja somente capaz de ler, escrever, e fazer
contas.
Estados de desenvolvimento e o Trivium
Minhas opiniões sobre psicologia infantil não são, eu admito,
ortodoxas ou esclarecidas. Olhando para minha vida (desde quando eu era a
criança que conheço melhor e a única criança que posso esperar conhecer
do meu interior), eu reconheço três estados de desenvolvimento. Estes
estados, de forma pronta e tosca, chamarei de Papagaio-Imitador, o
Petulante e o Poético-- este último coincidindo, aproximadamente, com o
início da puberdade. A etapa do Papagaio-Imitador é quando aprender por
memorização é fácil e, em geral, prazeroso; enquanto que o raciocínio é
difícil e, em geral, pouco apreciado. Nesta idade, facilmente memorizamos
as formas e aparências das coisas; gostamos de recitar os números de placas
de carros; sentimosalegria em cantar rimas e o estrondo e trovão de
polissílabas inteligíveis; desfrutamos da mera acumulação das coisas. A
idade Petulante que segue a anterior (e naturalmente a sobrepõe, em certa
medida), é caracterizada por contradições, retrucar, gostar de “pegar as
pessoas de surpresa” (especialmente os mais velhos); e pela proposta de
charadas. Sua capacidade de incomodar os outros é extremamente alta.
Geralmente surge no Quatro Ano. A idade Poética é popularmente
conhecida como a idade “difícil”. É uma idade egocêntrica; ela luta para se
expressar; sua especialidade é ser incompreendida; é inquieta e tenta
conseguir sua independência; e, com sorte e boas orientações, ela deve
mostrar os primórdios da criatividade; a busca da síntese do que já se sabe,
e a vontade deliberada de saber e fazer uma única coisa em detrimento de
todas as outras. Agora parece-me que a composição do Trivium se adapta
de forma singularmente apropriada a estas três idades: A Gramática para o
Papagaio-Imitador, a Dialética para a idade Petulante e a Retórica para a
idade Poética.
Comecemos, então, com a Gramática. Isto, na prática, significa a
gramática de uma língua em particular; e deve ser uma língua flexiva. A
estrutura gramatical de uma língua inflexiva é demasiado analítica a ser
compreendida por alguém sem prática prévia em Dialética. Além disso, a
língua flexiva interpreta a inflexiva, enquanto que as inflexivas são pouco
úteis para interpretar a flexiva. Vou dizer também, com firmeza, que o
melhor fundamento para a educação é a Gramática latina. Digo isto não
porque o latim é tradicional e medieval, mas simplesmente porque mesmo
um conhecimento rudimentar do latim reduz o trabalho e as dores da
aprendizagem de quase qualquer outro assunto por, pelo menos, cinquenta
por cento. É a chave para o vocabulário e a estrutura de todas as línguas
Teutônicas, bem como para o vocabulário técnico de todas as ciências e de
toda a literatura da civilização mediterrânica e seus documentos históricos.
Aqueles cuja preferência pedante por uma língua viva convence-os a
privar os alunos de todas estas vantagens podem substituir o russo, cuja
gramática é ainda mais primitiva. O russo é, naturalmente, útil com os
outros dialetos eslavos. Há algo também a ser dito sobre o grego clássico.
Mas a minha escolha é o latim. Tendo, assim, agradado aos Classicistas
entre vocês, continuarei a horrorizá-los adicionando que eu não acredito que
seja sábio ou necessário colocar o aluno comum sobre o leito de Procusto
da época Augustana, com seus versos e oratória altamente elaborada e
artificial. O latim pós-clássico e medieval, que foi uma língua viva até o
final do Renascimento, é mais fácil e, em alguns aspectos, mais animado; o
estudo dele ajuda a dissipar a difundida noção de que a aprendizagem e a
literatura chegaram a uma parada completa quando Cristo nasceu e só
voltou a acordar na Dissolução dos Mosteiros.
O latim deve ser iniciado tão cedo quanto possível—quando o
flexionado discurso não parece mais surpreendente do que qualquer outro
fenômeno em um mundo surpreendente; e quando o canto de “Amo, amas,
amat” seja tão ritualmente agradável quanto os sentimentos ao cantar “atirei
o pau no gato”.
Nesta idade, devemos, é claro, exercitar a mente com outras coisas
além de Gramática latina. A observação e a memória são as faculdades mais
vivas neste período; e se nós estamos aprendendo uma língua estrangeira
contemporânea, devemos começar agora, antes que os músculos faciais e
mentais se rebelem contra estranhas entonações. O francês ou alemão
verbal pode ser praticado junto a disciplina gramatical do latim.
Em inglês, entretanto, verso e prosa podem ser memorizados, e a
memória do aluno deve armazenar histórias de todos os tipos—clássicos
mitos, lendas Europeias, e assim por diante. Eu não acredito que as histórias
e obras-primas clássicas da literatura antiga devem ser utilizadas para
praticar as técnicas de Gramática—essa foi uma falha da educação
medieval que não precisamos perpetuar. As histórias podem ser apreciadas
e lembradas em inglês, e relacionadas com a sua origem em uma fase
posterior. A recitação em voz alta deve ser praticada individualmente ou em
coro; pois não devemos esquecer que estamos lançando as bases para a
Discussão e a Retórica.
A Gramática da história deve consistir, eu acredito, em datas,
eventos, histórias e personalidades. Um conjunto de datas para a qual
possamos associar todo conhecimento histórico posterior é de grande ajuda
quando chegarmos ao momento de instituir a perspectiva da história.
Podemos escolher quaisquer datas: aqueles dos Reis da Inglaterra são bem
apropriadas, desde que venham acompanhadas por imagens de vestimentas,
arquitetura, e outras coisas do cotidiano, de modo que a mera menção de
uma data possa acionar uma apresentação visual forte do período inteiro.
A geografia também será apresentada em seu aspecto factual, com
mapas, recursos naturais, e a apresentação visual de costumes, trajes, flora,
fauna, e assim por diante; e acredito que a memorização obsoleta e
desprestigiada de algumas capitais, rios, montanhas, etc., não fará mal. A
coleção de selos pode ser encorajada.
A ciência, no método Papagaio-Imitador, organiza-se naturalmente e
facilmente em torno de coleções—a identificação e nomenclatura das
amostras e, em geral, o tipo de coisa que costumava ser chamada de
“filosofia natural”. Conhecer o nome e as propriedades das coisas é, nesta
idade, uma satisfação em si; reconhecer um escaravelho à simples vista, e
poder garantir para os mais tolos que, apesar de sua aparência, não dá
ferroadas; ser capaz de distinguir a Cassiopeia e as Plêiades, e, talvez, até
mesmo saber quem eram Cassiopeia e as Plêiades; estar ciente de que uma
baleia não é um peixe, e que um morcego não é um pássaro—todas essas
coisas dão uma agradável sensação de superioridade; enquanto que
distinguir uma coral verdadeira de uma coral falsa ou um fungo comestível
de um fungo venenoso é um tipo de conhecimento que também tem valor
prático.
A Gramática da matemática começa, claro, com a tabela de
multiplicação, que, se não aprendida agora nunca será aprendida com
prazer; e com o reconhecimento de formas geométricas e o agrupamento de
números. Esses exercícios levam naturalmente à realização de simples
somas aritméticas. Processos matemáticos mais complexos podem, e talvez
devem, ser adiados por motivos que serão apresentados agora.
Até agora (exceto, é claro, para o latim), nosso currículo não contém
nada que vai muito além da prática comum. A diferença será percebida na
atitude do educador, quem deve olhar para todas essas atividades não como
“matérias” em si, mas como uma coleção de material para uso na próxima
parte do Trivium. Este material é de importância secundária; mas tudo e
qualquer coisa útil que possa ser memorizada deve ser memorizada neste
período, se imediatamente inteligível ou não. A tendência moderna é a de
tentar forçar explicações racionais na mente de uma criança em tenra idade.
Perguntas inteligentes feitas espontaneamente deveriam, é claro, receber
uma resposta imediata e racional; mas é um grande erro supor que uma
criança não pode facilmente desfrutar e se lembrar de coisas que estão além
de seu poder de análise—em particular se as coisas têm um forte e apelo
imaginativo (como, por exemplo, "Kubla Kahn"), um atraente jingle (como
algumas das rimas de memorização para gêneros latinos) ou de uma
abundância de polissílabas ricas e retumbantes (como o Quicunque Vult).
Isso me lembra a Gramática da teologia. Vou adicioná-la ao currículo
porque a teologia é a ciência mestra sem a qual toda a estrutura educacional
carecerá necessariamente da sua síntese final. Aqueles que discordam com
isto terão que se contentar em deixar a educação do aluno cheio de pontas
soltas. Isso importa menos do que poderia, já que quando as ferramentas da
aprendizagem têm sido efetivamente forjadas, o alunoserá capaz de
questionar a teologia por si só, e provavelmente insistirá em fazer isso e em
dar sentido a ela. Ainda assim, este assunto deverá ficar pronto e acessível
para que possa ser trabalhado. Na idade gramatical, portanto, devemos
familiarizar-nos com a história de Deus e o Homem em geral—isso é, o
Antigo Testamento e o Novo Testamento apresentados como partes de uma
única narrativa da Criação, da Rebelião e da Redenção—e também com o
Credo, a Oração do Pai Nosso e os Dez Mandamentos. Nesta fase inicial,
estas coisas não precisam ser totalmente compreendidas, mas devem ser
conhecidas e lembradas.
É difícil dizer em que idade, precisamente, devemos passar da
primeira para a segunda parte do Trivium. De um modo geral, a resposta é:
tão logo o aluno mostra-se espirituoso e disposto ao iniciar argumentos
intermináveis. Na primeira parte, as faculdades-chave são a Observação e a
Memória, de modo que, na segunda parte, a faculdade chave é a Razão
Discursiva. Na primeira, o exercício a que o restante do material foi, por
assim dizer, direcionado, era a Gramática do latim; no segundo, o exercício
chave será a Lógica Formal. É aqui que o nosso currículo mostra sua
primeira divergência acentuada dos padrões modernos. O descrédito em que
a Lógica Formal tem caído é totalmente injustificada; e a sua negligência é
a causa principal dos inquietantes sintomas que temos observado na
constituição intelectual moderna. A lógica tem sido desacreditada, em parte,
porque passamos a acreditar que somos condicionados quase inteiramente
pelo intuitivo e o inconsciente. Não há tempo para discutir se isto é
verdade; eu simplesmente observarei que negligenciar a formação adequada
da razão é a melhor maneira possível de torná-la verdadeira. Outra causa
para o desfavor em que a Lógica tem caído é a crença de que é inteiramente
baseada em suposições universais que são improváveis ou tautológicas. Isso
não é verdade. Nem todas as proposições universais são deste tipo. Mas
mesmo se fossem, isso não faria nenhuma diferença, uma vez que cada
silogismo cuja premissa maior seja “Todo A é B” pode ser reformulada em
forma hipotética. A Lógica é a arte de argumentar corretamente: “Se A,
então B”. O método não é invalidado pela natureza hipotética de A. De fato,
a utilidade prática da Lógica Formal hoje não reside tanto no
estabelecimento de conclusões positivas como na rápida detecção e
exposição da inferência inválida.
Vamos agora rever rapidamente o nosso material e ver como pode
ser relacionado com a Dialética. No âmbito da Linguagem, nós agora temos
o nosso vocabulário e a morfologia ao nosso alcance; daí em diante,
podemos concentrar-nos na sintaxe e análise (por exemplo, a lógica da
construção do discurso) e a história da língua (por exemplo, como passamos
a organizar nossa fala para transmitir nossos pensamentos).
Nossa Leitura passará da narrativa e a lírica para os ensaios, o
argumento e as críticas, e o aluno aprenderá tentar escrever este tipo de
coisa. Muitas lições—sobre qualquer assunto—assumirão a forma de
debates; e o lugar da recitação individual ou em coral será tomado por peças
dramáticas, com atenção especial para as peças em que um argumento é
expressado na forma dramática.
A matemática-- álgebra, geometria e os mais avançados tipos de
aritmética—agora será introduzida no currículo e assumirá seu lugar como
o que realmente é: não uma matéria separada, mas um subdepartamento da
Lógica. Não é nem mais nem menos do que a regra do silogismo em sua
aplicação específica para número e medida e deve ser ensinada como tal,
em vez de ser, para alguns, um mistério sombrio e, para outros, uma
revelação especial, nem iluminando nem iluminado por qualquer outra parte
do conhecimento.
A história, auxiliada por um sistema simples de ética derivada da
Gramática da teologia, fornecerá muito material apropriado para o debate:
O comportamento deste estadista foi justificado? Qual foi o efeito desta
promulgação? Quais são os argumentos a favor e contra esta ou aquela
forma de governo? Assim, teremos uma introdução à história constitucional
—um assunto sem sentido para a criança, mas de absoluto interesse para
aqueles que estão preparados para discutir e debater. A teologia em si
fornecerá material para a discussão sobre a conduta e a moral; e deve ter
seu escopo estendido por um modelo simplificado do curso de teologia
dogmática (isto é, a estrutura racional do pensamento Cristão), esclarecendo
as relações entre o dogma e a ética, e prestando-se para a aplicação dos
princípios éticos em situações em particular, que é corretamente chamado
de casuística. A geografia e as ciências igualmente fornecerão material para
a Dialética.
Mas, acima de tudo, não devemos negligenciar o material que é tão
abundante na vida diária dos próprios alunos.
Há uma deliciosa passagem no livro “The Living Hedge” de Leslie
Paul que conta como um grupo de meninos pequenos se divertiram por dias
e dias discutindo sobre uma extraordinária chuva que havia caído em sua
cidade—uma chuva tão localizada que deixou metade da rua principal
úmida e a outra metade seca. Alguém poderia argumentar corretamente
dizer que havia chovido naquele dia em ou sobre a cidade ou apenas na
cidade? Quantas gotas de água eram necessárias para constituir a chuva? E
assim por diante. A discussão levou a uma série de problemas semelhantes
sobre o descanso e o movimento, o sono e a vigília, este não, este a divisão
infinitesimal do tempo. Toda a passagem é um exemplo admirável do
desenvolvimento espontâneo da faculdade raciocinativa e da sede natural e
adequada do despertar da razão para a definição de termos e a exatidão da
afirmação. Todos os eventos são alimento para tal apetite.
A decisão de um árbitro; o grau ao qual podemos transgredir o
espírito de um regulamento sem estar presos pela letra: em questões como
estas, as crianças nascem casuístas, e sua propensão natural só precisa ser
desenvolvida e treinada—e especialmente, trazida para uma relação
inteligível com os acontecimentos no mundo adulto. Os jornais estão cheios
de bom material para tais exercícios: decisões jurídicas, por um lado, em
casos onde a causa em questão não é demasiado obscura; no outro, um
falacioso raciocínio e argumentos atrapalhados, observados em abundância
em algumas colunas de correspondência de certos jornais.
Onde quer que encontremos a Dialética, é, naturalmente, importante
focar a atenção na beleza e economia de uma demonstração boa ou um
argumento bem apresentado, para não deixar morrer a veneração. A crítica
não deve ser meramente destrutiva; entretanto, tanto o educador quanto os
alunos devem estar preparados para detectar a falácia, o raciocínio
descuidado, a ambiguidade, a irrelevância, e a redundância, e lançar-se
sobre eles, como ratos. Este é o momento quando é útil escrever resumos ,
com exercícios como a escrita de um ensaio e a redução do mesmo, quando
escrito, por 25 ou 50 por cento.
Será, sem dúvida, recusada a ideia de que incentivar os jovens na
idade Petulante a intimidar, corrigir e discutir com os mais velhos os tornará
perfeitamente intoleráveis. Minha resposta é que as crianças dessa idade são
intoleráveis de qualquer forma; e que sua vontade natural de argumentar
pode ser tanto canalizada para servir um bom propósito quanto deixada para
correr livre. Podem, de fato, ser um pouco menos intrusivos em casa se
forem disciplinados na escola; e de qualquer maneira, os mais velhos que
abandonaram o princípio saudável de que as crianças devem ser vistas e não
ouvidas não poderão culpar ninguém além de si mesmos.
Mais uma vez, o conteúdo do currículo nesta fase pode ser qualquer
coisa da sua preferência. As “matérias” fornecem o material; mas devem ser
todos considerados como mera munição para o moinho mental sobre o qual
trabalhar. Os alunos devem ser incentivados a procurar sua própria
informação e então orientados a utilizar bibliotecas e livros de referênciaadequadamente, e mostrados como identificar quais fontes são confiáveis e
quais não são.
Perto do final desta etapa, os alunos provavelmente começarão a
descobrir que seus conhecimentos e experiências são insuficientes e que
suas inteligências treinadas precisarão de muito mais material para
mastigar. A imaginação—normalmente dormente durante a idade Petulante
—irá despertar e levá-los a suspeitar das limitações da lógica e da razão.
Isso significa que eles estão passando para a idade Poética e estão prontos a
iniciar o estudo da Retórica. As portas do armazém de conhecimento devem
agora ser abertas para que eles possam dar uma olhada da forma que
quiserem. As coisas antes aprendidas pela memorização serão vistas em
novos contextos; as coisas uma vez friamente analisadas agora poderão ser
colocadas juntas para formar uma nova síntese; aqui e ali uma súbita visão
trará a mais emocionante de todas as descobertas: a percepção de que o
truísmo é verdadeiro.
É difícil traçar qualquer plano de estudos para o estudo da Retórica:
uma certa liberdade é exigida. Na literatura, deve-se permitir que a
apreciação mais uma vez lidere sobre a crítica destrutiva; e a autoexpressão
escrita pode avançar, com as suas ferramentas agora afiadas para cortar a
limpo e observar a proporção. Qualquer criança que já mostra uma
disposição para se especializar, deve proceder livremente; pois quando o
uso das ferramentas tem sido corretamente e verdadeiramente aprendido,
estará disponível para qualquer estudo, seja qual for. Seria bom, eu acredito,
que cada aluno aprenda a fazer uma ou duas matérias muito bem, enquanto
assistir algumas aulas de matérias subsidiárias a fim de manter sua mente
aberta para as inter-relações de todo o conhecimento. De fato, nesta fase,
nossa dificuldade será a de manter as “matérias” separadas; já que a
Dialética terá mostrado todos os ramos da aprendizagem que possam ser
inter-relacionadas, e a Retórica tende a mostrar que todo o conhecimento é
um só. Mostrar isso e mostrar porque é assim, é preeminentemente tarefa da
ciência. Mesmo com ou sem o estudo da teologia, devemos, pelo menos,
insistir que as crianças com certa inclinação para a especialização em
matemática e ciências sejam obrigadas a assistir a algumas aulas de ciências
humanas e vice-versa. Nesta fase, também, a Gramática latina, tendo feito
seu trabalho, pode ser descartada para aqueles que preferem continuar seus
estudos de linguagem do lado moderno; enquanto aqueles que
provavelmente nunca terão grande uso ou aptidão para a matemática
também poderão, de certa forma, deixar estes estudos de lado por um
tempo. De modo geral, tudo aquilo que for mero instrumental agora poderá
ficar em segundo plano, enquanto a mente treinada é gradualmente
preparada para a especialização em “matérias” que, quando o Trivium for
concluído, estará perfeitamente equipada para enfrentar por si só. A
síntese final do Trivium—apresentação e defesa pública da tese—deve ser
restaurada de alguma forma; talvez como uma espécie de “prova final”
durante o último semestre de estudos.
O escopo da Retórica também depende de se o aluno se lançará ao
mundo aos 16 anos ou se continuará para a universidade. Considerando que
a Retórica, de fato, deve ser iniciada aos 14 anos aproximadamente, a
primeira categoria de aluno deve estudar a Gramática dos 9 aos 11 anos e a
Dialética dos 12 aos 14; seus dois últimos anos de estudo devem ser
dedicados a Retórica, que, neste caso, seria do tipo bastante especializada e
vocacional, para que o aluno possa iniciar imediatamente alguma prática de
carreira. Um aluno da segunda categoria terminaria seu curso em Dialética
na etapa ou na escola preparatória, e iniciaria a Retórica durante seus dois
primeiros anos de estudos formais ou na escola pública. Aos 16, ele estará
pronto para iniciar aquelas “matérias” propostas para seus estudos
posteriores na universidade: e essa parte de sua educação corresponderá ao
Quadrivium medieval. O que isso quer dizer é que o aluno comum, cuja
educação formal termina aos 16, fará somente o Trivium; enquanto que os
acadêmicos concluirão o Trivium e o Quadrivium.
Palavras Finais
 
É o Trivium, então, uma educação suficiente para a vida?
Corretamente ensinado, eu acredito que sim. No final da Dialética, pode
parecer que estas crianças estão bem atrasadas com relação aos seus colegas
educados usando os métodos “modernos” à moda antiga no que se refere ao
conhecimento detalhado de uma matéria específica. Mas depois dos 14
anos, eles certamente serão capazes de ultrapassar os outros rapidamente.
De fato, não vejo por que um aluno completamente proficiente no Trivium
não possa prosseguir imediatamente para a universidade aos 16 anos, assim
provando-se igual à sua contrapartida medieval, cuja precocidade nos
surpreendeu no início desta discussão. Isso, com certeza, causaria uma
comoção no sistema público de educação, e desconcertaria as universidades
significativamente. Causaria uma grande transformação, por exemplo, na
regata Oxford e Cambridge.
Mas não estou aqui para considerar os sentimentos de entidades
acadêmicas: Eu estou preocupada apenas com o treinamento adequado da
mente para encontrar e lidar com a formidável massa de problemas
indigestos apresentados pelo mundo moderno. As ferramentas do aprender
são as mesmas para toda e qualquer matéria; e a pessoa que souber como
usá-las, em qualquer idade, terá o domínio de uma matéria nova em metade
do tempo com um quarto do esforço de uma pessoa que não tem estas
ferramentas a seu dispor. Aprender seis matérias sem lembrar como foram
aprendidas não faz nada para ajudar o aprendizado de uma sétima matéria;
aprender e lembrar a arte do aprender torna a abordagem de qualquer
matéria uma porta aberta.
Fica evidente que o ensino bem sucedido de um currículo
neomedieval dependerá mais do que o habitual do trabalho conjunto de
todos os professores em direção a um propósito comum. Já que nenhuma
matéria é considerada como um mal em si, qualquer rivalidade na sala dos
professores será tristemente inadequada. O fato de que o aluno é obrigado,
infelizmente, por algum motivo, a perder a aula de história às sextas-feiras
ou a aula de Shakespeare às terças-feiras, ou até mesmo omitir toda uma
matéria em favor de outra, não deve causar descontentamento—o essencial
é que adquira o método de aprendizagem em qualquer meio que lhe for
mais conveniente. Se a natureza humana sofrer este duro golpe no orgulho
profissional na nossa própria matéria, há conforto no pensamento de que os
resultados das provas do fim de semestre não serão afetados; já que os
papéis serão dispostos de modo a ser uma prova de método, por qualquer
meio.
Vou acrescentar que é muito importante que todos os educadores
sejam, para seu próprio bem, qualificados e obrigados a ensinar as três
partes do Trivium; caso contrário os Mestres da Dialética, especialmente,
poderão ficar com as mentes endurecidas numa permanente adolescência.
Por este motivo, os professores nas escolas preparatórias também devem ter
aulas de Retórica nas escolas públicas a que estão ligados; ou, se eles não
estão tão ligados, então por algum acordo com outras escolas no mesmo
bairro. Como alternativa, os alunos poderiam assistir algumas aulas
preliminares em Retórica na escola preparatória a partir dos treze anos.
Antes de concluir estas sugestões necessariamente muito gerais, eu
deveria dizer porque acho que é necessário, nestes dias, voltar a uma
disciplina que foi descartada. A verdade é que nos últimos trezentos anos
temos vivido de nosso capital educacional. O mundo pós-renascimento,
desnorteado e entusiasmado com a profusão de novas “matérias”, separou-
se da velha disciplina (que, de fato, tornou-se tristemente maçante e
estereotipada em sua aplicação prática) e imaginou que dali em diante
poderia, por assim dizer, passar alegremente pelo novo e estendido
Quadrivium sem passar pelo Trivium. Mas a tradiçãoescolástica, embora
quebrada e mutilada, demorou-se nas escolas e universidades públicas:
Milton, embora tenha protestado muito contra isso, foi formado por isso—o
debate dos Anjos Caídos e a disputa de Abdiel com Satanás tem as marcas
das ferramentas das Escolas, e poderiam, de forma rentável, figurar como
passagens estabelecidas em nossos estudos Dialéticos. Até o século XIX,
nossas relações públicas foram principalmente geridas, e nossos livros e
periódicos principalmente escritos, por pessoas criadas em lares e treinadas
em lugares onde a tradição ainda estava viva na memória e quase no
sangue. Assim, muitas pessoas que hoje são ateias ou agnósticas de religião
são governadas em sua conduta por um código de ética Cristão tão
enraizado que nunca pensariam em questioná-lo.
Mas não podemos viver do capital para sempre. Mesmo a tradição
mais enraizada, se nunca for regada, pode até demorar em morrer, mas no
final morrerá. E hoje um grande número—talvez a maioria—dos homens e
das mulheres que lidam com nossos assuntos, escrevem nossos livros e
jornais e figuram em nossas peças e nossos filmes, discursam de nossas
plataformas e púlpitos—sim, e que educam os nossos jovens—nunca,
mesmo em uma memória tradicional remanescente, foram submetidos à
disciplina Escolástica. É cada vez menos frequente ver que as crianças
educadas carreguem algo dessa tradição com elas. Perdemos as ferramentas
da aprendizagem—o machado e a cunha, o martelo e o serrote, o cinzel e o
aplanador—que eram tão adaptáveis a todas as tarefas. Em vez delas, temos
apenas um conjunto de gabaritos complexos, cada um dos quais fará
somente uma tarefa e nada mais, e ao usar o olho e mão carecem de
qualquer treinamento, de modo que ninguém consiga ver o trabalho como
um todo ou “olhar para o final da obra”.
De que serve empilhar tarefa sobre tarefa e prolongar os dias de
trabalho se no final da obra o objetivo principal não é atingido? A culpa não
é dos professores—eles já trabalham duro demais. A combinada insensatez
de uma civilização que esqueceu suas raízes está forçando eles a carregar o
peso cambaleante de uma estrutura educacional construída sobre a areia.
Eles estão fazendo para seus alunos o trabalho que os próprios alunos
deveriam fazer. Pois o único objetivo da educação é simplesmente isto:
ensinar aos homens como aprender por si mesmos; e toda instrução que não
consiga fazer isto é um esforço despendido em vão.
Sobre a autora
 
Paul M. Bechtel escreve que Dorothy Leigh Sayers (1893-1957)
iniciou-se brevemente na carreira de ensino após se graduar em Oxford. Ela
publicou uma longa e popular série de romances, traduziu a “Divina
Comédia”, escreveu uma série de peças de rádio e uma defesa da fé cristã.
Durante a segunda guerra mundial, ela morou em Oxford e foi um
membro do grupo que incluía C.S. Lewis, Charles Williams, J.R.R. Tolkien
e Owen Barfield. Por natureza e preferência, ela foi uma estudiosa e
especialista da Idade Média.
Neste ensaio, Miss Sayers sugere que atualmente ensinamos tudo
para nossos filhos menos como aprender. Ela propõe que adotemos uma
versão adequadamente modificada do currículo escolástico medieval por
motivos metodológicos
“The Lost Tools of Learning” (As Ferramentas Perdidas da
Aprendizagem) foi apresentado pela primeira vez por Miss Sayers em
Oxford em 1947.
 
	Nota da Tradutora
	Introdução
	Por que a educação clássica?
	Sobre a educação clássica
	Como aplicar a educação clássica
	Estados de desenvolvimento e o Trivium
	Palavras Finais
	Sobre a autora

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