Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 ATIVIDADE INDIVIDUAL Matriz de análise Disciplina: Direito de seguro e Resseguros Módulo: 2 Aluno: Daniela Clímaco Pereira Vieira Turma: PGO_DSRPOSEAD-36_28032022_1 “Turma 1” Tarefa: Atividade Individual Introdução Solicitante: Seguradora. Referente à: Análise fática, com prognóstico de êxito, sobre a negativa da cobertura do seguro garantia, frente ao pagamento da multa aplicada, pelo Governo Federal (Seguradora), à Construtora XPTO (Tomadora). Ementa Direito de Seguro. Licitação. Processo Administrativo. Obra de Grande Vulto. Seguro Garantia. Rescisão Contratual. Cobrança de Multa Contratual. Ausência de Comunicação à Seguradora. Circular Susep Nº 477/2013. Código Civil. Lei das Licitações Públicas. Relatório Trata-se de parecer formulado para a pessoa jurídica “Seguradora”, acerca do caso concreto que passo a narrar. Em 25 de maio de 2023, o Governo Federal e a Construtora XPTO firmaram contrato administrativo, após procedimento licitatório. O objetivo do contrato era a realização de obra de grande vulto, tendo esta sido orçada no valor de 980 milhões de reais e tendo como previsão de entrega a data de 25 de maio de 2027. Fora exigido pelo Governo Federal, doravante “Segurado” ou “Governo”, que fosse dado em garantia o maior valor permitido pela Lei 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos). Em resposta, a Construtora XPTO, doravante “Construtora” ou “Tomadora”, ofereceu um Seguro Garantia, com condições gerais que seguiam o texto padrão da Susep. 2 Em momento posterior, em 20 de fevereiro de 2025, o Governo, ora Segurado, notificou a Seguradora acerca da rescisão contratual que fora firmado entre a Construtora e o Governo, após regular procedimento administrativo. Ainda, invocando o Seguro Garantia, fora cobrado da Seguradora uma multa no montante de R$ 120 milhões, diante da inércia da Construtora. Diante disto, é pertinente destacar que a Seguradora foi surpreendida por tal comunicação, pois esta não tinha sido comunicada previamente acerca do Procedimento Administrativo, da rescisão rontratual ou da aplicação da multa. Em notificação recebida em 3 de março de 2025 pelo Governo Federal, a Seguradora negou a cobertura, alegando que o Segurado não cumpriu com as obrigações previstas na apólice. É o relatório, passo a opinar. Desenvolvimento 1. DA AUSÊNCIA DE PRÉVIA COMUNICAÇÃO DA EXPECTATIVA DO SINISTRO. Ab initio, faz-se necessário expor a definição do que seria o Seguro Garantia. Segundo a Min. Nancy Andrighi1 , este seria um contrato no qual a Seguradora garantiria os interesses do Credor, que figuraria como Segurado. Assim, o devedor (no caso em tela, a Construtora) é o tomador da garantia junto à Seguradora e indica seu credor como o beneficiário direto da prestação, no caso de concretização do sinistro ou do inadimplemento. Logo, é possível compreendermos que, visando a obtenção de mais segurança na contratação e execução de obras públicas, principalmente as de grande vulto, o Seguro Garantia preenche um relevante papel, garantindo a finalização da obra segurada, ainda que de maneira indireta, ao assegurar as obrigações assumidas pelo Tomador. No entanto, faz-se necessário ressaltar que, diante da cláusula geral de boa-fé contratual, prevista nos Art. 765 e 422 do Código Civil, além da Seguradora, os beneficiários também passam a ter determinadas obrigações que, caso não as façam, geram consequências 1 STJ. REsp nº 1838837 / SP (2019/0097513-3). RELATOR: Min. RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA. JULGADO EM 12/05/2020. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/processo/pesquisa/?aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&term o=REsp%201838837 https://processo.stj.jus.br/processo/pesquisa/?aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&termo=REsp%201838837 https://processo.stj.jus.br/processo/pesquisa/?aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&termo=REsp%201838837 pertinentes de trazer a baila, como a perda da própria garantia ou a isenção de responsabilidade da Seguradora. O Código Civil, em seus artigos 771 e 769, determina que o Beneficiário deve cooperar com a Seguradora, de forma que, além de fornecer documentos necessários ou prestar esclarecimentos, devem ainda realizar a comunização imediata do sinistro, principalmente quando esta é útil para a Seguradora e para a regulação do sinistro ou indenização por esta. Deste modo, uma vez que seja realizada a abertura do processo administrativo para que sejam apuradas inadimplências ou irregularidades por parte do Tomador, deve ser remetida cópia à Seguradora, com a finalidade de comunicar e fazer o registro da expectativa do sinistro. Assim, tão logo a Seguradora fosse notificada, esta poderia atentar-se ao procedimento administrativo instaurado pelo Governo Federal e empregar as diligências necessárias para minimizar as repercussões negativas resultantes do descumprimento contratual por parte da Construtora, reservando valores para a hipótese de efetiva concretização do sinistro, com a prévia instauração administrativa de regulação. Nesse sentido, cumpre destacar que este também é o entendimento jurisprudencial, como bem demonstrado abaixo: CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO MONITÓRIA. SEGURO-GARANTIA. CONTRATO ADMINISTRATIVO. DESCUMPRIMENTO DO DEVER CONTRATUAL. PERDA DO DIREITO À INDENIZAÇÃO. EXPECTATIVA DE SINISTRO. 1. O descumprimento do dever do segurado em comunicar à seguradora tão logo ocorra a inadimplência do tomador do serviço, a fim de registrar a expectativa do sinistro, acarreta a perda do direito ao pagamento do seguro. 2. A deflagração do procedimento administrativo para apurar falhas cometidas no curso do contrato administrativo deveria ser objeto de informação imediata à seguradora, a fim de possibilitar a minoração do sinistro. 3. Recurso desprovido. (TJDF, 8ª Turma Cível. Relator Des. Mario Zam-Belmiro. Apelação Cível nº 0703103-84.2019.8.07.0001. Publicado no DJE : 18/12/2019. Julgamento: 4 de Dezembro de 2019.) ADMINISTRATIVO.SEGURO-GARANTIA. INADIMPLEMENTO DA TOMADORA. FALTA DE COMUNICAÇÃO. ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA. 1. Ao deixar de ter conhecimento acerca do inadimplemento contratual por 4 parte da Tomadora, a seguradora apelada se viu impossibilitada de tomar providências para minorar as consequências, tanto para a segurada, como para a própria seguradora, trazendo prejuízo à apelada. Sabendo da inadimplência da Tomadora, a Seguradora ré poderia ter adotado os seguintes procedimentos: acompanhar os procedimentos de apuração das infrações contratuais cometidas pela Tomadora; realizar, por meio de terceiros, o objeto do contrato principal, e minorar as consequências do inadimplemento impugnado pela apelante. 2. Não há em ponto algum das Condições Gerais qualquer dúvida acerca das obrigações assumidas pela Segurada, tampouco acerca das condições que levam à isenção de responsabilidade ou à perda do direito à garantia securitária. 3. A cláusula que isenta a responsabilidade da seguradora, bem como a que exige a comunicação imediata do sinistro, são plenamente válidas e aplicáveis ao caso concreto, não havendo falar em abusividade das mesmas. 4. Improcedência do pedido de condenação da ré ao pagamento do valor de apólice de seguro-garantia relativo ao contrato de prestação do serviço de vigilância. (Tribunal Regional Federal da 4ª Região, TRF-4. Terceira Turma. Apelação Cível AC 5028768-91.2013.404.7000 PR 5028768-91.2013.404.7000. Publicação no D.E. 25/02/2016. Julgamento: 24 de Fevereiro de 2016.) Como o contrato em análise no presente parecer é um contrato cujas condições gerais são parte do texto padrão da Susep, além dos artigos supracitados do Código Civil, que abordam as cláusulas de boa-fé contratual e da necessidade de cooperaçãopor parte do Segurado, com a imediata comunicação do sinistro, salienta-se que na Circular da Susep de nº 477/2013, Ramo 0775, Capítulo II, Modalidade II, Itens 4.1 e 4.2.2, também resta estabelecida a isenção de responsabilidade da Seguradora, na hipótese discutida: “Item 4.1 - Tão logo realizada a abertura do processo administrativo para apurar possível inadimplência do tomador, este deverá ser imediatamente notificado pelo segurado, indicando claramente os itens não cumpridos e concedendo-lhe prazo para regularização da inadimplência apontada, remetendo cópia da notificação para a seguradora, com o fito de comunicar e registrar a Expectativa de Sinistro.” “Item 4.2.2. A não formalização da Reclamação do Sinistro tornará sem efeito a Expectativa do Sinistro;” Conforme resta evidente, houve inequívoca infração às normas expostas e à boa-fé contratual, não tendo havido prévia comunicação da expectativa do sinistro, acarretando na perda do direito à cobertura securitária, não sendo procedente o pedido do Governo Federal, em face da Seguradora, do pagamento da multa resultante do processo administrativo instaurado. 2. DA MULTA E AS MUDANÇAS CAUSADAS PELA NOVA LEI DE LICITAÇÕES: Registre-se oportunamente que o valor de multa não poderá mais ser utilizado como defesa pela Seguradora, pelos motivos que passo a expor: O Art. 97 da Nova Lei de Licitações e ainda, o Art. 4º, parágrafo único, da Circular da Susep nº 477/2013 estabelecem que também serão devidos pela Seguradora as multas oriundas de inadimplemento das obrigações do Tomador, de modo que a Seguradora não poderia se ilidir desta responsabilidade, com exceção da hipótese ocorrida de não comunicação do sinistro ou da expectativa deste. “Art. 4[...] Parágrafo único. Encontram-se também garantidos por este seguro os valores devidos ao segurado, tais como multas e indenizações, oriundos do inadimplemento das obrigações assumidas pelo tomador, previstos em legislação específica, para cada caso.” “Art. 97 da Lei 14.133/21. O seguro-garantia tem por objetivo garantir o fiel cumprimento das obrigações assumidas pelo contratado perante à Administração, inclusive as multas, os prejuízos e as indenizações decorrentes de inadimplemento, [...]” O contrato foi assinado em 25 de maio de 2023, data escolhida em razão da vigência concomitante da Lei nº 8.666/93 com a nova lei até abril de 2022. Deste modo, não fora assinado o contrato durante o período da Vacatio Legis. Ademais, quando assinado, já havia sido ultrapassado o prazo de dois anos, contados a partir da data de abril/2021, hipótese admitida nos Art. 191 e 193, da Lei 14.133/21, que estabeleciam que a Administração Pública teria a possibilidade de optar por realizar licitações pelos critérios da lei 8.666/93 ou pela nova lei de licitações, desde que indicada expressamente no contrato ou edital, sendo vedada utilizar combinadamente ambas as leis. Tais informações são relevantes, com vista no fato de que, caso a Lei 8.666/93 fosse utilizada como critério para a realização da Licitação em análise, o seu art. 56, § 3º, determinava o teto da garantia como 10% do valor do contrato. Atualmente, com a nova Lei, ao observar seu Art. 991, percebe-se que esse limite foi alterado para 30% do valor inicial do 6 contrato. Sob tal ambulação, não seria possível alegar descabimento do valor da multa, pois 30% de 980.000.000,00 (duzentos e oitenta milhões) seria o montante equivalente à R$ 294.000.000,00 (duzentos e noventa e quatro milhões), estando o valor cobrado dentro do limite estabelecido em lei. Neste caso, em uma eventual ação judicial, estabelece a Circular da Susep de nº 477/2013, Capítulo I, Das Condições Gerais, Itens 10 e 10.1, a sub-rogação da Seguradora nos direitos do Segurado contra o Tomador, como demonstra-se abaixo: “10. Sub-Rogação: 10.1. Paga a indenização ou iniciado o cumprimento das obrigações inadimplidas pelo tomador, a seguradora sub-rogar-se-á nos direitos e privilégios do segurado contra o tomador, ou contra terceiros cujos atos ou fatos tenham dado causa ao sinistro.” Conclusão Por tudo que fora exposto, conclui-se que: 1) O prognóstico de êxito é provável, em razão da ausência de comunicação prévia da expectativa do sinistro, o que impediu que a Seguradora se atentasse ao procedimento administrativo instaurado pelo Governo Federal e empregasse as diligências necessárias para minimizar as repercussões negativas resultantes do descumprimento contratual por parte da Construtora, reservando valores para a hipótese de efetiva concretização do sinistro, com a prévia instauração administrativa de regulação. 2) Com fulcro nos Art. 771 e 769 do Código Civil e, ainda, na Circular da Susep de nº 477/2013, Ramo 0775, Capítulo II, Modalidade II - Seguro garantia para construção, fornecimento ou prestação de serviços, Itens 4.1 e 4.2.2, o exposto acarretaria na perda do direito à cobertura securitária. 3) No entanto, vez que, com exceção da ausência de comunicação prévia acerca da expectativa do sinistro, não tenham outros óbices que impediriam a aplicação de multa à Seguradora, pois é hipótese admitida pela Susep e na Nova Lei de Licitações, caso entendido em uma eventual ação judicial que este valor é devido, terá a Seguradora o direito de se sub-rogar nos direitos do Segurado contra o Tomador, com vista na Circular da Susep de nº 477/2013, Capítulo I, Das Condições Gerais, Itens 10 e 10.1. É o parecer. Rio de Janeiro, 22 de abril de 2022. Daniela Clímaco OAB Referências bibliográficas CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO. Decreto Lei nº 10.406/2002. Disponível em: planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em 19 de abril de 2022. DIREITO DO SEGURO E RESSEGURO. 2021. Freitas, João Paulo de Sá e Goldberg, Ilan. Apostila FGV. LEI 8.666 DE 21 DE JUNHO DE 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm. Acesso em 19 de abril de 2022. LEI 14.133 DE 1º DE ABRIL DE 2021. Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14133.htm. Acesso em 19 de abril de 2022. Revista Jurídica de Seguros nº 12/ CNseg, maio de 2020. Disponível em: https://cnseg.org.br/publicacoes/revista-juridica-de-seguros-n-12.html. Acesso em 21 de abril de 2022. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14133.htm https://cnseg.org.br/publicacoes/revista-juridica-de-seguros-n-12.html
Compartilhar