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PALAVRAMUNDO: REFLEXÕES SOBRE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DE LEITURA E ESCRITA NA EJA SORAIA SALES BAPTISTA DA COSTA MACHADO Mª ANGÉLICA DE SOUZA FELINTO Mª DA CONCEIÇÃO ALVES FERREIRA EIXO: 11. EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E PRÁTICAS EDUCATIVAS Resumo O trabalho apresenta como ponto de partida a PALAVRAMUNDO, gerada na perspectiva freireana e propõe refletir sobre práticas pedagógicas no processo de aquisição da leitura e da escrita, buscando abordá-las com a especificidade do olhar necessário ao contexto da EJA. Para tanto, realizou-se uma pesquisa bibliográfica, dentro da concepção de educação construída e defendida por Paulo Freire, no intuito de convocar os educadores da EJA a uma postura mais crítica, consciente e transformadora na sua práxis educativa, pela consciência da sua natureza política e da aquisição da leitura e da escrita em seu caráter emancipatório. Traz algumas informações e reflexões sobre os sujeitos da EJA e o seu contexto, como também estabelece algumas relações com propostas pedagógicas dos teóricos soviéticos Leontiev e Galperin, no intuito de ampliar o olhar e as possibilidades de práticas educativas no contexto da EJA no Brasil. Palavras-chave: Práticas Pedagógicas; Leitura e Escrita; EJA. Abstract The work has as starting point the PALAVRAMUNDO generated in Freire's perspective and proposes to reflect on teaching practices in the acquisition of reading and writing, trying to address them with specific look necessary to the context of adult education. Therefore, we carried out a literature search within the educational concept built and defended by Paulo Freire in order to summon the educators of adult education to a more critical, conscious and transformative in their educational practice, the awareness of their political and reading and writing acquisition in its emancipatory character. Brings some information and reflections on the subject of adult education and its context, but also 19/09/2018 http://anais.educonse.com.br/2016/palavramundo_reflexoes_sobre_praticas_pedagogicas_de_leitura_e_es.pdf Educon, Aracaju, Volume 10, n. 01, p.1-12, set/2016 | www.educonse.com.br/xcoloquio establishes some relationships with educational proposals of the Soviet theorists Leontiev and Galperin, in order to broaden perspectives and possibilities of educational practices in the context of adult education in Brazil. Keywords: Pedagogical Practices; Reading and Writing; EJA. PRIMEIRAS PALAVRAS PALAVRAMUNDO aparece intencionalmente como primeira palavra, como palavra propulsora, pelo entendimento de que, ao Paulo Freire (2011, P. 20) gerá-la, comunica ao mundo (com sua competência verbal singular) seu olhar diferenciado sobre a educação e, neste caso, sobre o processo de aquisição da leitura e da escrita. Como palavra grávida de sentidos, “pronunciando o mundo” explicitou a necessária indissociabilidade entre a palavra e o mundo, a linguagem e a realidade. Sobre essa concepção e ação diferenciada, em sua criticidade, humanidade, historicidade, e sobre seu potencial transformador, este texto busca fazer uma abordagem, embora breve, que explicite aspectos da revolução paradigmática proposta por Freire, ao conceber o processo de aquisição da leitura e da escrita, a alfabetização emancipatória, concebendo a educação de forma ampla, extrapolando o espaço escolar e o seu processo formal, enfatizando seu caráter político e crítico e, sobretudo, a fundamental conscientização dos educadores quanto a seu papel de sujeitos, dentro da impossibilidade de neutralidade na prática educativa. Para um melhor entendimento dessa concepção no âmbito da educação de jovens e adultos, serão refletidos alguns aspectos contextualizadores que favoreçam um olhar mais aproximado dessa realidade e dos seus sujeitos, em suas especificidades e percursos. Na caminhada da pesquisa reflexiva, numa perspectiva interacionista, busca-se estabelecer diálogo com outras abordagens e articular relações e complementações teórico-práticas. Ao final, sem a pretensão de concluir, e sim de abrir-se em um começo de continuidade, pela própria incompletude, inconclusão, inacabamento da humanidade, coloca-se como reflexões algumas inquietações e provocações instigadoras, desejosas de apontar ou convocar as “utopias possíveis” e os” inéditos viáveis” no quadro educacional brasileiro. 2. PALAVRAS CONTEXTUAIS: BUSCANDO SITUAR A EJA E OS SEUS SUJEITOS Voltar-se para a EJA significando dirigir seus sentidos a ela, poderia ser um passo interessante para melhor compreendê-la e, sobretudo, nela atuar. Ao dizer sentidos, poderia explicitar colocando o olhar, a escuta, a percepção, o sentir... e por que não o paladar, o olfato? Afinal, os sentidos nos possibilitam uma melhor apreciação, aproximação e compreensão das coisas, do entorno, do mundo, isto, claro, se feito de forma respeitosa, cuidadosa e com a curiosidade necessária a quem deseja verdadeiramente buscar o saber. Agregar os sentidos, sem necessariamente atribuir maior importância, afirmar a postura pesquisadora, pautada no rigor científico, no compromisso e responsabilidade que tal tarefa exige pela sua complexidade, especificidade e diversidade, exige esforço e esperança. Em se tatando da EJA, envolve reconhecimento e respeito à diversidade de saberes culturais, que conferem identidade à práxis 19/09/2018 http://anais.educonse.com.br/2016/palavramundo_reflexoes_sobre_praticas_pedagogicas_de_leitura_e_es.pdf Educon, Aracaju, Volume 10, n. 01, p.2-12, set/2016 | www.educonse.com.br/xcoloquio educativa que deve ser desenvolvida no processo de formação das pessoas jovens e adultas que retornam ou adentram os espaços escolares. Neste sentido, o Documento Base Nacional preparatório para a VI CONFINTEA, 2008, apresenta no bojo das reflexões os Desafios da Educação de Jovens e Adultos no Brasil, onde se propõe discutir quem são Sujeitos da Educação de Jovens e Adultos, considerando a perspectiva a seguir: Pensar sujeitos da EJA é trabalhar com e na diversidade. A diversidade se constitui das diferenças que distinguem os sujeitos uns dos outros – mulheres, homens, crianças, adolescentes, jovens, adultos, idosos, pessoas com necessidades especiais, indígenas, afrodescendentes, descendentes de portugueses e de outros europeus, de asiáticos, entre outros. A diversidade que constitui a sociedade brasileira abrange jeitos de ser, viver, pensar — que se enfrentam. Entre tensões, entre modos distintos de construir identidades sociais e étnico-raciais e cidadania, os sujeitos da diversidade tentam dialogar entre si, ou pelo menos buscam negociar, a partir de suas diferenças, propostas políticas. Propostas que incluam a todos nas suas especificidades sem, contudo, comprometer a coesão nacional, tampouco o direito garantido pela Constituição de ser diferente. (BSB, 2008). É com esses sujeitos que a EJA precisa ser pensada, construída e reinventada. Sejam educandos ou educadores todos precisam ser partícipes desta proposta e prática educacional, para que ela seja verdadeiramente legítima. Nesta empreitada, que corresponde a um grande desafio, é importante evidenciar os aspectos que expressam as especificidades e demandas a serem consideradas no desenvolvimento de uma convivência educativa que valorize os sujeitos e os saberes construídos em espaços de educação não formais, mas que se constituem lugar social de convivência comunitária e produtor de conhecimento não escolarizado. Segundo Oliveira (1999), para uma melhor compreensão do lugar social desses jovens e adultos, é necessário transitar pela condição de não crianças, a condição de excluídos da escola e a condição de membros de determinados grupos culturais. De fato, considerar esses três âmbitos, poderá representar uma maior aproximação das suas necessidades, inclusive das suas expectativas no retorno aos estudos, com vistas à permanência na escola com sucesso em suas aprendizagens. Di Pierro (2005), em seus estudos sobre a Educação de Jovens e Adultos,discorre sobre a sua origem e trajetória no Brasil, por meio de um aprofundamento que busca contextualizá-la em seu percurso, demarcando a Constituição Federal de 1988 como determinante na garantia 19/09/2018 http://anais.educonse.com.br/2016/palavramundo_reflexoes_sobre_praticas_pedagogicas_de_leitura_e_es.pdf Educon, Aracaju, Volume 10, n. 01, p.3-12, set/2016 | www.educonse.com.br/xcoloquio do direito ao ensino fundamental e gratuito, incluindo a educação de jovens e adultos, além de conferir à escolarização um caráter eminentemente prioritário às políticas públicas. É importante destacar que no percurso histórico da educação brasileira, a EJA, nem sempre foi pensada em sua especificidade e relevância através das políticas públicas. Ao final dos anos 40, foram implementadas no Brasil, as primeiras políticas públicas de educação escolar para adultos, disseminando campanhas de alfabetização por todo o país. Nos anos 50, a educação de adultos, segundo Gadotti (2001, p. 42), era entendida principalmente como educação de base, como desenvolvimento comunitário. Neste cenário surge Paulo Freire entendendo-a como educação libertadora, como “conscientização”, em contraponto à educação entendida como funcional, que primava pelo treinamento de mão de obra mais produtiva, útil ao desenvolvimento nacional dependente (GADOTTI, 2011). E no ínicio da década de 60 que movimentos de educação e cultura popular, ligados a organizações sociais, à Igreja Católica e governos, desenvolveram diversas experiências voltadas à alfabetização de adultos com a proposição de conscientizar os participantes dos seus direitos, analisar criticamente a realidade e nela intervir para transformar as injustiças sociais. Gadotti (2011), ao revisitar a história da EJA no Brasil, destaca, dentre os períodos pesquisados em seus estudos, o ano de 1958, no qual foi realizado o 2º Congresso Nacional de Educação de Adultos, que contou com a participação de Paulo Freire e contribuiu para a ideia de desenvolver um programa permanente de enfrentamento do problema da Alfabetização no Brasil, o que possibilitou a construção do Plano Nacional de Alfabetização de Adultos, dirigido pelo próprio Freire. O Plano Nacional de Alfabetização funcionou durante o periodo de 1 ano e foi extinto em 1964, pelo Golpe do Estado. Na década de 70, o regime militar implantou e conduziu o MOBRAL, tendo como objetivo a sua legitimação, com o sistema educacional direcionado ao atendimento dos interesses hegemônicos, institucionalizando a escolarização básica para jovens e adultos nas redes de ensino, através da Lei 5692/71 (que reformulou o 1º e 2º graus e regulamentou o ensino supletivo). Os estudos de Gadotti e Romão (2011, p. 43), ao problematizar a institucionalização do MOBRAL, afirmam que este foi concebido como um sistema que visava basicamente ao controle da população (sobretudo rural). Para Machado (2008, p. 162), no tocante as legislações deste período histórico, como a Lei 5379, de 1967, 19/09/2018 http://anais.educonse.com.br/2016/palavramundo_reflexoes_sobre_praticas_pedagogicas_de_leitura_e_es.pdf Educon, Aracaju, Volume 10, n. 01, p.4-12, set/2016 | www.educonse.com.br/xcoloquio que criou o Mobral, e a Lei 5692, de 1971, que oficializou o ensino supletivo, ambas correspondem ao período da ditadura militar, e influenciaram na EJA: Deixando o estigma, difícil de ser superado, da oferta compensatória e aligeirada de escolarização. Há, portanto, no imaginário da sociedade brasileira, vários conceitos que se cristalizaram a partir das experiências de Mobral e ensino supletivo como, por exemplo, a ideia de que o aluno jovem e adulto que retorna à escola tem pressa e, por isso, precisa de “um curso rápido e fácil” para receber sua certificação, o que justificaria a oferta de cursos sem muita exigência no processo de avaliação. Outra concepção corrente é a de que os alunos não querem saber de nada, por isso não é necessário se preocupar com a qualidade do que vai ser ofertado; inclusive os mais jovens são os que em geral são tachados de indisciplinados e desinteressados. Há, ainda, aquela ideia de que todos os que passaram pelo Mobral e pelo supletivo - ou estão nos cursos noturnos - são sujeitos com “conhecimentos menores”. (MACHADO, 2008). Para a autora, não se justifica a oferta de uma educação aligeirada e reducionista ao jovem ou adulto que retorna à escola, pretendendo recuperar o tempo perdido. A educação básica precisa primar pelo princípio da igualdade de direito de acesso ao conhecimento produzido pela humanidade, e não pautar-se pelas exigências do mercado, precisa, sobretudo, reconhecer os estudantes da EJA como sujeitos de direito à educação, que trazem consigo saberes construídos na vivência em comunidade - saberes prévios - acumulados ao longo das suas vidas, como verdadeira leitura de mundo que será confrontada com o conhecimento sistematizado, com vistas a sua ampliação no processo produção de novos conhecimentos. Em meados dos anos 80, com o fim do regime militar e a realização das primeiras eleições diretas nas capitais, cria-se um ambiente político cultural favorável ao rompimento do paradigma compensatório e a retomada dos movimentos de educação popular e o desenvolvimento de novas experiências de alfabetização e escolarização de jovens e adultos . Neste contexto histórico de luta em defesa da educação como direito, a atual LDB 9394/96, três décadas depois, ainda se encontra impregnada pela ideia compensatória da educação de jovens e adultos que inspirou o ensino supletivo. A realização da V Conferência Internacional da Educação de Adultos, no ano de 1997, em Hamburgo, proclamou o direito à educação continuada ao longo da vida, quando ainda não havia no Brasil consenso em torno desse paradigma. Com 19/09/2018 http://anais.educonse.com.br/2016/palavramundo_reflexoes_sobre_praticas_pedagogicas_de_leitura_e_es.pdf Educon, Aracaju, Volume 10, n. 01, p.5-12, set/2016 | www.educonse.com.br/xcoloquio a contribuição da educação popular, junto a um contexto de mudanças no pensamento pedagógico, lentamente vem acontecendo a transição das referências na educação de jovens e adultos. Na trajetória dessa contextualizção, vem a convocação da leitura crítica de mundo fundamental aos educadores (e não somente aos educandos), para a compreensão do processo de aquisição da leitura e da escrita e na proposição metodológica, com práticas que, de fato, atendam à realidade da EJA. 3. AQUISIÇÃO DA LEITURA E DA ESCRITA NA PERSPECTIVA DE EDUCAÇÃO DE PAULO FREIRE Muitas provocações poderiam ser apontadas para justificar uma reflexão sobre o processo de aquisição da leitura e da escrita; enquanto pesquisadores em educação, possivelmente, não teremos maior motivo do que a triste e vergonhosa realidade brasileira, com seus altos índices de analfabetismo, que denunciam o fracasso educacional e o direito negado às classes populares (a camada oprimida da nossa sociedade) de acesso ao conhecimento. Diante dessa convocação, na trajetória da pesquisa, propomos então, iniciar pela indagação, tomando emprestado o título de uma obra de Freire: Qual “a importância do ato de ler” (indicotomizável ao ato de escrever) e como essa construção acontece na perspectiva freireana? A importância do ato de ler é respondida no seio da sociedade onde encontramos uma relação de poder entre opressores e oprimidos na qual fica explícito que o acesso ao conhecimento é garantido à classe dominante, perpetuando essa relação desigual. Rodrigues (2011, p.17,18) associa o empoderamento de um povo ao uso cotidiano da leitura e da escrita, no âmbito cultural e social, que lhe possibilita autonomia, principalmente num mundo grafocêntrico, para que possa reescrever o mundo com suas próprias palavras. É necessário ressaltar de que a leitura da qual falamos significa primeiramente a leitura de mundo, que possibilita a legítima leitura da palavra. A leitura crítica da realidadecom força libertadora e emancipatória, vivenciada num processo de alfabetização concebido e articulado tanto como ato cognoscitivo, como ato político. Como também é importante enfatizar que seu processo de aquisição, criticamente contextualizado na realidade, não se resume e nem se esgota na decodificação da palavra escrita, mecanicamente lida, o que corresponderia a uma visão restrita e ingênua do objeto de conhecimento, uma visão errônea do ato de ler. Freire (2011, p. 27) faz uma convocação sobre a necessidade urgente de superação da visão mágica da palavra escrita sem o entendimento de que, como sujeito, deva produzir sua própria palavra. Segundo ele mesmo coloca: [...] numa compreensão crítica do ato de ler, que não se esgota na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem escrita, mas que se antecipa e se alonga na inteligência do mundo. A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da 19/09/2018 http://anais.educonse.com.br/2016/palavramundo_reflexoes_sobre_praticas_pedagogicas_de_leitura_e_es.pdf Educon, Aracaju, Volume 10, n. 01, p.6-12, set/2016 | www.educonse.com.br/xcoloquio continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente. (FREIRE, 2011). E é nesta leitura de mundo que, enquanto sujeito, o educando, que não é tomado como analfabeto, mas alfabetizando, vai percorrendo sua caminhada individual, mas também, essencialmente, coletiva, na aquisição do conhecimento, com criatividade e responsabilidade, construindo seus saberes. Pois, como defendeu Freire (2014, p. 95), ninguém educa ninguém e ninguém se educa sozinho. O educador, como mediador assume uma postura dialógica, interagindo horizontalmente com os educandos na troca de saberes. Ao relatar, sua trajetória enquanto alfabetizando, desde suas primeiras experiências educacionais, Freire reafirma: [...] sempre vi a alfabetização de adultos como um ato político e um ato de conhecimento, por isso mesmo um ato criador. Para mim seria impossível engajar-me num trabalho de memorização mecânica dos ba-be-bi-bo-bu, dos la-le-li-lo-lu. Daí que também não pudesse reduzir a alfabetização ao ensino puro da palavra, das sílabas ou das letras. (FREIRE, 2011) E é na superação desta visão vigente em muitos métodos e propostas aplicadas até então, que em toda a sua obra e sua práxis alertou sobre a ilegitimidade de uma educação mecanicista, “bancária” na qual os educadores fazem seus depósitos e os educandos recebem passivamente, entendendo-se e entendidos como desprovidos de saber, como objetos no processo educativo. Imbuído do desafio de contrapor a mentalidade hegemônica, construiu, segundo Rodrigues (2011, p.16), fundamentos pedagógicos que representaram uma Revolução Paradigmática nos seus conceitos, como também nas suas práticas, como círculos de cultura, os temas/contextos geradores, a mediação pedagógica, a animação cultural, dentre outras, propondo a superação das experiências tradicionais, como também a superação da visão ingênua de suposta neutralidade da educação, por entendê-la como restrita aos aspectos técnicos e científicos. Por ser uma metodologia gerada neste viés revolucionário, traz como sustentáculos a visão dialética, que possibilita o diálogo na diferença e na diversidade, consequentemente, a abordagem dialógica que possibilita as trocas de saberes, garantindo o espaço de fala a todos os sujeitos. Desta forma, uma educação problematizadora vivenciada em processos coletivos, de construção 19/09/2018 http://anais.educonse.com.br/2016/palavramundo_reflexoes_sobre_praticas_pedagogicas_de_leitura_e_es.pdf Educon, Aracaju, Volume 10, n. 01, p.7-12, set/2016 | www.educonse.com.br/xcoloquio coletiva. 4. ARTICULANDO COM OUTRAS PALAVRAS E OUTROS SUJEITOS No entendimento de conhecimento como construção coletiva, dentro da própria concepção freireana, buscaremos neste espaço, fazer algumas interações e articulações com os teóricos soviéticos Leontiev e Galperin, com o intuito de apresentar algumas práticas pedagógicas que possam se entrelaçar com proposições freireanas nas suas intersecções e possam contribuir para a EJA em suas reflexões e possibilidades de ensino e aprendizagem, como também pela ampliação do olhar às articulações possíveis em espaços e tempos diversos. Iniciando esta proposição de diálogo, Núñez (2009, p.64) coloca que Leontiev, considera a atividade humana como o processo que media a relação entre o sujeito e o objeto, numa relação dialética em que ambos se transformam. Sendo a atividade o modo como o homem, especificamente, relaciona-se com o mundo, de forma criativa, num processo de reprodução e transformação. Freire (1983, p.57), concebe que os produtos resultantes da atividade humana, sejam obras materiais ou espirituais, por se desprenderem dele, voltam-se para ele e o marcam, afetando-o, na forma de ser e de agir, como construção cultural. Leontiev também traz em sua concepção, segundo Núñez (2009, p.76), que o sujeito da atividade não é ser isolado, pois está inserido numa rede de relações diversas que estabelece com os outros, podendo ser um indivíduo concreto, um grupo social ou a sociedade no todo, constituindo-se também na sua forma de realizar a ação, como se conscientiza do mundo dependentemente de sua posição social e essências sociais, configurando-se em um sujeito em um contexto social e histórico. Freire (1983, p.36), reflete que na busca da conscientização os sujeitos se apropriam criticamente da posição que ocupam com os demais no mundo, impulsionando-os a assumir seu verdadeiro papel como homens, como sujeitos da transformação do mundo, assim, humanizando-se. Na teoria de Galperin podemos pesquisar algumas contribuições metodológicas significativas para o ensino, baseados em princípios didáticos que regem o processo de ensino/aprendizagem. Dentre vários, destacaremos alguns dos quais estabelecem relação com alguns saberes elencados por Paulo Freire na Pedagogia da Autonomia: • Princípio do caráter científico do ensino - no processo educativo, para o desenvolvimento do aluno, deve pautar-se na educação científica correspondente ao desenvolvimento científico e tecnológico atual, entendendo-o como ferramenta para a cidadania. Na visão freireana: Ensinar exige rigorosidade metódica e pesquisa e curiosidade. Uma das tarefas do educador 19/09/2018 http://anais.educonse.com.br/2016/palavramundo_reflexoes_sobre_praticas_pedagogicas_de_leitura_e_es.pdf Educon, Aracaju, Volume 10, n. 01, p.8-12, set/2016 | www.educonse.com.br/xcoloquio é trabalhar com os educandos essa rigorosidade para maior aproximação com os objetos cognoscíveis, como também a construção da postura de pesquisador, para constatação e intervenção no mundo com curiosidade epistemológica. • Princípio do caráter consciente - a apropriação dos conteúdos na aprendizagem deve acontecer num processo consciente, para promover a auto regulação por sua vinculação à reflexão e a ação dos sujeitos que não o recebem pronto. Na visão freireana: Ensinar exige reflexão crítica sobre a prática, e tomada consciente de decisões. O pensar certo é essencial para a superação do saber ingênuo, precisa ser construído pelo aprendiz com o educador, no movimento dinâmico e dialético entre o fazer e o pensar e o pensar e o fazer, para que possa fazer sua intervenção no mundo, como sujeitos, suplantando a visão ingênua de neutralidade. • Princípio da vinculação da aprendizagem com a vida - para que o conteúdo escolar tenha vida é necessário que esteja vinculado às questões vitais da sociedade, pois é para ela que a escola deve se direcionar, não por uma prática vazia. Precisa vincular o que se ensina na escola à própria experiência e visão de mundo dos sujeitos. Na visão freireana: Ensinar exige apreensão da realidade e o reconhecimento e assunção da identidade cultural. A capacidade de apreender a substantividade do objeto aprendido ocorre namedida em que o aprendiz interage com o objeto do conhecimento como sujeito crítico, epistemologicamente curioso, participando verdadeiramente da construção desse conhecimento, não como uma trasferência do educador para ele. Como também, é necessário na prática educativa, proporcionar aos educandos na vivência coletiva a experiência de assumir-se na sua identidade cultural, para que sua posição na vida, no mundo seja mais consciente. Outras intersecções e complementações seriam possíveis. Podemos na ampliação do olhar e demais sentidos, fazer articulações em rede em diversos espaços com diferentes sujeitos, constantando possibilidades de contínuas trocas de saberes e fazeres na busca de um fazer melhor. Segundo Freire: A alfabetização se faz, então, um quefazer global, que envolve os alfabetizandos em suas relações com o mundo e com os outros. Mas, ao fazer-se esse quefazer global, fundado na prática social dos alfabetizandos, contribui-se para que estes se assumam como seres do quefazer da práxis. (FREIRE, 2011, p.27) E, na perspectiva de cidadania planetária, colocamo-nos conscientes de que os saberes coletivos entrelaçados e articulados podem transformar o mundo. NA INCOMPLETUDE, PALAVRAS INSTIGADORAS 19/09/2018 http://anais.educonse.com.br/2016/palavramundo_reflexoes_sobre_praticas_pedagogicas_de_leitura_e_es.pdf Educon, Aracaju, Volume 10, n. 01, p.9-12, set/2016 | www.educonse.com.br/xcoloquio Gosto de ser gente [...] porque mudar o mundo é tão difícil quanto possível. É a relação entre a dificuldade e a posibilidade de mudar o mundo que coloca a questão da importância do papel da consciência na história, a questão da decisão, da opção, a questão da ética e da educação e de seus limites. (FREIRE, 2014, p. 43, 44) Sem a pretensão das certezas e das verdades, no curto trajeto da pesquisa realizada para a elaboração deste texto, mais uma vez nos pautamos em Paulo Freire para renovar nossa utopia de superação das realidades injustas. A reflexão sobre práticas pedagógicas voltadas para o processo de aquisição da leitura e da escrita, adquirem sentido se articuladas na visão de uma educação critica e libertadora; se sustentadas na verdadeira crença de que a realidade posta tem a possibilidade de ser transformada. Na rejeição de qualquer visão ingênua ou acomodada, mas na clareza de que na conscientização de sua historicidade, os sujeitos do mundo, numa articulação coletiva, podem transformá-lo. E, sem dúvida, diante dos nossos índices de analfabetismo no Brasil e no mundo, entendemos ser uma questão da decisão, da opção, movida pela questão da ética, com a consciência do papel da educação e de seus limites, como também da possibilidade de extrapolá-los e assim, na proposição freireana (2011, p.34), “transformar situação-limite em inédito viável”. REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. Documento nacional preparatório a VI Conferência Internacional de Educação de Adultos (VI CONFINTEA). Brasília, DF: MEC; 2008. Disponível em http:// portal.mec.gov.br /arquivos/pdf/documento_final.pdf . DI PIERRO, Maria Clara. Notas sobre a Redefinição da Identidade e das Políticas Públicas de Educação de Jovens e Adultos no Brasil. Educ. Soc, Campinas, vol.26, n.92, Especial- Out. 2005. Disponível em http:// www. cedes.unicamp.br . Acesso em 11 de junho de 2016. FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 2011, 51ªed.São Paulo:Cortez 19/09/2018 http://anais.educonse.com.br/2016/palavramundo_reflexoes_sobre_praticas_pedagogicas_de_leitura_e_es.pdf Educon, Aracaju, Volume 10, n. 01, p.10-12, set/2016 | www.educonse.com.br/xcoloquio _____. Ação cultural para a liberdade e outros escritos. 2011,14 ed.rev.atual.Rio de Janeiro:Paz e Terra. _____. Educação e Mudança.1983, 8ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra. _____. Extensão ou Comunicação? 1983,7ª ed. Rio de Janeiro: PAz e Terra. _____. Pedagogia do Oprimido. 2014, 56ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Paz e Terra. _____. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 2013, 47ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra. _____. Pedagogia da Indignação. 2014. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra. GADOTTI M.; ROMÃO, J. E. Educação de jovens e adultos: teoria, prática e proposta. 12.ed. São Paulo: Cortez, 2011. MACHADO, M. M. Formação de Professores para EJA: uma perspectiva de mudança. Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 2, n. 2-3, p. 161-174, jan./dez. 2008. NÚÑEZ, Isauro Beltrán. Vygotsky, Leontiev, Galperin: Formação de conceitos e princípios didáticos. Brasília: Liber Livro, 2009. OLIVEIRA, Martha Kohl de. Jovens e adultos como sujeitos de conhecimento e aprendizagem. Trabalho apresentado na XXII Reunião Anual da ANPED. Caxambu, setembro de 1999. Revista Brasileira de Educação- Set/Out/Nov/Dez Nº12 ROMÃO, J. Eustáquio. RODRIGUES, V. Lane. Paulo Freire e a educação de adultos: teoria e práticas. São Paulo: IPF; Brasília; Liber Livro. Soraia Sales Baptista da Costa Machado* - Mestranda em Educação de Jovens e Adultos, Coordenadora da Rede Municipal de Educação de Salvador em EJA, Graduada em Pedagogia, Especialização em Metodologia do Ensino Superior. Email: sosales21@gmail.com . Mª Angélica de Souza Felinto** - Professora da Rede Municipal de Educação e Mestranda em Educação de Jovens e Adultos da Universidade do Estado da Bahia. UNEB. Grupo de Pesquisa – Gestão, Organização e Políticas Públicas em Educação – CNPQ. Email: angelicafelinto@hotmail.com . Mª da Conceição Alves Ferreira*** - Doutora em Educação, Mestre em Educação, Especialista em Gestão Educacional, Psicopedagoga escolar, Graduada em Pedagogia, Professora adjunta da Universidade do Estado da Bahia, professora e pesquisadora do Mestrado Profissional em Educação de Jovens e Adultos da UNEB. Grupo de Pesquisa – DUFOP. Email: 19/09/2018 http://anais.educonse.com.br/2016/palavramundo_reflexoes_sobre_praticas_pedagogicas_de_leitura_e_es.pdf Educon, Aracaju, Volume 10, n. 01, p.11-12, set/2016 | www.educonse.com.br/xcoloquio consinha@terra.com .br . Recebido em: 05/07/2016 Aprovado em: 06/07/2016 Editor Responsável: Veleida Anahi / Bernard Charlort Metodo de Avaliação: Double Blind Review E-ISSN:1982-3657 Doi: 19/09/2018 http://anais.educonse.com.br/2016/palavramundo_reflexoes_sobre_praticas_pedagogicas_de_leitura_e_es.pdf Educon, Aracaju, Volume 10, n. 01, p.12-12, set/2016 | www.educonse.com.br/xcoloquio
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