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See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.net/publication/352159952 Desenvolvimento da Criança: família, escola e saúde Book · September 2017 DOI: 10.7436/2017.dcfes.0 CITATIONS 8 READS 4,516 2 authors: Some of the authors of this publication are also working on these related projects: Fisioterapia View project Atividade física precoce: proposta de acompanhamento e intervençao em programa de estimulação precoce e fisioterapia aquática em bebês típicos e em risco ao desenvolvimento View project Luize Bueno Universidade Federal do Paraná 42 PUBLICATIONS 118 CITATIONS SEE PROFILE Vera Lúcia Israel Universidade Federal do Paraná 125 PUBLICATIONS 475 CITATIONS SEE PROFILE All content following this page was uploaded by Luize Bueno on 05 June 2021. 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Digital Object Identifier (DOI): 10.7436/2017.dcfes.0 PROIBIDA A COMERCIALIZAÇÃO Ilustrações dos caṕıtulos: Henrique Martins Schmidt Capa: Sérgio Alexandre Prokofiev Projeto gráfico e editoração: Omnipax Editora Ltda Ficha catalográfica: Juliana Farias Motta (CRB7/5880) Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) D451 Desenvolvimento da criança : famı́lia, escola e saúde / Editores Luize Bueno de Araujo; Vera Lúcia Israel. — Curitiba, PR: Omnipax, 2017 170 p. Inclui referências eISBN: 978-85-64619-19-7 ISBN: 978-85-64619-22-7 1. Crianças – Desenvolvimento. 2. Capacidade motora em crianças. 3. Saúde I. Araujo, Luize Bueno (ed.). II. Israel, Vera Lúcia (ed.). III. T́ıtulo CDD (22. ed.) 152.38 http://www.omnipax.com.br http://www.omnipax.com.br http://dx.doi.org/10.7436/2017.dcfes.0 Organizadores Luize Bueno de Araujo: Doutoranda em Atividade F́ısica e Saúde pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre em Comportamento Motor pelo Programa de Pós-Graduação em Educação F́ısica da UFPR (2013). Graduação em Fisioterapia pela UFPR (2010) e aperfeiçoamento em Reabilitação F́ısica na Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD) (2014). Tem experiência na docência, foi professora substituta do curso de Fisioterapia da UFPR (2011–2013). Atuou como orientadora e tutora à distância no Curso de Especialização em Gênero e Diversidade na Escola (UFPR) (2014–2016). Tem experiência na área de Fisioterapia, com ênfase em Neuropediatria, Fisioterapia Neurofuncional e Fisioterapia Aquática. Atualmente atua como docente do Curso de Fisioterapia da Faculdade Jangada – Instituto Educacional Santa Catarina e fisioterapeuta neurofuncional adulto e pediátrico da Fisioform – Cĺınica de Fisioterapia e Reabilitação Ltda. Link para o curŕıculo Lattes: http://lattes.cnpq.br/ 3039300334535258 Vera Lúcia Israel: Graduação em Fisioterapia pela Pontif́ıcia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e em Educação F́ısica pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestrado e doutorado no Programa de Pós- Graduação em Educação Especial da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar, SP). Pós-doutorado no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA) na Universidade Federal de Sergipe (UFS). Docente do Curso de Fisioterapia e do Programa de Pós-Graduação em Educação F́ısica da UFPR. Link para o curŕıculo Lattes: http://lattes.cnpq.br/1564269877369119 http://lattes.cnpq.br/3039300334535258 http://lattes.cnpq.br/3039300334535258 http://lattes.cnpq.br/1564269877369119 . Colaboradores Adriano Zanardi da Silva: Graduação em Fisioterapia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestrado em andamento pelo Programa de Pós-Graduação em Educação F́ısica da UFPR, linha de Pesquisa Atividade F́ısica e Saúde. Bruna Yamaguchi: Graduação em Fisioterapia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestrado no Programa de Pós-Graduação em Educação F́ısica da UFPR. Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Educação F́ısica da UFPR. Fisioterapeuta do munićıpio de Tijucas do Sul, PR. Henrique Martins Schmidt: Acadêmico de Especialização em Fisioterapia Traumato-Ortopédica Funcional pela Universidade Positivo (UP). Graduado em Fisioterapia pela UniversidadeCampos Andrade (UNIANDRADE). Autor das ilustrações utilizadas em caṕıtulos desse livro. As ilustrações podem ser utilizadas desde que citado o ilustrador e a referida fonte. Jheniffer Freitas: Acadêmica de Especialização em Fisioterapia em Neurofuncional (IBRATE). Graduada em Fisioterapia pela Universidade Campos Andrade (UNIANDRADE). Formação no Conceito Bobath, e Pediasuitr. Fisioterapeuta do Centro de Pesquisa Vitória (Curitiba, PR). Karina Fink: Pós-graduada em Fisioterapia em Neurologia com ênfase em Neuropediatria pelo Instituto Brasileiro de Therapias e Ensino (IBRATE). Formação no Conceito Neuroevolutivo de Bobath. Aperfeiçoamento em Fisioterapia Pediátrica pelo Hospital Pequeno Pŕıncipe. Fisioterapeuta contratada pela Unidade de saúde Mãe Curitibana, equipe bebê de risco. Fisioterapeuta da equipe de Home- Care da Unifisio. Graduada em Fisioterapia pela Unidade de Ensino Superior Vale do Iguaçu (UNIGUAÇU), União da Vitória, PR. . Manoela de Paula Ferreira: Doutoranda em Atividade F́ısica em Saúde pelo Programa de Pós-graduação em Educação F́ısica da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Mestre em Atividade F́ısica e Saúde pela UFPR, Fisioterapeuta pela UFPR. Bacharel em Dança pela Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR). É Fisioterapeuta e Preceptora de Fisioterapia da Fundação Estatal de Atenção Especializada em Saúde de Curitiba (FEAES). Tem formação em Pilates solo e acessórios, Microfisioterapia e Bioalinhamento. Maria de Fátima Minetto: Psicóloga, Doutora em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina. Professora Adjunta do Departamento de Teoria e Fundamentos da Educação da UFPR e do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPR, na linha de pesquisa Cognição, Aprendizagem e Desenvolvimento Humano. Mariana Rodrigues Gaspar Corrêa: Fisioterapeuta formada pela Universidade Federal do Paraná, Pós- Graduada em Terapia Manual e Postural aplicada à Ortopedia e Traumatologia – Ibrate. Nelly Narcizo de Souza: Pedagoga, Doutora em Educação pela Universidade Federal do Paraná. Professora Assistente e Coordenadora dos cursos de Pós Graduação lato sensu em Neuropsicologia Educacional e em Desenvolvimento Infantil na Universidade Positivo. Tainá Ribas Mélo: Doutoranda em Atividade F́ısica e Saúde pelo Departamento de Educação F́ısica da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Mestre em Comportamento Motor (UFPR), Especialista em Intervenção em Neuropediatria pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar, SP). Graduada em Fisioterapia pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste). Formação no Conceito Bobath, Método Isostretching e Pediasuitr. Fisioterapeuta da Secretaria Municipal de Saúde da Prefeitura de Paranaguá. Docente do Curso de Fisioterapia da Uniandrade. Docente e tutora do Curso de Especialização em Gênero e Diversidade na Escola/UFPR. Preceptora do Projeto PET Redes de Atenção às PcD/UFPR. Docente do curso de especialização em neurologia com ênfase em neuropediatria do IBRATE. Prefácio . Aprender a aprender sempre e a cada momento, desde o momento em que fomos gerados. Na infância constrúımos nossos alicerces baseados num percurso árduo de experiências e emoções com movimentos e sensações, a cada dia novos desafios para alcançar a felicidade e a plenitude de crescimento e desenvolvimento na busca de nossa saúde f́ısica, emocional, espiritual, afetiva, psicológica, mental, intelectual, cognitiva e na diversidade de ambientes e processos. Este é o desenvolvimento humano no decorrer da vida. Interações mãe/pai/bebê, famı́lia/comunidade, meio ambiente/ natureza/pessoas, famı́lia/escola, famı́lia/criança/escola, meio social e os profissionais de diferentes áreas de conhecimento em especial da saúde e da educação. Nossa construção de vida perpassa sim todos estes meios e vivências. Teorias e práticas nos envolvem e levam a evolução de novas etapas de desenvolvimento. Assim, esse livro articulou com essas diversas interações e experiências em busca da evolução. Na sequência apresentamos uma śıntese de cada caṕıtulo da obra que o leitor encontrará. No Caṕıtulo 1 “Como é o processo desenvolvimento da criança nos primeiros 2 anos de idade?” as autoras percorrem os conceitos básicos sobre a criança e seu desenvolvimento neuromotor discutindo o paradigma contextual na faixa etária de 0 a 2 anos de idade. Como o cérebro consegue por meio da neuroplasticidade junto às experiências do movimento corporal da criança pequena favorecer o crescimento e a evolução de suas habilidades motoras. Revisando os fatores positivos e negativos que interferem no desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM) e fornecendo dicas de estimulação por meio de brincadeiras nos primeiros anos de vida da criança. Já no Caṕıtulo 2 “Interações neuromotoras da criança: indiv́ıduo, ambiente e tarefa” são discutidos aspectos da atuação da Fisioterapia favorecendo a promoção e prevenção da saúde da criança. É relatado um projeto que avaliou fatores neuropsicomotores de mais de 400 crianças de 0 a 5 anos, na rede pública de ensino no litoral. E são discutidos o DNPM na infância e suas mudanças que são cont́ınuas, progressivas e complexas nas capacidades funcionais do movimento corporal, da cognição e da afetividade. Além de propor a aproximação entre famı́lia, escola e profissionais da educação e da saúde, com intervenções formativas e de contextos psicomotores para cada parte envolvida no desenvolvimento infantil. No Caṕıtulo 3, “Para fazer um laço é necessário unir as pontas...”, o desenvolvimento motor infantil é apresentado como fruto da interação e envolvimento entre famı́lia e escola. A adequação de ambientes e das tarefas para a estimulação adequada é descrito como parte de um projeto acadêmico desenvolvido nas escolas de educação infantil do litoral paranaense. É apresentado o modelo de Newell como meio de entender o desenvolvido da criança pequena e suas relações nesta fase da infância. Além das autoras descreverem aspectos de modelos biomédico e biopsicossocial correlacionando-os nos sistema único de saúde, são apresentadas estratégias da Organização Mundial de Saúde para o cuidado e acompanhamento da criança e descritos exemplos usados no projeto desenvolvido na educação infantil para unir as pontas Famı́lia–Escola = Laço. Para englobar as informações do desenvolvimento infantil no Caṕıtulo 4 é apresentado o projeto “Geoprocessamento como instrumento no processo fisioterapêutico no cuidado da criança”. Assim, pode-se traçar o perfil do usuário (criança e famı́lia) da escola de educação infantil e traçar metas e ações na gestão municipal, estadual e federal de aprimoramento da mesma. Levantamentos são feitos em relação ao número de habitantes, renda, escolaridade, doenças, preferências, etc., por meio de dados mapeados em sistemas digitais. São apresentados conceitos básicos de georreferenciamento como de análise e avaliação de riscos à saúde coletiva e geoprocessamento como técnica de coleta, tratamento e exibição de informações referenciadas em um determinado espaço geográfico. Finalmente se discute por meio de dados do projeto realizado como a Fisioterapia pode se utilizar desta ferramenta para produzir informações em saúde da criança. O objetivo do Caṕıtulo 5 é revisar e atualizar os principais recursos, técnicas e métodos da Fisioterapia neurofuncional aplicada à infância buscando evidências conhecidas e atualizadas sobre seus efeitos em crianças. O t́ıtulo “Fisioterapia neurofuncional: atualização de intervenções na infância” traz a experiência localizada na literatura da área e a contribuição de diferentes profissionais fisioterapeutas que produzem categorias de atenção em Fisioterapia esquematizando os achados quanto a cinesioterapia, métodos integrativos e recursos auxiliares adicionais. Isto permitirá ao leitorrevisar ou conhecer conceitos, objetivos terapêuticos e funcionais e resultados da Fisioterapia neurofuncional na infância, bem como novas estratégias e ou tentativas de promover, prevenir e reabilitar saúde integral da criança nos diferentes ńıveis. No Caṕıtulo 6 “Mı́dias: amigas ou vilãs? qual a influência sobre o desenvolvimento das crianças?” as autoras descrevem aspectos históricos de modelos de cuidar e/ou educar na infância, apresentando os ambientes da famı́lia e escola com a presença de mı́dias que interferem no DNPM da criança pequena. É resultado de um estudo que buscou entender a influência da tecnologia da informação e mı́dias no desenvolvimento infantil. São apresentados os dados obtidos da literatura da área e correlaciona-se os cenários da infância com as recomendações de profissionais e associações sobre como a famı́lia deve usar ou permitir o uso das mı́dias pela criança pequena e os resultados e efeitos das mesmas no desenvolvimento da criança. Além de descrever os benéficos do brincar com a criança inclusive usando a tecnologia, tanto junto à famı́lia como na escola. “Endireite essas costas menin@! Verdades e mitos sobre o desenvolvimento postural na infância” é tratado no Caṕıtulo 7. Orientações e dicas para diminuir dúvidas e angústias dos profissionais e familiares a respeito da postura da sua criança e do impacto que essas alterações podem ter no DNPM. É descrito um estudo de revisão sobre desenvolvimento postural do recém-nascido até a adolescência, revisando conceitos básicos sobre formação da coluna vertebral e outras estruturas corporais e como junto com o crescimento da criança como ocorre os aspectos destas mudanças ao longo da infância. Destacando uso de mochilas, tablets, celulares, entre outras tecnologias que podem afetar a postura e consequentemente os movimentos da criança e do adolescente. Prevenir fatores negativos no desenvolvimento postural depende da orientação e observação familiar quanto a sinais de alerta e quando em dúvida procurar profissionais da saúde, em especial educação em saúde feita por fisioterapeutas. O Caṕıtulo 8 discute o “O paradigma inclusivo e a educação infantil: qualidade no atendimento e promoção do desenvolvimento”, abordando a Lei no 13.146/2015 sobre a inclusão da pessoa com deficiência e sua relação de atuação junto à escola e a famı́lia. Descrevem-se interações históricas da Educação Infantil e suas Diretrizes Curriculares Nacionais e as poĺıticas de inclusão e os desafios nacionais para que de fato haja sucesso neste processo de inclusão, desde a formação do professor até o envolvimento da escola e da comunidade com dicas práticas. No Caṕıtulo 9 “Vivendo em sociedade: a inclusão e a valorização do diferente”, são apresentados e revisitados conceitos de inclusão educacional e os relatos e experiências da atuação da Fisioterapia e processos de inclusão de crianças especiais. Correlaciona os diferentes tipos de deficiências e dicas de estimulação, bem como apresenta conceito biopsicossocial do modelo da Organização Mundial de Saúde (OMS) denominado Classificação Internacional da Funcionalidade (CIF) desenvolvendo uma sistematização das restrições do modelo contextual (ecológico ou sistêmico) com a tŕıade pessoa com deficiência (PcD), acessibilidade e tarefas educacionais para a busca da educação em saúde no desenvolvimento desta pessoa com deficiência. Há o cuidado de demonstrar exemplos práticos e dicas de atitudes, serviços e tecnologias assistivas para facilitar o cotidiano desta PcD. Finalmente, as autoras apresentam dados e exemplos práticos de um projeto do laboratório do núcleo de atenção à pessoa com deficiência (LABNAPNE) desenvolvido Na Universidade Federal do Paraná no litoral entre 2007 e 2012. Que profissionais, familiares, educadores, gestores e estudantes possam aproveitar os relatos feitos nesta construção teórica que está fechando um ciclo histórico de vivências e aprendizados no litoral paranaense, com algumas contribuições de pesquisadores de outras cidades. Sejam Felizes!! Luize Bueno de Araujo Vera Lúcia Israel Capítulos 1 Como é o processo de desenvolvimento da criança nos primeiros 2 anos de idade? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1 Luize Bueno de Araujo e Vera Lúcia Israel 2 Interações neuromotoras da criança: indiv́ıduo, ambiente e tarefa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 Bruna Yamaguchi e Vera Lúcia Israel 3 Para fazer um laço é necessário unir as pontas... envolvimento entre famı́lia e escola . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 Mariana Rodrigues Gaspar Corrêa, Luize Bueno de Araujo e Vera Lúcia Israel 4 Geoprocessamento como instrumento ou indicador no processo fisioterapêutico no cuidado da criança . . . . . . . . . . . . . . . 41 Adriano Zanardi da Silva, Luize Bueno de Araujo e Vera Lúcia Israel 5 Fisioterapia neurofuncional: atualização de intervenções na infância . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 Tainá Ribas Mélo, Manoela de Paula Ferreira, Bruna Yamaguchi, Vera Lúcia Israel e Luize Bueno de Araujo 6 Mı́dias: amigas ou vilãs? Qual a influência sobre o desenvolvimento das crianças? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89 Tainá Ribas Mélo e Karina Fink 7 “Endireite essas costas menin@!” verdades e mitos sobre o desenvolvimento postural na infância . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 107 Tainá Ribas Mélo, Jheniffer Freitas e Henrique Martins Schmidt 8 O paradigma inclusivo e a educação infantil: qualidade no atendimento e promoção do desenvolvimento . . . . . . . . . . . . . . 129 Nelly Narciso de Souza e Maria de Fátima Minetto 9 Vivendo em sociedade: a inclusão e a valorização do diferente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151 Manoela de Paula Ferreira, Tainá Ribas Mélo e Vera Lúcia Israel . Capítulo 1 Como é o Processo de Desenvolvimento da Criança nos Primeiros 2 Anos de Idade? Luize Bueno de Araujo∗ e Vera Lúcia Israel 1. Introdução Você já ouviu falar que os dois primeiros anos de uma criança são essenciais para seu desenvolvimento? Mas e áı? O que esperamos de uma criança nesta faixa etária? O que é posśıvel fazer para otimizar esta fase cŕıtica do desenvolvimento? Estas são dúvidas de muitas famı́lias e profissionais que trabalham com a criança pequena. Muitas pessoas ainda acreditam que o recém-nascido responde exclusivamente de forma reflexa e automática, porém é necessário ter uma visão contextual sobre o desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM), entender que nesta fase a criança possui potenciais e que suas capacidades e habilidades estão em amadurecimento. Para que esta evolução aconteça de forma saudável e que o DNPM seja pleno, deve-se lembrar de que esta criança recebe influências dos ambientes em que vive e dos est́ımulos ofertados e vivenciados por ela. Dessa forma, o objetivo deste caṕıtulo é abordar o DNPM da criança desde o seu nascimento até os dois anos de idade, destacando o que é esperado no desenvolvimento t́ıpico, bem como as formas de estimulação. 2. O Que é Desenvolvimento Neuropsicomotor? Estudiosos utilizam diferentes denominações e conceitos teóricos sobre o DNPM, como desenvolvimento motor normal, desenvolvimento motor t́ıpico, desenvolvimento neurossensoriomotor, desenvolvimento neuropsicomotor, entre outras nomenclaturas (Castilho-Weinert & Forti- Bellani, 2011). Neste caṕıtulo será utilizado o termo desenvolvimento neuropsicomotor t́ıpico. O DNPM é definido como um processo sequencial, cont́ınuo e relacionado à idade cronológica, porém não depende única e exclusivamente dela. Com opassar dos meses e dos anos, por meio da estimulação ∗Autor para contato: luizebueno@hotmail.com Luize Bueno de Araujo & Vera Lúcia Israel (Ed.), (2017) DOI: 10.7436/2017.dcfes.01 ISBN 978-85-64619-19-7 luizebueno@hotmail.com 2 Araujo & Israel da famı́lia e do ambiente, a criança adquire uma enorme quantidade de habilidades motoras, que progridem de movimentos simples, denominados de reflexos, até a execução de habilidades motoras altamente complexas, que compreendem os movimentos voluntários que usa no dia-a-dia (Haywood & Getchell, 2010). Como exemplo, até os primeiros dois meses de idade, quando o bebê é colocado em pé com apoio do tronco e se realiza uma flexão anterior do tronco, ele vai responder reflexamente com alguns passos, é o chamado reflexo da marcha automática, já por volta dos 12 aos 15 meses a criança t́ıpica tem um repertório motor mais complexo e condições neuro-músculo- esqueléticas para adquirir a marcha independente. É necessário destacar que o DNPM tem interação direta com a neuroplasticidade do cérebro e com isto tem relações com os aspectos motores, cognitivos, afetivos, sensoriais e socioambientais. A área motora do cérebro da criança analisa a produção e regulação do movimento, a área cognitiva estuda as implicações da estruturação do pensamento para o movimento e a área afetiva procura compreender como as emoções interferem nos movimentos (Israel & Bertoldi, 2000). A informação sensorial é uma resposta enviada ao sistema nervoso do ser humano e serve como feedback para moldar o movimento e planejar sua execução. Porém se destaca que, apesar das áreas trabalharem em conjunto para a execução dos movimentos, não quer dizer que uma criança que tem uma deficiência f́ısico/motora tenha, por exemplo, uma deficiência auditiva, ou que uma criança com dificuldade na linguagem tenha uma deficiência intelectual. Portanto, a criança nunca deve ser subestimada por estar em uma cadeira de rodas ou por ter alguma dificuldade de expressão, sempre procure estimular seus potenciais neuromotores e cognitivo-afetivos. Por exemplo, uma criança que nasceu com cegueira pode demorar mais tempo para adquirir a marcha independente do que uma criança com visão ı́ntegra, mesmo que seu sistema neuro-músculo-esquelético esteja intacto. Isso acontece porque ela terá uma privação sensorial relacionada com o sistema visual, assim, os outros sistemas do seu corpo irão sofrer ajustes e adaptações para suprir esta necessidade da visão, portanto, esta criança precisa de uma maior variedade de est́ımulos. Atualmente o olhar para a saúde é mais complexo, explicado pelo modelo contextual, também conhecido como ecológico ou sistêmico, ao considerar o ser humano de modo biopsicossocial. Este é o modelo da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) (Organização Mundial da Saúde, 2015) que busca uma abordagem da saúde integral, considerando desde a questão da condição de saúde, enquanto aspectos funcionais e até mesmo espirituais. Na Figura 1, observa-se que para integrar estes conceitos entre o desenvolvimento infantil e a CIF se tem hoje a CIF – Crianças e Jovens (CIF-CJ), a qual destaca que o DNPM depende de relações da criança com O processo de desenvolvimento da criança 3 Figura 1. Modelo da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF). Fonte: (Organização Mundial da Saúde, 2015, p. 20). o meio ambiente e a influência dos est́ımulos oferecidos, ou seja, influências contextuais e/ou ambientais (Silva et al., 2016). A teoria dos sistemas dinâmicos (Newell et al., 2003), mais aceita atualmente como parte do paradigma contextual, aponta que o comportamento motor não é influenciado apenas pelo sistema nervoso do ser humano, mas também por outros fatores, como os psicológicos e os ambientais; assim, baseia-se na tŕıade indiv́ıduo, ambiente e tarefa (Haywood & Getchell, 2010). Com esta perspectiva fica claro o entendimento de quais são os fatores que influenciam o DNPM da criança. 3. Quais Fatores Influenciam no Desenvolvimento Neuropsicomotor? Até aqui foi posśıvel compreender o que é o DNPM em sua complexidade, bem como a influência de diversos fatores durante os primeiros anos da criança. Quando observamos o DNPM de uma criança, é necessário identificar quais fatores prejudicam e quais fatores potencializam o seu desenvolvimento. Os primeiros anos de vida são fundamentais para o desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM), pois é neste peŕıodo que as crianças estão propensas a sofrer influências de fatores protetores ou de risco para um desenvolvimento pleno, que podem levar a repercussões futuras até a vida adulta (Gannotti et al., 2014; Grantham-McGregor et al., 2007). 4 Araujo & Israel De acordo com o Comitê Cient́ıfico do Núcleo Ciência Pela Infância (Núcleo Ciência pela Infância, 2014), um pleno potencial no futuro, quando adultos, está relacionado com uma infância com cuidados de saúde adequados, um ambiente familiar afetivo, seguro e estimulante, bem como uma educação de qualidade. Os fatores que prejudicam ou potencializam o desenvolvimento podem ser decorrentes de fatores inerentes à criança, como aspectos biológicos e de hereditariedade; ao ambiente, como o ńıvel socioeconômico e a escolaridade; ou ainda, relacionados com a estimulação oferecida e experienciada (tarefa), como brincadeiras, movimentos e vivências infantis (Resegue et al., 2008). Diante disso, verifica-se que o estudo do desenvolvimento infantil perpassa várias áreas de conhecimento com diferentes olhares e abordagens teóricas e integra a compreensão das múltiplas dimensões nas quais a criança está inserida. Neste processo devem ser considerados inúmeros fatores associados que podem levar ao atraso no DNPM (Pilz & Schermann, 2007). Halpern & Figueiras (2004) afirmam que os resultados negativos no desenvolvimento são oriundos da combinação de fatores de risco genéticos, biológicos, psicológicos e ambientais e, geralmente, envolvem interações complexas entre eles. Além disso, um ambiente rico em estimulação favorece a aquisição de uma maior variabilidade de movimentos para a criança pequena, principalmente ambientes criativos, que estimulem ou demandem uma variabilidade de estratégias para o controle postural ou para a aquisição de novas habilidades neuromotoras (Silva et al., 2006). Mesmo que uma criança tenha alguma restrição ou deficiência, é necessário que uma grande variedade de est́ımulos e vivências seja ofertada para que ela adote estratégias motoras e assim desenvolva seu repertório motor. Para exemplificar uma prática que prejudica o DNPM, pode-se citar o uso do andador (Figura 2), também conhecido como voador. Atualmente sua venda é proibida, porém ainda se encontra em estabelecimentos comerciais e também como tradição entre famı́lias, ao passar entre primos, parentes e vizinhos. Normalmente o andador é utilizado pela famı́lia como um momento de entretenimento para a criança, sem pensar nas consequências do seu uso. Este dispositivo pula etapas do DNPM, possibilitando que a criança vivencie a postura ortostática e a marcha antes de explorar posturas mais baixas (arrastar e engatinhar) e antes mesmo dos seus sistemas estarem preparados para tal. Além disso, quando a criança está fazendo o uso destes equipamentos, pode alterar o equiĺıbrio corporal e aumentar o número de quedas e o risco de acidentes, como o traumatismo crânio encefálico, queimaduras e afogamentos. Esta vivência da postura e marcha de forma precoce e errada pode trazer consequências até a vida adulta, como alterações de equiĺıbrio e encurtamento musculares, por exemplo. O processo de desenvolvimento da criança 5 Figura 2. Criança fazendo uso do andador: errado. Diante disso, independente do ambiente em que a criança está inserida, seja seu lar, creche, Centro de EducaçãoInfantil ou abrigo, é preciso manter diariamente a atenção e o cuidado associado à estimulação. Os espaços da casa ou da escola/creche devem estar adequados no sentido de proteção e estimulação do processo de desenvolvimento motor, cognitivo, sensorial, emocional e social da criança. Para saber mais sobre a influência da escola no DNPM, bem como a interação com a famı́lia, veja o Caṕıtulo 3 deste livro. 4. O Que Devemos Observar no Desenvolvimento Neuropsicomotor da Criança Pequena? Como foi discutido até aqui, a criança está em processo de desenvolvimento, o qual é aperfeiçoado ao longo do tempo, porém com destaque aos anos iniciais. Para conseguir acompanhar e verificar este processo de desenvolvimento, bem como facilitar esta observação, existem alguns pontos a serem avaliados que estão sistematizados por faixas etárias nas Tabela 1. Observe sua criança, ela é ativa e irá demonstrar se está gostando da atividade ou se está cansada. Respeite a individualidade e vontade da criança, ela também precisa de um tempo para descansar. Lembre que cada criança é única, terá seu tempo e existirá uma variabilidade entre uma criança e outra. Olhe e explore sempre o seu potencial, o que a criança faz de mais avançado, e na dúvida, procure um profissional especializado. 6 Araujo & Israel Tabela 1. Principais Marcos Motores. Fonte: Adaptado de Israel et al. (2014, p.23-25). Idade Marco Motor Dicas Cronológica Recém- nascido ao 1o mês Decúbito ventral (barriga para baixo): permanece em flexão fisiológica, levanta pouco e por pouco tempo a cabeça e a gira para o lado. Decúbito dorsal (barriga para cima): rola parcialmente para o lado. Não apresenta controle de cervical. Posição ortostática (em pé): reflexo de marcha presente e suporta seu peso nos MMII com apoio do tronco. Acompanha objetos em movimento até a linha média, deixa as mãos fechadas, tem movimentos reflexos, com e sem finalidade espećıfica. Mostre objetos coloridos e sonoros para que a criança busque estes objetos. Utilize objetos com diferentes texturas e apresente-os para a criança. Converse com a criança. 2o ao 3o mês Gira a cabeça para todos os lados e chuta em decúbito dorsal. Decúbito ventral: leva a cabeça por curto tempo a 90o, mantém parte do peso sobre os antebraços com o tórax levemente levantado. Sentado: com apoio total e sem controle total da cervical. Posição ortostática: mantém quadris fletidos, suporta pouco peso. Consegue ver objetos mais distantes e os segue com a cabeça a 180o, usa a preensão palmar. Coloque a criança em decúbito ventral com aux́ılio de um rolo no tórax. Em decúbito dorsal ofereça objetos para a criança manipular. Conte estórias. 4o ao 5o mês Passa do decúbito dorsal para o lateral, brinca com os pés. Decúbito ventral: mantém o peso nos MMSS estendidos, arrasta-se. Sentado: flexiona o pescoço para ir para a posição sentada e nesta posição permanece por poucos minutos. Posição ortostática: sustenta o seu peso nos MMII, se apoiado. Segura e solta brinquedos. Com a criança em decúbito dorsal ofereça objetos nas laterais para que ela inicie o rolar. Em decúbito ventral coloque objetos a sua frente para que ela inicie o deslocamento com o arrastar. O processo de desenvolvimento da criança 7 6o ao 7o mês Passa de decúbito dorsal para ventral, se apoia em uma das mãos e pega brinquedos com a outra. Decúbito dorsal: levanta a cabeça. Sentado: senta sozinho. Fica em pé, se apoiado. Engatinha para trás, pega objetos e passa de uma mão para outra. Coloque a criança sentada e ofereça o cesto de tesouros, uma cesta na qual você vai colocar diversos objetos para que a criança explore-os. Selecione os objetos com segurança e adequados para a idade. Fale os nomes dos objetos para a criança. 8o ao 9o mês Prefere o decúbito ventral e fica na posição de engatinhar. Passa da posição sentada para decúbito ventral. Fica em pé e anda se segurando em móveis, senta-se e engatinha para frente. Manipula objetos, aponta, empurra e pega objetos em recipientes. Coloque a criança em ambiente seguro e com espaço para ela iniciar o deslocamento engatinhando. Esconda objetos dentro de recipientes para que a criança pegue-os e manipule- os. 10o ao 11o mês Fica em pé por pouco tempo. Posição ortostática: nesta posição, pega objetos do chão. Anda com apoio nas duas mãos ou em uma. Engatinha. Faz Urso (coloca mãos e pés no chão). Faz pinça (pega objetos e une o polegar ao indicador), coloca objetos em potes. Coloque a criança em pé com apoio em locais seguro. Utilize uma toalha no tórax para dar suporte e a criança iniciar o deslocamento em pé com segurança. 12o ao 15o mês Posição ortostática: anda rápido sem apoio para frente, lado e trás, sobe escadas sentado. Sentado: consegue arremessar objetos. Faz torres de 2 cubos, vira objetos, risca papel. Monte um circuito com obstáculos (colchonetes, espumas) para a criança adotar estratégias motoras e aperfeiçoar o equiĺıbrio. 8 Araujo & Israel 16o ao 24o mês Sobe e desce escadas apoiado em uma mão com os dois pés. Agacha-se. Pega objetos do chão, atira para frente. Impulsiona-se em brinquedos de roda. Dobra papel, faz torre de 6 cubos, segura lápis entre o polegar e os dedos, copia linha horizontal e vertical. Aprimore seu circuito com mais obstáculos. Coloque papel e giz para a criança desenhar. Estimule a criança a falar e não apenas apontar o que ela quer. 2o ano Corre, anda na ponta dos pés, anda para trás, sobe e desce escadas alternando os pés, pula com um pé só. Anda em triciclo, gira fechaduras, abotoa, usa tesouras, monta quebra- cabeça simples, dobra papel. Elabore atividades de pular e ficar em um pé só. Utilize brinquedos de encaixe. Conte histórias e estimule a criança a falar. 5. O Que é Intervenção Precoce? Anteriormente estudamos que o DNPM sofre influência de vários fatores e que devemos enfraquecer os fatores de risco e potencializar os fatores de proteção. A intervenção precoce é um conjunto de atividades e movimentos destinado a proporcionar à criança um desenvolvimento neuromotor e psicocognitivo completo, de forma a utilizar todo o seu potencial. Quanto antes for feita a intervenção da estimulação precoce, preferencialmente nos dois primeiros anos de idade, maiores as chances de prevenir e/ou minimizar atrasos no DNPM, uma vez que é nesse peŕıodo que ocorre com maior velocidade e intensidade a capacidade do sistema nervoso de ampliar e multiplicar suas conexões neurais devido à neuroplasticidade (Blauw- Hospers & Hadders-Algra, 2005; Hallal et al., 2008). A cada dia são mais fortes as evidências cient́ıficas de que os primeiros anos de vida são particularmente formidáveis para o desenvolvimento da criança e representam oportunidades significativas para o crescimento adequado. Descobertas recentes têm demonstrado, convincentemente, que os primeiros anos de vida, desde a gestação, é a fase mais cŕıtica da pessoa no que diz respeito ao seu desenvolvimento biológico, cognitivo, emocional e social (UNICEF, 2001). Isto por que, de acordo com Resegue et al. (2007), nos primeiros anos de vida a intensa neuroplasticidade do cérebro humano é mais acentuada e suscet́ıvel à estimulação. O brincar, seja ao explorar objetos ou interagir com as pessoas, desde os primeiros meses de vida, possibilita que a criança explore sensorialmente O processo de desenvolvimento da criança 9 diferentes objetos, sua forma, interaja com o meio, compreenda ação e reação, que mais tarde terão repercussões nas relações socioafetivas, como na cooperação, autocontrole e negociação, além do est́ımulo à imaginação e criatividade (Núcleo Ciência pela Infância, 2014) Dessa forma, o tempo e o momento de aplicação da intervenção precoce são fatores cŕıticos para o sucesso da estimulação, porém é necessário lembrar que o olharnão deve ser apenas para a criança, mas também para os contextos e ambientes em que a mesma está inserida, ou seja, deve envolver a famı́lia, a escola, os profissionais da saúde e educação e todos os envolvidos com a criança. 6. Dicas de Estimulação Agora já sabemos a importância de estimular e brincar com a criança pequena, mas de que forma podemos fazer isso nas fases iniciais do desenvolvimento? A seguir, apresentamos imagens e descrição de formas simples, de como estimular a criança, que podem ser realizadas em qualquer ambiente e com materiais simples dispońıveis no dia-a-dia. Use sua criatividade e ofereça est́ımulos variados para a criança (Figuras 3 a 14). O movimento serve como possibilidade de desenvolvimento e aprendizagem, possibilite isto a criança de forma segura, supervisionada e com qualidade. Para saber sobre o uso adequado de tecnologias, como tabletes e computadores, leia o Caṕıtulo 6 deste livro. Diante desse caṕıtulo espera-se que os profissionais da saúde e educação, familiares e gestores observem a criança pequena como um ser ativo, em um momento especial e crucial para sua vida futura e, dessa forma, consigam promover uma estimulação adequada e com qualidade para que as crianças cresçam e se desenvolvam da melhor maneira posśıvel e se tornem adultos com o máximo potencial. Figura 3. Coloque seu bebê no colo, estimule a buscar o brinquedo na linha média. Estará desenvolvendo a coordenação óculo-motora. Mantenha o brinquedo de 20 a 30 cm de distância. Utilize brinquedos com luzes e som para estimular os sistemas sensoriais. Aproveite este momento para conversar com a criança. 10 Araujo & Israel Figura 4. Ao deslocar com a criança no colo, carregue-a virada para frente, assim ela irá receber est́ımulos variados do ambiente e interagir com o mesmo. Figura 5. Coloque o bebê em prono (barriga para baixo) e coloque brinquedos que chamem a atenção para ele elevar a cabeça. Assim ele irá fortalecer os músculos da cervical e extensores do tronco. Inicialmente pode fazer um rolo com toalha para colocar abaixo do tórax. Figura 6. Desafie a criança a fazer trocas posturais (mudanças de posturas). Com brinquedos estimule-a a buscar o objeto de forma que realize o rolar. Ofereça os est́ımulos para ambos os lados. Figura 7. Ainda em prono (barriga para baixo) é necessário que a criança explore esta postura, pois assim irá fortalecer os músculos dos membros superiores (braços). E terá ińıcio do deslocamento com o arrastar. O processo de desenvolvimento da criança 11 Figura 8. É necessário deixar a criança em ambiente livre e seguro, no ińıcio ela começará a se arrastar em busca do brinquedo, e com o passar do tempo iniciará o engatinhar. Figura 9. Aos poucos a criança vai se interessar por posturas mais altas, possibilite que a criança passe do chão para em pé com apoio. Aos poucos ela estará mais segura para dar alguns passos na lateral com o apoio das mãos. Figura 10. Após explorar a postura em pé a criança estará preparada para dar os primeiros passos sem apoio. Tudo conforme o seu tempo. Figura 11. Para estimular a criança a caminhar, utilize uma toalha sobre o seu tórax, assim ela estará segura e ao mesmo tempo livre para a execução do andar. 12 Araujo & Israel Figura 12. Utilize as situações do dia-a- dia para a criança se desenvolver. Deixe- a comer com as mãos e tentar se alimentar sozinha, com uma colher. Essa atividade desenvolverá a coordenação manual e possibilita a exploração das texturas, formas, temperatura. Figura 13. A hora do banho também é um momento rico para a estimulação. Pode utilizar brinquedos de ação e reação. Utilize vários est́ımulos, porém ofereça um brinquedo por vez para manter a atenção da criança. Converse e conte histórias para a criança. Figura 14. Deixe a criança explorar diferentes texturas com as mãos, pés ou outras partes do corpo. Como exemplo, espuma de barbear, massinha de modelar, areia, entre outras, sob a supervisão de um adulto. O processo de desenvolvimento da criança 13 Referências Blauw-Hospers, C.H. & Hadders-Algra, M., A systematic review of the effects of early intervention on motor development. Developmental Medicine & Child Neurology, 47(6):421–432, 2005. Castilho-Weinert, L. & Forti-Bellani, C.D. (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria. 1a edição. Omnipax Editora, 2011. Gannotti, M.E.; Christy, J.B.; Heathcock, J.C. & Kolobe, T.H., A path model for evaluating dosing parameters for children with cerebral palsy. Physical Therapy, 94(3):411–421, 2014. Grantham-McGregor, S.; Cheung, Y.B.; Cueto, S.; Glewwe, P.; Richter, L. & Strupp, B., Developmental potential in the first 5 years for children in developing countries. Lancet, 369(9555):60–70, 2007. Hallal, C.Z.; Marques, N.R. & Braccialli, L.M.P., Aquisição de habilidades funcionais na área de mobilidade em crianças atendidas em um programa de estimuação precoce. Revista Brasileira de Crescimento e Desenvolvimento Humano, 18(1):27–34, 2008. Halpern, R. & Figueiras, A.C.M., Environmental influences on child mental health. Journal of Pediatrics, 80(2):104–110, 2004. Haywood, K.M. & Getchell, N., Desenvolvimento Motor ao Longo da Vida. 5a edição. Porto Alegre, RS: Artmed, 2010. Israel, V.L.; Araujo, L.B. & Ferreira, M.P., Estimulação neuropsicomotora na primeira infância: orientações para familiares e educadores. In: Israel, V.L. & Pardo, M.B.L. (Eds.), Desenvolvimento Infantil: Orientação a Pais e Profissionais. Porto Alegre, RS: Redes Editora, 2014. Israel, V.L. & Bertoldi, A.L.S., Deficiência F́ısico-Motora: interface entre educação especial e repertório funcional. Curitiba, PR: IBPEX, 2000. Newell, K.M.; Liu, Y.T. & Mayer-Kress, G., A dynamical systems interpretation of epigenetic landscapes for infant motor development. Infant Behavior & Development, 26(4):449–472, 2003. Núcleo Ciência pela Infância, , O impacto do desenvolvimento na primeira infância sobre a aprendizagem. Dispońıvel na internet em: http://issuu.com/fmcsv/docs/o_impacto_do_desenvolvimento_ na_pri/16?e=3034920/10202608, 2014. Estudo I. Organização Mundial da Saúde, , CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. São Paulo, SP: EDUSP, 2015. Pilz, E.M.L. & Schermann, L.B., Determinantes biológicos e ambientais no desenvolvimento neuropsicomotor em um amostra de crianças de Canoas/RS. Ciência e Saúde Coletiva, 12(1):181–190, 2007. http://issuu.com/fmcsv/docs/o_impacto_do_desenvolvimento_na_pri/16?e=3034920/10202608 http://issuu.com/fmcsv/docs/o_impacto_do_desenvolvimento_na_pri/16?e=3034920/10202608 14 Araujo & Israel Resegue, R.; Puccini, R.F. & Silva, E.M.K., Fatores de risco associados a alterações no desenvolvimento da criança. Pediatria, 29(2):117–128, 2007. Resegue, R.; Puccini, R.F. & Silva, E.M.K., Risk factors associated with developmental abnormalities among high-risk children attended at a multidisciplinary clinic. Sao Paulo Medical Journal, 126(1):4–10, 2008. Silva, A.Z.; Vojciechowski, A.S.; Mélo, T.R.; Yamaguchi, B.; Touchan, A.S.; Bertoldi, A.S. & Israel, V.L., Neuropsychomotor evaluation and functional classification in schoolchildren between the ages of 10 and 12 from the public school system. Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo, 27(1):52–62, 2016. Silva, P.L.; Santos, D.C.C. & Gonçalves, V.M.G., Influência de práticas maternas no desenvolvimento motor de lactentes do 6o ao 12o meses de vida. Revista Brasileira de Fisioterapia, 10(2):225–231, 2006. UNICEF, , Situação da Infância Brasileira – Desenvolvimento Infantil: os seis primeiros anos de vida. Braśılia, DF: Fundo das Nações Unidas para a Infância, 2001. Capítulo 2 Interações Neuromotoras da Criança: Indivíduo, Ambiente e Tarefa Bruna Yamaguchi∗ e Vera Lúcia Israel 1. Introdução A Fisioterapia como ciência do movimento e postura humana é reconhecida historicamente por grande parcela dapopulação pela sua atuação tradicional na reabilitação. Contudo, com os processos de evolução social e cultural houve uma transição das necessidades de atenção em saúde, que trouxeram novas demandas a todos os profissionais da saúde, inclusive na área de saúde da criança. A Fisioterapia tem seu campo de formação e atuação cada vez mais fortalecido e ampliado com atividades que visam à promoção de saúde e a prevenção de doenças (Bispo Júnior, 2010). A intervenção fisioterapêutica, na promoção e prevenção em saúde, ocorre num momento anterior a qualquer sinal ou sintoma de doença, o que pode levar a benef́ıcios dessa assistência como capacitar as pessoas a reconhecer bons hábitos e escolhas para sua saúde, bem como prevenir problemas relacionados à saúde, poupando as pessoas do processo de adoecimento (Pereira, 2014). Dentre os aspectos pasśıveis de promoção e prevenção está a saúde no contexto do desenvolvimento neuropsicomotor das crianças, o que inclui a educação em saúde com orientação de familiares e professores. Para o adequado desenvolvimento na primeira infância, de modo especial, devemos considerar fatores como vacinação, nutrição, condições do ambiente familiar e escolar, estimulação psicomotora, brincadeiras, rotina da criança, vivência cultural, ńıvel educacional e socioeconômico da famı́lia, entre outros, que poderão interferir positiva ou negativamente no desenvolvimento infantil. Nas últimas décadas, houve um maior acompanhamento do desenvolvimento infantil, para a prevenção de posśıveis alterações, o que traz benef́ıcios para toda a vida (Amorim et al., 2009). A verificação do desenvolvimento infantil é parte integrante da atenção da Fisioterapia na saúde infantil e compreende atividades relacionadas à promoção do desenvolvimento neuropsicomotor adequado. ∗Autor para contato: brunayamaguchi@hotmail.com Luize Bueno de Araujo & Vera Lúcia Israel (Ed.), (2017) DOI: 10.7436/2017.dcfes.02 ISBN 978-85-64619-19.7 brunayamaguchi@hotmail.com 16 Yamaguchi & Israel O fisioterapeuta é um dos profissionais responsáveis pela vigilância e estimulação das condições neuropsicomotoras na infância que deverão ser facilitadas de diferentes formas e devido a neuroplasticidade nesta faixa etária deverão permanecer no repertório motor por toda vida. Neste contexto, as famı́lias não terão seu primeiro contato com a Fisioterapia após um acometimento de doença já instalada, mas sim, já na estimulação e cuidados da saúde da criança promovendo a assistência a toda população na busca da qualidade de vida e hábitos saudáveis relacionados de modo particular ao movimento e postura humanas e suas repercussões sistêmicas. Em nossa experiência na avaliação neuropsicomotora de crianças de 0 a 5 anos, na rede pública de ensino, avaliamos e acompanhamos mais de 400 crianças, no litoral do Paraná. Este projeto fez parte das atividades extracurriculares dispońıveis na graduação de Fisioterapia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), setor Litoral, entre 2007 e 2013. Apesar da atividade se caracterizar como atividade de pesquisa, por meio da iniciação cient́ıfica, pôde agregar conhecimentos de ensino e extensão que desenvolveram habilidades e competências necessárias ao fisioterapeuta, possibilitando a inserção da Universidade na comunidade. A interação entre os conhecimentos cient́ıficos da academia e os conhecimentos com a população local levou a promoção de saúde das crianças participantes. A equipe de fisioterapeutas e estudantes do curso de Fisioterapia da UFPR frequentava os ambientes de diferentes Centros de Educação Infantil (CEI) públicos dos munićıpios do litoral do Paraná, com o apoio da Secretaria de Saúde e de Educação das cidades, e a autorização dos responsáveis legais pela criança. Na própria escola aconteciam as avaliações fisioterapêuticas lúdicas, bem como as orientações às famı́lias e professores envolvidos. Essa proximidade entre estudante, criança, professor, famı́lias e gestores com a prática na avaliação infantil da Fisioterapia, aliado com os estudos sobre o tema, nos trouxeram conhecimentos que agora buscamos compartilhar por meio deste caṕıtulo com todos os leitores que têm ou terão contato com crianças, em especial na faixa etária de 0 a 5 anos. O desenvolvimento neuropsicomotor na infância é caracterizado por mudanças cont́ınuas, progressivas e complexas na capacidade funcional cognitivo-motora. Esta capacidade é cumulativa e, dentro de condições t́ıpicas esperadas para cada faixa etária, é permanente. O desenvolvimento não cessa, apesar de muitas vezes não se conseguir observar as mudanças em sua plenitude. O desenvolvimento infantil é dependente da idade, sendo mais rápido ou lento dependendo do peŕıodo da vida e do indiv́ıduo (Haywood & Getchell, 2010). Nos primeiros anos de vida, as crianças desenvolvem suas potencialidades, explorando todas suas possibilidades de aprendizagem, favorecidas pela plasticidade cerebral (Baltieri et al., 2010). O As interações neuromotoras da criança 17 desenvolvimento infantil se caracteriza pelas modificações cont́ınuas e permanentes no ińıcio da vida, sendo resultado da interação entre fatores genéticos, biológicos, ambientais e das tarefas realizadas ou estimulações recebidas. Aquisições do desenvolvimento infantil aparecem na medida em que a criança tem contato ativo com ricos ambientes f́ısico e social de seu cotidiano. Estas modificações influenciam na forma como estas crianças percebem e lidam com o ambiente em que se encontram. Esta é a perspectiva ecológica, em que o desenvolvimento infantil influencia e é influenciado, de forma ativa, pelas relações da criança com o meio ambiente (Poletto & Koller, 2008). Com isso, vemos que o desenvolvimento da criança é dependente das potencialidades intŕınsecas de fatores pessoais, além das interações com o ambiente em que a criança é exposta e de est́ımulos (atividades) oferecidos, portanto, faz-se necessário a presença mediadora de profissionais de saúde, como no nosso caso do fisioterapeuta, no ambiente escolar. O modelo ecológico, que atualmente descreve o desenvolvimento humano, propõe que as principais relações que a criança é exposta, seja em cuidados ou em est́ımulos, são dadas por indiv́ıduos conviventes, na escola por profissionais da educação e em casa pelos familiares (Nobre et al., 2009). Estas pessoas que têm contato com as crianças devem assumir a responsabilidade de propor um ambiente saudável e rico em qualidade de cuidados e est́ımulos. Desta forma, os CEI e as famı́lias devem ter conhecimentos sobre o processo de desenvolvimento da criança e como estimulá-la adequadamente nos primeiros anos de vida. 2. Os Estímulos Neuropsicomotores no Desenvolvimento Infantil Estes est́ımulos que abordamos, são as chamadas tarefas, no modelo de desenvolvimento ecológico. Na prática, são as ações ou atividades psicomotoras t́ıpicas e esperadas para a idade de cada criança. Estas atividades, quando adequadamente propostas e realizadas, funcionam como est́ımulos que auxiliam na aquisição de novas habilidades psicomotoras fazendo a criança a superar desafios diários para o seu crescimento, em ganho de massa corporal e estatura, como no desenvolvimento de habilidades neuropsicomotoras saudáveis. Destaca-se o ato de brincar e a diversidade de brincadeiras como meios de estimular as habilidades psicomotoras na criança. O ato de brincar é uma atividade (tarefa) essencial para a promoção do desenvolvimento intelectual, social, emocional e f́ısico da criança e está presente em todas as culturas, justificando o crescente foco de atenção destinado a esse tema (Pfeifer et al., 2009). Por meio da brincadeira as crianças descobrem o mundo e as respostas neuromotoras, desencadeadas por estes est́ımulos, ajudando-a a formar seu repertório neuromotor individual(Nobre et al., 18 Yamaguchi & Israel 2009). A brincadeira é véıculo da experimentação motora, social, emocional que leva ao amadurecimento saudável da criança. 3. O Papel da Família Além de proporcionar um ambiente seguro, é papel da famı́lia fornecer os v́ınculos afetivos, os cuidados e os est́ımulos necessários ao crescimento e desenvolvimento da criança. A famı́lia ainda é responsável por mediar as relações da criança com a sociedade, possibilitando o desenvolvimento cognitivo infantil (Andrade et al., 2005). A educação no sentido amplo da palavra é missão da famı́lia e a criança é reflexo das relações familiares. Desde bebê a interação mãe-filho(a) ou pai-filho(a) já coopera com o desenvolvimento cognitivo-motor da criança, pois a mãe/pai conseguem interpretar os sinais sutis e dar os est́ımulos adequados a sua criança. Como exemplo, trazemos os resultados de um estudo, desenvolvido por Amorim et al. (2009), que verificou que as crianças que ficam menos tempo com a mãe apresentaram maior déficit no equiĺıbrio estático, comparadas às que permanecem mais tempo com a mãe. Sabe-se que o equiĺıbrio estático é uma função neurológica de alta relevância e complexidade neuromotora para o desenvolvimento, sendo que déficits nesta habilidade podem indicar dificuldades também na aquisição de outras habilidades futuras, como o andar e correr. Isto sugere que a presença da mãe é como um fator de proteção e confiança para aquisição dessa habilidade motora, sendo possivelmente influente em outras habilidades motoras. As habilidades motoras surgem na infância da prática e da experiência proporcionada para a criança, por meio de est́ımulos sensóriomotores (Florindo & Pedro, 2014). Essas habilidades motoras são relativamente permanentes no repertório neuromotor humano, envolvem movimentos do corpo e um conjunto de aprendizagem cognitiva (Florindo & Pedro, 2014). O mais relevante nos diversos estudos que investigam o ambiente escolar e seus est́ımulos, não é o fato da criança frequentar o CEI durante todo o dia ou meio peŕıodo, ou ainda permanecer em casa, mas sim a qualidade de est́ımulos oferecidos por estes ambientes escola e casa, devido a qualidade de sua estrutura e da estimulação feita pelas pessoas. É preciso maior investigação sobre quais experiências são proporcionadas para a criança e a qualidade desta estimulação (Bonome-Pontoglio & Marturano, 2010). Neste sentido, há um consenso multidisciplinar de profissionais que atuam nas escolas ou CEI´s, de que uma boa relação entre a famı́lia e a escola traz benef́ıcios para o desenvolvimento social, emocional e cognitivo da criança. Para otimizar a interação famı́lia-escola, é preciso adaptar diferentes estratégias, considerando as especificidades locais, como aspectos culturais e de economia (Poletto & Koller, 2008). A abordagem e a linguagem utilizadas devem ser adaptadas ao contexto da realidade local, As interações neuromotoras da criança 19 pois quando feita de maneira inadequada torna-se ineficaz, podendo ainda desmotivar a participação da famı́lia na escola. Para superar as descontinuidades entre os ambientes familiar e escolar, é necessário conhecer os tipos de envolvimento entre familiares e escola e estabelecer estratégias que permitam a concretização de objetivos comuns (Pilz & Schermann, 2007). A estratégia utilizada nas pesquisas e intervenções realizadas sempre foi expor o objetivo comum entre o CEI e os familiares, que é a busca da saúde da criança, assegurando ambiente e estimulação adequados para um desenvolvimento infantil pleno. 4. Avaliação Para verificar como está o desenvolvimento da criança, podem ser utilizadas escalas na Fisioterapia. Estas auxiliam na avaliação infantil, e em nossa experiência, trazem uma forte adesão quando aplicadas de forma lúdica. Os itens que constam nas escalas de avaliação são atividades que tipicamente a criança realiza em determinada idade. Por meio do desempenho funcional, verificando os diversos indicadores, como a aquisição e a evolução em diferentes áreas do desenvolvimento: cognição, linguagem, motricidade, comportamento, entre outras. O uso de testes de avaliação do desenvolvimento infantil é recomendado como estratégia para promoção da saúde infantil, acompanhando o crescimento da criança. Possibilita identificar, monitorar e quantificar as posśıveis alterações no desenvolvimento, ainda que não traga um diagnóstico (Silva et al., 2015). É posśıvel, nas avaliações do desenvolvimento, que os profissionais observem alguma diferença marcante, que pode repercutir num menor rendimento em uma ou mais áreas da vida da criança, ainda que futuramente. Desta forma, a avaliação também de capaz de apontar estas discrepâncias e chamar a atenção para uma ação urgente ou encaminhamentos adequados para cuidados de educação e ou saúde. Ao pensar que a estimativa é que uma em cada oito crianças apresente alterações no seu desenvolvimento neuropsicomotor, que possam interferir em sua qualidade de vida e inclusão escolar e social, a intervenção fisioterapêutica busca reduzir ou extinguir as diferenças ou riscos para o desenvolvimento na infância. O diagnóstico e a intervenção, antes dos cinco anos de idade, são primordiais para um bom prognóstico e evolução da criança reduzindo o risco de atraso neuropsicomotor (Ribeiro et al., 2010). Muitas vezes, consequências indesejáveis ou deficiências serão vistas apenas em idades avançadas, como problemas da aprendizagem, comportamento ou transtornos afetivos. Dessa forma, a identificação precoce de posśıveis situações de risco, que possam prejudicar o curso do 20 Yamaguchi & Israel desenvolvimento infantil, é relevante para evitar maiores déficits ao longo da vida. 5. A Abordagem da Família Os profissionais da saúde, envolvidos com a promoção do desenvolvimento infantil, precisam do apoio dos familiares para que haja continuidade nos cuidados de educação e de saúde e na estimulação neuropsicomotora adequada para cada faixa etária. A sensibilização dos familiares busca esse elo. A famı́lia deve ser o principal promotor, com plena consciência da sua responsabilidade, da formação neuromotora e psicossocial de seus (suas) filhos(as). A partir desse reconhecimento, buscamos a troca de experiências, instrumentalizando os familiares. Em nossa experiência, não apontamos para nenhum familiar os achados da avaliação individual da criança. Todos os familiares participavam de forma igual das atividades de educação em saúde e eram estimulados a reconhecer seus pontos acertivos e pontos a melhorar em relação ao seu papel fundamental. Quando havia discrepância ou risco ao desenvolvimento de uma criança a escola era alertada e fazia o encaminhamento da famı́lia e da criança. Os encontros com familiares e professores são atividades de educação em saúde, com isso, seu papel é gerar conhecimento, agregar, acolher as famı́lias e professores, dar direcionamento para as suas angústias, anseios, temores, dúvidas, assim como aproveitar suas experiências, seu conhecimento e sua cultura. Ao desenvolver essa abordagem de educação em saúde os protagonistas devem ser os participantes, mediados pelos proponentes. As atividades propostas buscavam conversar sobre o desenvolvimento, trocar experiências, oferecer orientações e dicas de como otimizar o conv́ıvio do familiar com a criança e dentro da escola também com os profissionais da educação. Em todas as atividades, que ocorriam em encontros do grupo de pesquisa com a famı́lia e com os professores também, duas vezes no ano letivo, buscava-se reforçar e inovar nas ações em saúde, além de sempre contar com um “lembrete” (produto). O lembrete (produto) era algo direcionado e desenvolvido pelo grupo de pesquisa para a famı́lia levar para casa, que tenha utilidade e seu objetivo fundamental é de lembrara cada famı́lia sobre o encontro, reforçando diariamente as dicas e conversas tidas no encontro do semestre. Podem ser calendário de geladeira com brincadeiras, livro de histórias infantis, porta-canetas de dicas. As interações neuromotoras da criança 21 6. A População de Crianças no Brasil Nossas avaliações vão ao encontro dos achados de outros grupos de estudo do desenvolvimento infantil (Brito et al., 2011; Andrade et al., 2005). Algumas faixas etárias apresentam maiores riscos na linguagem, e outras, no auto-cuidado. Além disso, contextualmente, a presença dos familiares e situação socioeconômica também se apresentam como fatores que influenciam nos resultados das avaliações das crianças realizadas. As áreas motoras foram as com maior desempenho nas crianças avaliadas. A área denominada de motor fino-adaptativo verifica a motricidade de precisão, atividades minuciosas de mão e destreza e foi observado que diversas atividades propostas pelos pedagogos e professores contavam com este tipo de atividade. A área do motor grosso, que verifica a mobilidade funcional, andar, correr, levantar, subir escadas, que envolve grandes grupos musculares, controle desses movimentos e equiĺıbrio dinâmico também teve, em geral, resultados dentro do esperado para cada idade. Ao longo da primeira infância há modificações na capacidade f́ısico- motora e cognitiva que permitem a criança se alimentar, trazer o alimento do prato para si, inicie/auxilie a servir-se, inicie a escovação de dentes com aux́ılio, entre outras atividades do cotidiano que deve ser gradativamente estimuladas e a criança passe a se responsabilizar pelas mesmas. Ocorre que, por diversos motivos, essa transição de funções de cuidado pessoal não acontece. Os motivos relatados pelos familiares vão desde falta de tempo para que a criança experimente a atividade, e por vezes, se suje; até excesso de “mimos” prolongando a dependência parental. Independente da justificativa, o resultado são crianças com baixa independência em tarefas já posśıveis e importantes de serem feitas ou iniciadas pelos pequenos. Ao mesmo tempo, desenvolve-se uma rede de relações pessoais, e o bebê é um indiv́ıduo que se relaciona tanto com o meio, quanto com as pessoas. Pais, avós, irmãos, professoras e colegas são o outro lado dessa relação. Os v́ınculos afetivos iniciam pelos familiares, e posteriormente, se ampliam com a idade para relações sociais na comunidade, na escola e outros em grupos que a famı́lia e a criança frequentam. A cooperação, a identificação de papéis sociais, o reconhecimento do indiv́ıduo, regras dos jogos e brincadeiras de grupo são noções que, da mesma forma que a capacidade funcional e cognitiva e a inteligência emocional também vão se ampliando com o tempo. Essas oportunidades da convivência devem ser estimuladas para o pleno desenvolvimento social progressivo da criança. Outro indicativo das pesquisas realizadas diz respeito ao desenvolvimento da linguagem. Percebeu-se um déficit principalmente a partir dos 18 meses. Pronunciar, reconhecer figuras, nomear objetos e utilizar adjetivos começam a fazer parte do novo repertório de comunicação. O fator socioeconômico se relaciona com o desenvolvimento 22 Yamaguchi & Israel infantil na medida em que os cuidadores têm menor instrução educacional, têm mais chances de dificuldades no desenvolvimento (Brito et al., 2011). Esse fato é facilmente relacionado com a realidade do Brasil e do local em que realizamos as pesquisas. Por sua vez, a baixa escolaridade reflete ainda na renda familiar, que é indicativo também de maior chance de déficit do desenvolvimento neuropsicomotor. 7. O Desenvolvimento Infantil e a Psicomotricidade A proposta da psicomotricidade vem da França do século XX, na busca por otimizar as propostas de est́ımulos, com a tŕıade motricidade, cognição e afetividade (Castilho-Weinert et al., 2011). É relevante destacar que a prática da psicomotricidade não é apenas aplicada a crianças, hoje é amplamente utilizada na intervenção de adultos e idosos, sejam esses com ou sem algum tipo de déficit neuromotor. Contudo, a utilização em bebês e crianças apresenta maior número de pesquisas cient́ıficas, visa não somente a recuperação de funções, mas a primeira aquisição das habilidades psicomotoras (Castilho-Weinert et al., 2011). Os pilares que descrevem a psicomotricidade são relatados em sete fatores (Silva et al., 2016): a) Tonicidade: Percebe que seus músculos podem contráırem-se mais rapidamente ou mais lentamente, tem a capacidade de conseguir controlar essas ações antagônicas. b) Equilibração: Verifica o equiĺıbrio dos seguimentos corporais em diversas posturas, tanto estaticamente quanto ao se movimentar. Utiliza-se das informações proprioceptivas, mas também labiŕınticas e de visão. c) Lateralização: Define a dominância de um membro superior, ou inferior, sobre o outro lado, assim como a noção de reconhecer em si e em outros corpos os lados direito e lado esquerdo. d) Noção de corpo: Reconhece em si e no outro estruturas corporais, podendo associar com funções. e) Estruturação espaço-temporal: Percebe a sequencia temporal e compreende diferenças temporais como ontem, amanhã, dias, anos. Reconhece seu corpo no espaço, desenvolve noções de local, grandezas e formas. f) Praxias global: Trata dos movimentos para mudar de posição, se movimentar assim como carregar objetos. Utiliza grandes grupos musculares. g) Praxia fina: Engloba o desenvolvimento motor fino, com movimentos mais precisos, usando principalmente destreza de mãos, como desenhar, As interações neuromotoras da criança 23 escrever, pegar objetos pequenos, entre outras atividades, que vão sendo desenvolvidas ao longo da infância, com maior domı́nio. Fatores fundamentais para o desenvolvimento infantil, em sido assegurados atualmente no Brasil, pelo recente Marco Legal da Primeira Infância (BRASIL, 2016) e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990). Contudo, famı́lia e escola são fundamentalmente os locais para proteção e est́ımulo do desenvolvimento das crianças. O respeito, o cuidado, o brincar, o ser generoso, conhecer direitos e deveres, ser ético, o aprender, o conviver, o conhecer, o assumir responsabilidade e progressivamente desenvolver-se no mundo são aquisições de valores humanos e éticos que a criança ao longo da vida ativamente conquistará vencendo os desafios de sua vida. Que possamos como fisioterapeutas contribuir para a infância. Referências Amorim, R.C.A.; Laurentino, G.E.C.; Barros, K.M.F.T.; Ferreira, A.L.P.R.; Moura Filho, A.G. & Raposo, M.C.F., Programa de saúde da famı́lia: proposta para identificação de fatores de risco para o desenvolvimento neuropsicomotor. Revista Brasileira de Fisioterapia, 13(6):506–513, 2009. Andrade, S.A.; Santos, D.N.; Bastos, A.C. & Pedromônico, M.R., Ambiente familiar e desenvolvimento cognitivo infantil: uma abordagem epidemiológica. Revista de Saúde Pública, 39(4):1–6, 2005. 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Newell (1986), o autor da Tŕıade, reforça a necessidade de compreender a relação do ser humano com o ambiente e com os outros seres humanos analisando a combinação das demandas do organismo, do ambiente e da tarefa em andamento. Os profissionais da saúde, a famı́lia e os/as educadores/as são os principais acompanhantes do desenvolvimento infantil e os responsáveis pelo cuidado da criança. Portanto, conhecer como se caracteriza cada determinante/restrição e como se relacionam é primordial para entender como ocorrem os processos de desenvolvimento, crescimento e perceber desvios no desenvolvimento infantil adequado. A teoria e a prática, quando relacionadas, quase sempre são conflituosas. Entretanto, é necessário o conhecimento sobre os processos envolvidos em um acontecimento para solucionar problemas relativos ao fato. O presente caṕıtulo discorre sobre os principais envolvidos no cuidado à criança, ressalta a necessidade do v́ınculo entre os cuidadores e caracteriza os ambientes que cercam a criança, destacando quais são os fatores nocivos e os fatores proṕıcios para um bom desenvolvimento infantil. Bem como relata a experiência de um projeto de iniciação cient́ıfica da Universidade Federal do Paraná, o qual tinha por objetivo “unir as pontas”, ou seja, ∗Autor para contato: marianargcorrea@gmail.com Luize Bueno de Araujo & Vera Lúcia Israel (Ed.), (2017) DOI: 10.7436/2017.dcfes.03 ISBN 978-85-64619-19-7 marianargcorrea@gmail.com 26 Correa, Araujo & Israel Figura 1. Modelo das Restrições de Newell. Fonte: Haywood & Getchell (2010, p. 26). aproximar educadores/as e famı́lia e/ou responsáveis para alertar os ganhos para o desenvolvimento da criança quando há boa convivência entre famı́lia e escola, além de informar os marcos do desenvolvimento infantil e os benef́ıcios neuromotores da estimulação adequada. Pois bem, há uma convenção entre os estudiosos em ausentar o foco do conceito de doença (modelo biomédico), o qual ainda predominante, tem perdido espaço para o modelo biopsicossocial, possuidor de um conceito mais amplo em saúde, sendo que este atende o ser humano de forma integral (Ayres, 2001; Demarco, 2003; Mandú, 2004; Pegoraro & Caldana, 2008; Zoboli, 2004). O modelo biomédico ou mecanicista visualiza a pessoa como uma máquina, no qual o conceito de saúde é definido como a ausência de doença. Neste modelo, perde-se a visão hoĺıstica do ser humano, não existe a integração entre as dimensões psicológicas e sociais, o que ganha destaque é a doença e sua cura, o diagnóstico individual e o tratamento (Cutolo, 2006). Reitera-se que até hoje o modelo biomédico predomina na atenção à saúde, em cĺınicas particulares, no Sistema Único de Saúde (SUS), sendo que dentro desse contexto o médico ou profissional da saúde faz sua entrevista e observação cĺınica ao atender um paciente, focando principalmente nos seus sinais e sintomas, isto é, na sua doença. Em contraponto, o modelo biopsicossocial é definido como “modelo que não tem o foco apenas na doença em si e o tratamento dela, mas em todos os aspectos que estariam diretamente relacionados ao fenômeno do adoecer, sejam eles fisiológicos, psicológicos, sociais, ambientais, dentre outros, os Para fazer um laço é necessário unir as pontas... 27 quais também devem ser considerados para que o tratamento seja eficaz” (Silva et al., 2001). Seguindo o racioćınio acima, na Carta de Ottawa (Brasil, 2002), o modelo biomédico foi considerado necessário, porém insuficiente para dar conta da saúde numa estratégia de promoção. Assim, a aproximação do modelo biopsicossocial de saúde faz com que o atendimento oferecido seja um cuidado participativo, estendido à comunidade, fazendo com que, por meio da prevenção de doenças e de medidas para a promoção da saúde, sejam ampliadas tanto a cobertura como a abrangência desse atendimento. Dessa forma, no cuidado à criança, para que haja um modelo participativo de intervenção, é necessário que as pessoas que cercam a criança se envolvam, tornando-se atentas às fases do desenvolvimento neuropsicomotor, e sejam capazes de identificar algum atraso neste processo. Tais medidas, poderiam reduzir ainda mais os problemas futuros, uma vez que a falta de estimulação adequada da criança pode acarretar prejúızos que se estendem até a vida adulta. Em particular, os primeiros anos de vida da criança são os mais significativos para o seu desenvolvimento completo e as experiências acumuladas durante este peŕıodo têm uma influência por toda a vida (Johnston, 2009). O tecido nervoso apresenta seu maior crescimento e maturação durante este peŕıodo e, portanto, mais suscet́ıvel a lesões. Por causa do alto grau de plasticidade das crianças, também é nesta fase que elas respondem melhor a intervenções de promoção e ou tratamentos e ainda a estimulação neuromotora e ambiental. No entanto, para receber essas intervenções, é necessário identificar o atraso e orientar, o mais rapidamente posśıvel, a criança a serviços especializados. Portanto, é necessário que os profissionais atuantes na atenção básica, a própriafamı́lia e os responsáveis pela criança, monitorem o desenvolvimento e identifiquem de maneira preliminar os fatores de risco, bem como as necessidades espećıficas, isso com o objetivo de garantir um adequado desenvolvimento da criança ou um rápido encaminhamento para a intervenção precoce. 2. Fatores de Risco Para o Desenvolvimento Infantil Visto que o desenvolvimento infantil é resultante de uma interação entre as caracteŕısticas biológicas e as experiências proporcionadas pelo ambiente e suas vivências de tarefas realizadas, fatores adversos nestas áreas podem modificar o ritmo esperado. A possibilidade que isto ocorra é chamada de risco para o desenvolvimento (Ribeiro et al., 2014 apud Rutter & Sroufe, 2000). Múltiplos fatores podem ser responsáveis pelos problemas de desenvolvimento nas crianças. Na maioria das vezes não se pode estabelecer uma única causa, existindo uma associação de diversas etiologias possivelmente associadas com o atraso. 28 Correa, Araujo & Israel Como por exemplo, a falta de afeto, de amor nos primeiros anos de vida deixará marcas definitivas no desenvolvimento da criança, formando um dos riscos mais importantes para o bom desenvolvimento. Os riscos para o desenvolvimento infantil pode ser classificados em biológicos e ambientais (Figueiras et al., 2005), ambos podem aumentar a possibilidade de riscos ao DNPM e também atuar como protetores. Os riscos biológicos abordam intercorrências no peŕıodo pré, peri e pós- natais, como exemplo as desordens genéticas, a má-formação congênita, meningites, prematuridade e śındromes. Já as experiências adversas de vida ligadas à famı́lia, ao meio ambiente e à sociedade são consideradas como riscos ambientais, como exemplo, as condições precárias de saúde, a falta de recursos sociais e educacionais, a educação materna e paterna, os estresses intrafamiliares, como violência, abuso e maus-tratos e as práticas inadequadas de cuidado e educação, dentre outros (Graminha & Martins, 1997). Quanto maior o acúmulo de fatores de risco, maiores as chances de a criança desenvolver- se de forma mais lenta, quando comparada a outras da mesma faixa etária (De Andraca et al., 1998). Dessa forma, o bebê pré- termo em ambiente f́ısico impróprio, entendido como risco ambiental, com ńıvel socioeconômico baixo, apresenta maior probabilidade de problemas no desenvolvimento do que, por exemplo, o bebê com risco apenas pela prematuridade (Halpern et al., 2000; Linhares et al., 2004). Halpern et al. (2000) em seu estudo com 1.363 crianças aos 12 meses de idade percebeu que 34% das crianças apresentavam riscos para problemas no desenvolvimento motor. Ao observar os fatores de risco, percebeu-se que as crianças que tinham maior risco de atraso no desenvolvimento foram as mais pobres, as que nasceram com baixo peso, as pré-termo e aquelas que não receberam leite materno ou foram amamentadas por menos de 3 meses. Ao conhecer os fatores de risco estabelecidos ao DNPM, é posśıvel refletir sobre as medidas protetoras, bem como a dinamicidade e complexidade do tema proposto. 3. Acompanhamento da Saúde da Criança: Melhorias e Aspectos que Devem ser Evitados Historicamente a escola desenvolve atividades de saúde das crianças ainda que seja apenas o encaminhamento para unidade de saúde quando apresentam dificuldades. Na famı́lia, por sua vez, os pais, ou quem os substitui, são os responsáveis pelo cuidado à criança, sendo que informam a situação da saúde da criança e buscam soluções para os problemas encontrados. Isto revela que a atenção à criança em idade escolar se materializa no encontro destes três eixos – serviço de saúde, escola e famı́lia. Embora exista um acordo entre os profissionais sobre a necessidade no acompanhamento do desenvolvimento da criança, o modo como Para fazer um laço é necessário unir as pontas... 29 fazê-lo ainda é discut́ıvel. São várias propostas e modelos para este acompanhamento, abaixo estão algumas delas que constam no Manual para Vigilância do Desenvolvimento Infantil no Contexto da Atenção Integrada às Doenças Prevalentes na Infância (AIDPI) (Figueiras et al., 2005): • Screenings de Desenvolvimento: Utiliza-se a aplicação de testes de triagem ou escalas, exames e outros procedimentos para checagem do desenvolvimento das crianças t́ıpicas, com o objetivo de se identificar crianças de alto risco para problemas de desenvolvimento. • Vigilância do Desenvolvimento: Esse modelo inclui as atividades relacionadas à promoção do desenvolvimento t́ıpico e à detecção de problemas de desenvolvimento, na atenção primária à saúde da criança, sendo um processo cont́ınuo, flex́ıvel, envolvendo informações da famı́lia, professores/as, profissionais de saúde e outros. • Avaliação do desenvolvimento: Investigação mais detalhada de crianças com suspeita de problemas no desenvolvimento, sendo geralmente multidisciplinar e diagnóstica. • Monitoramento ou Acompanhamento do desenvolvimento: Procedimento de assistir de forma próxima o desenvolvimento da criança, sem implicar na aplicação de técnica ou processo espećıfico, podendo ser periódico ou cont́ınuo, sistemático ou informal e envolver ou não processo de screening, vigilância ou avaliação. Todas essas propostas têm o seu espaço no estudo do desenvolvimento da criança. Desta forma, quando o objetivo for rastrear crianças com maior ou menor risco para problemas no desenvolvimento, os testes de screening são a melhor opção. No acompanhamento individual da criança, não resta dúvida da supremacia da vigilância do desenvolvimento. Muitas vezes um procedimento estará unido a outro permitindo um melhor resultado. É posśıvel que na vigilância do desenvolvimento seja necessário o uso de alguma escala, para servir de roteiro no exame do desenvolvimento. Deve se destacar a opinião da famı́lia sobre o desenvolvimento das suas crianças, principalmente na “vigilância do desenvolvimento”. Há um consenso na literatura de que os pais são bons observadores e detectores apurados das alterações observadas em seus filhos, mostrando uma alta sensibilidade na detecção de problemas no desenvolvimento dos mesmos. Na Tabela 1 serão apresentadas algumas formas de promover um desenvolvimento infantil pleno, visando uma melhoria em suas condições e qualidade de vida, como também aspectos que devem ser evitados (Figueiras et al., 2005). 30 Correa, Araujo & Israel Tabela 1. Manual para vigilância do desenvolvimento infantil no contexto da AIDPI (Figueiras et al., 2005). Caracteŕısticas Individuais O que fazer O que evitar Apoiar e amar a criança sempre (incondicionalmente) Elogiar a criança sempre que ela faça algo corretamente ou está se esforçando Falta de atenção, carinho, amor e cuidados com a criança Ser autoritária demais com a criança Deixar a criança expressar suas vontades e desejos e respeitá-la Dar oportunidade para a criança para fazer coisas sozinha Superproteger a criança Não deixar a criança experimentar coisas novas Realizar atividades com prazer e alegria Ambiente alegre e festivo Falta de espaço para brincadeiras Valorizar situações negativas e trágicas Deixar a criança criar e brincar livremente Oferecer materiais (seguros) para a criança brincar Não estimular a criança Regras ŕıgidas ou severas Caracteŕısticas Familiares O que fazer O que evitar Valorizar um ambiente familiar harmonioso e de confiança Saber escutar a criança e observar seu bem-estar Conflitos familiares constantes Violência e/ou maus tratos com a criança Abandonar a criança no caso de morte ou separação de entes queridos Caracteŕısticas da Comunidade O que fazer O que evitar Importância de resgatar e valorizar a cultura local Gestores e comunidade com interesse pela criança Falta de espaços lúdicos e de lazer para a criança Falta de coesão e solidariedade na comunidade Para fazer um laço é necessáriounir as pontas... 31 4. A Família como uma das Pontas do Desenvolvimento Infantil A famı́lia, um dos primeiros ambientes de socialização do indiv́ıduo, atua como conciliadora principal dos padrões, modelos e influências culturais (Amazonas et al., 2003), é a primeira mediadora entre a pessoa e a cultura, é considerada a origem de toda aprendizagem humana, com significados e práticas culturais próprias que resultam na construção do indiv́ıduo e da sociedade, bem como proporcionam a formação do comportamento, das ações para resolução de problemas (Dessen & Polonia, 2007). É considerada como a primeira instituição social que procura proteger, transmitir valores, crenças, e significados que estão presentes na sociedade (Kreppner, 2000). Ela tem, portanto, um impacto expressivo e forte influência no comportamento das pessoas, principalmente das crianças, que aprendem as diferentes formas de existir, de ver o mundo e construir as suas relações sociais (Dessen & Polonia, 2007). No ambiente familiar, a criança aprende a controlar as emoções, lidar com as adversidades da vida, administrar e resolver conflitos, expressar diversos sentimentos (Dessen & Polonia, 2007). Essas habilidades sociais e suas expressões que são desenvolvidas primeiramente no âmbito familiar, têm repercussões em outros ambientes com os quais a criança, o adolescente ou mesmo o adulto convivem, ativando aspectos benéficos ou provocando problemas e alterando a saúde mental e f́ısica dos indiv́ıduos (Del Prette & Del Prette, 2001 apud Dessen & Polonia, 2007). Por saber a relevância que o ambiente familiar tem no desenvolvimento de habilidades sociais, cabe destacar alguns fatores que favorecem a socialização das crianças como a segurança do apego interpessoal, a observação do comportamento dos pais/mães e o compromisso mútuo entre pais/mães e filhos/as (Koshanska et al., 2002). O modo como os pais/mães cuidam da socialização do/a filho/a, e também o temperamento da criança e a qualidade do relacionamento entre eles pode ajudar a prever se a socialização será fácil ou dif́ıcil (Koshanska et al., 2002). Outro fator de risco para o desenvolvimento infantil é a privação do pai (Araujo, 2013; De Andraca et al., 1998; Barros et al., 2003; Cia et al., 2005; Pilz & Schermann, 2007; Amorim et al., 2009; Almeida, 2009). Alguns estudos apontam que a presença do pai é fundamental para o desenvolvimento da criança (Manfroi et al., 2001). Uma pesquisa feita por Pilz & Schermann (2007) realizada no Munićıpio de Canoas/RS, utilizando o teste de Denver II, constatou que 27% da amostra exibiu prevalência de suspeita de atraso no desenvolvimento. Após análise de múltiplos fatores, perceberam que a probabilidade de crianças cujas mães não recebem apoio dos pais na criação dos filhos apresentarem suspeita de atraso no desenvolvimento neuropsicomotor é sete vezes maior do que aquelas cujas mães possuem apoio dos pais. No estudo de Anme et al. (2012) no Japão aponta o apoio 32 Correa, Araujo & Israel do cônjuge esteve significativamente relacionado ao desenvolvimento do vocabulário das crianças avaliadas. Diversos fatores interferem na relação da figura do pai no desenvolvimento infantil nos aspectos social e motor, a saber: harmonização da famı́lia, favorecendo um envolvimento mais afetivo da mãe com os filhos; a dinâmica familiar, auxiliando nas atividades domésticas e, dessa forma, transmitindo valores e exemplo de cooperação; o envolvimento nos cuidados básicos (higiene, alimentação) das crianças, assim aumentando a proximidade com os filhos/as; e também, as brincadeiras que aumentam a interação entre pai e filho (Manfroi et al., 2001). Portanto, constata-se que o pai atua como protetor do desenvolvimento infantil, pela interação e relacionamento com a criança, representação e apoio para a mãe e também por auxiliar nas condições socioeconômicas da casa (De Andraca et al., 1998; Barros et al., 2003; Almeida, 2009). A neuroplasticidade ocorre principalmente e ricamente no inicio da vida do ser humano e interfere diretamente nos aspectos individuais (criança), ambientais (onde ela vive) e as tarefas propostas (atividades e movimentos vivenciados). Bem como o desenvolvimento neuroplástico é suscet́ıvel à estimulação, originarão mudanças no comportamento motor desta criança, repercutindo na determinação de um desenvolvimento neuromotor pleno, com o aperfeiçoamento de todas as potencialidades e expansão do acervo motor (Araujo, 2013). Por fim, a famı́lia não é o único contexto em que a criança tem oportunidade de acumular experiências e ampliar o seu repertório como sujeito de aprendizagem e desenvolvimento (Formiga et al., 2004; Marques, 2001; Rego, 2003). 5. A Escola como Outra Ponta do Desenvolvimento Infantil Um programa de educação em saúde na escola tem como objetivo proporcionar um ambiente favorável ao desenvolvimento da criança. Portanto, os familiares ou responsáveis pela criança devem estar atentos, pois a qualidade da escola, além de ser determinante para a educação sanitária e ambiental, contribui para a competência cognitiva e psicossocial desta criança (Marshall, 2004). Assim as atividades de sala de aula devem ultrapassam o pensar e o aprender, atingindo campos da memória seletiva, racioćınio abstrato, criatividade, pensamento lógico, tendo o/a professor/a como principal fomentador dessas ideias (Marques, 2001). Também o movimento corporal da criança deve ser estimulado dentro da sala de aula que favorece um crescimento saudável e um desenvolvimento completo, favorecendo o aprendizado. Para fazer um laço é necessário unir as pontas... 33 Na concepção de Marques (2001) a escola, no século XXI, tem como objetivo estimular a criança (estudante) a adquirir conhecimento global, considerando o perfil sociocultural de cada um. Com isso, Marques sinaliza três objetivos que devem ser conseguidos pelas escolas na atualidade, são eles: desenvolver a cidadania e a habilidade de interferência social; promover o desenvolvimento f́ısico, afetivo, moral, cognitivo e de personalidade; gerar uma aprendizagem cont́ınua, proporcionando formas variadas de aprender e condições de inclusão no mercado de trabalho. Isto necessita da promoção de atividades atreladas às esferas afetiva, motora, social e cognitiva, de forma condizente a realidade de cada criança. Portanto, o ambiente escolar é essencial para o progresso da sociedade e da humanidade (Rego, 2003). Ele deve ser capaz de acompanhar a evolução da globalização e informar os alunos, assim como seus funcionários e pais, para se adaptarem as mudanças da atualidade, preparando-os para as dificuldades, o que contribui para o desenvolvimento não só dos seus alunos, mas de todos os indiv́ıduos. Em śıntese, a escola é uma instituição de atividades educativas formais, porém com uma responsabilidade no desenvolvimento e interação entre diversos contextos da sociedade, incluindo a criança e sua famı́lia. 6. A Interação Entre as Pontas... o Laço A introdução de modelos, teorias e maneiras práticas de propiciar a interação entre a famı́lia e a escola, reconhecendo a contribuição e os limites da famı́lia na educação infantil, é fundamental para“diversificar os sistemas de ensino e envolver, nas parcerias educativas, as famı́lias e os diversos atores sociais” (Delors et al., 2000, p. 56). A famı́lia e a escola surgem como duas instituições fundamentais para desencadear os processos evolutivos da criança, atuando como propulsores ou inibidores do seu crescimento f́ısico, intelectual e social (Polônia & Dessen, 2005). O ambiente familiar tem forte influência na permanência do estudante na escola, impedindo ou intensificando a evasão e a repetência na escola. As caracteŕısticas individuais, a falta de hábitos de estudo, a ausência nas aulas e os problemas de comportamento são determinantes para esta situação (Dessen& Polonia, 2007 apud Fitzpatrick & Yoles, 1992). Por mais que a escola contribua positivamente para reverter esses determinantes, é necessário que o sistema escolar consiga a colaboração de outros agentes de impacto na formação do aluno, incluindo a famı́lia (Dessen & Polonia, 2007 apud Fantuzzo et al., 2000). Avaliar cada contexto é imprescind́ıvel para identificar qualquer conflito do desenvolvimento da criança e a comunicação entre as partes torna-se condição determinante. 34 Correa, Araujo & Israel 7. Relato de uma Experiência em Projeto de Iniciação Científica na Universidade Uma explicação breve para quem não conhece o projeto. Um projeto de iniciação cient́ıfica (IC) procura atender uma missão da Universidade denominada de pesquisa, que leva à inserção de estudantes de graduação, previamente selecionados, para ações controladas e supervisionadas na comunidade. No caso deste projeto de IC a pesquisa foi desenvolvida em parceria com a secretaria de educação de um munićıpio do litoral paranaense com a intenção de avaliar crianças pequenas e intervir com estas crianças e suas famı́lias e com os profissionais das escolas. Após a coleta dos dados referentes às avaliações do desenvolvimento infantil, como finalização do estudo, houve uma devolutiva da equipe de pesquisa da Iniciação Cient́ıfica para os pais/responsáveis pelas crianças e outra para a equipe pedagógica do CEI (Centro de Educação Infantil) que envolveu professores/as, diretores/as, coordenadores/as, os quais foram convidados a participar. O objetivo da devolutiva dos resultados do projeto foi instrúı- los sobre a estimulação, o desenvolvimento e a saúde infantil. Na reunião com familiares a orientação foi feita por meio de um jogo de tabuleiro “gigante” em que os familiares eram os “peões” do jogo. Cada casa do jogo continha orientações em saúde, como alimentação saudável e vacinação, e formas de estimulação para idade espećıfica e áreas do desenvolvimento neuropsicomotor. Em alguns locais do tabuleiro havia jogos para que os pais vivenciassem como estimular seu filho por meio de brincadeiras e do lúdico. Não foram considerados os detalhes das avaliações individuais dos alunos, e nos casos identificados como risco foi solicitado uma reunião para a famı́lia, os pais e/ou responsáveis para esclarecer a situação de cada criança. Os temas abordados na devolutiva com os familiares foram: desenvolvimento infantil, estimulação precoce, alimentação adequada, a importância da vacinação, os principais marcos motores no desenvolvimento da criança, nutrição infantil, mitos e verdades no conhecimento popular, o ambiente familiar adequado, e a importância da troca de experiências entre a famı́lia, a escola e o profissional da saúde. Na devolutiva para as educadoras e cuidadoras do CEI, pesquisadores/as e profissionais da educação trocaram experiências por meio de rodas de conversa. Houve uma orientação para os/as educadores/as do CEI sobre estimulação motora para cada faixa etária e como prevenir e identificar atrasos motores e psicomotores e como estimular a criança durante as atividades do CEI. Esta devolutiva também teve o objetivo de apresentar os resultados das avaliações das crianças. Os principais temas abordados na devolutiva foram: desenvolvimento infantil, promoção e prevenção de saúde na educação infantil, o cuidar e o educar, o lúdico como forma de avaliação e tratamento, a importância da Para fazer um laço é necessário unir as pontas... 35 interação famı́lia-escola, formas de acompanhamento do desenvolvimento da criança, o que é considerado risco para o desenvolvimento infantil, as maneiras de avaliar uma criança com métodos adequados. As Figuras 2, 3, 4 e 5 são exemplos de algumas atividades desenvolvidas no projeto. Figura 2. Mãe participando de atividade lúdica. Colocar os objetivos, coordenação motora global, identificação de cores. Figura 3. A, B e C: Casas do Tabuleiro. As casas do tabuleiro tinham diversos objetivos: informar sobre saúde da criança, orientar sobre marcos do desenvolvimento infantil, estimular hábitos saudáveis, promover brincadeiras que estimulam o desenvolvimento motor da criança. Fonte: (Araujo, 2013). 36 Correa, Araujo & Israel Figura 4. A e D. Casas do tabuleiro. Objetivo: Dicas sobre promoção da saúde. B e C. Mães participando de atividade lúdica. Objetivo: informar sobre saúde da criança, orientar sobre marcos do desenvolvimento infantil, estimular hábitos saudáveis, promover brincadeiras que estimulam o desenvolvimento motor da criança. Fonte: (Araujo, 2013). Figura 5. Equipe de pesquisa de Iniciação Cient́ıfica. Para fazer um laço é necessário unir as pontas... 37 Referências Almeida, P.S., Estimulação na Creche: efeitos sobre o desenvolvimento e comportamento da criança. Tese de Doutorado em Neurologia, Curso de Pós-Graduação em Neurologia, Subárea de Neurociências, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, 2009. Amazonas, M.C.L.A.; Damasceno, P.R.; Terto, L.M.S. & Silva, R.R., Arranjos familiares de crianças de camadas populares. Psicologia em Estudo, 8(especial):11–20, 2003. 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Isso acontece na gestão municipal, estadual e federal. Levantamentos são feitos em relação ao número de habitantes, renda, escolaridade, doenças, preferências, etc. Tais estudos têm como objetivo conhecer as regiões e o perfil de quem mora ali, para que as melhores tomadas de decisões sejam feitas no momento de decidir como serão feitos os investimentos e quais são as prioridades mais urgentes. Que tal conhecer um pouco melhor como funciona todo esse processo e como ele pode ser aplicado na saúde da criança de 0 a 5 anos? Veja a seguir... 2. Geoprocessamento em Saúde O uso de computadores para realizar um mapeamento na área da saúde é algo novo, mesmo em âmbitos mundiais. Tal limitação se dava pelo alto custo de implantação dos projetos, bem como pelas dificuldades de montagem de bancos de dados. No entanto, a partir dos anos 90, houve uma grande evolução na área, com um aumento do número de usuários destes sistemas para o mapeamento digital, sendo posśıvel a construção de mapas temáticos (Nardi et al., 2013). O mundo, atualmente, encontra-se em um peŕıodo de grande evolução industrial e econômica. Para acompanhar essa evolução, a população ∗Autor para contato: zanardiufpr@gmail.com Luize Bueno de Araujo & Vera Lúcia Israel (Ed.), (2017) DOI: 10.7436/2017.dcfes.04 ISBN 978-85-64619-19-7 zanardiufpr@gmail.com 42 da Silva, Araujo & Israel em geral assume diversos padrões culturais, produtivos e de consumo. Com isso, os indiv́ıduos, em seu dia-a-dia, são expostos às mais diversas situações, condições e ambientes. No entanto, nem todas as experiências vividas são favoráveis, podendo levar o sujeito à situações de vulnerabilidade. São nesses momentos em que são expostas as diferenças sociais causadas pela grande evolução e situação econômica mundial (Souza et al., 2012). Em cidades com menor densidade populacional, como Matinhos, localizada no litoral do Estado do Paraná, no Brasil, podemos perceber que os espaços estão sendo transformados pelo ser humano. Porém, ainda conseguimos distinguir os espaços urbanos dos espaços rurais (DATASUS, 2016). Nos espaços urbanos, onde encontramos a maior concentração humana, percebemos que os seus centros dominam os recursos destinados a todas as áreas: saúde, educação, segurança, saneamento básico. Enquanto as regiões periféricas, mesmo das áreas urbanas, ficam a mercê da precariedade e falta de acesso. Todas as áreas citadas, que constituem quase que exclusividade das regiões centrais, desempenham funções essenciais na vida dos cidadãos (DATASUS, 2016). Os mapas temáticos são instrumentos poderosos na análise espacial do risco de determinada doença, pois apresentam as seguintes caracteŕısticas: descrevem e permitem a visualização da distribuição espacial do evento; exploração das informações, sugerindo os determinantes locais do evento e fatores etiológicos desconhecidos que possam ser formulados em termos de hipóteses e apontar associações entre um evento e seus determinantes (Malta et al., 2001). O georreferenciamento é uma ferramenta que permitea análise e uma avaliação de riscos à saúde coletiva, particularmente as relacionadas com o meio ambiente e com o perfil socioeconômico da população, enquanto o geoprocessamento é o conjunto de técnicas de coleta, tratamento e exibição de informações referenciadas em um determinado espaço geográfico (Hino et al., 2006). A apresentação gráfica, por meio do mapa, torna a informação mais acesśıvel, inclusive para a população, e pode ser estratégia para a democratização do conhecimento. Geralmente, em regiões muito próximas encontramos diferenças nas condições socieconômicas, e perfil epidemiológico, por isso é necessário a construção de mapas dinâmicos, criando fluxo permanente de monitoração da saúde no território, contribuindo para a avaliação das poĺıticas públicas (Ferreira et al., 2012). O trabalho de mapeamento geográfico abre espaço para outras áreas que podem ser beneficiadas com o trabalho, que podem usufruir do projeto já feito e promoverem mais benef́ıcios à comunidade (Chiesa et al., 2002). O ambiente dos Sistemas de Informações Geográficas (SIG) oferece margem à integração de informações diversas, as quais poderão proporcionar visão mais abrangente da situação no espaço. No entanto, Geoprocessamento como instrumento no processo fisioterapêutico 43 a avaliação do pesquisador é imprescind́ıvel, pois não há mecanismo automático para a interpretação dos resultados constrúıdos. A aplicação do SIG na pesquisa em saúde oferece grandes possibilidades, possibilitando aos pesquisadores aplicação de novos métodos para o manejo de sua informação espacial, tornando-se uma poderosa ferramenta para conexão entre saúde e ambiente (Hino et al., 2006). O SIG possui capacidade para acessar e integrar diferentes ńıveis de informações (vetoriais, raster, superf́ıcie, dados de campo e endereços), permite a apresentação e associação dos dados de diferentes formas (tabelas, gráficos e mapas temáticos) e possibilita o mapeamento, a exibição e a análise espacial dos dados relevantes para o processo de territorialização. Além disso, o sistema manipula os dados como os demais sistemas de informação e possui uma caracteŕıstica marcante de interligar atributos não espaciais a dados espaciais (Carvalho et al., 2000). O SIG, entendido como tecnologia utilizada para o processamento de informações advindas de várias fontes, permitem a visualização socioambiental de um determinado espaço geográfico e possibilitam a sua descrição e análise (Chiesa et al., 2002). Hau et al. (2009) explicam que os métodos de análise espacial na saúde vêm sendo usados principalmente em estudos ecológicos, para detecção de aglomerados espaciais ou espaço-temporais, na avaliação e monitoramento ambiental e vêm sendo aplicados ao planejamento e avaliação de uso de serviços de saúde, buscando identificar espacialmente áreas com caracteŕısticas espećıficas, a fim de subsidiar programas ou poĺıticas voltadas para a melhoria da saúde materno-infantil, e visando aumentar a eficiência na utilização de recursos públicos, definindo áreas prioritárias de atuação (Silva, 2013). 3. O Papel da Fisioterapia no Desenvolvimento Infantil Albuquerque et al. (2011) apontam que o desenvolvimento infantil depende das aquisições de aprendizado que emergem na medida em que a criança se envolve ativamente com os ambientes f́ısico e social de seu cotidiano. O processo de desenvolvimento caracteriza-se por mudança permanente na forma como estas crianças percebem e lidam com o ambiente. Nessa perspectiva ecológica, o desenvolvimento infantil influencia e é influenciado ativamente pelas transações da criança com o meio em que vive. Assim como Ferreira et al. (2011) citam que o Desenvolvimento Neuropsicomotor (DNPM) refere-se às constantes mudanças e adaptações pelas quais a criança passa do nascimento até o fim da vida. Tais mudanças estão relacionadas aos processos de maturação, e englobam os aspectos individuais da criança, as experiências adquiridas e sua interação com o ambiente (Ferreira et al., 2011). 44 da Silva, Araujo & Israel Durante o desenvolvimento a escola é o ambiente que mais fornece experiências de formação, relacionando-se com todos os componentes do desenvolvimento humano (f́ısico, cognitivo, emocional). Na escola as crianças adquirem novos conhecimentos e habilidades, além de um maior conv́ıvio e interação social (Papalia et al., 2009). A avaliação de crianças na faixa etária pré-escolar e escolar é extremamente necessária para a detecção de posśıveis atrasos no desenvolvimento (Haywood & Getchell, 2010). Caso haja suspeita de algum tipo de atraso, é necessário o encaminhamento destas crianças para profissionais especializados, como fisioterapeutas e psicólogos, para a formulação de um tratamento adequado. As intervenções psicomotoras visam a estimulação precoce e prevenção de atrasos no desenvolvimento por meio de atividades lúdicas. No Brasil, a saúde da criança tem enfoque no acompanhamento do crescimento e desenvolvimento infantil, incentivo ao aleitamento materno, orientação da alimentação da criança, imunização, prevenção de acidentes e atenção às doenças prevalentes na infância. Essas práticas constituem elementos essenciais para proporcionar boas condições de saúde na infância (Falbo et al., 2012). O acompanhamento de crianças e do processo de DNPM reúne diferentes modalidades de triagem e avaliação, que incluem pais, professores, fisioterapeutas, pediatras e demais profissionais. Nesse processo é utilizada a anamnese, a observação da criança em seu ambiente, a prática de atividades ou, ainda, a aplicação de instrumentos de triagem (Zeppone et al., 2012). O acompanhamento do desenvolvimento infantil deve ser em todos os ńıveis de atenção, desde a primária, com atividades de promoção do desenvolvimento t́ıpico e da detecção precoce de problemas ou alterações. Diante disso, afirma-se que os profissionais de saúde devem possuir conhecimentos básicos sobre o desenvolvimento infantil, para que possam fazer o seu acompanhamento de forma sistemática para todas as crianças sob sua responsabilidade, a fim de decidir se há um problema para ser investigado e qual tratamento adequado (Figueiras et al., 2005). A detecção de posśıveis riscos em crianças, usando uma abordagem mais ampla, contempla análise dos fatores de risco que contribuem para as desordens da criança, tornando-a suscet́ıvel ao enfrentamento das tarefas cotidianas. Os riscos ao desenvolvimento podem estar presentes na própria criança, como fatores genéticos, f́ısicos e psicológicos, ou no ambiente, como o ńıvel socioeconômico e cultural, acesso e escolaridade (Mengel & Linhares, 2007). Alguns estudos vêm demonstrando (Brito et al., 2011; Albuquerque et al., 2011) que as dificuldades no desenvolvimento de crianças que irão frequentar o ensino fundamental (pré-escolares) podem comprometer o desempenho escolar e, futuramente, atividades acadêmicas ou profissionais. Assim sendo, a epidemiologia surge na área infantil avaliando as condições ambientais vinculadas aos fatores sociais, econômicos, de atenção à Geoprocessamento como instrumento no processo fisioterapêutico 45 saúde e comportamentais da mãe na gestação, sempre a levar em consideração a indissociabilidade dos fatores citados e o potencial de ação sobre o desenvolvimento da criança (Brito et al., 2011). Portanto, o profissional fisioterapeuta deve ser capaz de identificar sinais de alerta do desenvolvimento infantil, identificar os fatores que causam estes problemas e formular intervenções para cada fator, aplicando-as e verificando sua eficácia (Oliveira et al., 2012). 4. Geoprocessamento: Experiência da Fisioterapia no Município de Matinhos O litoral do Paraná é uma das regiões menos desenvolvidas do Estado e possivelmente da RegiãoSul do Brasil. A área em questão abrange sete munićıpios localizados na faixa litorânea, maior reserva de Mata Atlântica do páıs. Os munićıpios que compõem a região são: Antonina, Morretes, Guaraqueçaba, Paranaguá, Pontal do Paraná, Matinhos e Guaratuba. A cidade de Matinhos, localizada no litoral paranaense, conhecida como “namorada do Estado do Paraná” pela beleza natural e por ser fundada no mesmo dia em que comemora-se o dia dos namorados (12 de junho), possui atualmente aproximadamente 33.000 habitantes e uma área territorial de 116.544 Km (DATASUS, 2016). Matinhos possui uma renda média domiciliar per capita de R$ 799,40. Taxa de mortalidade infantil de 23,61 mortos a cada mil nascidos vivos. Apresenta uma taxa de analfabetismo de 15 anos ou mais de 4,23%, superior à de Curitiba, capital do Estado, que é de 2,13%. Seu Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,743, enquanto o de Curitiba é de 0,823 (DATASUS, 2016). De acordo com a Secretaria Estadual de Educação (SEED), no ano de 2015, o munićıpio apresentava 671 alunos matriculados em creches, 846 alunos na pré-escola, 5193 alunos no ensino fundamental e 1412 no ensino médio, perfazendo um total de 8.122 escolares (DATASUS, 2016). Em média, as crianças iniciam sua vida acadêmica na creche aos 2 anos, porém pode ser antes, pois os Centros de Educação Infantil (CEIs) admitem crianças a partir de 6 meses de idade. A partir dessa faixa etária até os 6 anos, o munićıpio possui 2.189 crianças habitantes, porém, na mesma faixa etária, possui 1439 matriculadas na rede pública de ensino, e 35 na rede privada, totalizando 1474 crianças matriculadas (DATASUS, 2016). Atualmente não existe um sistema de acompanhamento do Desenvolvimento Neuropsicomotor (DNPM) de crianças escolares, mesmo a ńıvel nacional. A Universidade Federal do Paraná - Setor Litoral, com o curso de Fisioterapia, realizou diversas atividades formativas voltadas para avaliação, intervenção e educação em saúde nos Centros 46 da Silva, Araujo & Israel de Educação Infantil (CEI’s) e nas Escolas Municipais de Matinhos/PR, bem como Projetos de Extensão, Iniciação Cient́ıfica, Trabalhos de Conclusão de Curso voltados para esta área, atividades formativas, etc. Em todas as atividades foram realizados feedbacks (devolutivas) sobre o projeto realizado, os dados obtidos e conversas com os profissionais dos estabelecimentos de educação, famı́lia das crianças e comunidade escolar em geral. No entanto, muitos desses dados acabam se perdendo durante processos de trocas de gestão (a ńıvel de turmas, escolar ou mesmo municipal) ou são engavetados, fazendo com que não se aproveite o conhecimento e a informação gerada. Com a criação de um sistema eletrônico de acompanhamento, seria posśıvel verificar, por exemplo, se uma criança melhorou em uma avaliação motora que em algum momento ela apresentou alguma dificuldade. Ou mesmo se uma escola em que a maioria das crianças apresenta dificuldades em determinada área do desenvolvimento, com a criação de algum tipo de atividade extra, conseguiu melhorar esses resultados. Um projeto de pesquisa (iniciação cient́ıfica) com essa intenção foi criado como oportunidade para que se iniciasse este pensamento de acompanhamento em longo prazo. Foi realizado, até o momento, além das avaliações do DNPM, a criação de um mapa temático da região (Figura 1), com a inserção dos CEIs, no qual quatro CEIs foram avaliados e inseridos (CEI 1, CEI 2, CEI 3 e CEI 4), suas caracteŕısticas f́ısicas (dimensões, espaços dispońıveis, número de alunos e professores) e os resultados das avaliações citadas, podendo ser acessados ao escolher um CEI e clicar sobre o mesmo (Figura 2). Todas as estratégias para abordagem da relação entre saúde e ambiente são, no entanto, desenvolvidas a partir de hipóteses previamente estabelecidas. A fonte ou agente de risco são conhecidos e estudam- se suas conseqüências sobre a saúde. Em seguida, o lugar é conhecido (CEIs) e estuda-se a relação entre variáveis ambientais, sócio-econômicas e de saúde. Feito isso, o agravo e sua etiologia são conhecidos e estuda- se sua relação com fatores ambientais (estudos de acompanhamento, longitudinais). Assim, os critérios utilizados para regionalização são determinantes e são conseqüências do próprio processo de análise de dados epidemiológicos, isto é, seu resultado (Barcellos & Bastos, 1996). Muitas discussões, questionamentos e abordagens foram abordados nos outros caṕıtulos deste livro, aprofundando mais a questão do DNPM e suas peculiaridades. O objetivo deste caṕıtulo foi levantar é a necessidade da continuidade e expansão de estudos que envolvam o mapeamento em saúde. Mesmo que, se olharmos a quantidade de informações geradas e mapeadas, ainda pode ser considerado superficial do ponto de vista estat́ıstico e geográfico (foi realizado por professores e alunos do curso Geoprocessamento como instrumento no processo fisioterapêutico 47 Figura 1. Visualização do mapa temático criado de Matinhos. Pontos destacados no mapa: CEIs estudados de Fisioterapia da UFPR), porém levantou inúmeras questões que devem receber uma atenção maior no meio acadêmico e poĺıtico. Quando se fala sobre o DNPM e mostramos caracteŕısticas espećıficas do litoral do Paraná, apresentamos condições que podem estar influenciando, positiva ou negativamente, o crescimento e desenvolvimento (f́ısico, psicológico, social e acadêmico) de crianças do litoral paranaense. Isso apresenta uma relevância social, pois um devido acompanhamento permite descobrir carências de est́ımulos e investimentos sociais, apontar áreas deficitárias do desenvolvimento e dos CEIs (e também escolas), fazendo com que fique mais claro onde deve destinar-se recursos e poĺıticas públicas. Como exemplos destas poĺıticas públicas pode-se citar duas: Poĺıtica Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (PNAISC) e Poĺıtica Nacional de Educação Infantil. A PNAISC que tem, dentre outros objetivos, promover e proteger a saúde da criança e o aleitamento materno, mediante a atenção e cuidados integrais e integrados. Tais medidas de proteção vão desde a gestação até os 9 (nove) anos de vida da criança, em especiais cuidados com a primeira infância e às populações de maior vulnerabilidade, visando a redução da morbimortalidade e um ambiente facilitador à vida com condições dignas de existência e pleno desenvolvimento. Com isso, preconiza a identificação de situações de vulnerabilidade e grupos de risco, fazendo com que seja discutido e realizado uma articulação de um conjunto de estratégias intrassetoriais 48 da Silva, Araujo & Israel Figura 2. Visualização dos dados inseridos ao clicar sobre um determinado CEI. “Coord X” e “Coord Y” são os dados geográficos dos CEIs necessários para inserção no programa; “ANO AVALIA” se refere ao ano em que a avaliação foi realizada naquele determinado CMEI; “AVALIADOS” é o número total de crianças avaliadas no CEI; “MASC” e “FEM” refere-se a divisão por sexos (masculino e feminino); “QUESTNAVS” e “TIPICOS” referem-se ao resultado da avaliação por uma escala, que pode ser Questionável (com algum risco de atraso) ou T́ıpico (normal); “PES SOCIAL” (pessoal-social), “MOTOR FINO” (motricidade fina-adaptativa), “LINGUAGEM” e “MOTOR GROS” (motricidade grossa/global) são as áreas que as escala avalia e quantos apresentam risco de atraso nas mesmas. e intersetoriais para a melhor solução das necessidades desta população (Brasil, 2014). No que tange aos objetivos da Poĺıtica Nacional de Educação Infantil, vemos que ela vem para elaborar padrões mı́nimos de infra-estrutura para o funcionamento adequado das instituições de Educação Infantil, definir o custo criança/ano da Educação Infantil, com base nos parâmetros de qualidade, apoiar financeiramente os munićıpios e o DF na construção, reformaou ampliação das instituições de Educação Infantil, bem como na aquisição de equipamentos, mobiliário, brinquedos e livros de literatura infantil. Podemos, a partir disso, pensar que esta poĺıtica tem sentido complementar a PNAISC, pois considera a criança em sua totalidade e também em suas diferenças, onde destaca o conhecimento do mundo através do brincar. Também é destacado que a Educação Infantil (em CMEIs e escolas) tem função complementar à ação da famı́lia, o que implica uma profunda, permanente e articulada comunicação entre elas (Brasil, 2004). Geoprocessamento como instrumento no processo fisioterapêutico 49 Tal articulação pode ser feita através de bases de dados de informações sociodemográficas das regiões e de informações socioeconômicas e culturais desta população infantil que ali reside, permitindo que seja implantado um sistema de acompanhamento da saúde e educação destas crianças. Atualmente, ainda acredita-se que a implantação destas bases de dados cartográficas e o georreferenciamento têm elevado custo e dificuldade de aplicação. No entanto, faz-se necessário cada vez mais. Quatro fatores devem ser levados em conta: disponibilização da base de dados, programas dispońıveis, desenvolvimento tecnológico e capacitação pessoal. Isso refere- se a democratização das ferramentas, que são integradas e tem como objetivo diagnosticar tendências e situações sociais (Barcellos & Ramalho, 2002). A aplicação deste instrumento, o SIG, na pesquisa em saúde oferece grandes possibilidades, possibilitando aos pesquisadores aplicação de novos métodos para o manejo de sua informação espacial, tornando-se uma poderosa ferramenta para conexão entre saúde e ambiente. O ambiente do SIG oferece margem à integração de informações diversas, as quais poderão proporcionar visão mais abrangente da situação no espaço. No entanto, a avaliação do pesquisador é imprescind́ıvel, pois não há mecanismo automático para a interpretação dos resultados constrúıdos (Hino et al., 2006). O SIG tem potencial para ser um grande aliado tecnológico a serviço do planejamento, monitoramento e avaliação das ações de saúde da região. A utilização dessa técnica tende a aumentar, seja na comparação e acompanhamento das estat́ısticas vitais ou na organização espacial de serviços de saúde e recursos humanos (Hino et al., 2006). O que também deve ser levado em conta é a articulação de diferentes setores e instituições, como as que foram mapeadas e geoprocessadas no presente estudo e que configuram instâncias de organização da comunidade (famı́lia, escola, universidade e governo). A partir delas, que representam diferentes setores sociais ou governamentais, pode- se iniciar uma ação intersetorial, com posśıveis efeitos sinérgicos, no desenvolvimento econômico social, na superação da exclusão social e na melhoria da qualidade de vida da população local (Chiesa et al., 2002). 50 da Silva, Araujo & Israel “Nessa lógica, a escola não se limita ao ensino. O serviço de saúde não se limita ao atendimento das intercorrências ou ações preventivas. O ginásio de esportes não se limita a oferecer seu espaço e equipamentos. Cada serviço sediado numa dada comunidade compõe uma rede de ação social. Essa rede deve articular-se para identificar os problemas e encaminhar soluções integradas” (Junqueira, 1998, p. 19). 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Introdução O objetivo deste caṕıtulo é revisar e atualizar os principais recursos, técnicas e métodos da Fisioterapia neurofuncional aplicada à infância na atualidade, para assim trazer evidências conhecidas e atualizadas sobre seus efeitos em crianças. A Fisioterapia busca promover ao máximo a independência funcional, por meio do ganho de habilidades motoras utilizando técnicas e métodos com base em conhecimento cient́ıfico que propõem a realização de movimentos em diferentes condições ambientais e com diversos instrumentos. Existe uma enorme variedade de recursos, tidos como mais tradicionais até recursos alternativos. Com base na prática e experiência cĺınica das autoras, buscou-se em diversas bases de dados, livros, sites dos conselhos, informações sobre métodos de intervenção em neuropediatria com combinações de termos de métodos, técnicas e/ou recursos já consagrados e conhecidos, assim como novos recursos, com objetivo de explanar as atualizações e evidências cient́ıficas do uso dos métodos e recursos dispońıveis para crianças t́ıpicas ou com desordens neuromotoras. Foi realizada uma revisão integrativa seguindo 6 passos: pergunta norteadora; busca na literatura; coleta de dados; análise cŕıtica dos estudos inclúıdos; discussão dos resultados e revisão integrativa. Após a seleção de artigos, foram discutidos os seguintes temas: 1. Métodos e/ou técnicas utilizados pela Fisioterapia, 2. Métodos Integrativos e 3. Recursos Auxiliares Adicionais. ∗Autor para contato: ribasmelo@gmail.com Luize Bueno de Araujo & Vera Lúcia Israel (Ed.), (2017) DOI: 10.7436/2017.dcfes.05 ISBN 978-85-64619-19-7 ribasmelo@gmail.com 54 Mélo et al. 1.1 Panorama da intervenção em Fisioterapia neurofuncional Os programas de intervenção em Fisioterapia neurofuncional, adulto ou infantil utilizam-se de procedimentos com fundamentação teórica baseada no controle dos movimentos pelo sistema nervoso central (SNC) (Bertoldi et al., 2011) e na promoção, prevenção (Bertoldi et al., 2011; David et al., 2013) e recuperação das funções sensório-motoras (Bertoldi et al., 2011) buscando alinhamento, simetria e a melhor qualidade da funcionalidade motora. Na Fisioterapia neurofuncional infantil, também denominada de Fisioterapia em neuropediatria, de maneira geral, os exerćıcios terapêuticos objetivam melhora da funcionalidade (atividades motoras, marcha) otimizando as capacidades e desempenhos da criança em atividades e participação (Bailes et al., 2010). A Fisioterapia tem como objetivo funcional final a promoção do máximo de independência (Gannotti et al., 2014). Dentro desse papel o fisioterapeuta intervém de forma a facilitar o ganho dessas habilidades motoras por meio do incentivo de atividades f́ısicas (Bailes et al., 2011), ao utilizar técnicas e métodos com base em conhecimento cient́ıfico e evidências, desde recursos tidos como mais tradicionais até recursos hoĺısticos e terapias integrativas (Schorne et al., 2015) que buscam integrar a criança em suas dimensões afetivas, cognitivas e motoras (Israel & Bertoldi, 2010). Toda intervenção para ser considerada efetiva deve ser capaz de produzir mudanças nos domı́nios de atividade e participação pelo modelo da Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF), assim como na qualidade de vida (Damiano, 2009). Neste sentido, a intervenção deve envolver motivações que contribuam para alterações nas estruturas e funcionalidade corporal, bem como adequações e otimizações ambientais, para promover a melhor interação entre o indiv́ıduo e o ambiente (Israel & Bertoldi, 2010). Cabe ressaltar que para atender as necessidades individuais de cada criança, muitas vezes é necessário combinar possibilidades e recursos terapêuticos, dessa forma, a seguir o caṕıtulo é estruturado com a revisão e atualização sobre os principais recursos, técnicas e métodos da Fisioterapia neurofuncional, apresentando as evidências e efeitos em crianças. 1.2 Apresentação e discussão sobre os recursos, métodos e técnicas Após análise exploratória de recursos, métodos e/ou técnicas da Fisioterapia neurofuncional na infância, os dados estão apresentados e discutidos nas seguintes categorias apresentadas na Figura 1. Fisioterapia Neurofuncional 55 Figura 1. Categorias de atenção em Fisioterapia. Fonte: as autoras 2. Métodos ou Técnicas Utilizados pela Fisioterapia 2.1 Cinesioterapia A forma de intervenção mais tradicional é a cinesioterapia convencional que utiliza de exerćıcios com finalidade terapêutica, foi uma das primeiras técnicas a ser utilizada como tratamento, sendo precursora e a base de métodos e/ou técnicas. A cinesioterapia, como o próprio nome diz, é a terapia pelo movimento, na qual são utilizados exerćıcios que melhoram a função motora, força muscular, a resistência à fadiga, coordenação e a flexibilidade, por meio de exerćıcios passivos, ativos e ativos resistido para prevenção, reabilitação ou ainda manutenção de determinadas funções motoras. Tem como base teórica os conhecimentos anatômicos do corpo humano, aplicados de acordo com a capacidade e demandas de cada pessoa (Conti, 2011). A seguir são descritos vários métodos de intervenção que se apropriam da cinesioterapia na atuação em neuropediatria. 2.1.1 Intervenção ou Estimulação precoce O termo intervenção, estimulação e/ou atenção precoce embora ainda seja tema de discussão e não tenha definição de uma única nomenclatura, é amplamente utilizado (Costa, 2013) e consiste em programas de intervenção voltados preferencialmente para detecção e intervenção de crianças do 56 Mélo et al. nascimento até os 5 anos de idade (Blauw-Hospers & Hadders-Algra, 2005; Hadders-Algra, 2011), com peŕıodo cŕıtico descrito aos 7 meses (Hadders- Algra, 2011), preferencialmente com ińıcio antes dos 9 meses de idade corrigida (Blauw-Hospers & Hadders-Algra, 2005), considerados peŕıodos cŕıticos de plasticidade neural (Hadders-Algra, 2011). Preferencialmente deve ter foco de atenção primária e preventiva por meio de avaliações de atividades f́ısicas e demais fatores relacionados ao desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM) (David et al., 2013). Essa intervenção é evidenciada como benéfica até mesmo em neonatos prematuros, com efeitos positivos na mobilidade ativa, DNPM e como incentivo à mineralização óssea (Eliakim et al., 2001; Litmanovitz et al., 2003; Moreno et al., 2011), além de auxiliar no ganho de peso, e ńıveis séricos de leptina o que também poderia estar relacionados a maiores ńıveis de atividade f́ısica ao longo da vida (Eliakim et al., 2001). No entanto outros estudos ainda são inconclusivos ou não apresentam respostas significativas com relação à intervenção precoce sobre os aspectos motores, e com alguma evidência de ganho nos aspectos cognitivos (Hielkema et al., 2010; Hadders-Algra, 2011; Hielkema et al., 2011). Em populações at́ıpicas, como no caso da śındrome de Down, evidências apontam efeitos significativos na aprendizagem e desenvolvimento por meio de programas de intervençãoprecoces, sendo esses efeitos observados a longo tempo (Connolly et al., 1984). Com relação à frequência e intensidade desses programas dos 0-4 anos existem protocolos variados em intensidade e tempo de intervenção (20- 30’), assim como em frequência (1 a 6 vezes por semana), geralmente com maior frequência para protocolos com tempo de intervenção menores a 30 minutos (Timmons et al., 2012). Em prematuros, intervenções realizadas ao menos 1x/semana em lactentes são consideradas intensas enquanto as realizadas 1x/mês são menos intensas (Blauw-Hospers & Hadders-Algra, 2005). Independente de todas essas lacunas referentes à quantidade e intensidade parece haver um consenso de melhores evidências em abordagens contextuais e/ou ecológicas, em que o ambiente e atividades diárias sejam enfatizadas não só na terapia mas também em seu contexto familiar (Ahl et al., 2005), e assim esses programas de intervenção trazem melhores resultados quando associados à intervenção da criança em seu ambiente real, seja ele o seu lar e/ou creche. 2.1.2 Terapia de Neurônios Espelho O prinćıpio para utilização de espelho em terapia, com objetivo de realizar a Terapia por Neurônio Espelho (TNE) surgiu com descobertas na década de 90, sobre a existência de neurônios espelhos nos lobos frontais e parietais. Na TNE os exerćıcios são realizados em frente ao espelho com objetivo de fornecer feedback visual para o membro parético, simulando a execução Fisioterapia Neurofuncional 57 de movimentos normais pela imagem do movimento não parético (Pereira et al., 2013). A TNE baseia-se no que a neurociência chama de “sistema de espelho”: ao observar uma atividade motora o organismo pode ser capaz de apreender indiretamente apenas observando aquele movimento. Ainda não existem informações detalhadas se essa aprendizagem ocorre apenas para atividades motoras mais elevadas ou ocorre também em atividades sensório-motoras básicas (Watanabe et al., 2011). Uma revisão sistemática atual (Bruchez et al., 2016) verificou que a terapia espelho não tem efeito terapêutico significativo em crianças com hemiparesia, no entanto, o treinamento simultâneo do membro superior melhora a força muscular, a função e o uso diário do membro superior parético. A maior parte dos estudos é na população adulta, com evidência de melhora da coordenação motora, força de preensão manual em membro parético de paciente com Acidente Vascular Encefálico (AVE) (Pereira et al., 2013), e com Paralisia Cerebral (PC) (Gygax et al., 2011). 2.1.3 Terapia por Contensão induzida A Terapia por Contensão Induzida (TCI) é um tipo de intervenção intensiva que visa à recuperação da função do membro superior (MS) parético de pacientes com sequelas neurológicas e que apresentem hemiparesia. A técnica é composta por três prinćıpios, sendo eles, o treino de tarefa orientada, a restrição do membro superior menos afetado durante 90% do dia e a aplicação de um conjunto de métodos comportamentais para adesão e transferência dos ganhos para as atividades funcionais do dia-a-dia do paciente (Silva et al., 2010), sendo apontado como forma de intervenção com ńıvel de evidência alta em crianças hemiparéticas (Damiano, 2009) e prefeŕıvel quando comparado a métodos como Conceito Neuroevolutivo e Facilitação neuromuscular proprioceptiva (Silva et al., 2010). Há estudo (Gordon et al., 2007) que critique o uso da técnica em crianças quando comparado a adultos pelo motivo que a criança, diferentemente do adulto, provavelmente não teve, ou teve por curtos peŕıodos, experiência prévia de movimento t́ıpico. Outro motivo seria que na prática diária muitas das funções exigem uso bimanual, sugerindo alternativas de treinamento intensivo semelhante ao da TCI só que com uso bimanual, denominando de HABIT (Hand Arm Bimanual Intensive Therapy) traduzido como terapia intensiva bimanual de membros superiores (Gordon et al., 2007). 2.1.4 “Objetivo voltado/orientado à tarefa” (Goal-Directed Task ) Ao realizar uma tarefa visuo-motora há diversos processos que, em conjunto, geram o movimento funcional (Nakayama et al., 2016). O aprendizado motor envolve circuitos neuronais complexos ainda não totalmente compreendidos. Percebe-se um maior envolvimento excitatório 58 Mélo et al. de neurônios ao propor uma atividade direcionada a um objetivo funcional (Yamashita & Petersen, 2016). A demonstração ou as especificações da atividade são o primeiro passo ao propor a ação, seguida pela preparação do indiv́ıduo para atingir o objetivo. Durante a função, neurônios de feedforward e feedback corrigem e mantém-se em sintonia com o objetivo, nas múltiplas fases que são necessárias na finalização da ação (Nakayama et al., 2016). Toda essa ativação cognitivo-motora é capaz de desenvolver e/ou incrementar, em especial, atividades funcionais. Há relatos de que o treino voltado à tarefa reduz o tempo de execução da função cognitivo-motora, além de melhorar aspectos como a precisão e a coordenação motora (Hung et al., 2010; Yamashita & Petersen, 2016). 2.1.5 Coordenação Bimanual Atividades que envolvem a utilização de ambos os membros são comuns e rotineiras na vida diária, e a dificuldade de realizar essas atividades traz limitações funcionais (Kazennikov et al., 2002). A coordenação bimanual promove a coordenação motora, com envolvimento do planejamento motor e conta com duas maneiras de utilização dos membros superiores: a coordenação bimanual simétrica utiliza ambas as mãos com ação motora semelhante, como por exemplo, bater palma ou carregar um objeto grande; na coordenação bimanual assimétrica, cada mão executa uma tarefa diferenciada, como exemplo, o uso de talheres, com a estabilização do alimento pelo garfo, e o corte com a faca (Hung et al., 2013). Propostas de atividades sequenciais como, abrir uma gaveta e pagar um objeto, são bastante utilizadas nas propostas de atividades de coordenação bimanual assimétrica (Hung et al., 2010). Essa habilidade é desenvolvida tipicamente nas crianças, com melhoras significativas até os 5 anos de idade, com cont́ınuo aprimoramento até os 15 anos, sendo realizado mais facilmente atividades bimanuais simétricas, e posteriormente desenvolvida a habilidade motora bimanual assimétrica (Hung et al., 2013). A proposta de treino com essas atividades abrange ainda controle postural de estabilização e posição de outros segmentos corporais, controle cognitivo e a seletividade de ativação muscular, sinergia, redução de estereotipias (Kazennikov et al., 2002). Os estudos experimentais têm dado ênfase no tratamento de crianças com sequela envolvendo um dos membros superiores, como hemiparesias e monoparesias de membro superior (Hung et al., 2010, 2013). 2.1.6 Terapia Neuromotora Intensiva (TNMI), PenguimSuitr, AdeliSuitr, Pedia Suitr, TheraSuitr As terapias neuromotoras intensivas surgiram da proposição de que a intensificação do treinamento poderia ocasionar maiores ganhos funcionas Fisioterapia Neurofuncional 59 (Bower et al., 1996), embora ainda não haja consenso da melhor intensidade e frequência no treinamento (Bailes et al., 2010). Em crianças define-se como intensivas, ou terapias neuromotoras intensivas, rotinas com curtos peŕıodos de 2 (Bower et al., 1996) a 3-4h por dia de exerćıcios (Bar-Haim et al., 2006; Carr et al., 2006; Bailes et al., 2008; Christy et al., 2010) 5 vezes por semana (Scheeren et al., 2012) intercalados com longos peŕıodos de descanso ou terapia convencional (Christy et al., 2010). Os peŕıodos de descanso entre os módulos são justificados tanto pela questão do estresse ocasionado pelas atividades intensivas como pela necessidade da criança se envolver em outras tarefas que não somente a reabilitação (Christy et al., 2010). É uma terapia que tem alto custo, envolve dedicação exclusiva e para algumas crianças o uso do traje pode ser desconfortável(Bailes et al., 2011). Nos Estados Unidos estima-se que cada módulo pode custar 10 mil dólares (Christy et al., 2010). Dentre as TNMI há denominações espećıficas relacionadas ao tipo de vestimenta e protocolo. De maneira geral encontraremos citações sobre Penguimsuitr, AdeliSuitr (Shvarkov et al., 1997; Bar-Haim et al., 2006), TheraSuitr (Bailes et al., 2010), Pedia Suitr (Scheeren et al., 2012) e Terapia Neuromotora Intensiva (TNMI) (Neves et al., 2013, 2014), todos com propostas semelhantes e alguns diferenciais quanto a vestimenta e o seu momento de colocação. De forma semelhante ao AdeliSuitr e TheraSuitr, o protocolo do Pedia Suitr é parecido ao do TheraSuitr e utilizado na TNMI. De forma geral a TNMI, assim como as demais terapias com protocolo intensivo consiste em: a) Aquecimento (incluindo massagem, alongamento, cinesioterapia com mobilização ativa); b) Exerćıcios resistidos em membros inferiores e superiores (gaiola com cinesioterapia ativo resistido); c) Exerćıcios resistidos com uso do traje (gaiola com os elásticos, prancha de equiĺıbrio, bola, rolos, feijão, cama elástica); d) Manobras de fisioterapia respiratória; e) Treino de marcha (com uso do traje em terrenos irregulares, escada, rampa, esteira, grama, barras paralelas sem e com obstáculos). Cada módulo é realizado durante 5 semanas, 4 horas seguidas por dia durante 5 dias na semana. Em cada sessão são previstas pausas para descanso, hidratação e/ou toalete (Scheeren et al., 2012; Neves et al., 2013). Com relação às evidências dos exerćıcios intensivos, são descritos ganhos de habilidades motoras independente da modalidade: Fisioterapia convencional, conceito neuroevolutivo ou terapias com trajes (Bower et al., 1996; Bar-Haim et al., 2006; Carr et al., 2006; Christy et al., 2010). Pesquisadores (Alagesan & Shetty, 2011) defendem que o traje 60 Mélo et al. (suit) associado à gaiola com os “elásticos” proporciona às crianças uma estabilização do tronco com consequente facilitação dos movimentos de membros superiores e inferiores ao mesmo tempo que estimula as aferências proprioceptivas, táteis e vestibulares, as quais agiriam de forma a estimular conexões cerebrais que foram acometidas com a lesão encefálica, permitindo funcionalizar o tônus, manter e melhorar o alinhamento postural, favorecer a aquisição da marcha, melhorar o equiĺıbrio e coordenação, força e resistência muscular. Há ainda o fato de serem evidenciados ganhos permanentes (Bar-Haim et al., 2006) em testes de retenção, o que leva a efetividade, assim como impactos positivos na funcionalidade e qualidade de vida (Dilenno & Atkinson, 2006), diferenças pela GMFM-88, mas não pela GMFM-66 e pela análise qualitativa do movimento (Carr et al., 2006). Contrariando esses achados pesquisas não evidenciaram diferenças nas funções motoras (GMFM-66) e nas AVD’s (PEDI) com uso desse tipo de intervenção (Bailes et al., 2008). Há ainda autores que identificaram que possivelmente a intensidade dos exerćıcios e não o uso do traje seria responsável pelos efeitos positivos pela GMFM-66 e PEDI (Bailes et al., 2011). Além disso, parece haver melhor resposta em crianças menos comprometidas, ńıveis I e II pelo GMFCS (Sistema de Classificação da Função Motora Grossa) (Christiansen & Lange, 2008). Alguns aspectos negativos nos protocolos intensivos de reabilitação são relatados e devem ser pensados e planejados no caso da escolha por esse tipo de intervenção: fadiga, abandono ao tratamento devido à intensidade dos mesmos (Christiansen & Lange, 2008) e alto custo (Christy et al., 2010). 2.1.7 Treino de marcha com suporte parcial de peso (SPP) A recuperação ou ganho da função da marcha em crianças com desordens neuromotoras é de grande expectativa para pacientes e familiares, principalmente para aqueles em que a marcha independente é dif́ıcil e, muitas vezes, quando realizado de forma at́ıpica (Haupenthal et al., 2008). Na PC cerca de 90% das crianças apresentam alguma dificuldade nessa função (Mattern-Baxter, 2009). O treino de marcha com suporte parcial de peso foi uma estratégia para facilitar o treino para pacientes, por reduzir as necessidades de ajustes posturais, assim como permitir ao fisioterapeuta um treino com maior segurança (Day et al., 2004; Damiano & DeJong, 2009). Trata-se de um treino espećıfico, orientado à tarefa, permitindo a simulação do padrão locomotor que por repetição poderia estimular os circuitos neurais (Day et al., 2004; Damiano & DeJong, 2009), com ativação de respostas automáticas rećıprocas (Mattern-Baxter, 2009). Crianças e familiares relatam melhora na qualidade de vida com esse tipo de intervenção (Dieruf et al., 2009). Há estudos que relatam melhora na velocidade e resistência da marcha durante a deambulação em crianças com PC (Dodd & Foley, 2007; Mattern-Baxter, 2009; Willoughby et al., 2010; Fisioterapia Neurofuncional 61 Kurz et al., 2011) e melhora na função da marcha em crianças com atraso no desenvolvimento (Lowe et al., 2015). Outros (Johnston et al., 2011) relatam que a melhora evidenciada não é superior ao treino convencional. Assim, quando analisados individualmente alguns estudos demonstram melhora, porém quando avaliados de forma sistemática existem limitações nas evidências (Molina-Rueda et al., 2010) e por esse motivo duas revisões sistemáticas (Damiano & DeJong, 2009; Mutlu et al., 2009) e uma meta- análise (Molina-Rueda et al., 2010) foram realizadas. Embora a maioria dos estudos seja voltada a crianças com PC, a evidência para essa população (Damiano & DeJong, 2009; Mutlu et al., 2009) assim como para os casos de lesão medular ainda é fraca, sendo verificada elevada evidência do treino com SPP para crianças com Śındrome de Down (Damiano & DeJong, 2009). Apesar das contradições com relação aos efeitos, vantagens ligadas ao método são: segurança para o paciente, possibilidade de fornecer o input sensorial e o terapeuta poder incentivar a tŕıplice flexão (movimento realizado durante a marcha), menor gasto energético para o paciente, controle do suporte de peso com objetivo de favorecer que seja realizado movimento voluntário e possibilidade de se aumentar a velocidade de treino devido ao suporte fornecido e o deslizamento da esteira (Haupenthal et al., 2008). O SPP utilizado varia, mas na maioria é de 30% de retirada de carga (Matsuno et al., 2010). Seu efeito positivo sobre a marcha de crianças PC é favorecido com treino em piso fixo provavelmente por se aproximar mais do ambiente real da criança (Matsuno et al., 2010). A intensidade e tempo de tratamento ainda não têm um consenso, necessitando de estudos com critérios melhor definidos (Haupenthal et al., 2008). 2.1.8 Conceito Neuroevolutivo / Bobath Conhecido como método Bobath ou Conceito Neuroevolutivo, foi criado e descrito por Berta Bobath e Karel Bobath (Sá et al., 2004; Castilho- Weinert & Forti-Bellani, 2011) na década de 40, com uma nova abordagem de intervenção, que até então apresentava base em modelos ortopédicos (Raine et al., 2013). É considerada uma das formas mais utilizadas no mundo por fisioterapeutas, e consiste em proporcionar estimulação e facilitação de movimentos de maneira a ensinar ao encéfalo lesionado as habilidades motoras dentro de padrões mais próximos do desenvolvimento t́ıpico. Não segue um protocolo espećıfico de treinamento e sim proporciona experiências de movimento com o fisioterapeuta facilitando a aquisição de habilidades funcionais. São realizados alongamentos, facilitações de movimento t́ıpicos, inibições de padrões at́ıpicos (Bar-Haim et al., 2006) tendo por base a capacidade de neuroplasticidade com possibilidade de recuperação funcional (Raine et al., 2013) para pessoas com desordens neuromotoras, sendo bastante utilizado em crianças com PC (Knox & Evans, 2002). 62 Mélo et al. Alguns estudos (Pagnussat et al., 2013) apontam que os manuseiose facilitações desse método propiciam maior ativação muscular e por consequência facilitariam o (re) aprendizado de movimentos, principalmente quando os movimentos são realizados em diagonais. Apesar da grande quantidade de adeptos dessa forma de intervenção, com foco em padrões de movimentos t́ıpicos, há poucas evidências de vantagens dessa forma de intervenção realizada de forma individualizada sobre as demais formas de tratamento. Sabe-se que o DNPM é multifatorial e relacionado a fatores contextuais e, quantificar isso dentro da terapia é complexo, não sendo posśıvel esperar que apenas um único método possa solucionar por si só a complexidade do DNPM (Butler & Darrah, 2001). Atualmente as evidências de efeitos dessa intervenção individualizada e baseada em facilitações e inibições são fracas (Damiano, 2009) até porque não parece haver prejúızo no uso de bolas e rolos para a reabilitação, mas também não parecem oferecem est́ımulos próximos ao variado ambiente real da criança (Dusing & Harbourne, 2010). Ainda assim é uma das formas mais utilizadas de tratamento por fisioterapeutas que atuam em intervenção em neuropediatria (Raine et al., 2013). 2.2 CuevasMedekr e Gravity Force Stimulation (GFS) Criado pelo fisioterapeuta chileno Ramon Cuevas (Cuevas, 2014), a Gravity Force Stimulation (GFS) busca “normalizar” o sistema sensorial por meio de exerćıcios e ativações para o sistema nervoso para regulação tátil, propriocepiva e vestibular. A GFS contribui para melhora funcional do equiĺıbrio e marcha. Utiliza recursos para suporte e estabilidade para promover alterações sobre o equiĺıbrio e habilidade de marcha, parte do pressuposto de que a ação da gravidade associada a produção de movimento contribuem para os ajustes posturais e funcionalidade (Thabet & Kamal, 2011). Apesar de já ser um método com bastante utilização em pacientes neurológicos, ainda são escassos os trabalhos que sugiram as evidências de seus efeitos. 2.2.1 Integração sensorial A terapia de integração sensorial utiliza a informação sensorial para emergência de padrões funcionais mais adequados. Isso porque crianças com desordens neuromotoras apresentam muitas vezes déficit das funções sensoriais, com repercussões sobre as funções motoras (Moberg-Wolff et al., 2013), uma vez que os sistemas interagem entre si para a execução da tarefa motora. Algumas técnicas utilizam seus prinćıpios e conhecimentos, como nas intervenções em ambientes multissensoriais. Fisioterapia Neurofuncional 63 2.2.2 Snoozelen / ambientes multissensoriais O Snoezelenr, foi desenvolvido na Holanda, em 1975 (Bauer et al., 2015), com a palavra indicando (snuefflen= procurar, explorar; doezelen= descanso, relaxamento) (Merrick et al., 2004) com objetivo de estimular a exploração do ambiente ao mesmo tempo em que incentiva aspectos cognitivos e emocionais, por meio da vivência sensorial em sala equipada com instrumentos, equipamentos e materiais que oferecem variabilidade de est́ımulos (Bauer et al., 2015) em diversos sentidos: tátil, visual, olfativo, auditivo, vestibular e proprioceptivo, por meio de equipamentos organizados em sala de estimulação (Lopes et al., 2015; Jamshidi Manesh et al., 2015). É utilizado para intervenção com crianças com desordens sensório-motoras, como a śındrome de Rett (Lotan & Shapiro, 2005), alterações intelectuais e/ou comportamentais (Merrick et al., 2004; Nasser et al., 2004). É, portanto um método de estimulação sensorial por meio da utilização de ambientes multissensoriais, tendo como prinćıpio teórico de que o ambiente natural apresenta uma diversidade destes est́ımulos (Merrick et al., 2004). 2.2.3 Plataforma vibratória Atualmente existem diferentes tipos de aparelhos de vibração utilizados para o treinamento e para a reabilitação f́ısica. Esses aparelhos propiciam oscilação que se propaga para todo o corpo, e que, terapeuticamente, devem sem combinados com alguma forma de exerćıcio e atividade muscular, com possibilidade de melhoras no desempenho da força dinâmica e da flexibilidade (Batista et al., 2007), espasticidade (Krueger-Beck et al., 2010; Ibrahim et al., 2014) com repercussões sobre a movimentação voluntária (Ibrahim et al., 2014) enquanto alguns estudos não evidenciaram qualquer tipo de efeito (Batista et al., 2007). Essa técnica vem sendo utilizada em várias condições de saúde, incluindo pessoas com alterações neuromotoras como a PC (Ahlborg et al., 2006; Ibrahim et al., 2014) e Doença de Parkinson (Ebersbach et al., 2008). Um estudo randomizado organizado por Ahlborg et al. (2006) realizado com adultos com paralisia cerebral verificou que intervenção de 8 semanas de treinamento com vibração promoveu aumento da força muscular, melhora da função motora grossa e melhora da espasticidade em extensores do joelho. 2.2.4 Equoterapia A equoterapia ou hipoterapia é uma forma de intervenção feita sobre o cavalo que oferece inputs sensoriais que auxiliam nos objetivos terapêuticos, por meio do movimento do cavalo (Dewar et al., 2015). É uma prática interdisciplinar da saúde, educação e equitação e deve ser feita após uma avaliação médica, psicológica e fisioterapêutica (Silva & Aguiar, 2008). 64 Mélo et al. Nesta prática o movimento tridimensional do galope do cavalo é um método cinesioterapêutico, psicológico, social e pedagógico de forma a ampliar o repertório motor e emocional do paciente, promovendo ajustes tônicos, alinhamento corporal, coordenação motora, força muscular, organização espacial e temporal, equiĺıbrio, flexibilidade, consciência corporal e controle de ansiedade (Silva & Aguiar, 2008; Araújo et al., 2010). São poucos os produtos cient́ıficos sobre o tema da equoterapia. Este método foi aprovado em 1997 pelo Conselho Federal de Medicina e a Lei 5499/05 inclui a equoterapia entre os serviços especializados oferecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) (Araújo et al., 2010). 2.2.5 Facilitação neuromuscular proprioceptiva (FNP) Conhecido como método Kabat, foi desenvolvido com base nos conceitos para recrutamento de unidades motoras, atividade reflexa, irradiação, indução e inervação rećıproca, de forma a que o movimento seja pela excitação dos motoneurônios, de forma que músculos fracos ou paréticos possam ser favorecidos. Os movimentos são realizados em padrões de sinergia muscular originando os padrões de movimentos funcionais almejados (Sá et al., 2004). 2.2.6 Psicomotricidade Pode ser considerada uma especialidade e constitui área de conhecimento e práticas de atuação multi e interdisciplinar. A psicomotricidade auxilia o indiv́ıduo a integrar suas atividades funcionais a percepção do movimento efetivo e promove a interação entre o gesto motor e o sentido social e ambiental da produção de movimento (Israel et al., 2014). Desta forma, tais atividades trabalham no desenvolvimento motor, sensorial, cognitivo, social e psicológico e ampliam a criatividade. Com utilização de estratégias lúdicas adequadas a cada faixa etária, que utilizam a brincadeira como recurso para o aprendizado com a utilização de dimensões como funções motoras, cognitivas e afetivas, com utilização de diferentes recursos como jogos e brinquedos de todos os tipos (Israel et al., 2014). Partindo do pressuposto que o processo de desenvolvimento progride do geral para o espećıfico, há a necessidade de se explorar a aquisição motora em todas as faixas etárias, de maneira global e variável, de acordo com cada sujeito. Para isso a psicomotricidade utiliza alguns elementos básicos como esquema corporal, estruturação espacial, lateralidade, orientação temporal, ritmo, motricidade global e espećıfica. Tais elementos favorecem o desenvolvimento de noções de tempo e espaço (Rossi, 2012). Neste sentido, as atividades lúdicas da psicomotricidade irão permitir que a criança desenvolva uma compreensão da formacomo seu corpo se move e das relações que ela faz com o ambiente que vive (Rossi, 2012). Fisioterapia Neurofuncional 65 Além de ser uma área de conhecimento utilizada para promoção, prevenção e reabilitação em saúde pode auxiliar na aprendizagem escolar, contribuindo para um fenômeno cultural que consiste de ações psicomotoras exercidas sobre o ser humano de maneira a favorecer comportamentos e transformações. 3. Métodos Integrativos Desde 1960 há uma busca por novas terapias na área de saúde, relacionadas a diferentes fatores, dentre eles, insatisfação da atenção em saúde fragmentada, mudanças no perfil do desenvolvimento das doenças com maior aparecimento das doenças crônico-degenerativas, aumento da expectativa de vida, busca por uma maior autonomia no processo terapêutico, dúvidas e receios quanto a reações adversas de intervenções medicamentosas e cirúrgicas e busca pelas causas das alterações em saúde (Otani & Barros, 2011). Essa busca pela integralidade em saúde acaba por estar em consonância com a visão contextual e ampliada da saúde proposta pela CIF na busca pela compreensão do indiv́ıduo em sua totalidade. Neste sentido, surgem as terapias integrativas que visam promover saúde de forma a equilibrar nossa vida. A integralidade ao cuidado à saúde, proposto pelas terapias complementares, é uma das diretrizes aprovadas na 8a Conferência Nacional de Saúde e colocada como prinćıpio doutrinário do Sistema Único de Saúde (SUS) (Thiago & Tesser, 2011). Tais técnicas buscam entender para que adoecemos, e assim, como tratamos a causa, origem dos nossos sintomas. Desta forma, as terapias alternativas aprofundam-se na causa dos problemas em saúde, normalmente explicados por questões de estilo de vida, experiências vividas de maneira traumática e em isolamento e relações ambientais (Otani & Barros, 2011). A busca por métodos alternativos de atenção em saúde tem crescido no mundo, em especial no Brasil, estes podem contribuir em todas as intervenções em saúde, buscando uma melhor adaptação à medicações e a própria desmedicalização parcial (Thiago & Tesser, 2011). Dentro deste paradigma de terapias integrativas, no cenário da atenção em saúde, destacam-se a Fisioterapia Aquática, Osteopatia, Leitura Biológica, Nova Medicina Germânica, Microfisioterapia e Bioalinhamento, técnicas inovadoras que buscam conhecer a causa das alterações em saúde (Schorne et al., 2015). Tais técnicas buscam por meio de terapia manual, investigar junto ao paciente o que os levou a desenvolver determinadas doenças. Pelo toque corporal e informações verbais do terapeuta e do paciente são aplicadas correções corporais na busca pelo equiĺıbrio corporal (Souza, 2015). Todos os métodos integrativos citados podem ser utilizados em crianças com desordens neuromotoras, porém escassos e até inexistentes 66 Mélo et al. são as publicações a respeito das mesmas, consistindo em uma lacuna que precisa de maiores investigações. 3.1 Fisioterapia aquática A Fisioterapia aquática (FA), também conhecida como hidrocinesioterapia ou hidroterapia é utilizada para reabilitação de crianças com desordens neuromotoras e como forma de promoção à atividade f́ısica (Garcia et al., 2012; Schmitz & Stigger, 2014), de maneira complementar à Fisioterapia convencional em solo. Nesse sentido a FA consiste em exerćıcios que utilizam as propriedades f́ısicas da água como pressão hidrostática, empuxo, flutuação, viscosidade, tensão superficial e turbulência (Israel & Pardo, 2000) quando em imersão (Schmitz & Stigger, 2014) para redução da dor, ganho de força e alongamento muscular (Camilotti, 2013) e, também utilizada na reabilitação de crianças favorecendo a funcionalidade (Schmitz & Stigger, 2014) e em outras patologias pediátricas (Fragala-Pinkham et al., 2009) para melhora na função motora grossa (Dimitrijevic et al., 2012; Lai et al., 2014). Alguns estudos sugerem limitada evidência para essa população, principalmente pela baixa qualidade metodológica dos estudos (Jacques, 2010; Gorter & Currie, 2011), e por questionar a possibilidade de transferência de aprendizagem motora (Silva et al., 2009), outros sugerem efeitos positivos, mas sem séries de casos sugerindo maiores investigações (Fragala-Pinkham et al., 2009). Há estudo que relate que a utilização da FA aumenta a adesão à intervenção e diminui o número de faltas à sessão, devido à motivação que o ambiente aquático proporciona aos pacientes (Fragala-Pinkham et al., 2009) provavelmente por funcionar como um ambiente lúdico (McManus & Kotelchuck, 2007). Em bebês de risco ao DNPM ainda são escassas as evidências cient́ıficas, podendo, no entanto, consistir em meio auxiliar e de estimulação diferenciada, a qual poderia favorecer o incremento de algumas habilidades motoras por meio de transferência de aprendizado. Essa transferência de aprendizado favorecida pelo ambiente aquático é citado no estudo de McManus & Kotelchuck (2007) em programas que associam a intervenção tradicional em solo mais a FA. Existem vários métodos e/ou formas de FA, um exemplo que considera aspectos de ganhos motores dentro da água, de forma gradual e com interação entre os participantes, é o método Halliwick. Esse método tem como prinćıpios a associação do controle da respiração, equiĺıbrio, liberdade de movimentos, e por esse motivo não indica uso de flutuadores (Garcia et al., 2012) e que permite a participação direta do familiar durante a terapia. Essa forma de FA também favorece o est́ımulo a atividades lúdicas e psicomotoras constituindo em fator ambiental à promoção de saúde e qualidade de vida (Garcia et al., 2012). Em crianças com PC evidências Fisioterapia Neurofuncional 67 sugerem melhor modulação do tônus e adequação postural por meio da FA (Yamaguchi et al., 2015). 3.2 Acupuntura A acupuntura é um método de intervenção que utiliza agulha para promover um est́ımulo-organizador e equiĺıbrio orgânico, por meio de um racioćınio terapêutico que envolve múltiplas variáveis a respeito da fisiologia (Bellotto Junior et al., 2005). No Brasil a utilização da acupuntura tem sido crescente, como forma de terapia integrativa, com necessidade de maiores comprovações cient́ıficas (Palmeira, 1990). Em crianças o uso de agulhas é realizado geralmente a partir dos 7 anos de idade, mas com poucas publicações em crianças com desordens neuromotoras. Uma alternativa ao uso em crianças é utilizar sementes em pontos na orelha (auriculoterapia) ou laser nos pontos de acupuntura. Estudos internacionais sobre acupuntura em crianças com desordens neuromotoras apresentam evidências divergentes: uma pesquisa em crianças com PC não encontrou diferença significativa na administração concomitante de acupuntura à Fisioterapia (Duncan et al., 2012). Outras pesquisas evidenciaram efeitos positivos em crianças com PC, na modulação da espasticidade (Dabbous et al., 2016), força muscular e aquisição do sentar em bebês (Zhang et al., 2015) e AVD’s (Yang et al., 2015). Também são percebidos efeitos positivos por meio da auriculoterapia em crianças com PC no tratamento de alterações associadas como ansiedade e distúrbios do sono (Lai et al., 2015), sem serem relatados efeitos adversos significativos, o que demonstra uma possibilidade terapêutica coadjuvante promissora, assim como a necessidade de maiores investigações cient́ıficas. Um estudo multicêntrico randomizado e controlado (Wu et al., 2015) verificou o efeito da acupuntura associada ao exerćıcio f́ısico na aprendizagem em pessoas com AVE. Participaram do estudo 364 pessoas divididas em grupo controle e experimental. Notou-se que o grupo experimental apresentou após 4 semanas de tratamento melhoras na função motora e redução dos comprometimentos neurológicos inclusive no peŕıodo de destreino que ocorreu até o 5 mês após o término doprograma de tratamento. 3.3 Osteopatia A osteopatia é uma técnica de terapia manual recentemente inserida no curŕıculo da Fisioterapia, faz diagnóstico palpatório de bloqueios tissulares e de manipulações em disfunções e/ou lesões, de maneira a promover uma melhora no que se encontra alterado. A osteopatia entende que a estrutura determina a função e devem ser tratadas de forma indissociada (Schorne et al., 2015). 68 Mélo et al. Foi criada nos Estados Unidos por Andrew Taylor-Still (1828-1917) e envolve várias técnicas espećıficas para tratar alterações neuromusculares para reduzir dor, aumentar a mobilidade das articulações e alongar de forma duradoura os tecidos moles que restringem a mobilidade, auxiliando a autocorreção corporal (Arcanjo et al., 2010). Assim como Gemelli (2014), a revisão sistemática de Cerritelli & Ruffini (2016) avaliou a eficácia da osteopatia em pacientes com doenças neurológicas e verificou que os estudos são escassos, heterogêneos e de baixa qualidade metodológica, o que reforça a necessidade da realização de mais estudos aprofundados na área. 3.4 Leitura biológica Outra técnica, recente no Brasil, é a Leitura Biológica ou também conhecida como Nova Medicina Germânica. A Leitura biológica tem por prinćıpio explicar a causa, o desenvolvimento e a cura das doenças, por meio da identificação do evento espećıfico desencadeador de alterações sistêmicas, incentivando assim o processo de auto-cura, podendo ser utilizada conjuntamente com a Microfisioterapia (Schorne et al., 2015). 3.5 Microfisioterapia A Microfisioterapia é um método de Terapia Manual desenvolvida na França em 1983 pelos fisioterapeutas e osteopatas Daniel Grosjean e Patrice Benini. Sua base teórica está na embriologia, filogênese e ontogênese. A Microfisioterapia consiste em identificar a causa primária de uma doença ou sintoma e estimular a autocura por meio de técnicas para reprogramação celular e tecidual (Schorne et al., 2015). Nessa técnica o fisioterapeuta realiza micropalpação seletiva dos folhetos embrionários, identificando memórias que se instalaram, e provocaram sintomas corporais (Schorne et al., 2015) de modo que o corpo reconheça o fator agressor e inicie o processo de correção e reparo da ação. A agressão pode gerar cicatrizes que atrapalham o funcionamento celular gerando um sintoma. 3.6 Bioalinhamento O Bioalinhamento por sua vez, foi desenvolvido no Brasil pelos Fisioterapeutas Adaylton Leonel de Souza, Adalton Leonel de Souza e Ćıntia Frigo Leonel. É um método que se baseia na relação entre os conflitos biológicos inscritos durante a vida e as “doenças” orgânicas por eles gerados, oferecendo uma abordagem transpessoal como elo alinhador das funções normais do organismo integral. Na terapia são utilizados toques corporais e informações verbais espećıficas como est́ımulos de correção da informação que gerou uma agressão ao organismo, gerando um sintoma. A técnica é ampliada por estudos da Nova Medicina Germânica, Embriologia e F́ısica Quântica, Fisioterapia Neurofuncional 69 além de noções de Antroposofia, Etologia Animal e Psicologia Transpessoal (Souza, 2015). 4. Recursos Auxiliares Adicionais 4.1 Bandagem neuromuscular A bandagem neuromuscular, também recebe a denominação de Kinesio Tapingr age por meio de estimulação de receptores somatossensoriais os quais são aferências do est́ımulo que ascendem à medula e córtex somatossensorial podendo então auxiliar na diminuição da dor. Além disso, tem como proposta corrigir a função muscular, auxiliar na estimulação sangúınea e linfática (Zavarize & Martelli, 2014). A Kinesio Taping (KT) especificamente foi desenvolvida por Kenzo Kase, na década de 80, no Japão e só cerca de 10 anos depois nos EUA (Zavarize & Martelli, 2014). O fato da bandagem ser elástica a faz funcional por permitir o movimento assim como fluxo de flúıdos (Zavarize & Martelli, 2014). Um ensaio cĺınico randomizado com grupo controle (Kaya Kara et al., 2015) sobre os efeitos da KT sobre as funções corporais e atividade de crianças (7-12 anos) com PC espástica unilateral identificou evidências de ser uma abordagem complementar promissora para aumentar o feedback proprioceptivo com consequente incremento da aptidão f́ısica, função motora grossa, e as atividades de vida diária em crianças com PC, porém devido a qualidade metodológica do estudo ainda não estar dispońıvel na base de dados PEDro, esses achados não devem ser extrapolados sem que sejam realizados mais estudos para ratificar seus efeitos. 4.2 TheraTogsr Constituem órteses por vestimentas compressivas de lycra, criadas por Beverly Cusick (Theratogs, 2016) com a proposta de facilitar o alinhamento, a postura e as atividades funcionais de crianças com desordens neuromotoras, devendo ser utilizada de maneira intensiva para serem evidenciados efeitos positivos (Flanagan et al., 2009; Moberg-Wolff et al., 2013). Esses efeitos foram confirmados para a função do equiĺıbrio, habilidades funcionais de crianças com PC ńıvel I pelo GMFCS (Flanagan et al., 2009) e marcha (Rojas et al., 2008; Flanagan et al., 2009; Kafy et al., 2013; El-Kafy, 2014). Alguns pontos negativos são relatados: desconforto da criança, utilização do banheiro e higiene, calor com uso do traje (Flanagan et al., 2009). 70 Mélo et al. 4.3 Órteses As órteses são dispositivos que tradicionalmente são utilizados, em especial para crianças e em casos de comprometimentos neurológicos. Esse dispositivo gera forças externas que facilitam função motora e/ou o posicionamento buscando alinhamento corporal. Minimizam ou corrigem encurtamentos e deformidades, melhoram a qualidade ao movimento, evitando padrões at́ıpicos, desequiĺıbrio, favorecendo o desempenho neuromotor e a independência f́ısico-motora. O fisioterapeuta auxilia a equipe a planejar e executar estratégias de utilização das órteses, além de treinar seu uso e orientar os cuidados (Oliveira et al., 2010; Carvalho, 2013). O uso de órteses em crianças com PC traz melhoras significativas nos parâmetros qualitativos da marcha, bem como no desempenho motor grosso, quando comparado essas variáveis executadas com e sem o uso de órteses, o que impacta positivamente nos domı́nios de atividade e de participação da CIF para essas crianças (Cury et al., 2006). 4.4 O WalkAide Devido a diversas doenças neurológicas, muitas crianças desenvolvem padrões at́ıpicos de marcha por fraqueza muscular e aumento de tônus em membros inferiores. As órteses buscam dentro de suas possibilidades promover melhores padrões de marcha. Como formas mais funcionais de órteses temos hoje o WalkAide (Nogueira Neto et al., 2010). O Walkaide é um estimulador neuromuscular de único canal funcional de uso externo que opera a bateria, indicado para pacientes com redução de força de dosiflexores do tornozelo em decorrência de lesões neurológicas. Na fase de balanço da marcha o WalkAide estimula os músculos dorsiflexores otimizando a passada. Ainda como benef́ıcios do aparelho são observados a redução da fraqueza e ganho de força muscular, aumento do fluxo sangúıneo e manutenção ou ganho amplitude do movimento articular e redução de espasticidade dos flexores plantares (Nogueira Neto et al., 2010). Este aparelho já foi testado em pessoas com alteração da marcha em decorrência de lesão medular, paralisia cerebral, esclerose múltipla, traumatismo crâneo-encefálico e acidente vascular encefálico tendo resultados positivos de melhora funcional da marcha em até duas semanas de utilização. São contraindicações para o seu uso: marca-passo card́ıaco, trombose na área de aplicação, convulsões, neuropatia periférica, śındrome de Guillain-Barré, śındrome pós-pólio, alterações do membro inferior por trauma direto e alterações secundárias a cirurgias de coluna, quadril e joelho. 4.5 Estimulação elétrica funcionalA eEstimulação Elétrica Funcional (EEF), do inglês Funcional Eletrical Stimulation (FES) ou eletroestimulação, é uma modalidade terapêutica Fisioterapia Neurofuncional 71 auxiliar com o intuito de recrutar seletivamente músculos que apresentem déficit de força e contração por motivos diversos, de forma conjunta aos exerćıcios propostos ou para auxiliar no incremento de efeitos de toxina botuĺınica (Gunel, 2009). Há evidência de que o FES associado com o treino de controle de tronco em crianças com PC tem efeito superior ao da reabilitação sem eletroestimulação (Park et al., 2001; Karabay et al., 2012; Dewar et al., 2015), sendo o mesmo identificado no treino de força muscular de membros inferiores (Stackhouse et al., 2007). Esta técnica apresenta vantagem por ser uma forma não invasiva e auxiliar para os ganhos terapêuticos, devendo ser priorizado uso concomitante em atividades funcionais. As formas de eletroestimulação podem ser divididas em 2 tipos: estimulação neuromuscular, do termo em inglês NeuroMuscular Electrical Stimulation (NMES) e estimulação elétrica limiar/limite, do inglês Threshold Electrical Stimulation (TES), ambas correntes alternadas. A NMES é a aplicação de uma corrente em intensidade que permita contração muscular com o objetivo de fortalecimento muscular pelos seguintes prinćıpios: aumento da área de secção transversa do músculo pelo est́ımulo de contração e recrutamento de fibras tipo II (mais largas e de fibras de maior calibre). Ao uso de NMES de forma funcional, associada ao movimento é que se dá o nome de FES, amplamente utilizado (Kerr & McDowell, 2014). A TES seria uma corrente que promove contração mais fraca, a ser usada durante o sono com objetivo de aumentar irrigação sangúınea e a secreção de hormônios que estimulam massa muscular, com evidências ainda não claras sobre esses efeitos (Kerr & McDowell, 2014). 4.6 Imagética motora ou prática mental A imagética do movimento consiste em imaginar o movimento por meio de prática mental, combinando processos cognitivos aos sentidos. Isto porque as experiências sensoriais são capazes de potencializar novas aprendizagens motoras assim como mantê-las (retenção), sendo um recurso auxiliar útil na reabilitação neurofuncional (Sant’Anna et al., 2014). É uma proposta diferenciada das demais por enfatizar mais os processos cognitivos mentais envolvidos no movimento, do que a repetição de movimentos incentivada nas demais formas de intervenção (Dickstein & Deutsch, 2007; Steenbergen et al., 2009). É um recurso eficiente para utilização em tarefas motoras mais espećıficas, embora ainda não haja um consenso de tempo de intervenção e tipo de instrução fornecida (Sant’Anna et al., 2014; Wilson et al., 2016). A explicação para esta técnica baseia-se no prinćıpio de que ao imaginar estar-se-ia ativando a rede neural responsável pela execução do movimento e sendo o encéfalo plástico, essa prática poderia levar a modificações e ganho de habilidades motoras (Sant’Anna et al., 2014) por incentivar 72 Mélo et al. práticas antecipatórias, as quais são prejudicadas em crianças com PC (Steenbergen et al., 2009) devendo ser utilizada de forma complementar na intervenção fisioterapêutica (Dickstein & Deutsch, 2007). Esses efeitos positivos foram evidenciados em crianças com alterações da coordenação motora (Wilson et al., 2016), e em crianças com PC (Cabral et al., 2010; van Elk, 2013). Isso porque a alteração na PC não é somente na execução do movimento, envolve também alteração no planejamento motor (Steenbergen et al., 2009; van Elk et al., 2010). Sugere-se que este recurso tenha potencial terapêutico para crianças com PC hemiparética, porém sem ser conhecida idade ideal nem intensidade adequada para esse tipo de intervenção (Steenbergen et al., 2009). 4.7 Biofeedback O uso de dicas externas e de estratégias cognitivas é considerado estratégias auxiliares na aprendizagem de movimento. Nesse sentido o biofeedback consiste em um instrumento para o ajuste (adaptação e readaptação) de estratégias motoras (Cortés et al., 2010). O objetivo do feedback é realimentar constantemente o indiv́ıduo com relação às informações dinâmicas durante seu treinamento, tendo como vantagem permitir que pequenas mudanças no movimento sejam avisadas e recompensadas e gradualmente transformadas em mudanças maiores, ao mesmo tempo que age de maneira motivacional, ensinando a pessoa a ter melhor controle sobre seu corpo (Cruz, 2003). 4.8 Gameterapia ou terapia por realidade virtual (TRV) A terapia com uso de videogame, denominada gameterapia ou ainda Terapia por Realidade Virtual (TRV) consiste numa forma de treinamento funcional e terapêutico, a qual apresenta abordagem motivacional, com efeitos já comprovados sobre a função da marcha, equiĺıbrio, treino de força e de aquisições de habilidades motoras em crianças com PC, com efeitos superiores aos evidenciados no treino de marcha na esteira sem o uso de realidade virtual (Cho et al., 2016), está relacionada a est́ımulo de neuroplasticidade em crianças com PC evidenciadas por imagens neurológicas funcionais (You et al., 2005). A TRV pode ser utilizada em conjunto com outras formas de intervenção já mencionadas, funcionando como forma de feedback instantâneo para a realização dos exerćıcios (You et al., 2005). Devido a sua forma de interação instantânea permite um maior est́ımulo para a criança no que diz respeito à orientação espacial (Cho et al., 2016), fator esse alterado na maioria das crianças com desordens neuromotoras, seja pelos efeitos diretos das lesões neurológicas ou em decorrência das limitações e restrições que essas crianças apresentam na exploração do meio (Lowe et al., 2015). Fisioterapia Neurofuncional 73 O estudo de Bedair et al. (2016) verificou que o uso dos jogos de realidade virtual na função do MS de crianças hemiparéticas espásticas melhora significativamente a manipulação de objetos, habilidade motoras e funções do MS, uma vez que essa terapia estimula a participação ativa das crianças por meio da motivação. Além disso, a TRV é considerada uma forma segura e agradável, que ocasiona mudanças nas soluções à tarefa para a criança, incentivando seus circuitos neurais e que promove aumento da concentração da criança na função treinada (Cho et al., 2016). 4.9 Estimulação elétrica transcraniana A Estimulação Elétrica Transcraniana (EET) trata-se de uma forma de intervenção não invasiva, pela aplicação de estimulação elétrica por meio de eletrodos sobre áreas cranianas, de forma a ativar áreas corticais a ser utilizada de maneira funcional (Stagg et al., 2011), na prática de movimentos, sendo encontrados efeitos significativos de uso da EET associado a treino de marcha combinado com realidade virtual sobre parâmetros espaço-temporais da marcha (cadência e velocidade) de crianças com PC do tipo diparesia (Collange Grecco et al., 2015), assim como sobre o equiĺıbrio (Lazzari et al., 2017). Isso seria decorrente provavelmente do efeito anodal sobre córtex motor primário, regulando a excitabilidade (Stagg & Nitsche, 2011). Além disso, efeitos positivos foram encontrados em crianças e adolescentes com epilepsia, esquizofrenia e outros distúrbios do comportamento (Palm et al., 2016), sendo necessárias maiores investigações sobre seu uso. 4.10 Organização das técnicas conforme os níveis de atenção em saúde Pode-se perceber que as terapias descritas neste estudo podem ser utilizadas na atenção à saúde, desde a promoção até a reabilitação em saúde, a partir deste pensamento, foi criada Tabela 1. Nesta tabela são apresentadas as diversas terapias utilizadas na atenção da saúde infantil e seus peŕıodos de inserção na atenção à saúde. 5. Reflexões e Considerações Finais A abordagem deste caṕıtulo possibilitou observar que atualmente aFisioterapia neurofuncional infantil conta com um arsenal diverso de possibilidades para aperfeiçoar os programas de intervenção. Sugere-se que estudos considerem o ńıvel de intensidade de exerćıcio necessário para que ganhos permanentes com melhoras funcionais sejam 74 Mélo et al. T a b ela 1 . U tiliza çã o d o s m éto d o s e recu rso s d a F isio tera p ia em n eu ro fu n cio n a l in fa n til d e a co rd o co m o s ń ıv eis d e a ten çã o . P r o m o ç ã o P r e v e n ç ã o R e a b ilita ç ã o O steo p a tia * * √ √ √ G a m etera p ia e T era p ia p o r R ea lid a d e V irtu a l (T R V ) √ √ √ P sico m o tricid a d e √ √ √ M icro fi sio tera p ia * √ √ √ B io a lin h a m en to √ √ √ A cu p u n tu ra / A u ricu lo tera p ia √ √ √ S n o o zelen / A m b ien tes m u ltissen so ria is √ √ √ P la ta fo rm a V ib ra tó ria √ √ √ L eitu ra B io ló g ica √ √ √ F isio tera p ia a q u á tica * √ √ √ In terv en çã o o u E stim u la çã o p reco ce √ √ √ C in esio tera p ia √ √ √ T era p ia d e N eu rô n io s E sp elh o √ E q u o tera p ia √ V ib ra çã o √ C o n ceito n eu ro ev o lu tiv o √ F a cilita çã o n eu ro m u scu la r p ro p rio cep tiv a (F N P ) √ T era p ia N eu ro m o to ra In ten siv a (T N M I) √ P en g u im S u it r , A d eliS u it r , P ed ia S u it r , T h era S u it r √ T rein o d e m a rch a co m su p o rte p a rcia l d e p eso (S P P )* √ C u ev a sM ed ek r / G ra vity F o rce S tim u la tio n (G F S ) √ T era p ia C o n ten sã o in d u zid a √ G oa l-D irected T a sk √ C o o rd en a çã o B im a n u a l √ Im a g ética M o to ra o u p rá tica m en ta l √ B io feed b a ck √ Ó rteses √ E stim u la çã o E létrica F u n cio n a l √ E stim u la çã o E létrica T ra n scra n ia n a √ * E sp ećıfi ca s d a F isio tera p ia , * * esp ećıfi ca s d a F isio tera p ia n o B ra sil. Fisioterapia Neurofuncional 75 obtidos (Bar-Haim et al., 2006), independente da denominação do método empregado. Observa-se que de maneira geral as técnicas mais tradicionais e espećıficas apresentam maior quantidade de publicações quando comparadas aos métodos integrativos ou recursos adicionais, porém mesmo quando há publicação cient́ıfica, esta não atinge toda a diversidade de possibilidades de alterações neurofuncionais pediátricas, como no caso da TCI, que possui vários artigos publicados, porém relatam seus afeitos apenas na hemiparesia. Provavelmente essa dificuldade de elevada evidência se dê pelo fato da maioria dos casos de pesquisas na Fisioterapia nessa área, os estudos não são randomizados, há uma heterogeneidade da amostra, mesmo quando estipulados critérios de inclusão e a maioria das crianças realizam vários tipos de intervenções na busca de um melhor efeito posśıvel. 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Introdução No ińıcio da civilização o homem tinha que caçar seu próprio alimento, e para isso, ele corria, pulava, nadava, escalava, ou seja, realizava atividades f́ısicas intensas para sua sobrevivência ao mesmo tempo que cuidava e criava de sua prole, atividade destinada mais às mulheres. Atrelada à Revolução Industrial no século XVIII (Aguiar, 2009) e depois da Segunda Guerra Mundial houve profundas mudanças sociais, com a inserção da mulher no mercado (Tardido & Falcão, 2006), o que ocasionou uma modificação na forma de cuidar das crianças, que agora permaneciam em locais denominados creches (Aguiar, 2009). Além disso motivou-se a fabricação de alimentos pré-preparados (Aguiar, 2009) com consequentes mudanças nos perfis epidemiológicos e aumento de doenças crônicas relacionadas aos hábitos de vida (Tardido & Falcão, 2006). Isso configura um novo modelo de cuidar e/ou educar. Se antes as crianças eram criadas em casas, ambientes espaçosos, onde podiam correr e brincar, até mesmo na rua, com o tempo com a urbanização e violência, e as crianças passaram a ficar dentro de casa, em apartamentos com pouco espaço para de desenvolver, e/ou sob cuidados muitas vezes de outras pessoas que não os pais, como familiares e/ou babás e ainda podendo esse cuidado ser terceirizado nas creches. No ińıcio desse século novas ferramentas e instrumentos estão possibilitando transformações sociais (Brito & da Purificação, 2008). ∗Autor para contato: ribasmelo@gmail.com Luize Bueno de Araujo & Vera Lúcia Israel (Ed.), (2017) DOI: 10.7436/2017.dcfes.06 ISBN 978-85-64619-19-7 ribasmelo@gmail.com 90 Mélo & Fink Assim, as novas tecnologias da informação e comunicação1, representadas pelas mı́dias, estão presente em praticamente tudo que nos cerca, desde televisores com controle remoto, aparelhos que lavam e secam a roupa e a louça, videogames, carros, tablets e celulares, e esse acesso está cada vez mais fácil para as crianças, incluindo mı́dias educativas2. Antigamente as brincadeiras de crianças entre elas eram a principal forma de entretenimento, geralmente em espaços amplos, e atualmente são restritas ou trocadas por outras formas de diversão, por meio de recursos tecnológicos atrativos, que muitas vezes funcionam como “babás” substituindo o cuidado e tempo dos pais e familiares. A influência das mı́dias na vida das crianças é tanta que já se tornou alvo de estudos nacionais e internacionais (Rideout, 2013; AVG, 2015) que realizam por anos o padrão de consumo e comportamento no uso das mı́dias por crianças na América e o impacto sobre suas vidas. Pode-se observar um exemplo desse grande alcance das mı́dias em estudo realizado com 34 escolares de Curitiba: dessas, 100% têm televisão e celulares, 91% têm computador em suas casas e 90% podem “brincar” nos computadores com jogos e em alguns sites da Internet e 21% têm videogames. O computador foi a mı́dia citada como preferida (47%) pelas crianças (Mota, 2007) e tem suscitado investigações do uso e das relações das crianças e familiares após esse aumento de consumo das mı́dias pelas crianças, ao passo que 57% de 5 anos das crianças sabem usar aplicativos mas dessas apenas 14% sabem amarrar os cadarços dos sapatos (AVG, 2015). Em crianças de 6 a 9 anos, no Brasil cerca de 97% utiliza a internet (AVG, 2015). E em menores de 2 anos cerca de 38% já utilizaram algum dispositivo móvel (Sena, 2014). Para Buckingham (2000) crescer na era das mı́dias eletrônicas virou um desafio! Desde o século XX que há uma preocupação cont́ınua acerca das mudanças do que se chama de infância, sendo que o uso das mı́dias parece ter influências contraditórias. 1 “As tecnologias da informação e comunicação são o resultado da fusão de três vertentes técnicas: a informática, as telecomunicações e as mı́dias eletrônicas. (...) As novas tecnologias podem ser classificadas em mı́dia, multimı́dia e hipermı́dia. A mı́dia caracteriza-se por poucos elementos, como por exemplo, o rádio, o toca fitas que transmitem apenas som, ou seja, é só áudio; a televisão de antena também é uma mı́dia e já possibilita som e imagem. A hipermı́dia são os documentos que incorporam texto, imagem e som de maneira não linear. Multimı́dias (...) integram vários elementos ou aparatos que podem ser elementos ou dispositivos diferentes interconectados apresentados como módulos ou como um único produto denominado, geralmente, de computador multimı́dia” (Pinto, 2004, p. 04) 2 Mı́dia educativa corresponde a uma variedade de mı́dias, incluindo imagens de filmes (filme, televisão, v́ıdeo), rádios e músicas, mı́dias impressas (jornais e revistas), e também as novas tecnologias de comunicação digital (Buckingham, 2002). Mídias: amigas ou vilãs? 91 Figura 1. Cenários da infância 1. (Ilustração: Henrique Martins Schmidt) Por esse atual panorama e questionamentos que o presente caṕıtulo revisa e traz conceitos atuais sobre desenvolvimento infantil e a influência do uso de mı́dias e tecnologias sobre seu desenvolvimento. 2. Metodologia O presente trabalho buscou revisar de forma cŕıtica alguns trabalhos que analisaram a influência das mı́dias e/ou tecnologias sobre o desenvolvimento infantil. Com base no questionamento que originou o t́ıtulo deste caṕıtulo: seriam as mı́dias amigas ou vilãs do desenvolvimento infantil? Como suporte teórico buscaram-se trabalhos em livros, bases de dados como Scielo, Pubmed, Google acadêmico, ou sites relacionados a estudos nacionais e internacionais sobre o tema. Como palavras- chave foram utilizados os termos “desenvolvimento infantil e tecnologias”, “desenvolvimento e mı́dias”, “infância e mı́dias”, “infância e tecnologias”, porém não se detendo somente a esses descritores como também realizando buscas em trabalhos citados. As figuras nesse caṕıtulo, mais do que ilustrações informativas buscam a sua reflexão. 3. Infância, Mídias e Brincadeiras Para responder a pergunta principal do presente caṕıtulo, foram organizados tópicos para discussão: Definição da Infância; Mı́dias e tecnologias: Amigas ou Vilãs?; Mudanças na Infância; O Brincar. 3.1 Definição de infância Em termos legais e por definiçãode idade: 92 Mélo & Fink Lei Federal 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Art. 2o Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade (BRASIL, 1990). Infância compreende portanto o peŕıodo desde o nascimento até a transição para a fase adulta e em termo biológicos até o advento da puberdade com as caracteŕısticas sexuais secundárias que caracterizam a transição para a adolescência. Defende-se, também, uma definição voltada não somente aos aspectos biológicos e de idade cronológica, mas também como um peŕıodo definido por uma construção social e cultural variável, ou seja, em constante construção e sob influências de vários fatores (Buckingham, 2000). De qualquer maneira e independentemente da idade têm-se no desenvolvimento infantil a base, o alicerce da construção de habilidades e capacidades. Esse desenvolvimento é um processo cont́ınuo ao longo de toda vida, influencia e é influenciado pelos processos cognitivos e de inteligência, assim como por fatores do ambiente e atividades que realiza (Israel et al., 2014; Castilho-Weinert & Forti-Bellani, 2015). Em termos motores o desenvolvimento ocorre por ganhos e mudanças constantes no repertório motor, geralmente das habilidades mais amplas até serem aperfeiçoadas na motricidade fina (Castilho-Weinert & Forti-Bellani, 2015). Na proposição de um desenvolvimento infantil pleno, diversão, educação, socialização e comunicação deveriam ser os tópicos de uma infância saudável (Behenck et al., 2013). Com a mudança de cenário da infância e os grandes avanços de tecnologias (reflita sobre as Figuras 1–5), esperam-se mudanças também no desenvolvimento infantil. Nesse sentido, seriam as mı́dias as propulsoras de tais mudanças? Não dá para negar as mudanças ocorridas na infância. Nos últimos 30 anos elas começaram a passar mais tempo em instituições, em desigualdades sociais crescentes. As fronteiras entre crianças e adultos parecem menos viśıveis em algumas áreas enquanto em outras foram aumentadas. Pode-se dizer que as crianças ganharam poder poĺıtico, através de leis e representações, mas isso também as tornou mais vigiadas. Nesse caminho as mudanças das mı́dias também parecem influenciar as mudanças na infância. Estudos (Buckingham, 2000, 2007) relatam que crianças que têm poder aquisitivo melhor consomem mais mı́dias e passam mais tempo em casa, enquanto o uso de espaços públicos e das brincadeiras parece entrar em decĺınio. Há outros no entanto que defendem que a oferta Mídias: amigas ou vilãs? 93 Figura 2. Cenários da infância 2. (Ilustração: Henrique Martins Schmidt) de brinquedos adequados é justamente na classe econômica mais favorecida (Barros et al., 2003). Seria o uso de tecnologia um fator de influência ao desenvolvimento infantil? De que maneira? Poderia ser considerada uma forma de entretenimento passivo? E se ofertada na dosagem correta e de forma associadas a aspectos pedagógicos? E como fica “o brincar”? Pesquisas apontam que a natureza simbólica da televisão não é compreendida por crianças até a fase pré-escolar. Porém, se usado de forma educativa como programas da Vila Sésamo, pode favorecer as atividades de leitura na escola (Kirkorian et al., 2008). Cabe lembrar no entanto que a brincadeira ainda constitui aspecto fundamental no desenvolvimento infantil (Kishimoto, 2014), devendo ser a principal atividade cotidiana da criança (Kishimoto, 2010). 3.2 Mídias e tecnologias: amigas ou vilãs? Alguns estudos e cŕıticos ao uso das mı́dias relatam que ela poderia representar um perigo ao desenvolvimento infantil e influenciaria fortemente a “comercialização” da infância (Buckingham, 2000). Outros já relatam que essa exposição é necessária a um desenvolvimento saudável (Buckingham et al., 2007). O fato é que cada vez mais as crianças passam 94 Mélo & Fink Figura 3. Cenários da infância 3. (Ilustração: Henrique Martins Schmidt) mais tempo companhia das mı́dias do que na escola ou com sua famı́lia e amigos (Buckingham, 2007) e esse novo cenário passou a se tornar interesse de estudo em vários páıses (Buckingham, 2002). Em estudo, feito em Portugal, sobre a preferência e escolha de gadgets: a perspectiva da criança, Gomes (2014) concluiu que mais da metade das crianças menores de 12 anos usam os tablets; 77% usam em jogos; 57% em educação; 55% em entretenimento nas viagens; 43% para assistir a programas de televisão; 41% entretenimento nos restaurantes e 15% para comunicar com os amigos. 55% das crianças responderam que preferem comprar jogos, 33% a roupas (33%) e produtos desportivos (11%) . Buckingham (2000, p. 05) no entanto alerta para a necessidade de uma visão cŕıtica no uso das mı́dias e de sua influência no desenvolvimento infantil. Para o autor: ...as mı́dias est~ao longe de ser a causa única dessas mudanças: elas nem s~ao as destruidoras autônomas da infância, nem suas libertadoras. Apesar de ser atribúıdo às tecnologias e mı́dias um papel de determinante social, para Buckingham (2000) na verdade o que ocorre é um processo de convergência entre tecnologias de comunicação e de informação: Mídias: amigas ou vilãs? 95 N~ao se pode examinar as mı́dias de forma isolada - seja como o agente causador do desaparecimento da infância, seja como a raz~ao de seu maior poder. Ao contrário, é essencial situar a relaç~ao das crianças com as mı́dias no contexto das mudanças sociais e históricas mais amplas (Buckingham, 2000, p. 52). Não se pode esquecer, ainda, que apesar da preocupação com o uso excessivo das mı́dias, numa sociedade de desigualdades, como a nossa, mesmo com a grande oferta de produtos o acesso a essas mı́dias é desigual e representa muitas vezes um “poderio” daqueles que as têm e consomem sobre os que não as usam ou usam em menor frequência. Além disso, parece que somado a efeitos negativos encontram-se efeitos positivos no uso das mı́dias, sendo importante também entender sobre quais aspectos do desenvolvimento exercem influência (Buckingham et al., 2007). Positivos e/ou negativos, os efeitos das mı́dias carecem de atenção! Isso porque é de consenso a influência do meio e est́ımulos externos sobre o desenvolvimento infantil e que na privação de vivências sensório motoras adequadas, alterações na motricidade são esperadas (Formiga et al., 2010; Israel et al., 2014). Há evidências em estudos preliminares que desde que seja usada de forma mediada e associada com atividades lúdicas as mı́dias parecem não influenciar de maneira negativa o Desenvolvimento Neuropsicomotor (DNPM) (Fink, 2016). No estudo sobre a influência da tecnologia no desenvolvimento motor de crianças de quatro a seis anos de uma escola particular de Curitiba, (Fink, 2016) avaliou 23 crianças através da Escala de Denver II e observou que as crianças de quatro anos tiveram atraso na área pessoal-social, motora grossa e linguagem, as de cinco anos apresentaram atraso nas áreas motora grossa e linguagem, já as de seis anos, apenas uma criança apresentou atraso na área motora grossa. Foi avaliado também a área motora fina e nenhuma criança da amostra apresentou atraso. O aumento do consumo das mı́dias também revela uma tendência de menor atividade f́ısica, o que cria um ciclo vicioso: inatividade f́ısica versus uso excessivo de tecnologias. Tudo isso colabora para a questão do sedentarismo e seus agravantes: problemas card́ıacos, colesterol alto, diabetes, hipertensão, obesidade entre outros, fatores esses que podem influenciar o desenvolvimento. 3.2.1 Mídia vilã? Com relação a efeitos negativos no uso de mı́dias pode-se citar à exposição nem sempre controlada/mediada de conteúdos inadequados à idade como os de cunho sexual ou de violência. Isso poderia influenciar crenças, condutas e até mesmo o comportamento de criançascaso não orientadas e tendo nesse 96 Mélo & Fink Figura 4. Cenários da infância 4. (Ilustração: Henrique Martins Schmidt) tipo de conteúdo a única forma de contato com os assuntos (Buckingham et al., 2007). Além disso supõe que alguns fatores psicomotores poderiam ser influenciados em decorrência de serem propiciados menos est́ımulos de motricidade grossa, equiĺıbrio e estruturação espaço-temporal. Mas seriam as mı́dias uma forma de aprimoramento de funções intelectuais e de motricidade fina? Sabe-se que restrições na manipulação, principalmente por ambientes pobres em est́ımulos resultam em escores inferiores em testes padronizados para motricidade fina (Barros et al., 2003). Porém estudos preliminares em crianças de 4–6 anos (Fink, 2016) não identificaram influências restritivas pelo uso de mı́dias, possivelmente pelo fato de também explorarem as funções manuais com brincadeiras Além dessas questões há de se questionar o tempo de uso dessas mı́dias. Atualmente um estudo (Hansraj, 2014) identificou o aumento de chance a dores cervicais em pessoas que ficam muito tempo com flexão do pescoço, ocasionando intensa sobrecarga nessa região. Para maiores detalhes, ler o caṕıtulo desse mesmo livro denominado “Endireite essas costas menin@: verdades e mitos sobre desenvolvimento postural na infância”, que aborda as questões posturais na infância e relação com uso excessivo de mı́dias. A Associação Americana de Pediatria (AAP) pretende rever a recomendação dada em 2011 que pedia aos pais para não permitirem o uso Mídias: amigas ou vilãs? 97 das tecnologias por crianças menores de dois anos, pois esta recomendação foi redigida antes da explosão dos aplicativos e Ipads, orientando para que as crianças sempre tem que ter o acompanhamento dos pais (O Globo, 2015). 3.2.2 Mídia amiga? Atualmente surgem visões positivas da relação infância versus mı́dias. Ao invés de v́ıtimas não seriam as crianças em uso de mı́dias dotadas de uma forma poderosa de“alfabetização midiática”, com novas oportunidades para a criatividade, a comunidade, a auto realização? (Buckingham, 2000). Por mais relutantes que a sociedade possa ser com isso, há sim efeitos positivos evidenciados no desenvolvimento das crianças: no aprendizado, linguagem e cognição, por meio das mı́dias educativas; participação ćıvica, aux́ılio na formação de identidade pela identificação com pessoas e assuntos, manutenção da atenção (sim, isso mesmo!) nos jogos de computadores e incentivo à criatividade (Buckingham et al., 2007) Há também o lado positivo na utilização de videogames e tablets, pois a criança poderia ter a possibilidade de melhorar sua habilidade motora fina e o tempo de reação de escolha, porém devem ser utilizados com cautela e supervisionado pelos pais. Em adultos, efeitos positivos e significativos sobre a precisão manual (habilidade motora, tempo de reação e coordenação óculo-manual) são relatados em estudo que utilizou a tecnologia como forma de aperfeiçoamento dessas habilidades em cirurgiões. Aqueles que realizaram pelo menos 3 horas/semana jogando no computador ou no videogame, apresentaram 37% menos erros em cirurgias de laparoscopia e velocidade até 27% superior dos que praticaram o treinamento em comparação aos médicos que não treinaram em jogo (Rosser Jr. et al., 2007). Seriam esses mesmos efeitos posśıveis em crianças? Seria a infância um peŕıodo cŕıtico para esses est́ımulos? Por quanto tempo? Haveria efeitos positivos sobre quais outros aspectos do DNPM? As novas tecnologias de videogames que também utilizam movimentos corporais para a interação com os jogos, surgem como o ińıcio de uma nova perspectiva sobre estes, envolvendo um gasto calórico nunca visto antes na utilização deste tipo de tecnologia e iniciando um desenvolvimento cognitivo satisfatório. Uma combinação de alimentação saudável, atividade f́ısica regular e uma média de utilização destas tecnologias (videogames, televisão, computador) de 2 horas/dia na vida desta população são uma combinação muito boa para o desenvolvimento f́ısico e cognitivo (Carneiro, 2007). 98 Mélo & Fink Figura 5. Cenários da infância 5. (Ilustração: Henrique Martins Schmidt) As novas tecnologias estão áı para serem decifradas, entendidas e utilizadas, pois não existe lógica em tentar impedir os avanços das ciências exatas, humanas e biológicas, pois a cura para doenças e a ida do homem ao espaço só foram posśıveis pela compreensão e utilização das tecnologias dispońıveis no momento, e assim, continua-se a caminhada para um futuro onde a informação será ainda mais valiosa e a busca do desenvolvimento do ser humano será mais importante do que é considerada hoje. Há ainda que se citar o uso de mı́dias em tecnologias assistivas (Figura 5) favorecendo o processo de inclusão de inúmeras crianças com dificuldades e limitações de diferentes tipos (Rocha & Deliberato, 2012) e até mesmo em casos de educação a distância, principalmente em locais de dif́ıcil acesso. Defende-se a ideia que estamos na era de (re)aprender a conhecer, comunicar, integrar e se relacionar com as mı́dias (Brito & da Purificação, 2008). Não se incentiva o abandono das práticas educativas motoras, art́ısticas, sociais e culturais em detrimento do uso exclusivo das mı́dias. De maneira adequada e mediada ela pode se tornar instrumento importante de aprendizado, entretenimento e informação. Existem estudos com informações sobre indicação de tempo de uso tanto de mı́dias quanto de realização de atividades f́ısicas. A Tabela 1 aponta que as mı́dias só devem ser usadas a partir dos 2 anos de idade, Mídias: amigas ou vilãs? 99 Tabela 1. Tempo de exposição indicada ao uso mı́dias vs atividade f́ısica em cada faixa etária. (*) entende-se por atividades livres, brincadeiras, jogos e/ou exerćıcios f́ısicos. Idade Uso de mı́dias Atividade f́ısica * (AVG, 2015) (Tremblay et al., 2011, 2012) Até 1 ano Evitar uso Livre/todo dia 2 anos Evitar uso 30’/dia–6x/semana 2–5 anos 1h/dia 30’/dia–6x/semana 6–12 anos 2h/dia 1h/dia–3x/semana >13 anos 3h/dia 1h/dia–3x/semana Obs.: faixas etárias foram aproximadas para permitir relação entre os estudos. Fonte: (Tremblay et al., 2011, 2012; AVG, 2015) com limite de uso diário de 1h. Somente a partir dos 6 anos que esse tempo pode ser ampliado para 2h por dia e aos 13 para 3h por dia. Lembrando aqui que esse uso deve ser monitorado pela famı́lia, tanto em tempo, como em conteúdo. Em contrapartida a atividade f́ısica, por meio de brincadeiras e/ou jogos é indicada em todas as faixas etárias, podendo a partir dos 5/6 anos serem atividades mais vigorosas. Seria posśıvel usar as mı́dias de maneira educativa com filh@ e/ou Alun@? Estudos preliminares de (Fink, 2016) apontam que muitas crianças utilizam tecnologias no seu dia a dia, e desde que também adicionem brincadeiras em seu repertório, seu repertório, seu desenvolvimento não parece comprometido. Além disso, o consumo excessivo não é realidade de todas as crianças. Muller (2014), observou 17 crianças entre 5 e 6 anos de uma instituição pública federal durante 8 meses e registrou por meio de filmagens, fotos e gravações em áudio o comportamento de consumo das tecnologias pelas crianças. Sobre o perfil do grupo ela observou que a renda familiar era acima de três salários mı́nimos, e, embora a maioria das famı́lias possúısse computador, tablets, notebook, smartphone, a maior parte das crianças fazia uso desses artefatos em torno de duas a quatro vezes na semana, com duração de até uma hora. Entre os consumos culturais, a preferência foi pelos jogos. Porém há estudo eu identificou que a exposição por exemplo a brinquedos tecnológicos apresenta efeitos deletérios ao desenvolvimento principalmente da linguagem, tanto em termos quantitativos como qualitativos, quando comparado a crianças que utilizaram brinquedosnão tecnológicos (Sosa, 2016). E você? Brinca com sua criança? 100 Mélo & Fink 3.3 O brincar Além das questões mencionadas sobre o uso de mı́dias, a prática de atividade f́ısica por meio de brincadeiras auxilia a evitar o sedentarismo, manutenção de massa corporal com ńıveis de IMC adequados, mantendo- se eutróficas3 por serem mais ativas, e ficarem menos tempo expostas à televisão e videogame, atividades essas que em tempos prolongados são associadas à com sobrepeso, com possibilidades de desenvolvimento de doenças na vida adulta (Carneiro, 2007). A atividade f́ısica, por meio de exerćıcios f́ısicos incentiva a produção de hormônio de crescimento e também auxilia no metabolismo de liṕıdios, protéınas e glićıdios (Carneiro, 2007). Segundo a OMS (World Health Association, 2011) a evidência cient́ıfica dispońıvel para a faixa etária entre cinco e dezessete anos apoia que a atividade f́ısica proporciona benef́ıcios para a saúde fundamentais para crianças e adolescentes. Nı́veis adequados de atividade f́ısica contribuem para o desenvolvimento musculoesquelético, sistema cardiovascular, consciência neuromuscular, manutenção do peso corporal, auxilia no desenvolvimento social, autoconfiança e melhor controle da ansiedade e depressão. A recomendação é que pratiquem sessenta minutos de atividade f́ısica por dia, o que inclui: brincadeiras, jogos, esportes, tarefas, educação f́ısica, transporte. Sem dúvidas o brincar é essencial para a criança, pois através das brincadeiras elas testam suas habilidades e tentam superar seus limites. Os jogos com bola, como vôlei, basquete, futebol, handball proporcionam uma atividade f́ısica intensa para a criança, e com isso o desenvolvimento das habilidades motoras. Outros tipos de brinquedos, como bicicletas, patins, skates e cordas também incentivam a atividade f́ısica intensa e auxiliam as crianças a dominarem seus movimentos e a exercitarem os aspectos necessários para uma boa motricidade, tais como o equiĺıbrio e as noções de esquema corporal, temporal e percepção viso motora Porém dados de uma pesquisa internacional, feita pela OMO, denominada “Valor do Brincar Livre4”, relata que contraditoriamente a importância dada ao brincar por 98% dos pais, 87% desses percebem que suas crianças deveriam brincar mais! A pesquisa5 foi realizada com 12 mil pais de crianças em idade de 5 a 12 anos, em 2016, em vários páıses. Além 3 Por crianças eutróficas entende-se aquelas com peso adequado para sua altura, ou seja, IMC dentro dos parâmetros ideias. 4 Estudo conduzido por Edelman Berland, agência independente de pesquisa de marketing. Levantamento realizado entre fevereiro e março de 2016 nos EUA, Brasil, Reino Unido, Turquia, Portugal, África do Sul, Vietnã, China, Indonésia e Índia. Participação de especialistas como Stuart Brown, Priscila Cruz, Vital Didonet. 5 O v́ıdeo da pesquisa, de 60” pode ser visto em http://www.dirtisgood.com/ br/home.html?gclid=CLv0kaz5pMwCFRMJkQodvFYK4A http://www.dirtisgood.com/br/home.html?gclid=CLv0kaz5pMwCFRMJkQodvFYK4A http://www.dirtisgood.com/br/home.html?gclid=CLv0kaz5pMwCFRMJkQodvFYK4A Mídias: amigas ou vilãs? 101 do Brasil, China, Índia, Indonésia, Portugal, África do Sul, Turquia, Reino Unido, Estados Unidos e Vietnã participaram da pesquisa. A pesquisa chega a comparar que 84% crianças brincam ao ar livre menos de 2h por dia, tempo menor de exposição ao ar livre que presidiários, os quais consideram essas 2h as mais importantes do seu dia. Os motivos disso? Um dos motivos apontados foi a troca de atividades f́ısicas pela tecnologia: 9 em cada 10 pais relatam que suas crianças preferem modalidades virtuais a atividades f́ısicas. Assim o projeto da OMO lança campanhas como: “se sujar faz bem”, “#livre para brincar”, como iniciativas de incentivo às brincadeiras. O site6 inclusive, com base em especialistas, relata a importância do brincar no desenvolvimento infantil, com dicas interessantes de atividades que podem ser realizadas. “Brincar é mais que diversão7” defende Stuart Brown, fundador do Instituto Nacional para Brincadeira8. Até mesmo a revista New York Times fez uma matéria em 2008 (Henig, 2008) relatando que “Brincar é coisa séria!”. A brincadeira além de desenvolvimento f́ısico, promove desenvolvimento emocional, podendo representar importante forma de construção de empatia evitando atitudes violentas em crianças (Brown, 2014). A brincadeira é conhecida como atividade rica de possibilidades para o desenvolvimento infantil, porém não recebe o tratamento devido em todos os espaços, sendo que em muitos a realidade é de pouca variedade de estimulação (Marcolino & Mello, 2015). Em casa e/ou na escola: BRINQUE com sua criança! Obviamente que algumas brincadeiras podem ser realizadas com tecnologias. As mı́dias estão áı e não usá-las seria negar os avanços do conhecimento e da tecnologia, mas como e quanto usá-las pode fazer a diferença e ser determinante no desenvolvimento da sua criança. Dessa maneira as presentes autoras propõem questões de segurança e norteadoras do uso das tecnologias: quando usar ou não, tem de uso, tipo de est́ımulo... De maneira análoga à pirâmide alimentar, pode-se orientar que o “consumo” das crianças seja preferencialmente em elementos na base da pirâmide (Figura 6), os quais estão relacionados a brinquedos com exploração espacial, motricidade ampla em atividades tanto individuais como coletivas. Na sequência atividades mais espećıficas, em jogos, com uso 6 Mais informações em: http://www.dirtisgood.com/br/truth-about-dirt. html 7 Entrevista completa Play is more than just fun (maio, 2008) em: https://www.ted.com/talks/stuart_brown_says_play_is_more_than_fun_ it_s_vital?language=en. 8 Instituto Nacional da Brincadeira: http://www.nifplay.org/ http://www.dirtisgood.com/br/truth-about-dirt.html http://www.dirtisgood.com/br/truth-about-dirt.html https://www.ted.com/talks/stuart_brown_says_play_is_more_than_fun_it_s_vital?language=en https://www.ted.com/talks/stuart_brown_says_play_is_more_than_fun_it_s_vital?language=en http://www.nifplay.org/ 102 Mélo & Fink de bolas, skates etc. No topo da pirâmide há a representação da televisão, a qual representa recursos tecnológicos, devendo seu consumo ser moderado e preferencialmente supervisionado pela famı́lia, tanto na questão do tempo, como na de conteúdo. Figura 6. Pirâmide indicativa do consumo de brinquedos e mı́dias por crianças. (Ilustração: Henrique Martins Schmidt) Propõe-se a continuidade em estudos, preferencialmente longitudinais para acompanhamentos das implicações sobre o DNPM no uso de tecnologias. Isso porque as próprias tecnologias, assim como o desenvolvimento estão em constante mudança, necessitando de esforços conjunto no entendimento dos impactos de seu uso, das mais variadas formas, sobre os diferentes aspectos da vida. Sugere-se que na própria relação com as mı́dias e tecnologias, prioriza- se uma visão cŕıtica, pela busca de informações em livros e/ou sites confiáveis, assim como pela consulta a profissionais especializados em desenvolvimento infantil, e, na dúvida, busque informações sobre o desenvolvimento de seu/sua filho/a por profissionais especializados em desenvolvimento infantil, como pediatras, neuropediatras, pedagogos, Mídias: amigas ou vilãs? 103 psicólogos infantis, fisioterapeutas especializados, assim como terapeutas ocupacionais e fonoaudiólogos, em unidades básicas de saúde, consultórios e escolas. 4. Considerações Finais Vive-se em constantes mudanças sociais, com aumento cada vez mais expressivo no uso de mı́dias em todas as idades. Embora ainda sejam iniciais as evidências de influência no desenvolvimento infantil, a mudança na prática do consumo, com substituição de brincadeiras pelas atrativas tecnologias já é fato comprovado. Não se busca aqui o abandono das mesmas, mas sim seu uso controlado e consciente, de maneiraa incentivar o desenvolvimento infantil e associada às práticas de brincadeiras, essas sim, consideradas fundamentais ao desenvolvimento infantil. Portanto, é necessário atenção a esse consumo, oriente, estabeleça limites e escolha opções de mı́dias que sejam associadas a atividades pedagógicas. Além disso sempre com atenção ao desenvolvimento da criança e na existência de dúvidas e/ou alterações na aquisição de marcos motores, cognitivos e/ou comportamentais e afetivos, e busca de orientação de profissional adequado, seja na área da saúde ou na escola. Referências Aguiar, B.C.L.D., A instituição creche: apontamentos sobre sua história e papel. Nuances: Estudos sobre Educação, 2(2):30–35, 2009. AVG, , Digital diaries. Dispońıvel em: http://www.avg.com/ digitaldiaries/homepage, 2015. 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Você sabia que a criança passa por alterações ao longo do seu desenvolvimento e que isso inclui diversas adaptações posturais? Você presta atenção ao peso da mochila? Mobiliário da escola? E com as insistentes “manias” de permanecerem peŕıodos longos em posturas inadequadas? Você sabia que os pés “chatos” e joelhos para dentro fazem parte de uma fase da vida da criança? Sabia que muitas dessas alterações que você observa na sua criança é natural? Você sabia que muitas alterações posturais podem ser evitadas? Que outras necessitam apenas de poucas adaptações? Sabia que essas alterações podem e devem ser corrigidas o mais precocemente posśıvel com fisioterapia? Sabia que o uso de “botinhas ortopédicas” por exemplo, já não é o mais recomendado na maioria dos casos? Você sabia que a dor nas costas d@ adult@, a hérnia de disco ou o famoso “bico de papagaio” podem ser decorrentes de alterações posturais que iniciaram na infância? Nesse exato momento, ao ler essas perguntas você automaticamente corrigiu sua postura ou se sentiu “tentad@” a isso? Pois bem, são muitas as dúvidas e angústias dos profissionais e familiares a respeito da postura da sua criança e do impacto que essas alterações podem ocasionar. O assunto é complexo e pretende-se aqui dar algumas orientações e dicas para que você posso compreender, identificar precocemente e auxiliar nessa “saúde postural”. Assim o objetivo geral do presente caṕıtulo é explanar sobre o desenvolvimento postural t́ıpico do recém-nascido ao adolescente, *Nesse caṕıtulo o “@” será utilizado na identificação tanto do gênero feminino como masculino **Autor para contato: ribasmelo@gmail.com Luize Bueno de Araujo & Vera Lúcia Israel (Ed.), (2017) DOI: 10.7436/2017.dcfes.07 ISBN 978-85-64619-19-7 ribasmelo@gmail.com 108 Mélo et al. principais alterações que podem ocorrer nessa fase e oferecer dicas para observação e cuidados na promoção e reabilitação da postura “correta”. 2. Metodologia do Trabalho O presente caṕıtulo busca trazer uma atualização dos principais estudos na área de fisioterapia em relação às questões posturais na infância tanto no desenvolvimento t́ıpico como at́ıpico. Para isso buscaram-se trabalhos publicados nas principais bases de dados: Scielo, Pubmed, Google acadêmico, assim como alguns livros que abordem o tema. Os principais resultados serão apresentados de acordo com tópicos relacionando ao desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM) na infância, desenvolvimento da postura correta, principais alterações posturais na infância, orientações sobre o que e como observar a postura de sua criança e o que pode ser feito para prevenir e/ou reabilitar em casos de alterações identificadas. 3. Desenvolvimento Postural na Infância Para Penha et al. (2005) a postura é definida como um arranjo relativo entre as partes do corpo. É considerada“boa”, “estável”ou adequada quando esse posicionamento musculoesquelético é capaz de proteger de forma eficiente o corpo de lesões. Para Braccialli & Villarta (2000) essa postura estável entre o sujeito e o meio fornece a impressão de estabilidade corporal ao sujeito. No entanto quando se fala em postura estável também há que se considerar a relação dinâmica das partes do corpo, as quais se adaptam constantemente em resposta a est́ımulos recebidos. Isso porque as respostas de adaptação musculares são rápidas e com o tempo levam também a alterações esqueléticas. Quando se fala postura estudar coluna e membros inferiores é fundamental. A coluna apresenta 4 curvaturas (na visão lateral ou perfil): lordose cervical, cifose torácica, lordose lombar e nova cifose sacro- cocćıgena. Considerando-se valores positivos e negativos para essas curvas, a resultante de suas forças deve ser zero, ou seja, resultado de um complexo sistema de estabilização, com ação de músculos que se contraem e relaxam e que absorvem as forças exercidas sobre a estrutura óssea. Na vista anterior a coluna é alinhada e reta, sendo o eixo mestre, central, do sistema músculo- esquelético, em torno do qual se organizam membros, outros aparelhos e sistemas (Rocha & Pedreira, 2001). A postura se modifica ao longo do desenvolvimento t́ıpico por diferentes fatores e alterações nesta postura podem influenciar o desenvolvimento t́ıpico. Várias modificações posturais são evidenciadas durante esse desenvolvimento, muitas delas apenas transitórias com resolução espontânea (Hensinger, 1989). Endireite essas costas menin@ 109 Antes de serem relatadas essas alterações, far-se-á uma explanação breve sobre o desenvolvimento postural t́ıpico, do bebê ao adolescente. 3.1 Desenvolvimento postural: do recém-nascido à adolescência Na vida intra-uterina a coluna não apresenta as quatro curvas identificadas na fase adulta e é como se o bebê tivesse uma coluna em formato de “C”, como uma cifose única (Figura 1a). Com o seu desenvolvimento t́ıpico, sob ação de forças musculares constante, contra a ação da gravidade é que essas colunas vão se formando. A formação da lordose cervical é iniciada com os movimentos relacionados ao controle de cabeça (4o mês), ao levantá-la em decúbito ventral e ao sentar-se (Figuras 1b e 1c). A postura sentada favorece ainda a formação de uma longa cifose torácica e lombar (Rocha & Pedreira, 2001). Já a lordose lombar se inicia quando o bebê começa a engatinhar, que geralmente ocorre dos 09 a 12 meses de idade, e vai se consolidando com a aquisição do andar independente (Figura 1d), sendo uma curvatura importante para a manutenção do equiĺıbrio em pé (Sanches & Oliveira, 2007). Cabe lembrar que essas curvas são no plano sagital (perfil, vista lateral) e que no plano frontal (vista anterior) a coluna é ereta, alinhada e sem curvas (Rocha & Pedreira, 2001). A Figura 1 mostra a formação das curvaturas da coluna vertebral ao longo do tempo. Figura 1. Desenvolvimento das curvaturas da coluna vertebral. As setas indicam a formação das lordoses. Ilustração por Henrique Martins Schmidt 110 Mélo et al. Para Saccani & Valentini (2014) existem diferentes fatores que podem apresentar variações no peŕıodo das aquisições motoras influenciadas pelas condições e o meio ao seu redor, passando por peŕıodos de movimentações simples e descoordenadas e progredindo quanto ao controle motor e ritmo nas atividades motoras para as aquisições posturais prono, supino, sentado e em pé com controle postural. No desenvolvimento infantil t́ıpico, essa postura em alinhamento favorece o controle postural e aquisições de habilidades motoras mais complexas. No peŕıodo de 7 a 12 anos de idade, as crianças passam por alteraçõesposturais transitórias devido às alterações da proporções corporais e em sentido a um novo estado de equiĺıbrio corporal (Santos et al., 2009). Até mesmo as questões respiratórias influenciam na postura da criança. Isso porque o músculo diafragma (respiratório) se insere em vértebras lombares e seu encurtamento e/ou fraqueza pode levar a alterações posturais (Braccialli & Villarta, 2000). Assim crianças com alterações respiratórias crônicas, como asma e bronquite, e/ou respiradores bucais carecem de atenção e avaliação constante de sua postura. As principais alterações serão discutidas no próxima Seção. Não é somente a coluna vertebral que garante alinhamento. O correto posicionamento dos membros inferiores (quadril, joelho e tornozelo) também são indispensáveis à simetria corporal. No desenvolvimento t́ıpico a criança apresenta ao nascer um padrão flexor, incluindo flexão dos membros inferiores. Com o passar do tempo o padrão extensor fica mais evidente e e supino a criança realiza pequenos chutes e em prono já no terceiro trimestre o peso corporal que antes ficava mais na região de tronco superior transfere para a pelve, permitindo maior mobilidade em anf́ıbio e pivoteio. Na sequência irá adquirir posição em 4 apoios, engatinhar e passar para de pé (Castilho-Weinert & Forti-Bellani, 2015), uma sequência de ganhos motores que influenciam diretamente no alinhamento das estruturas da articulação do quadril. No desenvolvimento e alinhamento t́ıpico da articulação do quadril, o colo femoral forma um ângulo de 125◦ a 140◦ com o fêmur. A coxa vara seria então uma alteração de alinhamento em que este ângulo é menor que 125◦ e a coxa valga quando é maior que 140◦ e ambas podem ter origem já ao nascimento sendo porém muitas vezes identificadas em idades mais avançadas por meio de radiografias ou outros exames (Bruns et al., 2003). Alterações mais comumente viśıveis dizem respeito aos aspectos rotacionais do quadril. Padrão em rotação externa na criança, com rotação tibial (perna) interna no ińıcio do andar, assim como rotação femoral (coxa) interna em crianças constituem variações t́ıpicas do desenvolvimento (Staheli et al., 1985). A persistência no padrão em rotação interna é mais comum do que em rotação externa, e quando persistem de forma acentuada Endireite essas costas menin@ 111 apresentam bons efeitos com uso de órteses e fisioterapia (Nourai et al., 2015). O joelho também passa por modificações de alinhamento de acordo com o crescimento da criança. No recém-nascido o geno varo (ver Figura 2A), que dá uma aparência arcada aos membros inferiores, predomina e esse padrão tende a alinhar, com joelhos retificados a partir dos 6 meses até 1 ano de idade (Volpon et al., 1986; Saini et al., 2010) ou 2 anos de idade, (Hensinger, 1989). Depois disso há uma tendência ao valgo (ver Figura 2B), que confere aparência de “joelhos para dentro” ou “em X”, que se torna máxima entre 3 e 5/6 anos (Volpon et al., 1986; Saini et al., 2010). Esse padrão em valgo diminui até aproximadamente os 6-7 (Hensinger, 1989) a 10 anos (Figura 2C), com um novo pico de valgizaçäo em torno dos 13 anos (Volpon et al., 1986), sendo admitido 7o de valgo para homens e 8o para as mulheres (Hensinger, 1989). Figura 2. Desenvolvimento do alinhamento do quadril e joelho. (A) Varo de joelho com rotação externa de quadril; (B) valgo de joelho com rotação interna de quadril; (C) joelhos e quadril alinhados. Ilustração por Henrique Martins Schmidt A partir dos 6 anos o joelho já deve estar alinhado (Saini et al., 2010), padrões em valgo e varo devem ser avaliados por ortopedista e/ou fisioterapeuta. Joelhos varos persistentes acima de 2 anos ou valgo acima de 7 anos já devem ser acompanhados sob risco de complicações e deformidades ósseas (Espandar et al., 2010). Na fase de desenvolvimento alguns cuidados podem ser tomados para evitar complicações em joelhos e quadril (veja Seção 3.4.2 sobre postura sentada). Durante o desenvolvimento os pés geralmente são planos (sem a formação do arco plantar) até os 2 anos de idade (Figura 3C). Na maioria dos casos persistentes terá resolução espontânea aos 10 anos e uma minoria 112 Mélo et al. necessitará de palmilha ou outro procedimento (Jordao & Bertolini, 1998; Rocha & Pedreira, 2001). Alguns estudos (Jordao & Bertolini, 2008) apontam uma maior incidência de pés planos em meninos e associado ao uso de sapatos fechados. O ideal é que com o desenvolvimento a articulação do tornozelo seja alinhada em posição neutra (Figura 3A), mas não são raros os desalinhamentos e pisadas em posição supinada (com maior apoio e/ou pressão na borda lateral do pé – Figura 3B) ou pronada (com maior apoio e/ou pressão na borda medial do pé – Figura 3C) e de maneira geral não influenciam de forma significativa a performance motora das crianças (Arévalo-Mora et al., 2016). Figura 3. Alinhamento t́ıpico da articulação do tornozelo em posição neutra (A) e respectivo apoio plantar (a). Em casos de desalinhamento em supinação e/ou tornozelo varo (B) a pisada pode se apresentar como em pés cavos (b). Em caso de pronação e/ou tornozelo valgo (C) há uma tendência a pés planos/“chatos” (c). Ilustração por Henrique Martins Schmidt Assim crianças maiores de 4 anos ainda podem apresentar pés planos (Kretzer, 2007) ainda sendo contraditórias as evidências de intervenção nos mesmos. Para a Sociedade Brasileira de Ortopedia Pediátrica (2016), pés planos em crianças com desenvolvimento t́ıpico só devem ser investigados com maior cautela a partir dos 8-9 anos e estudos (Dare & Dodwell, 2014; Bauer et al., 2011; Carr et al., 2016) relatam que para a maioria dos casos são assintomáticos e sem repercussões sérias sobre o desenvolvimento. Da mesma maneira pés cavos (Figura 3B) só necessitam de maiores intervenções caso associado a outras patologias, causem dor e/ou perda de função (Wicart, 2012). Endireite essas costas menin@ 113 Pode-se observar que todas as estruturas sofrem modificações fisiológicas de alinhamento durante o processo de desenvolvimento. Durante o desenvolvimento t́ıpico espera-se um adequado alinhamento de todas as estruturas e partes do corpo. De maneira oposta quando há desequiĺıbiros musculares e tensões pode-se definir como “má” postura ou postura inadequada (Penha et al., 2005). 3.2 Principais alterações posturais na infância: a “má postura” As alterações posturais na infância e adolescência são frequentes devido às adaptações decorrentes do crescimento e também por fatores psicossociais. Algumas dessas alterações fazem parte do desenvolvimento t́ıpico (Penha et al., 2005). Porém, outras demandam intervenção o mais precoce posśıvel. Muitas dessas alterações serão responsáveis por dores na infância mesmo, ou na fase adulta (Loue et al., 2006). Souchard (1996) apud Braccialli & Villarta (2000) lembra que o ser humano ao adotar as diferentes posturas e manter-se ereto coloca a musculatura estática em tensão constante, com efeitos de diminuição de flexibilidade sobre o aparelho locomotor. Até mesmo a musculatura respiratória quando em posição de encurtamento interfere no alinhamento postural, pois acaba por ter o movimento do tórax dificultado quando submetido a horas em posição de encurtamento. Defende também que ao se adotar uma postura em encurtamento a atividade muscular dinâmica é comprometida, e sendo menos ativa passa ao relaxamento com consequente sobrecargas articulares. A faixa etária dos sete aos 12 anos de idade, compreende o peŕıodo de maiores adaptações posturais funcionais, com consequentes desalinhamentos e sobrecargas articulares, principalmente sobre a coluna (Oshiro et al., 2010) e muitas dessas alterações se não percebidas e tratadas podem se tornar permanentes (Martelli & Traebert, 2006). A incidência de alterações posturais na infância e adolescênciapreocupa! Para Trigueiro et al. (2013) 25,4% das crianças entre 7- 10 anos apresentam alterações posturais, de forma semelhante, essa prevalência foi evidenciada por Martelli & Traebert (2006) em 28,2% de crianças e adolescentes entre 10 e 16, sendo a hiperlordose (20,3%) e a hipercifose (11%) as alterações mais prevalentes. Os autores destacam, no entanto, que a maioria das alterações encontradas tinham caráter reverśıvel! Para Vilarinho (2002) a hipercifose foi a alteração mais prevalente (20,9%) e mais encontrada em meninos. Para Graup et al. (2010) em adolescentes a prevalência de desvios foi elevada, atingindo 53,8% dos adolescentes avaliados, e desses a alteração mais frequente (90,9%) foi a retificação da curvatura lombar, predominante no o sexo masculino. Guadagnin & Matheus (2012) estudaram crianças e adolescentes entre 10 e 15 anos e encontraram que hipercifose torácica foi a mais prevalente (67,18%), seguidos pela hiperlordose lombar (64,10%) 114 Mélo et al. e a escoliose (64,62%). Além disso, observaram que menos de 20% dos sujeitos apresentaram a coluna alinhada e que grande parte das crianças e adolescentes avaliados, apresentaram mais de um desvio postural, o que compromete a funcionalidade do corpo. Para as meninas, além das questões fisiológicas e mudanças no corpo, o uso de salto alto pode influenciar a postura favorecendo o aparecimento de distúrbios posturais, como anteriorização da cabeça, hiperlordose lombar, anteversão pélvica e joelho em valgo (Silva et al., 2013). Além disso o excesso de peso também pode levar a desalinhamentos e sobrecarga da coluna e/ou joelhos. Em crianças obesas um padrão em valgo e ou recurvatum de joelhos e valgo de tornozelo (Martinelli et al., 2011) podem ser evidenciados, o que a longo prazo podem resultar em sobrecarga articular e dor. Assim, de maneira geral, os joelhos podem apresentar-se de duas maneiras quanto à valgo e varo, valgo é quando com os pés próximos, os joelhos se tocam e os tornozelos não, já o joelho varo é quando há o contato apenas dos tornozelos na posição em pé (Miranda et al., 2009). Nos pés, quando há aumento do arco plantar, dá-se o nome de pé cavo. Quando o arco longitudinal está rebaixado, chama-se pé plano ou pé chato Pezzan et al. (2009). Para rever as alterações de joelhos, tornozelos e pés reveja as Figuras 2 e 3. Utilizamos várias nomenclaturas para nos referir às alteraç~oes posturais, mas você sabe o que significa cada uma delas ? A seguir é ilustrada uma foto com o alinhamento postural adequado e sem desvio da coluna e membros quando vistos de frente e de costas e com algumas curvas naturais, ditas fisiológicas (Figura 4A) quando visto de perfil. Na sequência seguem nomes para as principais alterações encontradas na infância e adolescência. Fizemos uma descrição resumida para sua compreensão. A hipercifose (Figura 4B) é o aumento da curvatura cifótica da coluna observada em vista lateral, podendo ter relações com sobrepeso e posicionamento anteriorizado dos ombros (Siqueira & Silva, 2011). O termo hiperlordose (Figura 4B) é utilizado quando há um aumento da curvatura da lordose superior ao fisiológico, nas regiões cervical e lombar (Barbosa et al., 2011). De maneira inversa, na diminuição dessas curvaturas pode-se denominar que há uma retificação (Figura 4C). A escoliose (Figura 4D) é uma alteração da coluna geralmente observada no plano frontal, mas que a afeta de forma tridimensional. Pode ocorrer em qualquer fase da vida, mas principalmente a partir dos dez anos de idade especialmente em peŕıodos de estirão do crescimento (Toledo et al., 2011). Endireite essas costas menin@ 115 Figura 4. (A) Curvas fisiológicas da coluna vertebral. (B-D) Principais alterações da coluna vertebral. Ilustração por Henrique Martins Schmidt 3.3 Como observar a postura de sua criança ? Esteja atent@ à postura de sua criança. Além disso faça avaliações periódicas com médico e fisioterapeuta que podem perceber quaisquer alterações que necessitem de intervenção. O adequado é observar alinhamento da coluna e dos demais segmentos com a criança despida e nas suas rotinas diárias: dormindo, sentada no chão, sentada na cadeira, carregando mochila, andando, etc. Além disso, ficar atento a posśıveis queixas de dor. Na existência de alterações e/ou queixas deve-se procurar um profissional de saúde. 3.4 Dicas de orientações posturais para o dia a dia Vários são os fatores que podem influenciar a postura da criança: fatores hereditários, ambientais (posições adotadas), condições f́ısicas (obesidade por exemplo), condição sócio-econômica, fatores emocionais (a postura reflete o comportamento), alterações fisiológicas (como a puberdade), crescimento (alterações mais evidentes na fase de estirão). Já há estudo que aponta que com orientações adequadas as próprias crianças são capazes de melhorar seu repertório postural no dia a dia Rebolho et al. (2009), ou com programas de intervenção Benini & Karolczak (2010). A seguir serão descritas algumas dicas sobre a postura de bebês, crianças e adolescentes nas posturas mais adotadas. 3.4.1 A postura deitada Na fase inicial da vida a criança permanece muito tempo na posição deitada e alguns cuidados tanto pensando em questões posturais como 116 Mélo et al. de desenvolvimento devem ser pensados. A manutenção por tempo prolongado numa mesma postura, principalmente em decúbito dorsal, devido ao risco associado de morte súbita em bebês em prono (Davis et al., 1998; Lesko et al., 1998) pode, eventualmente, levar a plagiocefalia deformacional da cabeça. Nesta, observa-se uma assimetria da mesma, com um achatamento paralelo da região occipital (Figura 5A) de um lado e frontal do lado oposto (Freitas et al., 2010). Isto pode ser prevenido com mudanças de postura da cabeça do bebê na posição decúbito dorsal (Figura 5B). Na ocorrência de deformidade, indica-se a realização de fisioterapia e uso de órtese (Brett et al., 2012). Por esse motivo, a mudança de postura com supervisão familiar é indicada, principalmente nos 4-6 primeiros meses. Além disso, as diferentes posturas propiciam experiências sensório-motoras diversas que incentivam aquisições motoras. Para crianças e adolescentes, assim como para adultos, aconselha-se dormir em decúbito lateral com um travesseiro entre os joelhos (Figura 5C) para manter o quadril alinhado, e dessa maneira a coluna, evitado rotações da mesma1 Figura 5. (A) Plagiocefalia; (B) Postura correta para bebê; (C) Postura correta para crianças/adolescentes dormirem. Ilustração por Henrique Martins Schmidt 3.4.2 A postura sentada Na escola ou em casa, nos computadores, longas são as jornadas da criança na postura sentada. No chão a postura sentada “em W” (Figura 6A) é adotada muitas vezes pela criança, mas deve ser evitada. No chão, posturas sentada de lado, ou com as pernas à frente dobradas (Figura 6B) ou esticadas (Figura 6C) favorecem o alinhamento e apresentam menores risco à criança. Já é conhecido (Braccialli & Villarta, 2000; Moro, 2000) que carteiras muito altas ou baixas, assim como as cadeiras levam a inclinações excessivas 1 The Better Sleep Council, dispońıvel em: http://bettersleep.org/ better-sleep/sleep-positions/ http://bettersleep.org/better-sleep/sleep-positions/ http://bettersleep.org/better-sleep/sleep-positions/ Endireite essas costas menin@ 117 Figura 6. (X) Exemplos da postura sentada incorreta, e ( √ ) correta. Ilustração por Henrique Martins Schmidt e sobrecarga da coluna (Figura 6D). No entanto sabemos que mobiliários bem adaptados não é a realidade de todas as escolas (MORO, 2000), nem uma possibilidade para todas as famı́lias. Então, o que fazer ? Recomendações (Figuras 6E e 6F): • Permitir e orientar que a criança mude de postura periodicamente • Pés apoiados quando sentados em cadeiras ou bancos • Cadeira que permitainclinação quando posśıvel • Espaço entre a cadeira e a carteira suficiente para a passagem do estudante • Questionar à criança ou adolescente se a posição é confortável Obs.: em casos em que n~ao é possı́vel atender essas recomendaç~oes por indisponibilidade de mobiliário, pode-se usar apoio nos pés (listas telefônicas e/ou caixas) por exemplo, para auxiliar na acomodaç~ao. A posição sentada confortável, embora tenha alguma recomendações técnicas, consiste naquela que mantém as articulações da coluna em algum ponto da amplitude média, permitindo liberdade de movimentos, sem tensionar a musculatura (Moro, 2000). Não se pode esquecer das crianças com deficiência. Em casos de crianças com deficiência f́ısica, visual, auditiva e/ou múltipla é indicado a assessoria dos profissionais de saúde para adequações para cada caso. Isso porque a postura adequada os auxiliarão no processo de inclusão, favorecimento de suas capacidades e aprendizagem. 118 Mélo et al. Mas nem só a postura sentada é vil~a. Você sabe por exemplo quanto de carga seu filh@ carrega na mochila? 3.4.3 A mochila Alguns estudos apontam que as crianças e adolescentes, de maneira geral, carregam até mais do que o dobro do que sua musculatura está preparada. Rebelatto et al. (1991) em seus estudos calcularam uma carga média para algumas idades. Entre 8-9 anos, as crianças deveriam transportar no máximo 0,929 Kg em mochilas com fixação dorsal, e 1,151 Kg em mochilas com fixação escapular. Entre 10-11 anos poderiam transportar no máximo 1,471 Kg em mochilas com fixação dorsal, e 1,872 Kg em mochilas com fixação escapular. Entre 12-14 anos 1,930 Kg em mochila com fixação dorsal e 2,41 Kg em mochila com fixação escapular. No entanto, a realidade é diferente, e nossas crianças carregam cargas bem superiores a essas, muitas vezes ainda de forma assimétrica. E é nesses momentos de assimetria e sobrecarga que há sobrecarga na coluna com consequentes dores e alterações posturais que podem persistir ao longo da vida. Moura et al. (2009) relataram em seu estudo baseado nos dados apresentados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) que o peso de mochilas, pastas e outros materiais não devem ser maiores que 5% do peso de crianças da pré-escola e 10% do peso de alun@s do ensino fundamental. O ideal é que o peso esta uniformemente distribúıdo (Figura 7B), evitando- se carregar a mochila de um lado só (Figura 7C) ou de forma curvada (Figura 7A). [hb!] Figura 7. Postura incorreta (X) , e correta ( √ ) ao carregar mochila. Ilustração por Henrique Martins Schmidt Endireite essas costas menin@ 119 3.4.4 O uso de andador infantil A aquisição da marcha é de grande expectativa dos pais e/ou familiares e muitos adquirem o andador com intuito de agilizar esse processo. Apesar de ainda apresentar uso bastante comum, chegando a representar 73% das crianças avaliadas numa pequena amostra (Paula, 2014), estudos (Blank, 2002; Cestari et al., 2013) apontam malef́ıcios ao DNMP no uso desse instrumento no primeiro ano de vida, principalmente atrasando a aquisição de marcha, enquanto outros (Wasman, 2006; Granço & Olmos, 2009) não evidenciam essa influência negativa com também não há influência positiva no DNPM para a agilizar essa aquisição. No entanto o uso desse instrumento é associado a alguns riscos: de quedas, deficiências musculoesqueléticas, altera noção espacial e equiĺıbrio e pode até mesmo influenciar nos aspectos cognitivos, por restrição na exploração ambiental (Cestari et al., 2013), motivos pelos quais a Sociedade Brasileira de Pediatria contra indica sua utilização. 3.4.5 O uso de celulares e tablets Atualmente uma preocupação voltada ao posicionamento em posturas de longo peŕıodo no uso de tablets e celular, até mesmo por crianças tem gerado interesse da comunidade cient́ıfica. Um estudo realizado recentemente nos Estados Unidos avaliou a carga exercida região de cervical à medida que deslocamos o pescoço para frente ao manusear aparelhos tecnológicos, tais como: smartphones, tablets e notebooks. Segundo Hansraj (2014), em posição ideal, com as orelhas alinhadas com os ombros, o peso transmitido ao pescoço é de aproximadamente 4,5 a 5,4 Kg (Figura 8A). Esse valor vai sendo aumentado caso gradualmente com a inclinação anterior do pescoço. Com 15 graus de inclinação, a sobrecarga aumenta para 12,27 Kg (Figura 8B). Com 30 graus de inclinação aumenta para 18,14 Kg (Figura 8C). Com 45 graus de inclinação a sobrecarga já é de 22,22 Kg (Figura 8D). Finalmente, com 60 graus de inclinação a sobrecarga chega a alarmantes de 27,22 Kg (Figura 8E), o equivale a mais de 5 pacotes de arroz de 5 Kg sobre sua coluna cervical (Hansraj, 2014). Assim, pode-se estimar a sobrecarga ao se passar muito tempo com o pescoço flexionado ao manusear tablets e celulares. Além dessas questões posturais deve-se atentar para riscos no desenvolvimento visual, pela soma de fatores de risco: luminosidade excessiva, postura incorreta por longos peŕıodos. Para outras questões relacionadas à influência do uso de tablets sobre o desenvolvimento infantil leia o caṕıtulo “Mı́dias: amigas ou vilãs ? Qual a influência sobre o desenvolvimento das crianças”. 3.4.6 Comportamento e relações familiares Além de todos os itens já citados como promovedores de alterações posturais, problemas familiares (educação ŕıgida) e ainda problemas 120 Mélo et al. Figura 8. Sobrecarga na articulação cervical ao usar celular/tablets. Fonte: Adaptado de (Hansraj, 2014). Ilustração por Henrique Martins Schmidt emocionais contribuem para uma postura inadequada, já que a postura também é reflexo do comportamento e sofre influências do meio. Na adolescência as mudanças corporais podem trazer posturas inadequadas em consequência do crescimento como também da postura “envergonhada” que muitos adolescentes adquirem. A exemplo disso podemos citar a postura em prostração dos ombros de algumas meninas quando ocorre o crescimento das mamas (Oshiro et al., 2010). 3.5 Mitos e verdades sobre o desenvolvimento e as alterações posturais A Tabela 1 exemplifica alguns mitos e verdades sobre desenvolvimento e alterações posturais. 3.6 O que fazer em casos de alterações posturais? Para Oshiro et al. (2010) a idade escolar compreende a fase ideal para intervenção e reabilitação das disfunções posturais e para eles quando mais precoce for a intervenção, melhor o prognóstico da criança e menor o tempo necessário à intervenção. Assim é indispensável a atenção dos pais e/ou familiares, dos professores em contato direto com as crianças, além das consultas periódicas com pediatra, fisioterapeuta e/ou outros profissionais de saúde, pois até mesmo alterações visuais e ortodônticas podem influenciar a postura. 3.6.1 O papel da Fisioterapia O fisioterapeuta pode identificar precocemente alterações da postura por meio de avaliações, preferencialmente de seguimento ou ainda na existência de encaminhamento por profissional ou consulta individual a critério do paciente/responsável pelo paciente, e por isso sua presença é justificada tanto em ambientes de saúde como educacionais, tanto com estratégias de prevenção e promoção de uma postura adequada (Benini & Karolczak, 2010), como para reabilitação em caso de alterações posturais já instaladas. Endireite essas costas menin@ 121 Tabela 1. Mitos e verdades sobre postura na infância e adolescência. Mito Verdade Pés chatos precisam de botinhas ortopédicas ! Os pés chatos podem ser aceitos nas fases iniciais da vida. Quando persistem e são dolorosos necessitam de avaliação. Já existem evidências que a maioria dos pés chatos não são dolorosos ao longo da vida, e que as botinhas ortopédicas já não são mais usadas. Porém a fisioterapia conta com recursos desde orientação de exerćıcios ao uso de palmilhas que podem ajudar sua criança. Andadoresaceleram a marcha independente! Ao contrário do que se pensa, não há evidências que o andador acelere a aquisição da marcha e em alguns estudos foi responsável até mesmo por atrasar essa aquisição. Seu uso apresenta risco de acidentes e lesões que podem ser graves e até mesmo permanentes. O ideal é permitir que a criança explore o ambiente com máximo de liberdade de movimentos posśıveis e passe pelas diferentes posturas. Natação corrige a coluna! Exerćıcios aquáticos e fisioterapia aquática são excelentes para a saúde, mas o simples ato de nadar não garante um retorno do alinhamento da coluna. É necessária uma consulta com profissional de saúde (ortopediatra e fisioterapeuta) para identificação das alterações e que o adequado plano de tratamento, buscando o alinhamento seja realizado. Só pessoa idosa tem dores nas costas! Em qualquer idade desalinhamentos posturais podem ocasionar aumento de tensão e dor. Porém em indiv́ıduos mais jovens a vantagem é a capacidade de recuperação maior e em menor tempo. Escoliose se corrige com colete! Depende! Se forem escolioses com angulação menor que 15o a fisioterapia pode ser a única indicação. Já em valores maiores, há necessidade de intervenção, acompanhada por ortopedista de uso de colete, e acima de 35-40 muitas vezes é indicada cirurgia. Por isso não espere a escoliose de sua criança piorar. Se você percebe alterações consulte @ médic@ de sua criança e @ fisioterapeuta. As dores nas costas durante a adolescência são dores de crescimento e passam com o tempo! As dores de crescimento existem, porém nem todas as dores nas costas durante a adolescência são dores de crescimento, por isso devem ser avaliadas por um profissional qualificado e tratadas para que o quadro álgico não se torne crônico e não se estenda até a vida adulta. 122 Mélo et al. Exerćıcios para correção da postura incluem desde alongamento e fortalecimento por meio de cinesioterapia, até técnicas e métodos espećıficos. Em escolares com escoliose há evidências positivas tanto com a cinesioterapia convencional (Fiorelli et al., 2014; Oliveira et al., 2015), como os métodos de Reeducação Postural Global (Segura et al., 2011; Toledo et al., 2011), Isostretching (Borghi et al., 2008) e Pilates (Segura et al., 2011) apresentam efeitos positivos, ressaltando a necessidade de exerćıcios de alongamento e alinhamento postural pelo fisioterapeuta. Alterações posturais da coluna podem ser prevenidas e reabilitadas com fisioterapia, a Figura 7 mostra a evolução de um paciente com escoliose (Figura 9A), atendido ao longo de 3 anos de fisioterapia pela autora do caṕıtulo. A evolução do alinhamento postural é observada pela foto (Figuras 9B a 9D) e foi comprovada pela diminuição do ângulo de escoliose de 12o para 4o pelo raio-X, numa fase de estirão de crescimento. Figura 9. Evolução da postura de um paciente atendido por fisioterapeuta com o método Isostretching. Com relação ao alinhamento do quadril e joelhos, em casos em que padrões em varo (Figura 10A) ou valgo persistem, associadas ou não com rotação de quadril interna ou externa, a utilização de órteses e fisioterapia (Figura 10B) podem auxiliar no processo de recuperação e retorno ao alinhamento (Figuras 10C e 10D). Apesar do varo ser uma fase do DNPM t́ıpico, quando a distância entre os côndilos (joelhos) for maior que 4 cm (Figura 10A) a intervenção fisioterapêutica é indicada. Já em casos de alterações dos pés esses devem ser acompanhados e intervenções só devem ser realizadas caso a alteração atrapalhe alguma função ou esteja associada com dor (Dare & Dodwell, 2014; Bauer et al., 2011; Carr et al., 2016). Endireite essas costas menin@ 123 Figura 10. Exemplo de desalinhamento em varo do joelho (A), com intervenção fisioterapêutica e uso de órtese para correção do varo de joelho e rotação do quadril (B) corrigido em 7 meses (C) com manutenção do alinhamento (D) Fonte: imagem de paciente atendido por uma das autoras, com permissão dos pais. 3.6.2 Equipe multiprofissional Além da atuação da fisioterapia para melhora do alinhamento postural, práticas de atividades psicomotoras e prescrição de órteses, outros profissionais podem ser necessários nesse processo: pediatra e/ou ortopedista (para acompanhamento, indicação de exames e intervenções invasivas), fonoaudiólog@ e ortodentista (para avaliação e correção ortodôntica), professor/a de educação f́ısica (estimulação de atividades psicomotoras). Além da atuação da fisioterapia para melhora do alinhamento postural, práticas de atividades psicomotoras e prescrição de órteses, outros profissionais podem ser necessários nesse processo: pediatra e/ou ortopedista (para acompanhamento, indicação de exames e intervenções invasivas), fonoaudiólog@ e ortodentista (para avaliação e correção ortodôntica), professor/a de educação f́ısica (estimulação de atividades psicomotoras). IMPORTANTE: Para qualquer dúvida consulte um profissional especializad@ e/ou capacitad@! N~ao acredite em tudo que lê na internet! 4. Considerações finais Assim como o desenvolvimento neuropsicomotor, o desenvolvimento postural inicia já na fase intra-uterina e passa por várias modificações na infância, sendo influenciados por diversos fatores relacionados a hábitos adotados que repercutem sobre articulações, ósseos e músculos da coluna e membros, os quais podem se modificar de maneira tanto positiva como negativa, com repercussões sobre o desenvolvimento neuropsicomotor como um todo. 124 Mélo et al. Muitos mitos são criados em torno dessas alterações, mas na realidade atitudes simples no dia a dia podem evitar alterações patológicas e dores, sendo necessária a observação constante dessas crianças e, na existência de dúvidas e/ou alterações identificadas, procurar avaliação e atendimento fisioterapêutico adequado, com boas possibilidades de recuperação quando essa identificação é precoce. Portanto, fique atent@ a quaisquer sinais de alerta, e na existência deles busque profissional capacitad@. 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Vários fatores estão envolvidos, entre eles: o ingresso da mulher no mercado de trabalho; as novas possibilidades de arranjos familiares; o movimento migratório das pessoas do interior para cidades maiores, com mais acesso a oportunidades de trabalho e educação, o que faz com que nem sempre a mãe trabalhadora tenha apoio para o cuidado da sua criança; e, também, como recurso para a parcela da população que possui condições socioeconômicas desfavoráveis (Rapoport & Piccinini, 2004; Cerisara, 2002; Rossetti-Ferreira et al., 2011; Moreira & Lordelo, 2002). Historicamente, esse serviço vem passando por várias modificações ao longo dos anos. Especialmente nas últimas três décadas, a educação extrafamiliar de bebês e crianças pequenas, tem sido marcada por profundas mudanças sociais, culturais, poĺıticas e econômicas, que entre outros fatores, afetaram as relações sociais, o mundo do trabalho, as estruturas familiares, os sistemas de ensino, a imagem de criança e o lugar que nossos pequenos ocupam nas instituições educativas e na sociedade (Fernandes, 2011). Em suma, pode-se afirmar que essas modificações também contribúıram para que a Educação Infantil tivesse acentuada a sua função pedagógica, deixando para trás o caráter assistencialista que teve em sua origem (Oliveira et al., 2006; Weber et al., 2006). Sekkel & Matos (2014, p. 09) indicam“que a educação infantil inclusiva tem um papel significativo no fortalecimento das experiências infantis e na manutenção de uma abertura ao outro (novo e diferente) que permanece ao longo da vida”. Nessa transição de entendimento de sua função, na ∗Autor para contato: nellysouza@gmail.com Luize Bueno de Araujo & Vera Lúcia Israel (Ed.), (2017) DOI: 10.7436/2017.dcfes.08 ISBN 978-85-64619-19-7 nellysouza@gmail.com 130 Souza & Minetto medida em que se foi ampliando o número de matŕıculas, adquirindo maior espaço em pesquisas no páıs, nos debates sociais, suas fragilidades foram se destacando, o que levou aos resultados dos primeiros estudos sobre a qualidade desse serviço, os quais indicavam uma situação generalizada de precarização, verificada tanto em aspectos f́ısicos (instalações ruins, materiais pedagógicos e equipamentos em escassez ou completa ausência), quanto em aspectos humanos (baixa escolaridade dos profissionais, falta de formação dos educadores, ausência de projeto pedagógico, problemas de interação instituição-famı́lia) (Campos et al., 2006; Fernandes, 2011). Tais resultados são importantes, pois reforçam as discussões sobre a necessidade de um atendimento de qualidade como parte dos direitos da criança. Ainda nesse sentido, por uma concepção da criança como um ser de direitos, foram importantes documentos como a Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente, ECA – Lei no 8069/90 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB – Lei no 9394/96 (Campos et al., 2006; Rossetti-Ferreira et al., 2011; Brasil, 2001b). Para Campos (1999), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Brasil, 2001b) é a que promoveu as maiores modificações na Educação, pois influenciou vários aspectos, em todos os ńıveis educacionais do páıs, dentre os quais, o sistema de financiamento, o curŕıculo nacional, os sistemas de avaliação, o uso de novas tecnologias, a organização da gestão e as possibilidades de se estabelecer parcerias com organizações não governamentais. Entre os itens indicados por essa autora, há pelo menos dois que são considerados de extrema relevância para a Educação Infantil: a) a definição da Educação Infantil como primeira etapa da Educação Básica – fato que transfere a responsabilidade desta para órgãos de educação; b) a exigência de formação prévia (preferencialmente ńıvel superior, admitindo-se ainda, no mı́nimo, o magistério – no ńıvel de ensino médio) para educadores e professores que se dedicam ao trabalho com crianças pequenas (Campos et al., 2006; Rossetti-Ferreira et al., 2011). Outros documentos de impacto na organização do atendimento de crianças pequenas foram as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (Brasil, 2007) e o Plano Nacional de Educação, PNE (Brasil, 2001a). O primeiro, porque ofereceu subśıdios para os projetos pedagógicos das prefeituras e das unidades de Educação Infantil e, o segundo, por ter estabelecido padrões mı́nimos para a infra-estrutura das instituições de Educação Infantil, bem como definiu as metas de expansão desse atendimento no páıs (Campos et al., 2006). Atualmente, segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (Brasil, 2007), o ensino infantil é a primeira etapa da Educação Básica, ofertada por espaços institucionais denominados creches e pré-escolas, em caráter não doméstico, que constituem estabelecimentos O paradigma inclusivo e a educação infantil 131 educacionais públicos ou privados nos quais se prima pela educação e cuidado de crianças de 0 a 5 anos de idade no peŕıodo diurno, em jornada integral ou parcial, regulados e supervisionados por órgão competente do sistema de ensino e submetidos a controle social. Destaca-se que o acesso ao atendimento em Educação Infantil, especialmente na faixa etária entre 0 e 3 anos, vem crescendo significativamente nas diferentes regiões brasileiras, o que justifica a necessidade de se ampliar os estudos e pesquisas nessa área, também como uma maneira de possibilitar elementos que promovam a qualidade desse serviço (Campos et al., 2011). Além disso, há outro aspecto que deve ser associado aos estudos a respeito da Educação Infantil que é a relação com o processo inclusivo, que é uma realidade crescente e que merece atenção. 2. A Inclusão e a Educação Infantil O movimento pela educação inclusiva no Brasil teve um grande impacto na discussão de poĺıticas educacionais para crianças e adolescentes com necessidades especiais uma vez que a grande maioria desta população havia sido historicamente exclúıda do sistema educacional público brasileiro (Mendes et al.,2011). O paradigma inclusivo vem sendo constrúıdo já há bastante tempo e tem em seus marcos principais a Conferência Mundial de Educação para Todos em Jomtien, Tailândia, em 1990; a Conferência Mundial sobre necessidades educacionais especiais: Acesso e Qualidade, organizada pelo governo espanhol e pela UNESCO, em 1994; e, a Convenção da Guatemala ocorrida em 1999. Esses três grandes eventos fortaleceram a percepção de que era necessário melhorar a educação de crianças e adolescentes com necessidades especiais, entendendo que teria que haver uma ressignificação da pessoa com deficiência, remetendo a necessidade de se transformar as escolas de maneira que não existissem mais restrições à aprendizagem de nenhum aluno em nenhuma idade. O que implicou também em uma ressignificação da própria Educação Especial, segundo Alves (2008). Outro marco interessante foi a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – promovida pela ONU, em Nova York, em 2006. Os propósitos desse evento foram essencialmente os de promover, proteger e assegurar condições plenas de igualdade e de gozo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência (Alves, 2008). O Brasil assimilou essas discussões e trouxe, em 2007, na Poĺıtica Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, proposta pelo Ministério da Educação, o pressuposto de que o movimento mundial pela educação inclusiva deve ser entendido como parte de uma ação cultural, pedagógica, poĺıtica e social desencadeada em defesa do direito de todos os alunos de estarem aprendendo e participando juntos, 132 Souza & Minetto sem nenhum tipo de discriminação (Brasil, 2008). Portanto, a educação inclusiva constitui-se em um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis e que avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola (Brasil, 2008). Assim, o contexto educacional inclusivo está pautado nas resoluções discutidas e propostas por esses eventos, o que promove certa “universalização” do que seria uma “educação para todos”. No Brasil, o Ministério da Educação, assumiu as orientações contidas nesses documentos, cabendo aos Estados e Muńıcipios a particularização do atendimento aos diversos contextos. E, na prática, a educação inclusiva vem sendo um grande desafio, pois vem reorientando as redes municipais de ensino a uma reorganização por propor novas demandas e redefinir competências e responsabilidades (Garcia, 2008). Segundo as Diretrizes da Poĺıtica Nacional da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (Brasil, 2008), o acesso à educação tem ińıcio na educação infantil, na qual se desenvolvem as bases necessárias para a construção do conhecimento e desenvolvimento global do aluno. Nessa etapa, a ludicidade, o acesso às formas diferenciadas de comunicação, a riqueza de est́ımulos nos aspectos f́ısicos, emocionais, cognitivos, psicomotores e sociais e a convivência com as diferenças favorecem as relações interpessoais, o respeito e a valorização da criança. Interessa retomar que a Educação Especial, na busca pela construção de contextos cada vez inclusivos, a partir do Decreto no 5671 de 2008 passa por algumas modificações tanto no seu lócus de oferta quanto em sua caracteŕıstica de atendimento, o que implicará na garantia de sua agora confirmada transversalidade. O que significa dizer que o aluno com necessidades especiais não é mais foco de atendimento apenas do serviço da Educação Especial, mas esta se apresenta em apoio em caráter suplementar ou complementar ao ensino regular e a sua oferta se verifica em espaço próprio, a Sala de Recursos Multifuncional. O referido serviço atende o público alvo da Educação Especial no que é configurado por alunos com: Deficiências (intelectual, f́ısica/neuromotora, sensorial ou múltipla), Transtornos Globais do Desenvolvimento e aqueles com Altas Habilidades/Superdotação. O Decreto no 7611/11 reforça esse aspectos e que esse grupo de professores realiza atendimento ao alunado, foco da Educação Especial, e que estão em inclusão na Educação Infantil e no Ensino Fundamental. Para tal, seu trabalho e sua relação com a criança pequena com necessidades especiais é fundamental, visto que está previsto que elas também devem orientar as famı́lias e educadoras do CMEI sobre o processo de inclusão desse alunado. O paradigma inclusivo e a educação infantil 133 Conforme o tema do presente estudo sobre a inclusão da criança pequena ressalta-se que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB (9394/96) já apontava em seu paragrafo 3o que a oferta do atendimento em Educação Especial, enquanto dever do Estado, também deve ser ofertado na faixa etária de zero aos seis anos de idade. E, antes disso, a Declaração de Salamanca (1994) indicava que é necessário garantir identificação das condições e necessidades especiais, assim como garantir procedimentos de intervenção o mais precoce posśıvel. Nesse sentido, do nascimento aos três anos, o Atendimento Educacional Especializado pode ser expresso por meio de serviços de estimulação precoce, que objetivam o processo de desenvolvimento e aprendizagem em interface com os serviços de saúde e assistência social (Brasil, 2008). E todas as etapas e modalidades da educação básica, o Atendimento Educacional Especializado deve ser organizado para apoiar o desenvolvimento dos alunos, constituindo oferta obrigatória dos sistemas de ensino. Deve ser realizado no turno inverso ao da classe comum, na própria escola ou centro especializado que realize esse serviço educacional (Brasil, 2008, 2011). Em virtude da orientação acima descrita, infere-se que esta certamente colaborou para a ampliação do acesso de crianças pequenas com necessidades especiais em condição de inclusão no ensino regular, especialmente na Educação Infantil, o que, por sua vez, pressupõe adequações para garantir um atendimento de qualidade desde tenra idade. Ferreira (2016) faz uma descrição muito atual do processo de implementação de poĺıticas públicas de inclusão na Educação Infantil, ou seja, a autora busca compreender se tais poĺıticas estão sendo efetivamente executadas. Por meio de estudo exploratório e descritivo do atendimento em 25 creches inclusivas (que tinham crianças com deficiência matriculadas em salas de ensino comum) no munićıpio de Franca (no Estado de São Paulo). Os resultados apontam que apesar dos avanços da legislação, principalmente no que diz respeito à perspectiva de Educação Inclusiva, observa-se uma organização na esfera teórica para “tentar atender ao que é legalmente assegurado, porém a teoria somente alcançará resultados se colocada em prática” (Ferreira, 2016, p. 110). A autora resume dizendo que a chegada das crianças com deficiência nas instituições de Educação Infantil requer que seja assegurada inclusão com qualidade, o que implica em ambientes f́ısicos adaptados, recursos pedagógicos adequados, proposta pedagógica com atendimento especializado complementar, e a capacitação dos profissionais. Paschoal & Brandão (2015) apontam que houve um avanço significativo da legislação quando esta reconheceu a criança como cidadã, como sujeito de direitos, inclusive, de direito à educação de qualidade desde o nascimento. Por outro lado, as contradições nas diferentes determinações 134 Souza & Minetto legais evidenciam os inúmeros desafios colocados para a efetivação desses direitos na vida das crianças e de suas famı́lias. Segundo dados ofertados pelo Brasil (2015), a partir do compromisso inclusivo, amplia-se o acesso ao ensino regular e ao desenvolvimento de poĺıticas públicas voltadas à inclusão escolarnos sistemas de ensino brasileiros. Em 2014, constata-se o total de 886.815 matŕıculas de estudantes público-alvo da Educação Especial, sendo 698.768 em classes comuns do ensino regular, representando 79% de inclusão escolar desta população. Entre 2008 a 2014, verifica-se crescimento de 84% das matŕıculas dos estudantes público-alvo da Educação Especial, na faixa etária de 04 a 17 anos, nas escolas comuns da rede regular de ensino, passando de 337.640 para 633.042 matŕıculas. O mesmo documento (Brasil, 2015) aponta a evolução das ações referentes à Educação Especial nos últimos anos é expressa no crescimento de 81% no número de munićıpios com matŕıculas de estudantes público alvo da Educação Especial. Em 1998, registram-se 2.738 munićıpios (50%), chegando a 2013, com 5.553 munićıpios (99%). Verifica-se, ainda, o aumento do número de escolas com matŕıcula, que em 1998 registra 6.557 escolas com matŕıcula de estudantes público-alvo da Educação Especial e, em 2013 passa a registrar 104.000, representando um crescimento de 1.486%. Dentre as escolas com matŕıcula de estudante público-alvo da Educação Especial, em 2013, 4.071 são escolas especiais e 99.929 são escolas de ensino regular com matŕıculas nas turmas comuns. Com o avanço do número de matriculas no ensino regular uma nova legislação, que estava a mais de 14 anos em tramitação foi aprovada. A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI – Lei 13.146/15) trouxe muitas novidades e assegurou direitos importantes dentre eles diagnóstico precoce, feito por equipe multidisciplinar, atendimentos especializados dos diferentes formatos conforme a necessidade, a presença de um profissional de apoio nas escolas que não deve ser financiado pelos pais. Outros benef́ıcios importantes foram criação de um ”aux́ılio- inclusão”, que consiste em uma renda auxiliar para o trabalhador portador de deficiência. Outro destaque está no fato de que as escolas privadas ficam proibidas de cobrar mensalidades maiores para alunos com algum tipo de deficiência. Também foi aprovada a obrigação de o poder público incentivar e fomentar a publicação de livros acesśıveis pelas editoras brasileiras. A nova lei também assegura o voto das pessoas com deficiência, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. No exerćıcio de cargo público, a pessoa terá assegurado o uso de tecnologias apropriadas, quando necessário. Dentre muitos outros direitos assegurados. Segundo Silva (2015, 2016) a nova Lei Brasileira de Inclusão materializa ações multidimensionais em torno da pessoa com deficiência abrangendo todo o ciclo vital, ou seja desde a infância até a vida adulta, de forma O paradigma inclusivo e a educação infantil 135 alinhada com a Declaração dos Direitos humanos e sobretudo com a Agenda de Desenvolvimento Sustentável para 2030. A contemporaneidade nos trouxe uma gama de transformações sociais; entre elas, algumas estão atreladas a perspectiva de construção de uma educação mais aberta, responsável e inclusiva. Atualmente pensar sobre educação de pessoas com necessidades especiais, implica em pensar em qualidade de atendimento e em contextos inclusivos, promotores de desenvolvimento, a partir de uma perspectiva de alteridade e equidade de direitos e oportunidades desde a infância. Segundo Arnais (2003), possibilitar o acesso à educação em contextos educacionais não excludentes o mais precoce posśıvel proporcionaria para a criança com necessidades especiais uma melhor compreensão de si mesma e dos outros e, aos colegas de turma e de escola, uma experiência de convivência harmônica com as diferenças. Desse modo, resume-se que alguns dos fundamentais prinćıpios do ideário da Educação Inclusiva são: o direito à educação; o direito à igualdade de oportunidades, o que não significa um “modo igual” de educar a todos e sim dar a cada um o que necessita, em função de suas caracteŕısticas e necessidades individuais; escolas responsivas e de boa qualidade; o direito à aprendizagem e o direito à participação (Carvalho, 2009; Oliveira, 2010). O que está consonante com a ilustração de Alves (2008) como benef́ıcios de uma “escola aberta” a todos: sentimento de pertencimento; maior qualidade da educação para todos e combate a todas as formas de discriminação. Com isso se procura garantir ocasiões de múltiplas interações nos ambientes das creches e pré-escolas, não excluindo de forma alguma a criança com necessidades educacionais especiais, de modo que todas as crianças tenham a oportunidade de aprender com as contribuições de cada um de seus colegas, em uma relação de alteridade (Oliveira, 2010). 3. Desafios para a Prática Inclusiva na Educação Infantil A realidade prática da Educação Inclusiva ainda apresenta muitos desafios e dificuldades. Ainda que, nos últimos vinte anos, conceitos como exclusão e inclusão educacionais tenham se tornado cada vez mais recorrentes nas pesquisas, documentos oficiais e na fala de gestores e professores, pode-se afirmar que uma educação que busca primar pela qualidade de todos os alunos esbarra em desigualdades de diversas naturezas (sociais, étnicas, raciais e de gênero) presentes na sociedade brasileira, que historicamente acumula um quadro de exclusões e contradições marcado por poĺıticas lábeis e inconsistentes (Sekkel et al., 2010; Moreira et al., 2011). Batista & Batista (2008) destacam que, em muitas situações, crianças pequenas que estão em inclusão educacional permanecem mais isoladas, especialmente as que apresentam alterações f́ısicas, por serem consideradas 136 Souza & Minetto incapazes de se locomover e explorar ambientes e objetos. Isto representa a perda de momentos importantes de interação social, ficando isoladas do contato com parceiros com semelhança de idade e tendo suas interações restritas à relação com o adulto cuidador (Batista & Batista, 2008) . Outrossim, é posśıvel verificar uma concepção de inclusão restrita ao atendimento de crianças com deficiências, enquanto as necessidades das demais crianças e dos profissionais que trabalham na escola são muitas vezes desconsideradas. O isolamento e o envolvimento com questões marginais do trabalho pedagógico são pontos centrais a serem considerados no enfrentamento das barreiras atitudinais para a construção de um ambiente inclusivo (Sekkel et al., 2010). Outro aspecto que merece atenção é a formação dos pedagogos e professores que atendem às crianças pequenas com deficiência na Educação Infantil, pois demonstram em vários estudos não possúırem conhecimentos suficientes para lidar com as particularidades que envolvem as diferentes condições de deficiência, tal como a intelectual ou a f́ısica, conforme evidenciado nos estudos de Melo & Ferreira (2009) e de Vitta et al. (2010). Esse último estudo traz concepções de professores de Educação Infantil que atendem crianças com deficiência e nas quais demonstram crer que a principal contribuição do processo de inclusão é a socialização destas crianças (Vitta et al., 2010). As autoras acima citadas também ressaltam terem encontrado problemas com o espaço f́ısico, recursos materiais e humanos, relativos à formação do professor; desse modo, os autores consideram que é preciso possibilitar aos professores uma formação que abranja conhecimentos sobre as diferentes deficiências e as necessidades educacionais relativas a estas, propiciando a adequação do espaço f́ısico e dos recursos materiais, além de assistência educacional espećıfica (Vitta et al., 2010). Drago (2005) percebeu que a inclusão da criança na Educação Infantil ainda se dá como mera integração, ou seja, baseada no prinćıpio que quem deve mudar é o aluno, ele é quem deve se adequar à escola e não o contrário. No estudo de Mendes (2010) as educadoras avaliaram que o prinćıpio da inclusão é válido, embora dif́ıcil de sercolocado em prática. Desse modo, é posśıvel perceber dados indicando que a inclusão de crianças com necessidades especiais é vista com reservas pelos profissionais da Educação Infantil, explicitando ideias preconcebidas sobre a deficiência. Eles se justificam pela falta de conhecimento do desenvolvimento infantil e dos fatores que o envolvem, bem como pelo fato de os profissionais vincularem suas atividades às experiências pessoais (Vitta, 2004, 2010). Vidal (2012) infere em sua pesquisa com crianças com idade entre quatro e seis anos, que há a necessidade de se discutir e promover ações que auxiliem na identificação do preconceito nessa faixa etária. Drago (2005) faz referências ao papel do educador de Educação Infantil enquanto importante modelo no que se refere ao entendimento, acolhimento O paradigma inclusivo e a educação infantil 137 e aceitação da criança pequena com deficiência na turma. Bazon (2009) constatou que atitudes de preconceito, barreiras atitudinais e falta de informação por parte de professores afetam profundamente o processo de inclusão da criança pequena. Nesse sentido, Bartalotti (2004) percebeu que a construção de histórias de sucesso na inclusão de crianças com necessidades especiais na Educação Infantil envolve a orientação, apoio e momentos de reflexão e discussão sobre o papel dos educadores junto a ações inclusivas e as singularidades desse alunado. Já Fernandes et al. (2008) indicam pelo menos dois grandes desafios para a inclusão da criança pequena na Educação Infantil: a) a ainda vigente visão cĺınico-assistencialista da deficiência, o que, nos primeiros anos de vida faz com que a criança seja vista como enferma ou doente; e b) as condições de acolhimento e orientação às famı́lias nos primeiros meses de vida da criança com deficiência, o que resulta, em um grande número de vezes, na dificuldade de aceitação da condição de deficiência da criança por sua famı́lia e na falta de observância do potencial de promoção do desenvolvimento dessa criança desde tenra idade. No que se refere às famı́lias das crianças com necessidades especiais, há a evidência da necessidade de um acompanhamento, antes, durante e após a inclusão propriamente dita, de modo a apoiá-las nos momentos de busca e escolha da escola, de adaptação da criança ao novo ambiente e de transição dos atendimentos oferecidos pela instituição especializada para outros setores (Luiz & Nascimento, 2012). Igualmente, Benincasa (2011) destaca: a) a importância da articulação entre os campos da Educação Especial e da Educação Infantil na construção de propostas pedagógicas que sirvam como suporte aos diferentes sujeitos envolvidos (professores, comunidade, famı́lia e criança) para a efetiva permanência do aluno com necessidades especiais no ensino comum; b) a presença de uma variedade de modos de recepção e compreensão do movimento de inclusão escolar por parte dos educadores envolvidos; e c) o reconhecimento de que o local de instituição (estrutura f́ısica e questões relacionadas à acessibilidade, por exemplo) produz impacto para se pensar os processos de escolarização de seus alunos e a tomada de decisão relativa a esses processos. França (2008) observou a influência positiva da estimulação assistemática, realizada por meio das interações sociais em sala regular para o desenvolvimento motor e interação social de crianças cegas menores de cinco anos e Amaro (2004) evidenciou a importância de se observar e refletir sobre a singularidade do aluno com necessidades especiais para que esta seja respeitada e valorizada. 138 Souza & Minetto Assim, percebe-se que Educação Inclusiva é uma reforma educacional que abarca um âmbito bastante abrangente, em diferentes ńıveis de mudanças, como já afirmado por Rodrigues & Lima-Rodrigues (2011). Tal fato requer a busca constante de se desvencilhar de muitas armadilhas conceituais para que a escola inclusiva deixe de ser mera proposição e passe a existir de verdade (Drago, 2011). Segundo Mendes (2010) é necessário definir quem são as crianças com necessidades especiais na idade entre zero e seis anos, para que se possam determinar os critérios de elegibilidade para os programas de detecção e intervenção precoce e planejar as ações necessárias, tais como alocar recursos, formar pessoal, entre outros. O que implicaria em discutir de forma concomitante o caráter transversal da Educação Especial na atualidade e o próprio serviço de Atendimento Educacional Especializado a partir de uma perspectiva de trabalho colaborativo com a Educação Infantil. Dentro de um panorama no qual a criança pequena é inserida no cuidado institucionalizado desde tenra idade e no qual passa cerca de 4 a 8 horas por dia distante de sua famı́lia, o educador de creche adquire uma função importante perante o desenvolvimento infantil, não apenas de cuidar e educar, senão de complementar e, às vezes de suplementar, a atenção familiar à infância (Bolsanello & Silva, 2002; Winnicott, 1975; Eltnik, 1999). Assim, as concepções que permeiam o atendimento são fundamentais, pois podem reforçar e manter determinadas ações, às vezes distorcidas, do que é necessário ou recomendável para a prática pedagógica (Schultz, 2002; Pacheco & Dupret, 2004). O cuidado de crianças pequenas durante muito tempo esteve atrelado à figura da mulher, senśıvel e carinhosa, que possúıa o perfil de “mãe” e gostava de cuidar de crianças, o que fortaleceu o caráter leigo e assistencialista dessa função (Oliveira et al., 2006; Weber et al., 2006). Ainda como parte dessa concepção, o atendimento voltado para as crianças menores, ocupou - e ainda ocupa - o lugar da necessidade, da desproteção, da fragilidade, de um trabalho voltado para a alimentação, a higiene, o abrigo e o apoio para o caso de ausência familiar (Fernandes, 2011; Guimarães, 2011; Souza, 2008). Tal situação parece ter corroborado com a desvalorização do profissional de creche, em especial o que trabalha com berçário e, com a dificuldade em se estabelecer uma identidade pedagógica nesse serviço (Souza, 2008; Oliveira et al., 2006). Como bem lembra Ramos (2006), a Educação Infantil, embora sua história remonte mais de um século como cuidado e educação extrafamiliar, somente nos últimos anos passou a ser inserida numa perspectiva educacional, em resposta aos movimentos sociais em defesa dos direitos das crianças. Como parte dessa transição do assistencialismo para a função pedagógica, alguns temas passaram a fazer parte das discussões no âmbito profissional da Educação Infantil e de pesquisas na área, com O paradigma inclusivo e a educação infantil 139 mais frequência, os quais facilmente se destacam: formação profissional, desenvolvimento infantil, relação adulto-criança, v́ınculo, planejamento, diversidade, competência infantil, entre outros. Nesse sentido, também se deve levar em conta que parece ser inevitável a revisão das bases e paradigmas educacionais vigentes, pois há que se promover um diálogo com as mudanças inerentes ao mundo atual (Gomes, 2009). Desde os anos 90 tem sido posśıvel identificar pesquisas relevantes que foram descortinando aspectos muito relevantes e contraditórios do trabalho do educador de creche, os quais ajudam a perceber concepções e necessidades, e fazem entender quais pilares vem suportando esse atendimento. Um exemplo é o trabalho de Lordelo (1995, 1998) que indicou em seus estudos que os educadores não se mostravam como parceiros do desenvolvimento infantil, pois trabalhavam em função de responder às necessidades mais imediatas e, predominantemente, f́ısicas das crianças atendidas. Também Melchiori & Alves (2001) revelam que os educadores não têm consciência de sua função como promotores de desenvolvimento infantil. Já Veŕıssimo & Fonseca (2003) perceberam que o atendimento de bebês nacreche é fortemente centrado na atenção quanto à higiene e alimentação. Vitta & Emmel (2004) identificaram uma tendência de que o trabalho no berçário seja pautado na concepção e na experiência de maternagem dos educadores. Já no estudo de Oliveira et al. (2006), os educadores demonstraram possuir a crença de que para atender crianças pequenas bastava ser mulher e ter experiência com crianças. Alves (2006) percebeu que a ideia de cuidado está relacionada à função de mãe e não à função de professor ou de educador. Nesse sentido, Veŕıssimo (2001) identificou um sentimento contraditório entre os educadores. Enquanto eles acreditam que associar função materna com a prática profissional é algo depreciativo, por outro lado, esperam que as crianças nutram afeto “filial” por eles. Soejima (2008) salienta que os educadores que participaram de sua pesquisa, demonstraram ter aprendido teorias sobre o desenvolvimento infantil na graduação, mas que não conseguiam fazer uso desse conhecimento no cotidiano da creche. Igualmente Souza (2008) verificou que os educadores possuem formação continuada sobre desenvolvimento infantil, mas que encontram dificuldades em transpor para a ação o seu conhecimento. Também se destacam conceitos pertinentes ao desenvolvimento humano e, especificamente voltados ao desenvolvimento da criança pequena Vitta (2004), Souza (2008) e Soejima & Bolsanello (2012) evidenciaram falta de conhecimentos abrangentes e consistentes sobre desenvolvimento infantil por parte dos educadores em seus estudos. Estes quando aparecem, são mais voltados à priorização de fatores ambientais, logo, gerando uma crença ambientalista de desenvolvimento (Melchiori & Alves, 2001; Melchiori et al., 2007; Souza, 2008). 140 Souza & Minetto Sobre desenvolvimento infantil, Soejima & Bolsanello (2012) verificaram a concepção entre os educadores de que quanto menos ativas as crianças eram, mais saudáveis, e, que quanto mais ativas, mais problemáticas. Sob esse aspecto, cabe questionar a qualidade da formação dos educadores conforme já proposto por Silva (2003), Vitta & Emmel (2004), Kramer (2006), Souza (2008) e Soejima (2008). Nesse sentido, ressaltam-se os achados de Schultz (2002) ao pesquisar a educação de crianças entre 0 e 3 anos e nos quais afirma que a formação dos professores dessa faixa etária pode interferir no desenvolvimento f́ısico e pśıquico e no bom desempenho da criança em seu futuro, já que, segundo a autora, há uma relação de dependência entre a formação do educador e a qualidade de seu trabalho. Por outro lado, a rotina dessas trabalhadoras mostra-se estressante, com muitas atribuições e com pouco ou nenhum tempo para o planejamento e reflexão sobre sua prática, ou mesmo para o cumprimento do que foi planejado, assim como, não raro, há a precarização da estrutura f́ısica dos ambientes, com poucos materiais e excessivo número de crianças por educadora (Alves, 2006; Oliveira et al., 2006; Lordelo et al., 2007; Souza, 2008). Há que se pensar que a fadiga, tanto f́ısica quanto mental, a falta de tempo, a frustração por suas condições de trabalho são aspectos que impedem um trabalho com qualidade e devem ser amplamente investigados (Souza, 2008; Bolsanello, 2009). Guimarães (2011) percebeu que a rotina na creche é fortemente baseada no controle e na automação das atividades. Segundo ela, os educadores falam muito para as crianças e não com as crianças, como citado por ela, descrevendo a rotina: “do colo ao chão; do chão para a cadeira; da cadeira novamente para o chão; o corpo dos bebês é conduzido pelos adultos, em razão das necessidades emergentes e do tempo correto para cada uma”. Tal dado corrobora com os achados de Souza (2008), no qual um dos educadores de seu estudo analisa a rotina de trabalho em creche como uma espécie de “fordismo infantil”, pois não é posśıvel dar conta da individualidade das crianças. Diante desses estudos destaca-se que o cotidiano da Educação Infantil é muito mais complexo do que parece à primeira vista. Não é tarefa simples apreendê-lo e analisá-lo (Carvalho, 2006). Contudo, é a partir de discussões conscientes sobre os aspectos envolvidos nos atendimentos à criança pequena que se tornará posśıvel ampliar a compreensão sobre o que é preciso para que os espaços da Educação Infantil se tornem contextos plenos e fomentadores do desenvolvimento humano, da capacidade de aprendizagem, da socialização e do exerćıcio da cidadania (Lima & Bhering, 2006). Ou ainda, como afirmado por Gomes (2009), pensar em educação de crianças com qualidade envolve não só considerar a travessia dos profissionais da creche para a área de Educação e sua formação, senão, O paradigma inclusivo e a educação infantil 141 buscar também, não descaracterizar suas histórias, suas experiências, superando o assistencialismo, objetivando a garantia dos direitos das crianças e, conjuntamente, os direitos dos educadores. Ainda, junto às afirmações de Gomes (2009), pensa-se que o que se põe também como uma questão importante, ou seja, a capacidade do educador de produzir reflexão sobre sua prática, podendo conceituá-la e transformá-la. Entre as reflexões haveria de ser integrado além dos aspectos de cuidar e educar, fatores relativos ao desenvolvimento humano. Afinal, ao cuidar e ao educar se está lidando com um ser em desenvolvimento intenso, cujos marcos iniciais de sua constituição como indiv́ıduo estão, também, à mercê do olhar de quem o cuida e o educa diariamente. Sendo assim, entender processos elementares e fundamentais do desenvolvimento humano, essencialmente nos primeiros anos, é relevante tanto para a organização e planejamento do cotidiano de atendimento quanto para o estabelecimento de estratégias na Educação Infantil (Carvalho et al., 2002). Logo, promover a avaliação do atendimento (no conjunto: profissionais, ambiente, interação com a famı́lia, estratégias de planejamento e atividades desenvolvidas) é algo importante, principalmente no que diz respeito ao contexto dos primeiros anos de vida, dada a sua especificidade e importância no futuro do indiv́ıduo (Lima & Bhering, 2006). Além de questões como a formação dos educadores e suas concepções, também vale a consideração de como se verifica a relação entre elas e as famı́lias das crianças atendidas. Afinal, a interação entre a famı́lia e a instituição de Educação Infantil é relevante para que ambos os contextos conheçam melhor a criança, estabeleçam critérios educativos comuns, discutam modelos de intervenção e relação com as crianças e compreendam as especificidades de cada uma (Silva, 2011). Nesse aspecto, vale lembrar que é na relação com o adulto cuidador que a criança vai, desde tenra idade, estabelecer “elos” de comunicação com as demais pessoas com quem convive. E por isso mesmo é que as ações de cuidado e educação não podem ser ações mecânicas de assear e alimentar apenas (Rocha, 2008). Contudo, as dificuldades dos educadores também passam pela precária interação com as famı́lias das crianças atendidas (Lordelo et al., 2007; Souza, 2008; Campos et al., 2011; Fernandes, 2011). Correa (2007) argumenta em sua pesquisa, que a relação famı́lia-instituição é um ponto a ser considerado para a promoção de um atendimento de qualidade. Silva (2011) percebeu em seu estudo que os educadores não demonstram conhecer ao certo como se dá o contexto familiar das crianças que atendem. Souza (2008) observou que a famı́lia não participa ativamente da rotina da creche na maioria das vezes deixando a criança na porta da instituição. Os projetos pedagógicos analisados por Fernandes (2011) indicaram um perfil de famı́lia visto pela escola, como um grupo que precisa de ajuda e que pode contribuir pouco com a Instituição. Instituição essa que convida o adulto-cuidador mais a confraternizar que compartilhar responsabilidades.142 Souza & Minetto A autora também verificou que há a necessidade de os pais participarem efetivamente das ações da creche, pois segundo ela, ao criar espaços de diálogo, troca, parcerias, pode-se favorecer e estimular as famı́lias a viverem experiências sociais mais amplas, a partilhar as angústias, alegrias e inseguranças advindas do cotidiano, favorecendo a superação das ideias assistencialistas acerca da Educação Infantil, em especial da que atende a criança com idade entre zero e três anos. Por outro lado, percebe-se que os pais nem sempre se excluem de participar tanto do cotidiano da Instituição quanto da educação de seus filhos (Fernandes, 2011; Silva, 2011). 4. O Paradigma Inclusivo na Educação Infantil: Contribuições para a Prática O distanciamento entre teoria e a prática é um dos aspectos discutidos pelos profissionais de educação que, por vezes, salientam que mesmo com cursos de especialização ou de aperfeiçoamento não se sentem seguros para modificar a prática em sala de aula. A articulação teoria e prática exige mudança de paradigma. De nada adianta o domı́nio de uma teoria se a mesma não subsidia a prática. Certamente um professor que tem muitos anos de prática, acredita que tem domı́nio e diante de um aluno com deficiência fica sem ação, uma vez que suas técnicas não tem o resultado esperado. Ao buscar novos saberes se depara com o desafio de mudar ações. Batista & Santos (2015) fazem uma revisão de literatura buscando verificar as opiniões a respeito da formação de professor e inclusão das crianças com deficiência na educação infantil nos mais diferentes aspectos: Formação (Inicial e Continuada), e inclusão das crianças pequenas com deficiência. Os resultados apontam que a formação continuada deve ter como foco as diferentes situações que constituem o ato educativo, a análise das práticas docentes e a criação de espaços para a reflexão coletiva, esforçando-se para criar na escola a crença de que é posśıvel pensar soluções para as questões da realidade escolar. Perrenoud et al. (2001) observam que o professor está constantemente diante de um processo cont́ınuo de tomada de decisões que dependem de seus saberes, agilidades nos esquemas de ação, aliados a suas concepções e a forma de olhar o mundo. Para os autores o trabalho pedagógico pressupõe a relação teoria e prática, sendo que a teoria compreende a sistematização do conhecimento, tentativa de interpretação dos anseios e necessidades que caracterizam a subjetividade humana, enquanto que a prática se constitui na realização do vivido, do material, do concreto. A inclusão provoca uma avalanche de reflexões, que além das modificações pedagógicas, revelam as dificuldades na prática ao lidar com alunos que se destacam do contexto por dificuldades espećıficas de aprendizagem ou por alterações do seu comportamento. Na verdade, a inclusão veio revelar o que já era real a formação do professor deixa a O paradigma inclusivo e a educação infantil 143 desejar quando não acompanha as exigências de sua prática. Quando suas competências não se adaptam as diversidades do alunado. É fundamental correlacionar a formação do professor, seu olhar diante a diferença, e a influência desses fatores na relação pedagógica em sala de aula. A constatação da diversidade como elemento integrante da natureza humana, esbarra a todo o momento em práticas que privilegiam a homogeneidade. Uma mudança de paradigma exige revisão de muitos conceitos. A educação embasada na ciência tradicional Newtoniana, Cartesiana que tinha como pressupostos a simplicidade (reação causais lineares, causa-efeito), estabilidade (determinação, previsibilidade), objetividade (subjetividade, uma única versão sofre um fato). Por isso, se a criança tinha um diagnóstico, por exemplo, de deficiência intelectual, já era certo a ideia de que não aprende; mas é fato que crianças deficientes não aprendem? Novos tempos, novas reflexões sobre os mesmos fatos, autores como Edgar Morin, e o pensamento complexo; Frijof Capra, e o pensamento sistêmico; Ludwig Von Bertalanffy, e a teoria geral dos sistemas, apresentam uma abordagem unificada de problemas de comunicação e de controle envolvendo todo um complexo de novas ideias. A educação na atualidade está permeada pelo paradigma contemporâneo (o pensamento sistêmico), e seus pressupostos: complexidade: contextualização, reação causais recursivas; instabilidade: indeterminação, imprevisibilidade; e intersubjetividade: múltiplas versões sobre um fato depende do olhar do observador (Vasconcelos, 2002). A educação hoje exige o abandono do pensamento simples que busca uma única resposta, uma única solução. Precisamos aceitar a instabilidade inerente à situação de aprendizagem de que quando uma criança não aprende é necessário pensar: Não aprendem o quê? Não aprendem onde? Não aprendem quando? Temos que exercitar a complexidade buscando as múltiplas variáveis que estão relacionadas à diversidade de aprendizagem, lembrando dos pressupostos acima citados. A relação teoria e prática está muitas vezes cristalizada pelo pensamento simples que desconsidera as contradições e as instabilidades do cotidiano. Na busca de certeza não se consegue atender a diversidade recheada de incertezas e instabilidade. E é nesse sentido que se sugere que a discussão sobre a Educação Inclusiva desde a Educação Infantil seja feita a partir de uma perspectiva voltada para a qualidade no atendimento e no entendimento de que esse paradigma, por ser provocativo, é ferramenta fundamental para a construção de contextos e pessoas que sejam mais favoráveis à alteridade nas relações e na equidade de direitos de ser e estar. Uma grande questão surge dessa discussão: é posśıvel fazer da Educação Infantil espaço e tempo que propicie a promoção do desenvolvimento humano a partir de contextos inclusivos? 144 Souza & Minetto Sugere-se que, se houver atenção e respeito a determinados aspectos, sim, é posśıvel. Assim, em relação ao paradigma inclusivo destaca-se em conformidade com estudo realizado por Souza (2013) a necessidade de serem considerados os seguintes aspectos: a) A construção de uma concepção de criança pequena com deficiência que a considere ativa, e um indiv́ıduo em desenvolvimento; b) A discussão e ampliação da concepção de inclusão, especialmente no que se refere à Educação Infantil; c) A utilização de uma abordagem de atendimento baseada nas relações e trocas mútuas entre os contextos nos quais a criança participa, direta ou indiretamente; d) Identifique e acolha as caracteŕısticas e necessidades da famı́lia da criança que está em inclusão, tornando-a também agente mediadora da inclusão do filho; e) A identidade e o papel do educador que trabalha no Centro Municipal de Educação Infantil e do professor do Atendimento Educacional Especializado, enquanto agentes mediadores da inclusão na Educação Infantil, a partir de uma perspectiva de cooperação e colaboração; f) A inclusão também como um modo de intervenção precoce, na qual se previne e minimiza riscos e dificuldades, promovendo o desenvolvimento humano. g) A adequação dos espaços das creches levando-se em consideração a realidade do atendimento, a quantidade de crianças atendidas, e as especificidades do público infantil que está em inclusão; h) A criação de cursos espećıficos que tratem da inclusão e do desenvolvimento na primeira infância; i) E, que os cursos de formação inicial e os de formação continuada levem em conta a inclusão de uma criança real, e que possam ser organizados conforme a linguagem e a realidade da prática profissional. 5. Considerações Finais As poĺıticas inclusivas estão avançando e se fortalecendo, ao mesmo tempo em que são exigidas mudanças no cotidiano da escola. A garantia das conquistas dos direitosdos estudantes com deficiência na escola perpassa a ação do professor e mudanças no espaço educacional. Promover a igualdade de oportunidade requer mudanças de paradigmas, de pensamento e de ação. É preciso pensar de forma ampla na inclusão educacional, como parte de um projeto de sociedade no qual se faz necessária a atuação de diferentes personagens e instâncias em prol de todos os sujeitos envolvidos. O paradigma inclusivo e a educação infantil 145 Referências Alves, D.O., Os desafios para a poĺıtica e a pesquisa em educação especial no Brasil. In: Mendes, E.G.; Almeida, M.A. & Hayashi, M.C.P.I. (Eds.), Temas em Educação Especial. Araraquara, SP: Junqueira & Marin, 2008. Alves, R.C.P., Percepções de Educadoras e Proposta Institucional Acerca dos Cuidados Infantis de Saúde em Creche. 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Desta forma, começou-se a mudar o modelo dereferência da pessoa com deficiência, antes focada em critérios exclusivamente médicos, para ummodelo social e educacional focadono que a criança ou adolescente em inclusão precisam para aprender de maneira espećıficae diferenciada de acordo com suas necessidades e potencialidades (Sanches & Teodoro, 2006; Sanches, 2011). O processo de inclusão escolar é um movimento histórico que tem sua origem na luta das pessoas com deficiência ao direitoa educação. Desta forma, este processoteve origem na educação especial que ao longo da históriapassou de segregacionista para o processo de educação inclusiva (Anjos et al., 2009; Silva, 2011). A partir de 1988, com a elaboração da Constituição Federal, o Estado passa a garantir um direito inalienável ao cidadão brasileiro, no qual assume o compromisso de educar a todos, sem qualquerdiscriminação ou exclusão social. Isto fica claro no Artigo 208, ∗Autor para contato: manoeladpferreira@gmail.com Luize Bueno de Araujo & Vera Lúcia Israel (Ed.), (2017) DOI: 10.7436/2017.dcfes.09 ISBN 978-85-64619-19-7 manoeladpferreira@gmail.com 152 Ferreira, Mélo & Israel [...] o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino [...] Dois anos após a Constituição Federal, ocorreu a Conferência Mundial sobre Educação para Todos (1990) reforçada pela conferência Mundial sobre necessidades educativas especiais, que originou a Declaração de Salamanca (1994), assinada por 92 páıses, valorizou os direitos da criança e do adolescente e asquestões sobre igualdade de oportunidades às pessoas com deficiência (Sanches & Teodoro, 2006; Silveira et al., 2012; Garcia, 2013). Neste sentido pode-se visualizar três fatores que contribuem para o pensamento inclusivo: 1o o lugar da pessoa com deficiência e da sociedade; 2o a visão e preparo do campo cient́ıfico; e 3o as práticas para o processo inclusivo (Anjos et al., 2009). Estes três aspectos devem ser discutidos em conjunto visando o as reflexões e ações no sentido de iniciativas inovadoras para que de fato a inclusão ocorra e permaneça em todos os âmbitos educacionais e sociais. Numa visão segregacionista, na qual as pessoas com deficiência deveriam ser educadas entre seus iguais, para assim serem bem atendidas, a ciência empenhava-se em conhecer e categorizar os diferentes tipos de doenças para, na tentativa da busca pela cura, cuidar dos doentes diferentes da sociedade, valorizando assim o modelo médico da deficiência e não verificando as potencialidades e valores da pessoa com deficiência (Anjos et al., 2009; Sanches, 2011). Com o passar do tempo o modelo médico segregacionista evolui para o modelo integracionista, ao invés de fatores orgânicos serem destacados, são os padrões sociais ou ambientais os que norteiam o processo de inclusão educacional e social da pessoa com deficiência. Nesta visão do modelo social da deficiência, os professores e equipe pedagógica deveriam dar condições para que a pessoa com deficiência estivesse ao máximo inserida nos padrões da escola comum, desta forma, criam-se as classes especiais. O problema deste paradigma, é que mesmo a pessoa com deficiência estando inserida na escola regular, esta por sua vez, não se modifica para acolhê-la, apenas a engloba, mas não se ajusta às suas necessidades (Mélo, 2015; Anjos et al., 2009; Silveira et al., 2012). No caminho do pensamento de inclusão escolar, que em muito caminha com o processo de inclusão social, o foco é promover mudanças no coletivo que garantam acesso a todos os indiv́ıduos, abrindo novas possibilidades de curŕıculos, flexibilizando grades de disciplinas e séries (Rocha et al., 2003). Nesta visão a educação especial seria expandida para atendimento educacional especializado, e este agiria na busca pelo suporte às necessidades individuais do aluno, em relação às demandas gerais da escola (Silva, 2011). Sob este ponto de vista, a escola se modifica, a Vivendo em sociedade 153 Figura 1. Paradigmas relacionados à pessoa com deficiência ao longo do tempo no contexto social. Ilustração por Henrique Martins Schmidt sociedade se transforma e as pessoas vivem sua diversidade e no campo da ciência o debate passa a ser a construção social da deficiência e do que é aceitável para a sociedade (Boschi et al., 2011). Estes paradigmas são apresentados na Figura 1, a qual ilustra muitos momentos vividos na sociedade sobre a inserção e inclusão de pessoas com necessidades especiais no contexto social. Em vários momentos, como o atual, vemos que em diferentes situações alternamos nosso posicionamento, segregacionista, integracionista, excludente e inclusivo. Hoje a inclusão no Brasil e a decisão em matricular crianças e adolescentes em escolas “regulares” ainda enfrenta pensamentos e práticas segregacionistas e integracionistas, por vezes excludentes e em alguns momentos inclusivistas, talvez isso ainda ocorra, pois a proposta inclusiva proposta para nossa nação é referente a existente em outros páıses com cultura, processo educacional e evolutivo diferentes do existente no Brasil (Anjos et al., 2009; Silveira et al., 2012). No contexto da palavra inclusão, estão contidos ideais de igualdade, fraternidade, direitos humanos e democracia, num caminho que busca acabar com a exclusão social, na busca pela justiça social e valorização da diversidade humana (Rocha et al., 2003). Desta maneira, a inclusão não é restrita às pessoas com deficiência, mas sim para todas as pessoas que convivem em sociedade e que buscam avanços educativos (Sanches & Teodoro, 2006; Silva, 2011). Este posicionamento retira o outro da sua zona de conforto, pois para incluir é preciso sentir e olhar a riqueza social, declarada em sua diversidade 154 Ferreira, Mélo & Israel e inovação. A diferença então pode se tornar uma oportunidade para a criação de novas situações de aprendizagem (Sanches & Teodoro, 2006; Rocha et al., 2003). Atualmente, mesmo com a evolução das leis e documentos, estamos longe da inclusão completa no ambiente social e educacional, mas por meio da participação da sociedade, de professores, profissionais da saúde e familiares envolvidos na construção de uma sociedade democrática, justa e de respeito ao outro poderemos em breve visualizar a real inclusão (Sanches & Teodoro, 2006; Silveira et al., 2012). 3. A Inclusão e a Pessoa com Deficiência A pessoa com deficiência conquistou ao longo dos anos, a partir de vários movimentos sociais, dentre eles a Poĺıtica Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (PNIPPD) do Decreto no 3.298/99 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Brasil, 2015) um conjunto de normativas que buscam assegurar às pessoas com deficiência o pleno direto à saúde, educação, habitação, reabilitação, trabalho, cultura, lazer, turismo (Garcia, 2013). Infelizmente do total de pessoas com deficiência no Brasil, apenas 2% estão regularmente empregados, o que reforça o fato que a inclusão ainda precisa de avanços no campo profissional. Por outro lado, no campo estudantil, na faixa etária dos 7 aos 14 anos, 88,6% das pessoas estão inclúıdas na escola, porém a taxa de anafalbetismo entre as pessoas com deficiência acima de 15 anos é de 72% (França et al., 2008). De acordo com o Censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estat́ıstica em 2010, o Brasil tem aproximadamente 23,9% da população com deficiência, porém no mundo essa porcentagem cai para 10%. (Carvalho et al., 2010). No Brasil, estima-se que a precariedade na assistência ao peŕıodo gestacional seja responsável por 16,8% das deficiências, seguida das alterações genéticas, que atingem 16,6% (França et al., 2008). A Tabela 1 apresenta os tipos de deficiência e sua incidência. Pensando na valorização da diversidade, que busca nas potencialidades, ferramentas para inserção social, a Organização Mundial da Saúde (2015), pode-se realizar uma classificação quanto à funcionalidade humana, que busca verificar a pessoa com deficiência no ambiente social, familiar, em suas atividades de vida diária e laborais. Essa classificação internacional da funcionalidade, saúde e deficiência (CIF) distingue conceitos de deficiência, incapacidade e desvantagem e colocada estes fatores como dependentes de outros conceitos (Carvalho et al., 2010), como apresentadona Figura 2. Para a CIF, a deficiência é entendida como a limitação funcional temporária ou permanente de uma função anatômica, fisiológica ou psicológica (ex.: diplegia). A incapacidade por sua vez vem a ser a restrição advinda da deficiência (ex.: ausência da marcha, no caso da diplegia). A Vivendo em sociedade 155 T a b el a 1 . T ip o s d e d efi ci ên ci a . F o n te : a s a u to ra s. D e fi c iê n c ia s M o to ra A u d it iv a In te le c tu a l V is u a l M is ta In c id ê n c ia 2 2 ,9 0 % 1 6 ,7 0 % 8 ,3 0 % 4 ,1 0 % N ã o es p ec ifi ca d a p o r se r ju n çã o d a s d em a is . D e fi n iç õ e s D efi ci ên ci a m o to ra co rr es p o n d e a u m a d is fu n çã o , d e ca rá te r co n g ên it o o u a d q u ir id o , q u e a fe ta a fu n ci o n a li d a d e em a sp ec to s d e m o b il id a d e, co o rd en a çã o . P o d e se r tr a n si tó ri a o u d efi n it iv a , em fu n çã o d e p ro b le m a s n eu ro ló g ic o s o u o rt o p ét ic o s. L ev a n d o a co m p ro m et im en to s co m o a m p u ta çõ es , m a l fo rm a çõ es , p a re si a s (r ed u çã o d e fo rç a ) a té p le g ia s (a u sê n ci a d e fo rm a ) em u m o u m a is se g m en to s co rp o ra is (I sr a el & B er to ld i, 2 0 1 0 ) A d efi ci ên ci a a u d it iv a é u m a a lt er a çã o se n so ri a l, cu rs a co m u m a re a çã o a n o rm a l d ia n te d o es t́ı m u lo so n o ro . É cl a ss ifi ca d a d e a co rd o co m o g ra u d e p er d a d a a u d iç ã o , m ed id a em d ec ib éi s (d B ), em ca d a u m d o s o u v id o s, p o d en d o se r le v e, m o d er a d a , se v er a o u p ro fu n d a . D e a co rd o co m o D ec re to n o 5 .2 9 6 , d efi ci ên ci a in te le ct u a l, re fe re -s e a o fu n ci o n a m en to in te le ct u a l in fe ri o r à m éd ia , co m m a n if es ta çã o a n te s d o s d ez o it o a n o s e li m it a çõ es a d u a s o u m a is á re a s d e h a b il id a d es a d a p ta ti va s. A ce g u ei ra to ta l o u a v is ã o su b n o rm a l sã o ca u sa d a s p o r im p er fe iç ã o d o s ó rg ã o s o u d o si st em a v is u a l. A ce g u ei ra é ca ra ct er iz a d a q u a n d o o in d iv́ ıd u o te m a cu id a d e v is u a l ig u a l o u m en o r a 3 / 6 0 (0 ,0 5 ), co m a m el h o r co rr eç ã o ó p ti ca n o o lh o d e m el h o r v is ã o . A b a ix a v is ã o (o u v is ã o su b n o rm a l) é a a cu id a d e v is u a l ig u a l o u m en o r d o q u e 6 / 1 8 (0 ,3 ) e ig u a l o u m a io r d o q u e 3 / 6 0 (0 ,0 5 ) n o o lh o d e m el h o r v is ã o co m a m el h o r co rr eç ã o p o sś ıv el (C a rv a lh o - F re it a s & M a rq u es , 2 0 1 0 ). C a ra ct er iz a o co n ju n to d e d u a s o u m a is d efi ci ên ci a s a ss o ci a d a s, d e o rd em f́ı si ca , se n so ri a l, in te le ct u a l, em o ci o n a l o u d e co m p o rt a m en to so ci a l e su a s li m it a çõ es fu n ci o n a is q u e a lt er a m a co m u n ic a çã o , in te ra çã o so ci a l (A rr u d a & A lm ei d a , 2 0 1 4 ), D ic a s E st im u le se m p re a s h a b il id a d es e va lo ri ze a s a p re n d iz a g en s. B u sq u e b ri n q u ed o s/ m a te ri a is co lo ri d o s e ex p li ca ti v o s, in ic ie o p ro ce ss o d e L IB R A S q u a n d o p o sś ıv el e a o in v és d e so m , p o d em o s u sa r in st ru m en to s q u e v ib ra m , p o r ex em p lo . B ri n q u e co m a cr ia n ça co m jo g o s d e re g ra s e a p re n d iz a g em d e o rg a n iz a çõ es so ci a is , en si n e e d ê a u to n o m ia a m ed id a q u e o s en si n a m en to s v ã o se n d o a p re en d id o s. P re fi ra in st ru m en to s co m re cu rs o s so n o ro s e a m b ie n te s li v re s d e m u it o s m ó v ei s e en fe it es q u e p o d em se rv ir d e b a rr ei ra s. T a m b ém m a n te n h a o s m a te ri a is se m p re n o m es m o lu g a r. B u sq u e co m p re en d er q u a is sã o o s p ri n ci p a is in te re ss es d a cr ia n ça , e u ti li ze es te re cu rs o p a ra su a so ci a li za çã o e in cl u sã o . 156 Ferreira, Mélo & Israel Figura 2. Classificação Internacional da Funcionalidade Incapacidade e Saúde (CIF). Fonte: (Organização Mundial da Saúde, 2015) desvantagem neste caso passa a ser o prejúızo advindo da incapacidade dada pela deficiência no realizar of́ıcios sociais esperados para uma pessoa nas mesmas condições de idade, gênero, fatores culturais (ex.: no caso do diplégico seria a desvantagem de se locomover por todos os locais que uma pessoa com a marcha preservada consegue se deslocar) (Carvalho et al., 2010). 4. Fatores que Influenciam no Processo de Inclusão Educacional Efetiva De acordo com o modelo contextual de Newell (Haywood & Getchell, 2010), o processo de desenvolvimento envolverá inevitavelmente a atuação da tŕıade, indiv́ıduo, ambiente e tarefa, conforme já abordados em caṕıtulos anteriores. Aqui apresentamos esta mesma proposta, sob o olhar da inclusão (Figura 3). Sob o ponto de vista de Newell para a prática da inclusão da pessoa com deficiência na escola, há a necessidade de se observar as restrições e potencialidades do indiv́ıduo no ambiente em que este estuda e como são ofertadas as atividades para o aluno em inclusão. Cabe lembra que no caso da Pessoa com Deficiência (PcD), a incapacidade e/ou dificuldade apresentada não existe somente pela existência da deficiência, mas sim pela existência de um ambiente restritivo, o qual ocasiona uma relação desfavorável entre o ambiente e o indiv́ıduo (Boschi et al., 2011; Sanches, 2011). Vivendo em sociedade 157 Figura 3. Modelo de Restrições para a inclusão. Fonte: as autoras Figura 4. Fatores inseridos no processo de inclusão escolar. Fonte: as autoras Nessa construção de modelo de inclusão podemos perceber quatro (4) fatores que devem caminhar juntos e alinhados para o bom processo educacional. Estes fatores são destacados na Figura 4 que aponta a relação entre eles para um mesmo fim, a inclusão da criança com deficiência no ambiente escolar. A escola, lugar onde a pessoa passa boa parte da sua vida, é reconhecida pelo seu dever pedagógico, mas também, atrelada à famı́lia é responsável pelos valores pessoais e significado de vida, saúde e ações que seus educandos desenvolverão. Nesta visão, a escola é um lugar inclusivo e questionador, que na busca pela construção da consciência e pela formação de pessoas com senso de justiça e valorização à diversidade (Aerts et al., 2004; Silva, 2011). 158 Ferreira, Mélo & Israel Assim, a escola inclusiva, em consonância com a famı́lia e os profissionais da saúde busca a valorização da diversidade humana, valida o pertencimento e a busca por soluções para a presença de todas as formas humanas. Pelo amadurecimento do discurso da escola com a sociedade e profissionais da saúde é que se pode pensar em outras formas de se desenvolver paradigmas sobre as crenças em produções sociais de saúde para a diversidade, de maneira igualitária e justa, visando à aprendizagem de acordo com as necessidades e potencialidades de cada um (Aerts et al., 2004; Silveira et al., 2012). De acordo com as metas do Plano Nacional de Educação (PNE) e conforme os quatro pilares da educação (aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver, aprender a ser) é preciso conhecer as necessidades das PcD visando favorecer seu processode aprendizagem (Saviani, 2014). O processo de aprendizagem na escola inclusiva precisa ser agradável para contribuir com a saúde f́ısica, cognitiva, afetiva e espiritual dos educandos, pois assim irá estimular diferentes áreas neuromoduladoras da criança e do adolescente e favorecerá a aquisição da informação, tanto para o aluno com como para o aluno sem deficiência (Sanches, 2011). Neste sentido, o pensamento social inclusivo trabalhado na escola e na famı́lia, com o apoio dos profissionais da saúde será vivido com emoção e estruturado sob a forma de discurso e posicionamento poĺıtico frente ao diferente, além de ser apreciado na forma de movimentos e atividades feitas em sala de aula e na sociedade (Garcia, 2013)). Neste aspecto, os profissionais, da saúde e da educação, quando pensam em criar interações que favoreçam o desenvolvimento da pessoa com deficiência, deverão orientar à famı́lia a estimulação de áreas emotivas, cognitivas e motoras, as quais apresentam inter-relação e estão descritas na Figura 5. Desta forma a aprendizagem de novas estratégias deverá ser significativa, coerente e clara, para favorecer o desenvolvimento social e funcional da criança e adolescente. A aprendizagem motora por meio do envolvimento da produção de tarefas que envolvam o movimento corporal poderá produzir integrações cognitivas e sensoriais levando a atender as demandas da pessoa com deficiência, seu ambiente no contexto escolar e social (Israel & Bertoldi, 2010). Assim, na integração entre aprendizagem e as funções efetivas, cognitivas e motoras, a escola e os profissionais de saúde no processo educacional e de formação humana terão um grande momento para encaminhar seus alunos a reflexão e construção de proposta saudáveis e inclusivas (Mélo, 2015). As instituições de ensino devem repensar constantemente a reestrutura curricular e de preferência elencar propostas de programas diversificados com o intuito de promover a acessibilidade, em todos os âmbitos de acesso à Vivendo em sociedade 159 Figura 5. Áreas a serem estimuladas no processo de aprendizagem. Fonte: adaptado de Israel & Bertoldi (2010, p. 39). escola, inclusive em atividades extracurriculares para a PcD (Boschi et al., 2011). Nessa direção, o professor preparado para o processo de inclusão é o professor que observa a diversidade e recria suas aulas e forma de ministrá- las, de acordo com os talentos dos alunos. Ele não precisa ter uma formação em alguma deficiência espećıfica, basta que ele tenha a habilidade de desenvolver estratégias pedagógicas envolventes que atinjam seus alunos nas necessidades que estes precisam (Aerts et al., 2004; Silva, 2011). O profissional da saúde pode contribuir com a informação sobre cada uma das deficiências, para assim desmistificar as potencialidades e limitações de cada pessoa, de forma a auxiliar no processo de inclusão, promovendo por meio de informações corretas a respeito de cada deficiência e de posśıveis recursos a serem utilizados (Rocha et al., 2003; Garcia, 2013), recursos estes, apresentados na Seção 5.1 deste caṕıtulo. Dentre os profissionais de saúde com atuação multiprofissional pode-se citar: fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo/a, assistente social, médico/a, psicólogo e outros/as) com os/as pedagogos/as e educadores/as atendendo a criança e/ou adolescente de forma integral, sem isolamento profissional em suas práticas (Durce et al., 2006) e contribuindo para uma melhor ambientação educacional, afim de minimizar as barreiras da construção do processo ensino-aprendizagem. Fora o fato de preparar o professor para as estratégias pedagógicas, muitas vezes as escolas têm barreiras arquitetônicas, que limitam o deslocamento e segurança de todas as pessoas. Existe ainda hoje a falta de equipamentos e mobiliário adaptados e materiais pedagógicos de apoio. Continuando neste cenário de limitações, por vezes as crianças e adolescentes com deficiência não contam com apoio de profissionais da saúde, o que deixa o caminho do professor solitário e sem perspectivas (Silva et al., 2015b). Neste sentido, o receio de realizar uma atividade com a criança que possa gerar risco para a sua saúde, faz com que os professores explorem pouco as habilidades das crianças com deficiência, quando falta o respaldo 160 Ferreira, Mélo & Israel Figura 6. Modelo de Restrições e Facilitadores para a inclusão. Fonte: as autoras de um profissional da saúde. Desta forma são criadas salas de aula com alunos desmotivados e professores frustrados. Parte desta falha no processo de inclusão é dos serviços de saúde e das gestões escolares em não ver esta demanda e criar relações multidisciplinares para a temática da inclusão (Rocha et al., 2003). Cria-se assim outra forma de barreira, a atitudinal! No âmbito das adequações arquitetônicas, cabe aos profissionais da saúde, da construção civil e da educação a responsabilidade de tornar os ambientes escolares mais acesśıveis, confortáveis, com melhor iluminação, adaptações como rampas, elevadores, barras de apoio, alerta tátil, visual e auditivo, também são necessários e podem ser conferidos nas normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (Rocha et al., 2003). Além disso, na impossibilidade de adequações imediatas repensa a loǵıstica de organização de salas e até mesmo de aux́ılio entre profissionais e/ou colegas de turma, de forma a incluir a PcD, pessoas em processo de envelhecimento, entre outras. Desta maneira, percebe-se que juntos, profissionais da saúde, da educação, familiares e comunidade podem criar um ambiente acolhedor da diversidade e valoroso por debater e modificar suas verdades para crescimento de todos, valorizando as potencialidades individuais para assim criar novas possibilidades de transformação do grupo social, ultrapassando as barreiras que limitam o processo de inclusão escolar e valorizando os facilitadores deste processo (Figura 6). 5. A Inclusão e a Tecnologia Assistiva Para realizar o processo de adaptações na inclusão escolar é necessário conhecer quais as potencialidades e limitações da pessoa com deficiência e observar o que era esperado que ela, em sua idade cronológica estivesse realizando, para assim criar mecanismos de acessibilidade com maior efetividade na resolução dos problemas do dia-a-dia. Vivendo em sociedade 161 Partindo da ideia da relação entre o indiv́ıduo, a tarefa e o ambiente, o indiv́ıduo em sua interação com o meio, sempre terá restrições, funcionais ou estruturais para realizar a tarefa ou permanecer no ambiente. Essa troca no caso das pessoas com deficiência, normalmente necessitará de apoio, que poderá ser dada por meio da Tecnologia Assistiva (TA) ou Comunicação Alternativa (CA). 5.1 Tecnologia Assistiva (TA) e Comunicação Alternativa (CA) O foco das Tecnologias Assistivas (TA) e da Comunicação Alternativa (CA), é desenvolver potencialidades desde habilidades do dia-a-dia até competências de aprendizagem escolar e profissional. Atualmente, com o crescimento das áreas de informática e inovação, existem muitos equipamentos, órteses e próteses, softwares, ponteiras, adaptações para teclado e mouses para todos os tipos de deficiência, visando a maior independência e autonomia da pessoa com deficiência em todos os ambientes sociais (Rocha et al., 2003; Israel & Bertoldi, 2010), variando de uma simples adaptação, como o engrossamento de um lápis para facilitar a preensão, até adaptações tecnológicas, como o comando de um mouse pelos movimentos dos olhos. A criação e adaptação da TA (Figura 7) e da CA (Figura 8) adequada à cada pessoa é função dos profissionais da saúde, que podem desenvolver ferramentas para auxiliar a melhor inclusão de todos no ambiente escolar e social, além de junto ao professor promover melhor condição de aprendizagem (Rocha et al., 2003). Figura 7.