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1. Conhecer a esclerose múltipla (definição, tipos, epidemiologia, fatores de risco, fisiopatologia) Uma doença autoimune, de caráter desmielinizante, crônica e evolutiva que atinge a substância branca do sistema nervoso central (SNC), e também cinzenta de forma continuada . Autoimunidade representa o processo de agressão à bainha de mielina do SNC por uma resposta inflamatória(macrófagos, linfócitos T, B e outras células do sistema imune) exacerbada e contínua. O curso clínico ocorre com eventos recorrentes e períodos de remissão, fato que determina o padrão sintomatológico e grau de incapacidade dos pacientes. Perda de oligodendrócitos TIPOS Esclerose múltipla remitente recorrente (EMRR) = é a forma mais comum, observada em 80% dos pacientes. Caracteriza-se por apresentar episódios agudos de comprometimento neurológico (chamados de surtos), com duração maior que 24 horas e intervalo de, no mínimo, 30 dias entre cada nova manifestação. Não existe progressão da deficiência entre os surtos. Clinicamente, caracteriza-se por surtos ou ataques seguidos por recuperação parcial ou total dos sintomas. Biologicamente, caracteriza-se por áreas focais de inflamação e desmielinização, que se resolvem ao longo do tempo e conduzem à recuperação, pelo que os doentes, até nova recorrência, se encontram estáveis a nível neurológico. Deste modo, o dano causado pela inflamação é pelo menos parcialmente reversível. Esclerose múltipla primária progressiva (EMPP) = apresenta piora contínua, gradual e aditiva de sinais neurológicos. Ocorre em aproximadamente 10% dos casos. EM DP é caracterizada pela incapacidade progressiva sem fases remitentes. Assim, os indivíduos com este subtipo clínico sofrem danos irreversíveis que provocam uma progressão lenta, ou passo a-passo para o aumento da deficiência com pouco ou nenhum alívio sintomático Esclerose múltipla secundária progressiva (EMSP) = esclerose múltipla remitente recorrente progridem vagarosamente, comum em pacientes que sofreram os sintomas após 40 anos de idade. É o segundo tipo mais comum de EM, representando cerca de 30% dos casos.EMPS é caracterizada por recaídas iniciais de EMRR, que, ao longo do curso da doença,são substituídas por declínio funcional progressivo. (18) Indivíduos com EMPS começam com disfunção neurológica reversível, mas, por razões desconhecidas, ocorre degeneração axonal levando a danos irreversíveis, que se apresenta clinicamente como EM progressiva Esclerose múltipla progressiva-recorrente (EMPR) = se caracteriza desde o início por doença progressiva, porém intercalada por surtos, com ou sem recuperação total,mas com progressão contínua entre os surtos. A menos frequente, ocorre em cerca de 5% dos casos. Este subtipo clínico é caracterizado pela deterioração progressiva desde oinício dos sintomas, semelhante à EMPP, mas também envolve ataques agudos ou recaídas. As razões para esta variabilidade neurológica permanecem desconhecidas.Grande parte do processo biológico é clinicamente silencioso e a carga da lesão não se correlaciona necessariamente com a quantidade ou intensidade da incapacidade. EPIDEMIOLOGIA A prevalência da EM varia com a latitude, de modo que, em regiões como o norte da Europa e Canadá, observam-se índices de 180/100.000 habitantes. Estima-se que 2,5 milhões de pessoas sejam afetadas pela doença. O Brasil é considerado um país de baixa prevalência, e estudos conduzidos em diferentes cidades brasileiras demonstraram uma distribuição heterogênea no território nacional, com taxas que variam de 1,3 a 27/100.000 habitantes. A EM é mais comum no sexo feminino e em pacientes de origem caucasiana. A faixa etária de início dos sintomas é entre 20 e 40 anos, sendo rara acima de 60 anos FATORES DE RISCO ● Fatores genéticos associados ao HLA-DR2 e polimorfismo do gene IL-7R ● Os fatores de risco mais comuns englobam fatores ambientais, fatores genéticos, baixa exposição no sol(Vitamina D), infecção por vírus(Epstein- Barr e herpes), tabagismo e obesidade na adolescência, contato com solvente orgânico ● FATORES QUE PREDISPÕEM À INFLAMAÇÃO NA EM: A ação de alguns fatores como fatores ambientais de natureza viral, exposição aos raios UV e menor produção da vitamina D, interferem indiretamente no sistema imunológico, contribuindo para o aparecimento de condições favoráveis para a ativação da linhagem linfocitária de função Th1 FISIOPATOLOGIA ● Agressão inflamatória autoimune(geralmente linfócitos T) sobre a bainha de mielina dos axônios do SNC… ● Lembre-se de que quem sintetiza mielina no SNC são os oligodendrócitos,enquanto a síntese de mielina no sistema nervoso periférico fica a cargo das células de Schwann! ● A perda da mielina envolve perda de fatores tróficos produzidos por essa camada protetora, levando à degeneração axonal permanente (o que explica porque após alguns anos as sequelas da EM acabam se tornando irreversíveis). ● Autoimunidade representa o processo de agressão à bainha de mielina do SNC por uma resposta inflamatória exacerbada e contínua. ● Por uma autorreação do sistema imune,gerando processos inflamatórios recorrentes que alteram o funcionamento normal da bainha de mielina por perda de suas partes constituintes, fenômeno denominado desmielinização. ● Assim, há prejuízo na condução de impulsos nervosos e são evidenciadas manifestações clínicas características. ● A perda de função durante o surto ocorre tanto pelo processo inflamatório agudo quanto pelos efeitos diretos da desmielinização. ● É possível ainda que o processo inflamatório inicial seja autolimitado e com resolução do processo agudo exista recuperação de função durante as fases de remissão da doença. ● Ocorrem áreas localizadas de desmielinização (placas), com destruição da oligodendróglia, inflamação perivascular e alterações químicas nos constituintes lipídicos e proteicos da mielina, dentro e ao redor das placas. ● Dano axonal é comum, e corpos celulares neuronais também podem ser danificados. ● Há desenvolvimento de gliose fibrosa nas placas que são disseminadas pelo sistema nervoso central, principalmente na substância branca, em particular nas colunas laterais e posteriores(especialmente nas regiões cervicais), nervos ópticos e áreas periventriculares. ● Os tratos no mesencéfalo, ponte e cerebelo também são afetados.A substância cinzenta no cérebro e na medula espinhal pode ser afetada, mas em extensão muito menor. ● Basicamente acontece: - Os linfócitos T ativados no sangue periférico e nos gânglios linfáticos vão ativar linfócitos B e macrófagos, estes por sua vez, vão atravessar a barreira hematoencefálica e alcançar o SNC,gerando focos de inflamação. - Esses focos de inflamação vão causar danos na bainha de mielina que por sua vez, vão prejudicar o isolamento elétrico diminuindo a velocidade de condução do sinal elétrico. - O dano causado na bainha de mielina pode se auto resolver ou levar a degeneração neuronal, quando tem a degeneração neuronal vai ocorrer a proliferação das células da glia no local(astrócitos e oligodendrócitos) que antes era preenchido pelos axônios dos neurônios, com isso, vão se formar placas (região de "cicatrizes")resultando em déficit s focais. - Os linfócitos e macrófagos que fazem a desmielinização contêm corpos granulo-gordurosos que são gerados pela degradação da mielina. 2. Entender o quadro clínico, diagnóstico(laboratoriais, LCR, ressonância) e tratamento da esclerose múltipla. QUADRO CLÍNICO ● Não existem achados clínicos que sejam exclusivos de EM , porém alguns são altamente característicos desta doença. ● Os sintomas iniciais mais comuns são alterações sensitivas (parestesias, hipoestesias ou hiperestesias) possíveis em qualquer distribuição e, com frequência, são migratórios SINTOMAS CLÁSSICOS ● Sinal de Lhermitte - Choque ou formigamento precipitado pela flexão do pescoço ● Perda sensitiva (parestesias) - Usualmente no início da doença ● Medulares (motor) - Dores muscular es secundárias à espasticidade ● Medulares (autônomo) - Bexiga, intestino e sintomas de disfunção sexual● Mielite transversa parcial agu da ● Cerebelares (tríade de Charcot) - Disartria, ataxia, tremor ● Constitucionais - Especialmente fadiga (70% dos casos) e tontura. Fadiga deve ser diferenciada da depressão (que pode, no entanto, coexistir), falta de sono, exaustão ● Dificuldades subjetivas - Capacidade de atenção , memória e julgamento ● Depressão - Sintoma comum ● Euforia - Menos comum que a depressão ● Distúrbio bipolar e demência fraca - Podem aparecer no final do curso da doença, mas por vezes surgem no início ● Oculares - Oftalmoplegia internuclear, lesão do fascículo longitudinal medial – diplopia e adução incompleta do olho; nistagmo no olhar horizontal ● Neuralgia do trigêmeo - Fraqueza facial bilateral ou dor no território do trigêmeo ● Mioquimia facial (espasmos dos músculos faciais) - Pode ser também um sintoma inicial ● Intolerância ao calor ● Neurite óptica - Muito frequente. Sintoma inicial em 17% dos pacientes, e 50% o apresentarão em algum momento da evolução. Caracteriza- se por diminuição da acuidade visual, borramento e palidez do nervo óptico, a fundoscopia. CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS SUGESTIVAS DE ESCLEROSE MÚLTIPLA ● Instalação entre 15 e 50 anos ● Evolução em recorrência e remissão ● Neurite óptica ● Oftalmoplegia internuclear ● Fenômeno de Uhtho� SINTOMAS COMUNS DA ESCLEROSE MÚLTIPLA ● Sintomas sensoriais (alteração da sensibilidade) - Dormência - Formigamento - Outras sensações anormais (disestesias) - Distúrbios visuais: Dificuldade de atingir o orgasmo, ausência de sensibilidade vaginal, impotência sexual nos homens; Tontura ou vertigem ● Sintomas motores (alterações da função muscular) - Fraqueza, atitud e desajeitada - Dificuldade de marcha ou de manutenção do equilíbrio - Tremor - Visão dupla - Problemas de controle intestinal ou da bexiga, constipação - Rigidez, instabilidade, cansaço anormal A OCORRÊNCIA DE DETERMINADOS SINAIS E SINTOMAS (RED FLAGS) DEVE COLOCAR EM DÚVIDA O DIAGNÓSTICO DE EM → exclusão ● Início antes dos 10 anos ou após os 50 anos; ● Alterações cognitivas graves e precoces; ● Crises convulsivas ● Alterações corticais (afasia, apraxia, a lexia e negligência); ● Déficits de instalação súbita. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de EM tornou-se uniforme a partir da publicação dos critérios de Poser que tinham como propósito demonstrar a disseminação das lesões neurológicas no tempo(mais de um surto) e no espaço (mais de uma região do SNC), levando-se em conta os dados clínicos (história e exame físico) e para clínicos (LCR, RM e estudoseletrofisiológicos). Excluindo outras doenças. O líquor pode mostrar bandas oligoclonais (BOC) que indicam produção intratecal de anticorpos, no entanto, não são altamente específicas, mas podem entrar como marcadores da disseminação de tempo. O LCR contém menos de seis leucócitos por milímetro cúbico e a concentração de proteínas é normal na maioria dos pacientes com uma síndrome clínica isolada ou EM estabelecida. Anormalidades das imunoglobulinas do LCR são comuns. RM ● A ressonância magnética é o exame indicado para auxiliar na confirmaçãodiagnóstica da EM e pode apresentar padrões diversificados de lesões na substância branca ● As lesões de inflamação aguda mais conhecidas são as lesões ovaladas (ovóides) ou dedos de Dawson, que são áreas arredondadas, esbranquiçadas, que variam de milímetros a centímetros, que podem ser localizadas ou difusas no SNC ● As lesões crônicas que surgem após a desmielinização da bainha de mielina são lesões escurecidas (hipodensas),denominadas de black holes, que surgem onde células da glia substituíram a bainha de mielina destruída Dados complementares: (1) RNM = envolvimento da substância branca(geralmente periventricular, bilateral e simétrico, além de ser típico o acometimento UNILATERAL do nervo óptico, bem como a presença de “placas” póstero-laterais da medula espinhal); -> Acometimento de SUBSTÂNCIA BRANCA (2) exame de potenciais evocados = pesquisa de condução neuronal alterada em regiões cujo acometimento pela EM é típico, porém não há relato de sintomas (ex.: potenciais evocados no campo visual evidenciam alterações não antes percebidas pelo paciente); (3) punção lombar = o líquor mostra bandas oligoclonais de IgG, porém esse achado não é sensível e tampouco específico (indica apenas a ocorrência de produção intratecal de anticorpos,o que pode ser obser vado nas infecções do SNC). A grande utilidade da punção lombar é,portanto, o diagnóstico diferencial com outras condições TRATAMENTO ● SURTOS – devem ser tratados com metilprednisolona em pulsoterapia 1 g IV por três a cinco dias, seguida de prednisona VO (geralmente por mais quatro ou oito semanas). Esta forma de tratamento controla bem o quadro agudo, m as não tem nenhum efeito sobre a progressão da doença → antiparasitário ● TERAPIA CRÔNICA (modificadores de doença) – envolve o uso de interferon-beta -1a (avonex ou rebif), interferon- beta -1b (betaseron) ou acetato de glatiramer (copaxone). De uma forma geral, essas drogas reduzem as recidivas da doença em 1/3. - O natalizumab ( tysabri) é um anticorpo monoclonal contra o VLA- 4, uma molécula de adesão leucocitária que facilita a entrada de leucócitos autorreativos no SNC. É a droga mais eficaz para o controle da doença (66% de redução nas recidivas), porém, devido a dois relatos de infecção fulminante ( leucoencefalopatia multifocal progressiva) por reativação do vírus JC (presente em estado latente na maioria da população), recomenda-se que o natalizumab seja reservado aos casos refratários à terapia convencional. - A mitoxantrona (novantrone) é u m quimioterápico com propriedades imunossupressoras, utilizado como primeira escolha no tratamento da forma progressiva da EM. Pacientes que recebem essa droga devem ser monitorizados periodicamente com ecocardiograma, pois trata-se de uma substância extremamente cardiotóxica ( a dose máxima cumulativa costuma ser atingida após 2-3 anos de uso). 3. Conhecer os diagnósticos diferenciais ( Lupus, Neurossífilis, ELA, síndrome de Guillain Barré. O diagnóstico diferencial inclui as doenças vasculares, infecto contagiosas, especialmente a paraparesia espástica tropical (mielopatia pelo HTLV-I), a deficiência de vitamina B12, lúpus e doença de Sjögren. Também é importante estabelecer o diagnóstico diferencial com a neuromielite óptica e a encefalomielite disseminada aguda 4. Conhecer a escala EDSS. O EDSS é a escala mais difundida para avaliação de EM. Possui vinte itens com escores que variam de 0 a 10, com pontuação que aumenta meio ponto conforme o grau de incapacidade do paciente. É utilizada para o estadiamento da doença e para monitorizar o seguimento do paciente. 5. Conhecer o prognóstico da esclerose múltipla. A história natural da EM segue um padrão semelhante em diferentes populações, mesmo considerando-se que existe alto grau de variabilidade entre os pacientes. O tempo médio para o EDSS 6 (necessidade de apoio unilateral de marcha) a partir do início dos sintomas é de 15 anos, e diversos fatores parecem influenciar a progressão da doença: sexo masculino, idade de início, forma clínica progressiva, número de surtos nos dois primeiros anos da doença remitente-recorrente, intervalo entre o 1º e o 2º surto. Pacientes com EM têm uma expectativa de vida, em média, de 7 a 14 anos menor e maior morbimortalidade que a população geral. Infecções, doença cardiovascular e suicídio, bem como a própria EM, são as causas mais comuns de morte. Interessantemente, pacientes expostos a betainterferona por mais de 3 anos apresentaram taxa de sobrevivência maior, quando comparados a pacientes tratados por menos tempo, sugerindo que o tratamento contínuo melhora a sobrevida.
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