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PSICOPATOLOGIA GERAL Professor Tom Rodrigues AULA 10: As alterações da Vontade; As alterações da Linguagem. A VONTADE E SUAS ALTERAÇÕES O que é vontade? Qual sua relação com os instintos, com a pulsão, com o desejo e com as expectativas sociais? A vontade é uma dimensão complexa da vida mental, relacionada intimamente com as esferas instintiva, afetiva e intelectiva (que envolve avaliar, julgar, analisar, decidir), bem como com o conjunto e valores, princípios, hábitos e normas socioculturais do indivíduo; ◦ Diferentes concepções teóricas: psicanálise, existencialismo, etologia, etc.; Ato volitivo ou ato de vontade O PROCESSO VOLITIVO O ato de vontade é pautado por quatro fases, em que ponderação, análise e reflexão precedem a execução motora, é denominado ação voluntária, e portanto, não instintiva e/ou impulsiva/compulsiva. 1. Fase de intenção ou propósito Na qual se esboçam as tendências básicas do indivíduo, suas inclinações e interesses. Nesse momento, impulsos, desejos e temores inconscientes exercem influência decisiva sobre o ato volitivo, muitas vezes imperceptíveis para o próprio indivíduo. 2. Fase de deliberação Fase que diz respeito à ponderação consciente, levando-se em conta tanto os motivos (razões intelectuais) como os móveis (razões afetivas) implicados no ato volitivo. O indivíduo faz uma análise básica do que seria positivo ou negativo, favorável ou desfavorável, benéfico ou maléfico em sua decisão. É um momento de apreciação, consideração dos vários aspectos e das implicações de determinada decisão. 3. Fase da decisão propriamente dita É o momento culminante do processo volitivo, instante que demarca o começo da ação, no qual os móveis e os motivos vencidos dão lugar aos vencedores. O sujeito decide fazer ou não fazer aquilo que estava inclinado a fazer. 4. Fase de execução Constitui a etapa final do processo volitivo, na qual os atos psicomotores simples e complexos decorrentes da decisão são postos em funcionamento, a fim de realizar e consumar aquilo que mentalmente foi decidido e aprovado pelo indivíduo. ALTERAÇÕES DA VONTADE Hipobulia/Abulia Pacientes com hipobulia/abulia apresentam diminuição ou até abolição da atividade volitiva. O indivíduo refere que não tem vontade para nada, sente-se muito desanimado, sem forças, sem “pique”. Geralmente, a hipobulia/abulia encontra- se associada à apatia (indiferença afetiva), à fadiga fácil, à dificuldade de decisão, tão típicas dos depressivos graves. ATOS IMPULSIVOS E ATOS COMPULSIVOS A diferenciação básica em termos de distúrbios da vontade é entre o ato impulsivo e o compulsivo. ATO IMPULSIVO Em oposição à ação voluntária, há os atos impulsivos, que são uma espécie de curto circuito do ato voluntário, da fase de intenção à fase de execução. Ou seja, o ato impulsivo abole abruptamente as fases de intenção, deliberação e decisão, em função tanto da intensidade dos desejos ou temores inconscientes como da fragilidade das instâncias psíquicas implicadas na reflexão, na análise, na ponderação e na contenção dos impulsos e dos desejos. IMPULSOS PATOLÓGICOS: predominam as ações psicomotoras automáticas, sem reflexão, ponderação ou decisão prévias, de tipo instantâneo e explosivo. O ato impulsivo apresenta as seguintes características: É realizado sem fase prévia de intenção, deliberação e decisão; É realizado, de modo geral, de forma egossintônica. É geralmente associado a impulsos patológicos, de natureza inconsciente, ou à incapacidade de tolerância à frustração e necessária adaptação à realidade objetiva. O indivíduo dominado pelo ato impulsivo tende a desconsiderar os desejos e as necessidades das outras pessoas. ATOS COMPULSIVOS O ato compulsivo, ou compulsão, difere do ato impulsivo por ser reconhecido pelo indivíduo como indesejável e inadequado, assim como pela tentativa de refreá-lo ou adiá-lo. A compulsão é geralmente uma ação motora complexa que pode envolver desde atos compulsivos relativamente simples, como coçar- se, picar-se, arranhar-se, até rituais compulsivos complexos, como tomar banho de forma repetida e muito ritualizada, lavar as mãos e secar-se de modo estereotipado, por inúmeras vezes seguidas, etc. Os atos e os rituais compulsivos apresentam as seguintes características: Há a vivência frequente de desconforto subjetivo por parte do indivíduo que realiza o ato compulsivo; São egodistônicos, isto é, experienciados como indesejáveis, contrários aos valores morais e anseios de quem os sofre; Há a tentativa de resistir (ou pelo menos adiar) à realização do ato compulsivo; Há a sensação de alívio ao realizar o ato compulsivo, alívio que logo é substituído pelo retorno do desconforto subjetivo e pela urgência em realizar novamente o ato compulsivo. Ocorrem frequentemente associados a ideias obsessivas muito desagradáveis, representando, muitas vezes, tentativas de neutralizar tais pensamentos. ◦ Ex: O indivíduo tem um pensamento obsessivo desagradável, como a ideia de que é impuro ou contaminado, sente, então, a necessidade de lavar-se compulsivamente, e isso alivia de forma transitória os pensamentos de ser contaminado. ◦ Logo após o alívio, os pensamentos obsessivos retornam à consciência do indivíduo, e ele sente-se novamente forçado a realizar o ato compulsivo neutralizador. TIPOS DE IMPULSOS E COMPULSÕES PATOLÓGICAS Impulsos e compulsões agressivas auto ou heterodestrutivas Automutilação; tricotilomania; ◦ As automutilações leves e moderadas são observadas em indivíduos com transtorno da personalidade borderline, naqueles com transtorno obsessivo-compulsivo e em alguns deficientes mentais. As mais graves (auto-amputação dos olhos e auto-amputação do pênis) dizem mais respeito a personalidades psicóticas em crise. Frangofilia (destruir objetos); Piromania (atear fogo); Impulso e ato suicída. Impulsos e compulsões relacionados à ingestão de substâncias ou alimentos Tais impulsos estão presentes em algumas formas de abuso de substâncias, nas quais o uso do agente psicoativo se caracteriza por grande impulsividade. ◦ Alguns exemplos: ◦ DIPSOMANIA (álcool); ◦ BULIMIA (comida); ◦ POTOMANIA (água), diferente de polidipsia (que é metabólica); ◦ CLEPTOMANIA (roubar). Atos e compulsões relacionados ao desejo e comportamento sexual São diversos os atos impulsivos e compulsivos de natureza sexual. Foram classicamente descritos como “perversões sexuais”, preferindo-se atualmente os termos atos impulsivos e compulsões sexuais, pois a designação “perversão” acabou ganhando conotação moral e de valor na linguagem comum. ◦ Fetichismo; ◦ Exibicionismo; ◦ Voyeurismo; ◦ Pedofilia; ◦ Gerontologia; ◦ Zoofilia; ◦ Coprofilia; ◦ Necrofilia; • Ninfomania; • Satiríase; • Compulsão a utilizar roupas íntimas do sexo oposto (diferente de uma transexualidade); • Compulsão à masturbação. • LEMBRAR-SE: Causa sofrimento? Principais alterações da Psicomotricidade Agitação Psicomotora; Lentificação e Inibição Psicomotora; Estupor; Estereotipias motoras; Maneirismos; Tiques; Diversas alterações da marcha (p. 187). Sempre é importante um diagnóstico diferencial: A causa é neurológica? A LINGUAGEM E SUAS ALTERAÇÕES Linguagem Particularmente na sua forma verbal, é uma atividade especificamente humana, talvez a mais característica de nossas atividades mentais. É o principal instrumento de comunicação dos seres humanos. Além disso, é fundamental na elaboração e na expressão do pensamento. Funções da linguagem Função comunicativa; Função de suporte do pensamento; Instrumento de expressão; Função de afirmação do Eu (que vem do Outro); Dimensão artística/lúdica da linguagem; Essencialmente relacionada com a criatividade. A língua é um processo empreendido conjuntamente pelos falantes e pelos ouvintes em interação recíproca e constante, contextualizada em determinado ambiente histórico, político e cultural. (Weedwood, 2002). Algumas alterações da Linguagem Alterações secundárias a lesão neuronal identificável; ◦ Exs: Afasias (perda da linguagem verbal); ◦ Parafasia (Déficit de linguagem verbal); ◦ Agrafia e Dislexia (Perda e dificuldades com a linguagem escrita); ◦ Alexia (Perda da capacidade de leitura). Algumas alterações da Linguagem Alterações da linguagem associadas a transtornos psiquiátricos primários; ◦ Logorréia, taquifasia e loquacidade (mania); ◦ Bradifasia (quadros depressivos, estados demenciais e esquizofrenia com sintomas negativos); ◦ Mutismo e mutismo seletivo; ◦ Ecolalia (esquizofrenia e quadros psico-orgânicos); ◦ Palilalia (semelhante ao anterior, só que repete a si mesmo); ◦ Tiques verbais ou fonéticos e coprolalia; ◦ Glossolalia (neolinguagem) Por que a linguagem é uma função importante a ser considerada em entrevistas com usuários e usuárias dos serviços de Saúde Mental? A linguagem é um importante elemento a ser considerado em entrevistas na Saúde Mental por tratar-se da função que temos acesso, por excelência, nesta modalidade técnica. A partir de características da linguagem (se mais mais eloquente, mais vaga, etc.), já podemos partir para hipóteses de diagnósticos sindrômicos. Sugestões de Leitura Suicídio e os desafios para a Psicologia (CFP, 2013); Recomendações de práticas não medicalizantes para profissionais e serviços de educação e saúde (Fórum sobre medicalização a educação e da sociedade, 2015); Sugestões de Filmes O Garoto Selvagem (François Trufaut, 1970). Sugestões de Filmes Nell (Michael Apted, 1994). Sugestões de Filmes A menina no país das maravilhas (Daniel Barnz, 2009). Sugestões de Filmes Shame (Steve McQueen,2011) Sugestões de Filmes Ninfomaníaca (Lars Von Trier, 2013-2014). Sugestões de Filmes Adeus à Linguagem (Jean- Luc Godard, 2015). Próxima Aula Funções psíquicas compostas e suas alterações; A personalidade e suas alterações; A inteligência e suas alterações. Leitura obrigatória: Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais, de Paulo Dalgalarrondo (2008), Capítulos VINTE E UM, VINTE E DOIS e VINTE e TRÊS.