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1 Ortopedia: Fraturas Expostas Introdução Sabe-se que as fraturas expostas têm grande risco de infecção, portanto o advento dos antibióticos foi essencial para o sucesso do manejo desses pacientes. A fratura óssea nem sempre é definida como a exposição óssea: muitas vez o paciente apresentará uma deformidade anatômica no membro fraturado associado a um hematoma que fica em contato com o meio externo; esse hematoma em contato com o meio externo já é suficiente para definir essa lesão como fratura exposta. Na fratura fechada o paciente costuma apresentar seu envelope muscular mais preservado, sendo um risco menor para contaminação. Devemos sempre investigar, entretanto, como está a perfusão arterial desse paciente, palpando seus pulsos – uma vez que um membro mal perfundido também têm maior risco de infecção, mesmo que não haja exposição óssea ao meio ambiente. Fisiopatologia Não confundir com a fisiopatologia da consolidação e formação de calos ósseos. Nesse momento estamos falando da recuperação dos tecidos moles. O processo descrito abaixo deverá acontecer concomitantemente a cicatrização óssea, ou até mesmo antes; se isso não acontecer, a consolidação óssea fica prejudicada. ● Fase inflamatória Após o trauma ocorre uma grande liberação enzimática, seguida de agregação plaquetária, vasoconstrição e hipóxia tecidual. Depois de um período, os leucócitos se mobilizam para esse local, promovendo a defesa contra possíveis infecções. Também há ação dos macrófagos, que fazem a retirada do tecido necrótico. Nesse momento, nós ajudamos no processo de recuperação com o desbridamento e uso de antibióticos. Quando isso acontece, as células e o tecido conseguem garantir sua proteção e avançar para a próxima fase. ● Fase proliferativa/reparadora A partir de fatores de crescimento a área da lesão começa a ser povoada com fibroblastos e células endoteliais, que tem a função de sintetizar matriz extracelular, produzindo colágeno (fibroblastos) e criar tecido de granulação, produzindo tecido cicatricial (células endoteliais). Mecanismo de trauma Quando ocorre o impacto entre o objeto e o membro afetado, esse membro absorve uma quantidade de energia de acordo com a energia do trauma, que normalmente é grande nas fraturas expostas. 2 Ocorre descolamento periosteal e rompimento da barreira dos tecidos moles, produzindo a fratura exposta. Se houver formação de aberturas após a lesão, é possível que ocorra a entrada de bactérias. Classificação de Gustilo-Anderson modificada ● Tipo I ○ Fratura exposta e limpa, com exposição do osso ou hematoma <1cm ● Tipo II ○ Fratura exposta com extensão >1cm, sem dano excessivo de partes moles, sem retalhos e avulsões; o potencial de contaminação já é maior ● Tipo III ○ Fratura segmentar, ou com dano excessivo de partes moles, ou amputação traumática ● Tipo IIIA ○ Dano extenso das partes moles, lacerações, fraturas segmentares, FAF, mas com boa cobertura óssea de partes moles – não há perda tecidual em decorrência do trauma ● Tipo IIIB ○ Cobertura inadequada de partes moles ao osso – há perdas teciduais em decorrência do trauma ● Tipo IIIC ○ Com lesão arterial importante, requerendo reparo – há perdas importantes de cobertura, o potencial de contaminação é grande 3 Também existem classificações quanto a lesão da pele, músculo e lesões neurovasculares, mas não precisam ser decoradas, uma vez que não ajudam com a prática clínica – ficam limitadas apenas para registros em prontuários e outras documentações. Diagnóstico Nem sempre é óbvio e observável em exames de imagem. Sempre devemos analisar como um contexto geral: mecanismo de trauma, lesão de partes moles, contaminação e classificação da fratura. Devemos sempre fazer uma análise neurológica do membro lesado, se há sensibilidade/motricidade, se há pulso. A radiografia dependerá da estabilidade clínica do paciente, mas idealmente deve ser feito um RX da articulação acima e abaixo do trauma. Tratamento Atendimento pré-hospitalar Consiste em imobilização (o mais próximo da anatomia possível), limpeza da ferida, curativo inicial, etc. No momento da imobilização, sempre tomar cuidado com o comprometimento de músculos, tendões, nervos e vasos – a movimentação pode tanto ocluir quanto desobstruir artérias, permitindo ou impedindo o fluxo para a porção mais distal da fratura. Observar sempre que mover se o membro se torna mais ou menos pálido e se o pulso pode ser palpável: são bons indicativos se foi uma boa mobilização ou não. Nota: nunca realizar torniquete. Atendimento hospitalar Sempre respeitar a abordagem do paciente de acordo com a ATLS. Se a fratura for observável, devemos realizar uma radiografia – porém apenas em pacientes estáveis; caso esteja instável, devemos aguardar. Em alguns casos pode ser considerada a profilaxia do tétano. 4 Antibioticoterapia A realização da cultura é incomum. Deve ser preconizada a limpeza do membro e realização de uma antibioticoprofilaxia mais genérica e o mais cedo possível, que pode ser convertida dentro de 24h para uma abordagem mais específica de acordo com o protocolo do hospital. No pós operatorio: ● Tipo I e II por 24 horas EV – Cefalosporina de 1ª Geração ● Tipo III por 72 horas EV – Cefalosporina de 1ª Geração, Gentamicina e Clindamicina ○ Depois inicia-se 14 dias via oral, tanto no Tipo I, quanto II e III Tratamento cirúrgico Devemos lavar a ferida o mais rápido possível. O prazo máximo para o tratamento cirúrgico é de cerca de 4 a 6 horas a partir do trauma; depois desse período, há grandes chances da ferida se tornar infectada. Objetivos: ● Remover corpo estranho (pedras, areias, cascalho, etc) com uso exaustivo com pelo menos 10 litros de soro fisiológico ● Remover tecidos desvitalizados/necróticos (desbridamento) ● Reduzir a contaminação bacteriana (irrigação) ● Criar ferida vascularizada (ferimento) ● Estabilizar a fratura (fixação temporária com fixadores externos) A intenção do uso exaustivo de soro na limpeza da ferida é ajudar os macrófagos na fase inflamatória para que o novo tecido que deve se formar possa fazê-lo com a melhor qualidade possível e de forma mais rápida possível Gerenciamento de Feridas em Fraturas Expostas Quando se trata de feridas resultantes de fraturas expostas, é crucial adotar as abordagens certas para garantir uma cicatrização adequada. ● Fechamento Primário Imediato Nessa abordagem, a ferida original é suturada imediatamente após o evento. Isso acontece no momento da emergência para restaurar a integridade da pele. ● Fechamento Primário com Enxerto Essa abordagem envolve o uso de enxertos de pele ou tecidos vascularizados locais. Esses enxertos são aplicados para fechar a ferida e acelerar o processo de cicatrização. 5 ● Fechamento Secundário - Ferida Aberta Controlada: Aqui, a ferida é deixada aberta, mas de maneira controlada. É aplicado um curativo apropriado, que pode consistir em gaze, materiais biológicos ou sintéticos, ou até mesmo um sistema de vácuo. A complementação desse processo ocorre posteriormente, após a realização de desbridamentos sequenciais (remoção de tecido danificado). Dentro da abordagem de fechamento secundário, temos diferentes cenários: ● C1 – Fechamento Retardado com Sutura Direta: A sutura é aplicada em um estágio posterior, permitindo um tempo para avaliação e preparação adequada da ferida. ● C2 – Fechamento com Enxerto de Pele ou Tecido Vascularizado Local: Nesse caso, enxertos de pele ou tecidos vascularizados são usados para fechar a ferida em um momento posterior. ● C3 – Cicatrização por Segunda Intenção: Aqui, a ferida é deixada para cicatrizar naturalmente, sem suturas ou enxertos. Isso estimula o processo de cicatrização do corpo. ● C4 – Fechamento com Enxerto Vascularizado à Distância: Esse método envolve o uso de enxertos vascularizados que são retirados de uma área distante do corpo, sendo então aplicados na ferida. Enxerto ósseo Na abordagem inicial, quando há perda de tecido ósseo (Tipo IIIB e IIIC), podemospreencher aquele espaço vazio com cimento ósseo – massa moldável repleta de vancomicina (ATB) colocada em espaços vazios muito grandes. Enquanto isso, o organismo revitaliza a pele/envelope muscular; posteriormente esse cimento é removido e o enxerto ósseo é colocado. O enxerto ósseo não é colocado na ferida ativa, pois há grandes chances desse enxerto ser perdido – caso ainda haja infecção nesse local. Deve-se aguardar pela recuperação local para fazer o enxerto de forma mais segura. Fixação das fraturas Após o tratamento das partes moles, limpeza, irrigação e antibióticos, colocamos uma fixação externa no paciente. Os fixadores são muito úteis para restaurar o comprimento do membro, alinhar rotações e reduzir o membro a sua posição mais anatômica possível. A partir das fixações, é feito um controle de danos teciduais e um planejamento ósseo: formas de ajudar na recuperação desse osso a cicatrizar da melhor maneira possível.
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