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Autor: Prof. Juliano Rodrigo Guerreiro Colaboradoras: Profa. Marília Tavares Coutinho da Costa Patrão Profa. Christiane Mazur Doi Planejamento e Gestão da Qualidade na Saúde Professor conteudista: Juliano Rodrigo Guerreiro Graduado em Farmácia-Bioquímica pela Universidade de São Paulo (FCF/USP – 2004) e doutor em Bioquímica pelo Instituto de Química da Universidade de São Paulo (IQ/USP – 2009). Realizou pós-doutorado com ênfase em Bioquímica de Plantas pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” da Universidade de São Paulo (Esalq/USP) entre 2009 e 2012. Especialista em Mariologia pela Universidade Dehoniana (2017). É coordenador do curso de Farmácia desde 2008 e professor titular da UNIP desde 2009, tendo sido professor auxiliar da mesma universidade de 2005 a 2009. Tem experiência nas áreas de Bioquímica, Farmacologia, Fisiologia, Química, Teologia e História e no gerenciamento de drogarias, atuando principalmente nos seguintes temas: estrutura de biomoléculas, bioquímica estrutural, metabólica e clínica, bioquímica e fisiologia de plantas, interação ligante-receptor e venenos animais. É autor e coautor de 17 livros e artigos científicos sobre venenos animais, fisiologia e bioquímica, com três patentes. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) G934p Guerreiro, Juliano Rodrigo. Planejamento e Gestão da Qualidade na Saúde / Juliano Rodrigo Guerreiro. – São Paulo: Editora Sol, 2022. 108 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. 1. Qualidade. 2. Etapa. 4. Indicadores. I. Título. CDU 614:658.56 U515.85 – 22 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Profa. Sandra Miessa Reitora em Exercício Profa. Dra. Marilia Ancona Lopez Vice-Reitora de Graduação Profa. Dra. Marina Ancona Lopez Soligo Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Claudia Meucci Andreatini Vice-Reitora de Administração Prof. Dr. Paschoal Laercio Armonia Vice-Reitor de Extensão Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades do Interior Unip Interativa Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcelo Vannini Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático Comissão editorial: Profa. Dra. Christiane Mazur Doi Profa. Dra. Angélica L. Carlini Profa. Dra. Ronilda Ribeiro Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista Profa. Deise Alcantara Carreiro Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Auriana Malaquias Leonardo do Carmo Sumário Planejamento e Gestão da Qualidade na Saúde APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................9 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................9 Unidade I 1 INTRODUÇÃO À GESTÃO DA QUALIDADE .............................................................................................. 11 1.1 Aspectos históricos .............................................................................................................................. 11 1.2 Conceito de qualidade e de gestão da qualidade ................................................................... 15 1.3 Os cinco aspectos da qualidade ..................................................................................................... 15 1.3.1 Qualidade do resultado do trabalho ............................................................................................... 16 1.3.2 Qualidade social ...................................................................................................................................... 16 1.3.3 Qualidade do processo .......................................................................................................................... 17 1.3.4 Qualidade técnica ................................................................................................................................... 17 1.3.5 Qualidade do serviço ............................................................................................................................. 17 1.4 Fases da implementação de um sistema de gestão da qualidade ................................... 17 1.4.1 Nomeação de um gerente de projeto ............................................................................................ 17 1.4.2 Definição do projeto .............................................................................................................................. 18 1.4.3 Orientação dos funcionários .............................................................................................................. 18 1.4.4 Estabelecimento das políticas e das metas de qualidade ...................................................... 18 1.4.5 Definição dos elementos da gestão da qualidade ..................................................................... 18 1.4.6 Compilação do manual de gestão da qualidade e das instruções dos procedimentos ............................................................................................................................................ 18 1.4.7 Realização de auditorias internas .................................................................................................... 18 1.4.8 Seleção de uma empresa de certificação ...................................................................................... 19 1.5 Etapas do planejamento do projeto de gestão de qualidade ............................................ 19 1.5.1 Etapa 1: corte ........................................................................................................................................... 20 1.5.2 Etapa 2: priorização das tarefas ....................................................................................................... 20 1.5.3 Etapa 3: agendamento das tarefas .................................................................................................. 20 1.5.4 Etapa 4: definição do cronograma .................................................................................................. 20 1.5.5 Etapa 5: identificação dos riscos ...................................................................................................... 20 1.6 Qualidade total ...................................................................................................................................... 22 2 AS SETE FERRAMENTAS ELEMENTARES DA QUALIDADE ................................................................ 24 2.1 Listas de verificação e cartões de coleta de erros ................................................................... 25 2.2 Histograma .............................................................................................................................................. 26 2.3 Gráfico de controle de qualidade .................................................................................................. 29 2.4 Diagrama de Pareto ............................................................................................................................. 30 2.5 Gráfico de dispersão ............................................................................................................................ 31 2.6 Fluxograma ............................................................................................................................................. 34 2.7 Diagrama de causa e efeito..............................................................................................................34 3 OUTRAS FERRAMENTAS USADAS NA GESTÃO DA QUALIDADE ................................................... 36 3.1 Matriz Swot ............................................................................................................................................ 36 3.2 Ciclo PDCA............................................................................................................................................... 37 3.3 Masp .......................................................................................................................................................... 39 3.3.1 Etapa 1: identificação e descrição do problema ........................................................................ 39 3.3.2 Etapa 2: obtenção de informações importantes ....................................................................... 40 3.3.3 Etapa 3: determinação da causa mais provável ......................................................................... 40 3.3.4 Aplicação do ciclo PDCA ...................................................................................................................... 40 3.4 Método 5W2H ....................................................................................................................................... 40 3.5 Programa 5S ........................................................................................................................................... 42 3.5.1 Seiri (utilização): identifique tudo o que não é necessário ................................................... 43 3.5.2 Seiton (organização): disponha os materiais de trabalho ergonomicamente e rotule-os ............................................................................................................................................................ 43 3.5.3 Seiso (limpeza): limpe completamente seu local de trabalho .............................................. 44 3.5.4 Seiketsu (saúde): padronize a arrumação e a limpeza ............................................................ 44 3.5.5 Shitsuke (disciplina): pratique a autodisciplina e internalize os princípios anteriores ......................................................................................................................................... 44 3.6 Método Seis Sigma .............................................................................................................................. 46 3.6.1 Etapa D: define (definir) ....................................................................................................................... 46 3.6.2 Etapa M: measure (medir) ................................................................................................................... 47 3.6.3 Etapa A: analyse (analisar) .................................................................................................................. 48 3.6.4 Etapa I: improve (melhorar) ................................................................................................................ 48 3.6.5 Etapa C: control (controlar) ................................................................................................................ 48 4 CERTIFICAÇÃO INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION (ISO) .................. 49 4.1 Aspectos históricos .............................................................................................................................. 50 4.2 Conceitos e principais considerações ........................................................................................... 50 4.3 O padrão ISO 9000 ............................................................................................................................... 51 4.4 O padrão ISO 9001 ............................................................................................................................... 52 4.5 O padrão ISO 9004 ............................................................................................................................... 53 4.6 O padrão ISO 19011 ............................................................................................................................. 54 Unidade II 5 GESTÃO DA QUALIDADE NOS SERVIÇOS DE SAÚDE ......................................................................... 62 5.1 Principais conceitos e aplicações ................................................................................................... 62 5.2 Ciclo de controle da qualidade e implementação da qualidade nos serviços de saúde ......................................................................................................................................... 65 5.3 Melhoramento contínuo da qualidade nos serviços de saúde .......................................... 66 5.3.1 Identificação do processo .................................................................................................................... 67 5.3.2 Descrição do processo .......................................................................................................................... 67 5.3.3 Construção do novo processo ........................................................................................................... 67 5.3.4 Monitoramento do processo .............................................................................................................. 68 5.4 Resultados da implantação do processo de melhoria da qualidade nos serviços de saúde ......................................................................................................................................... 69 5.5 Modelos de gestão de qualidade aplicados à área da saúde ............................................. 70 5.5.1 Gestão por processos ............................................................................................................................ 70 5.5.2 Gestão por diretrizes ............................................................................................................................. 72 6 AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DOS SERVIÇOS DE SAÚDE .................................................................. 74 6.1 Aspectos gerais ...................................................................................................................................... 74 6.2 Indicadores de qualidade .................................................................................................................. 76 6.2.1 Indicadores de qualidade espacial ................................................................................................... 77 6.2.2 Indicadores de informação ................................................................................................................. 78 6.2.3 Indicadores profissionais...................................................................................................................... 79 6.2.4 Indicadores de sinistro .......................................................................................................................... 79 6.3 Indicadores-chave de desempenho .............................................................................................. 80 7 ACREDITAÇÕES E CERTIFICAÇÕES NO CONTEXTO DOS SERVIÇOS DE SAÚDE ........................ 81 7.1 Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) ............................ 82 7.2 Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ................................................................. 82 7.3 Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) .................................................................. 83 7.4 Sistema Brasileiro de Certificação (SBC) e Programa de Auditoria Única de Dispositivos Médicos (MDSAP) ............................................................................................................... 83 7.5 Acreditação em saúde ........................................................................................................................ 84 7.5.1Principais programas de acreditação hospitalar ........................................................................ 86 7.6 Auditoria interna e tratamento de não conformidades ....................................................... 87 8 BENCHMARKING E ANÁLISE DE VALOR ................................................................................................. 91 8.1 Benchmarking ........................................................................................................................................ 91 8.2 Análise de valor ..................................................................................................................................... 93 8.2.1 Cadeia de valor ........................................................................................................................................ 93 8.2.2 Posicionamento estratégico ............................................................................................................... 94 8.3 Fatores geradores de custo ............................................................................................................... 95 9 APRESENTAÇÃO Caro(a) aluno(a), O que você entende por um serviço de qualidade? Você sabia que existem normas que visam a garantir a qualidade dos serviços e dos produtos oferecidos por organizações de diferentes áreas e que integram o que conhecemos como controle de qualidade? Esta disciplina tem como objetivo apresentar essas normas, juntamente com os modernos conceitos de qualidade e de produtividade que norteiam as atividades organizacionais nos estabelecimentos da área da saúde. Durante a leitura deste livro-texto, você aprenderá os métodos e as técnicas de elaboração do planejamento estratégico e operacional da qualidade, estudará as principais estratégias e ferramentas gerenciais de controle da qualidade nas organizações prestadoras de serviços de saúde e conhecerá os métodos de avaliação da qualidade assistencial. A organização do presente material segue uma estrutura de apresentação de conceitos que facilita o aprendizado e que é equivalente à estrutura utilizada nas aulas presenciais. Ao final da leitura, você deverá ser capaz de compreender os principais conceitos que envolvem a qualidade aplicada à saúde. Além disso, deverá estar a par dos principais aspectos referentes a técnicas de qualidade, assim como desenvolverá habilidades de ordenação e de realização de auditorias e planejamento de metas que são aplicáveis não só na área da saúde, mas na rotina e no desenvolvimento pessoal. Boa leitura! INTRODUÇÃO Entender a importância da gestão da qualidade na área da saúde implica o conhecimento de: • legislação pertinente; • modelos de gestão; • etapas do monitoramento qualitativo; • ferramentas utilizadas no controle contínuo de qualidade. Todo esse conteúdo é abordado ao longo deste livro-texto, conforme descrito a seguir. 10 Na unidade I, abordamos os seguintes tópicos. • A introdução à gestão da qualidade, com a apresentação de um breve histórico da gestão da qualidade na área industrial. • As sete ferramentas elementares da qualidade. • Outras ferramentas utilizadas na gestão da qualidade. • O sistema de certificação International Organization for Standardization (ISO). Na unidade II, desenvolvemos os itens a seguir. • A qualidade nos serviços de saúde. • A gestão da qualidade no contexto brasileiro, abordando o sistema de certificação e os programas de acreditação aplicados no território nacional. • Os processos de gestão aplicados aos serviços de saúde, incluindo a auditoria interna e a auditoria externa. • Os desafios da gestão da qualidade nos tempos atuais. Bom estudo! 11 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE Unidade I 1 INTRODUÇÃO À GESTÃO DA QUALIDADE 1.1 Aspectos históricos O termo gestão da qualidade é relativamente moderno. No entanto, a prática em si é muito mais antiga do que pode parecer inicialmente. A qualidade já desempenhava um papel importante desde os tempos remotos, tanto na fabricação de mercadorias como na construção civil. Por exemplo, sem a padronização das medidas de comprimento, certamente não seria possível a construção das pirâmides no Egito. Com o crescimento das atividades comerciais, esse tema ganhou ainda mais importância e, gradualmente, começou a institucionalizar-se. O surgimento de guildas, na Idade Média, representou um marco para o desenvolvimento da gestão da qualidade e da qualidade dos produtos em geral. As guildas prescreviam métodos de produção para seus membros, a fim de garantir a qualidade dos produtos. Esses métodos eram baseados em regulamentos e em processos de controle. Observação As guildas medievais foram associações criadas na Idade Média, em muitas cidades europeias, para regular o trabalho de determinadas classes profissionais. Até o advento da Revolução Industrial, os produtos e os processos eram realizados de maneira totalmente artesanal. Portanto, a padronização proposta inicialmente pelas guildas e, mais tarde, por outras associações tinha alcance limitado, e a qualidade era um conceito estendido apenas ao produto. Com o estabelecimento da manufatura e da produção em larga escala que marca o final do século XVIII e início do século XIX, a gestão da qualidade estendeu-se também para os processos de produção. Vamos, agora, aprender mais sobre a gestão da qualidade no período de surgimento das indústrias, especialmente durante a Segunda Revolução Industrial. 12 Unidade I A Segunda Revolução Industrial, iniciada na Europa e nos Estados Unidos em meados do século XIX, foi caracterizada pelo desenvolvimento das indústrias química, elétrica, de petróleo e de aço. Durante a Segunda Revolução Industrial, foram desenvolvidos os navios de aço movidos a vapor, os aviões, a refrigeração mecânica, o telefone e a produção em massa de bens de consumo, entre outros processos. A linha de produção nasceu durante a Segunda Revolução Industrial. Essa forma de organização do trabalho possibilitou que trabalhadores não qualificados pudessem fabricar produtos complexos por meio da divisão do trabalho. O trabalho na linha de produção é desempenhado por vários operários, o que significa que um único produto é montado por mais de um indivíduo. Esse tipo de produção precisa de regras e de padrões para prosseguir sem erros. Saiba mais O filme indicado a seguir pode propiciar uma inter-relação com os conteúdos da unidade. TEMPOS Modernos. Direção: Charles Chaplin. EUA: United Artists, 1936. 87 min. Nesse contexto, o controle de qualidade passou a ser visto não apenas como uma verificação final do produto, mas, também, como a verificação do processo em si, a fim de evitar desperdícios durante a produção. Como não é possível verificar todas as peças fabricadas em uma linha de produção, surgem ferramentas estatísticas para a realização de avaliações por amostragem. No início do século XX, com os objetivos de melhorar a eficiência na linha de produção das fábricas e de garantir a qualidade final do produto, o engenheiro mecânico norte-americano Frederick W. Taylor (1856-1915) desenvolveu o conceito de gestão científica, também conhecido como taylorismo. A gestão científica consiste no estabelecimento de especificações detalhadas, que são aplicadas ao gerenciamento do controle do processo de fluxos de trabalho. De acordo com essa teoria, o trabalho deve ser hierarquizado, conforme descrito a seguir: • O processo produtivo é baseado na especialização do trabalho, ou seja, cada trabalhador deve desenvolver uma atividade específica dentro do sistema produtivo, de maneira padronizada; • Os inspetores devem avaliar os produtos finais e separar aqueles que apresentam defeitos, para repará-los ou descartá-los. 13 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE Na década de 1930, o físico e engenheiro norte-americano Walter A. Shewhart (1891-1967) desenvolveu um novo e revolucionário sistema de testes de qualidade. Esse sistemaconsiste na aplicação de métodos estatísticos especialmente desenhados para tal. A principal ferramenta utilizada por Shewhart é o gráfico de controle de qualidade, que estudaremos em detalhes nos próximos tópicos. 0,85 0,81 0,72 0,62 Peças 1 M éd ia s 0,80 0,75 0,70 0,65 0,60 Figura 1 – Exemplo de gráfico de controle de qualidade. Nele, cada ponto corresponde a uma peça. A linha azul indica o valor médio do parâmetro que se deseja avaliar (por exemplo, tamanho ou, ainda, peso). As linhas vermelhas indicam a variação máxima aceita para esse parâmetro Disponível em: https://bit.ly/3O2xhqz. Acesso em: 8 jun. 2022. Os métodos de Shewhart não foram usados até a Segunda Guerra Mundial, quando se mostraram úteis para evitar defeitos materiais nos fornecedores das forças armadas estadunidenses. Após a Segunda Guerra Mundial, principalmente no período que abrange de 1945 a 1985, o Japão e os Estados Unidos consolidaram uma filosofia de qualidade ligada não mais ao produto, mas ao processo. A ideia era que, ao melhorar o processo, haveria melhoria nos produtos. O arcabouço teórico da qualidade como a conhecemos nasceu nesse período. A partir de 1946, durante a ocupação americana do Japão, engenheiros americanos foram enviados para ajudar a indústria japonesa. Dois americanos, Charles Protzman e Homer Sarason, organizaram uma série de seminários sobre técnicas de manufatura americanas. Em 1950, os japoneses promoveram vários outros seminários, sendo que muitos deles foram realizados por W. Edwards Deming, um matemático e especialista em controle estatístico de qualidade. Deming, aluno de Walter Shewhart, introduziu, na década de 1960, o movimento dos círculos de qualidade no Japão. Pequenas equipes de operários e especialistas, denominadas círculos da qualidade, foram treinados para aumentar a eficiência e a qualidade do trabalho. Além disso, Deming estabeleceu medidas de qualidade a serem cumpridas em outros setores da fábrica, além da linha de produção. Segundo Deming, testes estatísticos, como a análise de variância e os testes de hipóteses, devem ser aplicados desde o projeto do produto até sua venda, a fim de avaliar sua conformidade e garantir que a qualidade seja atingida de maneira mais abrangente. 14 Unidade I Ainda na década de 1960, os primeiros programas de erro zero foram introduzidos na indústria de armas dos Estados Unidos, com a máxima “Faça certo da primeira vez”, cunhada pelo empresário e escritor norte-americano Philip Crosby (1926-2001). Os programas de erro zero consistem em perguntar aos funcionários quais as causas dos erros no processo de produção e como eles podem evitá-los. Trata-se de uma maneira de valorizar a equipe e garantir que os erros não se repitam. Vamos, agora, para a década de 1970. Nessa época, a gestão da qualidade especializou-se ainda mais. Surgiram ferramentas de gestão e, também, o conceito de qualidade total. • As ferramentas de gestão são um conjunto de metodologias utilizadas para definir, analisar e resolver problemas que impactam os resultados das organizações. As mais conhecidas são: o programa 5S (seiri, seiton, seiso, seiketsu, shitsuke), o ciclo PDCA (plan, do, check, verify), o MASP (Metodologia de Análise e Solução de Problemas) e o Plano de Ação 5W1H (what, who, where, when, why and how). • A qualidade total representa o conjunto de iniciativas com foco na eficiência total da empresa, que visa à satisfação e à superação das necessidades e dos desejos do público-alvo. A gestão da qualidade total deve garantir que a empresa respeite os padrões de qualidade e utilize tudo o que estiver ao seu alcance para implantá-los. Com o intuito de verificar se a tal implantação foi feita de maneira adequada, foram criadas certificações. Na década de 1980, ocorreu a introdução de padrões de certificação ISO, como a ISO 9001 (ABNT, 2015b), que representa uma forma de assegurar que a empresa está apta a fornecer um produto, um serviço ou um sistema conforme as exigências das agências reguladoras internacionais. Um sistema de gestão da qualidade que trabalha com os padrões descritos na ISO 9001 (ABNT, 2015b) baseia-se nas seguintes dimensões: planejamento da qualidade, controle da qualidade, garantia da qualidade e melhoria da qualidade. Ainda na década de 1980, surgiram ferramentas para avaliar e corrigir os equívocos na implementação e na condução do sistema de qualidade. Dois exemplos são os indicadores de desempenho e as auditorias: • Os indicadores de desempenho, também chamados de key performance indicators (KPI), são métricas que avaliam a performance da organização. Alguns exemplos são: o indicador de lucratividade da empresa; o índice de turnover, que avalia o grau de rotatividade dos funcionários; a taxa de sucesso de vendas etc. • A auditoria é a análise de todas as atividades desenvolvidas por uma empresa. Os principais objetivos são: verificar se essas atividades estão sendo conduzidas conforme o planejado e se estão de acordo com as normas e as leis. 15 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE 1.2 Conceito de qualidade e de gestão da qualidade Na sociedade moderna, o termo qualidade é usado em uma ampla variedade de contextos. No âmbito organizacional, qualidade refere-se à conformidade de um produto ou de um serviço a requisitos predeterminados, estabelecidos por uma norma ou pelos próprios clientes. Em outras palavras, é o nível de perfeição de um processo, serviço ou produto, que visa à satisfação do usuário final. Oferecer um serviço ou um produto de qualidade engloba vários aspectos do ciclo de vida de uma instituição, como: • os valores que norteiam a gestão da empresa; • a cultura empresarial; • as características dos principais processos de decisão; • as técnicas e os métodos utilizados na fabricação de produtos, na prestação de serviços e nos sistemas de controle. Nesse contexto, a gestão da qualidade é o conjunto de todas as atividades desenvolvidas na criação de um produto, na prestação de um serviço ou na produção de qualquer bem, a fim de garantir que os objetivos da política de qualidade sejam alcançados em todos os processos de negócio. Portanto, a gestão da qualidade deve garantir que a empresa utilize tudo o que estiver ao seu alcance para assegurar a qualidade dos produtos e serviços oferecidos pela empresa. Em uma empresa, os departamentos de gestão da qualidade, também conhecidos como departamentos de quality management (QM), podem assumir a responsabilidade direta pela qualidade do produto e/ou do serviço ofertado ou, ainda, podem ser responsáveis pela gestão dos processos produtivos, a partir da criação de vários pré-requisitos que serão praticados em todas as áreas da empresa. A estrutura do sistema de gestão da qualidade está ligada à estrutura da empresa. Os departamentos de QM devem, portanto, ser capazes de mapear a estrutura organizacional do processo e suas inter-relações. Os sistemas de gestão da qualidade que atendem a esse requisito também são chamados de “sistemas de gestão da qualidade orientados para o processo”. 1.3 Os cinco aspectos da qualidade A gestão da qualidade engloba não só o produto final, mas também os processos e os procedimentos técnicos, organizacionais e comunicativos que contribuem para a fabricação do produto ou para a oferta do serviço. Além disso, inclui o relacionamento da empresa com os clientes e com o mercado, desde a aquisição do produto ou do serviço até a recepção de eventuais reclamações. 16 Unidade I O reconhecimento da qualidade pelo consumidor é o foco principal do trabalho. Para que esse objetivo seja alcançado, alguns aspectos-chave são levados em consideração: • a qualidade do resultado do trabalho; • a qualidade social; • a qualidade do processo; • a qualidade técnica; • a qualidade do serviço. Vamos conhecer cada um desses aspectos? 1.3.1 Qualidade do resultado do trabalho Os principais elementos que influenciam o resultado do trabalho são: • a solução conceitualutilizada na elaboração do produto; • os recursos de execução disponíveis; • as características logísticas; • as características econômicas do produto; • os recursos de comunicação que a empresa tem com os clientes. 1.3.2 Qualidade social Cada empresa deve estar altamente comprometida com seus colaboradores e com a sociedade. As qualidades sociais de uma empresa ou organização incluem: • as condições de trabalho; • o estilo de liderança adotado; • a motivação da equipe. 17 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE 1.3.3 Qualidade do processo Os processos de execução de um serviço e, também, os métodos de fabricação de um produto são etapas diretamente ligadas à garantia da qualidade. Nesse contexto, a gestão da qualidade do processo engloba: • o modo de manuseio do produto durante a fabricação; • os testes realizados durante os procedimentos produtivos. 1.3.4 Qualidade técnica A qualidade técnica é o aspecto mais tradicional e, por assim dizer, o mais “artesanal” dos aspectos de qualidade. Ela inclui: • os dispositivos de medição; • o material utilizado na confecção; • as máquinas e as ferramentas que fazem parte da produção. 1.3.5 Qualidade do serviço Os serviços, quando bem executados, contribuem para a satisfação e para a fidelização do cliente. Alguns exemplos são: • a boa vontade do prestador; • o eficaz atendimento ao cliente; • a manutenção da boa relação com o cliente. 1.4 Fases da implementação de um sistema de gestão da qualidade O estabelecimento de um sistema de gestão da qualidade é uma tarefa multifacetada, que envolve a coordenação de diferentes processos. As oito etapas a seguir são necessárias para a introdução de um sistema de gestão da qualidade. Vamos conhecê-las? 1.4.1 Nomeação de um gerente de projeto Uma das tarefas mais importantes para o estabelecimento de um sistema de gestão da qualidade efetivo é identificar um gerente de projeto adequado. Frequentemente, um funcionário da alta administração, com as habilidades necessárias, é nomeado para esse cargo. 18 Unidade I 1.4.2 Definição do projeto O projeto conhecido como “implantação de um sistema de gestão da qualidade” deve ser planejado em termos de etapas, processos, prazos e custos. Um bom planejamento de projeto apoia o gerente em seu trabalho e evita que os custos aumentem e que os prazos não sejam cumpridos. Falaremos mais sobre esse assunto no tópico 1.5. 1.4.3 Orientação dos funcionários Os funcionários devem ser informados desde o início a respeito de quais medidas para um sistema de gestão da qualidade estão sendo introduzidas. A cooperação dos funcionários é essencial, pois eles executam os processos de trabalho e, portanto, sabem onde há espaço para melhorias. 1.4.4 Estabelecimento das políticas e das metas de qualidade As principais características da política de qualidade devem ser estabelecidas no início do projeto. Os critérios adotados devem ser verificáveis, pois somente assim as metas de qualidade podem se tornar efetivas como instrumentos de controle do sistema de gestão da qualidade. 1.4.5 Definição dos elementos da gestão da qualidade Uma maneira promissora de projetar com eficiência um sistema de gestão da qualidade é começar pelos processos e pelas atividades de trabalho que são executados na empresa, compará-los com os requisitos do padrão desejado e, em seguida, decidir quais desses requisitos devem ser aplicados. Fazer uma lista de todas as atividades e de todos os processos ajuda a ter uma visão geral do processo. 1.4.6 Compilação do manual de gestão da qualidade e das instruções dos procedimentos O manual de gestão da qualidade resume os requisitos centrais discutidos nas etapas anteriores. Ele contém as instruções que devem nortear a implementação do sistema de gestão da qualidade em uma empresa. Procedimentos operacionais padrão, listas de verificação e formulários integram o manual. 1.4.7 Realização de auditorias internas As auditorias internas podem ser usadas para verificar se as instruções de procedimentos e de trabalho estão realmente sendo aplicadas conforme foram documentadas. Além disso, essas auditorias avaliam se tais instruções são adequadas para atender aos objetivos da gestão de qualidade. 19 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE As ferramentas mais importantes para a realização de auditorias internas são as listas de questões de auditoria. Com base nessas questões, o funcionário que realiza as auditorias pode avaliar se o trabalho está sendo executado conforme pretendido na gestão da qualidade. 1.4.8 Seleção de uma empresa de certificação O objetivo da certificação é garantir que o sistema de gestão da qualidade e, portanto, a organização do provedor de treinamento, seus processos, suas interfaces e seus métodos são adequados. Durante a certificação, os auditores externos fornecem informações sobre os pontos fracos e sobre o potencial de otimização dos processos e dos serviços. Observação Frequentemente, é mais difícil manter o nível de qualidade do que alcançá-lo. Os melhores sistemas de gestão correm o risco de perder relevância ao longo do tempo se não forem mantidos, adaptados e melhorados constantemente. Portanto, sempre tenha em mente os benefícios específicos da gestão de qualidade no trabalho diário. 1.5 Etapas do planejamento do projeto de gestão de qualidade Entre as oito fases da implementação do projeto de gestão de qualidade, o planejamento é, sem dúvida, uma das mais importantes. O projeto de gestão de qualidade consiste: • na determinação da lista de tarefas a realizar; • na estimativa do custo de realização de cada uma delas; • na seleção dos perfis necessários para desenvolver cada etapa do processo. Além disso, o estabelecimento de um cronograma permite: • acompanhar se os objetivos definidos foram alcançados; • monitorar o andamento das ações desempenhadas; • controlar a alocação de recursos para o desempenho das diversas tarefas. 20 Unidade I Vamos conhecer as cinco etapas do planejamento de um projeto de gestão da qualidade? 1.5.1 Etapa 1: corte O primeiro passo no planejamento do projeto é dividi-lo em etapas e determinar o tempo necessário para cumpri-las. É necessário determinar a lista de tarefas a serem realizadas, as cargas a serem esperadas e os recursos necessários. Além disso, o processo de validação que será empregado e os resultados esperados também devem ser detalhados. 1.5.2 Etapa 2: priorização das tarefas Assim que a lista de tarefas estiver completa, deve-se decidir quais terão prioridade. Se forem identificados pré-requisitos para a realização de uma tarefa, eles devem ser levados em consideração, o que pode resultar no aumento do seu nível de prioridade. O planejamento da entrega dos resultados deve ser estabelecido. Pode-se fornecer um exemplo de entrega de projeto para servir de modelo. Essas entregas também podem ser divididas em subprodutos, sendo que as atividades relacionadas à sua realização também devem ser listadas. 1.5.3 Etapa 3: agendamento das tarefas O agendamento de tarefas envolve determinar a ordem em que elas devem ser executadas. Nessa fase, deve-se também identificar as tarefas que precisam ser executadas sequencialmente e as tarefas que, por outro lado, podem ser paralelizadas. Para fazer isso, deve-se perguntar: a tarefa depende de outras tarefas? Em caso afirmativo, esses pré-requisitos podem ser tratados em paralelo ou devem ser tratados um após o outro? Existe uma margem de tempo aceitável para se completar a tarefa? Pode haver atrasos na entrega dos resultados? 1.5.4 Etapa 4: definição do cronograma Com base no nível de prioridade e na carga horária estimada das tarefas, devemos definir suas datas de conclusão. Ao final dessa operação, obtém-se o cronograma do projeto. 1.5.5 Etapa 5: identificação dos riscos O objetivo da identificação dos riscos é antecipar os diversos problemas que podem ser encontrados ao longo da realização do projeto. 21 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADENA SAÚDE Alguns fatores de risco que devem ser listados são: • os pontos críticos de cada tarefa; • a disponibilidade de recursos humanos e de materiais; • os tempos de contratação; • a disponibilidade de instalações. As possíveis consequências dos erros cometidos nesses diferentes processos devem ser estimadas e classificadas em ordem de importância e de impacto no projeto. Alguns exemplos são os que seguem: • O que acontecerá se instalações ficarem indisponíveis ou inacessíveis? • O que acontecerá se alguns membros da equipe se ausentarem? • O que acontecerá se os custos ocultos forem descobertos? • O que acontecerá se um fornecedor não puder fornecer o equipamento ou uma entrega no prazo? • O que acontecerá se a tecnologia originalmente selecionada não resolver o problema? Tais riscos podem ser materializados em uma matriz de risco (figura 2). Essa matriz deve ser atualizada ao longo do projeto, pois os riscos mudam com o tempo. Por exemplo, a ausência de um desenvolvedor na equipe pode representar um risco menor no início do projeto e se tornar um grande risco depois de algumas semanas ou alguns meses, quando ele adquiriu o conhecimento essencial para o desenvolvimento do projeto. 5 4 3 2 1 1 AA BB CC DD 1 15 12 9 6 3 3 Severidade A Baixo risco B Médio risco C Alto risco D Extremo Fr eq uê nc ia 3 10 8 6 4 2 2 2 20 16 12 8 4 4 4 25 20 15 10 5 5 5 Figura 2 – Exemplo de matriz de riscos Disponível em: https://bit.ly/3Mwe1Rc. Acesso em: 8 jun. 2022. 22 Unidade I 1.6 Qualidade total Todos que trabalham na empresa são responsáveis pela qualidade dos produtos e/ou dos serviços ofertados. Nesse contexto, a equipe de gestão de qualidade tem como principal função garantir os requisitos mínimos para que o padrão de qualidade seja atingido. O foco da gestão da qualidade não pode ser apenas o cliente. Em empresas que dependem fortemente de outras partes interessadas, como autoridades regulatórias, a gestão da qualidade também deve levar em consideração os requisitos dessas outras partes interessadas. O departamento de gestão da qualidade deve lidar regularmente com várias questões. Algumas são listadas a seguir: • Os temas relevantes são tratados na empresa? • Em caso afirmativo, isso ocorre com o grau de maturidade exigido? • É preciso construir know-how e, se necessário, contratar funcionários? • Em que medida deve-se definir diretrizes para garantir o profissionalismo e para não reduzir a automotivação e a criatividade? Essas perguntas mostram que a cooperação de todos os envolvidos na empresa é a base para uma gestão de qualidade bem-sucedida. Nesse contexto, o departamento de gestão de qualidade assume a função de moderador. A gestão da qualidade total, ou total quality management (TQM), é uma abordagem baseada na aplicação de conceitos de qualidade desenvolvidos no Japão, no final da década de 1970. A aplicação diligente desses métodos por empresas japonesas permitiu-lhes contornar muitos fabricantes ocidentais. Mas, paradoxalmente, o movimento da qualidade foi originalmente inspirado nas ideias americanas, que defendiam que a qualidade pode ser estabelecida a partir de um sofisticado controle estatístico. Lembrete Deming é comumente referido como o fundador do movimento moderno da qualidade, e os próprios japoneses acreditam que ele desempenhou um papel fundamental no milagre econômico do pós-guerra. Um dos objetivos da TQM é minimizar o desperdício e a reciclagem, eliminando a sucata gerada durante o processo de fabricação. Para isso, a TQM integra um grupo de conceitos que incluem muitas ideias relacionadas à manufatura enxuta, como o just in time e o kaizen. 23 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE Observação Just in time significa “no momento certo”. Trata-se de um sistema que objetiva a produção da quantidade exata do produto, de acordo com a demanda, de forma rápida e sem a necessidade da formação de estoques. Assim, evitamos desperdícios e custos extraordinários. Kaizen é uma metodologia japonesa que visa a diminuir os custos e a melhorar a produtividade das empresas. O sucesso da aplicação da TQM pelas indústrias japonesas foi tão grande que, em meados da década de 1980, as empresas ocidentais tentaram entender como as empresas japonesas eram gerenciadas. No final desse período, já era possível dividir todas as empresas líderes mundiais em duas categorias: as que já haviam introduzido a TQM e as que iriam fazê-lo. Essa tendência foi reforçada pela ampla aceitação da acreditação do sistema de qualidade. As normas internacionais ISO 9000 (ABNT, 2015a) tornaram-se referência mundial em qualidade, embora algumas empresas tenham se queixado de que a documentação burocrática dos procedimentos introduzidos, na verdade, as impedia de aumentar sua competitividade. De fato, um mal-entendido muito comum a evitar é o de confundir a adesão às normas mundiais e europeias de certificação de qualidade (representadas pelas normas internacionais ISO 9000 e 9004) com a aplicação da lógica da qualidade total. O mal-entendido decorre principalmente do fato de o sistema de normas que visa à certificação ter sido indicado com o termo sistema de gestão da qualidade, criando, deliberadamente ou não, certa afinidade com a gestão da qualidade total, que representa uma ideia muito mais ampla. As normas ISO 9000 e 9004 são voltadas principalmente para elementos internos e, em sua essência, tendem a avaliar se a empresa utiliza estruturas organizacionais adequadas; se segue procedimentos de trabalho formalizados; e se verifica a qualidade da produção, entre outros fatores. A qualidade total, por outro lado, é voltada principalmente para o ambiente externo à empresa, ou seja, para o cliente. Com esses elementos em mente, podemos conceituar qualidade total como uma estratégia de gestão da empresa: • centrada na qualidade; • baseada na participação consciente de todos os colaboradores; • que atende à excelência empresarial de longo prazo; • alcançada por meio da satisfação do cliente e da melhoria das relações internas e externas. 24 Unidade I Os princípios básicos da TQM são listados a seguir: • Mudança no foco do controle de qualidade do produto (verificar se o trabalho já concluído atende aos padrões exigidos) para a garantia da qualidade dos processos. A qualidade é “embutida” nos processos de produção, de forma que apenas as operações que atendam aos padrões aceitáveis são realizadas. • Adoção de uma filosofia de melhoria contínua. Todos na organização devem tentar melhorar o trabalho que realizam. A melhoria pode incluir o seguinte: reduzir custos, diminuir o tempo de realização de determinada tarefa, evitar desperdícios, tornar a vida de fornecedores ou dos clientes mais fácil e qualquer outra mudança positiva. Portanto, mudanças nos processos são feitas constantemente, e não a cada poucos anos, quando os métodos antigos já estão irremediavelmente desatualizados em comparação com os dos concorrentes. • Abordagem centrada no consumidor. De acordo com a TQM, toda decisão começa com o que o cliente deseja. • Esforço para fazer certo da primeira vez. Todos os funcionários devem usar procedimentos desenvolvidos e documentados para garantir que o trabalho executado atenda aos padrões aceitáveis. Isso elimina a necessidade de ação corretiva em trabalhos mal-executados. • Participação ativa de todos os colaboradores com os objetivos da organização. No ambiente da TQM, as velhas ideias sobre gerentes e supervisores que controlam o trabalho dos outros são substituídas pela ideia de responsabilidade de todos pela qualidade e pela melhoria do seu trabalho. Nesse contexto, o papel dos líderes é apoiar esses esforços. • Compromisso com a TQM no mais alto nível da organização. Somente se a alta administração dedicar o tempo e os recursos necessários, a TQM oferecerá benefícios reais. • Reconhecimento de que o desempenho só pode ser medido e melhorado encontrando-seformas adequadas de medi-lo. • Reconhecimento de que prevenir erros é muito mais eficaz do que os corrigir. 2 AS SETE FERRAMENTAS ELEMENTARES DA QUALIDADE As ferramentas da qualidade são estratégias e dispositivos estatísticos projetados para resolver vários problemas enfrentados pelo pessoal envolvido na operação do sistema de gestão da qualidade. Elas surgiram em 1943, quando um engenheiro e professor da Universidade de Tóquio, chamado Kaoru Ishikawa (1915-1989), propôs sete instrumentos para resolver a maioria dos problemas da empresa no campo da qualidade. Essas sete ferramentas passaram por diversas alterações e, no momento, estão divididas nos dois grupos mostrados a seguir. 25 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE • Grupo 1. Grupo para a coleta e a apresentação dos dados, que inclui as listas de verificação e de coleta de erros, os histogramas e os gráficos de controle de qualidade. • Grupo 2. Grupo para o agrupamento e a análise dos dados, que engloba o diagrama de Pareto, o diagrama de correlação, o diagrama de fluxo e o diagrama de causa e efeito. Ao aplicar as ferramentas da qualidade, devemos ter em mente que o uso de várias ferramentas inter-relacionadas e a ordem de aplicação influenciam os resultados obtidos. Vamos, agora, conhecer cada uma das sete ferramentas elementares da qualidade. 2.1 Listas de verificação e cartões de coleta de erros Uma lista de verificação é um formulário estruturado para coletar e analisar dados. Trata-se de uma ferramenta que pode ser adaptada para uma ampla variedade de finalidades. Os dados coletados por meio de uma lista de verificação podem ser quantitativos ou qualitativos. Quando as informações são quantitativas, a lista de verificação é chamada de folha de cálculo. Uma lista de verificação típica é dividida em várias colunas, cada uma indicativa de um parâmetro diferente. Caso os requisitos apontados em determinada coluna sejam cumpridos, a posição é marcada com um “tique”. Portanto, as marcas (tiques) feitas em colunas diferentes têm significados diferentes. Assim, a leitura dos dados leva em consideração a localização e o número de marcações presentes na folha. As listas de verificação geralmente usam um cabeçalho que responde às cinco perguntas a seguir: • Quem? • O quê? • Onde? • Quando? • Por quê? É importante estarmos atentos às definições operacionais para cada uma das perguntas, ou seja, precisamos observar o que segue. • Quem completou a lista de verificação? • O que foi coletado? 26 Unidade I • Onde ocorreu a coleta de dados? • Quando os dados foram coletados? • Por que esses dados foram coletados? A lista de verificação inclui, ainda, a classificação de defeitos: o que deve ser considerado um defeito menor, maior ou crítico. O cartão ou a lista de coleta de erros, por sua vez, contém a descrição do erro e o número de ocorrências relacionado. Trata-se da base para avaliações e análises estatísticas. As informações contidas em um cartão de coleta de erros geralmente são avaliadas com o uso do diagrama de Pareto, que abordaremos mais adiante. 2.2 Histograma Um histograma é uma representação gráfica da distribuição de frequência dos dados de medição em um período específico. Esse gráfico é elaborado conforme descrito a seguir: • No eixo horizontal (eixo x), são plotados os dados divididos em intervalos numéricos consecutivos que apresentam o mesmo tamanho. Esses intervalos são denominados classes. Por exemplo, suponhamos que a massa de um comprimido produzido varie de 950 mg a 1,350 g. Podemos dividir esse intervalo de massas nas seguintes classes: (1) 950 mg a 1,000 g; (2) 1,001 g a 1,050 g; (3) 1,051 g a 1,100 g; (4) 1,101 g a 1,150 g; (5) 1,151 g a 1,200 g; (6) 1,201 g a 1,250 g; (7) 1,251 g a 1,300 g; (8) 1,301 g a 1,350 g. Note que, nesse exemplo, cada classe corresponde ao intervalo de 50 mg. • No eixo vertical (eixo y), indica-se a frequência com que cada classe é observada ou, ainda, o número absoluto de ocorrências dentro de cada classe. No exemplo dado anteriormente, no eixo y, apontamos quantas vezes comprimidos que pertencem a cada classe foram obtidos da linha de produção do medicamento. Os resultados apresentados com o auxílio do histograma permitem a comparação entre os valores reais e os valores alvo. Para isso, é necessário que as classes sejam estabelecidas de maneira adequada, ou seja, que os limites de classe possibilitem a avaliação adequada dos dados. No exemplo anterior, se a massa desejada do comprimido variar de 1,101 g a 1,150 g, esses valores devem, preferencialmente, estar alocados dentro de uma mesma classe. 27 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE Observação O valor numérico que separa duas classes é chamado de limite de classe. O histograma (figura 3) é, portanto, uma ferramenta útil para compreendermos a distribuição das manifestações de vários problemas e erros. 0 1 3 5 7 9 112 4 6 8 10 Intervalos Fr eq uê nc ia 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 Figura 3 – Histograma. No eixo x, podemos observar que os dados foram divididos em 11 intervalos de classes. Vemos que, no eixo y, é apresentada a frequência relacionada com cada ocorrência Disponível em: https://bit.ly/3MsiG6I. Acesso em: 8 jun. 2022. Vamos ver um exemplo do diagrama de barras. Suponha, de modo fictício, que, em uma empresa, os processos A a Q apresentem as quantidades de falhas indicadas na tabela 1. Tabela 1 – Quantidades de falhas nos processos A a Q Nome do processo Quantidade de falhas Processo A 3 Processo B 2 Processo C 3 Processo D 2 Processo E 1 Processo F 5 Processo G 1 Processo H 2 Processo I 3 Processo J 2 Processo K 0 Processo L 1 28 Unidade I Nome do processo Quantidade de falhas Processo M 2 Processo N 2 Processo O 3 Processo P 2 Processo Q 2 A tabela 1 é um exemplo do que chamamos de tabela de dados brutos, em que tabulamos o conjunto das informações obtidas a respeito de certa característica, no caso, a quantidade de falhas. Podemos organizar as informações contidas na tabela de dados brutos de modo a obtermos uma tabela de frequência absoluta, como a mostrada a seguir: Tabela 2 – Quantidades de falhas e quantidades de processos Quantidade de falhas Quantidade de processos Nome do processo 0 1 Processo K 1 3 Processos E, G e L 2 8 Processos B, D, H, J, M, N, P e Q 3 4 Processos A, C, I e O 4 0 - 5 1 Processo F Total 1+3+8+4+0+1=17 Vamos chamar de frequência absoluta de cada medida a quantidade de processos que apresentou determinado número de falhas. Assim, elaboramos a tabela 3. Tabela 3 – Frequências absolutas das quantidades de falhas Quantidade de falhas Frequência absoluta 0 1 1 3 2 8 3 4 4 0 5 1 Total 1+3+8+4+0+1=17 29 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE As frequências absolutas da tabela 3 podem ser representadas, por exemplo, em um gráfico de barras, conforme ilustrado na figura 4. 0 1 2 Quantidade de falhas Fr eq uê nc ia a bs ol ut a 3 4 5 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Figura 4 – Gráfico de barras: frequências absolutas das quantidades de falhas 2.3 Gráfico de controle de qualidade Um gráfico de controle de qualidade, também conhecido como cartão de controle de qualidade ou gráfico de Shewhart, permite a representação gráfica de parâmetros estatísticos para uma série de amostras. Nesses gráficos, são estabelecidos limites de advertência superior e inferior, e uma linha central, que indica a média aceitável em torno da qual os resultados devem estar distribuídos. Os gráficos de controle de qualidade indicam se os valores individuais de um processo repetitivo, realizado dia após dia, estão dentro dos limites toleráveis. • Se a análise do gráfico mostrar que o processo está sob controle, ou seja, que ele é estável, nenhuma correção ou mudança no processo será necessária. Além disso, os dados desse processo poderão ser usados para prever o desempenho futuro do processo. • Se, por outro lado, os limites especificados forem excedidos, o processo deverásofrer intervenção. Uma variação dos gráficos de controle de qualidade, denominada gráfico de Levey-Jennings, é usada na validação dos resultados obtidos em um laboratório de análises clínicas. Vamos aprender mais sobre eles. No laboratório de análises clínicas, ao se iniciar uma corrida analítica, é necessário fazer a leitura, no equipamento, de soluções-controle cuja concentração de analito é conhecida. Os resultados obtidos com a leitura das soluções-controle são plotados no gráfico de Levey-Jennings (figura 5). Nesse tipo de gráfico de controle de qualidade: 30 Unidade I • no eixo vertical (eixo y), representamos os valores dos resultados do ensaio analítico; • no eixo horizontal (eixo x), representamos os dias em que os ensaios foram realizados. Como cada ponto indica um resultado, é possível verificar se há oscilação entre eles, o que pode estar relacionado a falhas no equipamento e/ou nos reagentes. 230 225 1 3 5 7 9 11 13 Dias Re su lta do d o co nt ro le 15 17 19 21 23 25 27 29 235 240 245 250 255 260 265 270 275 X + 3s X + 2s X + 1s X - 3s X - 1s X - 2s Figura 5 – Gráfico de Levey-Jennings, um tipo de gráfico de controle de qualidade usado no âmbito das análises clínicas. No exemplo, a média dos valores corresponde à linha central, indicada em verde. Os desvios-padrão estão indicados pelas demais linhas, até o limite de 3 desvios para mais ou para menos. Ainda em relação ao gráfico, cada leitura da solução padrão corresponde a um ponto Adaptado de: https://bit.ly/3Q6a3C4. Acesso em: 14 jun. 2022. Saiba mais Se você deseja atuar na área das análises clínicas, sugerimos a leitura a seguir. OLIVEIRA, C. A.; MENDES, M. E. Gestão da fase analítica do laboratório: como assegurar a qualidade na prática. Rio de Janeiro: ControlLab, 2010. v. 1. 2.4 Diagrama de Pareto O Princípio de Pareto afirma que grande parte dos problemas (em torno de 80% das observações) muitas vezes se deve a um pequeno número de causas (em torno de 20% do total). O diagrama de Pareto e a análise de Pareto são usados para classificar os dados de acordo com sua importância, a fim de verificar quais são as medidas prioritárias a tomar para a resolução dos problemas. Afinal, faz sentido resolver primeiro o problema maior, mais importante ou mais caro. 31 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE O diagrama de Pareto é relativamente fácil de entender e de executar. Ele é constituído de colunas e de uma curva. • Cada coluna corresponde a um tipo de erro. As colunas são apresentadas em ordem decrescente de número de ocorrências. • O valor acumulado de ocorrências é representado por uma linha. Como as causas são organizadas em ordem decrescente de importância, a função cumulativa é côncava. • O eixo vertical esquerdo geralmente representa a frequência das manifestações. • O eixo vertical direito é a porcentagem total do número total de manifestações. Observe o diagrama de Pareto a seguir (figura 6), que lista os principais defeitos encontrados na pintura das embalagens plásticas de determinado medicamento. Os três principais defeitos que, juntos, respondem por cerca de 80% das ocorrências, são: revestimento inadequado; trincas; e arranhões. Solucionar tais defeitos, portanto, deve ser encarado como prioridade. 140 120 100 80 60 40 20 0Defeito Fr eq uê nc ia Percentual 0 20 40 60 80 100 Re ve sti me nt o ina de qu ad o Tri nc a Ar ran hã o Mu ito gr os sa ou m uit o fi na Nã o a ca ba da Ou tro s Frequência 55 41 12 11 5 3 Perventual 43,3 32,3 9,4 8,7 3,9 2,4 Acum % 43,3 75,6 85,0 93,7 97,6 100,0 Figura 6 – Diagrama de Pareto Disponível em: https://bit.ly/3MPV0t9. Acesso em: 8 jun. 2022. 2.5 Gráfico de dispersão O gráfico de dispersão, também conhecido como diagrama de correlação, mostra se existe relação entre duas variáveis. Ele é frequentemente utilizado quando se deseja calcular o coeficiente de correlação e o modelo de regressão. 32 Unidade I Observação O coeficiente de correlação de Pearson (R) é um parâmetro que expressa o grau de relação entre duas variáveis quantitativas. O coeficiente de correlação R varia de -1 a 1, sendo que: • se R>0, quando uma variável aumenta, a outra variável aumenta; • se R<0, quando uma variável aumenta, a outra variável diminui; • se R=0, as variáveis não apresentam associação linear; • se R=1, as variáveis apresentam associação linear positiva tão forte que os pontos do gráfico de dispersão são pontos de uma reta crescente; • se R=-1, as variáveis apresentam associação linear negativa tão forte que os pontos do gráfico de dispersão são pontos de uma reta decrescente. Na figura 7, podemos ver exemplos de gráficos de dispersão para diferentes valores de R. R = 0,08 R = -0,10 R = 0,48 R = -0,55 R = 0,91 R = -0,90 R = 1,00 R = -1,00 Figura 7 – Valores de duas variáveis, x e y 33 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE Se elevarmos R ao quadrado, obteremos R2, que é o coeficiente de determinação. Os gráficos de dispersão são usados quando há uma variável sob o controle do experimentador. • Se há um parâmetro que aumenta e/ou diminui sistematicamente, ele é chamado de parâmetro de controle, ou variável independente, e, em geral, é plotado ao longo do eixo x. • No eixo y, indica-se a variável ajustável, ou dependente. Seus valores mudam de acordo com os valores atribuídos à variável independente. Com a ajuda do gráfico de dispersão, é fácil fazer uma declaração sobre a força e a direção de determinada interação. Para ilustrar o que dissemos, imagine a seguinte situação: uma indústria de cosméticos quer diminuir o tempo necessário para confeccionar determinado produto. Para isso, são realizados ensaios para testar o efeito da adição de um catalisador sobre o tempo total de uma das reações químicas envolvidas no processo produtivo. Os resultados são ilustrados a seguir, na figura 8. 20151050 40 60 80 100 120 Te m po to ta l d e re aç ão (m in ) Concentração do catalisador (g/L) Figura 8 – Gráfico de dispersão Adaptado de: https://bit.ly/3H4hju7. Acesso em: 8 jun. 2022. Podemos notar que, quanto maior for a concentração do catalisador, menor será o tempo necessário para que a reação aconteça. Portanto, existe correlação entre essas variáveis, e a utilização do catalisador é uma estratégia que deve ser considerada para diminuir o tempo total da produção. 34 Unidade I 2.6 Fluxograma O fluxograma, ou diagrama de fluxo, é uma ferramenta frequentemente utilizada para ilustrar processos e procedimentos. O principal objetivo do fluxograma é obter uma primeira impressão visual do que está acontecendo. Ele permite que vejamos se, eventualmente, há etapas de processo supérfluas ou há etapas ausentes que podem ser adaptadas posteriormente. Vejamos o exemplo de fluxograma mostrado na figura 9. Cana CaldeirasMoagem Tratamento químico Filtração Evaporação Fermentação Cozimento Destilação Centrifugação Retificação DesidrataçãoSecagem Bagaço Caldo Torta de filtro Vinhaça Melaço Açúcar Etanol (anidro) Etanol (hidratado) Figura 9 – Fluxograma da produção de etanol e açúcar Disponível em: https://bit.ly/3Q72ATc. Acesso em: 8 jun. 2022. Trata-se de uma importante ferramenta para garantir que os processos estão sendo realizados na ordem correta. É de fácil interpretação e pode ser usada por toda a equipe. 2.7 Diagrama de causa e efeito O diagrama de causa e efeito (figura 10), também conhecido como diagrama de Ishikawa ou diagrama em espinha de peixe, foi desenvolvido pelo pai do controle de qualidade japonês, professor Kaoru Ishikawa. 35 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE Trata-se de uma ferramenta para a resolução de problemas que retrata suas causas ou influências primárias. O diagrama de Ishikawa divide as causas do problema em seis grupos principais, que são apresentados a seguir. • Pessoas: pessoal envolvido no processo; partes interessadas etc. • Métodos: processospara completar tarefas e requisitos específicos para realizá-los, como estratégias, procedimentos, regras, regulamentos e leis. • Máquinas: quaisquer equipamentos, computadores e ferramentas necessários para realizar o trabalho. • Materiais: matérias-primas, peças, canetas, papel e outros itens usados para fabricar o produto final. • Indicadores: dados obtidos do processo que são usados para avaliar sua qualidade. • Ambiente: condições, como local, tempo, temperatura e cultura, em que o processo ocorre. Esses grupos podem ser subdivididos, a fim de identificarmos mais facilmente a relação entre as causas individuais. Dessa forma, diferentes aspectos são levados em consideração. Devido à sistemática do diagrama de Ishikawa, várias causas para o surgimento do problema tornam-se visíveis. Família de causas A Família de causas D Família de causas B Família de causas E Família de causas C Família de causas F Causa 1 Subcausa 1 Problema Figura 10 – Diagrama de causa e efeito Disponível em: https://bit.ly/3QovfTZ. Acesso em: 14 jun. 2022. 36 Unidade I Saiba mais Os livros a seguir propiciam o aprofundamento dos conteúdos sobre controle da qualidade abordados neste tópico. ISHIKAWA, K. Guide to quality control. Tokyo: Asian Productivity Organization, 1972. ISHIKAWA, K. Introduction to quality control. London: Chapman & Hall, 1989. 3 OUTRAS FERRAMENTAS USADAS NA GESTÃO DA QUALIDADE As ferramentas de gestão que serão apresentadas a seguir têm como principais objetivos aprimorar processos, otimizar projetos, melhorar resultados e resolver problemas e desvios. São elas: a matriz Swot, o ciclo PDCA, o Masp, o método 5W2H, o programa 5S e o método Seis Sigma. Vamos conhecê-las? 3.1 Matriz Swot A matriz strengths, weaknesses, opportunities and threats (Swot) lista as forças, as fraquezas, as oportunidades e as ameaças de um negócio. Trata-se de uma ferramenta muito utilizada durante a fase de diagnóstico estratégico. Ela tem a vantagem de sintetizar os pontos fortes e os pontos fracos de uma empresa no que diz respeito às oportunidades e às ameaças geradas pelo ambiente de trabalho. Graças a essa abordagem, evidenciam-se as estratégias relevantes para explorar um novo potencial ou melhorar uma prática já estabelecida. Ao adotá-la, a organização aguça sua capacidade de analisar e de avaliar seu negócio, aprende a autoquestionar-se e a saber como encontrar respostas relevantes para os problemas. A figura 11 ilustra a matriz Swot. Matriz SWOT Ferramenta Oportunidades Vantagens externas Ameaças Desvantagens externas Forças Vantagens internas Qual oportunidade pode potencializar uma força? Por quê? Qual ameaça pode limitar uma força? Como evitar que isso ocorra? Fraquezas Desvantagens internas Qual oportunidade pode limitar uma fraqueza? Por quê? Qual ameaça pode potencializar uma fraqueza? Como evitar que isso ocorra? Figura 11 – Matriz Swot Disponível em: https://bit.ly/3NZriD5. Acesso em: 8 jun. 2022. 37 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE 3.2 Ciclo PDCA O ciclo plan, do, check, act (PDCA) também é conhecido como ciclo de Deming ou ciclo de Shewhart. Trata-se de uma abordagem adotada durante o processo de melhoria contínua do desenvolvimento de produtos e serviços, bem como para analisar as causas de um erro. O círculo PDCA (figura 12) consiste em quatro fases repetitivas, que são resumidas a seguir: • Plan (analisar/planejar/formular as metas): corresponde à análise da situação atual e à contraposição com a situação desejada. O potencial de melhorias é identificado e as medidas pertinentes são desenvolvidas. • Do (fazer/executar): as medidas que foram desenvolvidas na etapa anterior são implementadas ou testadas nas respectivas áreas. • Check (checar/comparar): a eficácia das medidas implementadas é verificada e avaliada em relação aos objetivos estabelecidos. • Act (agir/reagir/melhorar): as medidas bem-sucedidas são definidas como padrão. Se as melhorias não tiverem sido comprovadas ou ainda não forem suficientes, as medidas implementadas constituem o ponto de partida para repetir o ciclo. Conforme dissemos, o ciclo PDCA também é conhecido como ciclo de Shewhart-Deming, que são os seus criadores. Ele é aplicado a vários campos de atividade, pois permite gerenciá-las de forma sistemática. Segundo Shewhart, principal criador do ciclo, a gestão da qualidade é dividida em três etapas principais, indicadas a seguir. • Desenvolvimento das especificações exigidas (tarefas, condições técnicas e níveis de tolerância). • Fabricação de produtos que atendam às especificações. • Inspeção (controle) dos produtos acabados para avaliar se eles atendem às especificações. Shewhart enfatizou que é necessário usar essa sequência de estágios em um mundo onde todos os processos mudam. Para realizá-los, são necessárias as quatro etapas do ciclo PDCA indicadas anteriormente. Um exemplo é a implantação da linha de produção de um medicamento em uma indústria de grande porte. Vejamos. • Durante a primeira etapa (plan), elabora-se um projeto para a produção do medicamento na planta da fábrica. 38 Unidade I • Durante a segunda etapa (do), são realizados os testes na linha de produção e nos laboratórios. • Durante a terceira etapa (check), o produto é disponibilizado no mercado. • Durante a quarta etapa (act), são aplicados testes para descobrir o que os consumidores pensam do medicamento ou por que os consumidores não estão usando o produto. Em seguida, a etapa 4 leva a uma nova etapa 1, que consiste em redesenhar o produto, e o ciclo começa novamente. Shewhart acreditava que é necessário melhorar continuamente a qualidade do produto. Para isso, também propõe um método utilizado não só para o controle de qualidade, mas também para a organização dos processos de produção. Essa estrutura horizontal para organizar e gerenciar o processo de produção é chamada de sistema Shewhart. Ao contrário do taylorismo, cuja utilização costuma gerar conflitos pelo fato de as quatro funções serem desempenhadas por diferentes grupos de pessoas, o ciclo PDCA reúne todas as fases do ciclo de produção em um único processo, e elas se tornam elementos do trabalho em equipe. Saiba mais O artigo a seguir aborda o taylorismo. SILVA, M. Taylorismo: quais as principais características desse modelo produtivo? Politize!, 6 ago. 2020. Disponível em: https://bit.ly/3tjXKYL. Acesso em: 8 jun. 2022. Existe outra versão do ciclo, denominada standardize, do, check, act (SDCA). A única diferença é o primeiro estágio: em vez da etapa planejar (plan), temos a etapa padronizar (standardize). Essa variação é aplicável a situações desconhecidas, instáveis e não padronizadas. Em termos mais simples: para melhorar algo, é necessário entender o que estamos melhorando. Portanto, em um primeiro momento, deve-se buscar um padrão da situação enfrentada, o que permite caracterizá-la. Saiba mais Leia sobre o ciclo SDCA no site a seguir. NEIL PATEL. Método SDCA: entenda o que é, as etapas do processo e como usar. Disponível em: https://bit.ly/3O00bHT. Acesso em: 8 jun. 2022. 39 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE Check Do PlanAct Figura 12 – Ciclo PDCA Disponível em: https://bit.ly/393b2C9. Acesso em: 8 jun. 2022. 3.3 Masp O Método de Análise e Solução de Problemas (Masp) utiliza o ciclo PDCA para a solução de irregularidades. Geralmente, os problemas de gerenciamento envolvem dois processos: • Tomar decisões sobre o que fazer; • Implementar as decisões. Para que isso seja possível, é necessário entender mais sobre o problema, o que pode ser feito seguindo-se algumas etapas, descritas a seguir. 3.3.1 Etapa 1: identificação e descrição do problema • Lugar: onde foram observados os desvios? • Tempo: quando ocorreram os problemas? • Grau de desvio: quão severo o problema é? • Essência: qual o estado do sistema (equipamento, equipe etc.) quando da detecção da falha? 40 Unidade I 3.3.2 Etapa 2: obtenção deinformações importantes • Para cada uma das quatro dimensões descritas (lugar, tempo, grau de desvio, essência), qual é a diferença observada comparando-se com a situação em que a falha não foi observada? • Essa diferença levou a uma mudança nas condições essenciais para que a produção ocorra dentro dos padrões estabelecidos? • Como essa diferença levou ao problema observado? 3.3.3 Etapa 3: determinação da causa mais provável • Após listar todas as causas possíveis, avalia-se a probabilidade de elas desencadearem o problema com a seguinte pergunta: se essa é a causa real do problema, como ela explica o desvio observado? • A causa mais provável do problema é determinada. 3.3.4 Aplicação do ciclo PDCA Após a realização das etapas mencionadas anteriormente, o ciclo do PDCA é aplicado, conforme descrito a seguir. • Etapa 1: identificação e descrição do problema. • Etapa 2: obtenção de informações importantes sobre o problema. • Etapa 3: determinação da causa mais provável. • Etapa 4: desenvolvimento de soluções, aplicando-se o ciclo PDCA. • Etapa 5: implementação da solução. • Etapa 6: avaliação dos resultados da solução. 3.4 Método 5W2H O método 5W2H é uma ferramenta usada para identificar as causas de um problema. Observação No método 5W2H, os 5 “w” referem-se a what (o quê), where (onde), when (quando), who (quem) e why (por quê). Os 2 “h” referem-se a how (como) e how much (quanto). 41 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE O método é baseado na aplicação das perguntas identificadas pelos 5 “w” e pelos 2 “h”. Trata-se de um modelo de análise estruturado com um plano prático que apresenta fases predeterminadas. Vamos, agora, detalhar o que se espera de cada uma das perguntas que constituem o método. • A pergunta “What?” refere-se à descrição do objeto. Quais produtos a empresa produz? Por que produzi-los? É possível produzir outra coisa? Se sim, o que deve ser produzido? Por exemplo: se o produto atualmente confeccionado não gera lucro, existe a possibilidade de produzir outra coisa? • A pergunta “Where?” refere-se ao local da produção. Onde a produção é feita? Por que ela é feita nesse local? É um local adequado? É possível mudar de local? • A pergunta “When?” refere-se ao horário e ao programa de produção. Quando o processo foi concluído? Por que ele foi concluído naquele momento? Pode-se realizar tal processo em outras ocasiões? É possível adiantar as etapas pós-processo? Quando isso deve ser feito? • A pergunta “Who?” refere-se ao pessoal envolvido na produção. Quem está fazendo isso? Por que essa pessoa ou essa equipe deve fazer isso? Se a pessoa for irresponsável, mas tiver um ótimo temperamento, ela pode influenciar outros trabalhadores? Às vezes, se você mudar uma pessoa, toda a produção é retomada. • A pergunta “Why?” refere-se às justificativas para as decisões tomadas na produção. Por que usar determinado parâmetro técnico? Por que não pode haver mudanças? Por que usar máquinas em vez de mão de obra? • A pergunta “How?” refere-se aos métodos utilizados. Como o produto é feito? Por que usar esse método para fazê-lo? Existe alguma outra maneira de fazê-lo? O que devo fazer? Às vezes, quando o método é alterado, soluciona-se o problema. • A pergunta “How much?” refere-se aos custos. Alterações no processo produtivo são viáveis do ponto de vista econômico? A solução do problema envolve investimento? De quanto? O método 5W2H permite que as melhores decisões sejam tomadas para resolver o problema. Essas decisões incluem, por exemplo, cancelar determinado processo, combinar processos diferentes, reorganizar o processo e simplificar processos complexos. Uma variação do método 5W2H é o método 5W1H, que exclui a pergunta “How much?”. Ele é utilizado quando a estimativa de custos é fixa. Veja, a seguir, um exemplo de aplicação do método 5W1H. 42 Unidade I Quadro 1 – Método 5W1H Indicadores Input/ output/ processo O quê? Quando? Por quê? Onde? Quem? Como? Tempo Tempo de resposta de cotação feita pela engenharia de vendas (a) Mensal Verificar a agilidade das respostas ao cliente Vendas Gerente de vendas Planilha Excel Processo Tempo gasto por áreas envolvidas no processo (a) Mensal Verificar a velocidade do fluxo de informações no departamento Departamento comercial Gerente comercial Sistema de registro de elaboração de proposta Processo Tempo gasto por cotação feita pela engenharia de aplicações (a) Semestral Avaliar a agilidade da engenharia de aplicações Engenharia de aplicações Gerente de engenharia Planilha Excel Output Prazo de entrega de fornecedores (c) Semestral Avaliar o desempenho dos fornecedores Logística Analista de logística Planilha Excel Processo Custo Faturamento (d) Mensal Avaliar o desempenho financeiro Departamento comercial Gerente comercial Relatório financeiro Output Margem de contribuição (d) Mensal Avaliar o desempenho financeiro Departamento comercial Gerente comercial Relatório financeiro Output Faturamento proveniente de negócios com novos clientes (d) Semestral Avaliar o crescimento da empresa Vendas Gerente de vendas Sistema ERP Output Giro de estoque (d) Semestral Avaliar o planejamento de compras realizado Logística Analista de logística Sistema ERP Processo Adaptado de: https://bit.ly/3Q8Wba4. Acesso em: 8 jun. 2022. 3.5 Programa 5S O programa 5S é uma forma de organizar e gerir determinado espaço ou produto com base em cinco princípios: • utilização (seiri); • organização (seiton); • limpeza (seiso); • saúde (seiketsu); • disciplina (shitsuke). 43 PLANEJAMENTO E GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE Todos esses princípios, ou sensos, são aplicados de forma cíclica. Com o programa 5S (figura 13), cada trabalhador pode rapidamente se tornar mais eficiente em seu próprio local de trabalho. Vamos, agora, entender os cinco princípios que regem o programa. 3.5.1 Seiri (utilização): identifique tudo o que não é necessário O princípio da utilização consiste em deixar na área de trabalho somente o que é extremamente necessário. A identificação dos materiais, equipamentos e ferramentas necessários para o ofício faz parte dessa prática. Diga adeus a todos os objetos em seu ambiente que não sejam diretamente relacionados ao seu trabalho. Tente olhar para o seu fluxo de trabalho como um estranho e pergunte-se: “Eu realmente preciso dessa ferramenta?” Identifique o que parece ocioso à primeira vista, mas que compensa no longo prazo. A aplicação desse princípio resulta em muito mais espaço para as coisas realmente necessárias. 3.5.2 Seiton (organização): disponha os materiais de trabalho ergonomicamente e rotule-os A organização, ou ordenação, consiste na ideia de liberar o espaço e descartar itens desnecessários. O principal objetivo é estabelecer uma nova ordem básica no local de trabalho. Em um cenário padrão, todos os itens do local de trabalho são divididos em vários grupos, a depender da frequência de uso. Esses itens são classificados em: • desnecessários; • raramente necessários; • frequentemente necessários. Com base na análise realizada, é tomada a decisão de armazenar ou não o objeto no local de trabalho. Muita atenção é dada à visualização: as áreas de armazenamento devem ser sinalizadas e destacadas com cor, luz ou símbolos. Na mesma fase, é criado um “armazém temporário”, no qual são recolhidos os artigos que aguardam decisão sobre a sua posterior utilização ou eliminação. Para pôr em prática esse princípio, posicione os dispositivos e ferramentas de acordo com a frequência de uso ou a ordem em que são usados. Além disso, você deve etiquetar de maneira adequada todos os equipamentos de trabalho e locais de armazenamento, para que você sempre saiba exatamente a que lugar algo pertence. 44 Unidade I Além dessa sistematização, é útil usar recursos visuais (ilustrações, fotos etc.) para registrar qual é o posicionamento ideal dos materiais de trabalho. 3.5.3 Seiso (limpeza): limpe completamente
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