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DIREITO INTERNACIONAL - ATOS INTERNACIONAIS

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DIREITO INTERNACIONAL - ATOS INTERNACIONAIS
Os atos internacionais desempenham um papel crucial no direito internacional, particularmente no direito internacional público. Eles são a principal fonte do direito internacional e desempenham um papel fundamental na regulação das relações entre Estados e organizações internacionais. Até a criação da Organização das Nações Unidas (ONU) em 1947, os costumes internacionais desempenharam um papel mais proeminente, mas desde então, houve uma tendência crescente para codificar essas regras consuetudinárias por meio de tratados e convenções.
As convenções internacionais desempenham um papel central nesse contexto. Um exemplo notável é a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969, que é considerada a "norma das normas" no direito internacional. Ela estabelece as regras para a elaboração, interpretação e aplicação de tratados e convenções. Essa convenção é fundamental e é frequentemente citada em concursos e discussões acadêmicas.
A elaboração desses atos internacionais envolve a representação dos Estados no âmbito internacional, com o objetivo de formalizar acordos escritos que regulamentem suas relações mútuas ou com organizações internacionais. Esses acordos podem ser denominados de várias maneiras, como convenções, tratados, protocolos, ajustes, cartas, entre outros. Embora esses termos possam variar, eles geralmente se enquadram na categoria de tratados ou convenções, desde que cumpram os requisitos do direito internacional.
No que diz respeito à incorporação desses atos internacionais no sistema jurídico interno de um Estado, geralmente existem dois processos: um no âmbito internacional e outro no âmbito interno. A ratificação e a aprovação parlamentar são frequentemente necessárias no nível nacional para garantir que o ato internacional seja vinculativo no sistema jurídico interno do Estado.
É importante observar que, embora a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969 seja amplamente aceita como uma autoridade no direito internacional, algumas questões específicas, como os acordos internacionais que envolvem organismos internacionais, estão sujeitas a convenções posteriores, como a Convenção de Viena de 1986. No entanto, essa convenção de 1986 ainda não está em vigor internacionalmente, mas os costumes internacionais e práticas recentes já reconhecem a capacidade dos organismos internacionais de participar na criação de tratados.
Em relação à vigência de um ato internacional, o princípio "tempus regit actum" estabelece que a versão mais recente de uma convenção ou tratado se aplica, substituindo versões anteriores. A vigência desses atos pode ser adiada de acordo com as disposições das convenções e tratados específicos, que estabelecem o número mínimo de ratificações necessárias para que um ato entre em vigor.
Em resumo, os atos internacionais desempenham um papel essencial no direito internacional, regulando as relações entre Estados e organizações internacionais. Eles são formalizados por meio de convenções e tratados e requerem um processo de ratificação e incorporação no sistema jurídico interno de cada Estado para serem vinculativos. A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969 é uma referência importante nesse contexto, e o princípio "tempus regit actum" rege a vigência desses atos internacionais.
Classificações dos Tratados
Os tratados internacionais podem ser classificados de diversas maneiras, levando em consideração diferentes critérios:
1. Número de Partes: Os tratados podem ter apenas duas partes, configurando um acordo bilateral, ou ser mais abrangentes, envolvendo múltiplos Estados, caracterizando-se como tratados multilaterais. Por exemplo, a Convenção Europeia de Direitos Humanos é um tratado multilateral que conta com a participação de 47 Estados.
2. Efeitos: Os efeitos de um tratado podem ser restritos às partes que o ratificaram ou podem alcançar terceiros que não fazem parte do acordo. A regra geral é que apenas os Estados ou partes envolvidas no tratado estejam sujeitos a ele. No entanto, em algumas situações, um tratado pode ter efeitos sobre terceiros.
3. Adesão: Os tratados podem ser abertos a qualquer Estado ou organização internacional que deseje aderir a eles, ou podem ser acordos fechados que restringem a participação apenas a Estados ou organizações específicos. Por exemplo, a Carta das Nações Unidas está aberta para adesão de qualquer Estado interessado em promover a paz e a segurança internacional, enquanto o Mercosul é um tratado regional com adesão restrita a países da América Latina que eram membros da ALADI (Associação Latino-Americana de Integração).
4. Procedimento de Conclusão: Existem dois procedimentos principais para a conclusão de tratados internacionais: solene e simplificado. O procedimento solene envolve cinco etapas: negociação, assinatura pelos chefes de Estado ou governo, submissão a referendo do Congresso Nacional (em casos de compromissos significativos), ratificação perante o órgão depositário e promulgação do decreto presidencial para vigência no sistema jurídico interno. O procedimento simplificado, conhecido como "executive agreement" ou "fast track", elimina as etapas de referendo e ratificação, sendo usado para compromissos que não afetam o patrimônio nacional ou não têm implicações financeiras significativas.
No Brasil, a Constituição Federal, em seu Artigo 49, estabelece a competência do Congresso Nacional para resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional. Essa resolução é necessária para a ratificação de tratados que afetam financeiramente o Estado brasileiro.
Essas classificações ajudam a compreender a diversidade de tratados internacionais e os processos envolvidos na sua negociação e ratificação. Cada tratado é único em seu contexto, propósito e impacto, e essas distinções auxiliam na análise e interpretação de sua aplicação no direito internacional.
Processo de Elaboração e Incorporação ao Direito Interno
O processo de negociação e incorporação de tratados internacionais ao direito interno é um procedimento complexo que envolve diversas etapas e atores. Vamos analisar essas etapas de forma organizada:
1. Negociação Inicial:
· O processo começa com a participação de representantes de cada Estado em fóruns de discussão. Esses fóruns permitem a aproximação e o debate de temas de interesse comum.
· As negociações iniciais buscam criar um texto que satisfaça todas as partes envolvidas.
2. Elaboração do Texto:
· Ao final das rodadas de negociação, o texto é elaborado. Os representantes dos Estados responsáveis por negociar o tratado entabulam de comum acordo os termos e as cláusulas do instrumento.
3. Aprovação e Votação:
· O texto resultante das negociações é submetido a todas as partes envolvidas para votação.
· O próprio tratado pode determinar o quórum necessário para a aprovação do texto. Em sua ausência, aplica-se a Convenção de Viena sobre Direitos dos Tratados de 1969, que estabelece a possibilidade de aprovação por maioria de 2/3 ou unanimidade.
· Blocos regionais multilaterais frequentemente utilizam a maioria para a aprovação. Por exemplo, a União Europeia utiliza esse método.
4. Representação Capaz:
· Para representar o Estado em negociações internacionais, é necessária a capacidade de representação. No Brasil, o Presidente da República e o Ministro das Relações Exteriores têm a capacidade exclusiva de representar o país em acordos internacionais, sem limitação quanto a assuntos ou temas específicos.
· Outros representantes podem ser designados por atos específicos ou indicados pelo Presidente da República ou Ministro das Relações Exteriores para representar o Brasil perante organizações internacionais ou Estados específicos.
5. Respeito ao Jus Cogens:
· As negociações devem respeitar o jus cogens, que são normas inderrogáveis hierarquicamente superiores. Qualquer tratado que viole o jus cogens é considerado um objeto ilícito e nulo no direito internacional.· O objeto das negociações deve ser lícito, possível e disponível para negociação pelas partes.
6. Reservas:
· Alguns tratados permitem que os Estados façam reservas, declarando que não se comprometem com determinadas cláusulas do tratado.
· As reservas devem estar de acordo com o que o próprio tratado permite.
7. Assinatura:
· A assinatura é a segunda etapa do procedimento. Uma vez que o tratado tenha sido aprovado, os agentes responsáveis por negociar o tratado o assinam.
· A assinatura é geralmente realizada pelo Presidente da República e representa a chancela do texto definitivo.
· A partir da assinatura, as partes se comprometem a não realizar ações que possam frustrar o propósito do tratado.
8. Obrigações de Não Fazer:
· A partir da assinatura, há uma obrigação de não fazer. Os Estados signatários se comprometem a não agir contrariamente ao tratado no plano interno.
9. Entrada em Vigor:
· O tratado não entra em vigor imediatamente após a assinatura. Para que o tratado se torne eficaz no âmbito interno, é necessário cumprir a etapa de ratificação e promulgação, que serão exploradas em detalhes na próxima etapa do processo.
Portanto, o processo de incorporação de tratados internacionais ao direito interno é altamente regulado e envolve várias etapas para garantir que os compromissos internacionais sejam consistentes com os interesses e princípios do Estado. Respeitar o jus cogens e seguir os procedimentos adequados é essencial para a validade e eficácia desses tratados no direito internacional.
Efeitos dos tratados: a) Vinculativo No que diz respeito aos efeitos dos tratados, o primeiro a ser considerado é o efeito vinculativo. Conforme estabelecido no Artigo 18, este efeito se refere à obrigação de cumprir o tratado, mesmo que este ainda não tenha sido internalizado no sistema jurídico interno do Brasil. Essa obrigação de cumprir o tratado é assumida desde a segunda etapa do processo de incorporação.
b) Ex nunc O segundo efeito, que não está diretamente relacionado à assinatura do tratado, mas que merece destaque para esclarecermos os diferentes aspectos dos tratados, é a questão da vigência "ex nunc". Isso significa que os tratados não têm efeito retroativo como regra geral. Ou seja, suas disposições só se aplicam a partir da ratificação do Estado, não retroagindo a situações anteriores. A exceção a essa regra é a possibilidade de retroatividade, que pode ocorrer mediante uma declaração separada de retroação de um tratado específico.
Para ilustrar essa exceção, podemos mencionar o exemplo do Tribunal Penal Internacional, que foi criado em 1998, mas só entrou em funcionamento em 2002. Alguns estados ratificaram o tratado antes mesmo do início de seu funcionamento e se submeteram à jurisdição do tribunal desde sua criação, enquanto outros estados optaram por não ratificar sua submissão ao tribunal.
O Estatuto de Roma, que estabelece o funcionamento do Tribunal Penal Internacional, prevê a possibilidade de um estado, mesmo que não tenha inicialmente aderido, decidir no futuro aderir retroativamente ao tratado, abrangendo atos ocorridos desde o início do funcionamento do tribunal. Isso representa uma exceção à regra geral de não retroatividade dos tratados.
Outro exemplo relacionado ao Brasil é o Decreto 4463 de 2003, por meio do qual o país se submeteu à jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos. O Brasil expressamente limitou essa submissão aos fatos ocorridos após 10/12/1998. No entanto, o país foi condenado pela Corte Interamericana por situações que ocorreram antes dessa data, como o caso de Carlos Gomes Lund vs. Brasil, que remonta à ditadura militar na década de 1970. Essa condenação ocorreu porque, internamente, a Lei da Anistia tornou impossível a reparação dos atos cometidos durante esse período, conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal na ADPF 153. Assim, embora no âmbito interno brasileiro a lei de anistia tenha sido considerada válida, a Corte Interamericana julgou com base em uma visão diferente, permitindo condenações por fatos anteriores a 10 de dezembro de 1998.
Essas são exceções à regra da não retroatividade dos tratados, como mencionadas pelo ministro Francisco Rezek em sua obra. É importante compreender que a regra geral é que os tratados só se apliquem a partir da ratificação, conforme estabelecido no Artigo 28 da Convenção de Viena sobre os Direitos dos Tratados.
4.1.3 Referendo A terceira etapa do processo de tratados envolve o referendo, ou seja, a submissão do tratado ao Congresso Nacional para que este o aprove ou rejeite. Existem diferentes processos legislativos possíveis para submeter um tratado ao Congresso Nacional. A regra geral é o processo com paridade de projeto de lei, conforme estabelecido no Artigo 65, que requer um quórum simples e um único turno de votação em cada casa do Congresso Nacional, com maioria simples para aprovação em cada casa.
Se o tratado for aprovado nesse processo, o Congresso emite um decreto legislativo autorizativo, permitindo ao Presidente da República prosseguir para a quarta etapa, que é a ratificação do tratado.
No entanto, quando se trata de tratados de direitos humanos, há uma distinção importante. Após a Emenda 45, foi introduzido o Parágrafo Terceiro no Artigo 5º da Constituição Federal, permitindo que tratados de direitos humanos possam seguir um processo legislativo equivalente ao das emendas constitucionais. Nesse caso, o tratado deve ser aprovado em dois turnos de votação em cada casa do Congresso Nacional, com 3/5 dos votos dos respectivos membros, e tem o mesmo status de uma emenda constitucional.
É importante observar que, em relação aos tratados de direitos humanos, o Congresso Nacional não pode fazer emendas ao texto enviado pelo Presidente da República. O Congresso pode apenas aprovar ou rejeitar o tratado na íntegra, sem realizar alterações unilaterais no texto, uma vez que as negociações já foram concluídas no plano internacional e qualquer alteração afetaria o acordo como um todo.
Em relação ao prazo para análise e aprovação dos tratados, o Congresso Nacional não tem um prazo fixo e discricionário. Isso significa que existem tratados brasileiros que aguardam há décadas para serem submetidos a referendo.
É importante mencionar que existe um debate doutrinário sobre a necessidade de o Congresso Nacional ser ouvido quando o Presidente da República deseja denunciar um tratado, ou seja, retirar o Brasil de um acordo internacional. Embora a legislação brasileira atualmente não exija a autorização ou referendo do Congresso para denunciar um tratado, a doutrina discute a possibilidade de introduzir essa exigência, alegando que, assim como é necessária a aprovação para aderir a um tratado, também deveria ser necessária a aprovação para deixá-lo. Esse é um tema debatido na doutrina, com diferentes posições, desde a exigência do referendo até a ideia de um ato complexo que combine as vontades do Presidente e do Congresso para denunciar um tratado. No entanto, a posição atualmente prevalecente na legislação é a de que não é necessário o referendo do Congresso para denunciar um tratado.
VEDAÇÃO AO RETROCESSO
É importante compreender que, no caso de denúncia de tratados, o Presidente da República pode afetar certas conquistas da sociedade brasileira que foram alcançadas a partir da ratificação e aceitação desses compromissos no âmbito internacional. Ao nos retirarmos desses compromissos, existe a possibilidade de regredirmos em termos de ganhos sociais, culturais e na proteção de valores internacionalmente concebidos, como aqueles estabelecidos nas Declarações Universais de Direitos Humanos, seja no âmbito da OEA, seja na ONU, por exemplo.
Quando o Estado brasileiro se retira de um tratado por decisão exclusiva do Presidente da República, não há uma proibição explícita contra o retrocesso social. O Supremo Tribunal Federal já julgou vários casos em que se questionou a possibilidade de o Presidente da República afetar o retrocesso social e jurídico, especialmente na proteção desses valores.
Recentemente, aADPF 679 debateu esse ponto, e a decisão sempre foi no sentido de que o Presidente da República tem autonomia e discricionariedade para esse ato, independente de referendo do Congresso Nacional. Além disso, caso haja denúncia unilateral de um tratado pelo Presidente da República, outros instrumentos podem proteger os mesmos valores em igual ou maior medida, tornando o retrocesso e a impossibilidade de denunciar tratados, principalmente aqueles relacionados aos direitos humanos, não necessariamente inevitáveis.
O entendimento do Supremo Tribunal Federal é que a legislação não exige a necessidade de referendo, sendo legítima a atuação unilateral do Presidente da República na efetivação das denúncias de tratados, sem depender de aprovação do Congresso Nacional.
O Projeto de Decreto Legislativo 177/2021, em tramitação na Câmara dos Deputados, que autoriza a denúncia da Convenção 169 da OIT pelo Brasil, tem gerado debates e controvérsias. O Ministério Público Federal (MPF) enviou ao Congresso Nacional uma nota técnica contrária a esse projeto, argumentando que a denúncia é inconstitucional e inválida, pois representaria a retirada do Brasil de um tratado internacional que assegura os direitos dos povos indígenas à consulta prévia, livre e informada sobre medidas que os afetem.
Essa é uma situação particular em que o MPF se manifesta contra a retirada do Brasil da Convenção 169 da OIT, que trata dos povos indígenas e tribais. Ainda não houve a retirada, e a deliberação sobre esse assunto está sujeita à discussão no Congresso Nacional.
O MPF destaca as inconsistências e a invalidade da proposta de denúncia, reforçando a importância da proteção dos direitos dos povos indígenas e tribais e alertando para o possível retrocesso caso o projeto seja aprovado.
RATIFICAÇÃO
Após a etapa de referendo, quando um decreto legislativo autoriza o Presidente da República a proceder com a ratificação de um tratado, o processo avança. Nesse ponto, o Presidente tem total discricionariedade e não está sujeito a prazos rígidos. Ele pode decidir se o Brasil ratificará o tratado, emitindo um documento que informa ao órgão depositário que o país concorda em se comprometer internacionalmente com esse tratado.
É importante observar que, mesmo após a emissão do decreto legislativo, não significa que o tratado entrará imediatamente em vigor no âmbito internacional. A entrada em vigor pode ser imediata ou diferida, dependendo do que está estipulado no próprio instrumento. Por exemplo, o Estatuto de Roma de 1998, que criou o Tribunal Penal Internacional, só entrou em vigor em 2002, após o depósito do 35º instrumento de ratificação. Essa entrada em vigor diferida foi estipulada pelos negociadores do tratado.
PROMULGAÇÃO
A quinta e última etapa é a promulgação, a partir da qual o tratado adquire vigência no plano interno do Brasil. A promulgação é um ato que requer a publicação oficial do texto do tratado, tornando-o efetivo no âmbito doméstico e obrigando o Estado brasileiro a cumprir esse compromisso.
É importante ressaltar que o Supremo Tribunal Federal reforça que a promulgação é o ato que confere vigência interna ao tratado, exigindo a publicação oficial. É a partir desse momento que o tratado passa a ser parte do direito positivo interno do Brasil.
Portanto, as cinco etapas envolvidas no processo de um tratado são: negociação, assinatura, referendo, ratificação e promulgação.
Em relação à competência para análise de tratados no Brasil, os dispositivos relevantes da Constituição estabelecem o seguinte:
· O Supremo Tribunal Federal (STF) tem competência para julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância que declararem a inconstitucionalidade de um tratado ou lei federal (Art. 102, III, "b" da CF).
· O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem competência para julgar, em recurso especial, as causas decididas pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios que contrariarem tratado ou lei federal, ou negarem-lhes vigência (Art. 105, III, "a" da CF).
· A Justiça Federal tem competência para julgar causas relacionadas a tratados e contratos da União com Estados estrangeiros ou organismos internacionais, bem como crimes previstos em tratado ou convenção internacional (Art. 109, III, V e V-A da CF).
A exceção a essa competência é nos casos do Art. 109, inciso V-A, quando as causas envolvem direitos humanos. Nesse caso, há a possibilidade de deslocamento de competência para a Justiça Federal, considerando o interesse da União em representar a República Federativa do Brasil perante cortes internacionais em caso de violação desses compromissos.
Portanto, essas regras de competência são essenciais para garantir que os tratados internacionais sejam aplicados de acordo com a Constituição e que haja uma jurisdição adequada para resolver disputas relacionadas a tratados e direito internacional.
EMENDA E MODIFICAÇÃO DE TRATADOS
No contexto das emendas e modificações de tratados, a regra fundamental a ser observada é a disposição do próprio tratado. As etapas para emendar um tratado são regidas pelos artigos 39 a 41 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969 (CVDT/69). De acordo com o Artigo 40 da CVDT/69:
1. Qualquer proposta para emendar um tratado multilateral entre todas as partes deverá ser notificada a todos os Estados contratantes, cada um dos quais terá o direito de participar: a) na decisão quanto à ação a ser tomada sobre essa proposta; b) na negociação e conclusão de qualquer acordo para a emenda do tratado.
2. Todo Estado que possa ser parte no tratado poderá igualmente ser parte no tratado emendado.
3. O acordo de emenda não vincula os Estados que já são partes no tratado e que não se tornaram partes no acordo de emenda; em relação a esses Estados, aplicar-se-á o artigo 30, parágrafo 4 (b).
4. Qualquer Estado que se torne parte no tratado após a entrada em vigor do acordo de emenda será considerado, a menos que manifeste intenção diferente: a) parte no tratado emendado; e b) parte no tratado não emendado em relação às partes no tratado não vinculadas pelo acordo de emenda.
Isso significa que qualquer emenda a um tratado multilateral deve ser notificada a todos os Estados contratantes, e cada Estado tem o direito de participar na decisão e negociação da emenda. Além disso, as emendas não vinculam os Estados que não as aceitaram, e novos Estados que aderirem ao tratado após uma emenda são considerados partes no tratado emendado.
Portanto, os Estados só se comprometem com emendas aos tratados com as quais tenham expressamente anuído. O silêncio não é interpretado como um compromisso no âmbito internacional.
INTERPRETAÇÃO DE TRATADOS
A interpretação de tratados é regida pelos artigos 31, 32 e 33 da CVDT/69:
· O Artigo 31 estabelece a regra geral de interpretação, que determina que um tratado deve ser interpretado de boa-fé de acordo com o sentido comum atribuível aos termos do tratado em seu contexto e à luz de seu objetivo e finalidade. Além disso, o contexto inclui o texto, preâmbulo e anexos do tratado, bem como quaisquer acordos entre as partes relacionados ao tratado.
· O Artigo 32 da CVDT/69 permite o uso de meios suplementares de interpretação, incluindo os trabalhos preparatórios do tratado e as circunstâncias de sua conclusão, quando a interpretação de acordo com o Artigo 31 deixar o sentido ambíguo, obscuro ou conduzir a um resultado manifestamente absurdo.
· Além disso, o Artigo 33 estabelece que, quando um tratado é redigido em duas ou mais línguas, o texto faz igualmente fé em cada uma delas.
Em relação aos acordos posteriores entre as partes, a CVDT/69 permite que eles sejam levados em consideração na interpretação de um tratado. Portanto, os acordos entre as partes relativos à interpretação do tratado ou à aplicação de suas disposições podem influenciar a interpretação, desde que sejam compatíveis com a jurisprudência da Corte Internacional de Justiça.
Portanto, a assertiva II está incorreta, uma vez que os acordosposteriores entre as partes podem influenciar a interpretação, desde que sejam compatíveis com a jurisprudência da Corte Internacional de Justiça.
RESERVAS EM TRATADOS
No que diz respeito a reservas em tratados, a CVDT/69 estabelece as regras relevantes nos Artigos 19, 20 e 22:
· O Artigo 19 trata do consentimento de outros Estados contratantes para aceitar uma reserva. Uma reserva requer a aceitação de todas as partes se a aplicação integral do tratado for uma condição essencial para o consentimento de cada uma delas em obrigar-se pelo tratado.
· O Artigo 20 estabelece que, se uma reserva for expressamente autorizada por um tratado, não é necessária a aceitação posterior pelos outros Estados contratantes, a menos que o tratado disponha de outra forma. Reservas podem ser retiradas a qualquer momento, sem necessidade de consentimento dos Estados que as aceitaram, a menos que o tratado estabeleça o contrário.
Portanto, a assertiva IV está correta, uma vez que o consentimento de um Estado que aceitou uma reserva não é necessário para sua retirada, desde que o tratado não exija tal consentimento.
Em resumo, o processo de emenda e modificação de tratados segue as regras estabelecidas na Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969. A interpretação de tratados é feita de acordo com os princípios da boa-fé e os meios suplementares estabelecidos na CVDT/69. As reservas podem ser aceitas desde que expressamente autorizadas pelo tratado, e a retirada de reservas não exige o consentimento dos Estados que as aceitaram, a menos que o tratado estabeleça o contrário.
CONFLITOS ENTRE DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO
O sistema jurídico interno pode dar origem a uma única ordem jurídica ou a duas ordens jurídicas distintas, o que gera diferentes posições doutrinárias quanto à prevalência do direito internacional ou do sistema jurídico interno de cada Estado. Algumas correntes negam a existência de duas ordens jurídicas, enquanto outras afirmam que não podem coexistir harmoniosamente.
Essas posições doutrinárias se dividem em dualismo radical e dualismo moderado. O dualismo radical argumenta que, embora existam duas ordens jurídicas, a lei interna sempre prevalece. Por outro lado, o dualismo moderado reconhece a existência de duas ordens jurídicas, mas permite a incorporação de atos jurídicos internacionais no âmbito interno, possibilitando sua aplicabilidade.
A maioria da doutrina afirma que o Brasil segue o dualismo moderado, reconhecendo a existência de convenções, tratados e atos internacionais fora do sistema jurídico interno. No entanto, o Supremo Tribunal Federal não se posiciona sobre qual tese doutrinária o Brasil segue, dando prioridade ao que está previsto na Constituição Federal e exigindo a complexa incorporação de atos internacionais ao sistema interno.
Outra corrente doutrinária argumenta que não existe a possibilidade de coexistência de ordens jurídicas, defendendo a existência de uma única ordem jurídica global. Internacionalistas radicais dão prevalência ao sistema jurídico internacional, enquanto internacionalistas nacionalistas consideram que a única ordem jurídica é a do plano interno. Internacionalistas moderados permitem a harmonização entre as normas internacionais e o âmbito interno.
No Brasil, a posição do Supremo Tribunal Federal é que os tratados internacionais, uma vez incorporados ao direito interno, têm a mesma validade, eficácia e autoridade que as leis ordinárias, não tendo hierarquia superior. A exceção ocorre apenas em casos de antinomia, em que se aplica o critério cronológico ou da especialidade.
A Convenção de Viena sobre Direitos dos Tratados estabelece que nenhuma norma interna pode prevalecer sobre um compromisso internacional assumido pelo Estado, tornando o Estado responsável por violar tais compromissos no âmbito externo.
A aplicação territorial dos tratados no Brasil é geralmente em todo o território nacional, com exceção das normas da Carta das Nações Unidas, que têm precedência em casos de conflito com outros acordos internacionais.
No caso de tratados em direito tributário, o Código Tributário Nacional estabelece que os tratados internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna e devem ser observados.
Em relação aos tratados em direito processual civil, as normas dos tratados internacionais são aplicáveis, ressalvadas as disposições específicas em tratados, convenções ou acordos internacionais dos quais o Brasil seja parte.
Em casos de conflito entre tratados internacionais, a Convenção de Viena oferece regras para determinar a prevalência, levando em consideração a situação das partes nos tratados e a compatibilidade das disposições dos tratados. O tratado posterior prevalece sobre o anterior na medida em que suas disposições são compatíveis.
Portanto, as regras para resolver conflitos entre tratados internacionais são estabelecidas na Convenção de Viena, levando em consideração a situação das partes nos tratados e a compatibilidade das disposições. Cada situação deve ser avaliada com base nas regras estabelecidas nessa convenção.
A questão do conflito entre tratados internacionais e normas internas é uma questão complexa e importante no contexto do Direito Internacional. No entanto, o texto apresentado possui uma organização confusa e dificulta a compreensão. Vou reformular o texto para torná-lo mais claro e organizado:
Conflito entre Tratados Internacionais e Normas Internas: Especialidade como Critério de Solução
8.4.1 - Especialidade
Um dos critérios para resolver conflitos entre tratados internacionais e normas internas é o princípio da especialidade. Isso significa que, quando um tratado internacional contém disposições específicas que não estão presentes na lei interna do país, as regras do tratado devem prevalecer sobre as regras gerais da legislação nacional.
Por exemplo, suponha que a Convenção de Viena estabeleça a obrigação de notificação consular em casos de prisão de estrangeiros, mas a lei interna não contenha essa disposição. Nesse caso, a regra especial da Convenção de Viena deve prevalecer sobre a lei geral de execução penal.
No Informativo 573, o Supremo Tribunal Federal resolveu um caso semelhante. Ficou estabelecido que os estabelecimentos prisionais e as autoridades policiais devem, de acordo com a Convenção de Viena, informar as autoridades consulares do país de origem do estrangeiro preso, para que essas autoridades possam prestar assistência ao estrangeiro. Mesmo que a lei de execuções penais brasileira não contenha essa obrigação, o Supremo decidiu que a Convenção de Viena, por ser uma norma especial, deve ser aplicada.
Além disso, no contexto de direitos humanos, a regra é sempre dar preferência à norma mais favorável ao indivíduo. Isso está em conformidade com a Convenção Americana de Direitos Humanos e o princípio pro homine.
Com a nova Lei de Imigração de 2017, podem ocorrer conflitos entre normas, especialmente entre convenções específicas sobre refugiados e asilo e a lei de imigração geral. A nova lei estabeleceu a primazia das normas mais protetivas para os migrantes. Além disso, o controle de convencionalidade é fundamental para garantir a conformidade das normas internas com os tratados internacionais.
Por exemplo, o Artigo 17, Item 7, do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos estabelece que ninguém pode ser processado ou punido por um crime pelo qual já foi absolvido ou condenado de acordo com as leis do país. Mesmo que a lei interna não preveja explicitamente essa proteção, ela deve ser respeitada devido ao controle de convencionalidade.
8.5 - Extinção de Tratados Internacionais
Por fim, é importante entender as formas de extinção ou suspensão de tratados internacionais. Algumas delas incluem:
· Vontade comum das partes.
· Denúncia ou retirada (por ato unilateral, com ou sem prévio aviso).
· Alteração das circunstâncias.
· Previsão no próprio instrumento.
· Expiração do prazo de vigência ou condição resolutiva.
· Acordo posterior que substitui o tratado anterior.· Impossibilidade de cumprimento devido a alterações nas partes.
· Caducidade (quando o tratado cai em desuso).
· Perda de objeto.
É importante mencionar que o rompimento das relações diplomáticas entre países não necessariamente resulta na extinção dos tratados existentes; cada caso é tratado individualmente.
Questão de Concurso:
96. (TRF2 – 2017) Quanto à internalização de tratados ao ordenamento nacional, marque a correta:
A) O sistema de recepção de tratados internacionais previsto na Constituição Federal não acolhe o chamado princípio do efeito direto e imediato dos tratados ou convenções internacionais sobre Direitos Humanos.
B) A extradição solicitada por Estado estrangeiro para fins de cumprimento de pena somente poderá ser deferida depois de internalizado o tratado de extradição firmado entre o Brasil e o respectivo Estado estrangeiro.
C) Somente após ser aprovado em duplo turno de votação, nas duas casas do Congresso Nacional, seguido de publicação de Decreto Presidencial, poderá o Tratado Internacional adquirir validade no Direito Brasileiro.
D) Tratado internacional que verse sobre matéria que a Constituição brasileira reserva ao domínio da Lei Complementar poderá ter aplicabilidade interna, bastando que no ato de internalização seja observado o quórum de maioria absoluta previsto no artigo 69 da Constituição.
E) Tratados que versem sobre a concretização de Direitos Humanos no plano interno não podem ser objeto de denúncia pelo Estado Brasileiro, sob pena de violação ao postulado da proibição de retrocesso.
Resposta: A) O sistema de recepção de tratados internacionais previsto na Constituição Federal não acolhe o chamado princípio do efeito direto e imediato dos tratados ou convenções internacionais sobre Direitos Humanos.

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