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ESCLEROSE SISTÊMICA • A esclerose sistêmica (ES) é uma doença rara, do grupo de doenças difusas do tecido conjuntivo, causada por disfunção endotelial e imunológica que compromete o tecido conjuntivo da pele, sistema musculoesquelético e órgãos internos, particularmente o coração, rins, pulmões e trato gastrointestinal. • Caracteriza-se por alterações inflamatórias, fibróticas e atróficas, ao lado de endarterite proliferativa e lesões capilares obstrutivas, sendo os mecanismos fisiopatológicos envolvidos complexos e ainda pouco conhecidos. • Ocorre acometimento vascular, principalmente da microcirculação e de vasos de pequeno calibre. Endoarterite proliferativa isquêmica associada a fibrose cutânea e visceral. EPIDEMIOLOGIA • Incidência: 11.9 pessoas/ano no Brasil, 3-15 mulheres para cada homem, predomínio em caucasianos. • A esclerodermia localizada é rara. A literatura estabelece uma incidência anual de 3-27 casos por milhão. • O pico de incidência na infância ocorre entre os 7 e 11 anos e, na fase adulta, na 4ª década. • A idade média ao diagnóstico é de 50 anos. ETIOPATOGENIA Lara Mattar | Reumatologia | Medicina UFR FIBROSE • Cutânea e de órgãos internos, patognomônica da ES, ocorre por ativação dos fibroblastos. • A fibrose normal e autolimitada à lesão que normalmente leva à regeneração tecidual é substituída por fibrose com perda da arquitetura tecidual. • No tecido fibrótico da ES, observa-se tecido acelular, rico em colágeno tipos I, III, V e VII e outras proteínas da matriz extracelular. • Também se observa acúmulo de miofibroblastos, acumulando alfa -actina de músculo liso(alfa-SMA) associada a rarefação de vasos sanguíneos e linfáticos. • Uma vez iniciada, a fibrose é amplificada e se mantem como consequência do dano tecidual e hipóxia progressiva, resultando em um ciclo vicioso. • Citocinas e fatores de crescimento (TGF beta), CTGF (fator de crescimento de tecido conjuntivo) PDGF (fator de crescimento derivado de plaquetas), VEGF (fator de crescimento vascular endotelial e ET-1, promove o acúmulo de colágeno, proteoglicanos, fibronectina, e outros componentes da matriz extracelular. • Adicionalmente TGF-beta, induz a diferenciação de fibroblastos em miofibroblastos, capazes de aumentar a rigidez da matriz extracelular, aumentar a produção de citocinas pro fibróticas além de serem relativamente resistentes a apoptose. • Células epiteliais e endoteliais também podem se diferenciar em miofibroblastos. SISTEMA IMUNE • Produção de auto anticorpos: Anticorpos séricos são característicos de doenças auto imunes com acometimento difuso do TC, 95% dos pacientes com ES produzem anticorpos contra múltiplos antígenos intracelulares • A presença de anticorpos antinucleares (FAN), assim como o FRy, é esperada na maioria dos pacientes, e sua ausência impõe o diagnóstico diferencial com doenças que simulam ES, como: fasciíte eosinofílica, fibrose sistêmica nefrogênica e escleromixedema. • O padrão mais comum de imunofluorescência do FAN na ES é o nucleolar • Anticorpos específicos para ES: → Anticorpo anti topo isomerase I (ou anti SCL-70) – mais associado a fibrose de pele, lesões em “sal e pimenta” → Anticorpo anti centrômero – mais associado a acometimento pulmonar → Anticorpo anti RNA polimerase III – mais associado a acometimento sistêmico → OBS: Estes anticorpos fazem parte dos critérios de classificação para ES do ACR /EULAR • Podem ainda ocorrer: → Anti-U3_ RNP/fibrilarina (a expressão de receptores TLR4 está aumentada na ES) → Anti Th/To → Anti RNA polimerase I e II → Anti U 11/U12 RNP • Alterações na imunidade inata relacionadas a via a via dos receptores toll-like podem estra envolvidas na patogênese da ES. • Ativação de linfócitos • Infiltração de células mononucleares nos órgãos afetados (Infiltrado inflamatório composto por células mononucleares, macrófagos e linfócitos t. • Observa-se migração e ativação de células TCD 4 • Alteração do balanço entre linfócitos com perfil Th1/Th2, com polarização para o perfil Th2 • Aumento de níveis séricos de IL-4 E IL-6, IL 10 e IL 13 • IL4 estimula a produção de TGF beta • Células Th 17, são implicadas na patogênese da doença e no desenvolvimento de fibrose • A IL 17, produzida por células Th17, está envolvida na ativação dos fibroblastos, além da indução de IL 1 e IL 6 VASCULOPATIA • Eventos iniciais da esclerose sistêmica: → Ativação de células endoteliais = alteração no controle do tônus vascular → Hiper reatividade vascular = aumento da permeabilidade vascular → Ativação plaquetária • Inflamação crônica do tecido conectivo, caracterizada pelo acometimento do endotélio dos vasos, principalmente de pequeno e médio calibres, que evoluem para uma endarterite proliferativa isquêmica. • Na ES encontram-se aumentadas: → Moléculas de adesão → ICAM-I (molécula de adesão envolvidas na interação entre vasculatura, matriz extra celular e migração linfocitária, incluindo molécula de adesão intracelular) → VCAM-I e E-selectina (molécula de adesão de células vasculares) • Alterações tipo lesão-regeneração e defeitos no reparo vascular e na angiogênese levam a progressão da vasculopatia com acúmulo de matriz extracelular na camada miointimal e a consequente endarterite obliterativa e estado de isquemia crônica. • Em pacientes com ES, alterações microvasculares com redução do número de alças capilares, presença de áreas avasculares e desorganização da arquitetura capilar podem ser visualizadas em fases precoces da doença. FORMAS DE DOENÇA • Esclerodermia localizada: restrita à pele, normalmente tem curso benigno e autolimitado → Morfeia: espessamento cutâneo que acomete pele e tecidos adjacentes → Esclerodermia linear: mais comum em crianças, com lesões em bandas/linhas, comum em metade do corpo • Esclerose sistêmica: envolvimento de órgãos, pouco frequente em crianças, manifesta-se entre 30-60 anos, em homens apresenta curso mais tardio e agressivo → Esclerose cutânea limitada: CREST – calcinose, raynaud, esofagopatia (incEEI), esclerodactilia, telangectasia → Esclerose difusa Lara Mattar Lara Mattar Lara Mattar FATORES DE RISCO – ESCLEROSE SISTÊMICA • Predisposição genética: → Agregação familiar, fatores étnicos → Associação com determinados HLA → Associação com polimorfismos gênicos → Genética controversa na esclerodermia localizada • Fatores ambientais: → Solventes orgânicos (tolueno, benzeno, tricloroetileno) → Sílica → Inibidores de apetite → L-triptofano, pentazocina, bleomicina → Infecções virais e bacterianas → Outros: fricção, trauma local, vacinas ou injeções, além de radioterapia • Fatores étnicos: → Índios Choctaw (norte-americanos) → Afro-americanos: mais frequentes do que caucasianos SUBTIPOS DE ESCLERODERMIA LOCALIZADA – CLASSIFICAÇÃO DE LAXER E ZULIAN Subtipo Descrição Morfeia circunscrita ou em placas (superficial ou profunda) Lesões circunscritas de induração, delimitadas à epiderme e derme (forma superficial) ou estendendo-se ao subcutâneo (forma profunda), de coloração eritematosa ou violácea Morfeia linear Induração linear acometendo o tronco, membros ou face (golpe de sabre), podendo atingir a musculatura e ossos subjacentes. É a forma mais comum nas crianças Morfeia generalizada Placas confluentes extensas Morfeia panesclerótica Envolvimento circunferencial de membros acometendo pele, subcutâneo, tecido muscular e ósseo Forma mista Duas ou mais formas associadas • Eventualmente, podem aparecer diferentes formas clínicas em um mesmo paciente. • A morfeia circunscrita ou em placas é o tipo mais frequente nos adultos. Precocemente surge como placas eritematosas ou violáceas que, com a progressão, tornam-se escleróticas principalmente no centro das lesões. • Pode haver predomínio de hipercromia em alguns pacientes. • Na maioria dos casos, a evolução é autolimitada, com reduçãodo espessamento após 3 a 5 anos, permanecendo alterações pigmentares e atrofia. Porém, alguns pacientes podem apresentar curso progressivo e recidivante. • Nas crianças, são mais frequentes formas mais graves, mutilantes e incapacitantes como a morfeia panesclerótica. • O espessamento cutâneo é o principal marcador clínico da ES. A forma clínica difusa apresenta pior prognóstico que as formas limitada ou intermediária. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS • Fenômeno de Raynaud • Aderência da pele a planos profundos • Diminuição da elasticidade cutânea • Microstomia • Leucomelanodermia • Fibrose de tendões e anexos articulares • Acroesclerose • Esclerodactilia • Acrosteólise • Garra esclerodérmica • Alterações de capilares periungueais • Úlceras puntiformes digitais • Necrose de extremidades • Telangiectasias e calcificações cutâneas • Na forma limitada, o espessamento é restrito a extremidade dos membros e a face, tipicamente associada a Ac anticentrômero e pode ocorrer hipertensão arterial pulmonar em fases tardias. Obs: difusa = DP intersticial; • Na forma difusa, ocorre espessamento cutâneo precoce e se estende a região proximal dos membros e tronco, predomina o ACOMETIMENTO PULMONAR E RENAL e os anticorpos predominantes são Anti SCL 70 e Anti RNA polimerase III • Crepitação tendínea: característica de comprometimento visceral precoce Escore Cutâneo Total (ECT): ECT < 40: sobrevida de 70% em 5 anos ECT > 40: sobrevida de 50% em 5 anos FENÔMENO DE RAYNAUD • O fenômeno de Raynaud (FRy) é uma resposta vascular exagerada à temperatura fria ou ao estresse emocional que cursa com alteração da cor da pele dos dedos de mãos e/ou pés. PCR -> Palidez – cianose – rubor. • Considera-se que a vasoconstrição anormal das artérias digitais e das arteríolas cutâneas ocorra devido a um defeito local nas respostas vasculares. • O FR é considerado primário (80-90% dos casos) se os sintomas ocorrerem isoladamente, sem evidência de outra doença relacionada, como lúpus eritematoso sistêmico, esclerose sistêmica, distúrbios hematológicos, hipotireoidismo, alterações vasculares, enxaqueca, exposições ambientais (como exposição a cloreto de polivinila (PVC) e síndrome de vibração mão-braço associada à exposição ocupacional a máquinas vibrantes), síndrome do túnel do carpo, fibromialgia, drogas e toxinas (como nicotina, cocaína, estrogênio, narcóticos, agentes simpaticomiméticos, derivados do ergot, clonidina, interferon, quimioterápicos). • É mais comum em jovens e mulheres, há associação com enxaqueca e tabagismo. • DIAGNÓSTICO: Se o paciente tiver resposta positiva para as 3 perguntas ou se for visualizado um ataque. → Os seus dedos são excepcionalmente sensíveis ao frio? → Seus dedos mudam de cor quando expostos a temperaturas frias? → Os seus dedos ficam brancos, azuis/roxos ou ambos? • Após o diagnóstico é importante identificar se o Raynaud é primário ou secundário. • Características que aumentam a suspeita de causa secundária: → Idade de início mais tardio (maior que 40 anos) → Sexo masculino → História de um precipitante conhecido → Vasoespamo durante todo o ano → Eventos graves dolorosos com sinais de isquemia tissular (ulceração/microcicatrizes) → Ataques assimétricos → Sinais ou sintomas de outra doença associada (como por exemplo: esclerodactilia, rash malar) → Capilares do leito ungueal anormais → Parâmetros laboratoriais anormais que sugerem doença vascular ou distúrbio autoimune → Sinais ou sintomas isquêmicos proximais aos dedos (como mão/pé ou braço/perna) • São critérios de diagnóstico definitivo de Raynaud primário, quando todos os itens abaixo estiverem presentes: → Ataques reversíveis de palidez ou cianose de extremidades → Pulsos periféricos fortes e simétricos → Ausência de microcicatrizes (“pitting scars”), úlceras ou gangrena digital → Ausência de anticorpos antinucleares → Capilaroscopia periungueal normal ESCLEROSE RENAL • Crise renal esclerodérmica: mais comum na forma difusa e no começo da doença • Pode ser desencadeado pelo uso de glicocorticoides • Sintomas: hipertensão de início recente (hipertensão maligna) – falta de ar, cefaleia, convulsão, edema agudo de pulmão + microangiopatia (anemia + esquizócitos), trombocitopenia, insuficiência renal, proteinúria. • Manejo: IECA (captopril) CRITÉRIOS DE CLASSIFICAÇÃO PARA ESCLEROSE SISTÊMICA ACR/EULAR 2013 Item Sub item Valor Espessamento cutâneo dos dedos das mãos, proximal ás articulações metacarpofalangeaneas 9 Espessamento cutâneo dos dedos (só computar o maior escore) Distal às articulações MCF 4 Edema de mãos 2 Lesões da polpa digital Microcicatrizes 3 Fenômeno de Reynaud 3 Autoanticorpos específicos para esclerose sistêmica (anticentrômero, anti rnapolimerase III, antitopoisomerase I- anti scl-70) 3 Teleangiectasias 2 Capilaroscopia periungueal alterada 2 Hipertensão arterial pulmonar ou doença intersticial pulmonar 2 ➔ DEFINE-SE PORTADOR DE ES SE ≥ 9 PONTOS. • O padrão Topo I-símile pode compreender a coloração de cinco regiões subcelulares: → 1) Pontilhado fino nuclear proeminente do tipo AC-4 em células em interfase. → 2) Pontilhado fino forte e consistente da cromatina condensada em células mitóticas. Dependendo da diluição do soro, a coloração da cromatina mitótica pode parecer homogênea. → 3) Coloração intensa da região organizadora de nucléolos (NOR) associada com os cromossomos condensados em células mitóticas. A coloração das NOR pode estar obscurecida pela intensa coloração dos cromossomos, já que as NOR nem sempre estão no mesmo plano focal (veja figura abaixo). → 4) Fraca coloração do citoplasma na interfase (e em algumas células mitóticas) sob forma de uma rede delicada irradiando a partir da área perinuclear em direção à membrana citoplasmática: em maiores diluições do soro, em geral, a coloração do citoplasma se torna relativamente mais brilhante e evidente. → 5) Coloração variável dos nucléolos, que podem aparecer como pontilhados ou com padrão perinucleolar. A coloração do nucléolo não é uma característica universal deste padrão, podendo variar de acordo com o substrato. TRATAMENTO • De uma maneira geral, o tratamento da esclerose sistêmica é determinado pela extensão e gravidade das manifestações clínicas. • Medidas gerais incluem uma abordagem multidisciplinar voltada para a educação do paciente, proteção de exposição ao frio, vacinação para influenza e pneumococo, suspensão do tabagismo, medidas antirrefluxo, suporte nutricional, atividade física e reabilitação motora e cardiopulmonar. • A escolha da melhor abordagem terapêutica dependerá do fenótipo apresentado pelo paciente, avaliando-se a presença de manifestações vasculares, inflamatórias e/ou fibróticas. epidemiologia etiopatogenia fibrose Sistema imune Vasculopatia formas de doença Fatores de risco – esclerose sistêmica Subtipos de esclerodermia localizada – classificação de laxer e zulian Manifestações clínicas Fenômeno de raynaud Esclerose renal CRITÉRIOS DE CLASSIFICAÇÃO PARA ESCLEROSE SISTÊMICA ACR/EULAR 2013 ➔ Define-se portador de ES se ≥ 9 pontos. TRATAMENTO