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POLÍTICAS E PROGRAMAS EM SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM > Reconhecer o conceito de SAN e suas dimensões. > Identificar as principais políticas e programas de SAN vigentes no Brasil. > Discutir o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) e suas diretrizes. Introdução Ao longo das últimas décadas, o debate sobre segurança alimentar e nutricional (SAN) vem ganhando destaque na sociedade civil e na agenda das políticas públicas de diversos países, entre eles o Brasil. A SAN está fortemente associada à saúde, ao ambiente e ao desenvolvimento sustentável global e atua como um eixo do desenvol- vimento e um objetivo estratégico das políticas públicas nacionais fundamentadas no princípio da soberania alimentar e do direito humano à alimentação adequada. Neste capítulo, você vai conhecer um pouco mais sobre o conceito de SAN e sua evolução ao longo da história. Em seguida, identificará os principais progra- mas e políticas públicas que estão vigentes no Brasil, que visam à promoção e à manutenção da SAN; por fim, poderá entender um pouco mais sobre o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN). Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional Jeison Fernando Schmitz Histórico e evolução do conceito de segurança alimentar e nutricional Para falarmos sobre a SAN, inicialmente é importante explicitarmos alguns conceitos que são correlatos, como os listados a seguir (CONTI, 2009): � Pobreza: ocorre de duas formas; uma delas é a absoluta, quando a renda do indivíduo é insuficiente ou inexistente e, com isso, fica privado de acessar os meios básicos, como alimentação, saúde, habitação e educação, e a outra é a pobreza relativa, calculada pela média geral do nível de vida da população, distorcendo a realidade, principalmente em localidades com alta desigualdade social, como no Brasil. � Fome: ocorre quando o indivíduo não se alimenta diariamente em quantidade e qualidade suficientes para suprir as necessidades de energia de sua taxa metabólica basal. Essa alimentação ineficiente estimulará sensações que incitam o indivíduo a se alimentar, as quais só cessarão com a ingestão de algum alimento. � Desnutrição: geralmente está associada às situações de pobreza e fome. Advém de uma alimentação inadequada ou inexistente, tanto de forma quantitativa (calorias geradas) quanto qualitativa (macro e micronutrientes). � Insegurança alimentar: definida quando ocorre a ingestão insuficiente de alimentos, que pode ser considerada transitória (épocas de crises), estacional (campanhas agrícolas) ou crônica (quando ocorre de forma contínua). A insegurança alimentar pode ser classificada em três níveis: leve, moderada ou grave. ■ O nível leve se caracteriza pela presença da incerteza sobre conseguir alimentação no futuro. ■ O nível moderado acontece quando a qualidade e a quantidade de alimentos estão comprometidas e sofrem uma redução, para que não falte comida antes da próxima aquisição. ■ Já a insegurança alimentar de nível grave ocorre quando um indiví- duo ou a sua família passam fome, por não consumirem alimentos durante um dia inteiro ou mais. � Conforme o relatório O estado da segurança alimentar e nutrição no mundo 2020 (FAO, 2020), estima-se que 9% da população da América Latina e do Caribe sofre de insegurança alimentar grave. O que causa bastante preocupação é o dato de que nessa mesma região, com menos de 1,06 dólar por dia, o indivíduo estará em insegurança alimentar, Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional2 pois é o custo de compra para uma dieta que atenda às mínimas ne- cessidades nutricionais. Essas estimativas não consideram o impacto ocasionado pela pandemia da Covid-19, portanto, os problemas rela- cionados à insegurança alimentar serão muito maiores. O conceito de SAN abrange o direito de todos os indivíduos terem acesso de forma regular e permanente a uma alimentação saudável, de qualidade e em quantidade suficiente, sem comprometer o direito de outras necessidades essenciais. A base da SAN está em atividades alimentares que promovem a saúde, respeitando as particularidades e diversidades culturais de cada região. Entretanto, o conceito de SAN nem sempre foi o mesmo e, podemos dizer, foi evoluindo conforme o avanço da história da humanidade e a preocupação com a alimentação. No início do século XX, após a Primeira Guerra Mundial (1914–1918), na Europa veio à luz a expressão segurança alimentar (SA), relacionada com a ideia de que a soberania de uma nação estava estritamente ligada à autos- suficiência alimentar. Ou seja, cada país, para se tornar menos vulnerável e dependente em tempos de crises e guerras, necessitava garantir meios para suprir a maior parte dos alimentos consumidos pela sua população (CONTI, 2009; FREITAS, 2019; MORAIS; SPERANDIO; PRIORE, 2020). Após a Segunda Guerra Mundial (1939–1945), a SA ganhou ainda mais força, principalmente com o surgimento de iniciativas como a criação da Organização das Nações Unidades (ONU) e a Organização das Nações Unidas para Alimen- tação e Agricultura (FAO). Em 1948, foi proclamada a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), pautada na promoção da justiça e da paz. A DUDH declara em seu artigo 25 que toda pessoa tem direito a um padrão de vida que assegure a si e à sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação (FREITAS, 2019; MORAIS; SPERANDIO; PRIORE, 2020). Em 1974, a FAO promoveu a I Conferência Mundial de Segurança Alimentar, impulsionada pela crise mundial de escassez de alimentos devido a quebras elevadas na produção em diversos países e, consequentemente, grandes altas nos preços de diversos alimentos. Durante a Conferência, foi constatado que só produzir alimentos não seria o suficiente para a garantia da SA; seria necessário garantir um acesso com regularidade para alimentar toda a população. Portanto, a partir da Conferência de 1974, foram estabelecidas algumas prioridades, como a ampliação da pesquisa agronômica, a intensificação da produção de alimento e o desenvolvimento de políticas e programas para melhorar a nutrição. Nesse momento, o conceito de SA estava voltado totalmente à produção agrícola, Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional 3 ou seja, enfoque no alimento e não no fator humano (CONTI, 2009; FREITAS, 2019; MORAIS; SPERANDIO; PRIORE, 2020; PINTO, 2013). Com essa mudança no foco, a partir dos anos 1980, a produtividade agrí- cola gerou excedentes na produção e aumento de estoques, resultando na redução dos preços dos alimentos. No entanto, mesmo assim, problemas da dificuldade no acesso à alimentação eram frequentes. E, com isso, foi cons- tatado que a pobreza e a ausência de recursos necessários para a aquisição de alimentos eram as principais causas da fome e da desnutrição. Então, em 1983, a FAO reformulou o conceito de as para, além da disponibilidade de alimentos, considerando a importância do acesso aos alimentos, tanto de forma física quanto econômica, propiciando maior igualdade (MORAIS; SPERANDIO; PRIORE, 2020). Na década de 1990, após diversas conferências apoiadas pela FAO e pela Organização Mundial da Saúde (OMS), acrescentaram-se outras perspectivas no conceito de SA após compreenderem que a disponibilidade e o acesso ao alimento não eram suficientes para assegurar uma situação de segurança alimentar. O acréscimo foi de perspectivas da nutrição (composição e varie- dade da dieta), da qualidade (química, biológica e física) e da inocuidade dos alimentos, da produção sustentável, equilibrada e culturalmente aceitável e dos princípios do direito humano à alimentação adequada (DHAA). Então, em 1992, na Conferência Internacional de Nutrição que ocorreu na Itália, devido à essa nova visão sobre a segurança alimentar, passou a ser denominada Segurança Alimentar e Nutricional (SAN). Em 1996, a Cúpula Mundial da Ali- mentação, convocada pela FAO, instaurou que a SANocorre quando todos os indivíduos possuem, de forma permanente, acesso físico, social e econômico a alimentos seguros, nutritivos e em quantidade suficiente para atender às suas necessidades nutricionais e preferências alimentares (CONTI, 2009; FREITAS, 2019; MORAIS; SPERANDIO; PRIORE, 2020; PINTO, 2013). Desde então, esse conceito vem ganhando destaque em diversas discus- sões pelo mundo e sendo remodelado de acordo com a realidade de cada nação. No Brasil, na II Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutri- cional, realizada no ano de 2004, entre as deliberações estava a definição de instituir um Sistema nacional de segurança alimentar e nutricional sustentável, assegurando a regulamentação das políticas de SAN como política pública, inclusive com Lei Orgânica. Tendo uma grande repercussão, essa deliberação logo se transformou em um Projeto de Lei que foi prontamente aprovado pela Câmara de Deputados e pelo Senado Federal. E, assim, em 15 de setembro de 2006, foi sancionada a Lei nº 11.346 que cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) com vistas a assegurar o DHAA e a criação Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional4 da Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN), que definiu o conceito da SAN mencionado no início desse texto. Existe uma grande abrangência de conceitos para a SAN, o que pode dificul- tar um pouco sua mensuração e seu monitoramento. Definindo as dimensões, é possível identificar e monitorar os determinantes e as consequências da insegurança alimentar e da fome. Diante dessa possibilidade, em esfera internacional, a FAO aponta quatro dimensões da SAN: a disponibilidade, o acesso e a utilização dos alimentos, e a estabilidade, que é uma dimensão transversal às outras três (Figura 1) (FAO, 2014). Figura 1. As quatro dimensões da SAN. Fonte: Adaptada de FAO (2014). A dimensão disponibilidade garante a disponibilidade dos alimentos para toda a população, envolvendo questões de produção, comércio internacional e nacional, abastecimento e distribuição desses alimentos. Como exemplo, podemos citar ações de melhoria dos sistemas de produção, acesso a meios de produção (ferramentas e insumos) e acesso aos recursos naturais (terra, sementes e água). O acesso tanto físico quanto econômico dos alimentos ocorre quando todos possuem a capacidade do obter esses alimentos de forma socialmente aceitável (compra, produção ou troca). Como ações que promovam a dimensão do acesso aos alimentos, podemos citar os programas de proteção social, acesso ao crédito e redes de segurança. A dimensão da utilização dos alimentos e nutrientes está relacionada com o seu aproveita- mento biológico, influenciado pelas condições de saneamento básico e saúde dos indivíduos e pela segurança (microbiológica e química) dos alimentos, abrangendo o conhecimento nutricional e a autonomia alimentar. Algumas ações em função dessa dimensão são os planos de vacinação, os programas de educação alimentar e nutricional e o acesso a cuidados de saúde. E a di- mensão estabilidade está relacionada ao elemento temporal da necessidade das três primeiras dimensões. No Brasil, a SAN é monitorada por meio de seis dimensões, que possuem similaridade com as quatro dimensões da esfera internacional: produção de Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional 5 Highlight Highlight alimentos, disponibilidade, renda, acesso à informação, educação e saúde e acesso a serviços de saúde (FAO, 2014; MORAIS; SPERANDIO; PRIORE, 2020). Principais políticas e programas públicos em SAN no Brasil Uma política pública de SAN pode ser caracterizada como um conjunto de ações do Governo Federal que configuram um compromisso público para assegurar a SAN a toda a população, principalmente para os grupos mais vulneráveis. A SAN possui diversas dimensões, como vimos anteriormente; portanto, para uma política pública alcançar a SAN é fundamental considerar simultaneamente todas elas, adotando um enfoque intersetorial e envolvendo vários setores do governo, juntamente com a participação da sociedade civil. As políticas e os programas públicos de SAN devem ser elaborados com base em diagnósticos adequados da população, que indiquem a realidade das condições de insegurança alimentar e, com isso, permitam uma definição de estratégias de intervenção ampla e articulada com objetivos de atuação bem identificados. Apesar de o conceito e as legislações de SAN avançarem no Brasil, o DHAA não é usufruído por todos os brasileiros. De acordo com o relatório O estado da segurança alimentar e nutrição no mundo 2020 (FAO, 2020), no Brasil, entre os anos de 2017 e 2019, a prevalência de insegurança alimentar moderada ou grave foi de 20,6% de toda a população, ou seja, 43,1 milhões de brasileiros. Sendo assim, se fazem necessárias a elaboração e a manutenção das políticas públicas de SAN, considerando a desigualdade social existente no Brasil. Em 2004 foi criado, pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Mi- nistério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, que tinha por objetivo atender às demandas do país por políticas de desenvolvimento social, SAN e assistência social, com a inclusão de políticas públicas de saúde e ações governamentais que abrangessem estratégias de alimentação e nutrição. Em 2016, esse ministério passou a ser intitulado Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, ocasionando perdas em suas estratégias sociais. Em 2019, no governo de Jair Bolsonaro, essa pasta foi incorporada ao Ministério da Cidadania (MORAIS; SPERANDIO; PRIORE, 2020). A seguir, você vai conhecer um pouco mais sobre algumas das principais políticas e programas públicos implementados pelo Governo Federal ao longo dos anos, visando à efetivação da SAN. Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional6 Programa de Aquisição de Alimentos O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) foi criado em 2003, no âmbito do Programa Fome Zero, sendo uma ação para a inclusão produtiva das famílias mais pobres e da zona rural. Os seus dois principais objetivos são promover o acesso à alimentação e incentivar a agricultura familiar. O PAA faz a aquisição de alimentos produzidos por agricultores familiares, por meio da compra do produto sem licitação, e os distribui para indivíduos que estejam em situação de insegurança alimentar e nutricional (CONTI, 2009). Com esse programa, o Governo promove o abastecimento alimentar por meio de compras governamentais de alimentos, fortalece a comercialização local, valoriza a biodiversidade e a produção agroecológica de alimento, estimula o cooperativismo e incentiva hábitos alimentares mais saudáveis. No site do Ministério da Cidadania, você fazer uma busca pelo pro- grama e acessar a plataforma de inclusão produtiva no seu município para verificar no mapa do Brasil a cobertura do programa. Programa Restaurantes Populares O Programa Restaurantes Populares (PRP) é implementado em uma parceria entre o Governo Federal e o Estado/município, contribuindo na promoção do DHAA e direcionado para municípios com mais de 100 mil habitantes que tenham grande quantidade de indivíduos em situação de miséria ou pobreza. O objetivo do PRP é ampliar a oferta de refeições prontas nutricionalmente adequadas para pessoas e famílias em situação de risco de insegurança alimentar e nutricional, promovendo uma alimentação adequada e saudável e valorizando os hábitos alimentares regionais (BRASIL, 2021; CONTI, 2009). O acesso ao Restaurante Popular é universal, ou seja, qualquer pessoa poderá utilizar de seu benefício, priorizando os grupos populacionais em situação de insegurança alimentar. O preço da refeição é acessível à população de baixa renda da região, geralmente sendo cobrado o valor simbólico de R$ 1,00, não podendo ultrapassar o valor de R$ 2,00. Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional 7 Highlight Programa Cozinha Comunitária O Programa CozinhaComunitária é semelhante ao PRP, porém é móvel. Constitui-se de equipamentos públicos de SAN, como um minirrestaurante, e tem capacidade mínima de produção de 100 refeições por dia. As cozinhas comunitárias devem ser instaladas em municípios que apresentam um elevado número de habitantes em situação de miséria ou pobreza, e, normalmente, com menos de 100 mil habitantes. O acesso ao programa também é univer- sal, entretanto é direcionado para indivíduos cadastrados nos serviços de assistência social, visando à conscientização alimentar e à inserção social. A orientação é de que a oferta das refeições servidas seja de forma gratuita (BRASIL, 2021; CONTI, 2009). Programa Bancos de Alimentos O Programa Bancos de Alimentos é uma iniciativa que contribui para o abaste- cimento alimentar e a SAN, com o objetivo de combater a fome e a insegurança alimentar da população. O programa atua por meio de estruturas físicas e/ou logísticas, com a arrecadação de doações de alimentos de setores públicos e/ou privados que seriam desperdiçados, e os destina gratuitamente para instituições sociais que atendem um público em situação de alta vulnerabi- lidade social (BRASIL, 2021; CONTI, 2009). Os bancos de alimentos apoiam a logística de execução das compras públicas de alimentos, como do PAA, reduzem o desperdício de alimentos que tenham qualidades sanitárias e sensoriais adequadas para o consumo humano e realizam atividades de educação alimentar e nutricional (EAN) em conjunto com instituições sociais, por meio de oficinas culinárias, teatros, palestras sobre reaproveitamento de alimentos, entre outras atividades. Programa Nacional de Agricultura Urbana e Periurbana Instituído em 2018, o Programa Nacional de Agricultura Urbana e Periurbana conta com ações que promovem a estimulação da produção agroecológica de alimentos em espaços urbanos e periurbanos, aproveitando as áreas ociosas, incentivando hábitos alimentares saudáveis e fazendo a implantação da produção com fins pedagógicos em instituições de ensino, principalmente em localidades de vulnerabilidade social (BRASIL, 2021; CONTI, 2009). Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional8 Dentre as iniciativas desse programa, podemos citar a implantação de hortas comunitárias e pedagógicas (em unidades escolares públicas), a im- plantação de viveiros de mudas, a criação de pequenos animais, assistência técnica e capacitação e propagação do conhecimento e informação pertinente com o tema da SAN. O Projeto Hortas Pedagógicas é uma iniciativa que tem por objetivo integrar o conhecimento científico ao conhecimento cotidiano da população brasileira. Para saber mais, busque por ele no site do Ministério da Cidadania. Programa Cisternas O Programa Nacional de Apoio à Captação de Água de Chuva e Outras Tecnolo- gias Sociais de Acesso à Água — Programa Cisternas consiste na implantação de tecnologias sociais de captação de água da chuva, por meio de cisternas, e tem a finalidade de auxiliar a produção agrícola e a criação de pequenos animais. Esse programa representa uma solução de acesso a recursos hídri- cos para a população que sofre com os efeitos das estiagens prolongadas. Para participar dele, o indivíduo precisa estar cadastrado no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, residir na área rural e não ter abastecimento de água — ou ter acesso precário à água de qualidade. Além da tecnologia implementada, a família beneficiada recebe um conjunto de materiais para a própria produção, como sementes, mudas e capacitações (BRASIL, 2021; CONTI, 2009). Programa Bolsa Família O Programa Bolsa Família, criado em 2003 pelo então presidente Lula, contribui para o combate à pobreza e à desigualdade no Brasil. Nesse programa, as famílias beneficiadas recebem, todos os meses, um valor transferido direta- mente pelo Governo Federal, garantindo um alívio mais imediato da pobreza. Podem fazer parte do Programa Bolsa Família todas as famílias que tiverem uma renda per capita de até R$ 89,00 mensais ou famílias com renda per capita entre R$ 89,01 e R$ 178,00 mensais com crianças ou adolescentes de 0 a 17 anos. As famílias participantes recebem um cartão de saque, o Cartão Bolsa Família, emitido pela Caixa Econômica Federal (BRASIL, 2021). Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional 9 Para acessar o benefício mensal, as famílias precisam cumprir alguns compromissos que visam ao reforço do acesso à educação, à saúde e à assis- tência social. Na área da educação, as crianças e adolescentes devem estar matriculadas na escola, e a frequência escolar deve ser de, pelo menos, 85% das aulas (para estudantes na faixa etária de 6 a 15 anos) e de 75% das aulas (para a faixa etária de 16 e 17 anos). Na área da saúde, as crianças menores de 7 anos devem estar com as vacinas recomendadas em dia e com um acom- panhamento do crescimento e desenvolvimento. As gestantes devem fazer o pré-natal e consultas na unidade de saúde (BRASIL, 2021; CONTI, 2009). O programa Bolsa Família é dinâmico, ou seja, todos os meses famílias entram no programa e outras famílias saem. Como é necessário um controle, periodicamente famílias são retiradas dos programas por não atualizarem as informações cadastrais ou porque tiveram alguma melhora na renda mensal. E em famílias que descumprem os compromissos, o programa aplica efeitos gradativos, que vão de advertências, suspensão do benefício por um ou dois meses até o cancelamento do benefício. Programa Nacional de Alimentação Escolar O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) tem como objetivo ofe- recer alimentação escolar e ações de EAN a estudantes de todas as etapas da educação básica pública, contribuindo para a melhora dos hábitos ali- mentares e do desempenho de seu aprendizado. O PNAE consiste no repasse do Governo Federal para estados, municípios e escolas federais de valores financeiros para a cobertura de 200 dias letivos, conforme o número de alunos matriculados em cada rede de ensino. O valor do repasse é calculado para cada aluno, de acordo com a etapa e a modalidade de ensino, variando de R$ 0,32 para cada aluno da educação de jovens e adultos (EJA) até R$ 2,00 para cada aluno do ensino médio em tempo integral. Com a aprovação da Lei nº 11.947/2009, o PNAE tem uma grande importância no âmbito da SAN, pois 30% do valor repassado para cada escola deve ser investido na compra direta de produtos da agricultura familiar, estimulando o desenvolvimento das comunidades locais (BRASIL, 2021; CONTI, 2009). Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais O Programa de Fomento Rural foi criado em 2011 e tem como objetivo apoiar a estruturação produtiva das famílias rurais mais pobres e desenvolver o Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional10 projeto produtivo de cada uma dessas famílias, para que ampliem ou diver- sifiquem a produção de alimentos e as demais atividades geradoras de renda, melhorando a SAN e superando a situação de pobreza. O programa consiste no acompanhamento social e produtivo na elaboração de um projeto produtivo e na transferência direta de recursos financeiros às famílias, no valor de R$ 2,4 mil (para famílias com renda per capita mensal de até R$ 89,00) ou R$ 3 mil (para famílias com renda per capita mensal de até R$ 178,00 e que residem na região do semiárido), que devem ser investidos no desenvolvimento do projeto estruturado (BRASIL, 2021). Ação de Distribuição de Alimentos a grupos populacionais tradicionais e específicos A Ação de Distribuição de Alimentos (ADA) tem como objetivo distribuir, de forma gratuita, cestas de alimentos para grupos populacionais específicos em situação de insegurança alimentar e nutricional, para complementar as outras estratégias de fomento e acesso à alimentação. Os públicos-alvo dessa ação são as comunidades indígenas e quilombolas (BRASIL, 2021). Promoção do consumo de alimentos adequados e saudáveis A EAN é um campo de atuaçãoda SAN e da promoção da saúde considerada uma estratégia fundamental para o estímulo de hábitos alimentares mais saudáveis. A EAN busca promover a SAN por meio de ações educativas e troca de conhecimento permanente, interdisciplinar, intersetorial e multiprofissio- nal, estimulando a autonomia dos indivíduos e combatendo o desperdício de alimentos (BRASIL, 2021; CONTI, 2009). Diante do exposto, os programas governamentais da área da alimentação e nutrição pouco avançarão no cenário político atual, sendo necessário maior engajamento da sociedade civil, de organizações não governamentais e instituições importantes na área da saúde, principalmente as relacionadas com a nutrição e a alimentação, para que as temáticas SAN e DHAA se man- tenham vivas nas discussões públicas e na agenda governamental (MORAIS; SPERANDIO; PRIORE, 2020). Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional 11 Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional Conforme mencionado anteriormente, o SISAN foi criado a partir da Lei nº 11.346/2006 (LOSAN), pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O SISAN é um sistema de gestão intersetorial, participativa e de articulação dos três níveis de governo e das organizações da sociedade civil para implementação e execução da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PN- SAN), que envolve ações e programas estratégicos, como os mencionados neste capítulo. Garante, assim, o DHAA e a SAN dos diferentes segmentos da população brasileira (BRASIL, 2021; CONTI, 2009). Entre os objetivos do SISAN, podemos destacar os listados a seguir. � Formular, articular e implementar políticas, planos, programas e ações de SAN em âmbitos nacional, estadual e municipal. � Estimular a integração dos esforços entre as três esferas do governo e a sociedade civil. � Acompanhar, monitorar e avaliar as mudanças que ocorreram na área da alimentação e nutrição no país. � Verificar o impacto dos programas e ações de SAN sobre a população a qual se destinava determinada política. Conforme o Art. 9º da LOSAN (BRASIL, 2006, documento on-line), o SISAN tem como base as seguintes diretrizes: I. promoção da intersetorialidade das políticas, programas e ações governamentais e não governamentais; II. descentralização das ações e articulação, em regime de colaboração, entre as esferas de governo; III. monitoramento da situação alimentar e nutricional, visando a subsidiar o ciclo de gestão das políticas para a área nas diferentes esferas de governo; IV. conjugação de medidas diretas e imediatas de garantia de acesso à alimenta- ção adequada, com ações que ampliem a capacidade de subsistência autônoma da população; V. articulação entre orçamento e gestão; e VI. estímulo ao desenvolvimento de pesquisas e à capacitação de recursos humanos. Todos os Estados brasileiros e o Distrito Federal já aderiram ao SISAN. Dessa forma, caso haja algum município interessado na adesão, deverá verificar com a Câmara Intersetorial de Segurança Alimentar e Nutricional (CAISAN) ou com o Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional12 de cada Estado. A adesão ao SISAN oferece diversas vantagens, como a par- ticipação na articulação das políticas públicas voltadas ao alcance da SAN e do DHAA, organização e maior participação da sociedade civil na formulação e implementação de políticas referentes à SAN, facilitação do acompanha- mento e monitoramento de indicadores, programas e orçamento de SAN, além da promoção de cidadania, dignidade, saúde e qualidade de vida de sua população (BRASIL, 2021). Acompanhe a linha do tempo com todas as legislações pertinentes ao SISAN. � Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006: cria o SISAN para assegurar o DHAA e dá outras providências. � Decreto nº 6.272, de 23 de novembro de 2007: dispõe sobre as compe- tências, a composição e o funcionamento do CONSEA. � Decreto nº 6.273, de 23 de novembro de 2007: cria, no âmbito do SISAN, o CAISAN. � Emenda Constitucional nº 64, de 4 de fevereiro de 2010: altera o Art. 6º da Constituição Federal, introduzindo a alimentação como um direito social. � Decreto nº 7.272, de 25 de agosto de 2010: regulamenta a Lei nº 11.346/2006 que cria o SISAN, institui a PNSAN e estabelece os parâ- metros para a elaboração do PNSAN. � Medida Provisória nº 870 de 2019: o presidente Jair Bolsonaro editou a medida que altera as atribuições e estruturas dos ministérios, por meio da qual a LOSAN sofreu alterações, e extinguiu o CONSEA. O PNSAN é um instrumento que foi construído de forma participativa, envolvendo diversos setores do governo, que tem como objetivo o planejamento, a gestão e a execução da PNSAN. Para verificar o plano completo, faça uma busca por II Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional 2016-2019 (CAISAN, 2018). Referências BRASIL. Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006. Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN com vistas em assegurar o direito humano à alimen- tação adequada e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 2006. Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional 13 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11346. htm. Acesso em: 8 maio 2021. BRASIL. Ministério da Cidadania. Inclusão social e produtiva rural. Brasília: Ministério da Cidadania, 2021. Disponível em: https://www.gov.br/cidadania/pt-br/acesso-a- -informacao/carta-de-servicos/desenvolvimento-social/inclusao-social-e-produtiva- -rural. Acesso em: 8 maio 2021. CAISAN. II plano nacional de segurança alimentar e nutricional: PLANSAN 2016-2019: revisado. Brasília: CAISAN, 2018. Disponível em: http://www.mds.gov.br/webarquivos/ arquivo/seguranca_alimentar/caisan/Publicacao/Caisan_Nacional/PLANSAN%20 2016-2019_revisado_completo.pdf. Acesso em: 8 maio 2021. CONTI, I. L. Segurança alimentar e nutricional: noções básicas. Passo Fundo: IFIBE, 2009. FAO. O estado da segurança alimentar e nutricional no Brasil: um retrato multidimen- sional: relatório 2014. Brasília: FAO, 2014. FAO. The state of food security and nutrition in the world: transforming food systems for affordable healthy diets. Roma: FAO, 2020. FREITAS, A. C. História da segurança alimentar e nutricional no Brasil. Londrina: Edu- cacional, 2019. MORAIS, D. C.; SPERANDIO, N.; PRIORE, S. E. Atualizações e debates sobre segurança alimentar e nutricional. Viçosa: UFV, 2020. PINTO, J. N. Manual sobre segurança alimentar e nutricional. Coimbra: PAANE, 2013. Leituras recomendadas CERVATO-MANCUSO, A. M.; FIORE, E. G.; REDOLFI, S. C. S. Guia de segurança alimentar e nutricional. Barueri: Manole, 2015. SILVA, C. O. et al. Segurança alimentar e nutricional. Rio de Janeiro: Rubio, 2015. Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Políticas e programas em segurança alimentar e nutricional14
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