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CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAC Marcio Vinicius Gonçalves DISSERTAÇÃO: GINÁSTICA LABORAL NA INDÚSTRIA Propostas e diretrizes para implantação São Paulo 2006 2 Marcio Vinicius Gonçalves Dissertação de mestrado apresentada ao Centro Universitário SENAC, São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do grau de Mestre em Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente. Orientador: Osvaldo Luiz Gonçalves Quelhas, D.Sc. / Senac São Paulo 2006 3 Gonçalves, Márcio Vinicius G635g Ginástica Laboral na indústria: propostas e diretrizes para implantação / Márcio Vinicius Gonçalves -- São Paulo, 2006. 96 f. : il. Color.; 31 cm Orientador: Prof.Dr. Osvaldo Luiz Gonçalves Quelhas Dissertação (Mestre em Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente) - Centro Universitário Senac, Campus Santo Amaro, São Paulo, 2006. 1. Ginástica laboral 2. Indústria 3. Propostas e diretrizes I. Quelhas, Osvaldo Luiz Gonçalves (orient.) II. Título CDD 363.7 4 Marcio Vinicius Gonçalves Título: Ginástica laboral na indústria: Propostas e diretrizes para implantação. Dissertação de mestrado apresentada ao Centro Universitário SENAC, São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do grau de Mestre em Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente. Orientador: Osvaldo Luiz Gonçalves Quelhas, D.Sc. / Senac A banca examinadora dos trabalhos de conclusão em sessão pública realizada em 27 de março de 2007, considerou o candidato: Aprovado 1) Examidador: Prof. Dr Osvaldo Luiz Gonçalves Quelhas- Orientador 2) Examinador: Prof. Dr. Dorival Barreiros - Centro Universitário Senac 3) Examinador: Prof. Dr. Antônio José Caulliraux Pithon 5 DEDICATÓRIA A Dona Cice e ao Sr. José “Piracáia”, meus pais, pessoas de bem, que criaram 04 filhos para vencer ma vida, sem atropelar os percursos do caminho e a minha esposa Camila, eterna aluna, companheira e amiga, que soube dividir minhas dificuldades no desenvolvimento do curso com sua suavidade e alegria... te amo demais. 6 AGRADECIMENTOS Primeiramente a Deus, por permitir a realização de um sonho. A minha família, pais e irmãos que se estiveram comigo, dividindo cada passo realizado. A minha esposa Camila, que por várias noites dividiu seu tempo com minhas horas de estudo para este trabalho, mais do que isso, compartilhou minhas dúvidas e expectativas, manteve-se companheira e madura para apresentar sempre a palavra certa no momento certo, mostrando cada dia mais que de todas as escolhas feitas por mim na vida, ela foi a mais importante e principalmente, a mais certa. A meus colegas de turma, em especial ao Marcel, que tornou a exaustiva rotina mais agradável. Ao meu amigo de graduação Celso Diniz, que sempre esteve presente nos grandes acontecimentos de minha vida. A minha cunhada Sandra, que me ajudou de forma fundamental na digitação de meus manuscritos. Aos meus professores, em especial ao meu orientador, Osvaldo Quelhas, que muito contribuiu para este trabalho, a professora Alice Itami, que sempre nos ajudou no desenvolvimento do curso, aos professores da banca de qualificação que muito contribuíram para o enriquecimento deste projeto e a todos os colegas do Centro Universitário Senac, que a partir desta data, entram definitivamente na minha vida, e finalmente, aos sócios-proprietários da empresa em questão (Alpha), em especial à João Battistela, que formam fundamentais na concretização deste passo, que se não é o mais importante, é certamente, um dos mais especiais de minha vida. 7 “O Senhor é meu pastor, nada me faltará. Em verdes prados Ele me faz repousar. Conduz-me junto às águas refrescantes, restaura as forças de minha alma. Pelos caminhos retos Ele me leva, por amor do seu nome. Ainda que eu atravesse o vale escuro, nada temerei, pois estais comigo. Vosso bordão e vosso báculo são meu amparo. Preparai para mim a mesa à vista de meus inimigos. Derramais o perfume sobre minha cabeça, e transborda minha taça. A vossa bondade e misericórdia hão de seguir-me por todos os dias da minha vida. E habitarei na casa do senhor por longos dias.” (Heb. 23, Salmo de Davi) 8 RESUMO As discussões sobre assuntos relacionados à utilização de programas de ginástica laboral na indústria em relação a sua eficiência e aos pressupostos oferecidos, findam desde o final da década de 80. Com o aumento do ritmo de produção, vários fatores contribuíram para o surgimento de diversas síndromes ocupacionais. Seguindo esta situação, começou-se a discutir formas de minimizar os efeitos resultantes das altas cargas de trabalho, até mesmo porque, neste mesmo período houve a atenção mais clara das responsabilidades do empregador quanto à manutenção da saúde e bem estar do trabalhador. Entretanto com o passar dos anos criou-se um pré-conceito da atuação do profissional da área de ginástica laboral. Diferentemente da proposta original, a GL passou a ser utilizada como ferramenta de trabalho para melhoria nos indicadores internos da fábrica, para tanto, tornou-se necessário que se criassem regras e indicadores que possibilitassem justificar tal condição. Indo em contra este conceito, buscou-se neste trabalho identificar premissas básicas que possibilitassem a criação de um modelo para elaboração de um PGL, cujo a idéia fundamental não resulta em atingir melhoria em indicadores, mas sim de garantir a implementação de um programa capaz de promover a simples ação de sensação de melhoria no ambiente de trabalho, resultante da atividade física compensatória executada no ambiente de trabalho. Este trabalho utilizou-se de um modelo de pesquisa realizado em uma pequena empresa do estado de São Paulo, de atuação na área metalúrgica, mais especificamente, ferramentaria. Os dados registrados serviram apenas para elucidar as técnicas e controles de variáveis apresentados, não influenciando nos objetivos propostos no tema. 9 ABSTRACT Discussions about the use of labor gymnastics programs in industry as well the efficiency in relation to achieves has began since the end of the 80’s. With the increase of production rhythm, some factors had contributed for the sprouting of many occupational syndromes. Following this situation, people started to argue forms of diminishing the resultant effects of high loads of work, even because at that exactly time, public opinion pay much more attention to the responsibilities of employers about health and welfare of employees. However, 20 years later, some preconceptions of professional performance of labor gymnastics area was created. Differently of the original proposal, labor gymnastics were now to be used as a tool to improve internal schedules of the company, which leads to the creation of rules to justify such condition. To put this concept down, we try to identify in this work basic premises that made possible the creation of a new Labor Program to Gymnastics, whose basic idea does not result in better results but to guarantee the implementation of a program capable to promote the sensation of improvement at the environment of work, as a consequence of compensatory physical activities. 10 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO 1. Considerações iniciais .......................................................................................... 12 1.1. Situação Problema ................................................................................................13 1.2. Questões de pesquisa ............................................................................................ 14 1.3. Importância do estudo .......................................................................................... 15 1.4. Objetivos do trabalho ............................................................................................ 15 1.4.1. Objetivo Geral .............................................................................................. 15 1.4.2. Objetivos específicos ................................................................................... 15 1.5. Limitações do estudo ........................................................................................... 16 1.6. Estrutura da dissertação ......................................................................................... 16 2. CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA ......................................................................... 16 3. REVISÃO DA LITERATURA ................................................................................... 18 3.1. Análise do trabalho em relação aos pressupostos ergonômicos ............................ 18 3.2. Histórico e reconhecimento .................................................................................. 19 3.3. Histórico brasileiro e reconhecimento .................................................................. 21 3.4. Contextualização social do fenômeno .................................................................. 22 3.5. Concepção da ergonomia ..................................................................................... 23 3.6. Cargas de trabalho ................................................................................................ 24 3.7. Discriminação da carga de trabalho ..................................................................... 25 3.8. Métodos e técnicas da intervenção ergonomizadora ............................................ 26 3.8.1. Principais tipos de pesquisas usadas em ergonomia .................................... 26 3.8.2. Método de pesquisa ..................................................................................... 28 3.8.3. Pesquisa em ergonomia ............................................................................... 38 3.8.4. Escolha das variáveis .................................................................................. 40 3.8.5. Controle das condições experimentais ........................................................ 43 3.8.6. Fatores contributivos ................................................................................... 45 3.8.7. Características do adoecimento ................................................................... 49 3.8.8. A dor como manifestação predominante...................................................... 49 11 3.8.9. As limitações funcionais............................................................................... 50 3.8.10. Os estágios e suas características................................................................ 52 3.9. LER/DORT na indústria ...................................................................................... 54 3.10. Prevenção de LER/DORT ................................................................................. 55 3.10.1. A ergonomia e a prevenção de LER/DORT ............................................... 58 3.10.2. Causas/ Fatores de risco................................................................................ 60 3.11. Ginástica Laboral como proposta preventiva de LER/DORT ........................... 60 3.12. Histórico mundial e brasileiro da ginástica laboral............................................. 60 3.13. Definições ........................................................................................................... 62 3.14. Treinamento de força ......................................................................................... 64 3.15. Áreas de penetração ........................................................................................... 66 3.16. Efeitos fisiológicos atribuídos a ginástica laboral .............................................. 67 3.17. Ginástica laboral e a influência da recreação ..................................................... 69 3.18. A proposta da ergomotricidade .......................................................................... 71 3.19. Os profissionais que atuam com a ginástica laboral .......................................... 71 3.20. Qualidade de vida no trabalho ........................................................................... 72 3.21. Síntese da revisão da literatura .......................................................................... 74 4. ESTRATÉGIA DE PESQUISA .................................................................................. 76 5. APRESENTAÇÃO DE PROPOSTA REFERENCIAL DE PESQUISA DE CAMPO: Estudo da implantação de ginástica laboral em pequena empresa de ferramentaria ................................................................................................................. 77 5.1. Caracterização do projeto e da empresa ................................................................. 77 5.2. O problema estudado na experiência ..................................................................... 78 5.3. Objetivo contextual ................................................................................................ 79 5.4. Implementação do PGL.......................................................................................... 79 5.5. Análise dos resultados ........................................................................................... 80 5.6 Considerações finais do estudo .............................................................................. 84 6. CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÃODE NOVAS PESQUISAS ........................... 86 12 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 90 8. APÊNDICE 13 1 INTRODUÇÃO 1. Considerações iniciais A vida do homem moderno, notadamente nos grandes centros urbanos, está cada vez mais voltada ao enfrentamento de situações críticas no tocante às suas necessidades básicas, tais como alimentação, moradia, transporte, ensino, saúde e a própria manutenção do emprego, situações estas, geradoras de estresse. A administração deste estresse tem se mostrado uma ferramenta vital nas novas técnicas de administração empresarial, no entanto, a melhoria dos níveis de qualidade de vida é hoje fator diferencial entre as empresas na competição por produtividade, qualidade e desempenho comercial. Marano (1990), destaca a qualidade na saúde como fator essencial na gestão administrativa, nesse sentido, os esforços para a compreensão do homem no trabalho e do contexto onde está inserida sua atividade são essenciais. A valorização do pensamento e atitudes preventivas em todas as esferas dos setores produtivos são fundamentais quando reconhecidas como condicionantes importantes para melhores resultados (IIDA, 1990). Dentre os aspectos citados, a Ergonomia surge como matriz ante os diversos programas, siglas e propostas de soluções para melhoria qualidade de vida do trabalho (QVT) e melhores resultados no sistema produtivo, relacionado neste caso ao absenteísmo. O homem desde o primórdio de sua jornada de trabalho até hoje vem sofrendo com evoluções cada vez mais perceptíveis e maçantes à sua vida diária. Desde o tempo da Revolução Industrial até hoje, a jornada de trabalho excessiva torna o homem cada vez mais adepto ao sedentarismo, gerando ao mesmo uma série de problemas de saúde, provocando assim, uma diminuição significante em sua qualidade de vida. Por volta da década de 90, onde a demanda da carga de trabalho era maior e mais intensa,surgiram diversas situações desfavoráveis a saúde do trabalhador, que por ventura apresentam menos tempo para a prática de atividade física, tornando o indivíduo predisposto a vários tipos de lesões ou distúrbios relacionados a LER/DORT, normalmente caracterizados pelo alto ritmo no trabalho e esforços repetitivos. Desde o término da Revolução Industrial até o presente momento o foco de preocupação torna-se a saúde do trabalhador. Nesse contexto surgiu à ginástica laboral com ações diretas e especificas a promoção da saúde do funcionário, prevenido, tratando e reabilitando o índice do surgimento de doenças ocupacionais. Várias empresas foram 14 evoluindo aos poucos com a preocupação de melhorar o rendimento laboral e a qualidade de vida dos trabalhadores. Torna-se objetivo desse presente estudo, verificar se as empresas incentivam os trabalhadores à prática de atividade física. Cabe, no entanto ressaltar que, apesar de não serem recentes, os estudos relacionados à pesquisa ergonômica ainda carecem de uma legislação regulamentadora. Evidentemente que dentro da norma regulamentadora 17 (NR17) encontra-se a citação da análise ergonômica, entretanto, não especifica dentre suas determinações, limites comparativos, bem como a sua abrangência, o que possibilita uma enxurrada de variáveis dentro de um único programa. Certamente, a análise aprofundada de todas as condicionantes psicossociais, organizacionais, ambientais e as características individuais de quem trabalha, devem trilhar os caminhos da prevenção, todavia, é fundamental que se estabeleçam limites e determine-se a abrangência de assuntos relacionados, uma vez que não são claros os critérios para se estabelecer o que é certo ou errado em ergonomia, no entanto, há sim a interpretação do “achismo” de alguns autores sem a menor preocupação de um resultado, bem como a grande maioria de programas de ginástica laboral (GL) que findam exclusivamente em operação mercantilista. 1.1. Situação problema Os centros industriais das grandes cidades são um universo de demandas com relação às diferentes formas de analisar e compreender o sistema produtivo. Devido à grande competitividade que atingiu o mercado mundial através da globalização, as empresas tornaram- se reféns da necessidade de adaptação a todas as novas tecnologias que se apresentem, bem como a investimentos constantes em pesquisa e reengenharias. Desde o término da Revolução Industrial até o presente momento o foco de preocupação torna-se a saúde o trabalhador. O advento de novos processos trouxe em seu bojo mudanças consideráveis no ambiente de trabalho, a era da informática e da tecnologia veio acentuar essas mudanças e catalisar suas conseqüências ao homem. Os tempos modernos impuseram uma nova rotina aos trabalhadores, que geralmente apresentam vida sedentária, e que durante a jornada de trabalho realizam movimentos repetitivos com uso e desuso incorreto da musculatura, posicionamento errôneo por passar horas na mesma posição, enfim, a grande jornada de trabalho deixa marcas no organismo. Como resposta, foi desenvolvida a Ginástica Laboral objetivando o melhoramento do desempenho dos trabalhadores durante a jornada de trabalho. As profissões 15 mais propícias a essas modificações são aquelas em que se realizam o mesmo movimento em alta freqüência, com ou sem o uso de força e má-postura. Bompa (2002), ressalta que, estatísticas atuais apontam que cerca de quatro milhões de brasileiros são submetidos a tratamentos em razão de dores provocadas pela postura incorreta no trabalho e pela pressão diária de situações de competitivas, desta forma, surge à necessidade da implementação de atividades que atuem direta e especificamente na prevenção de doenças no sistema muscular e nervoso dos trabalhadores. A crescente preocupação das empresas com a saúde e desempenho dos funcionários faz da Ginástica Laboral uma ótima oportunidade de trabalho para os profissionais habilitados no programa de prevenção e reabilitação da saúde do trabalhador, podendo ser útil às organizações para a melhoria da produtividade, entretanto, deve merecer cuidado quanto à avaliação dos resultados de sua utilização. A ginástica laboral deve ser considerada recurso proveniente do diagnóstico e da intervenção ergonômica. Já o estudo ergonômico tem como meta melhorar as condições do trabalhador em relação ao posto de trabalho, entretanto, em alguns casos, este tipo de “programa” tem sido explorado de maneira mercadológica, bem como seus subprodutos, como exemplo à ginástica laboral. Campos (1985), declara que a atuação da ginástica Laboral consiste em duas fases: 1° na fase curativa, onde a doença já está instalada no organismo, sendo o foco a reabilitação do individuo; e a 2° fase preventiva, onde a atuação da laboral e prevenir o surgimento ou instalação de doenças. Vários estudos forma apresentados para promover a discussão sobre a importância da implantação da ginástica laboral na empresa, entretanto, ainda necessitam de maior reconhecimento e caracterização científica, uma vez que, até os dias atuais ainda não há norma específica para a regulamentação do profissional da área ergonômica. 1.2. Questão de pesquisa Para alinhar o pensamento crítico deste trabalho com as fundamentações teóricas e com os objetivos da pesquisa, apresenta-se a questão que norteia o trabalho de campo e as conclusões: Quais etapas são fundamentais na implantação de um programa de ginástica laboral na indústria e quais as premissas básicas? 16 1.3. Importância do estudo A implementação da ginástica laboral da empresa busca a diminuição dos acidentes de trabalho, bem como de síndromes e distúrbios relacionados ao exercício contínuo do laboro (DORT), bem como, do estresse e do absenteísmo, buscando sempre a promoção da saúde, do trabalho e da qualidade de vida. Atuando na prevenção de doenças ocupacionais, a estratégia da utilização da ginástica laboral busca ainda a diminuição de acidentes de trabalho, proporcionando ao trabalhador um incentivo a mais à prática de atividade física. As empresas podem incentivar a prática de exercício físico dentro e fora do local de trabalho, com propostas que efetivam a produzir efeitos positivos no combate ao sedentarismo e em suas conseqüências imensuráveis à saúde do empregado. Credita-se a relevância deste estudo quanto à contribuição que pode proporcionar as metodologias de intervenção ergonômica e, explicitamente, quanto ao uso da ferramenta ginástica laboral. Busca-se ainda oferecer mais um trabalho de conteúdo científico, do qual, apesar das limitações e restrições, serve de objeto de análise para novas pesquisas relacionadas ao assunto. 1.4. Objetivos do trabalho 1.4.1. Objetivo geral Em um aspecto mais amplo, trata-se da compreensão da relação de instrumentos necessários à implantação de programas relacionados à ergonomia e da ginástica laboral quanto aos pressupostos oferecidos. 1.4.2. Objetivos Específicos Promover um estudo capaz de identificar todas as fases básicas para a implantação de um programa ergonômico com vistas à melhoria nos indicadores internos na indústria. Identificar as premissas básicas para implantação de um programa de ginástica laboral, cujo plano de atuação busca minimizar os efeitos de síndromes ocupacionais. 17 1.5. Limitações do Estudo São associadas especificamente ás condições de pesquisa. Os estudos realizados são baseados na revisão da literatura e na análise da experiência onde está colocado o foco na prática da aplicação da ginástica laboral em relação às premissas identificadas no estudo ergonômico, entretanto, se limitam a delinear ações instrumentais e metodológicas que possibilitem a implantação de programas relacionados ao assunto em questão, não abordando uma questão específica, cujo objetivo e conclusão seriam factíveisde análise. 1.6. Estrutura da Dissertação No capítulo I, encontram-se as considerações iniciais, bem como, os motivos e a situação geradora da pesquisa. No capítulo II faz-se a contextualização do tema, servindo como abertura para revisão da literatura apresentada no capitulo III. No capítulo seguinte (IV), apresenta-se à estratégia de pesquisa utilizada no projeto e no capítulo V discute-se a estrutura da empresa e os requisitos que possibilitaram a pesquisa. Por fim, apresenta-se a conclusão no capitulo VI e no capítulo VII o referencial bibliográfico para sustentabilidade do trabalho. 2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA Algumas definições encontradas sobre LER/DORT simplificam sua origem multifatorial fazendo associação a um fator de risco, em especial a repetitividade de movimentos. A definição presente na Norma Técnica (ordem de serviço 606 de 05/08/98) do INSS (1998), conceitua como uma “síndrome clínica caracterizada por dor crônica, acompanhada ou não de alterações objetivas e que se manifesta principalmente no pescoço, cintura escapular e/ou membros superiores em decorrência do trabalho, podendo afetar tendões, músculos e nervos periféricos”. Associa-se a estes fatores um complicador: o tempo insuficiente para a recuperação do tecido músculo-esquelético. 18 Sobre o freqüente acometimento da função, Moraes (1998), afirma que tais desordens “são entidades patológicas em que as funções e a configuração do sistema músculo-esquelético estão fora do normal”. Existem registros atuais sobre afecções de origem ocupacional em membros inferiores, em especial com manifestação nos joelhos (DEJOURS, 1992). Para Caillet (1999), os distúrbios musculoesqueléticos relacionados ao trabalho são definidos como “compensação dos trabalhadores” frente às condições produtivas a que estão sujeitos. Na mesma linha, Pollock (1993) e Alves & Minayo (1994) destacam o trabalhador em atividade e suas regulamentações. Bompa (2002), em sua abordagem sobre LER/DORT, define como sendo o “nome dos distúrbios de origem ocupacional que atingem dedos, punhos, antebraços, cotovelos, braços, ombros, pescoço e regiões escapulares, resultantes do desgaste muscular, tendinoso, articular e neurológico provocado pela inadequação do trabalho ao ser humano que trabalha”. Galafassi (1999) define LER/DORT como sendo “patologias que se instalam insidiosamente em determinados segmentos do corpo, e que são conseqüência do trabalho”. 19 3 REVISÃO DA LITERATURA 3.1. A análise do trabalho em relação aos pressupostos ergonômicos As manifestações somáticas em quem trabalha são um grito de alerta, mostrando que não é o homem quem está doente, mas sim o trabalho. (SALLES, 1991). O trabalho é uma necessidade humana, ou seja, um processo entre o homem e a natureza que está determinado pela forma concreta em que se dá a produção, distribuição, intercâmbio e consumo dos meios de vida pelos diferentes grupos humanos. O trabalho implica em um processo de reprodução social. (FIALHO, 1995). Portanto, a compreensão do “trabalhar”, do “produzir”, no sentido mais amplo e irrestrito, parece fundamental. Dangelo & Fattinni (1998), Campos (1985) e Capra (1988) destacam as bases que fundamentam o trabalho e suas relações com os distúrbios musculoesqueléticos, onde os trabalhadores são submetidos a um trabalho que não é organizado por eles e para eles, mas dentro dos princípios tayloristas e suas características. As potencialidades intelectuais são colocadas em segundo plano e as condições de trabalho inibem as relações humanas, o que pode levar a fragilização afetiva e intelectual de quem o executa. Nesta mesma linha, Couto (1978) afirma que o homem procura sua realização por meio do trabalho e é na ação transformadora que encontra momentos de satisfação, de realização de seus projetos. No momento em que ele completa um projeto qualquer, realiza uma vontade e isso o faz feliz, estimulando-o a iniciar um projeto. A problemática reside no fato de que o trabalhador de hoje realiza atividades que não são projetos seus, como também não são seus os frutos dos esforços. Longe de ser criativo, o trabalho que desenvolve torna-se opressivo e estafante. Ferreira (1999) estudando as relações entre ergonomia e psicodinâmica, em abordagem sobre as relações do homem com o trabalho, destacam que prazer e sofrimento são uma vivência subjetiva do próprio trabalhador, compartilhada coletivamente e influenciada pela atividade de trabalho. Nessa perspectiva analítica, todo o trabalho veicula implicitamente um custo humano que se expressa sob a forma de carga de trabalho, e as vivências de prazer e sofrimento têm como um dos resultantes, o confronto do sujeito com essa carga que, por conseguinte, é conflitante com o seu bem-estar. Segundo Zilli (2002), atualmente LER/DORT constitui um tema de preocupação central em bom número de países industrializados. Acrescentam ainda, que quando ocorram às 20 primeiras correlações sobre a cadência imposta e o estresse ligado ao trabalho, pensava-se que as atividades caracterizadas pelas tarefas repetitivas iriam diminuir com o passar do tempo, o que levaria a uma redução de seus efeitos negativos, inclusive LER/DORT. Mas, tem ocorrido o que se pode chamar de inversão de expectativas. O que se verifica é que esse fenômeno continua sendo um dos principais problemas relacionado ao trabalho. O mercado atual prioriza a diminuição dos custos de produção, com menor investimento em mão de obra e visa o aumento da produtividade. Para isso, introduz novas formas de organização, novas tecnologias e equipamentos. Na prática, isso pode trazer limitação da autonomia dos trabalhadores sobre os movimentos do próprio corpo e redução de sua criatividade e liberdade de expressão nas atividades que desenvolve. O enfoque dado ao trabalho na maioria das vezes, também ajuda a explicar a gênese dos conflitos do ser humano com o trabalhar, isto fica evidente nesta reflexão de Chamlian (1999): Sempre causa espanto quando são mostradas no espaço público, as atividades desenvolvidas pelos trabalhadores, nas mais diversas profissões e ambientes de trabalho. Mais grave ainda, é que quando se trata do trabalhar a referência é ligada à produção e, de uma maneira mais restrita, ao resultado. Resultado este que poderia ser considerado como a síntese de tudo que é feito pelos mais diversos atores da produção, mas que jamais retrata o que as pessoas fizeram para produzir. 3.2. Histórico e Reconhecimento Os primeiros estudos relacionados e comprovados sobre aspectos ergonômicos, tem rgistros datados a partir do início do século XVIII, onde, segundo Gonik (1991) e Enoka (1995), Charles Bell, em 1833, descreve a “câimbra do escrivão”, caracterizada pela alta incidência de espasmos na mão e em 1882, Robinson cita a “câimbra do telegrafista” e notou sua semelhança com a emergente “câimbra do escrivão”. Em 1895 a tendinite das estruturas do primeiro compartimento dorsal da mão foi mencionada por Fritz DeQuervain como “entorse das lavadeiras”, ao detectar o quadro em mulheres que lavavam a roupa com conseqüente desgaste sobre os tendões e músculos do polegar (CHEREM, 1998). Cherem (1998), cita ainda os relatos da adolescente Miles Franklin, em 1901, fazendo menção de queixas ou supostas lesões relacionando-as com a atividade desenvolvida: Entre os pequenos fedelhos, assim que crescem o suficiente para carregar o balde, aprendem a tirar o 21 leite. Assim suas mãos se acostumam com o movimento, e isto não os afeta. Conosco era diferente. Sendo quase adultos quando começamos a tirar o leite, e só então mergulhamos pesadamente neste exercício, um efeito doloroso caía sobre nós. Nossas mãos e braços, até os cotovelos inchavam, de maneira que o nosso sono era constantemente interrompido pela dor. Na Itália, em 1902, uma comissão especial definiu como doençaocupacional aquela causada diretamente por atividades desenvolvidas exclusivamente no campo de determinada profissão ou decorrente da tarefa executada (BUSCHINELLI 1993). Existem registros de que em 1908 “ a câimbra do telegrafista” foi incluída na lista de doenças cobertas pela previdência social britânica (British Workman’s Compensation act), que levou à criação de um comitê pelo Departamento dos Correios da Inglaterra e Irlanda (PALMER, 1976). O Ministério do Trabalho do Japão, em 1964, estabeleceu recomendações normativas relacionadas a limites para repetitividade e ritmo de trabalho, período de exposição diária, período de tempo máximo de atividade ininterrupta e período mínimo de tempo para recuperação (MARTINS & DUARTE, 2000). Mais recentemente, em 1974 a Japan Association of Industrial Health, fixou a denominação de Occupacional Cervicobrachial Disorder (O.C.D.), para as patologias relacionadas com movimentos repetitivos dos membros superiores (GALDINO FILHO, 1998). Na Austrália, nos anos 80, ocorreu um fenômeno por muitos chamado de “febre epidêmica”, com relação às LER/DORT, lá então denominada “neurose ocupacional”, o que levou a um determinado esforço para não se discutir a questão. Foi estabelecida uma moratória, em 1987, que por muitos anos impediu a publicação de artigos sobre LER/DORT no Medical Journal of Australia, e no mesmo ano, o Australian Public Service interrompeu a publicação dos registros de incidência de lesões (RANNEY, 2000). Em 1985, o Australian Council of Hand Surgery aprovou algumas resoluções referentes às lesões, chamando-as de “neurose ocupacional” e “síndrome da fadiga reversível”, no entanto os trabalhadores continuaram a sofrer lesões e muitos proeminentes cirurgiões de mãos não concordaram com essas resoluções. O problema foi amplamente discutido e as resoluções não foram aprovadas com apoio unânime (RANNEY, 2000). Ainda neste mesmo ano, a OMS classificou as “doenças relacionadas ao trabalho” (worked-related diseases), como multifatoriais, considerando existirem vários fatores envolvidos na gênese destas lesões. Em 1986, Fry 22 apresenta a hipótese da “overuse syndrome” – síndrome do uso excessivo, a partir de pesquisas clínicas realizadas com músicos (GOMES, 2002). 3.3. O Histórico Brasileiro e o Reconhecimento Entre outros dados históricos o reconhecimento como doença profissional no Brasil, em 6 de agosto de 1987, através da portaria 4062, em especial das tenossinovites, levou a um grande aumento sazonal do registro de casos no final da década de 80. (COUTO, 1995). Esse reconhecimento ocorreu para atender a reivindicação dos sindicatos e embora utilizasse a expressão “tenossinovite do digitador”, estendia a possibilidade do reconhecimento das outras categorias profissionais que “exercitam os movimentos repetidos dos punhos” (DEJOURS, 1992). Segundo Marano (1990), entre os anos de 1986 e 1990, houve um processo de análise e discussão sobre o trabalho de processamento de dados, envolvendo o Sindicato de Empregados de Empresas de Processamentos de Dados (SINDPD), Delegacia Regional do Trabalho de São Paulo (DRT/SP), entre outras entidades. Em fevereiro de 1987, o SINDPD/SP organizou uma Semana de Saúde, com a participação de várias entidades para uma discussão com os trabalhadores sobre os problemas relacionados ao trabalho em processamento de dados, sendo lançado, nessa ocasião, um Manual sobre Doenças Profissionais em Processamento de Dados, provavelmente o primeiro a ser publicado sobre o tema no Brasil. Para Cunha (1992), como as atividades de processamento eletrônico de dados vinham sendo estudadas no Brasil desde 1984 e no exterior há muito mais tempo, muita informação e conhecimento já haviam sido produzidos, explicando o envolvimento histórico dessa classe no reconhecimento e normatização de LER/DORT. Marano (1990), afirma que “a primeira versão da NR-17 foi elaborada durante o governo militar, portanto, sem nenhuma discussão com os diversos atores sociais interessados, limitando as ações das DRT’s à aplicação de multas”. Os primeiros passos naquela época apresentavam um aspecto bastante positivo quanto ao comportamento e enfrentamento da problemática, visto que as irregularidades identificadas nas inspeções das DRT’s em empresas de processamento de dados eram inicialmente discutidas em uma mesa de negociação composta pelos representantes da empresa e dos trabalhadores e técnicos das DRT's que desempenhavam papel de mediadores. Tais negociações resultavam em um compromisso entre as partes, de aspecto mais abrangente que os encontrados na norma vigente até então. 23 A NR-17 incluiu medidas preventivas especialmente para as atividades de processamento eletrônico de dados e estabelece o dever do empregador em adotar medidas, tais como: introdução de pausas de descanso, adequação de máquinas e mobiliários e a realização de estudo ergonômico para a redução da incidência das lesões. Essa norma teve o grande mérito de ter envolvido amplos setores sociais na sua elaboração e ter sido o resultado de um consenso social. A profusão de textos, incluindo contribuições externas terminou gerando, progressivamente, uma espécie de colagem de textos, de forma que a despeito de algumas valiosas contribuições, perdia-se a dimensão do todo, chegando a ponto da contradição explícita de conteúdo entre tópicos, que deveriam estar bem sintonizados (Revista CIPA, 1996). Segundo Martins & Duarte (2000), com o objetivo de uniformizar sua conduta e regulamentar os procedimentos e metodologia para fins de avaliação pericial, o INSS do Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS) publicou em nove de julho de 1997, no Diário Oficial da União, uma minuta para atualização da Norma Técnica sobre as LER. Essa minuta se propõe a atualizar a norma anterior, alterando inclusive a denominação das Lesões por Esforços Repetitivos (LER) para Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT). 3.4. Contextualização Social do Fenômeno A grande diversidade de aspectos envolvidos na compreensão das LER/DORT tem sido objeto de atenção há alguns anos no Brasil e no mundo. Frente à complexidade dos fatores contributivos envolvidos na gênese deste fenômeno, a sociedade busca soluções e adequações de toda a sorte, que passam por diversos ramos de atividade e do conhecimento. A luta pela compreensão aprofundada sobre as queixas dos trabalhadores e suas conseqüências, inicialmente foco da atenção apenas de profissionais da segurança e da saúde do trabalho, no decorrer da evolução histórica, passa a ser preocupação também de sindicatos, empresários, governo, ONG’s, pesquisadores, associações de trabalhadores lesados, poder judiciário, entre outros. Para Ferreira (1999), este fenômeno chamou mais atenção quando adquiriu a característica de ocorrer em diferentes processos produtivos, particularmente a partir das mudanças tecnológicas e organizacionais dos últimos 30 anos. Tais transformações foram induzidas pela automatização e informatização da produção, além das diferentes formas de gestão da força de trabalho que acompanham os processos de reestruturação produtiva no mundo globalizado, com conseqüências marcantes para aqueles que desenham o trabalho e, sobretudo para quem o executa. 24 Sobre um prisma sistêmico, o fenômeno LER/DORT tem aspectos sociais amplos, que ultrapassam os limites da doença e suas conseqüências e manifestações. Sato (1993), com base em um estudo de caso de um trabalhador acometido, acompanha o movimento da consciência do mesmo. Conclui o autor, que a autoconsciência desse trabalhador sofre um processo de transformação ao encontrar interlocutores que o reconheçam como pessoa e dêem espaço para refletir sobre sua condição de trabalho e de vida, dando novo significado à sua história. Mendes (1986) focaliza o processo de construção social da militânciade trabalhadores vitimados através do caso de uma associação de portadores das lesões. Em ambos os estudos, está presente a constatação de que a vivência como portador de LER/DORT e a interação em ambientes sociais confirmadores dessa percepção são situações facilitadoras para a emergência de sujeitos com a potencialidade para transformar os contextos de vida e os scripts socialmente definidos. Para Sato (1993), “são essas relações interpessoais e sociais compreensivas e solidárias que possibilitam criar um substrato para práticas coletivas e individuais que questionem os papéis sociais”. 3.5. Concepção da Ergonomia De acordo com Couto (1996), é um conceito crítico sem o qual a Ergonomia não pode ser entendida. O conceito de sistema já era utilizado por outras disciplinas, antes da Ergonomia utilizá-lo. Sua aplicação na ergonomia possibilitou o desenvolvimento de uma estrutura conceitual formal. No contexto da Ergonomia, o conceito de sistema significa que o desempenho humano no trabalho só pode ser corretamente conceituado em termos do todos organizado e que, para o desempenho do trabalho, este todo organizado é o sistema homem-máquina. Para Wisner (1994), tal definição ainda guarda certo grau de generalidade. Cabe adicionar algo que, poderíamos dizer, seriam requisitos para qualquer entidade ‘sensu lato’ ser considerada um sistema: Segundo um plano ou princípio: envolve o conceito de organização. Sabendo que em tudo no nosso universo há uma tendência a catamorfose, a idéia de organização, inerente ao sistema, procura ir contra esta tendência, no sentido de um equilíbrio ou do desenvolvimento, a anamorfose. Atingir um determinado fim: a interação entre as partes visa a um determinado fim. (IIDA, 1990). Enfatiza-se aqui o sentido teleológico, isto é, de relacionamento das partes com um fim, ou objetivo. 25 Explicitam-se, assim, os seguintes conceitos: Sinergia: ato ou esforço coordenado de vários órgãos na realização de uma função, associação simultânea de vários fatores que contribuem para uma ação coordenada; Holismo: tendência que se supõe seja própria do universo de sintetizar unidades em totalidades organizadas; Teleologia: estudo da finalidade, estudo dos fins humanos, doutrina que considera o mundo como um sistema de relações entre meios e fins – da abordagem de sistemas; Anaformose: corresponde à mudança no estado de um sistema tendendo ao desenvolvimento, à organização crescente – evolução contínua, sem etapas descontínuas ou saltos. A situação inversa é a catamorfose. Esta idéia de todo – holística, sinergética e teleológica – é à base da filosofia de sistemas que utiliza dentre os mais diversos campos do conhecimento. 3.6. Cargas de trabalho Enoka (2002), define carga de trabalho como “uma medida quantitativa ou qualitativa do nível de atividade (mental, sensório-motriz, fisiológica, etc.) do operador, necessária à realização de um trabalho dado”. Diz Couto (1995), em complementação: “a carga de trabalho deve ser distinguida das exigências e constrangimentos da tarefa, isto é, da quantidade e qualidade do trabalho e das limitações impostas”. Tem-se, portanto, que dos constrangimentos da tarefa resulta a carga de trabalho. A) Condicionantes da carga de trabalho A partir da proposição da Comissão de Pesquisa de Medicina do Trabalho da Organização Holandesa de Saúde (CARGO), Helfenstein (1988), discrimina do seguinte modo a carga de trabalho: Carga externa: será determinada pela combinação dos fatores que são inerentes à situação de trabalho e que causam reações no homem (ambiência física, operacional, organizacional); Carga funcional: significa a combinação dos fenômenos implicados na carga externa, com as exigências e constrangimentos da tarefa, com o desempenho das atividades da tarefa; Capacidade de trabalho: significa a maior energia possível que o homem é capaz de dispender de um dado modo de trabalho durante certo período de tempo; Grau de carga / carga de trabalho: é a relação entre a carga funcional e a capacidade de trabalho. 26 A partir de Alves & Minayo (1994), pode-se afirmar que carga de trabalho é a relação entre constrangimentos impostos pela tarefa, pela interface, pelos instrumentos e pelo ambiente (carga funcional), em conjugação com as atividades desempenhadas e a capacidade de trabalho do operador. Mais ainda: estas mesmas condições, além de determinarem a carga de trabalho, influenciam na performance do sistema – o rendimento do trabalho, a produtividade e a qualidade. Logo, para incrementar a produtividade e a qualidade deve-se melhorar as condições de trabalho. A carga de trabalho é expressa quantitativamente através dos índices fisiológicos (batimentos cardíacos, impulsos elétricos nos músculos, consumo de oxigênio, temperatura corporal). Resultam da carga de trabalho os custos humanos do trabalho, que se expressam em sintomas físicos e psíquicos, doenças profissionais e do trabalho, acidentes com morte, mutilações e lesões permanentes ou temporárias. B) Os três aspectos da carga de trabalho De acordo com Wisner (1994), todas as atividades – entre elas, o trabalho – possuem ao menos três aspectos: o físico, o cognitivo e o psíquico. Cada um deles pode determinar uma sobrecarga ou um sofrimento. Tais aspectos encontram-se inter-relacionados, o que torna freqüente, embora não necessário, que uma sobrecarga em um dos aspectos seja acompanhada por uma carga bastante elevada nos outros dois. Se a definição dos dois primeiros aspectos é bastante evidente, tal não ocorre para a dimensão psíquica. Esta última pode ser definida em termos de níveis de conflitos no seio da representação, consciente ou inconsciente, das relações entre a pessoa (ego) e a situação (no caso, a organização do trabalho). Mas este é, também, o nível em que o sofrimento e a fadiga física, a falta de sono, provocados pela distribuição dos períodos de trabalho no ritmo circadiano e a sobrecarga de trabalho cognitivo podem determinar alterações de ordem afetiva. 3.7. Discriminação da carga do trabalho Cumpre ainda observar que não existe, ao contrário do se difunde, atividade em que se coloque em jogo apenas o físico, a cognição e/ou a psique. Mesmo com diferentes ênfases, os três aspectos estão sempre presentes. Tem-se constatado freqüentemente que os trabalhadores que desempenham tarefas com carga mental predominante queixam-se de perturbações físicas, tais como dores nas costas e no pescoço e perturbações visuais (pruridos e sensações de queimadura oculares, etc.). Tais 27 perturbações estão relacionadas com o alto grau de imobilidade exigido pela tarefa aliado a uma forte concentração mental. Fialho (1995) demonstrou que, para as operadoras da indústria eletrônica, a rigidez da postura aumentava com a dificuldade da tarefa e com o aumento do ritmo de trabalho. Constatou ainda que, nessas condições, a cabeça tendia a se aproximar da tarefa. Em situação de laboratório, o mesmo pesquisador demonstrou, graças à eletromiografia (EMG), que a atividade dos músculos do pescoço aumentava com a freqüência e a complexidade dos sinais tratados pelas operadoras. Da mesma forma Butler (1991) demonstrou que, para os operadores de vídeo de computador, o número de fixações visuais é proporcional à densidade de informação contida no texto – sendo que a duração das fixações é proporcional à dificuldade dos códigos utilizados. Deste modo, a necessidade de observar e de tratar os sinais leva à imobilidade postural, sendo que os olhos se aproximam da tarefa e os músculos posturais se contraem em excesso. Conseqüentemente, as dores aparecem nas constas e no pescoço. Constata-se, então, a importância do registro das posturas e de sua duração para a avaliação das cargas físicas, psíquicas e cognitivas do trabalho. 3.8. Métodos e técnicas da intervenção ergonomizadora 3.8.1. Principais tiposde pesquisas usadas pela ergonomia A Ergonomia, ao realizar suas pesquisas e intervenções, lança mão dos métodos em uso pelas ciências sociais e das técnicas propostas pela engenharia de métodos. Couto (1995) apresenta as classificações de pesquisa em sociologia e psicologia. Baseiam- se, principalmente, em métodos de pesquisa que incluem diferentes abordagens lógicas para o projeto de investigações, assim como a escolha de uma variedade de técnicas, tais como a construção de questionários e escalas de avaliação. As classificações vão desde a consideração de vários métodos para alcançar um único objetivo até a consideração de um único método para alcançar diversos objetivos. Pode-se citar como exemplo o uso de surveys (termo técnico para designar um levantamento de informações ou opiniões por meio de um questionário administrado a uma amostra – geralmente aleatória – da população estudada) para verificar hipóteses, para descrever as características de um fenômeno e para buscar relações quantitativas entre variáveis indicadas. Há, em termos gerais, dois tipos de pesquisa – a pesquisa descritiva e a pesquisa experimental. A diferença que geralmente se estabelece entre os conceitos descrever e explicar 28 pode, aproximadamente, indicar como a pesquisa descritiva se distingue da experimental (GALAFASSI 1999). Descrever é narrar o que acontece. Explicar é dizer por que acontece. Assim, a pesquisa descritiva está interessada em descobrir e observar fenômenos, procurando descrevê-los, classificá-los e interpretá-los. A pesquisa experimental pretende dizer de que modo ou por quais causas o fenômeno é produzido. Atualmente, face à colocação do poder do saber e do questionamento da hegemonia do pesquisador na condução da pesquisa – desde a definição do problema, passando pela escolha dos métodos, pela construção do modelo teórico, pela definição dos instrumentos, até a avaliação dos resultados e a utilização destes. A pesquisa participante é descrita de modo mais comum como uma atividade integrada que combina investigação social, trabalho educacional e ação. Por outro lado, tem-se, segundo Marano (1990), que a pesquisa-ação é organizada para realizar os objetivos práticos de um ator social homogêneo dispondo de suficiente autonomia para encomendar e controlar a pesquisa. O ator é freqüentemente uma associação ou um agrupamento ativo. Os pesquisadores assumem os objetivos definidos e orientam a investigação em função dos meios disponíveis. A) Pesquisas descritivas O pesquisador procura conhecer e interpretar a realidade, sem nela interferir para modificá- la; interessa-se em descobrir e observar fenômenos e procura descrevê-los, classificá-los e interpretá-los. O problema será enunciado em termos de indagar se um fenômeno acontece ou não, que variáveis o constituem, como classificá-los, que semelhanças ou diferenças existem entre determinados fenômenos, etc. Os dados obtidos – qualitativos ou quantitativos – devem ser analisados e interpretados. A pesquisa descritiva apresenta diversas formas: pesquisa de opinião (ou pesquisas de atitude), pesquisas de motivação, estudos de caso, pesquisas para análise do trabalho, pesquisas documentais. A ergonomia, ao avaliar as condições de trabalho e analisar a tarefa, realiza pesquisas descritivas. B) Pesquisas experimentais Iida (1990), diz que o pesquisador manipula deliberadamente algum aspecto da realidade, dentro de condições previamente definidas, a fim de observar se produz o efeito conforme o esperado – pretende-se dizer de que modo ou por que causas o fenômeno se produz. A pesquisa experimental busca verificar a relação de causalidade que se estabelece entre variáveis, isto é, em 29 saber se a variável X independente (uma categoria), determina à variável Y dependente (um critério). Para tanto, necessita-se uma situação de controle rigoroso, para evitar a influência de fatores alheios à verificação que se deseja fazer. Depois, interfere-se diretamente na realidade, dentro das condições que foram pré-estabelecidas – manipula-se a variável independente para observar o que acontece com a dependente, se X é a causa de Y. A este procedimento denomina- se experimento. Não existe pesquisa experimental sem experimento. A ergonomia, com mais ênfase e freqüência nas suas origens e entre os ergonomistas americanos e ingleses, realizou vários estudos experimentais sobre percepção e manipulação (COUTO, 1995). Além destes, existem três outros métodos passíveis de serem utilizados pela Ergonomia: os estudos causais comparativos; a pesquisa participante e pesquisa-ação. Por serem de uso bastante específico, fugindo ao escopo deste trabalho, não serão aqui abordados. 3.8.2. Método de pesquisa Quando se considera a pesquisa descritiva, pode-se citar a observação e a inquirição como as suas principais subdivisões. A observação apresenta-se como observação assistemática, observação sistemática e registro de comportamento. A inquirição compreende entrevistas, verbalizações, questionários e escalas de avaliação. 3.8.2.1. Observação Na vida cotidiana a observação é um dos meios em que o ser humano utiliza com mais freqüência para conhecer e compreender pessoas, coisas, acontecimentos e situações. No sentido mais simples da palavra, para Verkhoshanski (2001), observar significa aplicar os sentidos a fim de obter uma determinada informação sobre algum aspecto da realidade. Entretanto, não podemos observar muitas coisas ao mesmo tempo. Por isso, uma das condições fundamentais para observação é limitar e definir o que se deseja observar. De acordo com o Galdino Filho (1998), a observação se torna um momento decisivo em qualquer investigação de fatos empíricos e, muitas vezes, é considerada como base de comprovação de tal ou qual hipótese. No entanto, o fato de recorrer à observação não resolve por si só todos os problemas de comprovação e não elimina todas as dúvidas – existem diversas filosofias de observação. 30 Ainda segundo Galdino Filho (1998), uma vez captada, a informação é selecionada, categorizada e expressa sob forma de dados. A captação da informação é seletiva, os dados considerados não são independentes do dispositivo de pesquisa que os produziu. Os dados são marcados pelos objetivos de sua produção, tendo em vista diversos tipos de processamento ou a comprovação de certas hipóteses. De acordo com a concepção do papel ativo do dispositivo da pesquisa, pode-se dizer que os dados são mais tomados do que deliberados. Os grupos e indivíduos observados possuem quadros de significados e de relevância a respeito das situações sociais e da vida cotidiana. Para Fialho (1995), o pesquisador deve considerar tais quadros para poder estabelecer uma comunicação adequada para fins de observação. O fato de interpretar as ações do ator de acordo com a estrutura de relevância da sua vida cotidiana não deve, entretanto, fazer esquecer as exigências teóricas. Enquanto observador científico deve-se construir o modelo do ator – os seus motivos, ações, gostos, aversões típicas – como condição lógica para observar e interpretar o comportamento de acordo com regras processuais ou teóricas. Na verdade, o maior problema metodológico da observação está na relação a ser estabelecida entre as representações imediatas das pessoas ou grupos implicados nas situações observadas e as representações ou modelos construídos pelos pesquisadores, a partir de uma determinada perspectiva teórica e mesmo ideológica. No momento da captação da informação, Pignatari (1984), diz que esta relação condiciona a comunicação ou intercomunicação entre os investigadores e os investigados. No decorrer da interpretação, qualquer confusão entre os dois planos de interpretação – o do pesquisador e o do pesquisado – gera paradoxos e distorções incontroladas. A) Observação assistemática A observação assistemática é tambémchamada de ocasional ou não estruturada. È a que se realiza, sem planejamento e sem controle previamente definidos, sobre fenômenos que ocorrem de modo imprevisto. Segundo Cunha (1992), quando se afirma que, na observação assistemática, o acontecimento se dá de modo imprevisto, isto não significa que seja necessariamente repentino, sem nenhuma previsão do pesquisador. Na verdade, pode indicar também que o acontecimento era esperado, mas se desconhecia, em maior ou menor grau, o momento da sua ocorrência e as características da sua dinâmica de desenvolvimento. 31 Gonik (1991), define a observação assistemática o fato de se obter o conhecimento através de uma experiência casual, sem que se determinem a priori quais os aspectos relevantes a observar e que meios utilizar para observá-los. Cabe, então, ao observador estar atento ao que acontece a cada momento durante a observação. Sob o ponto de vista da pesquisa, é muito importante o registro que se faz da observação. Nele deve haver grande fidelidade – anotam-se apenas os fatos que foram observados, sem misturá-los com desejos e avaliações pessoais. Caso se deseje registrar o ponto de vista pessoal, deve-se fazê-lo separadamente. Numa parte do registro, em separado, ficam as opiniões e a interpretação do pesquisador sobre o fato, sem interferir com o registro dos fatos observados. Durante a apreciação ergonômica, seja na fase da problematização ou durante a sistematização, o ergonomista lança mão da observação assistemática. Esta fase da observação funciona, também, como preparação para a formulação do problema, explicitação de hipóteses, definição de variáveis, assim como para o planejamento e elaboração dos instrumentos da observação sistemática, do registro de comportamentos, e para a preparação de questionários e escalas de avaliação (GONIK, 1991). B) Observação sistemática A observação sistemática recebe também as denominações de planejada, estruturada ou controlada. É a que se realiza em condições controladas para responder a propósitos que se definiram a priori. Para o seu desenvolvimento, requer planejamento e necessita de operações específicas, instrumentos e documentos particulares. No sentido estrito, Marano (1990) aponta que somente a observação sistemática configura uma técnica científica. A observação assistemática se daria, então, então, durante os estudos exploratórios para pesquisa. O ergonomista, na etapa de diagnóstico, lança mão da observação sistemática durante análise da tarefa, quando utiliza registros comportamentais das atividades da tarefa – posturas assumidas, exploração visual, manipulações acionais, comunicações e deslocamentos. B.1) Observação direta e observação indireta Pode-se realizar a observação sistemática de modo direto ou de modo indireto. No modo direto, aplicam-se diretamente os sentidos sobre o fenômeno que se deseja 32 observar. No modo indireto, utilizam-se instrumentos para registrar ou medir a informação que se deseja obter. Cumpre mencionar que a diferença entre um e outro não reside no uso de instrumentos, mas no fato de a obtenção da informação depender ou não de uma interferência, isto é, se a partir do registrado e medido é necessário ou não concluir a informação que se deseja. Assim, Ribeiro (1987) afirma que se pode fazer, por exemplo, a observação indireta da inteligência, através de um teste e, por outro lado, usar um binóculo, que apenas aumenta a capacidade visual, e permite, no entanto, que se continue a aplicar diretamente os sentidos sobre o fenômeno numa observação direta. B.2) Planejamento da observação sistemática De acordo com Fialho (1998), o planejamento de uma observação sistemática inclui: A delimitação da área da realidade empírica onde as informações podem e devem ser obtidas; A indicação do campo que compreende a população (a que ou a quem observar), as circunstâncias (quando observar), o local (onde observar); para limitá-lo mais ainda, pode- se dividi-lo em unidades de observação, que são grupamentos de pessoas, coisas, acontecimentos, que, sob o ponto de vista de nossos conceitos (ou da compreensão que temos dos mesmos), possuem características comuns e, de alguma forma, são significativas para a pesquisa em questão; A determinação do tempo e da duração da observação; A definição dos instrumentos que se utilizarão e explicitação do modo de utilizá-los; A preparação do material de apoio – planilhas de registro, fichas de entrevista, etc. C) Registros de comportamento Durante o levantamento de dados, para apreciação e/ou diagnóstico ergonômico, interrogam-se os operadores sobre suas atividades e sobre as exigências da tarefa. No entanto, ainda segundo Fialho (1998), vários estudos demonstram que apenas esse procedimento não é suficiente. Portanto, é necessário, também, lançar mão de observações sistemáticas/registros de comportamento – posturas, exploração visual/tomadas de informação, manipulação acional e comunicações. 33 Os gestos de observação e ação ligam-se às modalidades sensoriais e motrizes utilizadas. O conjunto desses gestos constitui uma parte do que podemos chamar a etologia do homem no trabalho. São exemplos destes gestos: Palpação de uma superfície para apreciar seu polimento ou da parte inferior de uma máquina para liberar a capota de seu ferrolho; Virar a cabeça e cheirar em direção a um odor; Movimentos da cabeça e do corpo para escutar melhor uma ordem ou precisar a origem de um assobio; Aproximação prudente de uma superfície que se acredita quente. As posturas fazem parte dos elementos da análise do trabalho mais evidentes e que, no entanto, não são correta e devidamente valorizados. A postura adotada como resposta comportamental do operador passa a ser um critério essencial por ser um elemento observável (PIGNATARI, 1984). A atividade postural é uma fonte essencial de informações proprioceptivas que permite encadear o caráter espacial das informações exteriores com a situação dos diferentes segmentos corporais no espaço. A postura como aspecto fundamental da atividade motriz é uma parte da carga de trabalho. Este é outro critério essencial. A atenção do ergonomista é, assim, voltada para dois aspectos: A postura assumida O encadeamento postural Estes aspectos são indissociáveis: as posturas de trabalho situam-se sempre como parte de um processo contínuo e dinâmico de mudança de postura. Este enfoque permite interpretar os resultados em termos de adaptação e regulação. Isto é importante porque somente se pode descrever uma postura quando se considera sua duração (a mudança ou a manutenção). Deste modo, realizam-se registros e medições de freqüência e tempo, para possibilitar afirmações válidas sobre a carga postural. O ergonomista deverá, portanto, identificar a atividade postural do operador, as manutenções prolongadas de postura e as mudanças freqüentes de postura como elementos de carga física de trabalho. O papel dos movimentos da cabeça e das informações proprioceptivas que resultam da coordenação dos espaços visuais e auditivos parece fundamental. O papel destes 34 mesmos movimentos na recalibração do espaço visual-motor pode dar suporte à hipótese de uma integração dos espaços tácteis e visuais pelo canal do referencial postural geral. Por esta razão, Fialho (1998) aponta que análise da localização da cabeça e de seus movimentos no decurso de uma atividade profissional pode ajudar a precisar o conjunto das informações úteis utilizadas para agir, de modo a se orientar no espaço, assim como auxilia na descoberta dos constrangimentos externos que determinam as modalidades de utilização destas informações. 3.8.2.2. Inquirição O termo inquirição, no contexto da pesquisa científica, implica a busca metódica de informações e a quantificação, sempre que possível, dos resultados (PIGNATARI, 1984). A) Entrevistas Pode-sedefinir entrevista como a técnica em que o investigador se apresenta frente ao investigado e lhe formulam perguntas, com o objetivo de obter dados que interessem à investigação. A entrevista é, portanto, uma forma de interação social. Mais especificamente é uma forma de diálogo assimétrico, em que uma das partes busca coletar dados e a outra se constitui em fonte de informação. Cumpre enfatizar que a entrevista não é uma técnica tão simples quanto parece ao utilizador superficial. O pesquisador não pode realizar entrevistas não-diretivas na base da intuição nem do senso ou da típica ingenuidade das entrevistas comuns. A entrevista é a mais flexível de todos os métodos interrogativos de coleta de dados. Daí porque se pode identificar os mais diversos tipos de entrevista. A classificação se faz a partir de critérios diversos, sendo que o mais usual se refere ao grau de estruturação. As entrevistas menos estruturadas desenvolvem-se de forma mais espontânea, sem que estejam sujeitas a um modelo específico de interrogação. Já as entrevistas mais estruturadas são aquelas que predeterminam em menor ou maior grau as respostas a serem obtidas. Entre os vários tipos de entrevista, distingue-se: a entrevista não-diretiva, ou entrevista aprofundada, na qual a conversação é iniciada a partir de um tema geral sem estruturação do problema por parte do investigador; a entrevista focalizada ou centrada (focused interview), na qual, dentro de hipóteses e de certos temas, o entrevistador deixa o entrevistado descrever livremente sua experiência pessoal a respeito do assunto investigado; a entrevista semi-estruturada, aplicada a partir de um pequeno número de 35 perguntas abertas; a entrevista clínica, eventualmente conduzida de maneira não- diretiva, cuja especificidade está na sua orientação em função do objetivo de interpretação sócio-psicológico da situação ou da personalidade dos sujeitos através de suas verbalizações (CHEREM, 1998). A ergonomia lança mão dos diferentes tipos de entrevista conforme as diferentes etapas, objetivos e objetos de pesquisa. Durante a problematização e a sistematização, lança-se mão de entrevistas não-diretivas e focalizadas. Para o ergonomista, o interlocutor fundamental é operador. Por melhor que seja o conhecimento do dispositivo técnico e das instruções escritas e orais destinadas ao trabalhador, por mais cuidado e atenção que se tenha com a observação de sua atividade, não apenas operatória, mas também perceptiva (movimento dos olhos), falta à palavra do operador. Por outro lado, perguntar ao operador sobre seu trabalho, fora do cenário da tarefa, também não é suficiente para compreender o trabalho realmente realizado. Quando levado a falar em detalhes sobre seu trabalho fora do local de execução, ele trará o máximo possível de elementos: planos, instrução, ferramentas, peças, tentativas de fazer esboços explicativos. Com efeito, existe um vocabulário próprio informal a toda atividade, e por vezes esse vocabulário é difícil de traduzir na ausência de objetos. Ocorre o mesmo para as relações espaço-temporais dos objetos entre si. A descrição da atividade dentro do posto de trabalho é muito mais fácil, mas precisa de um acordo nem sempre fácil de conseguir com a direção da empresa, a chefia do departamento e, sobretudo, com os próprios trabalhadores. A descrição exige uma alternância de atividade e interrupções para explicações que é, em geral, incompatível com o ritmo cotidiano da rotina do setor. Mais ainda, a rapidez das explicações solicita muito a intuição do ergonomista e acarreta o risco de perder informações e/ou perturbar o operador para obtê-las (PIGNATARI, 1984). O ideal é poder juntar as explicações dadas no local de trabalho com descrição detalhada da atividade fora dele. B) Verbalização A verbalização das atividades da tarefa pelo operador é uma das técnicas de grande utilidade para a Ergonomia. O ergonomista procura, através do depoimento do trabalhador, compreender o seu “modus operandi”, face às restrições do sistema, aos constrangimentos da tarefa e à sua experiência e competência. 36 De acordo com Couto (1996), “a verbalização como uma das manifestações das atividades do operador só adquire significado quando se tem a tarefa como quadro de referência”. Martins & Duarte (2000) dividem as verbalizações provocadas sobre o trabalho em relação com uma atividade de observação – protocolos verbais – em verbalizações simultâneas e verbalizações consecutivas. A escolha entre à suas modalidades depende das condições de realização da atividade e do tipo de informação que se deseja obter. Verbalizações simultâneas: apresentam a vantagem de produzir as explicações no próprio contexto da atividade. As condições concretas de sua realização estão presentes (a peça usinada, o documento a ser tratado, o programa a ser rodado). O operador está em condições para se expressar e o ergonomista para entender? Verbalizações consecutivas: não perturbam o desenvolvimento normal da tarefa. Fialho (1998) subdivide as verbalizações consecutivas em assistidas e não assistidas. As verbalizações consecutivas assistidas aparecem como mais eficazes. “Consistem em fazer falar o operador a partir de uma gravação em vídeo de sua atividade registrada em situação real. O sujeito é então estimulado e conduzido pela imagem e não existe a tentação de modificar seu comportamento para estabelecer uma conformidade com as normas oficiais”. C) Questionário O termo questionário pode designar instrumentos diferentes. Assim, é comum falar-se em entrevista, formulário, teste, enquête e escala com o mesmo sentido de questionário. Leavell (1977) define o questionário como a técnica de investigação composta por um número mais ou menos elevado de questões apresentadas por escrito às pessoas, tendo por objetivo o conhecimento de opiniões, crenças, sentimentos, expectativas e situações vivenciadas. Este instrumento é aplicado através de perguntas ou afirmações. Apresentam categorias ou alternativas de respostas fixas e que se estabeleceram previamente. O entrevistado deve assinalar a alternativa que mais se ajusta ou corresponde às suas características, idéias ou sentimentos. A utilização de um questionário com perguntas fechadas depende de diversos aspectos. Primeiro supõe que os entrevistados conheçam a temática que o questionário aborda. Segundo que o pesquisador conheça o suficientemente bem o grupo a ser 37 entrevistado, de modo que possa antecipar as respostas às perguntas. Por esta razão, um bom questionário com perguntas fechadas deve ser precedido da entrevista pautada. Deste modo, o pesquisador familiariza-se com a temática e suas implicações e conhece os discursos e os limites dos futuros questionados. D) Escalas de avaliação As escalas de avaliação são instrumentos que objetivam medir a intensidade das opiniões e das atitudes. Consistem basicamente numa série graduada de itens – dentre os quais o respondente deve assinalar aqueles que melhor correspondem à sua percepção sobre o fato pesquisado. Segundo Laville (1977), construir uma escala de avaliação implica: definir um contínuo; fidedignidade; validade; ponderação dos itens; natureza dos itens e igualdade das unidades. 3.8.2.3. Experimentos O experimento diferencia-se da experiência e da observação. Consiste em uma situação criada em laboratório coma finalidade de observar, sob controle, a relação que existe entre fenômenos. O termo controle serve para indicar os esforços feitos para a eliminação – ou, pelo menos, a redução ao mínimo possível – dos erros que possam surgir numa observação. Estes esforços são concretizados na forma de procedimentos que visam a isolar a observação de fatores e influências capazes de nela interferir, falseando-a. Em um sentido mais amplo, chama-se também de experimento situação criada fora de laboratório,mas nas quais se utilizam técnicas rigorosas com o objetivo de exercer controle sobre as variáveis que serão observadas. Cada uma destas questões implica em graus crescentes de realismo e existem ainda várias situações intermediárias. Mais ainda, o realismo compreende outros fatores, como o tipo de pessoas que deverão participar como elementos ou indivíduos de pesquisa. Existem argumentos a favor de experimentos altamente reais. Mendonça (1996), Afirma que não é possível controlar todas as variáveis num experimento. Observa-se que os experimentos são situações artificiais. Mas existem também argumentos contra o realismo. Constatam-se as dificuldades para controlar as variáveis, as conseqüências estatísticas das variáveis não controladas, a estabilidade das comparações, a impossibilidade de controlar os fatores motivacionais e os experimentos realistas. 38 Na realidade, não existe uma resposta conclusiva em relação à quão realistas propiciam uma maior confiança sobre a aplicabilidade dos resultados. No entanto, tais experimentos são de execução mais difícil, são mais caros. Talvez a melhor estratégia seja começar com experimentos de laboratório com tanto realismo quanto possível e desejável, face à relevância das variáveis. Caso o experimento de laboratório forneça resultados positivos e aplicáveis na prática, então é o momento de colocar os resultados da pesquisa de laboratório em campo, para determinar a estabilidade dos achados do laboratório em contextos diferentes. 3.8.2.4. Métodos da engenharia Conforme Lech (1998), os métodos da engenharia merecem uma atenção especial, porque os especialistas envolvidos no desenvolvimento do sistema não podem contar somente com recomendações, guidelines, checklists ou padrões para fazerem seu trabalho. As guidelines não analisam sistemas, nem projetam, testam ou avaliam estes sistemas. Pelo contrário, o especialista em Ergonomia tem que depender dos métodos que auxiliam as três atividades básicas do desenvolvimento de sistemas – análise, design e teste. Etapas e fases da intervenção ergonomizadora. A intervenção ergonomizadora pode ser dividida nas seguintes grandes etapas: A) Apreciação ergonômica Apreciação ergonômica é uma fase exploratória que compreende o mapeamento dos problemas ergonômicos da empresa. Consiste na sistematização do sistema homem-tarefa- máquina e na delimitação dos problemas ergonômicos – posturais, informacionais, acionais, congnitivos, comunicacionais, interacionais, deslocacionais, movimentacionais, operacionais, espaciais, físico-ambientais. Estas etapas – Sistematização e Problematização podem ocorrer simultaneamente. Fazem-se observações no local de trabalho e entrevistas com supervisores e trabalhadores. Realizam-se registros fotográficos e em vídeo. Esta etapa termina com o parecer ergonômico que compreende a apresentação ilustrada dos problemas, a modelagem e as disfunções do sistema homem-tarefa-máquina. Conclui-se com a hierarquização dos problemas, a partir dos custos humanos do trabalho, segundo a gravidade e a urgência; a priorização dos postos a serem diagnosticados e modificados; sugestões preliminares de melhoria; predições que se relacionam à provável causa do problema a ser enfocado na diagnose. 39 B) Diagnose ergonômica A diagnose ergonômica permite aprofundar os problemas priorizados e testar predições. De acordo com Chamlian (1999), o protocolo da pesquisa ou conforme a explicitação da demanda pelo decisor, far-se-á análise macro ergonômica e/ou a análise da tarefa dos sistemas homem-tarefa-máquina. Considera-se a ambiência tecnológica, o ambiente físico e o ambiente organizacional da tarefa. É o momento das observações sistemáticas das atividades da tarefa, dos registros de comportamento, em situação real de trabalho. Os níveis, amplitude e profundidade dos levantamentos de dados e das análises dependem das prioridades definidas, dos prazos disponíveis e dos recursos orçamentários. Esta etapa se encerra com o diagnóstico ergonômico que compreende a confirmação ou a refutação de predições e/ou hipóteses. Conclui-se com o quadro da revisão da literatura, as recomendações ergonômicas em termos de ambiente, arranjo e conformação de postos de trabalho, seus subsistemas e componentes, programação da tarefa – enriquecimento, pausas, etc. 3.8.3. Pesquisa em ergonomia 3.8.3.1. Atividades preliminares à pesquisa As atividades preliminares da pesquisa são aquelas realizadas antes de começar a pesquisa propriamente dita. Elas são muito importantes porque, se forem bem elaboradas, poderão proporcionar economias de tempo, esforço e dinheiro. Ao contrário, se forem mal elaboradas, a pesquisa pode não chegar ao fim ou terminar sem obter resultados significativos. Essas atividades compreendem a definição de objetivos, levantamento do “estado da arte”, e elaboração de uma proposta ou projeto de pesquisa. 1) Definição dos objetivos – A primeira providência necessária, antes de iniciar uma pesquisa, é definir o seu objetivo; ou seja, o que se pretende fazer ou conhecer. Esse objetivo deve ser colocado sempre por escrito, pois este é um teste importante para se saber se as pessoas têm uma idéia clara sobre aquilo que se pretendem fazer. Em alguns casos, o objetivo pode ser alterado durante o desenvolvimento da pesquisa, mas, de qualquer modo, é necessário haver um objetivo inicial, para começar a pesquisa. Por exemplo, supõe-se que se queira pesquisar o diâmetro ideal de cabos de chaves de fenda para uma tarefa que exige transmissão de toques elevados. Nesse caso, podem ser 40 construídos cabos de madeira com diferentes diâmetros, para serem testados. Durante a realização dos testes vai ser verificado que outros fatores, como tipo de material do cabo, a rugosidade superficial e o desenho dos cabos também influem na transmissão de torques. Nesse caso, o objetivo da pesquisa deve ser ampliado, para abranger também esses outros aspectos. Se ela restringir a estudar apenas os diferentes diâmetros em cabos de madeira, provavelmente terá pouca utilidade prática, pois não corresponderá à realidade da maioria das chaves-de-fenda encontradas no mercado. As condições em que serão realizados os experimentos também devem ser definidas com clareza, pois determinados resultados, obtidos sob certas circunstâncias, não serão necessariamente válidos em outras condições. Por exemplo, um tipo de letra que seja mais legível em cartazes, com o expectador parado, não significa que continue sendo também mais visível para “outdoors”, com o expectador em movimento, portanto, para que um determinado resultado experimental possa ser generalizado, é necessário que o mesmo seja testado nas mais variadas circunstâncias (COUTO, 1995). 2) Levantamento do “estado da arte” – O levantamento do “estado da arte” destina-se a verificar se os resultados pretendidos pela pesquisa ainda não estão disponíveis. Esse levantamento é feito principalmente pela revisão bibliográfica de livros e revistas. Na área de ergonomia, conforme aponta Iida (1990), existem cerca de uma centena de livros editados em diversos países do mundo. Aqueles editados até a década de 70 davam maior ênfase aos aspectos fisiológicos do trabalho, pois esse é o ramo mais tradicional da ergonomia, que se desenvolveu desde o início do século, principalmente nos países europeus. Mais modernamente, duas tendências são dominantes. Em primeiro lugar, tem havido uma crescente ênfase na pesquisa da percepção e dos processos mentais, como memória e decisão. Em segundo lugar, há uma ênfase cada vez maior sobre as influências do avanço tecnológico, principalmente pela entrada do computador em praticamente todos os setores, modificando substancialmente a natureza do trabalho humano. Na área de ergonomia, as diversas sociedades científicas existentes no mundo fazem congressos periódicos e publicam
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