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DESCRIÇÃO O papel das negociações complexas em diversos cenários nacionais e internacionais, como nas negociações políticas, com seus principais atores e objetivos, e o papel das negociações diplomáticas, com as relações entre os Estados e as instituições, assim como as explicações sobre o comportamento de empresas multinacionais e negociações comerciais. PROPÓSITO A compreensão sobre o comportamento dos atores internacionais e nacionais em negociações complexas é central para o estudante de Relações Internacionais e de áreas correlatas. Esse conhecimento ajuda a entender como diferentes tipos de negociação são feitas, quais são as ferramentas e atores envolvidos, o que é essencial para uma consideração sofisticada a respeito da arquitetura global. OBJETIVOS MÓDULO 1 Conceituar as negociações complexas e quais são os principais atores envolvidos nessas atividades MÓDULO 2 Identificar o papel dos Estados e das instituições internacionais nas negociações diplomáticas MÓDULO 3 Reconhecer as narrativas sobre negociações comerciais e o papel das empresas multinacionais INTRODUÇÃO Você já parou para pensar em como as negociações fazem parte do cotidiano das pessoas? Poderíamos dizer que ciência, tecnologia e negociação, bem como gestão de conflitos são temas muito presentes na sociedade do século XXI. Podemos pensar nas negociações que são necessárias no ambiente de trabalho, nas relações sociais, inclusive no âmbito mais restrito da família, e em como elas podem se tornar desafiadoras. Aos considerarmos as relações no âmbito mais amplo, como na relação entre os Estados, a complexidade é ainda maior. Vamos, daqui por diante, conceituar, identificar e reconhecer alguns dos aspectos que configuram a noção de relações complexas. Para isso, identificaremos três campos de observação: aspectos políticos administrativos, negociações diplomáticas e negociações comerciais. Esses campos não devem ser entendidos como estáticos, mas como modelo de identificação. MÓDULO 1 Conceituar as negociações complexas e quais são os principais atores envolvidos nessas atividades O CONCEITO DE NEGOCIAÇÕES COMPLEXAS Negociações complexas são um fenômeno bastante relevante nas discussões em diversas áreas, como o comércio internacional, as relações entre Estados e outras distintas práticas transnacionais. Podemos definir esse tipo de ação como um processo de diálogo e discussão entre agentes que envolve muitas variáveis: NORMAS ATORES PARTICIPANTES OBJETIVOS À medida que essas variáveis são gerenciadas por meio de canais de comunicação e processos de decisão que podem conter vários graus de transparência e clareza, a complexidade aumenta ainda mais. As negociações complexas vêm ocorrendo há muito tempo (COHEN; MEERTS, 2008), mas há certa dificuldade em apontar sua natureza fundamental, os seus elementos essenciais e as relações entre esses elementos. NEGOCIAÇÕES POLÍTICAS E ADMINISTRATIVAS Este módulo inaugura discussões sobre distintas segmentações das negociações, focando nos elementos políticos e administrativos. A maioria das decisões importantes na política e em áreas administrativas são – ou deveriam ser – o resultado de negociações. EXEMPLO Um governador pode debater subsídios para projetos de habitação popular com deputados; membros do parlamento podem redigir nova legislação tributária; dois chefes de Estado podem discutir um possível cessar-fogo em um conflito armado. Como esses exemplos sugerem, as negociações políticas podem ter um grande impacto na condição de vida em contextos locais e globais. Como Warren e Mansbridge (2013) argumentam, a relevância dessas negociações é baseada não apenas nesse impacto direto, mas também na natureza da negociação como uma ferramenta inerentemente democrática, que permite que as pessoas cheguem a decisões políticas de forma coletiva. Apesar de sua relevância, as negociações políticas em nível local, nacional e internacional têm recebido pouca atenção da literatura especializada no campo amplo das Ciências Humanas, principalmente nas Relações Internacionais. Como Zartman (2010, p. 229-230) observa: CURIOSAMENTE, A NEGOCIAÇÃO NÃO É ENSINADA COM MAIS FREQUÊNCIA EM CURSOS DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS (RI); SENDO MAIS COMUM CURRÍCULOS DE NEGÓCIOS. [...] A TEORIA DE RI ACABA IGNORANDO A NEGOCIAÇÃO, NEGLIGENCIANDO O FATO DE QUE A NEGOCIAÇÃO EM SEUS DIVERSOS ASPECTOS OCUPA A MAIOR PARTE DO TEMPO E ESFORÇO DAS RELAÇÕES INTERESTATAIS, DA DIPLOMACIA E DA POLÍTICA EXTERNA. EXEMPLO O que podemos ver no contexto acadêmico também pode ser observado na mídia. Por exemplo, quando as negociações sobre o acordo nuclear iraniano voltaram a se movimentar em 2017, muitos comentaristas concentraram suas análises nas diferenças políticas entre os países ou no papel do então presidente norte-americano Donald Trump. Imagem: Shutterstock.com Poucos analisaram, contudo, como essas diferenças foram tratadas do ponto de vista da negociação e como as partes poderiam ter criado e distribuído os elementos negociados de forma mais eficaz. A adoção dessa perspectiva poderia auxiliar que partes interessadas identificassem o potencial integrativo na mesa de negociação e possíveis soluções para os desafios apresentados. Uma discussão desse tipo de potencial poderia ter revelado que alguns negociadores visavam encontrar elementos em comum, mas outros agiam como se a negociação fosse um jogo de soma zero. Analisar as negociações dessa maneira também poderia ter esclarecido o desempenho de negociadores individuais e sua influência no resultado. Este módulo vai refletir sobre tais pontos, apresentando as características únicas das negociações políticas e administrativas, as principais ferramentas empregadas nesses processos e as melhores maneiras de analisá-las. Reforçamos que, além de nos concentrarmos puramente em objetivos explicitados na imprensa ou em declarações oficiais, uma análise sofisticada das negociações políticas envolve, necessariamente, uma combinação de mapeamento de interesses, grupos envolvidos e o histórico de articulações. NEGOCIAÇÕES POLÍTICAS E ADMINISTRATIVAS Embora as negociações políticas sejam apresentadas, muitas vezes, como diferentes de debates envolvendo questões de negócios e de empresas, por exemplo, é importante ter em mente que as mediações envolvendo dilemas políticos não são todas idênticas. Imagem: Shutterstock.com Como mostram os exemplos deste texto, as negociações políticas podem: Abordar questões locais, nacionais ou internacionais. Ser processos formais ou informais; distributivos, ou seja, com muitos atores envolvidos, ou integrativos, com número reduzido de participantes. Envolver questões tão diferentes quanto o orçamento de um governo, o papel da educação pública ou a paz entre Estados. Acontecer em ambientes democráticos ou não democráticos, em sistemas políticos bipartidários ou multipartidários. Apresentar como partes envolvidas, políticos eleitos, funcionários de carreira, diplomatas, funcionários públicos ou representantes de grupos de interesses. Abordar problemas graves, como mudanças climáticas ou problemas mais simples, como, por exemplo, conseguir um aliado político para apoiar um projeto de lei. Apesar dessas distinções, as questões e contextos da negociação na política são distintos daqueles de outros campos. Para fornecer uma primeira caracterização, apontamos cinco características cruciais a esse respeito, apresentadas por Starkey et al. (2015): interesses públicos difusos, complexidade, simbolismo, conflitos de valores e capacidade de imposição. INTERESSES PÚBLICOS DIFUSOS O primeiro aspecto, interesses públicos difusos, aponta que é essencial levar em conta quais são os elementos que motivam os envolvidos em uma negociação. Pode-se entender os interesses como o combustível que leva alguém a tomar uma decisão em determinado processo. Embora se possa presumir que as negociações fora do mundo político reflitam os interesses individuaisde uma pessoa ou empresa, as ações das autoridades eleitas devem (pelo menos até certo ponto) serem motivadas pelo que podemos entender como interesse público. Segundo Mahoney et al. (2009, p. 1035), pode-se definir os interesses públicos como “um amálgama complexo de interesses individuais e privados interdependentes”. Eles são caracterizados como difusos justamente por não terem um centro formador, sendo constituídos por meio de complexas relações dentro de uma comunidade, envolvendo não só as relações sociais, como também a imprensa, canais informais de comunicação e espaços de sociabilidade, como centros religiosos ou sindicatos. O interesse público pode envolver, entre outros aspectos: Opiniões sobre o gasto e o orçamento dedicado às Forças Armadas de uma nação. Estrutura dos sistemas públicos de educação, a política ambiental, ou o estabelecimento de sanções a um outro país. Uma vez que os negociadores políticos atuam por meio de uma interpretação do que acreditam ser os interesses públicos, frequentemente descobrem que essas narrativas são múltiplas, podendo, inclusive, estar em conflito umas com as outras. EXEMPLO Um líder político pode concluir que a população tem um interesse econômico, ético ou moral na preservação do meio ambiente. Ao mesmo tempo, o líder político pode ter que lidar com outro interesse público em uma regulamentação amiental favorável aos negócios e a empresas (e, portanto, menos hegemônica). Nesse caso, ele deve encontrar um equilíbrio adequado entre esses dois interesses, o que pode ser particularmente desafiador caso o negociador queira basear suas avaliações em estimativas confiáveis sobre os custos e benefícios de longo prazo da legislação. Portanto, mesmo quando os negociadores levam em conta a compreensão dos interesses públicos e consideram uma ampla gama de perspectivas da melhor maneira possível, eles podem chegar a conclusões muito diferentes sobre quais políticas apoiar e desenvolver. COMPLEXIDADE O próximo elemento, complexidade, está diretamente ligado a um elemento de imprecisão dos interesses públicos, na medida em que reforça a complexidade inevitável desse tipo de mediação. Enquanto uma negociação típica no mundo dos negócios é mais direta, por exemplo, a venda de um produto de uma empresa alimentícia para outra; uma negociação política e administrativa típica pode envolver dimensões de guerra e paz com outro Estado ou acordos sobre migração envolvendo potencialmente milhões de pessoas. Em ambos os casos, os negociadores precisam estar preparados para realizar análises sofisticadas com um número de variáveis expressivo. Confira os exemplos a seguir: Imagem: Shutterstock.com NEGOCIAÇÃO NO MUNDO DOS NEGÓCIOS As empresas alimentícias pretendem estudar diferentes mercados regionais ou tecnológicos para entender melhor o potencial dos produtos. Por esse motivo, podem consultar dados de produtos anteriores, entrevistar especialistas, realizar grupos de foco ou criar experimentos produzindo conteúdo relacionado. Imagem: Shutterstock.com NEGOCIAÇÃO POLÍTICA E ADMINISTRATIVA Os negociadores que discutem sanções políticas ou autorização para uso da força se debruçam sobre dados de conflitos passados e atuais, sobre o impacto das sanções na economia de um Estado inteiro, conversam com especialistas e dialogam com atores militares. Ao mesmo tempo, precisam levar em conta as consequências domésticas da sua decisão e calcular, da melhor forma possível, de que forma a sua decisão pode ter consequência em diversos cenários. Em contraste com as negociações comerciais, as negociações políticas não se concentram apenas nas questões econômicas, mas também exigem a consideração de várias outras dimensões, como direitos humanos ou segurança. No exemplo dado, o efeito econômico de curto prazo das sanções, por exemplo, pode provocar a diminuição nas exportações para os Estados em questão, com impacto sistêmico de longo prazo nas empresas no país de origem dos negociadores: alguns desses negócios podem encolher, outros podem crescer, e isso pode afetar a estrutura da economia nacional por muito tempo. Além disso, os representantes do Estado devem levar em consideração que seu comportamento relacionado aos direitos humanos pode abrir um precedente para o futuro ou até mesmo fomentar ou prevenir violências semelhantes no futuro. Foto: Shutterstock.com SIMBOLISMO O terceiro elemento citado por Starkey et al. (2015) é o simbolismo, que leva em consideração que as negociações políticas podem, às vezes, ser simplesmente simbólicas. Em outras palavras, seu objetivo principal pode ser que as partes mostrem respeito, boa vontade ou preocupação compartilhada. Analisando as cúpulas entre os Estados Unidos e a União Soviética, Druckman e Wallensteen (2016) argumentam que não apenas a relação em si, mas também sua exibição simbólica pode ter valor para os negociadores. Imagem: Shutterstock.com REUNIÃO PESSOAL DE LÍDERES DE PAÍSES Pode ter a função de simplesmente mostrar que eles, por exemplo, não estão prestes a iniciar uma guerra. Nesses casos em particular e nas negociações políticas em geral, a localização, o momento, o protocolo e aspectos relacionados representam grande valor simbólico. Imagem: Shutterstock.com ENCONTRO EM UM FERIADO NACIONAL OU EM UM LOCAL HISTÓRICO Pode definir um quadro para esse encontro, por exemplo, caracterizando-o como um encontro de amizade, respeito, cooperação econômica bem-sucedida ou visão de mundo e valores compartilhados. Um dos resultados pretendidos das negociações simbólicas, então, pode não ser necessariamente um acordo específico, mas sim enfatizar um espaço em comum e evocar sentimentos abstratos de esperança ou boa vontade entre observadores, como cidadãos ou outros atores não envolvidos nessas negociações. CONFLITOS DE VALORES O próximo elemento reflete sobre os conflitos de valores. Como relatam Harinck e Druckman (2017, p. 30), “conflitos de recursos – nos quais recursos escassos estão em jogo – têm se mostrado mais fáceis de resolver do que conflitos de valor, que envolvem normas, crenças e identidades das pessoas”. As negociações políticas, que muitas vezes abordam interesses públicos difusos, requerem uma consideração de normas, crenças, identidades e, portanto, conflitos de valor. Veja os exemplos a seguir: Imagem: Shutterstock.com ORÇAMENTO DEDICADO À SAÚDE Quando os líderes políticos negociam o orçamento dedicado à saúde, seus argumentos podem depender não apenas dos interesses públicos, mas também das interpretações subjetivas sobre essa área. Essas podem estar ligadas a valores pessoais ou ao que se interpreta serem valores públicos. Imagem: Shutterstock.com AGENDA CLIMÁTICA MULTILATERAL Quando delegações de países se reúnem para negociar, digamos, uma agenda climática multilateral, é provável que baseiem suas posições tanto nos custos e benefícios de diferentes propostas quanto em normas culturais ou morais relativas à preservação do meio ambiente e às vidas das gerações futuras. Como esses exemplos ilustram, a maioria dos interesses públicos está entrelaçada a valores, e a dinâmica e as implicações relacionadas são importantes, embora difíceis de discernir e distinguir. CAPACIDADE DE IMPOSIÇÃO Negociações políticas e administrativas envolvem reflexões sobre a capacidade de imposição. A execução de um acordo pode ser relevante se uma das partes aponta que pode não cumprir seus compromissos. Na política internacional, a falta de instituições fortes que possam fazer cumprir a implementação de negociações representa um grande desafio para os envolvidos. Nas últimas décadas, surgiu uma ordem institucional internacional incluindo vários tribunais internacionais, mas a aplicação da lei em nível internacional ainda é comparativamente débil. Além de instituições de negociações políticas, como a Corte javascript:void(0) Internacional de Justiça em Haia ou a Corte Europeia de Direitos Humanos, as NaçõesUnidas (ONU), especialmente seu Conselho de Segurança, desempenham um papel na aplicação de acordos internacionais. O Conselho de Segurança costuma ameaçar com sanções e outras medidas punitivas se Estados violarem o direito internacional. Muitas vezes, porém, o Conselho não impõe penalidades, o que tem sido interpretado por algumas partes como um sinal de que o descumprimento pode ficar sem consequências. Foto: Yeu Ninje / Wikimedia Commons / Domínio público Palácio da Paz, em Haia, sede da CIJ. CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA EM HAIA Histórica corte que julga os crimes internacionais de guerra. javascript:void(0) javascript:void(0) CORTE EUROPEIA DE DIREITOS HUMANOS Órgão da União Europeia voltado aos países membros, mas que apresentam impactos sobre outros países. EXEMPLO As repetidas violações do acordo de paz do Sudão do Sul, em 2015, por várias partes não tiveram consequências graves (LUX, 2017). Em 2017, o secretário-geral da ONU, António Guterres, meramente encorajou todos os sul-sudaneses a “acabar com a violência e resolver pacificamente a crise" (UN NEWS, 2017), mas não pediu sanções e outras medidas punitivas. Imagem: Spesh531 / Wikimedia Commons / CC BY-SA 3.0 javascript:void(0) SUDÃO DO SUL O Sudão do Sul é cristão e a maioria do país é muçulmana, mas o centro do problema é a região de Darfur. Os dois principais grupos que atuam em Darfur são o Movimento de Justiça e Igualdade (MJI) e o Exército de Libertação Sudanesa (ELS), que lutam contra o governo do Sudão e a milícia Janjaweed. A ONU intermediou uma paz em 2006, mas os conflitos não cessaram, mesmo com a “independência” por plebiscito em 2011. Como resultado da falta de instituições fortes, os negociadores frequentemente procuram identificar incentivos que aumentem a probabilidade de que suas contrapartes honrem e implementem acordos, mesmo sem a potencial aplicação por parte de instituições públicas. PROCESSOS DE NEGOCIAÇÃO As negociações políticas também se diferem de outras em termos de processo. Podemos destacar duas questões que são cruciais a esse respeito: a dualidade da comunicação pública e privada e o papel de acordos escritos. Imagem: Jacqueline Constantino; Elementos cruciais que diferem as negociações políticas de outras em termos de processo. O primeiro elemento reforça que, nas negociações políticas e administrativas, os negociadores transmitem muitos dos seus argumentos, suas ofertas e reivindicações de forma particular para garantir que certas informações sensíveis não sejam debatidas por um público amplo antes do período desejado. Ao mesmo tempo, negociadores muitas vezes também escolhem, devido à atenção da mídia e ao interesse que os cidadãos têm no trabalho de representantes e funcionários, comunicarem-se com seus homólogos de forma pública. Ambas as formas de comunicação são complementares e nada impede, em um processo de negociação, que sejam usadas de forma holística. EXEMPLO Por exemplo, entre 2016 e 2019, muitos meios de comunicação noticiaram regularmente no Reino Unido as negociações do chamado Brexit. Representantes de vários lados da negociação usaram a mídia para comentar publicamente sobre suas expectativas e esperanças, expondo suas demandas e ofertas. Ao mesmo tempo, discutiram essas mesmas questões em reuniões privadas. Dessa forma, não apenas expunham suas posições, mas também buscavam construir sua própria imagem ou a imagem de seus homólogos, além de criar ou aumentar a pressão pública sobre essas partes. Imagem: Christoph Scholz / Wikimedia Commons / CC BY-SA 2.0 javascript:void(0) BREXIT Termo midiático criado a partir da junção de Grã-Bretanha (Britain) e saída (exit). Em contraste, a comunicação “nos bastidores” (ou seja, em ambientes privados) geralmente permite negociações mais orientadas para a solução. Como Martin (2013, p. 14) coloca, "negociações políticas bem-sucedidas são mais prováveis de ocorrer [...] longe dos olhos do público" porque "permitem que as negociações incentivem a ponderação ao invés de postura" (p. 2). Os cenários de bastidores, então, dão aos negociadores autonomia em relação às pessoas que acabarão sendo afetadas pelo resultado. Não é necessariamente provável, mas ainda possível, que negociadores como Boris Johnson, que atuou como Ministro das Relações Exteriores britânico de 2016 a 2018, propositadamente se mostrem duros e provocadores no palco, agindo de maneira muito mais colaborativa e orientada para a solução de forma particular. O segundo elemento citado corresponde aos chamados acordos por escrito. Tais procedimentos são comuns em negócios (contratos ou planos) e na política (leis, declarações, ordens executivas ou, na política internacional, resoluções). Acordos em contextos políticos diferem de outros porque a linguagem utilizada pode não ter apenas um caráter jurídico, mas também político, cultural ou uma função simbólica. O tom de um acordo de coalizão não vinculativo, por exemplo, pode transmitir um senso de propósito comum ou a falta dele. Nesse sentido, devido à questão mencionada de opções limitadas de aplicação da lei em determinados contextos, o valor jurídico da linguagem em acordos políticos pode, às vezes, ser limitado. Nesses casos, a função política, cultural ou simbólica influencia eventualmente a linguagem escolhida em acordos. Uma evidência anedótica sugere que muitas vezes há debates acalorados antes de resoluções do Conselho de Segurança da ONU sobre se o Conselho deve “encorajar”, “convidar”, “convocar”, “exigir” ou “instar” as partes a realizarem uma determinada ação. Em alguns casos, para obter apoio de contrapartes ou para deixar espaço para futuras interpretações dos resultados, os negociadores podem optar por assinar acordos que são deliberadamente vagos ou mesmo ambíguos. EXEMPLOS DE NEGOCIAÇÕES COMPLEXAS – PARTE 1 Vamos rever alguns pontos de uma forma diferente. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. COMO EXEMPLO DE NEGOCIAÇÕES COMPLEXAS, PODEMOS APONTAR: A) Um número substantivo de normas, atores participantes ou objetivos. B) As relações entre um Estado forte e outro mais frágil. C) As dinâmicas comerciais dos Estados. D) A globalização e sua influência nas instituições internacionais. E) Debates entre atores que possuem conhecimentos distintos sobre os temas abordados. 2. SOBRE OS CONFLITOS POSSÍVEIS EM NEGOCIAÇÕES POLÍTICAS E ADMINISTRATIVAS, PODEMOS APONTAR: A) Os conflitos de valor são mais fáceis de se negociar do que conflitos de recursos. B) Estados com maior coesão social lidam de forma mais rápida com questões ligadas a negociações diplomáticas. C) Os conflitos de valor e de recursos são igualmente complexos para serem negociados. D) Negociações diplomáticas só podem ser integralmente executadas caso os Estados possuam poder militar para apoiar tais movimentações. E) Conflitos de recursos são mais fáceis de serem negociados do que conflitos de valor. GABARITO 1. Como exemplo de negociações complexas, podemos apontar: A alternativa "A " está correta. Negociações complexas são aquelas que possuem um número expressivo de variáveis, como leis, normas e objetivos dos atores envolvidos. 2. Sobre os conflitos possíveis em negociações políticas e administrativas, podemos apontar: A alternativa "E " está correta. Conflitos de recursos – nos quais recursos escassos estão em jogo – têm se mostrado mais fáceis de resolver do que conflitos de valor, que envolvem normas, crenças e identidades das pessoas. As negociações políticas, que muitas vezes abordam interesses públicos difusos, também frequentemente requerem uma consideração de normas, crenças, identidades e, portanto, de conflitos de valor. MÓDULO 2 Identificar o papel dos Estados e das instituições internacionais nas negociações diplomáticas NEGOCIAÇÕES DIPLOMÁTICAS Em 2019, o então presidente dos Estados Unidos Donald Trump se tornou o primeiro mandatário do país a visitar a Coreia do Norte. A cena, apesar do seu caráter simbólico, representava mesesde negociação diplomática entre os dois países. Nos debates do módulo anterior, apontamos uma reflexão mais ampla sobre um tipo de negociação complexa, as de cunho político e administrativo, que lidam com desafios nos contextos doméstico e internacional. Nesta seção, refletiremos sobre um tipo específico de negociação, a negociação diplomática, que lida essencialmente com elementos fora das fronteiras estatais. A negociação diplomática pode ser entendida como uma troca de concessões e compensações, em um quadro de ordem internacional, aceita por entidades soberanas. Dentro dessa lógica, ela normalmente se limita a negociações entre Estados. Como já apontado, as negociações internacionais em geral também abrangem negociações entre pessoas, empresas e instituições não governamentais além-fronteiras, mas, para esta seção, partimos do princípio de que pelo menos um dos envolvidos seja um Estado. Foto: White House / Fotos públicas Donald Trump primeiro presidente dos EUA a pisar na Coreia do Norte ao lado de Kim Jong Un. A diplomacia é vista como um meio que serve aos Estados em casos de cooperação com base em interesses comuns, ou mesmo se houver interesses opostos, desde que desejem alcançar uma solução não violenta para um conflito. A negociação, dentro dessa forma, tem sido usada ao longo do tempo como ferramenta para tais acordos. Qualquer que seja o método escolhido, a negociação internacional continua sendo a mais importante e prevalente para resolver as diferenças de forma pacífica. ATENÇÃO Os conceitos de “diplomacia” e “negociação” podem parecer quase sinônimos, mas, embora a diplomacia seja uma negociação, nem sempre uma negociação envolve práticas diplomáticas. Como já apontado, o uso do termo “diplomacia” envolve, na contemporaneidade, a atuação de atores representando entidades soberanas. Partindo desse princípio, conseguimos estabelecer algumas divisões sobre esse tipo de mediação, que pode ser bilateral ou multilateral. Imagem: Shutterstock.com MEDIAÇÃO BILATERAL É relativamente mais simples no que diz respeito à complexidade estrutural, já que envolve menos interessados, mas podem ser difíceis de administrar se as posições das partes forem muito polarizadas. Nesse sentido, essas negociações podem exigir que terceiros atuem como facilitadores ou mediadores. Imagem: Shutterstock.com NEGOCIAÇÕES DIPLOMÁTICAS MULTILATERAIS São muito mais complexas, com efeitos diversos entre as partes envolvidas. Um efeito positivo é a inclusão das partes interessadas – ou seja, os países e outras partes, como organizações intergovernamentais e não governamentais –, que têm interesse em que os acordos sejam aprovados. O lado negativo da inclusão, no entanto, é a possibilidade de os múltiplos envolvidos evitarem um resultado que lhes seja indesejável – ou mesmo enfraquecerem o acordo final de tal forma que seja inofensivo aos seus interesses e, portanto, ineficaz para os interesses coletivos. EXEMPLO A Bósnia é um exemplo do lado negativo da inclusão: todas as partes envolvidas no processo de negociação participaram do debate, com o resultado sendo positivo, o fim da guerra. Porém, a quantidade de atores com interesses no processo acabou por prejudicar, posteriormente, a criação de uma administração estatal viável. Imagem: TUBS/Wikimedia Commons/CC BY-AS 3.0. Localização da Bósnia e Herzegovina na Europa A negociação pode ser considerada um dos mais significativos instrumentos de política externa e é a principal responsabilidade dos diplomatas e representantes políticos, no sentido de atender aos interesses de seus governos. Elas são feitas para atingir certos objetivos, concretizar determinados valores ou para proteger e defender os interesses dos países. Por muito tempo, a negociação foi usada para troca de interesses, expressão de preocupações e modificação e correção de entendimentos mútuos. Mas, atualmente, as negociações diplomáticas, cada vez mais importantes, são responsáveis por muitas questões políticas. Obviamente, para resolver uma disputa entre Estados, a negociação é o primeiro passo e a abordagem inicial adotada antes do uso de outros métodos pacíficos. Então, significa que, antes que uma disputa se torne objeto de uma ação internacional, ela deve ser resolvida por meio de alguma manobra diplomática. HISTÓRICO DAS NEGOCIAÇÕES DIPLOMÁTICAS E SEUS DESDOBRAMENTOS Foto: Autor desconhecido / Wikimedia Commons / Domínio público Inscrição em língua suméria do século XXVI a.C. A análise arqueológica já demonstra que 3000 anos a. C. comunidades se engajaram em negociações diplomáticas, como pode ser confirmado em tábuas de argila no Oriente Médio. Obviamente, nesse período, tais encontros bilaterais se davam entre governantes com poder absoluto, lideranças tribais ou representantes de comunidades restritas. Posteriormente, na Itália renascentista, as cidades-estados não só utilizavam representantes especiais, mas também estabeleceram postos diplomáticos permanentes. A diplomacia, portanto, tornou-se mais regulamentada e a produção de normas, nesse contexto, beneficiou as negociações, também se tornando uma ferramenta mais complexa. Foto: CEphoto, Uwe Aranas / © CEphoto, Uwe Aranas Florença, o berço do Renascimento. Imagem: Den fjättrade ankan / Wikimedia Commons / Domínio Público A Ratificação do Tratado Espanhol-Holandês de Münster, 15 de maio de 1648, Gerard ter Borch (detalhe). A Paz de Westfália mudou o significado de soberania: por meio de uma série de negociações bilaterais nas cidades de Münster e Osnabrück, em 1648, declarou-se pela primeira vez que todos os Estados eram legalmente iguais. Assim, Westfália é amplamente vista como a origem de todas as conferências diplomáticas e o início da era dos marcos procedimentais, na medida em que ajudou a criar processos de negociação mais eficazes como alternativa à guerra. Duzentos anos depois, o Congresso de Viena (1814-1815) tornou-se a primeira negociação verdadeiramente multiestatal, embora não totalmente universal, pois o número de partes negociadoras reais foi mantido em cinco: Rússia, Áustria, Prússia, Grã-Bretanha e França. javascript:void(0) Imagem: Maciej Szczepańczyk / Wikimedia Commons / CC BY-SA 3.0. Congresso de Viena. Imagem: Coleções do Museu Imperial da Guerra / Wikimedia Commons / Domínio Público. A Assinatura da Paz no Salão dos Espelhos, Versalhes , 28 de junho de 1919, William Orpen. A Conferência de Paz de Paris de 1919 – concluída pelo Tratado de Versalhes que encerrou a Primeira Guerra Mundial – é um outro exemplo de grande evento da história da diplomacia. Como na Conferência de Viena, representantes de centenas de soberanias apresentaram suas credenciais em Paris, mas apenas cinco foram incluídos no círculo interno: Estados Unidos; França; Grã-Bretanha; Itália e Japão. Além disso, a negociação foi de fato trilateral, visto que o Japão não participou realmente e o papel da Itália foi comparativamente fraco. PAZ DE WESTFÁLIA Considerado o tratado internacional que dá início, de fato, às Relações Internacionais contemporâneas. javascript:void(0) TRATADO DE VERSALHES Engloba a assinatura simbólica de rendição dos alemães e as decisões sobre os eventos da Primeira Guerra. É dentro dessa lógica que podemos entender a diplomacia como uma estrutura institucional que facilita negociações interestatais (JÖNSSON, 2002), com a negociação diplomática sendo essencial para o funcionamento do sistema de Estados-nação (STARKEY; BOYER; WILKENFELD, 2015). É a partir desse processo histórico que, como aponta Meerts (1999, p. 86), os Estados foram estabelecendo para os negociadores diplomáticos uma série de mecanismos de proteção, impedindo um Estado de se elevar, pelo menos normativamente, acima do outro, garantindo que representantes de diferentes culturas nacionais interagissem uns com os outros de uma maneira "segura" e em uma "cultura diplomática" específica. Essa cultura pode incluirum protocolo diplomático, que geralmente regula questões de precedentes; as regras de procedimentos internacionais, que normalmente especificam as ordens de presidência, discursos, debates e mecanismos de decisão; e a linguagem diplomática, que é conhecida por sua ambiguidade construtiva (COHEN, 1986). Nessa lógica, as negociações diplomáticas dependem largamente de normas sociais adotadas internacionalmente e têm como base interações normativas específicas aceitas pela comunidade de países. Imagem: John Skylitzes - Madrid Skylitzes / Wikimedia Commons / Domínio Público. Omortague (r. 815-831), governante da Bulgária, envia uma delegação para o imperador bizantino Miguel II, o Amoriano (r. 820-829). Um olhar histórico sobre a diplomacia na evolução internacional da sociedade nos permite destacar que essas relações são, atualmente, algo mais do que um mero sistema de comunicação da sociedade de Estados. Algumas das inovações da diplomacia desenvolvidas ao longo da história se tornaram elementos permanentes da prática diplomática contemporânea. Um exemplo é o legado duradouro da diplomacia bizantina, que pode ser interpretada pela manutenção da importância dada ao cerimonial e a um código comum de protocolo na conduta diplomática. Uma compreensão mais ampla da diplomacia, portanto, pressupõe o reconhecimento do fato de que há um elemento de aprendizagem entre civilizações e de evolução dos procedimentos. A influência dos modos de diplomacia se espalhou por todo o globo e dificilmente pode ser superestimada. O PODER SIMBÓLICO E AS NEGOCIAÇÕES DIPLOMÁTICAS Negociadores diplomáticos usam amplamente símbolos em ações e interações, incluindo rituais e cerimônias (FAIZULLAEV, 2013). Por exemplo, um anexo simbólico dos mais importantes são justamente as bandeiras dos países, empregadas muitas vezes como forma de reforçar soberania ou, em conjunto com flâmulas de outros Estados, indicar alianças e cooperação. Para criar condições justas para as partes envolvidas, protocolos diplomáticos sugerem regras sobre o uso de bandeiras durante reuniões oficiais e negociações. A igualdade das bandeiras nacionais, tanto em número como em tamanho, é uma das expressões simbólicas de igualdade das partes em torno da mesa de negociação. Imagem: Shutterstock.com SAIBA MAIS Outras práticas diplomáticas estão permeadas de simbolismo: visitas oficiais, troca de presentes, convocação de embaixadores e o aumento ou redução da presença diplomática em um país estrangeiro. Frequentemente, Estados com conflitos de interesses entram em negociação indireta por meio de interações simbólicas. A importância da negociação indireta aumenta quando os países, por qualquer motivo, não podem negociar diretamente ou organizar negociações por meio de terceiros. Nesses casos, os Estados podem usar diferentes tipos de gestos e ações simbólicas, incluindo demonstrações de poder militar, contato com aliados ou rivais, declarações públicas e publicações relacionadas à questão disputada. Essas ações, embora não sejam instrumentos de negociações diretas ou mediadas, podem servir como ferramentas de posicionamento de negociação e barganha entre os Estados. EXEMPLO Como no caso das declarações em campanha e, também, durante o governo de Donald Trump na presidência dos EUA em relação à construção de um muro na fronteira entre o território estadunidense e o mexicano. Esse foi um elemento simbólico importante para sua base de apoio na política interna, como, também, um gesto de referência nas posições de seu governo quanto à política externa norte-americana. Foto: Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA / Fotos Públicas Os agentes da Patrulha de Fronteira dos EUA prenderam imigrantes ilegais. DESAFIOS PARA AS NEGOCIAÇÕES DIPLOMÁTICAS A partir da combinação dos elementos simbólicos supracitados e das dinâmicas materiais, as negociações diplomáticas propriamente ditas podem passar por desafios profundos durante a sua execução. Para fins didáticos, usaremos aqui a taxonomia empregada por Meertz (1999), que indica quatro elementos: violência, complexidade, burocracia e atores. VIOLÊNCIA O primeiro elemento reforça que o uso da força é um componente que sempre paira em debates entre Estados soberanos. A negociação – como guerra por meios pacíficos – está sob constante ameaça de ser destruída por ações violentas se as partes entenderem o uso da força como um instrumento mais eficaz na defesa de seus interesses. A opinião dominante na academia é que um tema terá maior sucesso de ser resolvido por fins pacíficos quando as partes interessadas estiverem em um impasse mútuo que possa gerar uma estratégia de saída pacífica. No entanto, se uma das partes preferir a guerra às palavras, o processo de negociação será relativamente inútil. É por isso que os países tentam estabelecer estruturas como organizações internacionais, para ajudá-los a conter a violência e conduzir processos de negociação protegidos por regras e regulamentos. SAIBA MAIS Nos últimos cinquenta anos, dois terços dos conflitos foram decididos por meio de negociações internacionais; um terço terminou com a vitória militar. COMPLEXIDADE O elemento seguinte reforça que o mundo está se tornando cada vez mais interdependente, com os atores ao redor das mesas de negociação aumentando, assim como o número de temas que são levados para palcos de debates. Isso eleva enormemente a complexidade da negociação diplomática, tanto de forma horizontal quanto vertical. Imagem: Shutterstock.com HORIZONTALMENTE Devido à força relativa dos países e da fraqueza relativa das organizações intergovernamentais e não governamentais, de modo que os países, enquanto pressionam por seus próprios interesses, terão um impacto centrífugo nos processos de negociação. Imagem: Shutterstock.com VERTICALMENTE Do ponto de vista da verticalidade, forças políticas localizadas são cada vez mais influentes, até mesmo porque a mídia permite que parlamentos e as populações se envolvam mais nos processos de negociação por meio de pressões externas, como o lobby. Além disso, os meios modernos de comunicação aumentaram a transparência, enquanto os negociadores geralmente precisam de algum tipo de sigilo para chegar aos resultados. LOBBY Atividade exercida por empresas, entidades, pessoas físicas, grupos representantes da sociedade ou diferentes facções que querem viabilizar interesses e objetivos próprios perante as decisões do poder público. javascript:void(0) BUROCRACIA Seguindo com a listagem proposta por Meertz, a burocracia aponta para a necessidade de compreensão do papel das estruturas de funcionários e sociabilidades criadas em espaços de negociação diplomática. Por exemplo, organizações internacionais também têm suas próprias necessidades e as defendem, mesmo que isso nem sempre esteja de acordo com os interesses de seus Estados membros. A União Europeia é um exemplo da luta entre o todo e as partes constituintes: para se ter conferências diplomáticas bem-sucedidas e para cobrir os principais temas de negociação, a burocracia dessa organização está crescendo. Nesse sentido, durante a negociação do Brexit, inúmeros políticos da Grã-Bretanha criticaram os “burocratas não eleitos em Bruxelas” (DEUTSCHE WELLE, 2017), indicando que a instituição havia se tornado um maquinário burocrata sem conexão com a população. Imagem: Shutterstock.com Embora as burocracias tenham de ser incorporadas para que as negociações sejam bem- sucedidas, essa estruturação também aumentará a perda de eficácia, podendo até gerar uma menor flexibilidade. Diplomatas tentam combater tal rigidez negociando fora da mesa tanto quanto possível, em trabalhos de corredor, encontros bilaterais informais etc. No entanto, estruturas e procedimentos são instrumentos necessários para direcionar os processos ao encerramento. ATENÇÃO Embora a informalidade seja útil, ela pode criar confusão e ambiguidade desnecessárias, pois os negociadoresperderão a supervisão e podem ser menos capazes de controlar os processos. ATORES Por fim, é importante ter em mente que as negociações diplomáticas envolvem atores racionais, que fazem escolhas específicas sobre os assuntos que debatem. Nesse sentido, políticos e diplomatas querem ser recompensados pela energia que colocam na tarefa. Ao mesmo tempo, humanos podem ser temperamentais, impacientes e egocêntricos. A empatia mútua permite um processo tranquilo se os atores se entenderem e até mesmo tenham boas relações interpessoais. ATENÇÃO Obviamente, as negociações podem ser prejudicadas caso os agentes não tenham uma boa relação, ou mesmo caso a defesa da reputação do negociador se torne mais importante do que o interesse de seu país. Políticos, graças aos modernos meios de comunicação e viagens, podem se conectar mais facilmente e afastar seus diplomatas, o que infringe a relativa autonomia da diplomacia, ameaçada já pelo crescente envolvimento de outros agentes em conferências diplomáticas. EXEMPLOS DE NEGOCIAÇÕES COMPLEXAS – PARTE 2 Vamos conhecer melhor o caso de cinco negociações diplomáticas históricas. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. SOBRE AS NEGOCIAÇÕES DIPLOMÁTICAS, PODEMOS DEFINI-LAS COMO: A) as práticas racionais, entre agentes internacionais, no sentido de gerar pacificação em conflitos armados. B) um meio que serve aos Estados em casos de cooperação com base em interesses comuns ou no desejo de alcançar uma solução não violenta para um conflito. C) negociações complexas entre Estados e Instituições Internacionais, em que aqueles são vistos como atores com menor capacidade. D) qualquer prática de negociação internacional que tenha como objetivo elementos de paz. E) a negociação complexa entre diplomatas de diferentes Estados nacionais e instituições internacionais. 2. EM RELAÇÃO À COMPLEXIDADE EM CENÁRIOS DE NEGOCIAÇÃO DIPLOMÁTICA, PODEMOS AFIRMAR QUE: A) são inerentes, pois práticas diplomatas são autores autônomos e não há capacidade de entender os objetivos dos Estados. B) reforça momentos de interdependência dos atores, que são mais numerosos na contemporaneidade. C) é típica das questões internacionais, já que os Estados são atores racionais e movidos por interesse próprio. D) pode ser entendida como ampla: antes do pós-Guerra Fria, os temas estavam restritos em questões de guerra e paz e, atualmente, envolvem outras dinâmicas. E) corresponde à inclusão de instituições internacionais às mesas de negociação. GABARITO 1. Sobre as negociações diplomáticas, podemos defini-las como: A alternativa "B " está correta. A diplomacia é vista como um meio que serve aos Estados em casos de cooperação com base em interesses comuns, ou mesmo se houver interesses opostos, desde que desejem alcançar uma solução não violenta para um conflito. A negociação, dessa forma, tem sido usada ao longo do tempo como ferramenta para esses acordos. 2. Em relação à complexidade em cenários de negociação diplomática, podemos afirmar que: A alternativa "B " está correta. A complexidade diplomática reforça que o mundo está se tornando cada vez mais interdependente, com os atores ao redor das mesas de negociação aumentando, assim como o número de temas que são levados para palcos de debates. MÓDULO 3 Reconhecer as narrativas sobre negociações comerciais e o papel das empresas multinacionais NEGOCIAÇÕES COMERCIAIS Na busca de oportunidades no mercado global, os administradores de empresas, políticos e agentes políticos têm cada vez mais se engajado em negociações comerciais internacionais. Tais atividades são uma das tarefas mais desafiadoras nas companhias, com pesquisas comprovando que líderes dessas empresas podem gastar mais de 50% de seu tempo em processos de negociação (ADLER, 2001). As questões envolvidas nas negociações internacionais comerciais são geralmente relevantes e pesquisadores também apontam que as consequências, em caso de falhas, podem ser bastante grandes: limitações no escopo e potencial de lucro das empresas, aumentos significativos em despesas não recuperáveis e, talvez o mais importante, diminuições na motivação dos negociadores internacionais. Foto: Shutterstock.com A negociação comercial é um tipo de mediação complexa que pode ser definida como a interação deliberada de duas ou mais partes, com pelo menos uma delas sendo uma empresa. Os casos internacionais, aos quais esse módulo também se dedica, envolvem agentes de diferentes nações, que procuram definir ou redefinir os termos de sua interdependência em uma questão de negócios (WEISS, 2006, p. 270). Assim, negócios internacionais são as transações que ocorrem para além das fronteiras de um país, com o propósito de satisfazer as necessidades de indivíduos e organizações. As negociações atuais nem sempre são facilmente classificadas, conforme nos aponta Salacuse (2010, p. 6). Esse autor aponta dois exemplos dessa confusão: Imagem: stock.adobe.com EXEMPLO 1 As negociações em 2006 entre representantes de quatro trabalhadores estrangeiros do petróleo sequestrados e criminosos nigerianos que os capturaram. Na medida em que as questões envolvem empresas, elas poderiam ser consideradas negociações comerciais? Imagem: stock.adobe.com EXEMPLO 2 As negociações realizadas nos EUA entre as subsidiárias americanas de uma montadora de propriedade japonesa e um fornecedor de peças nipônico. Seriam esses casos, envolvendo empresas e Estados, também um modelo de negociações internacionais? Salacuse aponta que sim: na medida em que envolvem questões envolvendo as empresas, não importa se as dimensões são específicas para termos financeiros ou mais amplos, todos os casos se enquadram dentro da lógica comercial. Devido aos vários critérios possíveis, a determinação da origem ou nacionalidade é muitas vezes complicada. Para este módulo, partimos da interpretação que o “internacional" significa o envolvimento de pelo menos dois contextos nacionais. Além disso, é importante ter em mente que uma das partes envolvidas pode ser um indivíduo, não necessariamente uma organização ou grupo. Por exemplo, no início de 2006, um cidadão nacional – o príncipe saudita Abdullah – liderou a compra por US$ 5 bilhões de uma rede de hotéis canadenses após meses de negociação. RESUMINDO Em suma, indivíduos e equipes que representam empresas grandes e pequenas, e indivíduos em negócios individuais, podem negociar com diversas contrapartes – investidores, funcionários, fornecedores, clientes, funcionários públicos, grupos de interesse e outros – em uma ampla variedade de situações transfronteiriças. MUDANÇAS HISTÓRICAS E DOS PROCESSOS DAS NEGOCIAÇÕES COMERCIAIS Nas últimas décadas, o contexto mundial em que ocorrem as negociações comerciais mudou significativamente. As transformações políticas, econômicas, sociais e tecnológicas influenciaram a natureza e o escopo das negociações. EXEMPLO O número de países, as arenas econômicas para os atores empresariais, aumentou de 124, na década 1970, para 196 em 2021. Ao mesmo tempo, apesar dessa fragmentação, a maioria dos países expandiu seus laços econômicos internacionais, tanto do ponto de vista regional quanto global. Os Estados Unidos, Canadá e México estabeleceram o Acordo de Livre Comércio da América do Norte e, na Europa, 27 países formaram a União Europeia. Dentro dessa lógica, atualmente, é quase impossível encontrar um produto ou serviço que não tenha caráter internacional para sua base de clientes, bem como pelo menos um elemento da sua cadeia de abastecimento. Por cadeia de abastecimento, referimo-nos aos insumos que vêm de outras fontes, incluindo as matérias-primas, componentes e equipamentos usados para produzir, armazenar e embalar o produto ou serviço. Não há, portanto, negociações comerciais relevantes, atualmente, que não sejam internacionais. Dessa forma, pode-se apontar muitas formas de transações comerciais internacionais: a visão “clássica” dos negócios comerciais internacionais tem sidoo comércio internacional, na forma de exportação e importação. O comércio, aqui, é entendido como o processo de transações entre atores que estão fisicamente localizados em lugares diferentes. A importância desse processo não deve ser desprezada: de acordo com a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), as exportações de bens e serviços em 2019 foram de US$ 30 trilhões, um aumento de quase seis vezes quando comparado à década de 1980. As Relações Internacionais descrevem essa movimentação de globalização financeira, que seria um dos braços da lógica globalizante tradicional, descrita normalmente pela área. Imagem: Shutterstock.com Desde o início do século XX, a principal mudança tem sido em relação ao crescimento das empresas internacionais, com operações e atividades controladas diretamente no exterior. As operações envolvem as companhias conhecidas como afiliadas ou subsidiárias e aquelas conhecidas como multinacionais. Apesar de vir à nossa mente exemplos como o Google, Huawei ou IBM, a maioria das multinacionais são de pequeno e médio porte, como a Embraer, Cobalt Light Systems e a Mind Gym. Por exemplo, empresas com menos de 200 funcionários contabilizaram 97,6% de todas as empresas em Taiwan, em 2013, e empregavam 78,3% da força de trabalho (ZHAO, 2020). POR QUE EMPRESAS REALIZAM NEGOCIAÇÕES COMERCIAIS INTERNACIONAIS? As empresas tornam-se multinacionais, internacionalizam-se por uma série de razões. Houve muitas tentativas de criar esquemas de classificação de motivos de internacionalização, sendo o motivo mais importante, subjacente a todos os outros, a obtenção de lucro. O objetivo da empresa é, inicialmente, a geração de um maior retorno sobre o seu investimento. Dunning (2008) estabelece uma série de razões, como a procura de recursos naturais e de expansão de mercado, dentre outros motivos. Um conceito importante para entendermos esse processo é o de ativos específicos das empresas (AEE). Esse conceito tenta explicar como empresas de fora de um país podem ser mais competitivas que as locais e, por isso, dedicarem-se a se inserir em outros contextos nacionais. ATENÇÃO Companhias estrangeiras, normalmente, estão em uma posição de desvantagem em comparação às empresas domésticas do país de origem, considerando que as primeiras não têm as conexões, a experiência ou o conhecimento local. Os AEE podem justamente modificar esse jogo. Os AEE podem ser bastante variados, como, por exemplo, equipamentos físicos, propriedade intelectual ou acesso privilegiado a recursos tangíveis e intangíveis, incluindo o conhecimento possuído por funcionários. Também podem estar relacionados a uma melhor organização, que daria vantagens competitivas para as empresas de fora do território onde querem atuar. Assim, internacionalização se enquadraria em uma percepção das empresas, em um mundo globalizado, em que podem aumentar consideravelmente seus lucros ao implementar bases em outras localidades. EXEMPLO A chegada da rede Starbucks no Brasil é bastante ilustrativa: a empresa norte-americana calculou que o país era um grande consumidor de café e passava por modificações no uso da tecnologia, com o aumento do acesso à internet por meio de celulares/smartphones. Os AEE da companhia podem ser vistos como uma combinação desses elementos, desde a organização da franquia, a qualidade do produto e a realidade dos espaços com conexão gratuita por redes sem fio. Foto: Shutterstock.com Dentro dessa lógica, é importante ter em mente que há uma diferença crucial entre a estratégia de uma empresa e sua motivação para se internacionalizar. A estratégia de uma empresa pode envolver certas práticas, incluindo internacionalizar, mas decidir sobre uma localização específica requer que a lógica das vantagens da localização seja incluída na decisão. A motivação para se internacionalizar implica que as empresas multinacionais procuram utilizar suas AEE em conjunto com ativos específicos do local (DUNNING, 2008). Assim, as empresas tendem a utilizar e explorar seus ativos específicos de forma eficiente e de forma mais completa possível, pelo tempo que eles ainda forem relevantes. No entanto, Muchlinski (2007) aponta que é da própria natureza dos ativos que seu valor como mecanismo perca utilidade ao longo do tempo. Em outras palavras, um elemento diferencial, como um produto ou tecnologia, pode perder seus atrativos, na medida em que as empresas concorrentes apresentem produtos e serviços novos ou criem produtos e serviços que os substituam. Sobre esses dois grandes temas, podemos apresentar uma variedade de motivações. As empresas podem se internacionalizar para: BUSCAR MERCADO As empresas desejam aumentar suas vendas ou mesmo alocar práticas de economias de escala. Muitas companhias têm como alvo os Estados Unidos por causa de sua grande população e alta renda per capita. Outras firmas, por sua vez, precisam se diversificar diante dos riscos e incertezas do ciclo econômico doméstico. Ao estabelecer operações em outro país, as multinacionais podem diminuir os efeitos negativos das oscilações econômicas no país de origem. Isso foi amplamente feito por empresas japonesas, por exemplo, as quais descobriram que, embora sua economia doméstica tenha estado em uma crise econômica desde a década de 1990, suas operações nos Estados Unidos e na Europa tiveram um desempenho bastante considerável. GARANTIR O ACESSO A INSUMOS IMPORTANTES PARA SUAS ATIVIDADES Envolvem-se em investimentos na busca de recursos e criando fornecedores de insumos “cativos”. Isso ajuda a reduzir o risco de comportamento oportunista de fornecedores independentes e a volatilidade do mercado. Em outras palavras, eles aprendem como "comprar melhor". Esses recursos podem incluir terras, ativos de mineração extrativa, mão de obra não qualificada (ou semiqualificada), experiência tecnológica/gerencial etc. BUSCAR EFICIÊNCIA Configurando operações perto dos clientes estrangeiros, essas empresas podem eliminar despesas de transporte, evitar a sobrecarga associada ao emprego de intermediários para lidar com o produto e responder com mais precisão às necessidades do cliente, além de aproveitar os recursos locais. Esse processo, conhecido como internalização do controle, pode ajudar a reduzir os custos gerais. Nessa lógica, as empresas podem racionalizar a estrutura de investimento estabelecido baseado em recursos ou em busca de mercado, de forma que a empresa de investimento possa ganhar com a governança comum de atividades geograficamente dispersas como, por exemplo, economias de escala e escopo. Devido a dispositivos de proteção, como barreiras tarifárias e não tarifárias, empresas podem também se estabelecer no local ao invés de exportar. A União Europeia (UE) é um excelente exemplo: as empresas fora da UE estão sujeitas a tarifas sobre produtos exportados – e as firmas que produzem os bens dentro do bloco, no entanto, podem transportá-los para qualquer outro país da UE sem pagar tarifas. Isso pode ser considerado internacionalização de apoio ao comércio. REALIZAR “INVESTIMENTOS DE ESCAPE” As empresas adotam essas práticas, na medida em que o mercado interno pode estar em uma lógica de instabilidade ou com alto grau de risco devido a mudanças políticas, sociais ou econômicas. Um número considerável de empresas de países emergentes procura evitar tais dilemas institucionais, realocando suas atividades em locais onde as instituições formais e informais são mais estáveis. Um bom exemplo é o banco HSBC, criado em Hong Kong, mas, devido às incertezas provocadas pela transferência da área administrativa, em 1997, para a China, decidiu mudar sua sede de operações para o Reino Unido. NEGÓCIOS COMERCIAIS E RISCO POLÍTICO Como citado, o processo de negociação comercial, que, na contemporaneidade, é inevitavelmente internacional, possui um forte caráter de evitar riscos. Ao se internacionalizar, companhias não só podem obter novos mercados, comotambém evitar que todas suas fontes de receita estejam centralizadas em um só local. Nesse sentido, uma ferramenta relevante para as questões desse tipo são as chamadas análises de risco político. O risco político é a probabilidade de que as forças políticas afetem negativamente o lucro de uma empresa ou impeçam a realização de outros objetivos críticos de negócios. Assim, o estudo do risco político aborda mudanças no ambiente que são difíceis de prever como, por exemplo, a eleição de um governo que está comprometido com a nacionalização de grandes indústrias ou que insiste em reduzir a participação estrangeira em empreendimentos comerciais. A maioria das pessoas acredita que o risco político está confinado aos países do Terceiro Mundo ou a aqueles com governos instáveis. No entanto, as políticas de mudança dos governos do Norte Global ilustram que esse risco político também é um problema para as empresas que fazem negócios em países altamente industrializados. Os governos protegem rotineiramente as principais indústrias por razões de segurança nacional, autossuficiência, ou cultura nacional. Os exemplos incluem restrições dos EUA ao investimento estrangeiro no setor bancário, defesa e indústrias de aviação comercial. O Japão realiza proteção de produtores de arroz, e a França ao envolvimento estrangeiro em seus negócios de cinema e mídia. Imagem: Shutterstock.com Muitas dessas disputas políticas são previsíveis, sendo as mudanças inesperadas decorrentes de complexidade e incerteza que criam tipos de risco mais perigosos. No entanto, esses exemplos indicam a difusão do risco político: dado o grande número de mercados internacionais em que operam as empresas multinacionais, o risco continuará a ser uma área de preocupação. Ao lidar com este problema, uma negociação eficaz pode ajudar a reduzir e conter o problema nessas áreas. Podemos examinar o risco político em dois níveis diferentes: macro ou micro. RISCO MACROPOLÍTICO EXEMPLO O risco macro é aquele que afeta todas as empresas estrangeiras da mesma maneira: a expropriação, a apreensão governamental de empresas privadas, com pouca ou nenhuma compensação aos proprietários, por exemplo. Governos comunistas na Europa Oriental e na China expropriaram empresas privadas após a Segunda Guerra Mundial. Fidel Castro fez o mesmo em Cuba de 1958 a 1959. Nos anos mais recentes, os governos de Angola, Chile, Etiópia, Peru e Zimbábue expropriaram empresas privadas. Em alguns casos, isso ocorre por leis que exigem que os cidadãos nacionais tenham participação majoritária em todas as empresas: por exemplo, a privatização de uma série de indústrias estatais na Rússia marcou um ponto de inflexão na história daquele país. No entanto, a corrupção e extorsão que levaram indivíduos politicamente conectados a construir grandes fortunas das indústrias de petróleo e alumínio podem ter desencadeado outro ponto de inflexão. Foto: Shutterstock.com Fidel Castro SAIBA MAIS O risco macropolítico também pode ser o resultado de boicotes políticos. Durante a guerra no Iraque, após os ataques em 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos, consumidores norte- americanos boicotaram as importações francesas e evitaram férias na França, na medida em que os franceses não apoiaram a invasão militar do Iraque. RISCO MICROPOLÍTICO Por sua vez, um risco micropolítico é aquele que afeta setores selecionados da economia ou negócios estrangeiros específicos. Esses riscos são normalmente resultado de uma ação governamental na forma de regulamentação, impostos sobre tipos específicos de atividade comercial e leis de conteúdo local. Vários fatores ajudam a determinar o grau de risco micropolítico. Um é o domínio de empresas estrangeiras ou a crescente competitividade de seus produtos em uma indústria. Imagem: stock.adobe.com EXEMPLO 1 Pequenos e médios fabricantes de ferramentas de precisão para a indústria eletrônica nos Estados Unidos uniram forças para fazer lobby por tarifas mais altas sobre as importações que pudessem competir com seus produtos, incluindo aqueles feitos por grandes empresas americanas com bases fora do seu país. Baseados no crescente deficit comercial e nas perdas de empregos na indústria, eles usaram a Associação Nacional Norte-Americana de Fabricantes para pressionar o governo a desafiar os regulamentos da OMC (Organização Mundial do Comércio) , no sentido de proteger seus negócios específicos. Essas firmas foram bem- sucedidas, com impactos para as empresas que exportavam para os EUA. Foto: stock.adobe.com EXEMPLO 2 O fim do sistema de cotas têxteis globais em janeiro de 2005, que mudou drasticamente o ambiente competitivo para países como Quênia e Paquistão. Sob esse sistema, os Estados e a União Europeia restringiram as importações de têxteis de acordo com o país de origem. Isso teve o efeito de proteger parcialmente esses países da competição direta com países como a Índia e China, na medida em que tinham volume garantido de exportação para os grandes mercados. Até 60% da receita anual de exportação do Paquistão veio do setor têxtil, que empregava mais da metade da força de trabalho industrial do país. Então, essa mudança teve um impacto significativo em sua economia. Esse último exemplo mostra que alguns riscos políticos são previsíveis, podem ser parcialmente planejados e devem ser considerados em negociações comerciais contemporâneas. EXEMPLOS DE NEGOCIAÇÕES COMPLEXAS – PARTE 3 Vamos conhecer algumas negociações comerciais emblemáticas do mundo contemporâneo. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. SOBRE AS MUDANÇAS CONTEMPORÂNEAS QUE IMPACTAM NAS NEGOCIAÇÕES COMERCIAIS INTERNACIONAIS, NÃO PODEMOS CITAR: A) o aumento expressivo de Estados, incrementando o possível mercado para essas empresas. B) mudanças tecnológicas, como aquelas ligadas às ferramentas de comunicação, criando não só novos produtos de negócios como facilitando a transferência de métodos. C) a criação e o fortalecimento de Blocos Econômicos – que provocaram alterações nas tarifas e nas estratégias de negócios. D) as mudanças políticas democráticas, com os países relevantes atuando de forma democrática. E) as mudanças sociais, com a inclusão de novos grupos e segmentos da sociedade no mercado consumidor. 2. ASSINALE A MELHOR DEFINIÇÃO SOBRE AS NEGOCIAÇÕES COMERCIAIS INTERNACIONAIS: A) Pode ser definida como a troca de produtos entre duas empresas que estão em espaços soberanos distintos. B) É sempre entre uma empresa do Norte Global atuando em espaços do Sul, levando sempre a trocas desiguais. C) Envolve a interação deliberada com trocas comerciais de duas ou mais partes, com pelo menos uma delas sendo uma empresa. D) Envolvem trocas comerciais articuladas por pelos menos dois atores, mediadas por uma instituição internacional. E) É, em última instância, a relação entre Estados, já que as empresas multinacionais possuem relações diretas com as nações. GABARITO 1. Sobre as mudanças contemporâneas que impactam nas negociações comerciais internacionais, não podemos citar: A alternativa "D " está correta. Apesar da expansão dos governos democráticos a partir do fim da Guerra Fria, principalmente após a independência das antigas repúblicas soviéticas, existem inúmeros casos de Estados não democráticos que são extremamente relevantes para o cenário econômico, como a China, Rússia e Arábia Saudita. 2. Assinale a melhor definição sobre as negociações comerciais internacionais: A alternativa "C " está correta. A negociação comercial pode ser definida como a interação deliberada de duas ou mais partes, com pelo menos uma delas sendo uma empresa. Nos casos internacionais, aos quais esse módulo também se dedica, elas envolvem agentes de diferentes nações, que procuram definir ou redefinir os termos de sua interdependência em uma questão de negócios. CONCLUSÃO CONSIDERAÇÕES FINAIS As reflexões sobre as negociações complexas – sejam elas para fins teóricos ou práticos – precisam levar emconta as mudanças no cenário internacional. Como apontamos aqui, diversos pesquisadores já indicam que não existem processos relevantes, políticos, econômicos ou sociais, que possam ser negociados sem se levar em conta o impacto de questões transnacionais. Somam-se a esses aspectos a multiplicidade, também provocada pela contemporaneidade, de novos atores, normas e valores que permeiam as trocas entre agentes econômicos e políticos. Nesse sentido, refletimos aqui que é possível dividir as negociações complexas em três grandes aspectos: as dimensões político-administrativas; as questões diplomáticas; as considerações comerciais. A primeira reflete sobre as conexões entre atores com fins políticos, sejam eles dentro um Estado-nação ou internacionalmente, como subsídios para projetos de habitação popular com deputados, redação por membros do parlamento de nova legislação tributária ou discussão por dois chefes de Estado sobre um possível cessar-fogo em um conflito armado. Como esses exemplos sugerem, as negociações políticas podem ter um grande impacto na condição de vida em contextos locais e globais. A relevância dessas negociações é baseada não apenas nesse impacto direto, mas também na natureza da negociação como uma ferramenta inerentemente democrática, que permite que as pessoas cheguem a decisões políticas de forma coletiva. A segunda consideração diz respeito às negociações diplomáticas. A diplomacia é vista como um meio que serve aos Estados em casos de cooperação com base em interesses comuns, ou mesmo se houver interesses opostos, desde que desejem alcançar uma solução não violenta para um conflito. A negociação, dentro dessa forma, tem sido usada ao longo do tempo como ferramenta para esses acordos. Qualquer que seja o método escolhido, a negociação internacional continua sendo a mais importante e prevalente para resolver as diferenças internacionais de forma pacífica. Por fim, refletimos sobre negociações comerciais internacionais, que definimos como o estudo das transações que ocorrem em todo o país com o propósito de satisfazer as necessidades de indivíduos e organizações. Importante reforçar que a ênfase no tipo de ator e sujeito da negociação: esse entendimento inclui negociações entre empresas multinacionais e governos anfitriões sobre o investimento estrangeiro direto. A combinação holística desses pontos é essencial para que analistas, profissionais e interessados possam navegar no complexo cenário contemporâneo de negócios e, dentro das possibilidades, estabelece vínculos bem-sucedidos nas áreas em que atuam. AVALIAÇÃO DO TEMA: DIREITO DE USO DE IMAGEM * A EnsineMe reserva ao autos o direito de se manifestar. REFERÊNCIAS ADE, V. Political negotiations: characteristics and related performance disincentives. International Journal of Conflict Management, 2019. Consultado na internet em: 27 maio 2021. ADLER, N. J.; GUNDERSEN, A. International dimensions of organizational behavior. Cincinnati: South-Western, 2001. COHEN, Y. Media Diplomacy: The Foreign Office in the Mass Communication Age. Londres: Frank, 1986. DRUCKMAN, D.; WALLENSTEEN, P. Summit meetings: Good or bad for peace? Global Summitry, 2(2), 71-92, 2016. Consultado na internet em: 27 maio 2021. DUNNING, J. H.; Lundan, S. M. Multinational enterprises and the global economy. 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Rio de Janeiro: Alta Books, 2017. CONTEUDISTA Fernando Luz Brancoli CURRÍCULO LATTES javascript:void(0); javascript:void(0);
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