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2 OS CABOCLOS JÁ CHEGARAM - POR UMA ESCUTA MULTIESPECIES DAS VOZES DO ANTROPOCENO

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OS CABOCLOS JÁ CHEGARAM: POR UMA ESCUTA MULTIESPÉCIES DAS VOZES DO ANTROPOCENO
DA GEOLOGIA À PLURIDISCIPLINARIDADE: UM CONCEITO QUE GANHOU VIDA PRÓPRIA
1. Antropoceno: O ensaio começa apresentando o conceito de Antropoceno, que se refere a uma época geológica na qual a ação humana tem um impacto significativo nos sistemas naturais da Terra. Este termo foi proposto por Paul Crutzen e Eugene Stoermer em 2000. O texto destaca que a mudança de nome da época atual é controversa entre os geólogos, mas o conceito do Antropoceno tem se expandido como um campo de pesquisa interdisciplinar dedicado à crise socioambiental planetária.
2. Diversidade de Abordagens: O ensaio observa que há uma grande variedade de abordagens para entender o Antropoceno, incluindo perspectivas críticas e otimistas. Alguns veem o Antropoceno como uma época de crise climática e urgência em reduzir as emissões de carbono, enquanto outros defendem o "bom Antropoceno", argumentando que as tecnologias futuras resolverão os problemas ambientais.
3. Perspectiva Crítica: A maioria dos estudiosos do Antropoceno tende a adotar uma perspectiva crítica, argumentando que é necessária uma reformulação fundamental da agência humana em relação à natureza. Isso é visto como crucial para evitar efeitos irreversíveis sobre o planeta e a sobrevivência da humanidade.
4. Sexta Extinção em Massa: O ensaio menciona a "sexta grande extinção em massa", que se refere à extinção em grande escala de espécies causada pela ação humana. Esta extinção é única porque é a primeira vez na história da Terra que uma única espécie (humana) está causando uma extinção em massa.
5. Ecologia de Saberes e Epistemologias do Sul: O ensaio também destaca a importância da Ecologia de Saberes e das Epistemologias do Sul na compreensão do Antropoceno. Isso envolve a valorização de conhecimentos indígenas e locais, bem como uma crítica ao eurocentrismo nas abordagens ao meio ambiente.
6. Decolonialidade: O ensaio enfatiza a perspectiva decolonial como parte integrante do entendimento do Antropoceno. Isso inclui questionar a mentalidade colonial que levou a ações prejudiciais ao meio ambiente e à busca de soluções que levem em consideração uma justiça ambiental global.
Em resumo, o ensaio oferece uma visão abrangente e crítica do conceito de Antropoceno, destacando sua importância como um campo de pesquisa interdisciplinar que lida com questões urgentes relacionadas à crise ambiental global e a necessidade de repensar a relação entre a humanidade e o meio ambiente.
AS ESTRELAS: ANTROPOCENO, SOBERBA COLONIAL E ECOLOGIA DE SABERES
O ensaio enfatiza de maneira significativa a importância da abertura para diferentes formas de conhecimento e a valorização das epistemologias do Sul como parte fundamental de uma abordagem eficaz do Antropoceno. Ele destaca a necessidade de superar a arrogância associada à ideia de que o conhecimento ocidental é universalmente superior e que as soluções para os desafios do Antropoceno podem ser encontradas apenas nesse paradigma.
A referência ao conceito de "Ecologia de Saberes" de Boaventura de Sousa Santos destaca a necessidade de reconhecer e respeitar a diversidade de conhecimentos e experiências, especialmente aqueles historicamente marginalizados ou oprimidos. Essa abordagem promove um diálogo intercultural e interepistemológico que enriquece a compreensão dos desafios e das soluções para o Antropoceno.
A humildade intelectual e a escuta atenta são características essenciais destacadas no ensaio, pois reconhecem que a resolução dos problemas do Antropoceno exige a colaboração genuína e o aprendizado mútuo entre diferentes perspectivas de conhecimento. Isso inclui não apenas a ciência ocidental tradicional, mas também os saberes indígenas, tradicionais e outras formas de conhecimento local.
Em última análise, o ensaio apela para uma transformação profunda na maneira como a humanidade se relaciona com o mundo natural e com as diversas culturas e saberes presentes no planeta. A superação da soberba colonial da modernidade é fundamental para criar uma abordagem mais inclusiva, colaborativa e eficaz na busca de soluções para os desafios complexos e interconectados do Antropoceno. Essa abordagem reconhece que nenhum paradigma de conhecimento único pode enfrentar adequadamente os problemas que enfrentamos e que a diversidade de saberes é uma riqueza a ser valorizada e cultivada em nossa jornada rumo a um futuro mais sustentável e justo.
O BEBÊ E A ÁGUA DA BACIA: MODERNIDADE, COLONIALIDADE E DECOLONIALIDADE
O texto aborda uma questão crucial: a relação entre a Modernidade e a Colonialidade, destacando o lado sombrio da Modernidade que, muitas vezes, serviu de fachada para as agendas coloniais. A análise sugere que há duas maneiras de interpretar essa relação complexa.
Uma interpretação mais radical argumenta que os supostos valores e conquistas do projeto da Modernidade sempre foram meras fachadas para os intentos coloniais, e que, portanto, não há méritos reais na Modernidade. Essa visão é caracterizada pela desconfiança profunda em relação aos supostos benefícios da Modernidade, destacando seu papel na exploração e na opressão.
Por outro lado, uma interpretação mais moderada reconhece que, apesar dos aspectos sombrios e coloniais da Modernidade, surgiram realizações tecnológicas, científicas e epistemológicas que podem beneficiar a humanidade. Isso inclui noções como os direitos humanos, que têm sido fundamentais para lutas sociais e reivindicações por justiça e igualdade. O texto também reconhece o papel da Modernidade na produção e disseminação de conhecimento, como evidenciado pelo próprio ensaio sendo submetido a um periódico acadêmico e disponibilizado online.
No entanto, o ponto central do ensaio é que, apesar desses possíveis benefícios da Modernidade, é crucial que a sociedade contemporânea aprenda a ouvir e dar espaço às vozes que a Modernidade historicamente calou. Isso envolve uma abordagem de humildade intelectual e abertura para diferentes perspectivas, especialmente aquelas historicamente marginalizadas ou oprimidas, como os povos indígenas, comunidades tradicionais e outros grupos subalternizados. A metáfora de "ouvir muito e falar pouco" destaca a importância de aprender com essas vozes e compreender os conhecimentos e experiências que podem ser cruciais na busca por soluções para os desafios do Antropoceno.
Em última análise, o texto argumenta a favor de uma abordagem equilibrada que reconhece os aspectos problemáticos da Modernidade, mas também valoriza as contribuições positivas que ela trouxe, desde que seja acompanhada de uma reflexão crítica e de um compromisso genuíno com a justiça, a igualdade e a colaboração intercultural. Isso implica em abrir espaço para uma diversidade de saberes e vozes na busca por respostas aos desafios complexos do nosso tempo.
A VIRTUDE MÍOPE DO HUMANISMO
O trecho do texto discute a questão do antropocentrismo, que é a ideia de que os seres humanos são o centro e a medida de todas as coisas, e o excepcionalismo humano, que é a crença de que os seres humanos são excepcionais e superiores a todas as outras formas de vida. Essas ideias têm profundas raízes na história da Modernidade e na forma como a ciência moderna tradicionalmente tratou os animais.
O texto argumenta que o antropocentrismo e o excepcionalismo humano são formas de miopia, pois limitam nossa compreensão e apreciação das outras formas de vida e do mundo natural. O antropocentrismo implica que só valorizamos e levamos em consideração as formas e vozes humanas, ignorando a rica diversidade das formas de vida não humanas.
O excepcionalismo humano, por sua vez, sustenta a ideia de que os seres humanos têm o direito natural de subjugar e explorar todas as outras formas de vida em benefício próprio. Isso tem levado a práticas cruéis em relação aos animais, como a criação industrial de animais para alimentos, experimentação em laboratórios e a indústria de peles.
O texto também observa que, historicamente, a ciência moderna contribuiupara a perpetuação dessas ideias, especialmente com a visão de René Descartes de que os animais são meros autômatos insensíveis. No entanto, o texto destaca que, graças aos estudos de pesquisadores como Jane Goodall, Dian Fossey e Biruté Galdikas, bem como à Etologia Cognitiva de Donald Griffin, a visão dos animais está mudando, reconhecendo a complexidade de seu comportamento e a presença de inteligência e emoções.
No entanto, o excepcionalismo humano ainda persiste em muitos aspectos da sociedade e da ciência, e o texto alerta para a necessidade de superar essas ideias míopes. Reconhecer a inteligência e a sensibilidade dos animais, bem como a interconexão de todas as formas de vida na biosfera, é crucial para abordar os desafios do Antropoceno de maneira mais ética e sustentável. Isso implica em repensar nossa relação com os animais e o ambiente natural e em adotar uma abordagem mais holística que valorize todas as formas de vida e o planeta como um todo.
A PERSPECTIVA MULTIESPÉCIES
O trecho do texto destaca a importância da abordagem multiespécies nos estudos do Antropoceno. Essa abordagem questiona os pilares epistemológicos da Modernidade, como o excepcionalismo humano e a dicotomia entre natureza e cultura, e propõe uma visão mais ampla e interconectada do mundo natural.
A abordagem multiespécies reconhece que a vida na Terra é caracterizada por uma teia complexa de interdependências entre todas as formas de vida, não apenas os seres humanos. Ela supera a ideia de que os seres humanos são o centro de tudo e destaca que todas as espécies têm agência e contribuem para a construção do mundo vivo.
A autora Anna Tsing é mencionada como uma das defensoras dessa abordagem, propondo uma "antropologia-mais-que-humana" que amplia o escopo das ciências acadêmicas tradicionais para incluir uma compreensão mais profunda das relações entre todas as espécies.
A abordagem multiespécies desafia a visão antropocêntrica que trata os seres não humanos como recursos a serem explorados e destaca a necessidade de reconhecer o valor intrínseco de todas as formas de vida. Ela também enfatiza que as formas de vida não humanas são sujeitos ativos na construção do mundo e que a interdependência entre as espécies é fundamental para a sobrevivência e a sustentabilidade do planeta.
O texto finaliza observando que, embora os seres humanos tenham exercido um poder considerável sobre o planeta, a recente pandemia de COVID-19 é um lembrete de que a vida é complexa e interconectada, e que os microorganismos, em particular as bactérias, desempenham um papel fundamental na biosfera. Portanto, a abordagem multiespécies nos convida a repensar nossa relação com todas as formas de vida e a reconhecer nossa interdependência com o mundo natural.
A ESCUTA DOS POVOS PRIMEIROS: TRANSDISCIPLINARIDADE E ANIMISMO
O trecho do texto destaca a importância da transdisciplinaridade e da escuta das múltiplas vozes do Antropoceno, indo além das limitações das disciplinas acadêmicas tradicionais. Ele menciona a necessidade de reconhecer e valorizar outros tipos de conhecimento, além do conhecimento científico, e destaca a importância de aprender com os povos originários e suas cosmovisões animistas.
A transdisciplinaridade envolve a abertura para diferentes formas de conhecimento e a integração de perspectivas diversas na abordagem dos desafios do Antropoceno. Isso significa reconhecer que a ciência não é a única fonte de conhecimento válida e que outras formas de sabedoria, como as dos povos indígenas, têm méritos próprios.
A citação de Boaventura de Sousa Santos enfatiza a ideia de que diferentes tipos de conhecimento são relevantes para diferentes contextos e propósitos. Por exemplo, o conhecimento científico pode ser essencial para objetivos específicos, como a exploração espacial, enquanto o conhecimento dos indígenas é fundamental para compreender a biodiversidade da Amazônia.
O texto também destaca a importância do animismo nas cosmovisões dos povos originários. O animismo é a crença de que todas as coisas, desde seres humanos até elementos naturais como árvores e rios, têm vida e inteligência. Isso implica uma profunda conexão com o mundo natural e uma compreensão de que a natureza está viva e consciente. O animismo desafia a visão moderna de que a natureza é inanimada e pode contribuir para uma compreensão mais holística e interconectada do mundo.
A fala do xamã yanomami Davi Kopenawa enfatiza a ideia de que a floresta e a natureza como um todo são inteligentes e vivas. Ele destaca que a floresta possui um "sopro vital" que sustenta a vida e a saúde das plantas e dos seres humanos. Essa visão animista da natureza ressalta a importância de cuidar e preservar o meio ambiente, reconhecendo que tudo na Terra está interligado e vivo.
Em resumo, o texto destaca a necessidade de abraçar a transdisciplinaridade, valorizar diferentes formas de conhecimento e aprender com as cosmovisões animistas dos povos originários para enfrentar os desafios do Antropoceno de maneira mais holística e sustentável.
PALAVRAS QUE ABRAM OLHOS E MUNDOS
O trecho do texto destaca a importância da linguagem e das palavras na nossa compreensão do mundo e na nossa relação com o ambiente. Ele chama a atenção para a diferença entre a linguagem dos Potawatomi, que enfatiza a animação e a relação de todas as coisas com a vida, e a linguagem ocidental, que muitas vezes separa o mundo em categorias animadas e inanimadas.
A linguagem dos Potawatomi, com sua alta porcentagem de verbos, expressa uma visão de mundo em que tudo está vivo e em constante relação. Cada palavra declara o estado animado ou inanimado daquilo a que se refere, enfatizando a interconexão e a vitalidade de todas as coisas. Essa perspectiva animista reconhece que tudo na natureza, desde os cogumelos emergindo da terra até uma baía, está cheio de vida e inteligência.
O autor argumenta que a linguagem desempenha um papel fundamental na nossa compreensão do mundo e que precisamos repensar nossa gramática e vocabulário para refletir uma visão de mundo mais ampla e interconectada. Ele propõe uma "gramática do animado" que nos ajude a reconhecer a vida em todas as coisas e a estender a categoria de "vida" para além dos limites do pensamento ocidental tradicional.
Além disso, o texto destaca a importância de ouvir e aprender com as vozes dos povos indígenas e das culturas milenares que têm uma compreensão profunda da interconexão entre os seres vivos e o ambiente. Essas culturas valorizam a relação com a natureza e reconhecem a importância de cuidar e preservar o mundo em que vivemos.
Em resumo, o texto nos convida a repensar nossa linguagem e nossa relação com o mundo, reconhecendo a vida em todas as coisas e ouvindo as vozes que nos lembram da interconexão e da importância de viver em harmonia com a natureza.
ANIMISMO E ENCANTAMENTO
O texto enfatiza a importância do encantamento, da conexão com a espiritualidade, e do respeito à natureza e aos conhecimentos tradicionais dos povos indígenas como caminhos para enfrentar os desafios do Antropoceno. Ele destaca como pensadores como Luiz Antônio Simas, Luiz Rufino e Davi Kopenawa Yanomami defendem a necessidade de uma "ciência encantada" e uma abordagem que reconheça a vida em todas as coisas.
A perspectiva do encantamento, segundo os autores, é fundamental para superar as lógicas de dominação e exploração que permeiam o modelo colonialista e capitalista. Ela permite que as pessoas reconheçam a interconexão entre todos os seres vivos e valorizem a natureza não apenas por seu valor instrumental, mas por seu valor intrínseco.
O exemplo dos yanomamis e de Davi Kopenawa Yanomami destaca como esses povos indígenas têm uma relação profunda com a floresta e reconhecem seu valor não apenas como recurso, mas como parte essencial de suas vidas. Eles veem a floresta como um ser vivo, e seu conhecimento é baseado em uma vivência corporificada e espiritualizada.
Além disso, o texto aponta para a importância da escuta e da humildade em relação aos conhecimentos tradicionaisdos povos indígenas e das culturas que têm uma visão de mundo mais interconectada. A ideia é que, ao reconhecermos a sabedoria desses povos e aprendermos com eles, podemos encontrar caminhos para enfrentar os desafios do Antropoceno de uma forma mais sustentável e harmoniosa com o meio ambiente.
Em última análise, o texto nos convida a repensar nossas concepções de ciência, conhecimento e valor, reconhecendo a importância do encantamento, da espiritualidade e da relação com a natureza como elementos essenciais para a sobrevivência e o bem-estar de todas as formas de vida no planeta.

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