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FICHAMENTO_ UNIDADE 1_ A desagregacao da sociedade feudal e a emergencia da modernidade - 060821

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
INSTITUTO DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
DISCIPLINA: HISTÓRIA MODERNA
PROFESSOR: WELLINGTON BERNARDELLI SILVA FILHO
ACADÊMICA: MACARENA CAVALCANTE MAIRATA
	HILTON, Rodney et al. Uma Crítica; Uma Réplica. In: A transição do feudalismo para o capitalismo. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977.
UNIDADE 1
A desagregação da sociedade feudal e a emergência da modernidade
Uma crítica
Paul Sweezy
Sweezy inicia sua crítica apontando que, segundo Dobb, a definição de feudalismo consiste em: “(...) como sendo "virtualmente idêntico com o que usualmente se entende por servidão: uma obrigação imposta ao produtor pela força, independentemente de sua vontade, no sentido de cumprir certas exigências econômicas de um senhor, quer sob a forma de serviços a serem prestadas ou de tributos a serem pagos em dinheiro ou espécie." (p.39).
Para o autor, a definição dada por Dobb para feudalismo é um equívoco pois “(...) ao não identificar um sistema de produção, alguma forma de servidão pode existir em sistemas que nada têm de feudal (...).” (p.40). Sweezy contra-argumenta o que diz Dobb citando Engels “(...) certamente servidão e dependência não são uma forma específica (spezifisch) medieval-feudal, encontramo-la em toda parte ou quase toda parte onde os conquistadores fizeram os antigos habitantes cultivarem a terra para eles". (p.40).
O autor aponta as características traçadas do feudalismo da Europa ocidental por Dobb: “1) baixo nível técnico, no qual os instrumentos de produção são simples e em geral baratos, e o ato de produção é em grande parte de caráter individual; a divisão de trabalho ... se encontra em grau de desenvolvimento muito primitivo"; 2) "produção para atender as necessidades imediatas da família ou da comunidade aldeã, e não para um mercado mais amplo"; 3) "agricultura dominial: cultivo das terras do senhor, às vezes em grande escala, mediante trabalho compulsório"; 4) "descentralização política"; 5) "detenção condicional da terra em troca de algum tipo de serviço para o senhor"; 6) "exercício, por parte de um senhor, de funções judiciais ou quase-judiciais em relação à população dependente”. (p.41).
Sweezy traz uma reflexão importante acerca da ‘competição’ existente tanto no capitalismo, como, segundo ele, era um elemento visto nas relações feudais. “(...) um elemento de instabilidade é a competição entre os senhores por terras e vassalos, os quais constituem, somados, o fundamento do poder e do prestígio. Esta competição é análoga à que existe pelos lucros sob o capitalismo, mas seus efeitos são bastante diferentes. Gera um estado de guerra mais ou menos constante; a resultante insegurança de vidas e bens, porém, ao invés de revolucionar os métodos de produção, como o faz a competição capitalista, apenas reforça a dependência mútua do senhor e dos vassalos, fortalecendo, portanto, a estrutura básica das relações feudais”. (p.41). 
O crescimento populacional é tido por Sweezy como um segundo elemento de instabilidade, o autor afirma: “(...) a estrutura da senhoria limita o número de produtores que é capaz de empregar e o número de consumidores que pode sustentar (...). Isso não significa, é claro, que o crescimento é impossível, mas apenas que ele sempre é inferior ao aumento da população. Os filhos mais moços dos servos são expulsos da estrutura regular da sociedade feudal e vão constituir a população errante — que vive de esmolas ou de banditismo e que fornece a matéria-prima para os exércitos mercenários — tão característica da Idade Média”. (p.41, p.42). 
A teoria de Dobb sobre o declínio do feudalismo
Sweezy relata que para Dobb as razões do declínio do feudalismo estão na “(...) ineficiência do feudalismo como sistema de produção, somada às crescentes necessidades de receitas por parte da classe dominante, a responsável principal pelo seu declínio (...). E prossegue acerca da teoria de Dobb sobre o declínio do feudalismo: “(...) a causa fundamental do colapso do feudalismo foi a superexploração da força de trabalho: os servos desertaram das propriedades senhoriais en masse, e os que permaneceram eram muito poucos e demasiadamente sobrecarregados para permitir que o sistema se mantivesse na sua antiga base”. (p.43, p.44). 
Uma crítica à teoria de Dobb
O autor faz duras críticas à teoria de Dobb que se utiliza da necessidade do “aumento da receita da classe dominante feudal e da fuga dos servos da terra”, para trazer à tona os enfrentamentos no interior do sistema feudal e consequentemente, entender o porquê de seu colapso, (p.45). 
Entretanto, Sweezy refuta esses dois fatores da teoria de Dobb quanto ao aumento da receita da classe dominante feudal e a fuga dos servos com os seguintes argumentos: “(...) mesmo num sistema dinâmico tal como o capitalismo, mudanças espontâneas nos gastos dos consumidores são desprezíveis, e o mesmo se aplicaria a fortiori a uma sociedade tradicionalmente como o feudalismo. Além disso, considerando se o que se passava fora do sistema feudal, encontramos múltiplas razões para a crescente extravagância da classe dominante feudal: a rápida expansão do comércio a partir do século XI punha ao seu alcance uma quantidade de bens cada vez maior e mais variada”. (p.46); quanto a fuga dos servos: “(...) Os servos não podiam simplesmente desertar das senhorias, não importa quão severos pudessem tornar-se seus senhores, a menos que tivessem para onde ir”. (p.47). 
E prossegue concluindo sua crítica a teoria de Dobb: “(...) não tendo analisado as leis e tendências do feudalismo europeu ocidental, engana-se ao tomar como tendências imanentes certos desenvolvimentos históricos que de fato só podem ser explicados como produto de causas externas ao sistema”. (p.48).
Outros comentários sobre a teoria do declínio do feudalismo
Sweezy, trás algumas reflexões sobre a teoria: a ineficiência da organização senhorial da produção, (p.50); a mera existência do valor de troca como um fato econômico de vulto tende a transformar a atitude dos produtores, (p.53); evolução dos gostos da classe feudal dominante, (p.53); por fim, (...) o desenvolvimento das cidades, que eram os centros e os geradores da economia de troca, abriu para a população servil do campo a perspectiva de uma vida melhor e mais livre. (p.53). 
E, apesar de suas duras críticas à teoria de Dobb, Sweezy expõe sobre importantes contribuições de Dobb ao debate sobre o tema: “Dobb, portanto, está certíssimo ao rejeitar a teoria de que a ascensão do comércio automaticamente traz consigo o fim da servidão; e se a servidão se identifica com o feudalismo, o que é verdadeiro ex definitione, o fim do feudalismo também”. (p.54).
O que se seguiu ao feudalismo na Europa Ocidental?
Após o colapso do feudalismo, o que segundo Sweezy, decorreu foi: “(...) o feudalismo europeu ocidental entrou num período de crise aguda no século XIV e daí por diante se desintegrou, com maior ou menor rapidez em diferentes regiões”. (p.56). E chama o período intermediário entre um sistema e outro de “produção pré-capitalista”, (p.59). 
Período que ele define como: “(...) bastante forte para minar e desintegrar o feudalismo, mas fraco demais para desenvolver uma estrutura independente própria: tudo o que poderia realizar de positivo era preparar o terreno para o avanço vitorioso do capitalismo nos séculos XVII e XVIII”. (p.62). 
Algumas observações sobre a ascensão do capitalismo
Acerca da análise da ascensão do capitalismo feita por Dobb, Sweezy expressa que é "preciso e elucidativo". Entretanto, o autor torna a sua posição crítica. (p.63). A origem do capitalista industrial e o processo da acumulação original, analisados por Dobb, para Sweezy, houve “má leitura de Marx”. (p.65). 
E esclarece: “Quando se trata de analisar os requisitos para o investimento industrial, ele mostra que o complemento necessário para a aquisição por parte da burguesia não era a realização, pela mesma, mas a ruptura do antigo sistema de produção e, especialmente, a expropriação dosbens de um número suficiente de agricultores de maneira a formarem uma classe disposta a trabalhar por salário”. (p.68). 
Uma réplica
Maurice Dobb
Dobb inicia seu artigo enfatizando a importância das críticas de Paul Sweezy ao debate sobre a compreensão do "desenvolvimento histórico e do marxismo como método de estudo desse desenvolvimento". (p.71). 
E esclarece: “Em primeiro lugar, não estou certo de que Sweezy rejeite minha definição de feudalismo ou apenas a considere incompleta. Essa definição, segundo ele, assenta na virtual identificação do feudalismo com servidão (...). Se ele considera que o feudalismo assim definido cobre algo mais amplo que a forma medieval de economia europeia, para abranger grande variedade de tipos que (em qualquer estudo mais aprofundado do feudalismo) mereçam análise cuidadosa, concordo plenamente. Mas ao referir-se a um "sistema de produção" ele parece dizer algo diferente disso, pondo em contraste um sistema de produção a um modo de produção no sentido de Marx. Não vejo bem o que se pretende que seja abrangido por um sistema de produção. Mas o que segue indica a intenção de fazer incluir as relações entre o produtor e seu mercado (...)”. (p.71).
O autor reconhece que “(...) a relação de produção seja em si mesma capaz de considerável variação. (...) seja prestação direta de serviços ou apropriação de tributos em espécie ou dinheiro.” (p.72). Mas pontua: “(...) a distinção entre elas não corresponde à que existia entre o "feudalismo da Europa ocidental" — sobre a qual, segundo Sweezy, eu deveria ter-me concentrado em separado (...)”. (p.73).
Acerca do feudalismo e a luta de classes, Dobb esclarece: “(...) o que ela fez foi modificar a dependência do pequeno modo de produção em relação à suserania feudal e, com o tempo, libertar o pequeno produtor da exploração feudal. (...)”. (p.74); do crescimento das cidades mercantis: “(...) desempenharam importante papel na aceleração da desintegração do antigo modo de produção. O que afirmo é que o comércio exerceu sua influência na medida em que acentuou os conflitos internos no antigo modo de produção”. (p.75).
Outro ponto que Dobb esclarece é sobre a “desintegração feudal “proximidade dos centros de comércio”: “ Nos Studies citei várias provas que refutam a opinião simplista que tem sido popularizada pelos vulgarizadores da "economia monetária". Repetirei aqui apenas duas delas. Foi precisamente no Norte e Oeste atrasados da Inglaterra que a servidão sob a forma de prestação direta de trabalho desapareceu primeiro, enquanto no Sudeste mais adiantado, com seus mercados urbanos e vias de comércio, a prestação de serviços persistiu teimosamente. Do mesmo modo, em muitas partes da Europa oriental, a intensificação da servidão nos séculos XV e XVI foi acompanhada pelo crescimento do comércio, e a correlação não se estabeleceu entre a proximidade dos mercados e a desintegração feudal (...)”. (p.76). 
Dobb ainda afirma que concordo com Sweezy quanto à: “ (...) sociedade econômica na Europa ocidental entre o século XIV e o final do século XVI como complexa e transitória no sentido de que as formas econômicas antigas estavam em processo de rápida desintegração enquanto as novas apareciam, simultaneamente. Concordo também com ele em que durante esse período o pequeno modo de produção estava em vias de emancipar-se da exploração feudal, mas ainda não estava sujeito (pelo menos em grau significativo) às relações capitalistas de produção que acabaram por destruí-lo. Além disso, considero que reconhecer esse fato é vital para a perfeita compreensão da passagem do feudalismo para o capitalismo”. (p.77). 
Mais adiante, Dobb faz uma crítica à Sweezy quanto a chamar os dois séculos que separam o feudalismo do capitalismo, de “transitório”. Para Dobb, esse período deve ser classificado como “híbridos sem lar”. (p.77). 
Dobb conclui com a esclarecendo dois pontos finais da crítica de Sweezy. (p.77). O primeiro, acerca do modo de produção, comentou: “ (...) seja qual for a interpretação dada à passagem decisiva da abordagem de Marx (e continuo pensando que ela justifica a interpretação que em geral lhe é dada). Citei algumas dessas provas nos Studies (cap. 4). Sem dúvida é um ponto que merece maiores pesquisas. Mas a importância da pequena e média burguesia ascendente desse período já foi demonstrada por Tawney, por exemplo” . (p.79). 
E, quanto à chamada ao processo de acumulação, Dobb comentou: “(...) devo reconhecer que Sweezy tocou num ponto fraco do estudo, sobre o qual eu mesmo tenho dúvidas, e admito serem incompletas as provas. A existência ou não dessa fase não invalida minha principal afirmativa, pois a expropriação de outrem é que constitui a essência do processo de acumulação, e não a mera aquisição de categorias especiais de bens pelos capitalistas”. (p.80).
	WOOD, Ellen Meiksins. O modelo Mercantil e seu legado. In: A Origem do Capitalismo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001
UNIDADE 1
A desagregação da sociedade feudal e a emergência da modernidade
O modelo Mercantil e seu legado
Ellen Wood
Wood inicia contando que a explicação mais difundida sobre a origem do capitalismo é crer que "(...) resultado natural de práticas humanas quase tão antigas quanto a própria espécie". (p.21). A autora esclarece que o capitalismo, "sociedade mercantil", é o "(...) amadurecimento de práticas comerciais antiquíssimas e sua libertação das restrições políticas e culturais". (p.22).
Tais restrições, aponta a autora, sofreram um rompimento antinatural conforme a seguinte explicação: "A explicação clássica dessa interrupção invoca as invasões do Império Romano pelos bárbaros (...). (...) a ruptura da civilização mercantil mediterrânea muito depois - na invasão muçulmana (...). eliminou o antigo sistema de comércio ao fechar as rotas comerciais do Mediterrâneo entre o Oriente e o Ocidente". (p.22).
Ainda segundo Wood "(...) cidades dedicadas ao comércio e dominadas por uma classe autônoma de habitantes de burgos (ou burgueses), que viria a se libertar de uma vez por todas dos grilhões das antigas." (p.23). E que isso bastou para explicar a ascensão do capitalismo moderno. (p.23). A autora explica algo interessante sobre o que hoje é tido como um capitalista: "(...) burgo ou burguês é , por definição, um morador da cidade". (p.23).
Retomando ao debate sobre o modelo mercantil, as hipóteses apontadas por historiadores acerca do desenvolvimento comercial, são comentadas pela autora: "(...) Esses pressupostos tendem a apresentar um outro corolário importante, qual seja, o de que as cidades e o comércio eram, por natureza, antiéticos ao feudalismo, de modo que seu crescimento, como quer que tenha ocorrido, solapou as bases do sistema feudal". (p.24).
E questiona: "(...) se o feudalismo trouxe o descarrilamento do progresso da sociedade mercantil, a lógica intrínseca do mercado (...), nunca se modificou significativamente. Desde o começo, ela implicou indivíduos racionalmente egoístas, que maximizam sua utilidade vendendo mercadorias em troca de lucro (...)". (p.24, p.25). Acresce:" Dada essa oportunidade, presumiu o modelo, as pessoas sempre se portaram de acordo com as regras da racionalidade capitalista, visando o lucro e, na busca, procurando meios de melhorar a produtividade do trabalho". (p.25).
Depois do modelo mercantil clássico 
A autora explica sobre a percepção de Max Weber acerca do desenvolvimento do capitalismo: "(...) só surgiu em condições históricas muito específicas, e não em outras. (...) e usou da cidade ocidental e da religião européia, especialmente para explicar o desenvolvimento do capitalismo noutros lugares (...)". (p.26).
E complemente: "Convém acrescentar que Weber também compartilhou com muitos outros o pressuposto transeuropeu (...), não apenas que algumas circunstâncias gerais europeias foram condições necessárias do capitalismo, mas que toda a Europa, a despeito de todas as suas variações internas, seguiu essencialmente a uma mesma via histórica". (p.27). 
A autora cita a tese de Pirenne acercado modelo demográfico que "(...) atribui o desenvolvimento econômico europeu a certos ciclos autônomos de crescimento e de declínio populacional (...)". (p.27). E "(...) regidas pelas leis da ofertas e da procura (...)”. (p.28). Até então não questionadas. A autora conclui que "(...) o tradicional modelo mercantil continua a prevalecer, quer na superfície, quer sob forma mais subterrânea”. (p.29).
Uma exceção digna de nota: Karl Polanyi
A autora inicia citando Karl Polanyi com uma afirmação: "(...) a motivação do lucro individual, associada às trocas no mercado, nunca foi, até a era moderna, o princípio dominante da vida econômica". (p.29). E prossegue:"Em todas as sociedades anteriores, as relações e práticas econômicas estavam inseridas ou imersas em relações não econômicas - de parentesco, comunais, religiosas e políticas". (p.29).
E aponta:" Em particular, nem os mercados locais nem o comércio de longa distância que caracterizou as economias pré- capitalistas eram essencialmente competitivos”. (p.30 ). “(...). O comércio exterior consistia simplesmente em "transportar". (p.30 ). A autora explica sobre a mudança nas relações sociais:"Somente na moderna sociedade de mercado,segundo Polanyi,é que há uma motivação econômica distinta, instituições econômicas distintas e relações separadas das relações não econômicas". (p.31).
Wood explica que "(...) a Revolução Industrial deu origem a uma sociedade de mercado (...). "(...) tornou necessário converter "a substância natural e humana da sociedade em mercadoria". (p.32). Wood afirma que acerca do avanço tecnológico e do progresso do capitalismo que: "Sem intervenções desse tipo (do Estado), "a velocidade desse progresso poderia ter sido desastrosa e transformado o próprio processo num acontecimento degenerativo, em vez de construtivo". (p.33).

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