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W BA 00 33 _V 3. 0 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM 2 Neide Rodriguez Barea São Paulo Platos Soluções Educacionais S.A 2022 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM 1ª edição 3 2022 Platos Soluções Educacionais S.A Alameda Santos, n° 960 – Cerqueira César CEP: 01418-002— São Paulo — SP Homepage: https://www.platosedu.com.br/ Head de Platos Soluções Educacionais S.A Silvia Rodrigues Cima Bizatto Conselho Acadêmico Alessandra Cristina Fahl Ana Carolina Gulelmo Staut Camila Braga de Oliveira Higa Camila Turchetti Bacan Gabiatti Giani Vendramel de Oliveira Gislaine Denisale Ferreira Henrique Salustiano Silva Mariana Gerardi Mello Nirse Ruscheinsky Breternitz Priscila Pereira Silva Coordenador Giani Vendramel de Oliveira Revisor Michele Aparecida Cerqueira Rodrigues Editorial Beatriz Meloni Montefusco Carolina Yaly Márcia Regina Silva Paola Andressa Machado Leal Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)_____________________________________________________________________________ Barea, Neide Rodriguez Psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem / Neide Rodriguez Barea. – São Paulo: Platos Soluções Educacionais S.A., 2022. 32 p. ISBN 978-65-5356-388-9 1. Idade. 2. Relação. 3. Teorias. I. Título. 3. Técnicas de speaking, listening e writing. I. Título. CDD 370.15 _____________________________________________________________________________ Evelyn Moraes – CRB: 010289/O B248p © 2022 por Platos Soluções Educacionais S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Platos Soluções Educacionais S.A. https://www.platosedu.com.br/ 4 SUMÁRIO Apresentação da disciplina __________________________________ 05 Desenvolvimento da criança de zero a dez anos _____________ 07 O desenvolvimento do pré-adolescente e do adolescente ___ 21 Teorias psicológicas da aprendizagem _______________________ 32 Alterações no desenvolvimento da aprendizagem ___________ 44 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM 5 Apresentação da disciplina Esta disciplina tem como objetivo apresentar os principais aspectos do desenvolvimento humano e como eles se relacionam com a aprendizagem, oferecendo ao pós-graduando uma visão panorâmica do que se considera um progresso regular no amadurecimento das estruturas cognitivas, afetivas e motoras. O Tema 1, chamado de “O desenvolvimento da criança de zero a dez anos”, apresentará os aspectos de desenvolvimento motor, socioemocional e cognitivo das crianças desta faixa etária, apontando os marcos de amadurecimento. Já no Tema 2, intitulado “O desenvolvimento do adolescente e do pré-adolescente”, você conhecerá os aspectos de desenvolvimento motor, socioemocional e cognitivo das crianças a partir dos onze anos, passando pela adolescência e avançando pela idade adulta até o envelhecimento. No Tema 3, “Teorias psicológicas da aprendizagem”, você conhecerá as principais teorias desenvolvidas por psicólogos e médicos que explicam o processo de aquisição dos conhecimentos. Neste tema, você aprenderá sobre as propostas behaviorista, construtivista, a psicogênese da pessoa completa e o socioconstrutivismo, explorando as recentes descobertas da neurociência que indicam os processos neurobiológicos associados à memorização e à evocação de conhecimentos. Por fim, no Tema 4, “Alterações no desenvolvimento da aprendizagem”, a proposta é estudar sobre os principais transtornos da aprendizagem e conhecer um pouco como se faz um diagnóstico e as intervenções. 6 Todo este conhecimento é fundamental para o psicopedagogo, pois traz os elementos mais essenciais para o exercício de sua profissão. Esta é uma disciplina que traz muitos exemplos e reflexões sobre a prática, além de uma série de indicações para aprofundar seu conhecimento. Esperamos que você realize excelentes aprendizagens! 7 Desenvolvimento da criança de zero a dez anos Autoria: Neide Rodriguez Barea Leitura crítica: Michele Aparecida Cerqueira Rodrigues Objetivos • Conhecer processo de desenvolvimento da criança. • Identificar os marcos do desenvolvimento e as expectativas para cada idade. • Compreender os processos psicológicos relacionados ao desenvolvimento cognitivo. 8 1. Da concepção ao nascimento: a origem do desenvolvimento humano O desenvolvimento humano, a psicologia e a aprendizagem são temas que despertam interesse nas pessoas, principalmente naquelas que atuam no campo da saúde e da educação. Conhecer e saber estimular o processo de amadurecimento cerebral e o desenvolvimento cognitivo, psicológico e motor é uma das competências requeridas para professores, psicopedagogos, psicólogos, médicos, fonoaudiólogos e demais profissionais que atuam com crianças e adolescentes. Nesta aula, você conhecerá mais sobre os aspectos mencionados e refletirá sobre como estes conhecimentos são empregados em sua profissão. Antigamente, observava-se melhor o desenvolvimento do bebê após seu nascimento. Atualmente, sabe-se que processos cognitivos, psicológicos e motores ocorrem no período fetal, ou seja, após o terceiro mês de gestação. Após a concepção, o embrião entra em um processo de desenvolvimento acelerado, no qual as células de diversos tipos se multiplicam, dando origem aos órgãos do corpo e tecidos. Incluindo as células nervosas, que são as responsáveis pela captação de informações processadas no cérebro. Dentro da barriga da mãe, envolvido pelo líquido amniótico, os estímulos recebidos pelo feto são sutis, porém existem e são captados pelos cinco sentidos (visão, paladar, olfato, tato e audição). São as primeiras conexões neurais, que criam a base das aprendizagens que ocorrerão após o nascimento. Costa et al. (2021, p. 2) apontam que: 9 (…) o feto possui sensibilidade tátil e auditiva, as interações entre os pais e o feto como o toque e a conversa favorecem o desenvolvimento infantil desde a gestação. O desenvolvimento sensorial do feto tem início com o toque e, ao longo da gestação, ele desenvolve o paladar, a audição, o olfato e a visão. Para entender melhor, os cinco sentidos já se desenvolvem no período gestacional, principalmente no estágio fetal, segundo Cha (2004): • Tato: o feto já é capaz de tocar as paredes do útero, chuta e se mexe, estimulando o desenvolvimento motor e o tato, o que ajudará, após nascer, a controlar os braços e as pernas, andar, agarrar objetos, entre outras ações. • Audição: por volta da 24ª semana de gestão, o sistema auditivo está completo. Isso permite que o bebê se acostume a alguns sons ambientes (latidos de cachorro, por exemplo, que são altos) e à voz da mãe e de pessoas próximas (ainda que o som seja abafado dentro do útero). O feto ainda escuta os batimentos cardíacos, os ruídos da digestão, por exemplo, e até mesmo músicas. Esta é a base para, após o nascimento, aprender os tons e as notas musicais e a linguagem oral. • Paladar: enquanto está no útero, o bebê tem contato com o líquido amniótico, que é repleto de sabores: doce, salgado e amargo. • Olfato: o sistema olfativo é completamente formado durante a gestação e, mesmo no útero, o feto tem contato com odores a partir de mecanismos bioquímicos que ainda não estão completamente elucidados. • Visão: o feto é capaz de perceber a luminosidade, iniciando o processo da visão, porém ainda não enxerga cores ou formas. Posteriormente, é este sentido que permitirá a aprendizagem a partir daquilo que o bebê e a criança enxergam. 10 O feto também é capaz de perceber mudanças emocionais na mãe, ainda que não saiba o que isso signifique: sente a pressão arterial alterada em casos de ansiedade, sente o fluxo sanguíneo regular em caso de tranquilidade,sente a pressão muscular em caso de tensão, capta sons mais altos e é capaz de construir memorizações. A aprendizagem e o desenvolvimento do feto são modestos quando se comparam com o grau de avanço após o nascimento. Os aspectos motores, psicológicos e cognitivos, embora estudados separadamente por diversos pesquisadores, são interligados e se retroalimentam constantemente. 2. O desenvolvimento motor O desenvolvimento humano está diretamente relacionado à evolução gradual do sistema nervoso central e periférico e da cognição. Durante a infância, esse processo ocorre de maneira acelerada, principalmente no cérebro (COSENZA; GUERRA, 2011). A criança é uma grande exploradora. Em linhas gerais, seu objetivo é apenas adaptar-se ao meio em que vive, de forma a garantir sua sobrevivência. Portanto, precisa desenvolver processos de aprendizagem. Antes dos dois anos, já aprende a se locomover e a falar, elementos básicos para sua sobrevivência independente. Essas conquistas são possíveis devido ao processo de amadurecimento cerebral, aos estímulos e às oportunidades que recebe e à própria motivação. O quadro a seguir apresenta algumas conquistas motoras: 11 Quadro 1 – Desenvolvimento motor até os três anos de idade Período de desenvolvimento Conquistas esperadas Logo após o nascimento O bebê desenvolve uma boa técnica para mamar, os movimentos são descoordenados e ele apenas chacoalha pernas e braços sem grandes objetivos, o que mudará muito em breve. Entre 1 e 2 meses Já é capaz de responder a um sorriso com outro sorriso (controle dos músculos da face), os olhos estão cada vez mais potentes (musculatura ocular) e gosta de observar objetos coloridos; parece gostar de mudar de posições. Entre 3 e 4 meses Torna-se mais ativo, olha e acompanha pessoas e objetos com o olhar; vira a cabeça na direção do som. Entre 5 e 6 meses É capaz de rolar e sentar-se com apoio; leva mãos e pés à boca; vira o corpo na direção do som. Entre 7 e 9 meses É capaz de ficar sentado sem apoio. Por volta dos oito meses já está preparado para engatinhar; até o final dos nove meses, a visão será bem aperfeiçoada, muito parecida com a de um adulto. Entre 10 e 12 meses Aponta para aquilo que quer, está preparado para engatinhar e andar com apoio e pode começar a andar sem apoio quando estiver perto de completar um ano. Consegue dar tchau e falar “papa” e “mama” direcionado à pessoa certa; brinca e imita pessoas próximas. Entre 13 e 18 meses Reconhece-se no espelho e pode se alimentar sozinho; fala algumas palavras; anda sozinho; é capaz de cumprir instruções simples (pegar a mamadeira, por exemplo) e começa a testar limites. 12 Entre 19 e 24 meses É capaz de correr, subir e descer escadas; brinca com vários brinquedos sozinho. Seu vocabulário atinge 200 palavras. Compreende certos conceitos, como algumas formas geométricas. Interessa-se por montar pequenos quebra- cabeças. Tem senso de humor, presta atenção em histórias e reconhece partes do corpo. Entre 2 e 3 anos Já é capaz de se expressar em sua língua materna e de tirar e colocar sapatos e roupas. Chuta bola sem perder o equilíbrio, dança, explora bastante o ambiente, cumpre ordens. Fonte: elaborado pela autora. A partir dos três anos, as habilidades motoras vão se refinando: a criança é capaz de correr cada vez mais rápido, superar obstáculos, controlar os movimentos, dosar a força; mais à frente, é capaz de organizar o pensamento sobre o movimento antes de executá-lo (planejamento e planificação). A criança, por volta dos seis anos, consegue expressar a sua dominância lateral e escolher a mão com a qual escreverá. O controle dos movimentos passa a ficar cada vez mais preciso, elaborado e especializado, desde o controle corporal mais amplo (praxia global) até o controle dos movimentos refinados (praxia fina, controle das mãos e dos pés). Cada uma delas possui um ritmo próprio de desenvolvimento: algumas mais cedo e outras mais tarde. É importante observar se os marcos de desenvolvimento estão se sucedendo e procurar ajuda e orientação caso o processo não esteja ocorrendo de acordo com o esperado. Como marcos do desenvolvimento motor, temos: • Controle da cabeça: os bebês são capazes de virar a cabeça de um lado para o outro logo que nascem; quando colocados de barriga 13 para baixo, são capazes de erguer suficientemente a cabeça para movê-la. Com três meses já controlam bem o movimento da cabeça, e com quatro meses de idade são capazes de mantê-la ereta quando carregados no colo ou sentados. Caso o neném não sustente a cabeça aos seis meses, deve ser encaminhado ao médico. • Controle das mãos: com três meses consegue agarrar um objeto de tamanho médio para ele, mas tem dificuldades de segurar algo pequeno. Aos oito meses, desenvolve a capacidade de passar um objeto de uma mão para a outra e, depois, consegue segurar coisas pequenas, pois isso exige um controle motor mais especializado de mãos e dedos. • Locomoção: o bebê é capaz de rolar por volta dos três meses por decisão própria, ou seja, manifesta a vontade de mudar de lugar. Com cerca de seis meses é capaz de ficar sentado quando colocado nesta posição e, aos oito meses, senta-se sozinho. Entre seis e dez meses, começa a se deslocar, arrastando-se ou engatinhando; com sete meses, caso alguém segure suas mãos ou se apoiando em móveis, ele é capaz de ficar em pé. Aos onze meses, fica em pé sem apoio e, em seguida, inicia o processo de andar; a princípio, circula pelo ambiente segurando-se em móveis e, rapidamente, abandona o apoio, conquista que se realiza por volta de um ano de idade. Com dois anos a criança pode subir degraus (um pé e depois o outro no mesmo degrau; só mais tarde ela conseguirá alternar os pés); depois, passa a descer degraus e, por volta de dois anos e meio, já começa a correr e a pular com os dois pés; caso o bebê não ande até um ano e oito meses, recomenda-se consultar um médico. 3. O desenvolvimento psicológico e cognitivo Os processos psicológicos são sustentadores do desenvolvimento do ser humano e se relacionam com o sistema motor e com o processamento cognitivo. Os processos psicológicos básicos são: percepção, atenção, 14 memória, aprendizagem, motivação, afetividade, inteligência, pensamento e linguagem. Cabe ressalvar que, para Piaget (1967), motivação e afetividade acabam sendo processos semelhantes, pois influenciam a forma como um indivíduo se apropria da aprendizagem. A percepção-atenção-memória-aprendizagem envolvem a ativação e a utilização de células nervosas, processamento mental e respostas. Vejamos um exemplo: ao encostar a mão em um objeto muito quente, a reação da pessoa é retirar a mão imediatamente. Na verdade, ocorre o seguinte processo: ao tocar o objeto quente, ativa-se o sentido do tato (na ponta dos dedos, há pontos receptores de calor, que levam a informação de uma temperatura muito quente, capaz de causar danos, ao grupo de nervos responsáveis pelo trânsito de informações que parte da pele dos dedos, avançando pela mão e pelo braço e chega até a medula espinhal, que carrega a informação até o cérebro). No cérebro, a informação é captada e gera uma resposta de afastar a mão do objeto quente. Esta informação percorre o caminho de volta: medula espinhal, circuito nervoso do braço, mão e dedos, e faz com que os músculos se contraiam e a pessoa finalmente afasta a mão do objeto quente. Porém, isso causa uma impressão no cérebro: a de que objetos muito quentes podem causar machucados. Essa impressão é uma aprendizagem que usa da memória para evitar ou aprender a contornar situações deste tipo e semelhantes. Quanto mais experiências sensoriais (desenvolvidas através dos cinco sentidos: tato, olfato, paladar, visão e audição), mais aprendizagens são realizadas. A atenção, por sua vez, é um mecanismo que deixa o cérebro alerta para processar com mais velocidade as informações obtidas pelos órgãos do sentido e fornecer respostas cadavez mais assertivas. Quanto mais a criança amadurece, mais capacidade ela tem de desenvolver aprendizagens duradouras. A motivação é um processo psicológico básico que regula a ação do indivíduo e está presente desde muito cedo na vida dos bebês. A motivação é o que os leva a explorar o mundo e aprender. “A motivação parece ser resultado de uma atividade cerebral que processa 15 as informações vindas do meio interno (fome, dor, desejo sexual) e do ambiente externo (oportunidades e ameaças) e determina o comportamento a ser exibido.” (COSENZA; GUERRA, 2011, p. 81). Ela está associada a fatores internos (como desejos e metas a serem alcançados pessoalmente) e pode estar relacionada a fatores externos (associada a um estímulo extrínseco: tirar boas notas nas provas para impressionar os pais, por exemplo). Está associada também aos benefícios que se obterá, por exemplo, para um bebê que deseja pegar um objeto. A motivação está em alcançá-lo para poder explorá-lo. Conforme a criança vai amadurecendo, seus interesses também vão se modificando. Outro processo psicológico básico, a afetividade corresponde à compreensão e gestão das emoções, ou seja, o entendimento que temos emoções e que estas podem ser ativadas e canalizadas para resolução de situações ou problemas do cotidiano, bem como são fundamentais para a aprendizagem (PIAGET, 1967). Pense, por exemplo, em uma criança pequena que está fazendo birra em uma loja. Ela age assim porque ainda não sabe se expressar de outra forma, então chora, se joga no chão, grita. Quando tiver mecanismos mais evoluídos, conseguirá pedir o que deseja e administrar uma resposta positiva ou negativa. Imagine, por exemplo, que ela deseja um brinquedo, mas o pai informa que só poderá dá-lo no Natal. Ela ficará emburrada, aceitará pacificamente a resposta, fará uma reserva financeira para adquirir o brinquedo antes? Depende das condições que ela tem e do seu amadurecimento para conseguir. Inteligência-pensamento-linguagem atuam conjuntamente. A inteligência é um processo de adaptação às condições de vida no momento. Aqueles que não conseguem se adaptar não sobrevivem. Para se adaptar, o ser humano precisa lidar com problemas, acasos, equívocos, transtornos e criar soluções. A inteligência é o processo que compreende a análise de situações complexas ou problemáticas, seguida da localização ou 16 criação de respostas a cada uma das situações, de forma a viver melhor. Assim, por exemplo, uma criança que está com fome buscará uma fruta, um pacote de bolachas ou pedirá comida a alguém; se ela não se alimentar ou não for alimentada, perecerá. O problema, no caso, é a fome (manifestação do corpo indicando que precisa de nutrientes para manter-se vivo e saudável), e a solução está em localizar comida de alguma forma. Normalmente, antes da ação, o cérebro processa informações para escolher a melhor opção, ou seja, existe um processo de pensamento, uma reflexão. Este pensamento é estruturado e, quando a criança começa a aprender a falar, seu pensamento passa a ser verbal. Assim, a linguagem passa a fazer parte do pensamento. Por outro lado, a linguagem é a forma mais rápida de comunicação e de resolução de problemas. Quanto mais imersa na linguagem materna, quanto mais falante e quanto mais a criança escutar a língua, mais rápido, preciso e assertivo será seu pensamento. Todos os processos básicos iniciam-se de forma simples, imatura e pouco reflexiva. A partir da maturação biológica e das experiências vividas, os processos psicológicos se tornam mais complexos, maduros e altamente reflexivos. Todos os processos básicos dependem um do outro e andam lado a lado, apesar de estarem separados em blocos nesta leitura. A primeira forma de interação com o mundo (e, portanto, de aprendizagem) é puramente comportamental. O bebê vai experimentando possiblidades e observando o que acontece ao redor. Da mesma forma, as pessoas que cuidam dele desenvolvem rotinas para que ele se adapte melhor ao mundo. A teoria que estuda a aprendizagem através do comportamento é chamada Behaviorismo (ou comportamentalismo). O bebê emite certos comportamentos quando vê pessoas conhecidas. Ao observar seu cuidador carregando uma mamadeira, deduz que será 17 alimentado, após ter vivenciado esta experiência algumas vezes. Isto é uma aprendizagem. Ao sentir algum desconforto, o bebê aprende que, se chorar, chamará a atenção de algum adulto. Percebe que, se emitir sons, ele também atrairá a atenção do adulto. Desta forma, o bebê é capaz de indicar algo ao adulto que cuida dele. Enquanto sua necessidade não for satisfeita, ele manterá o comportamento de choro ou balbucio. Mas, como o ele descobriu isso? Simplesmente, testou várias possibilidades até que o adulto deu a resposta que ele desejava, então passou a repetir seu comportamento para satisfazer sua necessidade. Estas breves experiências parecem simplórias, mas são significativas do ponto de vista da aprendizagem. Da mesma forma, desenvolverá processos de aprendizagem para andar, comer, ler etc., sempre testando hipóteses e avaliando resultados. A aprendizagem da fala é particularmente estudada como um comportamento adquirido, estimulado pelos adultos. Quando a criança balbucia “AAAA”, normalmente se interpreta como o desejo de beber água, então lhe é servida a água. A criança percebe que, para beber água, basta falar “AAAA”. Em seguida, os adultos começam a nomear a água: “Ah, você quer ÁGUA! Repete: ÁGUA, ÁGUA!”. Conforme a criança avança na linguagem (mesmo que não acerte de primeira), sua aprendizagem é reforçada entregando-lhe um copo de água. Não só a perspectiva comportamental explica os processos de aprendizagem. Teorias mais modernas e complexas foram desenvolvidas, tal como a cognitivista: Abordagem cognitivista: parte do princípio que o conhecimento é fruto do pensamento e tem como objetivo estudar a cognição (o ato de conhecer) e a consciência. Para tanto, procura descobrir como funciona a percepção humana, a compreensão e o processamento da informação. Assim, na Abordagem Cognitivista, o ser humano é visto como um ser pensante e 18 utiliza recursos mentais para agir sobre o mundo. (…) Nesta abordagem, o ser humano aprende a partir das experiências, introjetando-as, refletindo sobre elas, modificando-as internamente e produzindo seu conhecimento. (TAVARES, 2016, p. 90-91) Jean Piaget (1967) é o maior representante do cognitivismo e desenvolveu sua própria teoria, chamada Epistemologia Genética. Para o biólogo, o processo de aprendizagem nada mais é do que uma forma de o ser humano se adaptar ao mundo. Tavares (2016) explica melhor: Para Piaget, o desenvolvimento da inteligência do ser humano é sua melhor estratégia de adaptação à vida. Isso ocorre desde o nascimento, portanto, inicia-se no estágio pré-operatório (que vai dos 0 aos 18-24 meses), quando os bebês iniciam as primeiras experiências motoras. Essas experiências são responsáveis pela criação das primeiras estruturas cognitivas ou esquemas iniciais. (TAVARES, 2016, p. 93-94) Posteriormente, partindo-se nestes esquemas iniciais, todo o restante das experiências é organizado, criando, inclusive, novos esquemas, melhores e maiores. O processo se dá por meio de assimilação (introjeção de novas experiências nos esquemas mais antigos) e assimilação (consolidação das aprendizagens). Até os dois anos de idade, Piaget (1967) considera que a criança está na fase chamada sensório-motora, ou seja, uma fase de exploração e manipulação de objetos. 19 Quadro 2 – Estágios de desenvolvimento segundo Piaget Em torno de 2 anos de idade A criança reorganiza seu mundo interno a partir da compreensão de símbolos, ou seja, compreende que objetos, pessoas, eventos, animais, entre outros podem ser substituídos por palavras (nome das coisas). O simbolismo (função simbólica) ainda não está completamente desenvolvido, mas é exatamente ao atingir esta capacidade que a criançaingressa no terceiro estádio, o pré-operatório. Esta fase também é conhecida como “idade dos porquês”, já que a criança procura por esclarecimentos na maior parte do tempo. Em torno de 7 anos de idade A criança ingressa no estágio chamado operatório-concreto e é capaz de resolver problemas, interagir no mundo, fazer investigações, criar hipóteses e testá-las ainda num sentido mais próximo de si, dependendo de elementos de concretude (por exemplo, dificilmente é capaz de entender as relações políticas entre países – muito abstrato, mas é capaz de entender o ciclo da água na natureza, situação mais concreta por ter vivenciado pessoalmente). Após 11-12 anos A criança entra no estádio operatório-formal, desenvolvendo pensamento abstrato, amplo e envolvendo questões éticas e problemas mais complexos. Fonte: elaborado pelo autor. A psicologia e o desenvolvimento humano são temas muito interessantes e significativos para seu exercício profissional. Aproveite para aprofundar seus estudos pesquisando as referências indicadas. Referências CHA, S. C. Medicina fetal. São Paulo, SP: Roca, 2004. COSENZA, R. M.; GUERRA, L. B. Neurociência e educação: como o cérebro aprende. Porto Alegre, RS: Artmed, 2011. 20 COSTA, P. et al. Oficinas educativas sobre vínculo com o feto durante a gestação: um ensaio clínico. Rev Gaúcha Enferm., v. 42, 2021. Disponível em: https://www.seer. ufrgs.br/index.php/rgenf/article/view/118326/64453. Acesso em: 22 maio 2022. PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Rio de Janeiro, RJ: Forense, 1967. TAVARES, N. R. B. Aquisição e desenvolvimento da linguagem. Londrina, PR: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2016. https://www.seer.ufrgs.br/index.php/rgenf/article/view/118326/64453 https://www.seer.ufrgs.br/index.php/rgenf/article/view/118326/64453 21 O desenvolvimento do pré-adolescente e do adolescente Autoria: Neide Rodriguez Barea Leitura crítica: Michele Aparecida Cerqueira Rodrigues Objetivos • Conhecer o processo de desenvolvimento do adolescente, iniciando com a pré-adolescência. • Identificar os marcos do desenvolvimento e as expectativas para cada idade. • Compreender os processos psicológicos relacionados ao desenvolvimento cognitivo. 22 1. A pré-adolescência, um novo marco Nesta Leitura Digital, o enfoque recai sobre a adolescência, que tem início por volta dos dez-onze anos de idade, com uma fase chamada pré-adolescência. A verdade é que o termo pré-adolescência ainda não é completamente aceito. No Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), por exemplo, “Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade” (BRASIL, 1990, [s. p.]), ou seja, não há menção à pré-adolescência. Assim, considerar a pré-adolescência como uma fase de transição não é uma questão simples, mas cada vez mais este termo vem aparecendo na literatura acadêmica. Enquanto a infância e a adolescência possuem características mais claras, a pré-adolescência é uma fase de transição entre elas. Tem início por volta dos dez anos e encerra-se por volta dos doze anos, período em que a puberdade começa. A puberdade está associada ao amadurecimento biológico, que se traduz em mudanças corporais. É nessa fase que aparecem também algumas transformações psicológicas: o pré-adolescente começa a sair do egocentrismo, busca encontrar seu lugar no mundo, as relações de amizade se tornam mais fortes e desenvolve-se um perfil mais crítico e, por vezes, confrontador. Schoen-Ferreira e Aznar-Farias (2010) nos lembram que o período da adolescência atravessou vários momentos históricos, o que permite traçar uma reflexão sobre os impactos antropológicos da evolução da espécie. Na pré-história, os adolescentes tinham função específica: ficar acordados no período da noite para vigiarem e protegerem o grupo. Acredita-se que esta função, ao longo de milhares de anos, levou o pré- adolescente atualmente a desenvolver o comportamento de dormir 23 mais tarde, mesmo não existindo mais uma função social específica que os obriguem a ficar acordados. Outro aspecto importante mencionado pelas autoras é que, a partir da Idade Antiga, os pré-adolescentes passaram a ter novas funções sociais, associadas ao trabalho. Tanto a infância quanto a adolescência não eram fases reconhecidas como antecessoras da fase adulta, pelo contrário, as crianças e os adolescentes eram entendidos como adultos em miniatura, portanto não havia nada errado que começassem, desde a mais tenra idade, a trabalhar. Assim que começavam a andar, já podiam assumir algumas funções domésticas e, com seis ou sete anos (às vezes, menos), já podiam assumir algumas funções profissionais e gerar renda para a família. Com o vigor da pré-adolescência, os jovens exerciam rotinas de trabalho de doze a quatorze horas por dia, de domingo a domingo. Apenas em meados do século XIX a perspectiva sobre a adolescência começa a mudar, devido à preocupação com a preservação da sociedade, aos estudos médicos, pedagógicos e psicológicos, à expansão da educação e à migração das populações rurais para as grandes cidades (SCHOEN- FERREIRA; AZNAR-FARIAS, 2010). 2. Desenvolvimento motor na adolescência Impulsionado pela puberdade, o desenvolvimento motor na adolescência sofre algumas alterações antes de se tornar mais refinado. Papalia e Feldman (2021, p. 443) apontam que: “O surto de crescimento adolescente afeta praticamente todas as dimensões do esqueleto e dos músculos; o crescimento muscular atinge o máximo aos 12,5 anos nas meninas e aos 14,5 nos meninos. Até mesmo os olhos crescem mais rapidamente […]”. 24 Este crescimento inesperado traz a necessidade de um novo ajuste motor: é preciso aprender a lidar com braços mais longos e pernas mais fortes, bem como desenvolver uma nova orientação espacial em relação ao próprio corpo. Muitas vezes, o adolescente acaba parecendo desastrado: esbarra em tudo, quebra coisas, não controla a força da mão, perde a noção do tamanho dos passos… Na verdade, ele precisa de um tempo para se reorganizar em função do estirão do crescimento. Quando o crescimento se estabiliza um pouco e o adolescente consegue perceber suas potencialidades, o desenvolvimento motor entra em um estado que chamamos de refinamento. Isso significa que tudo o que a criança fazia empregando a motricidade passa a ser feito de uma forma melhor na fase da adolescência. A escrita melhora, a praxia global melhora (coordenação dos grandes membros do corpo – braços, pernas e cabeça), a praxia fina melhora (coordenação dos dedos e das mãos). Não é à toa que é mais ou menos aos quatorze anos que os adolescentes optam por um esporte preferido e que são capazes de executar movimentos muito complexos na dança. Figura 1 – O esporte na adolescência Fonte: https://conteudo.imguol.com.br/c/entretenimento/ab/2022/03/24/criancas-jogando- basquete-esportes-coletivos-1648153060540_v2_900x506.jpg.webp 25 O desenvolvimento motor atinge seu ápice na adolescência e se mantém pela idade adulta até o momento de seu declínio, que acontece com a chegada da velhice. 3. Desenvolvimento psicossocial e cognitivo na adolescência A adolescência é uma fase de reconstrução da identidade do indivíduo, já que a infância foi superada (ou quase totalmente superada), mas ainda não há uma personalidade nova totalmente construída. No processo de reconstrução da identidade, é normal que ocorra uma confusão entre a própria identidade (quem sou) e os papéis que o adolescente representa (papel de criança, de adolescente, de filho, de estudante etc.). Segundo Papalia e Feldman (2021), apoiadas na teoria de Erickson, a identidade do adolescente só é resolvida quando ele organiza três questões: a escolha de trabalho e de quem será (profissional), a escolha dos valores que sustentarão sua vida e a opção pela identidade sexual que seja satisfatória para si próprio. A construção da identidade passapor testes, aprendizagens, experimentações, até que o adolescente tenha clareza para fazer suas escolhas e sustentá-las. Até lá, é normal o confronto com familiares e amigos, além da criticidade excessiva. A sexualidade é ponto significativo no desenvolvimento psicossocial da adolescência, um dos aspectos fundantes da personalidade, pois relaciona-se ao reconhecimento da própria orientação sexual, que perpassa tanto a compreensão e o aceitamento das primeiras manifestações sexuais quanto a capacidade de formar uniões afetivas ou mesmo sexuais, além de influenciar sua autoimagem (PAPALIA; 26 FELDMAN, 2021). Curiosidade e prazer sexual aparecem nesta fase devido a uma maior descarga de hormônios que prepara os corpos jovens para a reprodução humana. Quando tratamos das relações sociais na fase da adolescência, observa- se a procura por um grupo de pertencimento que acaba sendo, muitas vezes, mais próximo do jovem do que os próprios familiares. O grupo de pertencimento é um modelo de referência, no qual o adolescente é e se sente valorizado e estimulado, aceito como é, sem exigências comportamentais ou qualquer tipo de adaptação, o que o deixa cada vez mais conectado ao grupo. Por outro lado, os pais tendem a buscar mecanismos que controlem o comportamento do adolescente de acordo com o que julgam ser o mais adequado. Então, é possível que se instale uma nova crise, agora social. Na fase da adolescência, ocorre um processo psicológico chamado individuação, que significa a luta do adolescente por desenvolver sua autonomia e construir sua própria identidade, momento em que ele busca estabelecer um limite sobre a influência dos pais e familiares. Aberastury e Knobel (2003) apontam que a maioria dos adolescentes busca realizar três “direitos” essenciais à constituição de sua identidade, durante o processo de individuação: • O direito de ir e vir: trata-se da independência de sair sozinho ou com amigos, sem a supervisão de adultos, decidindo o horário de saída e de chegada. • O direito de usar o tempo: deseja organizar o próprio tempo, mesmo que isso o afaste do convívio familiar (tende a ser uma fase passageira). • O direito de viver um amor: busca o envolvimento emocional com outra(s) pessoa(s) de forma intensa, revelando-se em sentimentos de paixão e amor. 27 Quando falamos do desenvolvimento psicossocial do adolescente, é importante mencionar alguns fatos que podem dificultar ou favorecer a construção da identidade e da autoimagem do indivíduo. Figura 2 – Transformações físicas e neurológicas Fonte: elaborada pela autora. A adolescência é conhecida como a fase das paixões: os jovens se apaixonam por artistas, por músicas, por um esporte, por uma pessoa, e todo este movimento emocional e afetivo é muito importante, pois os ajuda a desenvolver foco, persistência e resiliência. 28 Quando se fala em desenvolvimento cognitivo, o adolescente passa por uma transformação em seu modo de pensar e falar, pois há um amadurecimento e aprofundamento dos aspectos relacionados ao pensamento. Piaget (1967) aponta que a adolescência marca o ingresso no nível mais elaborado do pensamento, ou seja, cognitivamente, o pensamento atinge a capacidade de abstração e conceituação, trabalhando muito mais no plano das ideias do que no plano concreto. O adolescente faz um uso cada vez melhor da língua materna e de outras linguagens, bem como desenvolve raciocínio cada vez mais complexo e lógico, entre outros aspectos. Piaget (1967) chama de operatório-forma a fase que se inicia por volta dos onze anos e que perdura pelo resto da vida. Este estádio é marcado pela ampliação da capacidade de abstração, desenvolvimento da noção do outro (empatia) e suas perspectivas, desenvolvimento do pensamento hipotético e dedutivo. Pode, por exemplo, refletir e debater sobre temas culturais, políticos, econômicos, sociais, bem como voltados à liberdade, ao amor, à fé e à religião. Seu pensamento se torna mais flexível, favorecendo a compreensão dos tempos históricos e dos conhecimentos naturais, tais como os geográficos, físicos, químicos e biológicos. O pensamento abstrato permite usar a simbolização na matemática (uso do X para resolver equações algébricas e outros cálculos mais complexos). Permite também gerar hipóteses de pensamento (ultrapassando o limite da realidade e investigando as variáveis associadas ao pensamento hipotético). Compreende a relação entre causa e efeito, é capaz de compreender e criar metáforas e empregar frases com duplo sentido. Como o ritmo natural do corpo do adolescente transforma-se nesta fase, ele pode precisar de mais horas de sono e, com certeza, de mais estímulos à aprendizagem escolar. O adolescente possui temas 29 de interesse que o motivam profundamente, por isso é importante conhecer a cultura jovem e estimular que esta motivação gere comportamentos saudáveis, tais como o protagonismo juvenil, que está associado à capacidade de autossuficiência e autoconfiança, favorecendo a transformação da heteronomia em autonomia. Heteronomia e autonomia são conceitos desenvolvidos e aprofundados por Piaget (1994). O autor indica que a anomia existe até os dois anos, aproximadamente, isto é, a criança até esta idade não compreende que existem regras e normas a serem seguidas. Conforme cresce, a criança adentra na fase da heteronomia (que vai até os dez anos de idade, aproximadamente). Na heteronomia, percebe que existem regras no mundo e é capaz de segui-las, ainda que sejam propostas por outras pessoas. A autonomia tem início na pré-adolescência e avança pela adolescência, a partir dos 11 anos, quando o jovem começa a adquirir a consciência moral, as regras e normas éticas são introjetadas e, mesmo na ausência de uma figura de autoridade, o adolescente continua seguindo os combinados e os princípios éticos e morais. Figura 3 – Três estados da formação moral Fonte: elaborada pela autora. 30 Quanto mais autônomo o adolescente é, mais capacidade ele tem de exercitar seu protagonismo. Assim, possibilidades de participação social são muito valorizadas pelo adolescente. Ele busca por novas experiências e vivências que superem as questões e situações do núcleo familiar, ampliando seus conhecimentos, a compreensão sobre a realidade, as possibilidades de intervenção em questões sociais (participação de grupos voltados à política, à preservação do meio ambiente, à cidadania, ao voluntariado, entre outros). Como se percebe, a adolescência é uma fase bastante complexa, que envolve transformações tanto nos aspectos físicos quanto nos cognitivos e psicossociais. Há características da adolescência que permanecem ao logo da vida adulta, impulsionando ações e relações nesta etapa da vida. A adolescência, que ao longo de milhares de anos foi ignorada, agora é estudada, respeitada e estimulada, pois se constitui em um momento significativo para a construção da identidade, que permanecerá na fase adulta, até o envelhecimento. Referências ABERATURY, A.; KNOBEL, M. Adolescência normal: enfoque psicanalítico. Porto Alegre, RS: Artmed, 2003. BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, [2022]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 4 jun. 2022. PAPALIA, D. E.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento humano. Porto Alegre, RS: AMGH, 2021. PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Rio de Janeiro, RJ: Forense, 1967. PIAGET, J. O juízo moral na criança. São Paulo, SP: Summus, 1994. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm 31 SCHOEN-FERREIRA; T. H.; AZNAR-FARIAS, M. Adolescência através dos séculos. Psicologia: teoria e pesquisa, v. 26, n. 2, 2010. Disponível em: http://www.scielo.br/ pdf/ptp/v26n2/a04v26n2.pdf. Acesso em: 12 jun. 2022. http://www.scielo.br/pdf/ptp/v26n2/a04v26n2.pdf http://www.scielo.br/pdf/ptp/v26n2/a04v26n2.pdf 32 Teorias psicológicasda aprendizagem Autoria: Neide Rodriguez Barea Leitura crítica: Michele Aparecida Cerqueira Rodrigues Objetivos • Compreender os processos psicológicos relacionados ao desenvolvimento cognitivo. • Construir conceituação acerca do sentido do aprender e da escolarização regular. • Construir repertório em relação à psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem. 33 1. Teorias que explicam o processo de aprendizagem humana A aprendizagem é um dos processos do desenvolvimento humano que mais despertam interesse. Por que será que o ser humano aprende e como será que aprende? O que o leva a desenvolver sua cognição? Aprender é entendido como um processo adaptativo, ou seja, na tentativa de garantir a sobrevivência da espécie, o ser humano desenvolveu processos para resolver problemas do seu cotidiano e guardou esses conhecimentos em sua mente, resgatando-os quando necessário, aprimorando-os a partir da reflexão sobre estes conhecimentos e das experimentações e ensinando-os às gerações posteriores. Para compreender melhor: pense no homem primitivo, que precisou criar mecanismos para não morrer, entre eles, técnicas e instrumentos para caça, formas de se proteger. Esses conhecimentos foram aperfeiçoados e transmitidos às gerações posteriores, até que se inventou a escrita, o sistema numérico… E o conhecimento se tornou cada vez mais amplo e especializado. Mas, para isso acontecer, os processos de aprendizagem foram fundamentais. Para compreender como o ser humano aprende, foram construídas algumas teorias que explicam este processo. Figura 1 – Esquema das principais teorias da aprendizagem Fonte: elaborada pela autora. 34 As teorias da aprendizagem têm uma relação íntima com a área da Psicologia, pois trata-se de da organização de múltiplos fatores mentais orientados para um propósito. É preciso ressaltar, também, que os pesquisadores que elaboraram essas teorias nem sempre as nomearam, portanto pode haver uma divergência entre os termos apresentados nesta Leitura Digital e em outros materiais. 2. O Behaviorismo Também chamado de Comportamentalismo, esta teoria compreende que toda aprendizagem é manifestada pelo comportamento e, através do estímulo ou da inibição de determinado comportamento, é possível que o indivíduo aprenda. Os estudos iniciais, realizados por Pavlov, foram aprofundados por Watson e Skinner, nos anos de 1950. Para eles, os condicionantes ambientais exercem influência sobre o comportamento. Condicionantes são fatores que estabelecem a condição para que algo ocorra ou não. Por exemplo, se há carência de alimentos para um indivíduo, a tendência é que ele emagreça. O condicionante, neste caso, é a ausência de alimentos. Os behavioristas acreditam que o manejo de condicionantes conduz a determinadas aprendizagens. Eles não estão errados. É verdade que condicionantes provocam aprendizagem. Veja outro exemplo: uma criança faz birra e é colocada de castigo, e isso se repete algumas vezes. Em dado momento, a mãe avisa: “se você tiver um mal comportamento, ficará de castigo”, e isso leva a criança a exibir bons comportamentos. O aviso da mãe é um condicionamento para o comportamento da criança. 35 Outro aspecto importante desta teoria diz respeito aos reforços. Reforços são incentivos para que um comportamento seja mantido ou não. Quadro 1 – Incentivos comportamentais Tipo de reforço O que é Exemplo Reforço positivo Dar uma recompensa quando um comportamen- to desejado ocorre Estrelinha no caderno Doce depois de comer todos os alimen- tos do prato Parabéns e elogios Reforço negativo Retirar algo negativo quan- do um comportamento de- sejado aparece Tirar do castigo quando a criança faz uma boa ação Tirar a proibição de usar o computador para jogar no período das férias porque a criança foi bem na escola Punição Aplicar uma medida puni- tiva quando o comporta- mento indesejado aparece Deixar de castigo Tirar o celular Extinção Retirada das recompensas quando um comportamen- to indesejado aparece Não dar estrelinha no caderno, se este era um hábito Não elogiar nem dar parabéns Fonte: elaborado pela autora. Uma das críticas a esta teoria é que pouco ou nenhum destaque se dá aos aspectos emocionais dos indivíduos, desconsiderando- os nos processos de aprendizagem. O enfoque se dá apenas nos condicionantes ambientais e impactos dos incentivos. Outra crítica profunda que esta teoria sofreu foi em relação à crueldade com que os experimentos comportamentais eram realizados em crianças, bebês e animais. Por fim, é preciso considerar que, muitas vezes, os condicionantes levam os indivíduos a buscarem respostas mais criativas e a se tornarem mais resilientes. Quando Skinner apresenta suas reflexões, ele considera que 36 ambientes mais ricos e com menos condicionantes são mais propícios para o desenvolvimento da aprendizagem e que ambientes mais rígidos e com menos recursos poderiam ser prejudiciais (BETTIO; LAURENTI, 2016). Esta não é uma teoria que deve ser desprezada, mas considerada com cuidado e atenção. 3. O Construtivismo Embora seu maior representante, Jean Piaget, nunca tivesse nomeado sua teoria com desta forma, trata-se de um termo bastante consolidado quando se refere ao processo de aquisição do conhecimento a partir da organização e reorganização de esquemas mentais. Piaget (1967) entende que as primeiras aprendizagens ocorrem assim que o bebê nasce e por um período muito curto na verdade. Os reflexos são os chamados esquemas iniciais, formados a partir das primeiras interações do bebê com o mundo e, a partir deles, são sobrepostos novos esquemas (oriundos, por exemplo, do contato com a mãe ou a pessoa que cuida dele, do processo alimentar, das imagens que observa, dos sons que escuta, dos objetos que toca). Esquemas são processos cognitivos baseados na aquisição e acomodação de novos conhecimentos. Para Piaget (1967), há uma energia (que ele chama de energética) que leva o indivíduo a aprender, a sanar sua curiosidade, a buscar por mais conhecimento. Por este motivo, o indivíduo está sempre em um processo de desequilíbrio cognitivo, segundo o autor, que o conduz à busca do equilíbrio através da aprendizagem. Porém, este equilíbrio é sempre passageiro, já que a curiosidade e os novos desafios o colocam novamente em desequilíbrio cognitivo. 37 A busca pelo equilíbrio cognitivo envolve dois processos básicos de conhecimento: • A assimilação: contato inicial com algum conhecimento, introjeção de informações relacionadas àquilo que se está pesquisando, novos dados, fatos ou objetos; caso estas informações não sejam pertinentes, elas não farão parte do próximo processo e serão desprezadas. • A acomodação: acolhimento das informações assimiladas, causando alterações nos esquemas pré-existentes ou construção de novos esquemas. A partir da acomodação, o novo conhecimento passa a fazer parte do volume de conhecimentos anteriores do indivíduo e pode ser empregado quando necessário. Vejamos dois exemplos: 1. Uma criança que deseja alcançar um objeto, porém está na fase de engatinhar. Sua vontade (energética) faz com que teste vários movimentos, até que aprenda a se colocar de pé, apoiando-se em móveis ou pessoas, e consiga alcançar o objeto (assimilação). Após exercitação e com mais prática (acomodação), o movimento de ficar em pé se torna mais fácil e é incorporado aos esquemas de locomoção da criança. 2. Imagine que uma pessoa vai fazer uma viagem ao exterior por alguns dias e ela precisa se comunicar muito pouco. Ela precisará aprender alguns termos da língua do país que está visitando. A assimilação é o processo de conhecer as novas palavras. Destas novas palavras, algumas serão esquecidas, mas outras farão parte do vocabulário para sempre e poderão ser empregadas quando a pessoa quiser. As palavras da língua estrangeira que permaneceram foram acomodadas junto ao esquema de palavras do indivíduo. 38 Figura 2 – Processo de aprendizagemsegundo Piaget Fonte: elaborada pela autora. Conforme o indivíduo vai amadurecendo, ele vai se tornando mais apto a construir e acomodar esquemas mais complexos, observou Piaget (1967) e, por este motivo, organizou o desenvolvimento das capacidades dos indivíduos em quatro estágios. Quadro 2 – Estágios de desenvolvimento segundo Piaget Estágio Idade aproximada Capacidade Sensório- -motor 0 a 2 anos Conhecimento do mundo baseado nos sentidos e nas habilidades motoras, construção dos primeiros esque- mas de ação, inteligência prática. Pré-opera- tório 2 a 6 anos Uso de símbolos, palavras e números para representar o mundo (inteligência simbólica); desenvolvimento de esquemas mentais, perspectiva individual/pensamen- to egocêntrico. Operatório concreto 7 a 11 anos Operações lógicas baseadas nos fatos concretos atuais, pensamento reversível e descentrado; início das operações abstratas com múltiplos enfoques. Operatório formal 12 anos em diante Pensamento abstrato e hipotético, raciocínio dedutivo, experiências concretas não são mais limitantes. Fonte: elaborado pela autora. 39 Piaget é uma referência fundamental quando se estuda o processo de aprendizagem em seres humanos, pois muitas de suas observações foram validadas por estudos posteriores e pelas recentes descobertas sobre o funcionamento do cérebro. 4. A Psicogênese da Pessoa Completa Talvez você estranhe o título desta seção, pois não é comumente apresentado quando se fala dos estudos e da teoria desenvolvida por Henri Wallon. O próprio Wallon (2007) escolheu esta denominação para o corpo teórico que desenvolveu, pois sua preocupação era compreender o desenvolvimento humano de forma mais global, explicando que os processos de aprendizagem envolvem mais do que apenas processos cognitivos. Para ele, há três grandes dominâncias (ou campos funcionais) que caminham juntas enquanto o processo de aprendizagem é executado: a cognição, a motricidade e a afetividade. Figura 3 – A relação entre as dominâncias no processo de aprendizagem Fonte: elaborada pela autora. 40 Veja, por exemplo, uma criança que está aprendendo a escrever, ou seja, compreender que os sons da fala podem ser reproduzidos de forma gráfica, seguindo determinadas regras da escrita, emprega as três dominâncias da seguinte forma: • Campo funcional cognitivo: busca elementos internos que subsidiem sua ação (o que já sabe sobre a escrita?), da mesma forma que busca elementos externos para aprender a escrever (há modelos disponíveis para ver e reproduzir? Há alguém que pode ensinar? Como se faz?). • Campo funcional afetivo: canalização da energia, pensamento, foco, resiliência e motivação para produzir a escrita compreensível, envolvendo o controle da ansiedade e o respeito à sua capacidade no momento. • Campo funcional motor: controle corporal e da praxia fina (dedos e mãos) para segurar o lápis, tonicidade para produzir os grafemas, distribuição adequada das letras no espaço. Principalmente no campo da Psicopedagogia, os elementos afetivos e motores que envolvem a aprendizagem trazem grandes pistas sobre as dificuldades e os transtornos que levam ao não-aprender aos quais o psicopedagogo precisa ficar atento. 5. Socioconstrutivismo É provável que você se depare com outros termos para nomear esta perspectiva desenvolvida por Vygotsky e seus colaboradores, tais como sociointeracionismo ou apenas interacionismo. Esta teoria parte da perspectiva que há uma construção de conhecimentos de base cognitiva, ou seja, a aprendizagem vai se tornando cada vez mais complexa a partir das aprendizagens iniciais 41 e do amadurecimento neurobiológico do cérebro. Enquanto os demais pesquisadores e psicólogos estavam ocupados em descrever os processos mentais que ocorriam com o indivíduo enquanto ele aprendia, Vygotsky (1984) chamou a atenção para dois aspectos que influenciam os processos de aprendizagem: o meio social e a interação com outros indivíduos, considerando estes fatores tão importantes quanto os próprios processos cognitivos. Para Vygotsky (1984), o processo de aprendizagem ocorre a partir do campo chamado Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) – aquilo que o indivíduo consegue realizar com a ajuda de outra pessoa – e passa a fazer parte dos conhecimentos consolidados quando o indivíduo passa a fazer a ação sozinho, sem a ajuda de outra pessoa. Neste momento, o conhecimento faz parte de outro campo, a Zona de Desenvolvimento Real (ZDR). Figura 4 – Zonas de desenvolvimento cognitivo propostas por Vygotsky Fonte: elaborada pela autora. A ZDPo é compreendida como o espaço cognitivo próprio para experimentações, no qual se realizam práticas e testam-se hipóteses, onde o conhecimento não está totalmente estruturado, já que a 42 criança ainda não tem autonomia em relação ao seu emprego. A ZDPr é compreendida como a distância entre a Zona de Desenvolvimento Potencial e a Zona de Desenvolvimento Real. Já a ZDR é compreendida como o espaço cognitivo onde os conhecimentos já estão estruturados e o indivíduo tem a autonomia de empregá-los sem a ajuda de adultos ou pessoas mais experientes. Vejamos um exemplo: uma criança deseja aprender a amarrar o tênis e ela não sabe fazer sozinha. Observa um adulto fazendo os laços e nós e tenta reproduzir, pode até mesmo pedir ajuda ao adulto. Neste momento da experimentação, dos testes e erros, a criança está na ZDP. Quando ela aprende a amarrar o cadarço de seus tênis e é capaz de fazer isso sem a ajuda de um adulto, ela já consolidou este conhecimento e ele passa a integrar a ZDR. Assim, Vygotsky chama a atenção para a mediação que o adulto ou a pessoa mais experiente é capaz de desenvolver nos processos de ensino e aprendizagem, valorizando o papel dos profissionais que se dedicam à educação. As teorias da aprendizagem fazem parte dos estudos da Psicologia e do desenvolvimento humano e são conhecimentos fundamentais para o psicopedagogo e para os profissionais da educação, pois trazem recursos importantes para desenvolver metodologias e práticas mais apropriadas ao processo de aprender de cada educando. Referências BETTIO, C. D. B.; LAURENTI, C. Contribuições de B. F. Skinner para o estudo do desenvolvimento humano. Acta Comportamentalia: Revista Latina de Análisis de Comportamiento, v. 24, n. 1, p. 95-108, 2016. Disponível em: https://www.redalyc. org/journal/2745/274544251007/html/. Acesso em: 3 jul. 2022. PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Rio de Janeiro, RJ: Forense, 1967. https://www.redalyc.org/journal/2745/274544251007/html/ https://www.redalyc.org/journal/2745/274544251007/html/ 43 VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo, SP: Martins Fontes, 1984. WALLON, H. A evolução psicológica da criança. São Paulo, SP: Martins Fontes, 2007. 44 Alterações no desenvolvimento da aprendizagem Autoria: Neide Rodriguez Barea Leitura crítica: Michele Ap. C. Rodrigues Objetivos • Identificar falhas no processo de desenvolvimento da aprendizagem. • Entender como funciona o processo de intervenção nas dificuldades de aprendizagem. • Construir repertório em relação à psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem. 45 1. Alterações no desenvolvimento da aprendizagem: origens Você já teve problemas de aprendizagem? Lembra de algum tópico ou conteúdo que não conseguiu aprender, embora tenha estudado bastante na época? Existe algum tema na sua vida atual que você não consegue aprender? E a pergunta mais importante: é fácil viver uma situação de não-aprendizagem? Imagine, então, como isso é complexo, delicado e dolorido para os alunos, cujo único objetivo é estudar, que ainda estão em processo de desenvolvimento e constituindo sua personalidade. O não-aprender é uma alteração no desenvolvimento regular e esperado da aprendizagem em seres humanos e pode ser de dois tipos. Em geral, significa que algo está impedindo a ocorrência de um processo natural do avanço cognitivo do indivíduo. Ferreira et al.(2018, p. 5) aponta que: As dificuldades de aprendizagem quase sempre se apresentam associadas a problemas de outra natureza, principalmente comportamentais e emocionais. As dificuldades emocionais, por sua vez, influenciam problemas acadêmicos, e estes afetam os sentimentos e os comportamentos das crianças. Todos os seres humanos aprendem, em maior ou menor grau, com maior ou menor amplitude. Quando isso não ocorre, é preciso investigar os fatores que levam a não-aprendizagem, os quais, em geral, fazem parte de um ou outro âmbito, conforme o esquema a seguir. 46 Figura 1 – Alteração no desenvolvimento da aprendizagem Fonte: elaborada pela autora. Os fatores psicoemocionais não se configuram como transtornos, mas como uma dificuldade (ampla ou restrita a um ou poucos aspectos), que pode ser superada, desde que: • Haja acolhimento e suporte dos familiares para a situação. • Se busque a causa da dificuldade de aprendizagem. • Se escolha o profissional mais adequado para a situação (psicólogo, psicopedagogo, professor particular, por exemplo). • Se realizem processos de intervenção assertivos. • O educando tenha motivação ou consiga ser motivado para recuperar seu vínculo com a aprendizagem. • Haja abertura da escola e intenção de ajudar o educando a recuperar o vínculo com sua aprendizagem. 47 Os transtornos de aprendizagem de ordem neurobiológica (Dislexia, Discalculia e Disortografia) e demais situações, tais como o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), a Disgrafia, o Transtorno do Espectro Autista (TEA), as deficiências (intelectual, visual, auditiva, física, múltipla); a paralisia cerebral, a Síndrome de Down, entre outras. Nestes casos, há uma questão biológica (neurológica ou física) que perturba o processo regular da aprendizagem. 2. O não-aprender devido a fatores psicoemocionais O insucesso escolar é um processo dolorido para os envolvidos. Os educandos se sentem incapazes, infelizes e sem perspectiva de melhora. Para os educadores, existe a sensação de fracasso por não conseguir fazer seu aluno aprender. Para a família, a incompreensão da situação e a falta de conhecimento para poder dar suporte ao aprendente gera frustração e, talvez, mais cobranças. O não-aprender ligado a fatores psicoemocionais é entendido como uma dificuldade de aprendizagem, e não um transtorno. Para Ferreira et al. (2018, p. 3), (…) ao se fazer referência às dificuldades de aprendizagem não se pode perder de vista a presença de distorções inerentes ao próprio sistema educacional e às influências ambientais que funcionam como contexto para as manifestações comportamentais e as peculiaridades do indivíduo, que pode apresentar, no sistema escolar, sintoma de não aprender. Não se sabe ao certo como os traumas, as situações do cotidiano (nascimento de irmãos, separação dos pais, mudanças de residência, falecimento de ente querido, entre outras) ou mesmo condições pessoais (sentimento de baixa autoestima, depressão, insegurança, entre outras) causam impactos sobre o processo de aprender de alguns educandos, mas não sobre outros. Uma dificuldade de aprendizagem de ordem psicoemocional é um pedido de socorro. 48 (…) as crianças com baixo desempenho escolar apresentam sentimentos de vergonha, dúvidas sobre si mesmas, baixa autoestima e distanciamento das demandas da aprendizagem, caracterizando problemas emocionais. (…) o abuso físico ou psicológico, passando por uma vasta gama de disfunções orgânicas e dramas pessoais e até pela perda de familiares e pelo cotidiano escolar, é pontilhado por ocasiões de perplexidade e frustações. (…) experiências sociais desagradáveis, insegurança, medos, tensões, tristezas, ansiedades e preocupações acabam por interferir na elaboração e reformulação de esquemas cognitivos. (FERREIRA et al., 2018, p. 9) Fatores psicoemocionais precisam de atendimento especializado para que o aprendente retome o curso regular de aprendizagem. Este atendimento é realizado por psicólogos e psiquiatras, estes últimos quando necessário. Um psicopedagogo também pode ser indicado. Os fatores psicoemocionais não são considerados transtornos de aprendizagem, uma vez que não estão associados diretamente a distúrbios neurobiológicos. Porém, precisam ser diagnosticados e tratados, pois podem afetar diversos âmbitos da vida do aprendente, causando os mais diversos impactos. No caso da aprendizagem, os profissionais que atendem o aprendente precisam desenvolver algumas ações, observadas no esquema a seguir. 49 Figura 2 – Processo de atendimento a aprendentes com dificuldades de aprendizagem de ordem emocional Fonte: elaborada pela autora. Alguns sintomas que indicam a presença de abalos de ordem emocional, normalmente relatados pelos profissionais da escola e pelas famílias, são: regressões, comportamento opositor, negativismo, baixa autoestima, autoconceito abalado e até mesmo narcisismo. Faz parte do trabalho do psicólogo ou do psicopedagogo que atende a um aprendente com dificuldades de aprendizagem de origem psicoemocional orientar a família e a escola em relação às ações que precisam ser realizadas para que o educando retome seu vínculo com a aprendizagem e reencontre a alegria e o prazer de aprender. Em relação ao atendimento, o terapeuta precisará enfocar estratégias que impulsionem o desenvolvimento da aprendizagem do aprendente e a superação de seus limites, bem como de fortalecimento da sua autoestima, respeitando sempre suas necessidades de aprendizagem e seu ritmo. 50 3. O não-aprender associado a transtornos neurobiológicos e outros tipos de alterações Quando se trata de transtornos de aprendizagem, há um grupo mais específico de distúrbios: Dislexia, Discalculia e Disortografia. São chamados transtornos de aprendizagem porque causam distúrbios mais relacionados ao processo de aprender, não sendo incapacitantes para outros setores da vida, tais como os sociais, por exemplo. No entanto, também há outros transtornos que aparecem e afetam mais diretamente o processo de aprendizagem escolar, tais como o TDAH e a Disgrafia. Cada transtorno tem suas particularidades e conheceremos algumas características. Figura 3 – Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) Fonte: elaborada pela autora. 51 O TDAH é diagnosticado por uma equipe multidisciplinar, que inclui: neurologista, neuropsicólogo e psicopedagogo. Os sintomas do TDAH podem ser mais brandos ou muito intensos. Em alguns casos, há a necessidade de medicação, pois os sintomas podem atrapalhar demais o aprendente. Nos casos de TDAH, o controle inibitório não é muito bem desenvolvido, isto quer dizer que o cérebro não consegue inibir os estímulos externos, que acabam atrapalhando a concentração. Estes estímulos externos provocam reações impulsivas (fala e movimentos), que também não conseguem ser inibidas ou controladas pelo indivíduo. A Dislexia é um transtorno relacionado à leitura e à escrita, ou seja, o indivíduo tem dificuldades em decodificar a leitura (incompreensão do que lê ou compreensão superficial, não reconhece letras, não associa letras a sons) e codificar a escrita (não consegue escrever com clareza, omite letras e sílabas, realiza troca de letras e inversão na posição das letras em uma palavra). Figura 4 – Dislexia Fonte: elaborada pela autora. 52 Novas pesquisas têm associado cada vez mais a Dislexia ao Transtorno do Processamento Auditivo Central (TPAC), um campo de estudo da Fonoaudiologia. Já a Discalculia é um transtorno relacionado ao campo da matemática, uma incapacidade na compreensão e expressão matemática. Figura 5 – Discalculia Fonte: elaborada pela autora. Há uma relação entre a Dislexia e a Discalculia: a incapacidade de interpretar os signos numéricos, assim como os alfabéticos. Em geral, embora o aprendente não tenha outros comprometimentos cognitivos, a presença da Dislexia pode levar à Discalculia. E observa-se que, na presença da Discalculia,há também um certo grau de dificuldade com leitura e escrita de textos (ROTTA; OHLWEILER; RIESGO, 2015). Os transtornos relacionados à escrita são a Disgrafia e a Disortografia. 53 Figura 6 – Disgrafia e Disortografia Fonte: elaborada pela autora. Enquanto a Disgrafia está associada a problemas motores de reproduzir as letras, a Disortografia está, na maior parte das vezes, associada à Dislexia. O diagnóstico é realizado por fonoaudiólogos e neurologistas. A intervenção emprega técnicas de escrita, valoriza a ideia a ser transmitida sobre a produção de texto, orienta a escola e os pais neste sentido. O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um transtorno neurobiológico, sem causa definida, que promove alterações na comunicação, na interação social e no comportamento. Pode afetar o processo de aprendizagem: o educando pode tanto ter uma inteligência mais desenvolvida quanto menos desenvolvida. Pode ter um foco de interesse e conhecer profundamente a temática, como pode ter facilidade para uma área do conhecimento e dificuldade em outra. Cada vez menos se procura utilizar o termo Autismo, já que há novas pesquisas e novos entendimentos sobre a complexidade deste transtorno. 54 No caso do TEA, quanto mais cedo for realizado o diagnóstico e iniciarem os atendimentos multidisciplinares, mais fácil é para o educando desenvolver a aprendizagem e os demais aspectos da vida. Em geral, o diagnóstico consegue ser realizado bem cedo, por volta de um ou dois anos de idade, iniciando pelo pediatra que atende a criança. Posteriormente, uma equipe faz o acompanhamento, tais como: psicólogo, psicopedagogo e neurologista. Pode-se também ser necessário o apoio de um terapeuta ocupacional e um acompanhante. Em geral, o processo de aprendizagem parte do foco que o aprendente tenha, a partir daí se estabelecem as relações com as outras áreas do saber, buscando ampliar cada vez mais o foco de interesse. Por exemplo, se o aprendente gosta de bandeiras, é possível buscar relações com a História, a Geografia e a Matemática. O ensino precisa ser mais dirigido, e o aprendente com TEA, acompanhado de forma mais próxima. Normalmente, os materiais precisam ser apresentados com imagens e os textos precisam ser fracionados, com perguntas e destaques. À exceção da deficiência intelectual, as demais deficiências são comprometimentos biológicos que não necessariamente trazem comprometimentos cognitivos, ou seja, a inteligência está preservada e os processos de ensino e aprendizagem precisam ser apenas adaptados, se houver necessidade. Na deficiência visual, é preciso trabalhar com equipamentos específicos, como amplificadores da visão ou linguagem Braille. Para a deficiência física, é preciso verificar se o comprometimento motor interfere na escrita e na manipulação de materiais escolares. Na deficiência auditiva, dependendo do grau de surdez, faz-se necessário o uso da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). A deficiência intelectual, assim como a paralisia cerebral, necessita de um diagnóstico e orientações mais específicas em cada caso. Os transtornos e as dificuldades são um campo amplo nos dias de hoje e necessitam de estudos mais aprofundados e atualizados, por este motivo, fique sempre atento a estas situações. 55 Referências FERNANDES, F. Transtornos de escrita: disgrafia e disortografia. Multirio, 2019. Disponível em: http://www.multirio.rj.gov.br/index.php/reportagens/15211- transtornos-de-escrita-disgrafia-e-disortografia. Acesso em: 10 jul. 2022. FERREIRA, A. C. dos S. et al. Dificuldades de aprendizagem e problemas emocionais do aluno: uma contribuição da psicologia escolar. Revista Interação Interdisciplinar, v. 3, n. 1, p. 5-21, jan.-jul. 2018. Disponível em: https://publicacoes.unifimes.edu.br/index.php/interacao/article/ download/256/433/1014#:~:text=Os%20fatores%20emocionais%20que%20 implicam,social%20e%20cultural%20do%20sujeito. Acesso em: 8 jul. 2022. ROTTA, N. T.; OHLWEILER, L.; RIESGO, R. dos S. Transtorno da aprendizagem: abordagem neurobiológica e multidisciplinar. Porto Alegre, RS: Artmed, 2015. http://www.multirio.rj.gov.br/index.php/reportagens/15211-transtornos-de-escrita-disgrafia-e-disortografia http://www.multirio.rj.gov.br/index.php/reportagens/15211-transtornos-de-escrita-disgrafia-e-disortografia https://publicacoes.unifimes.edu.br/index.php/interacao/article/download/256/433/1014#:~:text=Os%20fatores%20emocionais%20que%20implicam,social%20e%20cultural%20do%20sujeito 56 BONS ESTUDOS! Sumário Apresentação da disciplina Desenvolvimento da criança de zero a dez anos Objetivos 1. Da concepção ao nascimento: a origem do desenvolvimento humano 2. O desenvolvimento motor 3. O desenvolvimento psicológico e cognitivo Referências O desenvolvimento do pré-adolescente e do adolescente Objetivos 1. A pré-adolescência, um novo marco 2. Desenvolvimento motor na adolescência 3. Desenvolvimento psicossocial e cognitivo na adolescência Referências Teorias psicológicas da aprendizagem Objetivos 1. Teorias que explicam o processo de aprendizagem humana 2. O Behaviorismo 3. O Construtivismo 4. A Psicogênese da Pessoa Completa 5. Socioconstrutivismo Referências Alterações no desenvolvimento da aprendizagem Objetivos 1. Alterações no desenvolvimento da aprendizagem: origens 2. O não-aprender devido a fatores psicoemocionais 3. O não-aprender associado a transtornos neurobiológicos e outros tipos de alterações Referências
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