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Unidade 3 Linguistica - A Linguagem muda em função do contexto

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07/09/2023, 16:38 Linguística
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LINGUÍSTICA
CAPÍTULO 3 - A LINGUAGEM MUDA EM
FUNÇÃO DO CONTEXTO?
Adriana Paula da Silva Amorim
INICIAR
Introdução
Para iniciar este estudo, é importante que você tenha em mente que tanto o
estruturalismo quanto o gerativismo – duas correntes linguísticas de base formal –
consideram a linguagem como um aspecto essencialmente humano, e a língua
como um sistema autônomo de regras por meio do qual uma comunidade
linguística se comunica. De fato, as discussões realizadas pelos teóricos formalistas,
em especial Saussure (1916) e Chomsky (1957), possuem grande relevância no
âmbito dos estudos linguísticos.
Ao longo da segunda metade do século XX, outras vertentes dos estudos linguísticos
começaram a surgir com base em algumas indagações, tais como: se a língua de fato
é homogênea, como postula Saussure (1916), por que mudamos nosso modo de
falar em diferentes situações de comunicação? Se a linguagem é essencialmente
humana, por que ao estudá-la desconsideramos as manifestações realmente
proferidas pelos falantes das línguas? E, ainda, como podemos afirmar que ela não
sofre influências da história e da cultura dos povos? No início do tópico 3.1, você
poderá observar um diagrama que apresenta o resumo do percurso histórico dos
estudos linguísticos.
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A fim de refletir sobre essas questões, neste capítulo trataremos de duas áreas da
linguística que consideram fatores extralinguísticos, ou pragmáticos, no estudo da
linguagem: o funcionalismo e a sociolinguística. Dessa forma, os dois primeiros
tópicos deste capítulo destinam-se ao funcionalismo, enquanto os dois últimos à
sociolinguística. Esperamos que você se sinta instigado a conhecer melhor e
compreender esses conceitos, intensificando, assim, sua formação profissional e
acadêmica.
Bom estudo!
3.1 Funcionalismo europeu e norte-
americano
A ciência linguística passou por três momentos: o historicismo, o descritivismo e o
funcionalismo, conforme você pode observar no diagrama a seguir.
Após a preocupação de elaboração de árvores genealógicas das línguas e
comparação entre línguas, que configuram o primeiro momento; a abordagem à
análise descritiva da língua, realizada pelos estruturalistas e gerativistas, no
segundo momento, surgiu uma outra forma de estudar e entender a língua,
conforme seu uso em funcionamento.
Figura 1 - Percurso histórico dos principais estudos linguísticos. Fonte: Elaborada pela autora, 2018.
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O funcionalismo é a corrente teórica da linguística que analisa a relação entre forma
e função, entre a expressão e o conteúdo, ou significado, considerando a situação de
comunicação. 
Em oposição ao estruturalismo e ao gerativismo, o funcionalismo busca estudar a
estrutura linguística considerando sua relação com o contexto de comunicação em
que ela se enquadra. Assim, embora seu surgimento tenha ocorrido dentro dos
estudos estruturalistas, com linguistas do Círculo Linguístico de Praga, seus
métodos e objetivos de análise diferem da abordagem estritamente estruturalista,
visto que não se interessa somente pela forma, mas leva em consideração que o
código linguístico é condicionado pelo significado, ou seja, a forma existe em função
do conteúdo, diretamente ligado aos aspectos comunicativos externos ao sistema
linguístico. Em outras palavras, quando formulamos um texto, selecionamos e
organizamos as palavras a fim de atingir nossos objetivos de alertar, orientar, pedir,
emocionar, entre outros.
Figura 2 - Elementos situacionais passam a ser importantes na análise linguística. Fonte: Marcin
Balcerzak, Shutterstock, 2018.
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Dessa forma, a língua não é mais considerada um sistema autônomo, conforme
afirmavam estruturalistas e gerativistas. Por isso, os estudos funcionalistas
trabalham com dados reais de fala ou escrita em variados contextos de produção da
linguagem. 
VOCÊ SABIA?
Existem formas variadas para uma única função linguística. Pense em diferentes expressões que
servem para cumprimentar uma pessoa: oi! / olá! / e aí? /bom dia! / boa tarde! /boa noite!, entre
tantas outras. Observou quantas formas usamos para a função “saudação” em português?
Para compreender melhor a relação entre forma e conteúdo, leia as frases no
esquema a seguir:
Nos dois casos, temos a ocorrência de formas bem semelhantes, cuja ordenação dos
termos difere em função do objetivo comunicativo do seu emissor. Na frase à
esquerda, identifica-se uma ação (fazer um bolo) realizada por Karina. Em
contrapartida, na frase à direita percebe-se claramente que, dada a situação
comunicativa, acreditava-se que outra pessoa havia feito o bolo, logo o emissor
enfatiza a informação de que foi Karina quem fez. São conhecidas duas vertentes
funcionalistas dos estudos linguísticos, uma europeia, proveniente do
estruturalismo; e uma norte-americana, mais radical em sua oposição às correntes
formalistas e que, inclusive, influenciou muitos grupos de estudo e pesquisa
funcionalistas no Brasil.
Figura 3 - Transformação da estrutura da frase em virtude da função. Fonte: Elaborada pela autora,
2018.
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3.1.1 Funcionalismo europeu
O funcionalismo europeu surgiu como um movimento dentro do estruturalismo,
enfatizando a relevância da função das estruturas linguísticas (CUNHA, 2017), tais
como: a função distintiva dos fonemas (bola e bala) e a função contextual da sintaxe
(Karina fez um bolo / Quem fez o bolo foi Karina).
Segundo Cunha (2017) e Lombardi e Gardelli (2015), os primeiros estudos
funcionalistas – realizados a partir de 1926 pelo Círculo Linguístico de Praga,
fundado por Vilém Mathesius – admitiam que forma e função interagem de modo
que a função influencia, em certa medida, a organização formal. Isso foi considerado
uma inovação nos estudos linguísticos, por incluir na análise os significados e os
fatores externos à língua, ligados ao uso. Veja a seguir quais foram as principais
contribuições dos grupos de estudos funcionalistas da Europa.
O Círculo Linguístico de Praga se destacou nos estudos fonológicos. Segundo seus
participantes, os fonemas:
Não são elementos mínimos em si, mas feixes ou conjuntos de traços distintivos
simultâneos. Por exemplo, o fonema /p/ é constituído dos traços: oclusivo, bilabial,
surdo; enquanto o fonema /b/ reúne traços: oclusivo, bilabial, sonoro. Logo, /b/ e /p/
diferem quanto à sonoridade, e é esse o traço que distingue pares mínimos, como as
palavras “pata” e “bata” ou “pico” e “bico” (CUNHA, 2017, p. 160).
Trubetzkoy (apud CUNHA, 2017; LOMBARDI; GARDELLI, 2015) destaca a função
demarcadora e expressiva dos fonemas. O acento tônico que diferencia as palavras
influência (substantivo) e influencia (verbo) é um exemplo de função demarcadora
da estrutura linguística. Já a função expressiva, que revela a emoção ou sentimento
do emissor, pode ser exemplificada como a pronúncia alongada de determinados
fonemas, como em magníiiiiiiiifico.
De acordo com Cunha (2017), Jakobson – que elaborou um modelo do processo
comunicativo e destacou as funções da linguagem – trabalhou com o conceito de
marcação, afirmando que há categorias marcadas e não marcadas na língua. Por
exemplo, a palavra patos é marcada em relação à palavra pato, pois apresenta um
traço distintivo de número que a segunda não apresenta. Mathesius, por sua vez,
dedicou-se à análise da organização da sentença. Para ele, organização das palavras
na frase se dá em função das informações (CUNHA, 2017).
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Conforme define Halliday (1985), informação é o processo de interação entre o
conhecido e o novo.Assim, de acordo com suas análises, quando uma informação é
nova tende a ser mencionada no final da frase, enquanto a informação dada, ou
seja, já conhecida entre os interlocutores, tende a ser mencionada no início, por já
ser conhecida. Imaginando que as frases Karina fez um bolo e O bolo estava
delicioso foram retiradas de uma conversa entre duas pessoas conhecidas,
percebemos que, na primeira cláusula, o elemento bolo é uma informação nova,
por isso aparece no final, mas, contextualmente, na segunda já é conhecido, por isso
aparece no início da cláusula (CUNHA, 2017). Dando prosseguimento à teoria da
estrutura funcional da sentença, desenvolvida por Mathesius, Jan Firbas elaborou,
no início da década de 1960, o modelo da estrutura informacional da sentença,
afirmando que a informação dada, conhecida pelo ouvinte, tem menor grau de
dinamismo comunicativo e é denominada tema, enquanto a informação nova
possui grau máximo de dinamismo e é denominada rema. Nessa perspectiva, em O
bolo estava delicioso, o bolo é o tema, e estava delicioso é o rema.
Além do Círculo Linguístico de Praga, marcante nos estudos funcionalistas
europeus, há a Escola de Genebra, de base saussuriana, representada por Charles
Bally, Albert Sechehaye e Henri Frei. Esses teóricos foram além dos postulados de
Saussure e passaram a considerar os fatos linguísticos relacionados à fala e sua
relação com as funções atribuídas a eles de acordo com a situação comunicativa.
Além disso, afirmavam que certos desvios individuais em relação às regras do
sistema linguístico poderiam chegar a ser incorporados ao sistema da língua, dada a
sua regularidade, bem como caracterizavam alguns desvios como resultados de
intenções comunicativas diversas, quando “erramos” de propósito com
determinada finalidade (CUNHA, 2017).
Percebeu como os estudos funcionalistas ainda se encontram, de certa forma,
apegados à estrutura ou ao sistema linguístico? Essa realidade mudou quando, em
Londres, também se desenvolveu um grupo, através das ideias de Halliday (1985),
que se apropriou de um conceito mais amplo de função, que inclui tanto as funções
dos elementos dentro da estrutura como as funções de enunciados e textos inteiros.
Nesse sentido, para ele, a linguagem deve ser concebida e estudada como um
processo social, considerando cada indivíduo participante do ato comunicativo
(CUNHA, 2017).
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Michael Alexander Kirkwood Halliday nasceu no condado de Yorkshire (Inglaterra), em 1925. Formou-se
em linguística na Universidade de Londres e trabalhou como professor em instituições da Inglaterra,
Austrália e China. Estabeleceu seu trabalho de linguagem como parte da vida social humana (GHIO,
2005).
Halliday (1985) trabalhava com a análise da língua em três níveis:
o texto: utilizado para explicar a linguagem posta em prática, seja ele dito ou
escrito;
o sistema: a articulação dos elementos para a produção e recepção de
sentidos pelos interlocutores;
a estrutura: cada elemento da língua é explicado pela sua função dentro do
sistema linguístico.
Procurando integrar língua e fala, consideradas categorias dicotômicas pelo
estruturalista Saussure (1916), a proposta de Halliday (1985) é chamada de
linguística sistêmico-funcional. Na prática, consideremos a seguinte frase: “Ele é tão
cruel quanto Hitler”. Certamente, ao escolher a palavra Hitler, o interlocutor não
considerou somente o fato de ser o nome de uma pessoa, adequada para esta
posição na sentença, mas o seu significado, identificado por aqueles que conhecem
os acontecimentos em torno dessa personalidade reconhecida mundialmente pelos
seus feitos políticos e pelo holocausto durante a Segunda Guerra Mundial (1939-
1945). Em síntese, quando formulamos frases, escolhemos as palavras mais
adequadas pela sua função dentro do contexto, a depender da finalidade e da
pessoa com quem estamos falando, e não simplesmente pela sua função dentro do
sistema linguístico.
Conforme Cunha (2017), paralelamente, o grupo holandês composto por Simon Dik
e seus seguidores, elaboraram um modelo de análise sintática funcional, segundo o
qual a frase deve ser analisada em três níveis: sintático, semântico e pragmático.
Dessa forma, na frase “Karina fez um bolo”, o termo “Karina”, no nível sintático,
possui função de sujeito; no nível semântico, possui função de agente e, na função
VOCÊ O CONHECE?
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pragmática, possui função de tema (informação dada). Em síntese, para ele, funções
sintáticas devem ser analisadas junto às funções pragmáticas, que também fazem
parte do sistema de regras da língua.
No Brasil, Rodolfo Ilari (1987) ocupou-se da análise linguística acerca dos conceitos
de tema e rema, em linha com os estudos do Círculo Linguístico de Praga, bem como
acerca da relação entre a semântica e as estruturas linguísticas, refletindo sobre as
operações inconscientes que realizamos o tempo todo ao nos comunicarmos. Além
disso, Ilari (1999) colaborou sobremaneira para os estudos descritivos das línguas
românicas, oferecendo um aparato científico para novos estudiosos da área.
3.1.2 Funcionalismo norte-americano
Nos EUA, foi muito forte a tendência estruturalista e behaviorista de Bloomfield e
Sapir, no entanto, Sapir foi influenciado pela visão funcionalista da linguagem,
assim como Franz Boas e Benjamin Lee Whorf.
Os estudos norte-americanos são considerados mais radicais em relação à
combinação entre forma e função. De acordo com estas teorias, as funções externas
à linguagem definem as categorias gramaticais. Logo, não há necessidade de se
estudar os níveis estruturais da língua, apenas os seus princípios comunicativos, os
quais veremos no próximo tópico.
Segundo Lombardi e Gardelli (2015), Dwight Bolinger, precursor do funcionalismo
norte-americano, destacava o papel dos fatores pragmáticos na ordenação dos
elementos na frase. Os funcionalistas norte-americanos defendiam que só é possível
descrever e explicar a língua com base nos elementos extralinguísticos, pois “a
sintaxe é uma estrutura em constante mutação em consequência das vicissitudes do
discurso, ao qual se molda” (CUNHA, 2017, p. 163).
Ainda conforme descreve Cunha (2017), Talmy Givón, em contraposição à visão
estruturalista, centrou seu trabalho na relação de motivação entre fatores externos à
língua e fatos gramaticais, ou seja, a iconicidade, que será vista com mais detalhes
no tópico posterior. Hopper e Thompson (1980), por sua vez, desenvolveram o
conceito de transitividade, ou transferência da ação de um agente para um paciente,
gerado pela ocorrência de frases com agende explícito ou não, o que, para eles,
releva intenção discursiva do falante.
Ultrapassando as fronteiras dos Estados Unidos, as ideias funcionalistas norte-
americanas influenciaram grupos de linguistas na Alemanha e no Brasil. Na
Alemanha, os estudos dedicaram-se às questões de mudança linguística e de
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gramaticalização. No Brasil, a partir da década de 1980, foram formados o Projeto de
Estudo do Uso da Língua e o Grupo de Estudos Discurso & Gramática. Enquanto o
primeiro assume uma visão semelhante à sociolinguística, considerando fatores de
ordem comunicativa para interpretar a função das estruturas linguísticas, o segundo
estuda os processos de gramaticalização (CUNHA, 2017).
CASO
O Grupo de Estudos Discurso & Gramática foi fundado em 1991, sob o título “Iconicidade na fala e na
escrita”, assumido pelo grupo por dois anos. Seus participantes organizaram amostras de língua
falada e escrita com informantes em cinco cidades brasileiras: Rio de Janeiro (RJ), Natal (RN), Rio
Grande (RS), Juiz de Fora (MG) e Niterói (RJ), a fim de criar um banco de dados reais de fala dos
brasileiros para análise da língua. O material é considerado rico, pois além dos registros da
modalidade oral da língua, há registrosda modalidade escrita, o que permite ao analista comparar
as duas modalidades, se necessário. Veja mais em:
<http://www.discursoegramatica.letras.ufrj.br/
(http://www.discursoegramatica.letras.ufrj.br/)>.
No tópico seguinte, serão abordados os princípios de análise funcionalista:
informatividade, iconicidade, marcação, transitividade e gramaticalização.
3.2 Princípios ou categorias
funcionalistas
Conforme você estudou, por meio dos estudos funcionalistas, surgiram novas
categorias de análises da estrutura linguística, levando em consideração a
importância do contexto situacional para a descrição e explicação dos fatos
linguísticos. Veja quais são eles e como são aplicados à análise linguística.
3.2.1 Informatividade
Como já explicitado anteriormente, o termo informação diz respeito ao processo de
interação entre o que é conhecido dos interlocutores e o que lhes é novo (HALLIDAY,
1985). Nessa perspectiva, a partir desse princípio, se analisa o nível informacional
http://www.discursoegramatica.letras.ufrj.br/
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dos elementos linguísticos, com ênfase nos sintagmas nominais, que podem ser
classificados em dado, novo, disponível ou inferível. Com finalidade de
exemplificação, utilizaremos trechos retirados do corpus Discurso & Gramática.
Observe:
I: é: assim é ... eu vou contar um ... um ... um acidente que aconteceu comigo em
setenta e três né... uma coisa que marcou muito ... na minha vida ... é eu tinha seis
anos ... aí nós saímos da ... nós morávamos em Nova Descoberta ... aí nós saímos de
casa né ... a passeio durante o ... pela manhã ... eu ... eu ... meu irmão ... papai ... um
motorista ... (CUNHA, 1993, p. 1). 
Um elemento é novo quando é introduzido pela primeira vez no enunciado. Assim,
o termo “acidente” recebe essa classificação. Um elemento é considerado dado
quando já foi mencionado no texto ou se estiver disponível na situação de
comunicação, como quando se refere aos próprios interlocutores. No excerto acima,
a expressão “uma coisa que marcou muito a minha vida” é exemplo de informação
dada, por já ter sido citada anteriormente na fala do informante.
Além disso, o elemento pode estar disponível, quando se subentende que está na
mente dos interlocutores por ser único e fazer parte do contexto social e cultural a
que pertencem, como “sol”, “lua”, “São Paulo”. No excerto em análise, “Nova
Descoberta” é um elemento disponível. Em última instância, um elemento pode ser
inferível quando não está explícito, mas pode ser identificável por outra
informação. É o caso do veículo onde estavam as pessoas que se envolveram no
acidente. Embora não esteja explícito o tipo de veículo, sabe-se que se trata de um
veículo automotivo, pela informação “motorista”, presente no texto.
A relevância da informatividade reside na seleção e ordenação dos elementos
linguísticos na frase, em decorrência de seu status informacional (CUNHA, 2017).
3.2.2 Iconicidade
Saussure (1916) e seus seguidores estruturalistas trabalhavam com o conceito de
arbitrariedade da língua. Em contrapartida, o conceito de iconicidade (relação de
motivação entre forma/código e função/significado) ganhou espaço nos estudos
funcionalistas, já que para eles a estrutura linguística revela intenções dos
interlocutores.
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A versão inicial de iconicidade, por meio da qual se defende uma relação de
igualdade entre código e significado (BOLINGER, 1977, apud COSTA, 2017), foi
questionada devido ao fato de que as mudanças linguísticas causadas pelo tempo
ou pelo contexto alteram o significado de algumas expressões, como a conjunção
concessiva “embora”, que outrora tinha valor de advérbio temporal, sob a forma
“em boa hora”, e hoje também é utilizada como partícula de afastamento, como no
caso de “vamos logo embora”.
Conclui-se, portanto, que a iconicidade dos termos está sujeita a modificações
temporais, tanto na forma “em boa hora > embora”, como na função, inclusive
porque os usuários da língua a utilizam criativamente, atribuindo novos significados
a expressões em determinados contextos.
Assim, a iconicidade passou a ser tratada sob novos aspectos, quais sejam: a
quantidade de informação, o grau de integração entre forma e conteúdo e a
ordenação dos segmentos na frase.
De acordo com o subprincípio da quantidade, “quanto maior a quantidade de
informação, maior a quantidade de forma” (CUNHA, 2017, p. 168). Isso pode ser
visto nas palavras derivadas, que além de possuírem mais elementos formais,
veiculam mais conteúdos, mais informações. Por exemplo:
Pedra – Pedraria – Pedregulho – Petrificar
Por conseguinte, segundo o subprincípio da integração, expressões de significados
próximos tendem a aparecer próximas na forma. É possível percebermos essa
relação entre o substantivo e o adjetivo relacionado a ele. Por exemplo:
Janaína comprou uma calça preta e uma blusa branca.
Temos, no predicado dessa oração, dois sintagmas nominais, compostos por um
substantivo e um adjetivo relacionado a ele; cada adjetivo aparece próximo ao
nome ao qual se refere, o que confirma a hipótese da integração.
Por fim, o subprincípio da ordenação sequencial é subdividido em dois. O primeiro
é o subprincípio da ordenação linear, segundo o qual a ordenação dos elementos
na frase tende a refletir a ordem temporal em que os fatos realmente ocorrem, como
no relato a seguir:
I: De noite estava batendo, na porta e meu primo, abriu a porta era uma, moça toda de
branco. Aí ela foi sumino, sumino ela foi embora. No outro dia de noite estava batendo
na po. E meu primo não atendeu. De manhã meu primo viu a marca do monstro
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(VOTRE; OLIVEIRA, s. d., p. 71).
O outro subprincípio de ordenação é o subprincípio de topicalidade, muito
semelhante aos conceitos de tema e rema desenvolvidos pelo Círculo Linguístico de
Praga. Segundo esse princípio, informações velhas ou já mencionadas
anteriormente tendem a vir no início da frase, enquanto as informações novas
tendem a aparecer no final. Por exemplo:
I: Entrei na lancha juntamente com dois colegas de serviço e sentei na cadeira do
canto, porém não vi que a cadeira estava sem encosto. Caí com tudo pra trás no colo de
um senhor que estava no banco de trás (VOTRE; OLIVEIRA, 1996, p. 5).
Nesse relato escrito, percebemos que a palavra “cadeira”, quando citada pela
primeira vez, aparece no final da frase, por ser um elemento novo no discurso. Em
compensação, ela aparece no início da frase seguinte, por já ser uma informação
dada, mencionada anteriormente.
Portanto, o princípio da iconicidade está intrinsecamente ligado às intenções do
falante ou ao conhecimento partilhado entre ele e o ouvinte, o que motiva a
organização das informações na sentença.
3.2.3 Marcação
Como você viu, o Círculo Linguístico de Praga deu origem à categorização dos
elementos da língua em marcados ou não marcados. Um item é considerado
marcado quando possui um traço ausente em outro item, como é o caso das
palavras “cidadão” e “cidadãos”. A palavra “cidadãos” é marcada em relação à
palavra “cidadão”, pois possui uma desinência de número (que marca o plural) que a
outra não possui. Essa caracterização sempre acontece na comparação entre dois
elementos.
Em resumo, as formas não marcadas, segundo Cunha (2017), apresentam as
características na figura a seguir.
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De fato, se pensarmos nas palavras não marcadas pelo plural, ou seja, palavras no
singular, percebemos que elas estão em maior número na Língua Portuguesa,
possuem um conteúdo mais amplo (como quando dizemos “o cidadão brasileiro
merece respeito” nos referindo a todos os cidadãos, mesmo usando o singular). Sua
forma é mais simples que o plural, com menos elementos formais, e é mais
facilmente assimilada pelascrianças em aprendizagem da língua.
Outro exemplo, é a organização das frases em Língua Portuguesa que, em sua
maioria, aparecem na ordem direta: sujeito > verbo > complemento. Outras
formações frasais, em que o sujeito aparece no final da oração, por exemplo, são
consideradas formas marcadas em relação à ordenação direta da oração, mais
comum. 
3.2.4 Transitividade
Provavelmente você já ouviu falar da transitividade dos verbos de acordo com a
gramática tradicional. Os manuais didáticos de gramática afirmam que os verbos
transitivos necessitam de complemento, enquanto os intransitivos não necessitam
de complemento. Nesse sentido, Hopper e Thompson (1980) afirmam que a
transitividade, sob a visão funcionalista, é o nível de transferência da ação de um
agente para um paciente, de acordo com “a dinamicidade do verbo, a agentividade
do sujeito e a afetação do objeto” (CUNHA, 2017, p. 172).
 Figura 4 -
Características das formas marcadas, segundo Cunha (2017). Fonte: Elaborada pela autora, 2018.
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Retomando a frase “Karina comeu o bolo”, observe que esta sentença possui um
nível de transitividade mais alto do que em “Karina observou o bolo”, a partir dos
critérios apresentados por Cunha (2017).
Os autores supracitados observaram que, em textos mais extensos, as orações com
maior nível de transitividade apresentam conteúdos centrais no texto, enquanto as
orações com baixa transitividade aparecem em comentários descritivos e
avaliativos, geralmente sem centralidade nos textos.
3.2.5 Gramaticalização
Como premissa do funcionalismo, “a gramática é um organismo maleável, que se
adapta às necessidades comunicativas e cognitivas dos falantes” (CUNHA, 2017, p.
173). Nesse sentido, certas palavras ou organizações sintáticas utilizadas em
contextos específicos podem chegar a ser incorporados ao sistema da língua ou
sofrer mudanças dentro dele. Cunha (2017) cita o exemplo do verbo “querer”, que
passou a ser utilizado como conjunção em algumas situações comunicativas, por
exemplo, na formação “quer você vá, quer você não vá, o importante é que eu vou”.
Atualmente, esse significado da palavra “querer” já é admitido dentro da gramática
da língua.
Figura 5 - O sistema linguístico tem caráter adaptativo. Fonte: TypoArt BS, Shutterstock, 2018.
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O processo de gramaticalização é diacrônico, ou seja, acontece gradativamente ao
longo dos anos, de modo que não percebemos. O que leva uma forma não
gramatical a ser incorporada à gramática ou sua variação gramatical é a frequência
com que é utilizada pelos falantes da língua.
O livro “Introdução à gramaticalização”, de Sebastião Carlos Leite Gonçalves (2007), aborda a questão da
variação do sistema linguístico, devido a sua constante necessidade de renovação. Inicialmente, o autor
apresenta a teoria do processo de gramaticalização para depois demonstrar a ocorrência desse
fenômeno no português do Brasil.
VOCÊ QUER LER?
3.3 Sociolinguística
A sociolinguística, como o próprio nome sugere, tem como premissa a relação entre
a estrutura da língua e os aspectos sociais e culturais dos falantes. Assim como o
funcionalismo, os estudos sociolinguísticos também analisam a língua a partir de
textos realmente proferidos em situação real de comunicação, com método objetivo
e sustentando a tese de que a língua não é autônoma, ou seja, deve ser estudada de
forma interdependente em relação aos fatores extralinguísticos que interferem
diretamente no sistema linguístico.
Foi nos estudos da sociolinguística que surgiu o termo variação linguística, pois
foram percebidas variações sistemáticas, ou seja, motivadas por fatores sociais ou
culturais específicos em determinadas situações, como o uso de gírias entre os
jovens. Por isso, a sociolinguística também é conhecida como teoria da variação.
A sociolinguística, enquanto ramo da linguística que estuda sua relação com os
fatores sociais inerentes à comunicação humana, situou seus estudos na variação da
língua em função de fatores extralinguísticos, como contexto, faixa etária, classe
social e escolaridade.
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Segundo Cezario e Votre (2017), o precursor dos estudos sociolinguísticos foi o
linguista William Labov, a partir da década de 1960, nos EUA.  Desde então, muitos
estudiosos têm se interessado por esse tema, dada sua relevância não somente no
campo da linguagem, mas da sociedade como um todo. Neste tópico, serão
apresentados alguns conceitos importantes para a sociolinguística, bem como um
breve panorama histórico de surgimento dos estudos e pesquisas no âmbito da
sociolinguística.
3.3.1 Sociedade e linguagem
Todo indivíduo encontra-se inserido em uma comunidade de fala, e compartilha
com outros membros dessa comunidade alguns traços como religião, trabalho,
lazer, faixa etária, escolaridade, profissão e sexo, formando, assim, grupos menores
dentro da comunidade maior.
Figura 6 - A língua é um importante recurso na comunicação digital, principalmente por meio de redes
sociais. Fonte: Ivelin Radkov, Shutterstock, 2018.
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Cada um desses grupos possui formas distintas de dizer a mesma coisa, o que é
chamado de variação linguística. Cada uma dessas formas é chamada de variante.
Essa variação pode ser de ordem fonológica, morfológica, sintática, lexical (de
vocabulário) e motivada por fatores linguísticos ou não linguísticos (contexto, classe
social, sexo, faixa etária). Além disso, uma variante pode ser mais utilizada do que a
outra, sendo considerada padrão, enquanto a outra é não padrão.
Um exemplo da relação entre linguagem e sociedade é apresentado por Cezario e
Votre (2017, p. 151): existe alternância de utilização dos fonemas /l/ e /r/ nos
encontros consonantais do português, como em “claro / craro”, “bicicleta / bicicreta”.
Ainda de acordo com Cezario e Votre (2017), pesquisas de Mollica e Paiva (1987) e
Cezario (1991) demonstraram que há uma: “[...] variação estável que caracteriza
duas comunidades de fala: a forma não padrão /r/ é usada pelos falantes das classes
menos favorecidas e com baixo grau de escolaridade. A outra forma, canônica, é
usada pelo grupo mais escolarizado.” (CEZARIO; VOTRE, 2017, p. 151).
Figura 7 - Dentro de uma mesma comunidade de fala, são formados grupos linguísticos, cada qual com
suas formas distintas de dizer o mesmo. Fonte: A1Stock, Shutterstock, 2018.
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Além disso, é possível verificar uma variação entre a linguagem utilizada por
homens e mulheres em diversas sociedades. Em algumas comunidades da África, as
mulheres são proibidas de pronunciar o nome do sogro, dos irmãos dele e de seu
próprio genro. Também devem evitar palavras da língua que sejam semelhantes aos
nomes deles. Nesse caso, há palavras que somente os homens podem falar, devido
a fatores culturais. No português, também há variação linguística em função do
sexo: é comum, no Brasil, um homem dizer: “esta é minha mulher”, mas não é
comum ouvir uma mulher dizer: “este é o meu homem”, pois em alguns contextos
essa frase pode ser considerada vulgar (CEZARIO; VOTRE, 2017).
É válido lembrar que não cabe ao analista da linguagem julgar se as formas são
corretas ou erradas, pois o sociolinguista busca, na verdade, descrever as variações
da língua e explicá-las por meio de hipóteses baseadas nas informações não
linguísticas de que possa dispor.
3.3.2 O advento da sociolinguística
Segundo Cezario e Votre (2017), o termo sociolinguística foi utilizado para primeira
vez na década de 1950, mas a partir dos estudos de Labov, na década de 1960, esse
ramo da linguística, de fato, se desenvolveu. A sociolinguística é fruto da
insatisfação de muitos linguistasem relação ao estruturalismo e ao gerativismo, que
desconsideravam os usos reais da linguagem influenciados por fatores sociais e
culturais pertencentes às comunidades de fala, considerando o uso da língua um
caos que impossibilitaria seu estudo.
A sociolinguística possui interface com outras disciplinas, como a sociologia, a
antropologia, entre outras. Além disso, é possível perceber que há uma interação
entre a sociolinguística e o funcionalismo. Como o funcionalismo também trabalha
com enunciados realmente proferidos em situações reais de fala, muitos grupos
funcionalistas utilizam o aparato teórico-metodológico da sociolinguística para
coletar seu corpus e analisar os dados (conforme você estudou no tópico 3.2, sobre o
corpus Grupo Discurso & Gramática). Em contrapartida, algumas explicações sobre a
variação linguística são realizadas através de conceitos funcionalistas.
A pesquisa sociolinguística parte da coleta de dados, por meio da gravação da fala
de um número considerável de informantes, para posterior análise. A intenção é que
o informante não se preocupe muito com a forma como vai manifestar suas ideias,
ou seja, que a fala seja mais espontânea possível. Assim, pede-se que ele faça um
relato de uma experiência pessoal, para que vá, aos poucos se envolvendo com a
narração, e não monitore sua forma de falar.
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As regularidades encontradas na fala de indivíduos do mesmo grupo linguístico
revelam as características linguísticas de cada região geográfica, de cada classe
social, de cada contexto de comunicação (mais ou menos formal), de cada faixa
etária, entre outros fatores sociais verificáveis.
Meillet (1926, apud CEZARIO; VOTRE, 2017), muitos anos antes do advento da
sociolinguística, já dizia que não se pode separar a história das línguas da história da
cultura e da sociedade em que estão inseridas. No tópico seguinte, você conhecerá
os aspectos sociais que influenciam na variação linguística e alguns exemplos
pertinentes para cada um deles. 
3.4 Mudanças e variedades linguísticas
Ao longo dos muitos trabalhos no âmbito da sociolinguística, tem-se percebido que
as variações linguísticas podem gerar mudanças no sistema linguístico, com o
desaparecimento de algumas formas e aparecimento de outras. É o caso, por
exemplo, da forma de tratamento “vossa mercê”, que após passar por sucessivas
variações, caiu em desuso, dando lugar à forma “você”, como é utilizada hoje.
Essa percepção só é possível após sucessivas análises dessas formas em períodos
diferentes, a fim de perceber as possíveis mudanças pelas quais a língua possa estar
passando.Em um estudo sincrônico, ou seja, em um determinado espaço de tempo,
é possível encontrar muitas variantes, muitas formas de expressar o mesmo
conteúdo, a depender da situação.
É o caso das variantes relativas à primeira pessoa do plural: “nós” e “a gente”. A
partir da constatação da existência das variantes, o analista busca encontrar
regularidades ou explicações para o uso de cada uma delas. Nessa perspectiva,
“nós” é considerada uma estrutura mais formal, enquanto “a gente” é utilizada em
contextos mais coloquiais. Existem, ainda, as variantes mais estigmatizadas da
combinação dessas formas com o verbo: “nós vai”, “a gente vamos”, geralmente
utilizadas por pessoas de classe social baixa e baixo nível de escolaridade. No
entanto, também há ocorrências de utilização dessas variantes por pessoas de
escolaridade mais alta, em contextos bem informais e/ou com interlocutores de
baixa escolaridade e classe social desfavorecida. Na sequência, você identificará os
detalhes de cada um dos aspectos que levam à variação linguística.
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3.4.1 Aspectos de variação da língua
O sociolinguista procura as probabilidades de ocorrência de determinada variante
em grupos divididos por sexo, idade, escolaridade, etnia, nível socioeconômico e
contexto comunicativo, entre outros aspectos que lhe pareçam relevantes na análise
do seu corpus.
Em relação ao nível socioeconômico e à escolaridade, por exemplo, verifica-se que
as pessoas analfabetas costumam proferir frases como: “As casa foi pintada”,
marcando o plural somente no primeiro elemento, enquanto pessoas com nível
superior geralmente marcam o plural em todas as palavras: “As casas foram
pintadas”, o que não quer dizer que em um contexto informal, uma pessoa com nível
universitário não se expresse da primeira forma, já que não vê necessidade de ser
formal se for compreendido por seu interlocutor (CEZARIO; VOTRE, 2017, p. 143).
Em relação à regionalidade, não podemos esquecer que residimos num país muito
extenso que, habitado por povos indígenas, passou pelos processos de colonização
(por portugueses e espanhóis), de chegada de africanos no período de escravidão e
de imigração (de italianos, alemães e judeus, entre outros). Essa mistura de etnias
propiciou a formação de múltiplos sotaques e dialetos no país. Podemos citar as
diferentes pronúncias do fonema /r/ em palavras como cantar e comer pelo Brasil:
no Sul, a pronúncia é vibrante; no interior de estados como São Paulo, o /r/ é
retroflexo (com a língua dobrada para trás) e no Nordeste, o som do /r/ no final dos
verbos é omitido.
VOCÊ SABIA?
O português brasileiro difere bastante do português de Portugal, desde a forma como as palavras
são escritas e pronunciadas, até a estrutura sintática e as variações de significado. Isso ocorreu
devido ao processo de interação entre o português trazido pelos colonizadores, a língua nativa e as
várias outras que chegaram ao país pelos processos de imigração.
Em relação ao contexto comunicativo, consideramos que cada pessoa possui (ou
deveria possuir) um repertório linguístico variado, do qual lança mão dependendo
de cada situação. Um grande empresário certamente se expressa de formas
distintas quando conversa com seus fornecedores e clientes, quando conversa com
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um familiar ao telefone, quando apresenta os resultados de sua empresa a um
grupo de financiadores ou quando combina um jogo de futebol com os amigos. O
léxico e a sintaxe utilizados, de fato, serão alterados em cada um desses casos.
Em síntese, os processos de variação ocorrem de três formas principais, segundo
Cezario e Votre (2017):
Variação regional: relativa à origem geográfica dos falantes (cidades, estados,
regiões do país). É o caso das palavras mandioca, macaxeira e aipim, ditas em
diferentes partes do país para se referir ao mesmo alimento. É possível,
também, perceber uma variação entre o português de Portugal e do Brasil.
Enquanto no Brasil dizemos “estou ligando para você”, em Portugal se diz
“estou a ligar para você”.
Variação social: relativa a grupos socioeconômicos, faixa etária, escolaridade,
etnia, profissão, entre outros. Por exemplo, é o caso dos jargões próprios da
área profissional da informática, como log, PC e bug.
Variação de registro: relativa ao grau de formalidade do contexto situacional,
como o ambiente, os interlocutores ou o próprio meio de comunicação. É o
caso da linguagem mais formal utilizada em e-mails profissionais e menos
formal utilizada em salas virtuais de bate-papo (chats) de entretenimento.
O filme Cine Holliúdy mostra, de forma bem-humorada, o dilema vivido por Francisgleydisson em relação
à chegada da TV ao interior cearense, e o desinteresse da população pelo cinema. Apesar de brasileiro, o
filme é legendado, pois os personagens utilizam o dialeto nordestino – “falado em cearensês”, como
avisam os produtores –, e as legendas possibilitam que os diálogos sejam entendidosnas demais regiões
do Brasil. Para assistir, acesse o endereço: https://www.youtube.com/watch?v=zP-nMen5APQ
(https://www.youtube.com/watch?v=zP-nMen5APQ).
É importante destacar que, normalmente, uma variante pode refletir mais de um
tipo de variação. É o exemploda utilização de “tu” e “você” como forma de
tratamento. Trata-se de uma variante regional, visto que no Rio Grande do Sul, a
forma “tu” é bastante utilizada, enquanto no Rio de Janeiro as duas formas são
VOCÊ QUER VER?
https://www.youtube.com/watch?v=zP-nMen5APQ
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utilizadas com frequência. Do ponto de vista social, é possível perceber que os
jovens preferem utilizar a forma “tu”; os menos escolarizados também. Por fim, em
relação ao registro, a forma “tu” é utilizada em contextos informais.
3.4.2 Preconceito linguístico
Considerando as variações da língua, Bagno (2008, p. 48) afirma que “[...] em toda
língua do mundo existe um fenômeno chamado variação, isto é, nenhuma língua é
falada do mesmo jeito em todos os lugares, assim como nem todas as pessoas falam
a própria língua de modo idêntico”. No entanto, são notáveis as manifestações de
cunho preconceituoso com as variantes da língua menos prestigiadas.
Na comparação entre o dialeto padrão e o não padrão, este é considerado errado e
inferior em relação ao primeiro, considerado correto e puro. A variedade padrão é
privilegiada no ensino e, segundo alguns professores, deve ser buscada como meio
para se conseguir prestígio social. Mais que isso, muitas vezes, a norma culta da
língua tem sido instrumento de dominação social e humilhação de pessoas que
falam de uma forma específica porque moram vêm de uma determinada região ou
porque não teve oportunidade de estudar (BAGNO, 2008). De fato, é importante e
necessário aprender e estudar a modalidade padrão da língua, visto que ela é
utilizada em situações mais formais, como no mercado de trabalho. No entanto, as
outras variantes não devem ser esquecidas e/ou consideradas inferiores.
Bagno (2008) chama atenção para a importância de se romper esse círculo vicioso
que tem se tornado o preconceito linguístico. A saída, para ele, é ensinar as crianças
a valorizarem todas as modalidades de registro, mostrando que nenhuma é melhor,
ou pior, do que as outras.
O livro “Nós cheguemu na escola, e agora? Sociolingüística & educação”, de Stella Maris Bortoni-Ricardo
(2005), é fruto de uma pesquisa sociolinguística realizada no Brasil. É direcionado a professores de
línguas – portuguesa ou estrangeiras –, ou a outros profissionais interessados na relação entre linguagem
e sociedade. 
VOCÊ QUER LER?
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Diante do exposto, percebemos a relevância dos estudos dos funcionalistas e
sociolinguistas, que consideram os fatores não linguísticos envolvidos na
comunicação humana (tais como os interlocutores, o contexto de comunicação e a
finalidade do que é dito), reconhecendo a capacidade dinâmica e evolutiva da
língua.
Síntese
Ao concluir o estudo sobre funcionalismo e sociolinguística, você já está apto a
perceber as semelhanças e diferenças entre as variações linguísticas, bem como sua
importância a partir pontos de vista distintos sobre o mesmo objeto de análise: a
língua.
Neste capítulo, você teve a oportunidade de:
reconhecer a língua como um instrumento de interação social;
perceber a relação entre forma e função;
compreender as categorias de análise funcionalista: informatividade,
iconicidade, marcação, transitividade e gramaticalização;
entender a relação entre linguagem e sociedade;
compreender que uma língua tem diversas variantes e que não há uma mais
certa ou mais errada.
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