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seus predecessores apenas previram; ele realizou. Os grandes monumentos de lucidez do direito francês, os Códigos que se tornaram modelos para todo o mundo burguês, exceto o anglo-saxão, foram napoleônicos. A hierarquia dos funcionários – a partir dos prefeitos, para baixo –, das Cortes, das universidades e escolas foi obra sua. As grandes “carreiras” da vida pública francesa, o exército, o funcionalismo público, a educação e o direito ainda têm formas napoleônicas. Ele trouxe estabilidade e prosperidade para todos, exceto para os 250 mil franceses que não retornaram de suas guerras, embora mesmo para os parentes deles tivesse trazido a glória. Sem dúvida, os britânicos se viam como lutadores pela causa da liberdade contra a tirania; mas em 1815 a maioria dos ingleses era mais pobre do que o fora em 1800, enquanto a maioria dos franceses era quase que certamente mais rica, e ninguém, exceto os trabalhadores assalariados, cujo número era insignificante, tinha perdido os substanciais benefícios econômicos da Revolução. Há pouco mistério quanto à persistência do bonapartismo como uma ideologia dos franceses apolíticos, especialmente dos camponeses mais ricos, depois da queda do ditador. Foi necessário um segundo Napoleão menor, entre 1851 e 1870, para dissipá-la. Ele destruíra apenas uma coisa: a Revolução Jacobina, o sonho de igualdade, liberdade e fraternidade, do povo se er- guendo na sua grandiosidade para derrubar a opressão. Este foi um mito mais poderoso do que o dele, pois, após sua queda, foi isso e não a sua memória que inspirou as revoluções do século XIX, inclusive em seu próprio país. HOBSBAWM, Eric. A Era das Revoluções: 1789-1848. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989. As contradições inerentes ao absolutismo manifestaram-se de forma aguda e em todos os níveis na segunda metade do século XVIII. A primeira manifestação foi ideológica, por meio do Iluminismo e seu campo aparentemente inesgotável de críticas ao que o próprio movimento chamou de Antigo Regime. O mais visível foi o político – por meio do desenvolvimento do pensamento liberal que já começara a ganhar forma com John Locke e sua análise sobre a Revolução Gloriosa, ao final do século XVII. Também a análise econômica cristalizou-se pela obra de Quesnay e Gournay, atingindo seu ponto mais alto com Adam Smith. O liberalismo econômico foi a essência da crítica burguesa àquilo que o próprio pensamento liberal batizou como mercantilismo, afirmando uma posição de defesa da liberdade econômica que era, na verdade, a defesa da ação independente da burguesia. Outro elemento de crítica profunda foi o social, com a negação do caráter estamental da sociedade do Antigo Regime, que se manifestava na estrutura de privilégios que cercava a nobreza. No rastro dessa negação aos princípios que marcaram a vida europeia na Idade Moderna, o Iluminismo voltou-se contra os aspectos culturais do Antigo Regime, como a predominância da Igreja, encetando uma violenta crítica ao clero e uma defesa aberta da razão e da ciência como únicas guias para o conhecimento. Outra manifestação deu-se no campo econômico. A Revolução Industrial coroou três séculos de ascensão da burguesia, com a acumulação do capital mercantil, fruto indireto da prática mercantilista das monarquias, revertendo-se na consolidação do capitalismo e da hegemonia econômica da burguesia. A crise do Antigo Regime manifestou-se ainda na sua periferia. A independência das colônias inglesas, que mais tarde dariam origem aos Estados Unidos da América, foi o ponto de partida para um processo que levaria ao fim do sistema colonial, sustentáculo fundamental do mercantilismo e das monarquias europeias. Por fim, essa crise encontrou sua manifestação mais explosiva na Revolução Francesa. Em um intervalo de apenas 25 anos, a monarquia, que sintetizou todos os componentes do que se chamou de Antigo Regime, foi destruída. A velha ordem em todos os seus aspectos foi suprimida, as ideias que marcaram a Revolução expandiram-se por toda a Europa e mesmo a tentativa de restaurar o Antigo Regime, com o Congresso de Viena, mostrou-se efêmera e inviável. Não por acaso, a Revolução Francesa é a síntese do que se chama de crise do Antigo Regime. Resumindo Quer saber mais? Livro y HOBSBAWM, Eric. A Era das Revoluções: 1789-1848. Trad. de Marcus Penchel e Maria L. Teixeira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2009. Filmes y Danton – O processo da Revolução. Direção: Andrzej Wajda, 1982. Duração: 130 minutos. y Germinal. Direção: Claude Berri, 1993. Duração: 160 minutos. HISTÓRIA Capítulo 6 O fim do Antigo Regime e a montagem do mundo burguês178 1 Mackenzie Assinale a alternativa que corresponde à Primeira Revolução Industrial, ocorrida na Inglaterra a partir da segunda metade do século XVIII. A A consolidação do modo de produção capitalista estimulou a união entre o capital burguês e o trabalho operário. B Promoveu a passagem do capitalismo monopolista para a fase do capitalismo concorrencial-comercial. C As inovações tecnológicas possibilitaram melhorias nas condições de vida das classes populares e redução das jornadas de trabalho. D Os trabalhadores, destituídos dos meios de produção, passaram a sobreviver da venda da sua força de trabalho. E Introduziu, em massa, na indústria capitalista, métodos manuais de produção autônoma, devido às modificações tecnológicas. 2 UEMG 2018 Com base nos dois depoimentos e na imagem a seguir, considerando o que pode ser relacionado a essas fontes históricas, assinale a alternativa INCORRETA. “Eu tenho conhecimento de mais acidentes no início do dia do que no final. Eu fui, inclusive, testemunha de um deles. Uma criança estava trabalhando a lã, isto é, preparando a lã para a máquina, mas a alça a prendeu, como ela foi pega de surpresa, acabou sendo levada para dentro do mecanismo; e nós encontramos seus membros em um lugar, outro acolá, e ela foi cortada em pedaços; todo o seu corpo foi mandado para dentro e foi totalmente mutilado”. (John Allett começou a trabalhar em uma fábrica de têxteis quando tinha quatorze anos. Allett tinha cinquenta e três anos quando foi entrevistado por Michael Sadler e seu Comitê da Câmara dos Comuns, em 21 de maio de 1832.). “Os primeiros dias de setembro foram muito quentes. Os jornais noticiavam que homens e cavalos caiam mortos nos campos de produção agrícola. Ainda assim, a temperatura nunca passava de 29°C durante a parte mais quente do dia. Qual era então a situação das pobres crianças que estavam condenadas a trabalhar quatorze horas por dia, em uma temperatura média de 28°C? Pode algum homem, com um coração em seu peito e uma língua em sua boca, não se habilitar a amaldiçoar um sistema que produz tamanha escravidão e crueldade?” (William Cobbett fez um artigo sobre uma visita a uma fábrica de tecidos que aconteceu em setembro de 1824). Lewis Hine. Some of the young knitters in London Hosiery Mills. Londres, 1910. A Os trechos e a foto são associados ao trabalho infantil na Revolução Industrial, pois aproximadamente 50% dos tra- balhadores eram crianças que trabalhavam entre 12 e 16 horas por dia. Nas fábricas, as condições de trabalho eram precárias, pois não havia janelas e trabalhavam muitos operários, propagando-se as doenças mais facilmente. B Os trechos e a foto reforçam os aspectos negativos da Revolução Industrial, quando uma classe industrial nascente preferia empregar mulheres e crianças, pois estes recebiam metade do salário de um homem adulto, pela mesma carga horária. Contudo os aspectos positivos devem ser também ressaltados, mesmo porque essa situação foi modificada com máquinas adaptadas à altura das crianças, e a escola tornou-se obrigatória para o povo logo após o movimento ludista e o movimento cartista. Exercícios complementares F R E N T E 2 179 C Os depoimentos e a foto retratam o fato de que muitas crianças com menos de 8 anos trabalhavam nas fábricas simplesmente para ganhar alojamen- to e comida, sendo que havia uma alta jornada de trabalho em condições deploráveis. O longo tempode trabalho gerava cansaço nas crianças, o que acabava diminuindo o ritmo das atividades. Castigos, como socos e outras agressões, eram aplicados para punir a desatenção. As crianças que chegavam atrasadas ou que conversavam durante o trabalho também eram castigadas. D No início da Revolução Industrial, os operários vi- viam em péssimas condições de vida e trabalho. O ambiente das fábricas era insalubre, assim como os cortiços onde muitos trabalhadores viviam. As jor- nadas de trabalho chegavam a 80 horas semanais. Para mulheres e crianças, submetidas ao mesmo número de horas e às mesmas condições de traba- lho, os salários eram ainda mais baixos. 3 Vunesp O historiador David Landes, referindo-se à Re- volução Industrial, escreveu: O cerne dessa Revolução foi uma sucessão inter- -relacionada de mudanças tecnológicas. Os avanços materiais ocorreram em três áreas: (1) houve uma substituição das habilidades humanas por dispositivos mecânicos; (2) a energia de fonte inanimada – especial- mente a do vapor – tomou o lugar da força humana e animal; (3) houve uma melhora acentuada nos méto- dos de extração e transformação das matérias-primas, especialmente no que hoje se conhece como indústrias metalúrgicas e químicas. Prometeu desacorrentado. a) Qual foi o primeiro país a iniciar a industrialização com o uso tecnológico descrito pelo texto? b) Indique duas consequências da industrialização nos movimentos sociais e políticos europeus nos séculos XVIII e XIX. 4 UFMS 2019 Um dos eventos que mais influenciaram a história da humanidade nos últimos séculos foi a re- volução industrial. Esse acontecimento impulsionou a economia, a exploração do trabalho, o domínio de algumas nações sobre vastas regiões do mundo e acentuou a divisão entre os países dominantes e os que eram dominados. Assim, a revolução industrial movimentou não apenas a economia, mas também a sociedade, a produção artística e cultural e a po- lítica de toda uma época. Assinale a alternativa que caracteriza corretamente os primeiros momentos da revolução industrial e que tornaram a Inglaterra pio- neira no desenvolvimento de indústrias durante o século XVIII. A A Inglaterra, importante metrópole do século XVIII, possuía colônias na América do Norte, África e Ásia que favoreceram a exploração de matérias-primas e mão de obra, impulsionando o desenvolvimento de seu setor industrial. B A Inglaterra contava com um grande contingente de trabalhadores disponíveis, visto que a lei de cercamentos de terras desapropriou inúmeros camponeses, que passaram a atuar nas fábricas como trabalhadores e influenciaram decisivamen- te na divisão dos lucros e dos meios de produção, fatores que tornaram a Inglaterra uma grande po- tência industrial. C Caracterizada pela exploração do trabalho assa- lariado, a revolução industrial oferecia benefícios e estímulos para a população mais pobre (como ambiente salubre, jornadas de trabalho justas e salários que estimulavam a competitividade entre os trabalhadores fabris), e a burguesia industrial retroalimentava o sistema com o consumo inter- no, fortalecendo-o primeiro na Inglaterra para mais tarde estender suas redes de comércio com os de- mais países da Europa. D A mecanização do sistema de produção foi um fator determinante para que o sistema fabril de pro- dução superasse o sistema de manufaturas, aliado ao fato de que a Inglaterra contava com grandes reservas de carvão mineral e ferro para alimentar e produzir novas máquinas para a produção. E A organização da produção manufatureira inglesa foi fundamental para o desenvolvimento da revolução industrial, visto que essa produção de manufaturas passou a contar com máquinas e motores que subs- tituíram a divisão do trabalho e colaboraram para o acúmulo de lucro pelo detentor dos meios de produção. 5 Fuvest Seria mais correto chamarmos o Iluminismo de ideologia revolucionária [...] Pois o Iluminismo implicava a abolição da ordem política e social vigente na maior parte da Europa. Eric J. Hobsbawn. A Era das Revoluções, 1789-1848. Descreva a ordem política e social que o Iluminismo criticava e pretendia destruir. 6 Uerj 2019 Tudo que está escrito nas Sagradas Escrituras é verdade? De fato, cada uma das religiões diz: “Minha fé é a certa, e aqueles que creem em outra fé creem na falsidade e são inimigos de Deus”. Assim como minha fé me parece verdadeira, outro considera verdadeira sua própria fé; mas a verdade é uma só. Marido e mulher estão em pé de igualdade no ca- samento. Não podemos sair e comprar um homem como se fosse um animal. Todos os homens são iguais na presença de Deus; e todos são inteligentes, pois são suas criaturas; ele não destinou um povo à vida, outro à morte, um à misericórdia e outro ao julgamento. Nossa razão nos ensina que esse tipo de discriminação não pode existir. Adaptado de HERBJORNSRUD, Dag. “Os africanos que propuseram ideias iluministas antes de Locke e Kant”. Folha de S. Paulo, 24/12/2017. HISTÓRIA Capítulo 6 O fim do Antigo Regime e a montagem do mundo burguês180
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