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Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 1 de 26 Filosofia – Caderno 4 SEMANA 1: Racionalismo René Descartes (1596 – 1650) Filósofo e matemático francês, considerado por muitos o pai da filosofia moderna. Em seus escritos, reflete sobre o mundo renascentista e sobre as consequências da revolução científica que marca o século XVI. Procura estabelecer os fundamentos para um conhecimento seguro, fundado em parâmetros racionais e em bases matemáticas, rompendo com os preceitos escolásticos e criticando, por outro lado, os posicionamentos de pensadores céticos que emergem em sua época. Descartes é um dos expoentes mais importantes do Racionalismo, vertente filosófica que aponta ser o princípio de racionalidade o que faz com que o homem seja capaz de obter conhecimento sobre si mesmo e sobre o mundo. A razão seria mais confiável do que os sentidos em matéria de produzir um conhecimento seguro. Contudo, é preciso um método para guiar a razão. De outro modo, ela estaria sujeita a erros. Descartes procura, assim, firmar uma base segura para o desenvolvimento das ciências. Busca também legitimar a matemática. Dúvida metódica – Descartes assume a dúvida como método e busca aquilo de que não se pode duvidar (indubitável ou ideia clara e distinta) Há já algum tempo eu me apercebi de que, desde meus primeiros anos, recebera muitas falsas opiniões como verdadeiras, e de que aquilo que depois eu fundei em princípios tão mal assegurados não podia ser senão mui duvidoso e incerto; de modo que me era necessário tentar seriamente, uma vez em minha vida, desfazer-me de todas as opiniões a que até então dera crédito, e começar tudo novamente desde os fundamentos, se quisesse estabelecer algo de firme e de constante nas ciências. Mas, parecendo-me ser muito grande essa empresa, aguardei atingir uma idade que fosse tão madura que não pudesse esperar outra após ela, na qual eu estivesse mais apto para executá-la; o que me fez diferi-Ia por tão longo tempo que doravante acreditaria cometer uma falta se empregasse ainda em deliberar o tempo que me resta para agir. (René Descartes – Meditações Metafísicas) “Meditações Metafísicas” (obra publicada em 1641) Busca uma base inicial segura para o conhecimento. Crítica ao ceticismo vigente, que duvidava de qualquer possibilidade de se definir verdades. Ao mesmo tempo, vale-se das próprias indagações céticas, submetendo suas crenças e antigas opiniões a uma análise rigorosa em busca pelo conhecimento seguro e indubitável. Afirma que aceitará como verdade apenas aquilo que conseguir sobreviver a qualquer dúvida. Duvida sistematicamente da tradição, dos sentidos, da realidade exterior, da matemática até chegar à primeira verdade segura: Cogito ergo sum. Em um momento significativo de sua primeira meditação, apresenta o que se costuma chamar de dúvida hiperbólica: argumento do gênio maligno, uma ferramenta de radicalização de seu método, com o intuito de fortalecer os critérios que demonstrem evidência. Qualquer indício de dúvida, mesmo algo que pareça absurdo à primeira vista, deve servir para que uma ideia seja descartada. Cogito – Penso, logo existo: garante a existência de um ser que pensa, mas não necessariamente um mundo exterior ao pensamento. Descartes dividiu a realidade em res conngitans (consciência e mente) e res extensa (corpo e matéria). Para ele, o pensamento é mais evidente do que a matéria, uma vez que é mais fácil comprovar o mundo imaterial do que o mundo material, algo constatado nas meditações filosóficas que o conduzem à sua primeira certeza, o COGITO. Assim como Platão, Descartes acredita na existência de certas ideias inatas. Uma desses seria a noção da existência de Deus. Ele afirma: “eu não teria a ideia de uma substância infinita e perfeita se ela não tivesse sido colocada em mim por uma substância verdadeiramente infinita e perfeita”. Deus, assim, é parte importante do sistema filosófico de Descartes, uma vez que é a existência de Deus que rompe com a hipótese do gênio maligno e garante a existência do mundo material. Argumento Mecanicista Descartes acreditava que o mundo físico operava como uma máquina, assim como as diferentes engrenagens produzidas pelo homem, tal como um relógio, por exemplo. No relógio, uma coisa funciona em função da outra e os mecanismo interagem entre si, o que pode originar dinâmicas complexas. Assim ele acreditava ser o funcionamento do mundo, que era visto por Descartes como um mecanismo bastante complexo. Um dos caminhos para se compreender um mecanismo complexo seria desmembrá-lo em partes mais simples, que é o que ele apresenta em sua obra Discurso do Método. “Discurso do Método” (publicado em 1637) Questiona o conhecimento até então adquirido e assume a racionalidade como o atributo fundamental do homem, que pode garantir o conhecimento seguro, desde que guiada por um método. As 4 regras do método: 1. jamais aceitar como verdadeira uma coisa que não se soubesse ser evidentemente como tal; 2. dividir as dificuldades em níveis, de acordo com a complexidade; 3. ir do pensamento mais simples ao mais complexo; 4. enumerar e revisar para nada omitir. “ (...) porque nossos sentidos nos enganam às vezes, quis supor que não havia coisa alguma que fosse tal como eles nos fazem imaginar. E, porque há homens que se equivocam ao raciocinar, mesmo no tocante às mais simples matérias da Geometria, e cometem aí paralogismos, rejeitei como falsas, julgando que estava sujeito a falhar como qualquer outro, todas as razões que eu tomara até então por demonstrações. E enfim, considerando que todos os mesmos pensamentos que temos quando despertos nos podem também ocorrer quando dormimos, sem que haja nenhum, nesse caso, que seja verdadeiro, resolvi fazer de conta que todas coisas que até então haviam entrado no meu espírito não eram mais verdadeiras que as ilusões de meus sonhos.” DESCARTES, Discurso do método. São Paulo: Nova Cultural, 1987 – p.25. Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 2 de 26 Exercícios 1. (Ufsc 2019) No que se refere à obra Meditações Metafísicas de Descartes, é correto afirmar que: 01) os sentidos corpóreos são enganadores e, portanto, não são confiáveis para a obtenção de conhecimento. 02) só é possível distinguir o sono da vigília com o auxílio do gênio maligno. 04) não é possível adquirir conhecimento, portanto só nos resta aceitar o ceticismo. 08) Deus não existe, de modo que a melhor posição em filosofia é o ateísmo. 16) a dúvida metódica não se deve aplicar às verdades matemáticas. 32) a expressão “eu sou, eu existo” é a primeira certeza da filosofia cartesiana. 64) Deus existe, e tal verdade pode ser provada pela ideia que temos de Deus como um ser perfeito e pela constatação de que sua inexistência implicaria uma imperfeição. 2. (Uel 2019) Leia o texto a seguir. E se escrevo em francês, que é a língua de meu país, e não em latim, que é a de meus preceptores, é porque espero que aqueles que se servem apenas de sua razão natural inteiramente pura julgarão melhor minhas opiniões do que aqueles que não acreditam senão nos livros dos antigos. E quanto aos que unem o bom senso ao estudo, os únicos que desejo para meus juízes, não serão de modo algum, tenho certeza, tão parciais a favor do latim que recusem ouvir minhas razões, porque as explico em língua vulgar. DESCARTES, R. Discurso do Método. Trad. J. Guinsburg e Bento Prado Jr. São Paulo: Abril Cultural, 1973. Coleção “Os pensadores”. p. 79. Com base nos conhecimentos sobre Descartes e o surgimento da filosofia moderna, assinale a alternativa correta. a) A língua vulgar, o francês, expressa de modo mais adequado o espírito da modernidade por estar livre dos preconceitos da língua dos doutos, o latim. b) Redigir o Discurso do Método em francês teve propósitosimilar à tradução da bíblia para o alemão feita por Lutero: facilitar o acesso à sacralidade do texto em língua vulgar. c) O desencantamento do mundo, resultante da radical crítica cartesiana à tradição, teve como consequência o abandono da referência à divindade. d) As ideias expressas por Descartes em seu Discurso do Método refletem a postura tipicamente moderna de ruptura total com o passado. e) A razão natural inteiramente pura é um atributo inerente à natureza humana, independentemente da tradição ou da cultura à qual o humano se vincula. 3. (Enem 2018) O século XVIII é, por diversas razões, um século diferenciado. Razão e experimentação se aliavam no que se acreditava ser o verdadeiro caminho para o estabelecimento do conhecimento científico, por tanto tempo almejado. O fato, a análise e a indução passavam a ser parceiros fundamentais da razão. É ainda no século XVIII que o homem começa a tomar consciência de sua situação na história. ODALIA, N. In: PINSKY, J.; PINSKY. C. B. História da cidadania. São Paulo: Contexto. 2003. No ambiente cultural do Antigo Regime, a discussão filosófica mencionada no texto tinha como uma de suas características a) aproximação entre inovação e saberes antigos. b) conciliação entre revelação e metafísica platônica. c) vinculação entre escolástica e práticas de pesquisa. d) separação entre teologia e fundamentalismo religioso. e) contraposição entre clericalismo e liberdade de pensamento. 4. (Unesp 2018) De um lado, dizem os materialistas, a mente é um processo material ou físico, um produto do funcionamento cerebral. De outro lado, de acordo com as visões não materialistas, a mente é algo diferente do cérebro, podendo existir além dele. Ambas as posições estão enraizadas em uma longa tradição filosófica, que remonta pelo menos à Grécia Antiga. Assim, enquanto Demócrito defendia a ideia de que tudo é composto de átomos e todo pensamento é causado por seus movimentos físicos, Platão insistia que o intelecto humano é imaterial e que a alma sobrevive à morte do corpo. (Alexander Moreira-Almeida e Saulo de F. Araujo. “O cérebro produz a mente?: um levantamento da opinião de psiquiatras”. www.archivespsy.com, 2015.) A partir das informações e das relações presentes no texto, conclui-se que a) a hipótese da independência da mente em relação ao cérebro teve origem no método científico. b) a dualidade entre mente e cérebro foi conceituada por Descartes como separação entre pensamento e extensão. c) o pensamento de Santo Agostinho se baseou em hipóteses empiristas análogas às do materialismo. d) os argumentos materialistas resgatam a metafísica platônica, favorecendo hipóteses de natureza espiritualista. e) o progresso da neurociência estabeleceu provas objetivas para resolver um debate originalmente filosófico. 5. (Enem 2016) Nunca nos tornaremos matemáticos, por exemplo, embora nossa memória possua todas as demonstrações feitas por outros, se nosso espírito não for capaz de resolver toda espécie de problemas; não nos tornaríamos filósofos, por ter lido todos os raciocínios de Platão e Aristóteles, sem poder formular um juízo sólido sobre o que nos é proposto. Assim, de fato, pareceríamos ter aprendido, não ciências, mas histórias. DESCARTES. R. Regras para a orientação do espírito. São Paulo: Martins Fontes, 1999. Em sua busca pelo saber verdadeiro, o autor considera o conhecimento, de modo crítico, como resultado da a) investigação de natureza empírica. b) retomada da tradição intelectual. c) imposição de valores ortodoxos. d) autonomia do sujeito pensante. e) liberdade do agente moral. 6. (Ufu 2010) Em O Discurso sobre o método, Descartes afirma: Não se deve acatar nunca como verdadeiro aquilo que não se reconhece ser tal pela evidência, ou seja, evitar acuradamente a precipitação e a prevenção, assim como nunca se deve Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 3 de 26 abranger entre nossos juízos aquilo que não se apresente tão clara e distintamente à nossa inteligência a ponto de excluir qualquer possibilidade de dúvida. (REALE, G.; ANTISERI, D. História da filosofia: Do humanismo a Descartes. Tradução de Ivo Storniolo. São Paulo: Paulus, 2004. p. 289.) Após a leitura do texto acima, assinale a alternativa correta. a) A evidência, apesar de apreciada por Descartes, permanece uma noção indefinível. b) A evidência é a primeira regra do método cartesiano, mas não é o princípio metódico fundamental. c) Ideias claras e distintas são o mesmo que ideias evidentes. d) A evidência não é um princípio do método cartesiano. 7. (Uel 2010) Observe a tira e leia o texto a seguir: Mas há um enganador, não sei quem, sumamente poderoso, sumamente astucioso que, por indústria, sempre me engana. Não há dúvida, portanto, de que eu, eu sou, também, se me engana: que me engane o quanto possa, nunca poderá fazer, porém, que eu nada seja, enquanto eu pensar que sou algo. De sorte que, depois de ponderar e examinar cuidadosamente todas as coisas é preciso estabelecer, finalmente, que este enunciado eu, eu sou, eu, eu existo é necessariamente verdadeiro, todas as vezes que é por mim proferido ou concebido na mente. (DESCARTES, R. Meditações sobre Filosofia Primeira. Tradução, nota prévia e revisão de Fausto Castilho. Campinas: Unicamp, 2008, p. 25.) Com base na tira e no texto, sobre o cogito cartesiano, é correto afirmar: a) A existência decorre do ato de aparecer e se apresenta independente da essência constitutiva do ser. b) A existência é manifesta pelo ato de pensar que, ao trazer à mente a imagem da coisa pensada, assegura a sua realidade. c) A existência é concebida pelo ato originário e imaginativo do pensamento, o qual impede que a realidade seja mera ficção. d) a existência é a plenitude do ato de exteriorização dos objetos, cuja integridade é dada pela manifestação da sua aparência. e) A existência é a evidência revelada ao ser humano pelo ato próprio de pensar. 8. (ENEM) Após ter examinado cuidadosamente todas as coisas, cumpre enfim concluir e ter por constante que esta proposição, eu sou, eu existo, é necessariamente verdadeira todas as vezes que a enuncio ou que a concebo em meu espírito. DESCARTES, R. Meditações. Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979. A proposição “eu sou, eu existo” corresponde a um dos momentos mais importantes na ruptura da filosofia do século XVII com os padrões da reflexão medieval, por a) estabelecer o ceticismo como opção legítima. b) utilizar silogismos linguísticos como prova ontológica. c) inaugurar a posição teórica conhecida como empirismo. d) estabelecer um princípio indubitável para o conhecimento. e) questionar a relação entre a Filosofia e o tema da existência de Deus. 9. (Unioeste 2011) Considerando-se as primeiras linhas das Meditações sobre a filosofia primeira de René Descartes: “Há já algum tempo dei-me conta de que, desde meus primeiros anos, recebera muitas falsas opiniões por verdadeiras e de que aquilo que depois eu fundei sobre princípios tão mal assegurados devia ser apenas muito duvidoso e incerto; de modo que era preciso tentar seriamente, uma vez em minha vida, desfazer-me de todas as opiniões que recebera até então em minha crença e começar tudo novamente desde os fundamentos, se eu quisesse estabelecer alguma coisa de firme e de constante nas ciências. (...) Agora, pois, que meu espírito está livre de todas as preocupações e que obtive um repouso seguro numa solidão tranquila, aplicar- me-ei seriamente e com liberdade a destruir em geral todas as minhas antigas opiniões” É correto afirmar sobre a teoria do conhecimento cartesiana que a) Descartes não utiliza um método ou uma estratégia para estabelecer algo de firme e certo no conhecimento,já que suas opiniões antigas eram incertas. b) Descartes considera que não é possível encontrar algo de firme e certo nas ciências, pois até então esse objetivo não foi atingido. c) Descartes, ao rejeitar o que a tradição filosófica considerou como conhecimento, busca fundamentar nos sentidos uma base segura para as ciências. d) ao investigar uma base firme e indestrutível para o conhecimento, Descartes inicia rejeitando suas antigas opiniões e utiliza o método da dúvida até encontrar algo de firme e certo. e) Descartes necessitou de solidão para investigar as suas antigas opiniões e encontrar entre elas aquela que seria o verdadeiro fundamento do conhecimento. 10. (Uel 2012) Leia o texto a seguir. Mas há algum, não sei qual, enganador mui poderoso e mui ardiloso que emprega toda sua indústria em enganar-me sempre. Não há, pois, dúvida alguma de que sou, se ele me engana; e, por mais que me engane, não poderá jamais fazer Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 4 de 26 com que eu nada seja, enquanto eu pensar ser alguma coisa. De sorte que, após ter pensado bastante nisto e de ter examinado cuidadosamente todas as coisas, cumpre enfim concluir e ter por constante que esta proposição, eu sou, eu existo, é necessariamente verdadeira todas as vezes que a enuncio ou que a concebo em meu espírito. (DESCARTES, René. Meditações. Trad. J. Guinsburg e Bento Prado Júnior. São Paulo: Abril Cultural, 1973. p.100 - Coleção Os Pensadores.) A partir do texto e dos conhecimentos acerca de Descartes: a) Apresente o propósito e os graus da dúvida metódica. b) Demonstre como Descartes descobre que o pensamento é a verdade primeira. Gabarito: 1. 01+32+64=97 2.E 3.E 4.B 5.D 6.C 7.E 8.D 9.D SEMANA 2: Introdução à sociologia brasileira (parte I) “Fracassei na maioria das propostas que defendi. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu” Darcy Ribeiro A Sociologia no Brasil Na Europa, a Sociologia tem seu início formal quando, em meados do século XIX, Auguste Comte propõe um método voltado para a elaboração científica do pensamento social, o que atribui à nova ciência um considerável grau de autonomia em relação à Filosofia Social, fundamental para seu desenvolvimento posterior. O foco da Sociologia é compreender a sociedade industrial moderna, caracterizada pelo modo de produção capitalista. No Brasil, há uma relação direta entre a formação do pensamento sociológico e o complexo processo de formação da consciência nacional, isso porque a identidade nacional do país vincula-se a um processo histórico de colonização e implantação da cultura europeia, promovido especialmente pelos jesuítas. “Imbuídos do espírito da catequese contrarreformista, os jesuítas trouxeram a filosofia universalista e a escolástica. Promoveram o tupi à condição de língua geral, popular, ao lado do latim e do português. Introduziram um sistema misto de exploração do trabalho indígena que, combinado com o ensino religioso, quase aniquilou, aos poucos, a cultura nativa. Assim, a catequese e a evangelização foram um importante instrumento de colonização.” (COSTA, Cristina. Sociologia: Introdução à Ciência da Sociedade. Ed. Moderna, p. 300) No século XVIII, com a mineração, e, posteriormente, no início do século XIX, com a vinda da família real portuguesa para o Brasil, a sociedade brasileira começa a se urbanizar e a população livre passa a ser, pela primeira vez, mais numerosa do que a escrava. Há um forte desenvolvimento nas artes, com o Barroco, mas na produção científica o conhecimento era ainda insignificante. Ao longo do século XIX há alguns “estudos naturalistas” sobre o Brasil e o romantismo se desenvolve na literatura. Muito embora a nação emergisse como tema e como objeto de análise na produção artística da época, os modelos eram estrangeiros e na maioria das vezes isentos de caráter crítico ou reflexivo. Somente no final do século XIX, quando a sociedade começa a se modernizar, especialmente nos centros urbanos, é que a literatura realista começa a explorar a crítica social, como, por exemplo, na obra de Machado de Assis. O livro “Os Sertões”, de Euclides da Cunha, que se propõe a analisar de modo denso e completo a Guerra de Canudos, no interior da Bahia, é considerado por muitos uma obra inaugural do pensamento sociológico no Brasil. O autor, que como muitos de sua época era influenciado pelo Determinismo (corrente cientificista que acreditava que o ser humano é produto do meio ambiente, da raça e do contexto histórico), defendia, a princípio, o “embranquecimento dos brasileiros” e criticava a miscigenação racial. Euclides da Cunha manifesta essa perspectiva no seguinte trecho: "Intentamos esboçar, palidamente embora, ante o olhar de futuros historiadores, os traços atuais mais expressivos das sub-raças sertanejas do Brasil. E fazemo-lo porque a sua instabilidade de complexos, aliada às vicissitudes históricas e deplorável situação mental em que jazem, as tornam talvez destinadas a próximo desaparecimento ante as exigências crescentes da civilização." (CUNHA, Euclides da. Os Sertões, Campanha de Canudos.) Contudo, após passar algum tempo vivendo junto à comunidade de Canudos, o próprio autor modifica sua visão e aos poucos abandona o determinismo. Com isso, temos em “Os Sertões” uma obra complexa, permeada por contradições, mas que explicita (de modo literário, jornalístico e historiográfico) o conflito de uma sociedade dividida entre o universo das cidades litorâneas e o do interior agrário e tradicional. Contradição semelhante permeia a obra literária, também inserida no contexto pré-modernista, de Monterio Lobato. Segundo Zinda Vasconcelos, em “O universo ideológico da obra infantil de Monteiro Lobato”: Francamente eugenista, a trama urdida por Lobato em O choque, onde a inteligência dos brancos acabava vencendo, vem destacar posições ambíguas Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 5 de 26 no escritor. Mas, se neste livro ele abraça ideias acerca da superioridade racial, em outros momentos resgata o elemento de origem africana e reconhece seu papel na cultura brasileira – como na caracterização de Tia Nastácia e tio Barnabé – personagens do sítio do Pica-Pau Amarelo representantes do saber popular. E tampouco se esquiva em denunciar as crueldades do escravismo, conforme se pode constatar no conto Negrinha. A falta de homogeneidade da população brasileira era alvo das críticas do pensamento internacional ao mesmo tempo em que se disseminava no Brasil no final do século XIX. Aquela população “sem forma”, misturada, mestiça era incompatível com qualquer projeto de nação. O Brasil era visto, então, como “uma nação sem povo”, pois não havia algo de homogêneo que pudesse definir ou caracterizar sua população. Proliferavam na época teses deterministas e positivistas, que contribuíam para que a miscigenação racial fosse vista como algo extremamente negativo. Tais teses estavam ligadas a estudos sobre raça e eugenia, que influenciavam muitos acadêmicos no final do século XIX. Era comum que o pensamento internacional analisasse de modo pejorativo o povo brasileiro, tal como no seguinte trecho, escrito pelo suíço Louis Agassiz, que relata sua viagem pelo Brasil: “O resultado natural do contato ininterrupto de mestiços entre eles é uma classe de homens em que tipos puros desaparecem quase totalmente, assim como as boas qualidades, físicas e morais, das raças primitivas, engendrando uma multidão sem raça tão repulsiva quanto os cães vira-latas, que estão aptos para serem companheiros e entre os quais é impossível escolher um único espécime que tenha a inteligência, a nobreza ou a afetividade natural que faz do cachorro de raça pura o companheiro favorito do homem civilizado. (...) Que qualquer um que duvidedo mal da mistura de raças e está inclinado, por uma falsa filantropia, a quebrar com as barreiras entre elas, vá ao Brasil. Não pode aí negar a deterioração resultante de uma amálgama de raças, mais difundida aqui do que em qualquer outro país do mundo, que apaga rapidamente as melhores qualidades do branco, do negro e do índio, deixando um tipo sem descrição nem raça, débil em termos físicos e mentais”. A Semana de Arte Moderna, em 1922, representa o início de uma busca por algo que rompesse com a preponderância das análises deterministas e positivistas que tratavam de modo pejorativo a miscigenação racial e que possibilitasse, assim, unificar todo esse conjunto de pessoas no país de uma forma singular, propriamente brasileira, de modo a definir o Brasil como cultura e civilização. Quando os modernistas inauguraram a Semana de 22, o Brasil era um país agrário, não industrializado e governado pela oligarquia do café. E mesmo a cidade de São Paulo sendo muito mais desenvolvida, (também mais cosmopolita, mais próxima das tendências europeias do que as demais cidades do país) as propostas dos modernistas não deixavam de estar distantes de sua realidade, de ser chocantes demais para o contexto. O modernismo no Brasil é um rompimento com o atraso do país. Propõe uma estética nova, de vanguarda, para um pensamento novo sobre o Brasil. A cidade de São Paulo passa por profundas modificações nas primeiras décadas do século XX. Os modernistas observaram a industrialização crescente e a importância gradativa que iam adquirindo os centros urbanos. Falando de progresso, de modernidade, eles pretendiam dar um grito de independência contra o atraso cultural do país. Inspirados nas linguagens das vanguardas européias, que revolucionaram a arte do período, buscavam romper com as tradições acadêmicas da arte no Brasil (tradições importadas da Europa) e, ao mesmo tempo, valorizar as marcas autenticamente brasileiras. Apesar da modernidade destacar uma nova realidade a ser pensada e retratada, o Brasil (apesar das marcas do progresso que começavam a aparecer na cidade de São Paulo) permanecia pouco desenvolvido, atrasado culturalmente, com um povo que carecia, segundo os relatos da época, de uma identidade própria. A Semana de Arte Moderna de 1922 pretendia colocar a cultura brasileira a par das correntes de vanguarda do pensamento europeu, ao mesmo tempo em que pregava a tomada de consciência da realidade brasileira, buscando inseri-la em um processo de civilização e adequação à contemporaneidade. A Semana de 22 detona um processo de transformação estética, reunindo propostas renovadoras que se defrontam com as tradições acadêmicas. O período que prossegue, de 1922 a 1930, é um período rico em manifestos e revistas que buscam definições e debatem questões do modernismo no país. O Movimento Antropofágico, que surge com o Manifesto Antropofágico, escrito por Oswald de Andrade em 1928, nasce como uma nova etapa do nacionalismo pau- brasil, sob a inspiração da tela de Tarsila do Amaral que Oswald batizou de Abaporu, que significa, em Tupi, homem que come. Essa tela deu nome ao movimento cuja proposta principal era que houvesse uma incorporação de vários elementos, tanto nativos quanto civilizadores, na formação de uma identidade cultural brasileira. Nessa perspectiva, os modernistas dão um importante passo reconstruindo a temática da identidade brasileira a partir de novas linguagens artísticas. Abaporu, Tarsila do Amaral – 1928. Se a Semana de 22 representa o primeiro passo do pensamento brasileiro no século XX, as obras “Casa Grande & Senzala”, de Gilberto Freyre, e “Raízes do Brasil”, de Sérgio Buarque, representam os passos seguintes. O fato é que a proclamação da República não havia criado uma nação brasileira, com uma sociabilidade específica. Que país era o Brasil? Como era o seu povo? Quais suas peculiaridades? Já era uma República e então se via forçosamente inserido na modernidade através de um processo civilizatório complexo e comandado pelas elites. Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 6 de 26 A GERAÇÃO DE 1930 Embora possamos dizer que havia alguma formulação sociológica no Brasil do final do século XIX, vinculada sobretudo ao pensamento de Euclides da Cunha, a Sociologia propriamente dita, autônoma e produzida num ambiente acadêmico, remete à década de 1930, com a fundação da Universidade de São Paulo e o aumento da produção científica. Em 1931 a Sociologia torna-se disciplina obrigatória no ensino médio. Os principais expoentes de uma geração de intelectuais que desponta na década de 30 são: Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Caio Prado Jr. Dentre as principais características do pensamento da época, podemos citar o interesse por analisar o Brasil de um modo não eurocêntrico, o nacionalismo como sentimento capaz de consolidar uma identidade brasileira e a valorização das abordagens científicas, inspiradas em teorias sociológicas e antropológicas produzidas na Europa e nos Estados Unidos. Casa Grande & Senzala, de Gilberto Freyre O passo dado pelos modernistas na Semana de 22 é seguido pela elaboração da primeira grande obra teórica que se volta para pensar a cultura e a sociabilidade brasileira. Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freyre, é uma obra pioneira para a Sociologia do país. Gilberto de Mello Freyre (1900 – 1987) nasceu e morreu no Recife. Sua obra é influenciada pela Antropologia culturalista de Franz Boas, pensador com o qual teve contato em sua pós- graduação na universidade Columbia, nos EUA, e também por análises da história do Brasil, sobretudo em seus aspectos mais cotidianos, que ele absorve inclusive de sua memória pessoal e de evocação de registros do seu passado, por meio de relatos familiares. Sua narrativa “romanceada” muitas vezes parece avessa à busca por rigor científico. Contudo, eis um dos traços fundamentais de seu estilo, descrito por muito estudiosos como “romance (ou saga) da história do Brasil”. Para Gilberto Freyre, todo o brasileiro, mesmo o alvo de cabelo louro, traz consigo, na alma ou no corpo, elementos incorporados dos indígenas e dos negros. Assim, ser brasileiro significa ser mesmo misturado. O português, por conta de uma disposição cultural, é um povo que gosta de se misturar. Freyre busca a origem desse comportamento na história de Portugal. Surge, já nessa primeira visualização da obra, uma interpretação para o Brasil. Ambos, indígenas, negros e brancos, contribuíram de forma significativa na formação do povo brasileiro. A cultura brasileira nasce, então, na miscigenação de elementos, e essa falta de homogeneidade não é algo prejudicial a um processo civilizatório, não significa a ausência de singularidade. Pelo contrário, Freyre atribui características comuns a todos os brasileiros. A partir de sua obra podemos reconhecer uma cultura peculiar de nosso país. Assim, podemos dizer que ele desenvolve uma tese sobre a formação da sociabilidade brasileira. Segundo Gilberto Freyre, nossa cultura nasce na esfera privada, nas relações cotidianas de família, no ambiente da casa grande. O negro aparece como importante elemento civilizatório, talvez o mais importante. A narrativa de Freyre é bastante rigorosa e detalhista, ao mesmo tempo, é como se ele estivesse contando uma história. “Na ternura, na mímica excessiva, no catolicismo em que se deliciam nossos sentidos, na música, no andar, na fala, no canto de ninar menino pequeno, em tudo que é expressão sincera de vida, trazemos quase todos a marca da influência negra. Da escrava sinhama que nos embalou. Que nos deu de mamar. Que nos deu de comer, ela própria amolegando na mão o bolão de comida. Da negra velha que nos contou as primeiras histórias de bicho e mal assombrado. Da mulata que nos tirou o primeiro bicho de pé de uma coceira tão boa. Da que nos iniciou no amor físico e nos transmitiu, ao ranger da cama-de-vento,a primeira sensação completa de homem. Do moleque que foi nosso primeiro companheiro de brinquedo” (Gilberto Freyre, Casa Grande e Senzala, pg. 331). Os negros, ao adentrarem na vida doméstica, imprimem sua cultura. As histórias portuguesas sofrem alterações ao passarem pela boca das negras, as velhas amas-de-leite. A linguagem infantil também se modifica no contato com as amas negras. Sem contar os hábitos alimentares, de higiene, que foram também bastante influenciados. Como vemos, a figura negra feminina tem uma importância fundamental na formação da sociabilidade brasileira. Ela adentra o ambiente doméstico e passa a fazer parte do cotidiano da família patriarcal. É na casa grande que o escravo pode manifestar sua cultura, pois não está oprimido no trabalho. É esse escravo que molda e influencia a cultura brasileira. O nascer da civilização brasileira se dá no seio da família, a sociabilidade surge nas relações de dominação, que se alternam com momentos de doçura, e que constituem o espaço privado da grande família. Assim, a relação senhor/escravo é um eixo explicativo da formação social brasileira. Essa relação de hierarquia e dominação é marcada pelo uso da violência. As relações familiares como um todo eram marcadas pela violência. Segundo Gilberto Freyre, a proximidade corporal pressupõe excessos de autoridade quanto ao corpo alheio: o despotismo dos pais, a agressão de senhores a seus escravos, a crueldade das senhoras com as escravas, dos meninos com os moleques de brinquedo. Ao mesmo tempo, a família patriarcal era bastante coesa. Na perspectiva de Freyre, as relações entre senhores e escravos também eram marcadas pela proximidade e pela doçura, como podemos claramente perceber através do trecho citado anteriormente. Os escravos domésticos fazem parte da vida afetiva da grande família, assim como da vida sexual, em muitos casos. As relações dos senhores com seus escravos, apesar de serem hierárquicas, não eram, para ele, unilaterais. E por isso os escravos tanto contribuíram para nossa formação cultural; também porque, segundo Freyre, o senhor português Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 7 de 26 não tinha consciência racial, o que permitiu ao negro imprimir sua cultura no Brasil. Com tudo isso, Freyre desmistifica a idéia da inferioridade mental do negro e dos povos miscigenados que proliferavam nas análises deterministas e positivistas da época. “(...) Dentro da orientação e dos propósitos deste ensaio, interessam-nos menos as diferenças de antropologia física (que não explicam inferioridades ou superioridades humanas, quando transportadas dos termos de hereditariedade e família para os termos de raça), que as de antropologia cultural e história social africana” (idem, pg.349). Em seu trabalho, procurou deixar de lado categorias como raça, natureza e determinismo do meio, e tentou interpretar o Brasil a partir da noção de cultura. A tese de Freyre quanto às contribuições equilibradas de negros e brancos ao patrimônio cultural brasileiro, e mesmo quanto à convivência supostamente harmônica no ambiente doméstico, permitiu que ele fosse interpretado a partir da ideia de democracia racial. O autor é visto como o criador desse mito da democracia racial, de que negros e brancos convivem no Brasil em harmonia, de que aqui não existe racismo, o que posteriormente foi criticado por diversos autores que pensaram as questões raciais e os problemas de conscientização racial no Brasil. Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque Gilberto Freyre demonstra ter saudades do período colonial, da voz suave da “ama-negra a nos embalar, daquela coceira tão boa, quando a mulata tirava de nós o bicho-de-pé”. A sociabilidade que nasce na esfera privada, que surge entre senhores e escravos, possibilita a constituição de relações de proximidade e troca de afinidades. Gilberto Freyre identifica a lógica privatista de nossa sociedade. Sérgio Buarque, por sua vez, aprofunda a questão da proeminência da vida privada no Brasil, entretanto, não adota um tom saudosista, volta-se para o futuro, está preocupado com o processo de modernização e com o desenvolvimento democrático no Brasil. Ao contrário de Gilberto Freyre, Sérgio Buarque não tinha uma formação antropológica etnológica, também não estava preocupado com a narrativa. Sua preocupação maior era criar tipos ideais que caracterizassem a sociedade brasileira. Fortemente influenciado por Weber, sua obra se aproxima mais da Sociologia da época, apesar dele não ter formação em Sociologia. Com uma visão bastante apurada da formação colonial brasileira, Sérgio Buarque publica a obra Raízes do Brasil em 1936. Nela, identifica em nossa trajetória cultural os fundamentos de uma ordem patrimonialista que dificulta o desenvolvimento civil e democrático do Brasil. As raízes coloniais brasileiras são, para o historiador e sociólogo, contrárias à constituição de um espaço público em que predominem as regras racionais e a aceitação da lei como medida de justiça e equidade. Há no Brasil, por conta de um processo histórico em que os valores privados prevalecem sobre os públicos, uma dificuldade em se criar regras impessoais, fundadas no mercado e de se constituir um espaço público regido por uma lógica racional. Para Sérgio Buarque, essa raiz patrimonialista precisa ser quebrada para que haja um desenvolvimento democrático, para que o país se modernize. A formação colonial brasileira foi feita por um colonizador que não desejava constituir uma sociedade. O tipo ideal de colonizador que predominava era o do aventureiro, um tipo movido pelas paixões, avesso a uma noção de riqueza constituída a partir do trabalho, alguém que se apropria dos recursos para garantir sua própria sobrevivência. O modelo do aventureiro se opõe, portanto, ao tipo ideal do trabalhador, que procura se estabilizar e planeja objetivos longínquos. Sérgio Buarque identifica a cultura ibérica ao favorecimento da esfera privada. As raízes aventureiras de nossa colonização favorecem a lógica privatista que predomina em nossa sociedade. A ideia da não-racionalidade do brasileiro destaca-se por meio da figura do homem cordial. O homem cordial é o tipo ideal que personifica a tese de Sérgio Buarque, pois marca as relações de hierarquia e troca de favores presentes no espaço público. O homem cordial cultua valores como hospitalidade, generosidade, entretanto, é antagônico a qualquer manifestação de autoridade social que seja coercitiva à sua pessoa. Sua lógica é personalista. Apesar de não tolerar coerção social, reconhece o êxito de conviver entre as hierarquias, usando as regras a seu proveito. Essa lógica de socialização que predomina no homem cordial é oriunda de uma cultura que nasce na esfera privada, no seio da família patriarcal, e que também se funda na não- racionalidade do colonizador português, em sua atitude de aventureiro. Segundo Sérgio Buarque, a família foi sem dúvida a instituição que mais se destacou em nossa sociedade. As relações criadas na esfera doméstica sempre ofereceram o modelo obrigatório de qualquer composição social entre nós. A dificuldade de adaptação dos indivíduos no mecanismo social se deve especialmente ao triunfo de virtudes familiares, de ordem privatista. Sérgio Buarque evoca, em sua obra, um comportamento racional moderno, está preocupado com a modernização política do país. Segundo ele, onde predomina o Estado deve ser abolida a ordem familiar, deve haver um triunfo da lei em detrimento do que é doméstico, o indivíduo deve tornar-se cidadão. Entretanto, no Brasil, como vimos, o Estado republicano convive com valores privatistas próprios de uma ordem familiar. Esses valores são um obstáculo à democracia, não permitem que o indivíduo deixe de ser uma expressão da coletividade familiar e torne-se um cidadão. A cordialidade brasileira é fruto de uma lógica privada, sustentada em hierarquias. A elitebrasileira carrega o coletivo-familiar, carrega a lógica do privilégio, carrega o autoritarismo. Sérgio Buarque vê a sociedade brasileira como uma sociedade autoritária que, por ser patrimonialista e atribuir importância Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 8 de 26 fundamental ao prestígio, não consegue cultuar valores democráticos. Até hoje podemos identificar a sociedade brasileira com uma sociedade que passou por um processo de modernização, mas que permanece conservadora, com dificuldade de criar uma sociabilidade pública. Implantar a sociedade civil não significa implantar civilidade e cidadania, uma democracia requer uma sociedade democrática e ações políticas mediadas pelas leis e pelos costumes republicanos. Exercícios: 01. (ENEM 2004) A questão étnica no Brasil tem provocado diferentes atitudes: I. Instituiu-se o “Dia Nacional da Consciência Negra” em 20 de novembro, ao invés da tradicional celebração do 13 de maio. Essa nova data é o aniversário da morte de Zumbi, que hoje simboliza a crítica à segregação e à exclusão social. II. Um turista estrangeiro que veio ao Brasil, no carnaval, afirmou que nunca viu tanta convivência harmoniosa entre as diversas etnias. Também sobre essa questão, estudiosos fazem diferentes reflexões: “Entre nós [brasileiros], (…) a separação imposta pelo sistema de produção foi a mais fluida possível. Permitiu constante mobilidade de classe para classe e até de uma raça para outra. Esse amor, acima de preconceitos de raça e de convenções de classe, do branco pela cabocla, pela cunhã, pela índia (…) agiu poderosamente na formação do Brasil, adoçando-o.” (Gilberto Freyre. O mundo que o português criou.) “[Porém] o fato é que ainda hoje a miscigenação não faz parte de um processo de integração das “raças” em condições de igualdade social. O resultado foi que (…) ainda são pouco numerosos os segmentos da “população de cor” que conseguiram se integrar, efetivamente, na sociedade competitiva.” (Florestan Fernandes. O negro no mundo dos brancos.) Considerando as atitudes expostas acima e os pontos de vista dos estudiosos, é correto aproximar a) a posição de Gilberto Freyre e a de Florestan Fernandes igualmente às duas atitudes. b) a posição de Gilberto Freyre à atitude I e a de Florestan Fernandes à atitude II. c) a posição de Florestan Fernandes à atitude I e a de Gilberto Freyre à atitude II. d) somente a posição de Gilberto Freyre a ambas as atitudes. e) somente a posição de Florestan Fernandes a ambas as atitudes. 02. (ENEM 2009) “Formou-se na América tropical uma sociedade agrária na estrutura, escravocrata na técnica de exploração econômica, híbrida de índio – e mais tarde de negro – na composição. Sociedade que se desenvolveria defendida menos pela consciência de raça, do que pelo exclusivismo religioso desdobrado em sistema de profilaxia social e política. Menos pela ação oficial do que pelo braço e pela espada do particular. Mas tudo isso subordinado ao espírito político e de realismo econômico e jurídico que aqui, como em Portugal, foi desde o primeiro século elemento decisivo de formação nacional; sendo que entre nós através das grandes famílias proprietárias e autônomas; senhores de engenho com altar e capelão dentro de casa e índios de arco e flecha ou negros armados de arcabuzes às suas ordens”. De acordo com a abordagem de Gilberto Freyre sobre a formação da sociedade brasileira, é correto afirmar que a) a colonização na América tropical era obra, sobretudo, da iniciativa particular. b) o caráter da colonização portuguesa no Brasil era exclusivamente mercantil. c) a constituição da população brasileira esteve isenta de mestiçagem racial e cultural. d) a Metrópole ditava as regras e governava as terras brasileiras com punhos de ferro. e) os engenhos constituíam um sistema econômico e político, mas sem implicações sociais. 03. (UEL) “A falta de coesão em nossa vida social não representa, assim, um fenômeno moderno. E é por isso que erram profundamente aqueles que imaginam na volta à tradição, a certa tradição, a única defesa possível contra nossa desordem. Os mandamentos e as ordenações que elaboraram esses eruditos são, em verdade, criações engenhosas de espírito, destacadas do mundo e contrárias a ele. Nossa anarquia, nossa incapacidade de organização sólida não representam, a seu ver, mais do que uma ausência da única ordem que lhes parece necessária e eficaz. Se a considerarmos bem, a hierarquia que exaltam é que precisa de tal anarquia para se justificar e ganhar prestígio”. (HOLANDA, Sergio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 33). Caio Prado Junior, Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda são intelectuais da chamada “Geração de 30”, primeiro momento da sociologia no Brasil como atividade autônoma, voltada para o conhecimento sistemático e metódico da sociedade. Sobre as preocupações características dessa geração, considere as afirmativas a seguir. I. Critica o processo de modernização e defende a preservação das raízes rurais como o caminho mais desejável para a ordem e o progresso da sociedade brasileira. II. Promove a desmistificação da retórica liberal vigente e a denúncia da visão hierárquica e autoritária das elites brasileiras. III. Exalta a produção intelectual erudita e escolástica dos bacharéis como instrumento de transformação social. IV. Faz a defesa do cientificismo como instrumento de compreensão e explicação da sociedade brasileira. Estão corretas apenas as afirmativas: a) I e III. b) I e IV. c) II e IV. d) I, II e III. e) II, III e IV. Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 9 de 26 04. (Uel 2011) Leia o texto a seguir. “Na verdade, a ideologia impessoal do liberalismo democrático jamais se naturalizou entre nós. Só assimilamos efetivamente esses princípios até onde coincidiram com a negação pura e simples de uma autoridade incômoda, confirmando nosso instintivo horror às hierarquias e permitindo tratar com familiaridade os governantes.” (HOLANDA, S. B. de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 160.) O trecho de Raízes do Brasil ilustra a interpretação de Sérgio Buarque de Holanda sobre a tradição política brasileira. A esse respeito, considere as afirmativas a seguir. I. As mudanças políticas no Brasil ocorreram conservando elementos patrimonialistas e paternalistas que dificultam a consolidação democrática. II. A política brasileira é tradicionalmente voltada para a recusa das relações hierárquicas, as quais são incompatíveis com regimes democráticos. III. As relações pessoais entre governantes e governados inviabilizaram a instauração do fenômeno democrático no país com a mesma solidez verificada nas nações que adotaram o liberalismo clássico. IV. A cordialidade, princípio da democracia, possibilitou que se enraizassem, no país, práticas sociais opostas aos princípios do clientelismo político. Assinale a alternativa correta. a) Somente as afirmativas I e II são corretas. b) Somente as afirmativas I e III são corretas. c) Somente as afirmativas III e IV são corretas. d) Somente as afirmativas I, II e IV são corretas. e) Somente as afirmativas II, III e IV são corretas. 05. (Uem 2011) “O quadro familiar torna-se, assim, tão poderoso e exigente, que sua sombra persegue os indivíduos mesmo fora do recinto doméstico. A entidade privada precede sempre, neles, a entidade pública. A nostalgia dessa organização compacta, única e intransferível, onde prevalecem necessariamente as preferências fundadas em laços afetivos, não podia deixar de marcar nossa sociedade, nossa vida pública, todas as nossas atividades. Representando, como já se notou acima, o único setor onde o princípio de autoridade é indisputado, a família colonial fornecia a ideiamais normal de poder, da respeitabilidade, da obediência e da coesão entre os homens. O resultado era predominarem, em toda a vida social, sentimentos próprios à comunidade doméstica, naturalmente particularista e antipolítica, uma invasão do público pelo privado, do Estado pela família.” HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio, 1992, p. 50. Considerando o texto acima e o tema instituições sociais, assinale o que for correto. 01) O texto trata das relações que os indivíduos estabelecem com uma instituição social específica, o Estado. 02) No processo de formação da sociedade brasileira, os interesses privados interferem na conduta pública dos indivíduos. 04) No Brasil, a comunidade doméstica promoveu um equilíbrio entre os interesses coletivos e privados, revelando sua ação em defesa do que é público. 08) O autor define que a família colonial é uma organização compacta, única e intransferível, que exerceu profunda influência na formação social e cultural brasileira. 16) O Estado brasileiro manteve-se livre dos particularismos, das visões antipolíticas e dos interesses privados. 06. (Unicentro 2011) No Brasil, o pensamento sociológico se desenvolve a partir da década 30, do século passado, com a fundação da Universidade de São Paulo e o crescimento da produção científica. Sobre o desenvolvimento dessa ciência no Brasil, no século XX, é correto afirmar: a) Os sociólogos desse período buscavam descrever o país por meio de estudos naturalistas. b) Os grandes nomes desse período foram Euclides da Cunha, Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda. c) As duas preocupações dos sociólogos eram a aculturação indígena e a modernização do sistema político brasileiro. d) A orientação das análises sociológicas estava voltada para as discussões mundiais ditadas por países, como França e Inglaterra. e) O interesse dos intelectuais desse período estava voltado para o conhecimento do Brasil real, do povo, em oposição às análises etnocêntricas anteriores. 7.(UEL). Na primeira metade do século XX, o desenvolvimento social brasileiro foi marcado por intensos debates a respeito do processo de modernização do País. De acordo com esses debates: I. O País era apresentado, por algumas correntes de pensamento, como sendo de vocação agrícola. II. O desenvolvimento social e econômico do País passaria, necessariamente, pela modernização do campo. III. O atraso brasileiro decorria de sua origem feudal, aqui reproduzida mediante a relação entre senhor e escravo. IV. A expansão da economia capitalista no campo seria fundamental para eliminar os focos de pobreza e os movimentos sociais de caráter agrário. Assinale a alternativa correta. a) Somente as afirmativas I e II são corretas. b) Somente as afirmativas I e IV são corretas. c) Somente as afirmativas III e IV são corretas. d) Somente as afirmativas I, II e III são corretas. e) Somente as afirmativas II, III e IV são corretas. Gabarito: 1. C 2. A 3. C 4. B 5. 01+02+08=11 6. E 7. D Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 10 de 26 SEMANA 3: Empirismo Inglês e Criticismo de Kant 1.Empirismo Inglês Corrente filosófica que parte do pressuposto de que o conhecimento humano tem origem nas experiências sensoriais. Os principais pensadores da tradição empirista são: Francis Bacon, Thomas Hobbes, John Locke e David Hume. Em 1660 é fundada, em Londres, a Royal Society of London for the Improvement of Natural Knowledge, instituição que representa a tradição empirista inglesa e que tem como principal objetivo firmar um método seguro que possa contribuir com o avanço científico. Francis Bacon (1561 - 1626) Contemporâneo a Descartes, é considerado um dos primeiros pensadores modernos. Seu pensamento atrela o progresso social ao desenvolvimento técnico-científico, por meio do lema “saber é poder”. Por isso, para muitos Bacon é considerado já um precursor das ideias iluministas. As duas principais contribuições de Bacon para a história do pensamento filosófico são seu método indutivo e a Teoria dos Ídolos. Ídolos Em sua obra Novum Organum, Bacon preocupou-se inicialmente com a análise de falsas noções (ídolos) que se revelam responsáveis pelos erros cometidos pela ciência ou pelos homens que produzem conhecimento. Esses ídolos foram classificados em quatro grupos: 1) Idola Tribus (ídolos da tribo). Ocorrem por conta das deficiências do próprio espírito humano e se revelam pela facilidade com que generalizamos com base nos casos favoráveis ou em observações imediatas. O homem, que se entende como o padrão das coisas, faz com que todas as percepções dos sentidos e da mente sejam tomadas como verdade, limitando as possibilidades de conhecimento do mundo. Tais ídolos são, portanto, inerentes à natureza humana, à própria tribo ou condição humana. 2) Idola Specus (ídolos da caverna). Resultam da educação e da pressão dos costumes, que conformam a humanidade a visões de mundo preestabelecidas. Há uma alusão à alegoria da caverna platônica, pois Bacon faz referência às correntes que nos fixam ao mundo sensível: nossas crenças, nossos valores e nossas opiniões. 3) Idola Fori (ídolos do foro - vida pública). Estes estão vinculados à linguagem e decorrem das dificuldade de comunicação e do próprio mau uso da língua; 4) Idola Theatri (ídolos do teatro - autoridade). Decorrem da irrestrita subordinação à autoridade de pensamentos e doutrinas, tal como a física aristotélica, que do ponto de vista empírico carecia de demonstração, mas que era considerada verdadeira por pressuposto de autoridade. Assim, é preciso propor uma nova forma, um novo modelo de ciência que não caia na mesma armadilha dos ídolos. O modelo para Bacon é o Método Indutivo, caracterizado pela observação dos fenômenos, por meio de experiências, para que se possa chegar a uma regularidade desses mesmos fenômenos. Com a percepção dessa regularidade, o cientista pode fazer relação entre elas até chegar a uma generalização ou a uma lei. Usando o método indutivo, a ciência estabelecerá conhecimento seguro e conquistará avanços na parte técnica. Tal conhecimento deve exercer controle sobre a natureza e é essa justamente a ideia expressa em sua famosa frase: “saber é poder”. John Locke (1632 – 1704) Publica a obra Ensaio sobre o Entendimento Humano, em 1690. Acredita que as representações do real são sempre derivadas das percepções sensíveis. O conhecimento, portanto, não é inato, mas resulta do modo como elaboramos as informações provenientes da experiência. Defende a ideia de que a mente humana é uma página em branco (tábula rasa) que se constitui a partir das experiências. David Hume (1711 – 1776) O escocês David Hume levou o empirismo a níveis radicais. Nas suas principais obras Tratado sobre a natureza humana (1739) e Investigação sobre o entendimento humano (1748), encontramos sua tese principal, semelhante à dos outros empiristas, de que todas as ideias se originam da experiência sensível. Contudo, o que é importante na obra de Hume é notar como ele leva esse princípio a consequências que estão além dos seus contemporâneos, chegando a beirar o ceticismo. Além disso, cunha um novo conceito, o hábito, que vai exercer forte influência sobre filósofos posteriores, como Immanuel Kant. Hume parte das premissas empiristas, estabelecendo uma distinção entre impressões (dados fornecidos pelos sentidos) e ideias (representações da memória ou da imaginação). Acredita que percepção forma todas as ideias. Quanto mais próximas cronologicamente da experiência, maior força e nitidez possuem tais ideias. Por isso, para ele, os fenômenos da percepção são sempre particulares. Os conceitos são formados a partir de generalizações de casos particulares que captamos por meio de nossas experiências.Não existe, por exemplo, a ideia geral de árvore, mas sim cada árvore que vemos. A nossa mente opera, assim, de modo a extrair os aspectos gerais dos fenômenos e criar relações entre eles, tais como as noções de causalidade. Tendemos a, ao observar algo imediato, supor que isso seja o efeito de algo ou causa de um próximo efeito, porém, para Hume, estamos restritos às experiências momentâneas e não temos o poder de alcançar tamanhas suposições. A causalidade, ou seja, a relação entre diferentes fenômenos, é, para Huem, um hábito criado pelo pensamento. O que para muitos outros filósofos seria razão, para Hume é apenas o hábito ou costume de associar ideias que têm origem na experiência. Desse modo, Hume entende que somos dotados de um mecanismo psicológico que nos leva a encontrar semelhanças ou algum padrão de repetição nos fenômenos e é por meio desse processo, o hábito, que tiramos as nossas conclusões acerca da realidade. Porém, tais conclusões não geram um conhecimento seguro, uma vez que dependem de fatores subjetivos. “Todo o poder criador da mente reduz-se à simples faculdade de combinar, transpor, aumentar ou diminuir os materiais fornecidos pelos sentidos e pela experiência”, afirma Hume. Por que associamos ideias? Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 11 de 26 Por repetição ou semelhança. Se vivemos em uma região em que todos coelhos são brancos, tendemos a associar a espécie animal a esta cor. Se comemos um alimento todos os dias e, em uma viagem, observamos algo semelhante, tendemos a classificar aquilo como um alimento mesmo sem termos experimentado. Essas associações, contudo, atingem somente probabilidades, jamais certezas. Podemos incidir em erros seguindo semelhantes especulações. Afinal, estamos circunscritos em nosso próprio campo de experimentação, que é limitado, mas tendemos a tirar conclusões gerais, que buscam explicar a realidade como um todo. Hume, como vimos, duvida da possibilidade de alcançarmos um conhecimento verdadeiro (essencial e completo) acerca da realidade. Por isso, podemos dizer que ele radicaliza as bases do Empirismo e alcança o que muitos definem como CETICISMO RELATIVO, uma vez que não duvida da nossa capacidade de percepção imediata da realidade, mas põe em xeque as conclusões que tiramos por meio do hábito. Para o filósofo, as verdades só podem ser constatadas em termos particulares, jamais de modo generalizado. Em uma das partes de sua obra Ensaio acerca do entendimento humano, Hume procura desconstruir o argumento cartesiano da prova da existência de Deus, mostrando que Deus, como ideia, é fruto de conclusões que obtemos projetando elementos de nossas experiências diretas para preencher as lacunas da realidade que não compreendemos. 1.O Criticismo de Kant Immanuel Kant (1724 – 1804) Filósofo alemão, um dos principais expoentes do século XVIII e de toda a filosofia moderna. Nasceu, cresceu e trabalhou por toda a vida na cosmopolita cidade portuária de Konigsberg (atual Kaliningrado), então parte da Prússia. Embora nunca tenha deixado a província natal, tornou-se um filósofo internacionalmente conhecido ainda em vida. Estudou na Universidade de Konigsberg e lecionou na mesma universidade ao longo de toda sua vida. Após uma fase em que defende preceitos semelhantes aos demais pensadores iluministas, como a valorização da racionalidade humana e seu poder de romper com a ignorância e com a alienação, Kant adentra em sua fase célebre, conhecida como criticismo ou fase crítica. Tal fase corresponde à maturidade do pensamento do autor, após seus cinquenta anos de vida. Influenciado por David Hume, desperta de seu “sono dogmático” e questiona a capacidade da racionalidade humana compreender a realidade tal como é em si mesma. Em todo a sua obra, Kant dialoga com o pressuposto iluminista de que a razão autônoma é capaz de produzir conhecimento. Ele parte da tese de que “a razão tende a libertar a humanidade de seu estado de menoridade”, porém, acredita que posicionar a filosofia no “projeto iluminista” implica em se analisar criticamente a razão humana, estabelecendo os limites do que esta pode conhecer. Essa busca pelos limites da racionalidade humana é o que decide aprofundar por meio de suas obras críticas: Critica da Razão Pura, Crítica da Razão Prática e Crítica das Faculdades do Juízo. Tais obras solidificam o Criticismo, vertente filosófica desenvolvida por Kant. Crítica à Razão Pura Promove uma análise crítica da razão humana e dos limites do conhecimento, O que a razão pode conhecer do real? Como o conhecimento se processa? Os juízos Dialogando com as vertentes do Racionalismo e do Empirismo, Kant busca analisar o que a razão consegue conhecer de modo puro, ou seja, a razão por ela mesma. Ao fazer esta análise, constata que a razão não traz, de modo inato, nenhuma informação acerca da realidade física ou metafísica, mas possui a capacidade de produzir um conhecimento lógico e universal, que Kant classifica como juízo analítico. Juízo analítico: é fruto de uma operação racional, de deduções lógicas que a racionalidade alcança por ela mesma. Por isso, trata-se de um conhecimento independente da experiência (a priori). É um instrumento de análise do próprio pensamento, mas não conclui nada acerca da realidade externa. Para Kant, o juízo analítico é aquele em que o predicado está contido no conceito do sujeito. Como exemplo, temos a seguinte afirmação: “o quadrado tem quatro lados”. Juízo sintético: representa o conhecimento obtido por meio da experiência (a posteriori). Nesta forma de conhecimento o predicado não está contido no sujeito, por isso Kant acredita que a experiência acrescenta conteúdo à forma lógica da racionalidade. Quando digo que “aquela caneta é azul”, é necessária uma informação sensível posterior para que o conhecimento possa ser validado. Porém, o juízo sintético se limita ao tempo e espaço em que a experiência está circunscrita, portanto, não constitui um juízo necessário e universal. Juízo sintético a priori: para Kant, a ciência deve se basear numa terceira forma de juízo, capaz de sintetizar os outros dois. Para isso, a mente do cientista deve ser capaz de produzir juízos que dependam da experiência, mas que possam ser universais e necessários, ou seja, que transcendam os limites daquele fenômeno em particular. Síntese entre racionalismo e empirismo O conhecimento, para Kant, está relacionado, portanto, à nossa capacidade de produzir juízos sintéticos a priori. Isso acontece porque os dados fornecidos pela experiência são organizados dentro dos nossos moldes racionais. A razão é uma estrutura vazia, anterior à experiência e independente desta (a priori), porém os conteúdos que a razão conhece e Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 12 de 26 nos quais ela pensa dependem da experiência (a posteriori). A experiência não é a causa das ideias, mas é a ocasião para que a razão, recebendo a matéria ou o conteúdo, formule as ideias. Experiência: fornece os conteúdos, a matéria do conhecimento. RAZÃO Forma universal e necessária do conhecimento. Recebe as informações do meio e as organiza de acordo com suas formas estruturais: sensibilidade: noções temporais e espaciais; entendimento: organiza os conteúdos enviados pela sensibilidade em categorias (qualidade; quantidade; causalidade; finalidade; verdade; falsidade; universalidade e particularidade). “O entendimento nada pode intuir e os sentidos nada podem pensar. Só pela sua reunião se obtém conhecimento” Revolução Copernicana de Kant O “eu” é condicionante no processo de conhecimento. O objeto apenas se encaixa nos moldes da percepção humana. Não é o objeto que determina o sujeito, mas o sujeito que determina o objeto. O objeto só se torna cognoscível à medida que há um sujeito que pode conhecê-lo e isso depende da estruturade nossa razão (formas a priori). Por isso, o mundo não é senão aquilo que pode ser conhecido pelo sujeito, é sua representação. “A razão só entende aquilo que produz segundo seus próprios planos” Impossibilidade da Metafísica A razão possui essas estruturas como meio de conhecimento. Por serem universais e necessárias, o conhecimento é racional e verdadeiro para os seres humanos. Isso implica que podemos conhecer a realidade dentro dos limites do cognoscível. O que não se pode supor é que com essas estruturas possa-se conhecer a realidade tal como esta é em si mesma. O erro dos inatistas e empiristas foi supor que a nossa razão alcança a realidade em si , o númeno, quando na verdade só podemos captar a realidade como fenômeno, ou seja, a realidade organizada pela razão, que submete os conteúdos da experiência às formas da sensibilidade e do entendimento. 3. Texto complementar KANT: Resposta à Pergunta: Que é esclarecimento? Esclarecimento é a saída do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de fazer uso de seu entendimento sem a direção de outro indivíduo. O homem é o próprio culpado dessa menoridade se a causa dela não se encontra na falta de entendimento, mas na falta de decisão e coragem de servir-se de si mesmo sem a direção de outrem. Sapere aude! Tem coragem de fazer uso de teu próprio entendimento, tal é o lema do esclarecimento. A preguiça e a covardia são as causas pelas quais uma tão grande parte dos homens, depois que a natureza de há muito os libertou de uma direção estranha, continuem, no entanto de bom grado menores durante toda a vida. São também as causas que explicam por que é tão fácil que os outros se constituam em tutores deles. É tão cômodo ser menor. Se tenho um livro que faz as vezes de meu entendimento, um diretor espiritual que por mim tem consciência, um médico que por mim decide a respeito de minha dieta, etc., então não preciso esforçar-me eu mesmo. Não tenho necessidade de pensar, quando posso simplesmente pagar; outros se encarregarão em meu lugar dos negócios desagradáveis. A imensa maioria da humanidade (inclusive todo o belo sexo) considera a passagem à maioridade difícil e além do mais perigosa, porque aqueles tutores de bom grado tomaram a seu cargo a supervisão dela. Depois de terem primeiramente embrutecido seu gado doméstico e preservado cuidadosamente estas tranquilas criaturas a fim de não ousarem dar um passo fora do carrinho para aprender a andar, no qual as encerraram, mostram-lhes, em seguida, o perigo que as ameaça se tentarem andar sozinhas. Ora, este perigo na verdade não é tão grande, pois aprenderiam muito bem a andar finalmente, depois de algumas quedas. Basta um exemplo deste tipo para tornar tímido o indivíduo e atemorizá- lo em geral para não fazer outras tentativas no futuro. É difícil, portanto, para um homem em particular desvencilhar-se da menoridade que para ele se tornou quase uma natureza. Chegou mesmo a criar amor a ela, sendo por ora realmente incapaz de utilizar seu próprio entendimento, porque nunca o deixaram fazer a tentativa de assim proceder. Preceitos e fórmulas, estes instrumentos mecânicos do uso racional, ou, antes, do abuso de seus dons naturais, são os grilhões de uma perpétua menoridade. Quem deles se livrasse só seria capaz de dar um salto inseguro mesmo sobre o mais estreito fosso, porque não está habituado a este movimento livre. Por isso são muito poucos aqueles que conseguiram, pela transformação do próprio espírito, emergir da menoridade e empreender então uma marcha segura. Que, porém, um público se esclareça a si mesmo é perfeitamente possível; mais que isso, se lhe for dada a liberdade, é quase inevitável. Pois, encontrar- se-ão sempre alguns indivíduos capazes de pensamento próprio, até entre os tutores estabelecidos da grande massa, que, depois de terem sacudido de si mesmos o jugo da menoridade, espalharão em redor de si o espírito de uma avaliação racional do próprio valor e da vocação de cada homem em pensar por si mesmo. O interessante nesse caso é que o público, que anteriormente foi conduzido por eles a este jugo, obriga-os daí em diante a permanecer sob ele, quando é levado a se rebelar por alguns de seus tutores que, eles mesmos, são incapazes de qualquer esclarecimento. Vê-se assim como é prejudicial plantar preconceitos, porque terminam por se vingar daqueles que foram seus autores ou predecessores destes. Por isso, um público só muito lentamente pode chegar ao esclarecimento. Uma revolução poderá talvez realizar a queda do despotismo pessoal ou da opressão ávida de lucros ou de domínios, porém nunca produzirá a verdadeira reforma do modo de pensar. Apenas novos preconceitos, assim como os velhos, servirão como cintas para conduzir a grande massa destituída de pensamento. Para este esclarecimento, porém, nada mais se exige senão LIBERDADE. E a mais inofensiva entre tudo aquilo que se possa chamar liberdade, a saber: a de fazer um uso público de sua razão em todas as questões. Ouço, agora, porém, exclamar de todos os lados: não raciocineis! O oficial diz: não raciocineis, mas exercitai-vos! O financista exclama: não raciocineis, mas pagai! O sacerdote proclama: não raciocineis, mas crede! (Um único senhor no mundo diz: Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 13 de 26 raciocinai, tanto quanto quiserdes, e sobre o que quiserdes, mas obedecei!). Eis aqui por toda a parte a limitação da liberdade. Que limitação, porém, impede o esclarecimento? Qual não o impede, e até mesmo favorece? Respondo: o uso público de sua razão deve ser sempre livre e só ele pode realizar o esclarecimento entre os homens. Exercícios 1. (ENEM) Texto I Experimentei algumas vezes que os sentidos eram enganosos, e é de prudência nunca se fiar inteiramente em quem já nos enganou uma vez. DESCARTES, R. Meditações Metafísicas. São Paulo: Abril Cultural, 1979. Texto II Sempre que alimentarmos alguma suspeita deque uma ideia esteja sendo empregada sem nenhum significado, precisaremos apenas indagar: de que impressão deriva esta suposta ideia? E se for impossível atribuir-lhe qualquer impressão sensorial, isso servirá para confirmar nossa suspeita. HUME, D. Uma investigação sobre o entendimento. São Paulo: Unesp, 2004. Nos textos, ambos os autores se posicionam sobre a natureza do conhecimento humano. A comparação dos excertos permite assumir que Descartes e Hume a) defendem os sentidos como critério originário para considerar um conhecimento legítimo. b) entendem que é desnecessário suspeitar do significado de uma ideia na reflexão filosófica e crítica. c) são legítimos representantes do criticismo quanto à gênese do conhecimento. d) concordam que conhecimento humano é impossível em relação às ideias e aos sentidos. e) atribuem diferentes lugares ao papel dos sentidos no processo de obtenção do conhecimento. 2. (Uel 2007) Leia o texto a seguir: “Todos os raciocínios referentes a questões de fato parecem fundar-se na relação de causa e efeito. É somente por meio dessa relação que podemos ir além da evidência de nossa memória e nossos sentidos. [...] Arrisco-me a afirmar, a título de uma proposta geral que não admite exceções, que o conhecimento dessa relação não é, em nenhum caso, alcançado por meio de raciocínios a priori, mas provém inteiramente da experiência, ao descobrirmos que certos objetos particulares acham-se constantemente conjugados uns aos outros. ”Fonte: HUME, D. Investigação sobre o entendimento humano. Tradução de José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Editora UNESP, 1999. p. 44-45. Com base no texto e em seus conhecimentos sobre Hume, é correto afirmar que: a) Ao observarmos dois objetos conjugados entre si, podemos observar também a relação de causa e efeito que os une. b) É a razão que nos faz descobrir as causas e efeitosdos acontecimentos. c) Quando raciocinamos a priori e consideramos um objeto ou causa apenas, tal como aparece à mente, independente de toda observação, ele facilmente poderá sugerir-nos a ideia de algum objeto distinto, como seu efeito, e também exibir-nos a conexão inseparável e inviolável entre eles. d) Nenhum objeto jamais revela, pelas qualidades que aparecem aos sentidos, nem as causas que o produziram, nem os efeitos que dele provirão; tampouco nossa razão é capaz de extrair, sem o auxílio da experiência, qualquer conclusão referente à existência efetiva de coisas ou questões de fato. e) Todas as leis da natureza e todas as operações dos corpos são conhecidas pela razão, com o auxílio da experiência. 3. (UNESP) Suponhamos, pois, que a mente é um papel em branco, desprovida de todos os caracteres, sem nenhuma ideia; como ela será suprida? De onde lhe provém este vasto estoque, que a ativa e ilimitada fantasia do homem pintou nela com uma variedade quase infinita? De onde apreende todos os materiais da razão e do conhecimento? A isso respondo, numa palavra: da experiência. Todo o nosso conhecimento está nela fundado, e dela deriva fundamentalmente o próprio conhecimento. (John Locke. Ensaio acerca do entendimento humano [publicado originalmente em 1690], 1999. Adaptado.) Qual é a interpretação de Locke sobre as ideias inatas? Explique quais foram as implicações do pensamento desse filósofo no que se refere à metafísica. 4. (UNESP) “O Iluminismo é a saída do homem de um estado de menoridade que deve ser imputado a ele próprio. Menoridade é a incapacidade de servir-se do próprio intelecto sem a guia de outro. Imputável a si próprios é esta menoridade se a causa dela não depende de um defeito da inteligência, mas da falta de decisão e da coragem de servir-se do próprio intelecto sem ser guiado por outro. Sapere aude! Tem a coragem de servires de tua própria inteligência!” (Immanuel Kant, 1784.) Esse texto do filósofo Kant é considerado uma das mais sintéticas e adequadas definições acerca do Iluminismo. Justifique essa importância comentando o significado do termo “menoridade”, bem como os fatores sociais que produzem essa condição, no campo da religião e da política. 5. (Uem 2009) “(...) a própria experiência é um modo de conhecimento que requer entendimento, cuja regra tenho que pressupor a priori em mim ainda antes de me serem dados objetos e que é expressa em conceitos a priori, pelos quais, portanto todos os objetos da experiência têm necessariamente que se regular e com eles concordar.” (KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. São Paulo: Abril Cultural, 1983, p.13). Com base na filosofia de Kant, assinale o que for correto. 01) O método de Kant é chamado criticismo, pois consiste na crítica ou na análise reflexiva da razão, a qual, antes de partir ao conhecimento das coisas, deve conhecer a si mesma, fixando as condições de possibilidade do conhecimento, aquilo que pode legitimamente ser conhecido e o que não. Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 14 de 26 02) Para Kant, uma vez que os limites do conhecimento científico são os limites da experiência, as coisas que não são dadas à intuição sensível (a coisa em si, as entidades metafísicas como Deus, alma e liberdade) não podem ser conhecidas. 04) Kant mantém-se na posição dogmática herdada de Hume. Para os dois filósofos, o conhecimento é um fato que não põe problema. O resultado da crítica da razão é a constatação do poder ilimitado da razão para conhecer. 08) O sentido da revolução copernicana operada por Kant na filosofia é que são os objetos que se regulam pelo nosso conhecimento, não o inverso. Ou seja, o conhecimento não reflete o objeto exterior, mas o sujeito cognoscente constrói o objeto do seu saber. 16) Com a sua explicação da natureza do conhecimento, Kant supera a dicotomia racionalismo-empirismo. O conhecimento, que tem por objeto o fenômeno, é o resultado da síntese entre os dados da experiência e as intuições e os conceitos a priori da razão. 6. (Ufu 2004) Até agora se supõe que todo nosso conhecimento tinha que se regular pelos objetos: todas as tentativas de mediante conceitos estabelecer algo a priori sobre os mesmos, através do que nosso conhecimento seria ampliado, fracassaram sob esta pressuposição. Por isso, tente-se ver uma vez se não progredimos melhor nas tarefas da Metafísica admitindo que os objetos têm que se regular pelo nosso conhecimento, o que assim já concorda melhor com a requerida possibilidade de um conhecimento a priori dos mesmos que deve estabelecer algo sobre os objetos antes de nos serem dados. O mesmo aconteceu com os pensamentos de Copérnico que, depois das coisas não quererem andar muito bem com a explicação dos movimentos celestes admitindo—se que todo exército de astros girava em tomo do espectador, tentou ver se não seria mais bem-sucedido se deixasse o espectador mover-se e, em contrapartida, os astros em repouso.” KANT, I. Crítica da razão pura São Paulo: Nova Cultural, 1987, p. 14. (Os Pensadores) Considerando a leitura do trecho acima, podemos dizer que a revolução copernicana de Kant é a) uma revolução filosófica e científica segundo a qual o espectador não pode permanecer fixo em sua posição, aprendendo apenas os fenômenos, mas deve considerar que ele mesmo encontra-se em movimento para poder perceber as coisas em si mesmas. b) uma revolução astronômica que pretendeu mudar o curso da Filosofia Moderna, propondo uma reavaliação da física newtoniana. c) uma revolução filosófica que estabeleceu que o conhecimento da coisa em si só pode ser atingido caso haja um cuidadoso estudo dos fenômenos. d) uma revolução filosófica que afirmou a distinção entre fenômeno e coisa em si, qualificando esta última como incognoscível. 7. (Uem 2009) A Filosofia Moderna compreende os séculos XVII e XVIII, caracterizando-se por um acentuado racionalismo que se opõe ao pessimismo teórico do ceticismo, o qual duvida da capacidade da razão humana poder alcançar um conhecimento certo fundamentado em uma verdade universal. Assinale o que for correto. 01) René Descartes, no Discurso do Método, instaura a dúvida metódica; deve ser, portanto, considerado um adepto do ceticismo. 02) O dogmatismo opõe-se ao ceticismo, pois é uma doutrina segundo a qual é possível atingir a certeza de verdades inquestionáveis. 04) Para o racionalismo, o ponto de partida do conhecimento é o sujeito como consciência de si reflexiva, isto é, como consciência que conhece sua capacidade de conhecer. 08) Francis Bacon é um dos mais importantes céticos do século XVII, pois, para ele, o homem nunca poderia libertar-se dos ídolos que impedem sua razão de alcançar qualquer saber efetivo. 16) O racionalismo acredita que a vida ética pode ser totalmente racional, visto que a razão humana é capaz de conhecer a origem, as causas e os efeitos das paixões e das emoções, podendo dominá-las e governá-las. 8. (Ufsj 2012) Os termos “impressões” e “ideias”, para David Hume, são, respectivamente, por ele definidos como a) “nossas percepções mais fortes, tais como nossas sensações, afetos e sentimentos; percepções mais fracas ou cópias daquelas na memória e imaginação”. b) “aquilo que se imprime à memória e nos permite ativar a imaginação; lampejos inéditos sobre o objeto e sua natureza”. c) “o que fica impresso na memória independentemente da força: ação de criar a partir do dado sensorial”. d) “vaga noção do sensível; raciocínio com força de lei que legitima a natureza no âmbito da razão”. 9.(Enem PPL 2018) Quando analisamos nossos pensamentos ou ideias, por mais complexos e sublimes que sejam, sempre descobrimos que se resolvem em ideias simples que são cópias de uma sensação ou sentimento anterior. Mesmo as ideias que, à primeira vista, parecem mais afastadas
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