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Complexo de Édipo: Um breve relato do pensamento freudiano. Oziel Martins Araújo1 Vinicius Arena Munis2 Resumo: Na teoria psicanalítica, o complexo de Édipo se refere ao desejo da criança pelo envolvimento sexual com o genitor do sexo oposto, especial atenção erótica de um menino para a mãe. Freud sugeriu que o complexo de Édipo desempenha um papel importante na fase fálica do desenvolvimento psicossexual. Ele também acreditava que a conclusão desta etapa envolve a identificação com o genitor do mesmo sexo, o que acabaria por levar ao desenvolvimento de uma identidade sexual madura. O complexo de Édipo, tem atraído interesse e discussões tanto da classe acadêmica, como filósofos, sociológos, psicólogos tanto da população em geral como professores, pedagogos e principalmente dos pais, pois estes querem estar cada vez mais próximos dos filhos e identificar algo que possa trazer sentimentos hostis às crianças. Logo, este artigo tem por objetivo revisar a literatura deixada por Sigmund Freud sobre o assunto. O tema complexo Édipo traz outros assuntos que merecem ser citados como Complexo de Electra, Vivência pré-edipiana. Palavras chave: Freud, pai, mãe, infância, amor, ciúmes, Édipo, Electra. Vitória/ES, 2019 1 Este trabalho foi desenvolvido como pré-requisito à conclusão do curso Especialização em Filosofia da Psicanálise, oferecido pela Universidade Federal do Espírito Santo, coordenado pela Professora Claudia Murta, no período de 2017/2018. Cabe aqui um agradecimento à professora citada, ao tutor Nivaldo Cardoso dos Santos Filho bem como aos demais colegas de sala de aula, pelos debates e sugestões de ideias. 2 Orientador. Mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Espírito Santo 2 1 – Introdução Este artigo de revisão compreende um resumo sobre o Complexo de Édipo na Psicanálise. Existem inúmeras obras e textos de autores renomados como Freud, Lacan, Winnicott e Miller versam sobre o assunto. Sendo assim este artigo pretende traçar um resumo sobre o Complexo de Édipo baseado no material bibliográfico produzido por Sigmund Freud com o intuito de fomentar uma releitura do tema. Vale ressaltar que o tema proposto traz discussões e polêmicas e que após a literatura deixada por Freud comprendendo o final do século XIX até os anos 30 do século XX serviu de centro para novas literaturas e conceitos vinculados a sexualidade, damos evidência as mudanças produzidas pelos movimentos feminista3, homossexual, transexual e afins. Logo, é importante, relatar que hoje ao falar de Complexo de Édipo esses temas são sempre lembrados; sendo assim, mesmo não sendo o universo de estudo neste artigo procuramos falar forma suscita e clara sobre o Complexo de Electra e também da Fase Pré-Edipiana, mas sempre tendo em mente que nosso universo de estudo é o Complexo de Édipo. 2 – Metodologia A forma de pesquisa empregada neste artigo de revisão foi a pesquisa bibliográfica, tanto a direta, em leituras nos seminários de Freud, para tanto tivemos acesso aos volumes publicados no Brasil pela Editora Imago, Edição Standart Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, assim apreciamos os volumes IV A Interpretação dos Sonhos I (1900), V A Interpretação dos Sonhos II e Sobre os Sonhos (1900-1901), VII Um caso sobre Histeria, Três Ensaios sobre Sexualidade e outros trabalhos (1901-1905), XV Conferências Introdutórias sobre Psicanálise, Partes I e II (1915-1916), XIX O ego e o Id e outros trabalhos (1923-1925) e XXII Novas Conferências Introdutórias sobre Psicanálise e 3 O movimento feminista ganhou força e atenção a partir da década de 1930, servindo de ponte para o movimento homossexual a partir dos 50 e 60 do século XX e o movimento transexual apesar de ter literaturas desde os anos 50 passou a ter maior evidência a partir dos 80 do século XX. 3 outros Trabalhos (1932-1936) como a pesquisa bibliográfica indireta através de leituras de livros, textos, artigos que versam sobre o assunto. 3 – Psicanálise e o Desenvolvimento Psicossexual Nesta seção abordaremos o conceito de psicanálise, inconsciente, as fases do desenvolvimento humano propostas por Freud e uma breve explicação do mito grego sobre o Édipo Rei. Chiaratti; Gonçalves; Ricieri (2014, p. 46) afirmam que a psicanálise é uma teoria e uma prática que buscam sistematizar um conjunto de conhecimentos que objetiva encontrar as leis gerais sobre a estruturação e o funcionamento do psiquismo e dos processos inconscientes, em sua influência na conduta normal ou patológica dos indivíduos. Para os autores, Freud desenvolveu seu pensamento considerando que as recordações passam do inconsciente para o consciente, que há forças resistentes a certos fatos, causando traumas, dor. Concordando com os autores, Freud partiu do princípio de que reprimimos aquilo de que não gostamos ou que nos incomoda, que não há descontinuidade na vida mental, cada evento mental é motivado pelo intuito consciente ou inconsciente de determinados fatos que o precederam. Para Freud apud Chiaratti; Gonçalves; Ricieri (2014, p. 47) o homem, e consequentemente suas ações, é o resultado de vivências esquecidas e armazenadas em uma área sem acesso: o inconsciente. Exemplificando, quando um sentimento ou pensamento não está relacionado aos pensamentos e sentimentos que o precedem, as conexões estão no inconsciente. No inconsciente estão os elementos naturais, que jamais foram conscientes, não são compreensíveis à consciência. O inconsciente é um sistema do aparelho psíquico regido por leis próprias de funcionamento; por exemplo, é atemporal, não existem as noções de passado e presente. 4 Para auxiliar o leitor e fomentar a sua atenção e melhor compreensão, apresentaremos um breve resumo sobre as fases do desenvolvimento propostas por Freud. Assim temos, conforme Chiaratti; Gonçalves; Ricieri (2014, p. 51-52): i) Fase oral (nascimento — 1 ano): ao nascer, o bebê perde a relação simbiótica que possuía com a mãe e a satisfação plena da vida intrauterina. Com o corte do cordão, a separação é irreversível e a criança deve iniciar sua adaptação ao meio. Ao nascer, a estrutura sensorial mais desenvolvida é a boca. É pela boca que começará a provar e a conhecer o mundo. É pela boca que fará sua primeira e mais importante descoberta afetiva: o seio. Os principais pontos de tensão e gratificação são a boca, a língua e os lábios — em que se incluem o morder e a sucção. ii) Fase anal (1 — 3 anos): nessa fase, a libido passa da organização oral para a anal. O período é denominado fase anal porque a libido passa a organizar-se sobre a zona erógena anal. No segundo e terceiro anos de vida, dá-se a maturação do controle muscular na criança, isto é, a organização psicomotora de base. iii) Fase fálica (3 — 5 anos): por volta dos 3 anos de idade, a libido inicia nova organização. A erotização passa a ser dirigida aos genitais e desenvolve-se o interesse infantil por eles. A masturbação torna-se frequente e normal. Os genitais erotizados dirigem uma busca de satisfações de desejos à organização da fantasia infantil, de forma inconsciente. [compartilho com o leitor a preocupação com que uma má interpretação sobre o assunto pode provocar, nesta fase, o prazer encontra-se nas genitais, porém, não da mesma forma que para um adulto]. iv) Período de latência (5 anos — puberdade): caracteriza-se pela canalização das energias sexuais para o desenvolvimento social, a partir das sublimações, sendo um período intermediário entre a genitalidade infantil (fase fálica) e a adulta (genital). A sexualidade, que permanece reprimida durante esse período, aguarda a eclosão da puberdade para ressurgir. Estando os fins eróticos vetados, dá-se lugar para o desenvolvimentointelectual e social da criança. 5 v) Fase genital (puberdade em diante): alcançar a fase genital constitui, para a psicanálise, atingir o pleno desenvolvimento do adulto normal. Freud (2014), apud Chiaratti; Gonçalves; Ricieri, sugeriu que o complexo de Édipo desempenha um papel importante na fase fálica do desenvolvimento psicossexual. Ele também acreditava que a conclusão desta etapa envolve a identificação com o genitor do mesmo sexo, o que acabaria por levar ao desenvolvimento de uma identidade sexual madura. Isto posto, podemos seguir adiante e expressar que Complexo de Édipo é um dos conceitos fundamentais de Freud, na Psicanálise. Este conceito refere-se a uma fase no desenvolvimento infantil em que existe uma “disputa” entre a criança e o genitor do mesmo sexo pelo amor do genitor do sexo oposto. Essa disputa fica evidenciada na fase fálica como vimos anteriormente, e podemos notar que popularmente a pessoas expressam: “como essa menina é apegada ao pai!” ou então “ esse menino não desgarra da mãe”, logo, já temos um exemplo prático do Complexo de Édipo. O complexo de Édipo desempenha papel fundamental na estruturação da personalidade e na orientação do desejo humano. 4 – Quem foi Édipo Rei? Para construir o conceito de Complexo de Édipo, Freud utilizou-se da mitologia grega, mais especificamente do teatro, escrito por Sófocles chamado “Édipo Rei”. De acordo com Ferrari (2011) o mito conta a história de Laio, rei de Tebas, que teria sido avisado por um Oráculo sobre seu futuro maldito: ele seria assassinado por seu próprio filho que se casaria com sua mulher, ou seja, a mãe deste. Para evitar que isso se concretizasse, Laio decide abandonar a criança num lugar distante, colocando-lhes pregos nos pés, para que morresse. Um pastor encontra a criança e lhe dá o nome de Edipodos (pés-furados). Essa criança, mais tarde é adotada pelo rei de Corinto. Ao consultar o oráculo, Édipo recebe a mesma mensagem que seu pai Laio recebera anos antes, mas, acreditando que se tratava dos 6 pais adotivos, Édipo foge de Corinto. Em sua fuga, Édipo se depara com um bando de negociantes e seu líder e acaba por matá-los todos em uma briga, sem saber que esse líder era Laio, seu pai. Ao chegar a Tebas, Édipo decifra o enigma da Esfinge e livra a cidade de suas ameaças, assim recebe o trono de rei e a mão da rainha Jocasta, agora viúva. Os dois se casam e têm quatro filhos. Ainda com Ferrari (2011) anos depois, quando uma peste chega à cidade, Édipo e Jocasta consultam o oráculo para tentar resolver essa questão e acabam por descobrir que são mãe e filho. Jocasta suicida-se e Édipo fura os próprios olhos como punição por não ter reconhecido a própria mãe. 4.1 – O Complexo de Édipo e a Psicanálise No desenvolvimento infantil e ao perceber a relação entre os pais, a criança passa a responsabilizar o genitor do mesmo sexo pela “separação” e deseja o amor, proteção e total atenção do genitor do sexo oposto. Nessa fase, a criança passa a ter sentimentos hostis para com o genitor do mesmo sexo ou mesmo outras fontes que possam desviar a atenção do genitor de sexo oposto diante de si. Em seu livro de 1900 A Interpretação dos Sonhos I Freud propôs pela primeira vez o conceito de complexo de Édipo, embora ele não tenha formalmente começado a usar o termo até o ano de 1910. O termo foi nomeado por causa do personagem de Sófocles, Édipo Rei, que acidentalmente mata seu pai e se casa com sua mãe, como já relatamos anteriormente. É destino de todos nós, talvez, dirigir nosso primeiro impulso sexual para nossa mãe, e nosso primeiro ódio e primeiro desejo assassino, para nosso pai. Nossos sonhos nos convencem de que é isso o que se verifica. O Rei Édipo, que assassinou Laio, seu pai, e se casou com Jocasta, sua mãe, simplesmente nos mostra a realização de nossos próprios desejos infantis. (FREUD, 1900, p. 179). 7 Para Freud (1900, p. 179) somos mais afortunados que ele [Édipo] entrementes conseguimos, na medida em que não nos tenhamos tornado psiconeuróticos, desprender nossos impulsos sexuais de nossas mães e esquecer nosso ciúme de nossos pais. Freud segue estudando seus pacientes e no livro A Interpretação dos Sonhos II e Sobre Sonhos (1900-1901) e começa encontrar um padrão nos sonhos de seus pacientes com relação aos seus genitores e isso fica mais evidente no livro Um caso de Histeria, Três ensaios sobre a teoria da sexualidade e outros trabalhos (1901-1905) ao tratar a paciente Dora a lenda de Édipo provavelmente foi considerada como a elaboração poética do que há de típico relações entre Dora, seu pai e a senhora K. O pai de Dora tinha uma relação com a senhora K [as duas famílias eram amigas]. Segundo Freud o comportamento de Dora ia muito além da esfera de interesse de uma filha; ela se sentia e agia mais como uma esposa ciumenta, como se consideraria compreensível em sua mãe. Ainda de acordo com Freud identificava-se com as duas mulheres, a que o pai amara um dia (a mãe) e a que amava agora (a amante). É óbvia a conclusão que sua inclinação pelo pai era muito maior do que ela sabia ou estava disposta a admitir, ou seja, que estava apaixonada por ele, pondera Freud. Freud relata que aprendeu a ver nessas relações amorosas inconscientes entre pai e filha ou entre mãe e filho, conhecidas por suas consequências anormais, uma revivificação de germes dos sentimentos infantis. Expus em outros lugares em que tenra idade a atração sexual se faz sentir entre pais e filhos, e mostrei que a lenda de Édipo provavelmente deve ser considerada como a elaboração poética do que há de típico nessas relações. É provável que se encontre na maioria dos seres humanos um traço nítido dessa inclinação precoce da filha pelo pai e do filho pela mãe, e deve-se presumir que ela seja mais intensa, já desde o início, no caso das crianças constitucionalmente destinadas à neurose, que têm amadurecimento precoce e são famintas de amor. (FREUD, 1901, p. 36). Freud relata que tratou a paciente Dora por vários anos [Dora abandona o tratamento e regressa após anos sem contato com Freud], analisando seus sonhos e comportamentos baseando nas confissões durante as sessões. Em determinado momento Freud verifica que o “apego” da jovem do seu pai foi lhe transferido: “Desde o início ficou claro que em sua 8 fantasia eu substituía seu pai, o que era fácil de compreender em vista de nossa diferença de idade”. Freud (1901, p. 79) conclui o tratamento da paciente, segundo o autor: Passaram-se novamente vários anos desde sua visita. A moça se casou, e por certo com aquele rapaz (...), afastamento do homem amado em direção ao pai, ou seja, a fuga da vida para a doença, esse segundo sonho anunciou que ela se desprenderia do pai e ficaria recuperada para a vida. (FREUD, 1901, p. 76). Penso que, no caso de Dora houve um desfecho positivo, pois a paciente passou pelo período de atraçaõ pelo pai,ciúmes da mãe e posteriormente da amante (senhora K) e no final desta fase identcou-se com a mãe, prova disso que ela se casa com um rapaz. No livro O Ego e o Id e Outros Trabalhos (1923-1925) Freud afirma que o assunto é complicado, porém é necessário abordá-lo pormenorizadamente. Já na obra Conferência Introdutórias sobre a Psicanálise I e II (1915-1916) o autor revela uma preocupação com a repercussão do assunto: Não se pode dizer que o mundo tenha demonstrado muita gratidão à investigação psicanalítica por sua revelação do complexo de Édipo. Ao contrário, a descoberta provocou a mais violenta oposição entre adultos; e aqueles que não se interessaram por tomar parte no repúdio a este relacionamento emocional proscrito e tabu, compensaram seu débito mais tarde, subtraindo a este complexo o seu valor, por meio de reinterpretações tortuosas. (FREUD, 1915, p. 135). Freud (1923, p. 19) comenta o Complexo de Édipo em sua forma simplificada,e no caso de uma criança do sexo masculino, (...). Em idade muito precoce o menininho desenvolve uma catexia4 objetal pela mãe, originalmente relacionada ao seio materno, e que é o protótipo de uma escolha de objeto segundo o modelo anaclítico; o menino trata o pai identificando-se com este. Para o autor durante certo tempo, esses dois relacionamentos avançam lado a lado, 4 É o processo pelo qual a energia libidinal disponível na psique é vinculada a ou investida na representação mental de uma pessoa, idéia ou coisa. 9 até que os desejos sexuais do menino em relação à mãe se tornam mais intensos e o pai é percebido como um obstáculo a eles; daí conforme o Freud disso se origina o complexo de Édipo. Sua identificação com o pai assume então uma coloração hostil e transforma-se num desejo de livrar-se dele, a fim de ocupar o seu lugar junto à mãe. Daí por diante, a sua relação com o pai é ambivalente; parece como se a ambivalência, inerente à identificação desde o início, se houvesse tornado manifesta. Uma atitude ambivalente para com o pai e uma relação objetal de tipo unicamente afetuoso com a mãe constituem o conteúdo do complexo de Édipo positivo simples num menino. (FREUD, 1923. p.20). Para Freud a catexia objetal da mãe, por parte do menino, deve ser abandonada. De acordo com o autor o seu lugar pode ser preenchido por uma de duas coisas: uma identificação com a mãe ou uma intensificação de sua identificação com o pai. Freud esclarece que estamos acostumados a encarar o último resultado como o mais normal; ele permite que a relação afetuosa com a mãe seja, em certa medida, mantida. Dessa maneira, a dissolução do complexo de Édipo consolidaria a masculinidade no caráter de um menino. Logo, de maneira precisamente análoga, o desfecho da atitude edipiana numa menininha pode ser uma intensificação de sua identificação com a mãe (ou a instalação de tal identificação pela primeira vez) - resultado que fixará o caráter feminino da criança. De acordo com Freud a descrição acima refere-se ao complexo de Édipo simples e é a sua forma mais comum, e um estudo mais aprofundado geralmente revela complexo de Édipo mais completo, o qual é dúplice, positivo e negativo, e devido à bissexualidade originalmente presente na criança. 4.2 – A Dissolução do Complexo de Édipo No capítulo “A dissolução do complexo de Édipo (1924)” presente no livro “O Ego e o Id e Outros Trabalhos (1923-1925) Freud revela a importância do assunto fenômeno central do período sexual da primeira infância. Para o autor a dissolução do complexo de Édipo 10 resultado de diversas análises demonstra ocorrer após experiência de desapontamentos penosos. A menina gosta de considerar-se como aquilo que seu pai ama acima de tudo o mais, porém chega a ocasião em que tem de sofrer parte dele uma dura punição e é atirada para fora de seu paraíso ingênuo. O menino encara a mãe como sua propriedade, mas um dia descobre que ela transferiu seu amor e sua solicitude para um recém-chegado. (FREUD, 1923. p.102). Conforme vemos acima a reflexão deve aprofundar nosso senso da importância dessas influências, porque ela enfatizará o fato de serem inevitáveis experiências aflitivas desse tipo, que agem em oposição ao conteúdo do complexo. No caso do menino a ausência da satisfação esperada, a negação continuada do bebê desejado, devem, ao final, levar o pequeno amante a voltar as costas ao seu anseio sem esperança. Assim, concordo com Freud que o complexo de Édipo se encaminharia para a destruição por sua falta de sucesso, pelos efeitos de sua impossibilidade interna. Freud ainda apresenta outra ótica sobre a ruina [dissolução] do complexo, o autor faz analogia a queda dos dentes de leite de uma criança que estão fadados a cair quando os dentes permanentes começam a crescer. Embora a maioria dos seres humanos passe pelo complexo de Édipo como uma experiência individual, ele constitui um fenômeno que é determinado e estabelecido pela hereditariedade e que está fadado a findar de acordo com o programa, o instalar-se a fase seguinte preordenada de desenvolvimento. Assim sendo, não é de grande importância quais as ocasiões que permitem tal ocorrência ou, na verdade, que ocasiões desse tipo possam ser de algum modo descobertas. (FREUD, 1923. p.102). Freud se refere ao fim da fase fálica e ao início da fase de latência (puberdade) no já vimos anteriormente. 11 Freud (1923, p. 104) que as catexias [libidinal] de objeto são abandonadas e substituídas por identificações. Para o autor a autoridade do pai ou dos pais é introjetada no ego5 e aí forma o núcleo do superego6, que assume a severidade do pai e perpetua a proibição deste contra o incesto, defendendo assim o ego do retorno da catexia libidinal. Ele afirma que as tendências libidinais pertencentes ao complexo de Édipo são em parte dessexualizadas e sublimadas [coisa que provavelmente acontece com toda transformação em uma identificação] e em parte são inibidas em seu objetivo e transformadas em impulsos de afeição. Conforme o autor esse processo introduz o período de latência, que agora interrompe o desenvolvimento sexual da criança, muito importante no desenvolvimento do indivíduo. 5 – Electra e a Fase Pré-Edipiana Em 1931, Freud, já com 75 anos de idade, na obra Novas Conferências Introdutórias sobre Psicanálise e outros Trabalhos – admitiu sua dificuldade em decifrar o enigma da esfinge feminina. Reconheceu, então, que o complexo de Édipo correspondia de forma muito limitada ao desenvolvimento feminino. Para entender a questão feminina, o conceito deveria ser ampliado. Freud criou o termo pré-edipiano para poder manter o complexo de Édipo como núcleo da neurose. Através do prolongamento da fase pré-edipiana, Freud encontrou uma maneira de por um lado, manter o desenvolvimento de ambos, meninos e meninas, determinado pelo complexo de Édipo, mas por outro, de diferenciar o percurso deste para meninas. Assim, de acordo com Halberstadt (2006) ele evitou confrontar-se com o problema do complexo de Édipo nas meninas. 5 Com referência aos acontecimentos externos, o ego desempenha sua função dando conta dos estímulos externos, armazenando experiências sobre eles na memória, evitando o excesso de estímulos internos (mediante a fuga), lidando com estímulos moderados (por meio da adaptação) e aprendendo, com a atividade, a produzir modificações convenientes no mundo externo em seu próprio benefício. Ballone (2014) apud Chiaratti; Gonçalves; Ricieri (2014, p.60). 6 O superego, ou seja, a consciência moral, nem sempre reflete fielmente as normas da sociedade. Como ele se forma na infância, as restrições e proibições à expressão das energias instintivas são internalizadas de uma forma mais rígida e severa que as repressões reais. Freitas (2014) apud Chiaratti e tal (2014, p.60). 12 O mito de Electra7 tem sido escolhido como tema por vários autores clássicos e modernos, fascinados pelos enigmas da feminilidade. Electra representa a problemática do desenvolvimento feminino malsucedido, frequentemente marcado por ciúmes, masoquismo, dramatização, rejeição da feminilidade e sexualidade freada8. Uma obra de arte ou um mito são comparáveis com um sonho, afirma Halberstadt e concordo com a autora que eventos simbólicos ricos em significado expressam diversas emoções e fantasias. Assim Electra traduz o conflito entre mãe e filha, repleto de fantasias de morte, suicídio e ódio, que leva ao sadismo e também ao masoquismo. É importante destacar diferenças entre Electra e Édipo, enquanto este mata um estranho em um cruzamento de Delfos, em um ataque de raiva irracional; já Electra planeja durante muitos anos o assassinato da sua mãe, que executará sorrateiramente e Electra alimentaráum rancor pelo resto de sua vida em relação a sua mãe pelo fato de que esta, junto com o amante Aegisthus, matou seu pai, Agamêmnon, e a amante deste, Cassandra. Após anos de espera, Electra consegue executar sua vingança com a ajuda do irmão, matando a mãe, Clytaemnestra. Electra tornou-se uma mulher infeliz e só, obcecada pelo rancor em relação a sua mãe e a Aegisthus, seu padrasto. Ela era cronicamente enraivecida, profundamente frustrada e sofria amargamente com seu destino incontestavelmente triste. Na ausência de Agamêmnon, identificava-se intensamente com seu pai adorado. Assim ela odiava a mãe com a mesma intensidade com que amava o pai, como se ela tivesse dividido seus afetos em dois polos opostos. A dissolução do complexo de Electra acaba por conduzir a identificação com o genitor do mesmo sexo. E podemos acrescer o aparecimento da bissexualidade da mulher que também fica evidenciado no caso de Electra e seu desejo de ser e possuir ambos os sexos é 7 Embora seja frequentemente associado com Freud, foi na verdade Carl Jung que cunhou o termo complexo de Electra em 1913. 8 Para Chodorow, tanto o complexo de Édipo como o de Electra são reduções. O desenvolvimento da heterossexualidade e da homossexualidade apresentam uma variabilidade e complexidade tão grandes que não justificam generalizações no caso individual (CHODOROW, 1992, apud HALBERSTADT ). 13 demonstrado pela depreciação do marido (Eurípides), e também na medida em que força seu irmão a servir-lhe como ferramenta no assassinato de sua mãe. Passado esse breve relato sobre Electra voltamos nosso pensamento para Freud, e entendemos que o psicanalista apresenta três saídas ao Édipo na menina: a neurose, a homossexualidade e a feminilidade, obtivemos essa conclusão ao examinar a obra Novas Conferências Introdutórias sobre Psicanálise e outros Trabalhos. Vale ressaltar que no pensamento do autor: A descoberta de que é castrada representa um marco decisivo no crescimento da menina. Daí partem três linhas de desenvolvimento possíveis: uma conduz à inibição sexual ou à neurose, outra, à modificação do caráter no sentido de um complexo de masculinidade, a terceira, finalmente, à feminilidade normal. (FREUD, 1932, p. 85) Logo, aprendemos que o termo Complexo de Édipo começa aos poucos a deixar de ser relatado quando se trata de meninas com suas mães ou como queiram genitor do mesmo sexo, e como já dissemos anteriormente o próprio Freud confirma que Édipo limita-se ao universo masculino e com essa limitação Freud pode observar e denominar essa fase de vinculação da menina a sua mãe de pré-edipiana, pois, na época de Freud a vida sexual era dominada pela polaridade masculino-feminino, por isso não podemos imputá-lo culpa ou lhe cobrar textos e análises sobre homossexualidade, transexualidade e identidade de gênero. 14 6 – Conclusão Vimos neste artigo que o tema edipiano que foi proposto por Freud teve aceitação na Psicanálise, mesmo sendo alvo de críticas foi o primeiro passo para estudar a sexualidade infantil e os primeiros casos receberam na literatura psicanalítica o nome de neurose infantil. O desfecho favorável do complexo de Édipo, que é um dos conceitos fundamentais de Freud na Psicanálise, entendemos que seja a afeição da criança pelo sexo oposto e depois o seu desfecho positivo resultará para o menino na identificação com a masculidade e para a menina com feminilidade, pois muitos psicanalistas defendem que o seu desenvolvimento malsucedido frequentemente é marcado por marcado por ciúmes, masoquismo, dramatização, rejeição da masculinidade e/ou feminilidade e sexualidade freada. Entretanto, atualmente, estudos vindos dos meados do século XX para cá apresentam a vivência pré-edípica como berço da transexualidade, que após debates o termo “transexualismo” foi substituído por Transtorno de Identidade de Gênero, adiante por Disforia de Gênero e hoje por Transtornos da identidade sexual; o que não foi nosso universo de estudo, no entanto, podemos deixar registraddo que psicanalista Robert Stoller versa sobre o assunto em seu importante trabalho “A experiência transexual” publicado em 1975. Como relatado em nossa introdução procuramos dedicar um tempo sobre o complexo de Electra, visto que Freud não deixou literatura sobre o tema, apesar que por volta dos anos 1930 este mencionar o termo relação pré-edipiana, que outros estudiosos deram ênfase ao assunto, por exemplo, Carl Jung. Na literatura de Freud chamou-nos a atenção a análise que o psicanalista fez da paciente Dora mesmo que o Complexo de Édipo seja orientado para o univerno masculino, o caso da paciente Dora nos serviu para nos iniciar no assunto. Em resumo esperamos ter alcançado nosso propósito que era traçar um resumo sobre o Complexo de Édipo baseado no material bibliográfico produzido por Sigmund Freud com o intuito de fomentar a atenção para o assunto, assim como quebrar o tabu sobre o desenvolvimento psicossexual da criança, trazer a tona a releitura do tema tantoda população em geral quanto de professores, pedagogos, filósofos, sociólogos, psicólogos e psicanalistas. 15 7 – Referências CHIARATTI, Fernanda Germani de Oliveira; GONÇALVES, Carlos Eduardo de Souza; RICIERI, Marilucia. Psicologia da educação: desenvolvimento e aprendizagem. Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2014. FERRARI, Juliana Spinelli. Complexo de Édipo;Brasil Escola. Disponível em <https://brasilescola.uol.com.br/psicologia/complexo-edipo.htm>. Acesso em jan de 2019. FREUD, Sigmund. Volume IV, A Interpretação dos Sonhos I (1900). Edição Standart Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Editora Imago[recurso eletrônico]. ______________. Volume V, A Interpretação dos Sonhos II e Sobre os Sonhos (1900- 1901). Edição Standart Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Editora Imago[recurso eletrônico]. ______________. Volume VII, Um caso sobre Histeria, Três Ensaios sobre Sexualidade e outros trabalhos (1901-1905). Edição Standart Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Editora Imago[recurso eletrônico]. ______________. Volume XV, Conferências Introdutórias sobre Psicanálie, Partes I e II (1915-1916). Edição Standart Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Editora Imago[recurso eletrônico]. ______________. Volume XIX, O ego e o Id e outros trabalhos (1923-1925). Edição Standart Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Editora Imago[recurso eletrônico]. ______________. Volume XXII, Novas Conferências Introdutórias sobre Psicanálise e outros Trabalhos (1932-1936). Edição Standart Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Editora Imago[recurso eletrônico]. RIOS, Dermival Ribeiro, coord. Grande Dicionário Unificado da Língua Portuguesa. São Paulo, SP: DCL, 2010. Universidade Federal do Espírito Santo. Normatização e Apresentação de Trabalhos Científicos e Acadêmicos. Vitória, ES: Abiblioteca, 2006. ____________________________________. Normatização de Referências: NBR 6023:2002.Vitória, ES: A Biblioteca, 2006.
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