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HISTÓRIA DA FILOSOFIA José Carlos da Silva Ferreira1 A autora do texto que esta resenha trata é Maria Lucia Arruda Aranha, uma filosofa formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Com uma vasta área de filosofia da educação, o texto trata de modo geral sobre o percurso da cultura humana, da gênese do conhecimento e da filosofia e do saber educacional. Logo no início do texto, a autora analisa a educação indígena através de relatos indígenas. A resposta do líder indígena desconstrói a ideia de uma superioridade do homem branco e principalmente da primazia educacional. Está implícito o ideal civilizador que o ocidental criou sobre sua cultura. Por isso, a autora analisa também essa mesma cultura enquanto produto construído historicamente entre as sociedades. Algumas dessas associações humanas, segundo a autora, valorizam a atividade intelectual como sinônimo de civilidade, enquanto o trabalho manual é o oposto, ou seja, a falta de civilidade, a barbárie. A estrutura geral do texto representado pela autora dualiza o homem enquanto benfeitor da civilização e o animal irracional como símbolo da barbárie. Pensamento bastante parecido com a antropologia dos séculos XIX e XX, onde o escalonamento (principalmente aquele proposto de Lewis Morgan) é claramente observado. Primeiro se dicotomia o que é civilizado do que é selvagem/bárbaro. É possível que o mesmo poderia ser feito com o próprio homem, dividindo entre aqueles que correspondiam aos estágios de selvagens, bárbaros e por fim civilizados. O conceito de cultura, segundo a autora, é o “resultado de tudo o que o homem produz para construir sua existência”. (ARANHA, 2006). Desse modo, é necessário observa em primeiro lugar a multiplicidade do próprio conceito. Logo em seguida, a autora associa a linguagem (sistema criado por signos e consequentemente por representações) como sendo sinônimo de cultura. Quando a Maria Lucia fala do mundo primitivo, ela utiliza da irracionalidade animal – não-humana – para diferenciar o homem do animal. No mesmo parágrafo, a autora faz a comparação entre animal irracional e 1 Graduado em História pela Universidade de Pernambuco homem (ela não destaca que o homem também é um animal), quando diz que o animal irracional não domina o tempo. Nossa observação se baseia no fato de que a ideia da medição do tempo, como conhecemos, iniciou com o advento das estruturas da revolução industrial. Quem aborda essa ideia é Edward Thompson quando lembra que o tempo do homem rural era alicerçado no ordenamento da natureza. A colheita, o dormir, o acordar, o festejar. O homem rural, paralelo ao animal descrito por Maria Lucia, não domina o tempo, mas adapta suas necessidades a ele. Portanto, o homem das sociedades modernas domina o tempo, o homem das sociedades antigas não domina. Sobre o processo de socialização cultural, a autora argumenta que o meio no qual o indivíduo se encontra dita regras, costumes e modos de agir. Essa preposição pode ser ampliada para as relações sociais que o indivíduo cultiva durante toda a sua vida. Os processos de assimilação cognitiva também perpassam as relações sociais. Assim, também existe algo de inativista no modo de lidar com os processos interpessoais/emocionais, não sendo apenas o entrelaçamento cultural, mas socioafetivo. O desdobramento do processo de culturalização também apresenta sua aversão. Dessa forma, o indivíduo classifica o estranho e o diferente como inferior. Isso ocorreu ao longo da história e foi utilizado como narrativas para a perpetuação do poder e da hegemonia de pessoas, grupos e sociedade em detrimentos dos outros. O processo pelo qual existe o estranhamento (e posteriormente a subtração e subversão da cultura do outro) é conhecido por etnocentrismo, como pontua Roque Laraia (2001). Na página 17, a autora cita que as esferas de poder, sendo elas de três tipos, constituem alicerces de inclusão ou exclusão da própria cultura. O problema está no subentendimento do conceito de cultura, cunhado anteriormente pela própria autora. Ela diz que em sociedades hierarquizadas e elitizadas, existe uma espécie de limitação cultural que restringe determinados fenômenos a pequenos grupos. Isso seria melhor explicado se o conceito de cultura fosse lembrado como amplo. A exemplo, podemos citar a apreciação de musicas clássicas por pessoas de comunidades. Ou até mesmo o contrário. O rap e o funk é um tipo de cultura pertencente a determinado grupo dentro do contexto no qual ele está inserido. Quando Maria Arruda fala em cultura e educação, é percebido novamente a presença do trabalho como intermediador cultural. Para ela, é o trabalho que se criam relações sociais, modelos de comportamentos, instituições e saberes. Isso obviamente acontece sim no trabalho, da contemporaneidade. Por outro lado, evidentemente que a religião e outros grupos sociais também sejam progenitores de relações sociais (inclusive com o sentimento de pertencimento pela crença), a criação de instituições, modelos de comportamentos etc. Essa recorrência do trabalho enquanto produto da cultura, frequentemente apontado por Aranha, também parte do pressuposto que a narrativa da autora obedece à lógica da qual ela compôs seus estudos e referenciais epistemológicos, sendo parte da filosofia. Pela utilização de expressões como “dialético”, “trabalho” e “cultura”, o pensamento colocado no texto se assemelha a construção da historiográfica do materialismo histórico- científico. Por isso, é observável a recorrência da ideia de trabalho como força motriz utilizada para observa as superestruturas da sociedade geral, como a cultura, a educação e a socialização humana. Na continuidade do texto, a autora se restringe a analisar os processos da educação relacionados com a ideia de produção material. Para a autora, a educação é um produto da produção do trabalho humano. É interessante quando analisamos a desigualdade social como fator de exclusão e evasão escolar. No entanto, a educação não pode ser colocada necessariamente como um produto da produção capitalista. Ela faz uma análise sobre a educação no brasil atual, e como os processos de políticas públicas para valorização educacional ainda são escassas. Nesse momento, é importante observar o contexto que a autora escreveu o texto. Ela cita que é inexistente uma organização do sistema de ensino no Brasil. Possivelmente, o texto foi escrito antes da criação da Lei de Diretrizes e Bases em 1996, uma vez que essa lei desenvolve justamente essa organização da educação básica. Outra prova disso é a própria nomenclatura de 1º e 2º grau. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS https://seer.ufu.br/index.php/che/article/view/29201/16167 https://seer.ufu.br/index.php/che/article/view/29201/16167 Laraia, Roque de Barros, 1932- 1.331c Cultura: uni conceito antropológico / Roque 14.ed. de Barros Laraia. — 14.ed. — Rio de Janeiro: Jorge "Zahar Ed., 2001 (Antropologia social)