Prévia do material em texto
67 FENOMENOS DE TRANSPORTE 4 - UFSCar Prof. Roger Valeri Daleffe - Período: 2º Sem. 2007. Alunos: 41. Turma: 102040 A. Quarta (14h) AULA VIII 8. CAMADA LIMITE (Escoamentos Externos) 8.1 O Conceito da Camada Limite O conceito de camada-limite foi introduzido originariamente em 1904, por Ludwig Prandtl, um alemão estudioso da aerodinâmica. Prandtl mostrou que muitos escoamentos viscosos podem ser analisados dividindo o escoamento em duas regiões, uma perto das fronteiras sólidas e a outra cobrindo o resto do escoamento. Apenas na delgada região adjacente a uma fronteira sólida (a camada-limite) o efeito da viscosidade é importante. Na região fora da camada-limite o efeito da viscosidade é desprezível, e o fluido pode ser tratado como não-viscoso. O conceito de camada-limite forneceu o elo que faltava entre a teoria e a prática (principalmente, ele introduziu a possibilidade teórica do arrasto*). Além disso, o conceito de camada-limite permitiu a solução de problemas de escoamentos viscosos, o que seria impossível pela aplicação das equações de Navier-Stokes ao campo completo do escoamento. Desse modo, a introdução do conceito de camada-limite marcou o começo da era moderna da mecânica dos fluidos. *Na dinâmica dos fluidos, arrasto é a força (FA) que faz resistência ao movimento de um objeto sólido através de um fluido (um líquido ou gás). O arrasto é composto de forças de fricção (atrito), que agem em direção paralela à superfície do objeto (primariamente pelos seus lados, já que as forças de fricção da frente e de trás se anulam), e de forças de pressão, que atuam em uma direção perpendicular à superfície do objeto (primariamente na frente e atrás, já que as forças de pressão se cancelam nas laterais do objeto). 21 2 A AF C Vρ= A “F A nada mais é que a força que o escoamento exerce sobre o corpo em sua própria direção.” O coeficiente de arrasto CA (também chamado de coeficiente de resistência aerodinâmica, Cx) e por vezes apelidado simplesmente coeficiente aerodinâmico ou ainda de coeficiente de atrito superficial (Cf) permite quantificar a força de resistência ao ar por parte de uma dada superfície. Um objeto caindo em um gás ou líquido é sujeito a uma força em sentido oposto ao seu movimento. A velocidade terminal é alcançada quando a força de arrasto é igual em módulo à força da gravidade que empurra o objeto para baixo. http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/d/d2/Terminal_Velocity.png� 68 Na camada-limite, tanto as forças viscosas quanto as forças de inércia são importantes. Por conseguinte, não é surpreendente que o número de Reynolds (que representa a razão entre as forças de inércia e as forças viscosas) seja significativo na caracterização dos escoamentos em camada limite. O comprimento característico usado no número de Reynolds ou é o comprimento na direção do escoamento no qual a camada-limite se desenvolveu ou é alguma medida da espessura da camada-limite. Como acontece nos escoamentos em dutos, o escoamento de camada-limite pode ser laminar ou turbulento. Não há valor único do número de Reynolds para o qual ocorre a transição de escoamento laminar para turbulento em uma camada-limite. Entre os fatores que afetam a transição de camada-limite estão o gradiente de pressão, a rugosidade superficial, a transferência de calor, as forças de campo e as perturbações da corrente livre. Considerações detalhadas desses efeitos estão além dos nossos objetivos aqui. Em muitas situações de escoamento real, uma camada-limite se desenvolve sobre uma superfície longa, essencialmente plana. A borda da camada-limite, com espessura indicada por δ(x), não pode ser observada em um escoamento real; ela será definida arbitrariamente como o conjunto de pontos nos quais a velocidade é igual a 99% da velocidade da corrente livre (a velocidade da corrente livre é a velocidade do escoamento não-viscoso, U∞), como mostrado na Figura 1. Assim, a camada limite é definida como a região próxima ao sólido em que o fluido “sente” a presença do sólido, ou ( ) ( ) 0,99 U x x U δ ∞ = = (109) Figura 1: Definição de espessura de uma camada-limite. 69 A camada limite começa com um escoamento laminar de espessura zero na borda frontal de uma placa plana, como mostrada na Figura 2, ou com uma espessura finita no ponto de estagnação de um objeto rombudo ou aerofólio (Figura 3). Figura 2: Camada-limite com transição Figura 3: Escoamento ao redor de um corpo rombudo e um corpo carenado. 70 Após uma distância xT que depende da velocidade da corrente livre, da viscosidade, do gradiente de pressão, da rugosidade da parede, do nível de flutuação na corrente livre e da rigidez da parede, o escoamento laminar passa por um processo de transição que resulta, após uma pequena distância, em escoamento turbulento, como representado. Para o escoamento sobre placas rígidas lisas com baixa intensidade de flutuação na corrente livre com gradiente de pressão zero, 5 ,Re 5 10 T x c U xρ μ∞= = × (110) Para o escoamento sobre placas rígidas rugosas ou com alta intensidade de flutuação na corrente livre com gradiente de pressão zero, 5 ,Re 3 10 T x c U xρ μ∞= = × (111) A grandeza U xρ μ∞ é o número de Reynolds local e T U xρ μ∞ é o número de Reynolds crítico. O escoamento até xT é considerado laminar e, após xT turbulento, pois a região de transição normalmente é curta e por isso, ignorada nos cálculos. 8.2 Equações para o perfil de velocidades na camada-limite laminar sobre uma placa plana Considerações: - camada limite bidimensional (x e y); - fluido incompressível; - escoamento em regime permanente; - forças de campo desprezíveis. Simplificando as equações do Balanço Diferencial de Massa e do Balanço Diferencial de Quantidade de Movimento (Equação de Navier-Stokes na direção x), e aplicando a Resolução de Blasius, obtemos as equações para os perfis de velocidade em x e em y: x df U U dη∞= 1 2 y U df U f x d ν η η∞ ⎛ ⎞= −⎜ ⎟⎝ ⎠ U y x η ν ∞= ⋅ 2 2s U d f U x d τ μ ν η∞∞= ⋅ (112) Na parede 0,332s U U x ρμτ ∞∞= (113) sendo que as variáveis η, f , df dη e 2 2 d f dη são obtidas da Tabela 1, a seguir: 71 Tabela 1: Funções da camada limite para uma placa plana Nomenclatura para as Equações (112): U = u e U∞ = u∞. Equações adicionais: 1/2 , 1/2 , 2 0,664 0,664Re 2 s x f x x U x C U τ ρ ρ μ − −∞ ∞ ⎛ ⎞≡ = =⎜ ⎟⎝ ⎠ (coeficiente de atrito superficial local, laminar) 1/2 , 1/2 , 2 1,328 1,328Re 2 s x f x x U x C U τ ρ ρ μ − −∞ ∞ ⎛ ⎞≡ = =⎜ ⎟⎝ ⎠ (coeficiente de atrito superficial médio, laminar) 5 5 / Rex x U x δ ν∞= =⋅ (espessura da camada limite, laminar) 1/5 1/5 , 0,0592 0,0592Ref x x U x C ρ μ − −∞⎛ ⎞= =⎜ ⎟⎝ ⎠ (coeficiente de atrito superficial local, turbulento, Rex < 10 8 ) 1/5 1 , 0,074 Re 1742 Ref L LC −= − L− (coef. de atrito superficial médio, mixto (lam+turb), Rex,c = 5×105, ReL < 108) 1/5 , 0,074 Ref L LC −= (coef. de atrito superficial médio, mixto (lam+turb), Rex,c = 5×105, ReL < 108)* 1/50,38 Rexxδ −= ⋅ (espessura da camada limite, mixto (laminar+turbulento))* *Consideração quando L >> xT (camada laminar muito curta) A força de arraste é dada por: 2, 1 2 A f xF C U Aρ ∞= 72 Exemplo 30: Estime a espessura da camada-limite na extremidade de uma superfície plana de 4 m de comprimento, caso a velocidade do escoamento livre seja U∞ = 5 m/s. Utilize ar atmosférico a 30ºC. Calcule também a força de arrasto, caso a superfície tenha 5 m de largura. (a) Despreze a porção laminar do escoamento e (b) leve em conta a porção laminar usando Recrít = 5 X 10 5 . Exemplo 31: O ar atmosférico a 30 ºC escoa sobre uma placa plana de 8 m de comprimento e 2 m de largura, a 2 m/s. Suponhaque exista escoamento laminar na camada-limite em todo o comprimento. Em x = 8 m, calcule (a) o valor máximo de Ux, (b) o cisalhamento na parede e (c) a vazão na camada. (d) Além disso, calcule a força de arrasto sobre a placa.