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POLÍTICAS E PROGRAMAS PARA A ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO ESCOLAR Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS Autoria: Larissa Bueno Ferreira. CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Carlos Fabiano Fistarol Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Jóice Gadotti Consatti Norberto Siegel Camila Roczanski Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Marcelo Bucci Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Copyright © UNIASSELVI 2019 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: F383p Ferreira, Larissa Bueno Políticas e programas para a alimentação e nutrição escolar. / Larissa Bueno Ferreira. – Indaial: UNIASSELVI, 2019. 165 p.; il. ISBN 978-85-7141-295-8 1.Nutrição escolar – Brasil. 2.Alimentação escolar – Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CDD 371.716 Sumário APRESENTAÇÃO ....................................................................05 CAPÍTULO 1 O que Devo Saber Sobre o Estado Nutricional e a Alimentação do Pré-Escolar e Escolar? ..........................07 CAPÍTULO 2 Políticas e Programas Nacionais de Alimentação e Nutrição do Escolar ............................................................67 CAPÍTULO 3 Educação Nutricional: Estratégias e Desafios Atuais ...123 APRESENTAÇÃO Prezado acadêmico! A disciplina Políticas e Programas para a Alimentação e Nutrição Escolar do curso Educação Alimentar e Nutricional na Educação Básica tem como objetivo contribuir para que você tenha uma capacitação qualificada com conhecimento teórico e prático de qualidade e que te ofereça uma visão amp- la e coordenada sobre a gestão de pessoas que possam exercer o controle social, especialmente referente às políticas e aos programas de saúde voltados para a educação básica no Brasil, com enfoque para a Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) e o Programa Nacional de Alimentação do Escolar (PNAE). Desde o final da década de 1990, a PNAN vem se esforçando em conjun- to a outras políticas públicas para garantir a todos os indivíduos que os direitos humanos estejam integralmente preservados, assim como uma maior proteção e promoção da saúde e da alimentação. Do mesmo modo, o PNAE busca também garantir aos estudantes matriculados em escolas públicas uma alimentação esco- lar de qualidade e quantidade suficiente para suprir as suas necessidades, assim como estimular o desenvolvimento dos hábitos alimentares saudáveis que possam garantir um bom aprendizado e rendimento escolar satisfatório. Veremos neste módulo o quão importante é a execução das políticas e pro- gramas voltados para a alimentação saudável, especialmente destinada ao público infantojuvenil, como precursora de uma vida adulta mais duradoura e de uma pop- ulação mais saudável. Ademais, veremos adiante o período da transição nutricional que estamos vivendo e seus efeitos que já estão repercutindo nos sistemas públicos de saúde e na vida das pessoas, ou seja, saímos da linha expressiva da fome e en- tramos em uma fase do consumo inadequado de nutrientes que desencadeiam as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), evidenciadas no mundo todo. Diante desse contexto, as crianças são as melhores escolhas para pro- mover a educação nutricional e também são consideradas acessíveis para que ocorra a execução de intervenções educativas que modifiquem o cenário das defi- ciências e excessos nutricionais instalados na sociedade moderna. Uma vez que é na infância que os hábitos alimentares são estabelecidos, por ser essa fase um momento de intenso desenvolvimento físico, cognitivo e psicológico, logo é um período favorável para a adequação e a preservação das escolhas alimentares saudáveis a longo prazo. Veremos também que em determinado momento da infância, a criança passa a ter o convívio com pessoas externas a sua família e, geralmente, esse pri- meiro ambiente é a comunidade escolar. Veremos que a escola, além de exercer um papel de destaque na formação educacional do indivíduo, contribui para as es- colhas alimentares, comportamentais e sociais da criança. Dessa forma, torna-se um local importante para o desenvolvimento de estratégias, oficinas e atividades direcionadas para as escolhas saudáveis e adequadas para a formação humana em toda a sua complexidade. Para promover um maior entendimento e interação, este livro está dividido em três capítulos, a ideia é que possamos dialogar e estimular em você o desejo de aprofundar os seus conhecimentos e despertar o seu senso crítico. Afinal de contas, um bom profissional é aquele que consegue ver além com a capacidade constante de se autoavaliar, revendo conceitos e ampliando oportunidades para ser melhor sempre! Cada capítulo está organizado por objetivos, referencial teórico, atividades de estudo, pesquisas e recomendações de aprofundamento sobre a temática proposta. O primeiro capítulo abordará a transição nutricional e as principais compli- cações de saúde no período escolar provenientes do comportamento alimentar, as- sim como apresentar a você uma caracterização, necessidades, recomendações e desafios nutricionais da criança no período pré-escolar e escolar. No segundo capítulo, conceituaremos e discutiremos a PNAN e o PNAE, apresentando os princípios e as diretrizes e também elucidaremos os processos de gestão e operacionalização dos recursos e repasses financeiros dos programas de alimentação e nutrição do escolar. Por último, no terceiro capítulo, encerraremos discutindo sobre o desen- volvimento dos hábitos alimentares saudáveis em todas as fases da vida, assim como as estratégias adotadas para incentivar e promover a educação nutricional, como as atividades lúdicas, a horta pedagógica, entre outras atividades que incen- tivem o desenvolvimento sustentável e também estudaremos sobre a agricultura familiar como precursora de uma alimentação nutritiva e com impacto positivo na vida de várias famílias e na comunidade de maneira geral. Esperamos que desfrute de maneira consciente esse material preparado exclusivamente para você! A educação nutricional vai muito além dessas páginas e esperamos contribuir ativamente na sua motivação e na sua capacidade de con- tinuar os estudos acreditando sempre no seu potencial de ir cada vez mais longe, melhorando a vida das pessoas ao seu redor. Que todo esse conhecimento seja contínuo, permanente e transformador para a educação alimentar e nutricional, especialmente, para todas as crianças do Brasil. CAPÍTULO 1 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? A partir da perspectiva do saber-fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: Contextualizar as escolhas alimentares atuais e pregressas com a transição nutricional. Apontar de forma segura e precisa as principais recomendações nutricionais na fase do crescimento e desenvolvimento do ser humano, que contempla especialmente o período pré-escolar e escolar. Conduzir e avaliar o atendimento e/ou a orientação nutricional de maneira mais assertiva, com respaldo científi co. Desenvolver o senso crítico e a habilidade de analisar os diferentes cenários e as escolhas alimentares na infância. 8 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar 9 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 1 CONTEXTUALIZAÇÃO Neste capítulo, abordaremos de maneira global os desafi os atuais da tran- sição nutricional, o impacto das mudanças alimentares no crescimento e no desen- volvimentodas crianças, características gerais, necessidades e recomendações, especialmente na idade pré-escolar e escolar. Discutiremos, ainda, as transformações ocorridas em diversos países, como a queda expressiva dos casos de desnutrição e aumento acelerado da obe- sidade, cenário este que muda a ótica do problema, o que não signifi ca que as medidas a serem tomadas para a recuperação, a manutenção e a promoção da saúde sejam menos relevantes comparadas a períodos anteriores, uma vez que coexistem ainda os défi cits nutricionais com o ganho elevado de peso, assim como as carências de micronutrientes com doenças crônicas não transmissíveis. Além disso, procuramos trazer também para a discussão as perspecti- vas para o futuro, as estratégias a serem utilizadas para auxiliar as famílias, as escolas e a população de maneira geral, pautadas nas recomendações dos prin- cipais órgãos e instituições de saúde, como a Organização Mundial de Saúde, o Ministério da Saúde, a Sociedade Brasileira de Pediatria e demais documentos científi cos e diretrizes relevantes. Assim, este capítulo apresenta a você as principais características e neces- sidades nutricionais dos pré-escolares e escolares, bem como as recomendações e as orientações: a importância da formação de hábitos e comportamentos alimen- tares saudáveis e em equilíbrio com as etapas do crescimento e desenvolvimento infantil, a manutenção da saúde do indivíduo e as repercussões das escolhas ali- mentares, enquanto criança, em todas as demais fases da vida. Por último, sugerimos que você, ao realizar a leitura do capítulo, faça si- multaneamente as leituras indicadas ao longo de todo o texto. Esses materiais auxiliarão ainda mais o entendimento e a consolidação dos conceitos, além de serem um suporte interessante para o seu estudo e aprendizado. Boa leitura! 10 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar 2 TRANSIÇÃO NUTRICIONAL E PRINCIPAIS COMPLICAÇÕES DE SAÚDE NO PERÍODO ESCOLAR PROVENIENTES DO COMPOR- TAMENTO ALIMENTAR 2.1 Transição Nutricional A Organização Mundial da Saúde (OMS) determinou como Epidemia Global da Obesidade as transformações ocorridas em diversos países, caracterizadas pela diminuição da desnutrição e acelerado aumento da obesidade. Esta condição nutricional tem afetado tanto adultos como crianças no mundo todo (WHO, 2016). Segundo Santos et al. (2010, p. 26), “a coexistência de défi cit nutricional com excesso de peso, assim como da carência de micronutrientes com doenças crônicas não transmissíveis, caracteriza a chamada transição nutricional”. A população brasileira encontra-se num momento de transição do ponto de vista demográfi co, social, epidemiológico e nutricional em dois extremos da má nutrição: desnutrição pela carência e obesidade pelo excesso, que compartilham o mesmo cenário (SBP, 2012). A população brasileira encontra- se num momento de transição do ponto de vista demográfi co, social, epidemiológico e nutricional em dois extremos da má nutrição: desnutrição pela carência e obesidade pelo excesso, que compartilham o mesmo cenário (SBP, 2012). A transição nutricional está associada a uma complexa rede de mudanças nos padrões demográfi co, socioeconômico, ambiental, agrícola e de saúde, envolvendo, ainda, fatores como: urbanização, distribuição de renda, crescimento da economia, incorporação de tecnologias e alterações socioculturais. Os sistemas alimentares, incluindo os processos de produção, modifi cação, distribuição, propaganda e consumo de alimentos, estão fortemente relacionados à transição nutricional e precisam ser reposicionados para não apenas ofertar alimentos, mas, sim, promover dietas mais saudáveis e sustentáveis para todos (WHO, 2016). A Figura 1 apresenta algumas mudanças na composição corporal de crianças nas últimas pesquisas nacionais, apontando os resultados da transição nutricional. 11 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 FIGURA 1 – VALORES DE PREVALÊNCIA DA TRANSIÇÃO NUTRICIONAL NAS ÚLTIMAS PESQUISAS NACIONAIS Défi cit de altura Défi cit de peso Défi cit de peso Défi cit de altura Excesso de peso Excesso de peso Obesidade Obesidade 29,3 14,7 7,2 5,7 2,2 4,3 10,9 15,0 34,8 2,9 4,1 16,6 26,7 12,8 6,3 5,4 1,5 3,9 8,6 11,9 32,0 1,8 2,4 11,8 Masculino Feminino Prevalência de défi cit de altura, défi cit de peso, excesso de peso e obesidade na população de 5 a 9 anos, por sexo. Brasil - 1974-1975, 1989 e 2008-2009 40 35 30 25 20 15 10 5 0 ENDEF 1974 -1975 PNSN 1989 POF 2008-2009 Transição Nutricional FONTE: IBGE (2010) Esse processo transicional apresenta alguns aspectos. Dentre eles, um dos mais relevantes foi o intenso declínio da desnutrição infantil, a qual podemos listar alguns benefícios, como o controle microbiológico mais apurado a partir do desenvolvimento tecnológico e científi co, alimentos com durabilidade por períodos prolongados, entre outros. No entanto, podem surgir fatores que contrapõem os benefícios desse processo, em particular, mudanças de ordem socioeconômicas, que fazem com que “as prevalências do excesso de peso, que já superam as de desnutrição, apareçam como indicativo de um comportamento epidêmico de saúde na população infantil” (MENEZES et al., 2018, p. 231). Vale ressaltar que, ao longo da última década, o interesse pela nutrição foi crescendo de forma constante com alguns marcos importantes: • Em 2012, a Assembleia Mundial da Saúde adotou as Metas Globais para 2025 de Nutrição de Mães, Lactantes e Crianças Pequenas. • Em 2013, o mesmo órgão adotou metas para as doenças crônicas não transmissíveis. 12 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar • Ainda em 2013, na 1ª Cúpula da Nutrição para o Crescimento (Nutrition for Growth, N4G), os doadores consignaram US$ 23 bilhões para ações que melhorem a nutrição. • Em 2014 houve a Segunda Conferência Internacional sobre Nutrição (International Conference for Nutrition, ICN2), e com a recente indicação do período entre 2016 e 2025, como a Década da Ação sobre a Nutrição das Nações Unidas, mais pessoas começaram a reconhecer a importância de combater todas as formas de má nutrição. • Em 2015, os objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU consagraram o objetivo de acabar com todas as formas de má nutrição até 2030 (IFPRI, 2016). INTERNATIONAL FOOD POLICY RESEARCH INSTITUTE (IFPRI). Global Nutrition Report 2016: from promise to impact: ending malnutrition by 2030. Washington: IFPRI, 2016. Segundo o relatório sobre a nutrição mundial de 2016, se continuarmos a fazer o mesmo de sempre, não veremos as metas globais serem cumpridas. No entanto, essa avaliação apresenta algumas surpresas positivas. Muitos países estão em vias de cumprir as metas relacionadas ao atraso no crescimento, à emaciação, ao sobrepeso em crianças menores de cinco anos e ao aleitamento materno exclusivo. Quase todos os países, porém, estão longe de cumprir as metas com relação à anemia entre as mulheres, ao sobrepeso em adultos, ao diabetes e à obesidade. Crescentes em todas as regiões e em quase todos os países, a obesidade e o sobrepeso são hoje um desafi o global alarmante. O número de crianças menores de cinco anos com sobrepeso está muito perto daquelas crianças que sofrem de emaciação. Por outro lado, nessa mesma faixa etária, o atraso no crescimento está diminuindo em todas as regiões, exceto na África e na Oceania; e o número de crianças menores de cinco anos com sobrepeso cresce em maior velocidade na Ásia (IFPRI, 2016). Muitos países estão em vias de cumprir as metas relacionadas ao atraso no crescimento, à emaciação, ao sobrepeso em crianças menores de cinco anos e ao aleitamento materno exclusivo. Quase todos os países, porém, estão longe de cumprir as metas com relação à anemia entre as mulheres, ao sobrepeso emadultos, ao diabetes e à obesidade. 13 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 Frente a isso, considerando o panorama mundial, no Canadá, na Austrália e parte da Europa, as taxas de aumento de excesso de peso na população infantil, na década de 1990, alcançaram 1% ao ano e, como refl exo desse crescimento, observou-se que essas localidades e outras, como Estados Unidos e México, ultrapassaram os 20% de crianças diagnosticadas com sobrepeso e obesidade (PEREIRA et al., 2017). No documentário “Muito além do peso”, lançado em 2012, o famoso chefe de cozinha e apresentador de TV Jamie Oliver diz que: “Nós, adultos das últimas gerações, abençoamos nossas crianças com uma expectativa de vida menor do que a nossa. Seu fi lho vai viver dez anos a menos do que você por causa do ambiente alimentar que construímos”. A declaração, um tanto quanto alarmante, é contundente com os resultados demonstrados na Figura 2, retirada do mesmo documentário e que refl ete o cenário mundial para excesso de peso entre as crianças ao redor do mundo. O famoso chefe de cozinha e apresentador de TV Jamie Oliver diz que: “Nós, adultos das últimas gerações, abençoamos nossas crianças com uma expectativa de vida menor do que a nossa. Seu fi lho vai viver dez anos a menos do que você por causa do ambiente alimentar que construímos”. O documentário “Muito além do peso” pode ser acessado no link a seguir: <https://www.youtube.com/watch?v=8UGe5GiHCT4>. No Chile, entre 1987 e 2000, em crianças de seis anos, verifi cou-se a prevalência de 12% para 26% em meninos e de 14% para 27% em meninas; na China, a prevalência de sobrepeso e obesidade em crianças dessa mesma idade aumentou de 7,7% para 12,4% em um período de tempo bastante reduzido, entre 1991 e 1997. Já no ano de 2011, cerca de 101 milhões de crianças menores de 5 anos de idade apresentavam baixo peso, ao passo que, em 2013, estimou-se que 42 milhões de crianças no mundo (6,3%), nessa mesma faixa etária, estavam acima do peso (PEREIRA et al., 2017). 14 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar FIGURA 2 – PORCENTAGEM DE CRIANÇAS COM SOBREPESO E OBESIDADE NO CENÁRIO MUNDIAL FONTE: <https://www.youtube.com/watch?v=8UGe5GiHCT4>. Acesso em: 22 nov. 2018. “O excesso de peso na infância confi gura-se como problema emergente de saúde pública no mundo todo, merecendo especial atenção nos países em desenvolvimento, onde as prevalências do baixo peso ao nascer e a desnutrição aguda e crônica ainda são presentes em maiores proporções” (MENEZES et al., 2018, p. 231). Corroborando os últimos achados, segundo a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF 2008-2009) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografi a e Estatística (IBGE), em parceria com o Ministério da Saúde, o Brasil apresentou um crescimento relevante no número de crianças acima do peso, principalmente na faixa etária entre 5 e 9 anos de idade. O número de meninos com peso excessivo mais que dobrou no período entre 1989 e 2009, passando de 15% para 34,8%, respectivamente (Gráfi co 1). Já o número de obesos teve um aumento de mais de 300% nesse mesmo grupo etário, indo de 4,1% em 1989 para 16,6% em 2008-2009 (Gráfi co 2). Entre as meninas, esta variação foi ainda maior. Especifi camente com relação ao sobrepeso e à obesidade em crianças de 5 a 9 anos, as prevalências foram de 23,9% e 13,7%, respectivamente, no sexo masculino e 23,4% e 10% no sexo feminino, e em pouco mais de 30 anos. Ainda em 2009, uma em cada três crianças, na mesma faixa etária (5 a 9 anos) estava acima do peso recomendado pela OMS. A parcela dos meninos e rapazes de 10 a 19 anos de idade com excesso de peso passou de 3,7% (1974-1975) para 21,7% (2008-2009), já entre as meninas e as moças, o crescimento do excesso de peso foi de 7,6% para 19,4% (IBGE, 2010). “O excesso de peso na infância confi gura-se como problema emergente de saúde pública no mundo todo, merecendo especial atenção nos países em desenvolvimento, onde as prevalências do baixo peso ao nascer e a desnutrição aguda e crônica ainda são presentes em maiores proporções” (MENEZES et al., 2018, p. 231). 15 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 Já o défi cit de altura observado em crianças de 5 a 9 anos (importante indicador de desnutrição) caiu de 29,3% entre os anos de 1974-1975 para 7,2% nos anos pesquisados entre 2008-2009 nos meninos e de 26,7% para 6,3% nas meninas, com destaque na zona rural da Região Norte: 16% dos meninos e 13,5% das meninas. A pesquisa também traz informações sobre as crianças menores de 5 anos: o défi cit de altura foi de 6% no país, sendo mais signifi cativo em meninas no primeiro ano de vida (9,4%), crianças da Região Norte (8,5%) e na faixa mais baixa de rendimentos (8,2%) (IBGE, 2010). GRÁFICO 1 – EVOLUÇÃO DA FREQUÊNCIA DO SOBREPESO ENTRE CRIANÇAS E ADOLESCENTES 1974-1975 1989 2002-2003 2008-2009 40 35 30 25 20 15 10 5 0 10,9 15,0 34,8 32,0 11,9 8,6 3,7 7,7 16,7 21,7 7,6 13,9 15,1 19,4 Masculino 5-9 anos Masculino 10-19 anos Feminino 10-19 anosFeminino 5-9 anos FONTE: IBGE (2010) GRÁFICO 2 – EVOLUÇÃO DA FREQUÊNCIA DA OBESIDADE ENTRE CRIANÇAS E ADOLESCENTES 1974-1975 1989 2002-2003 2008-2009 2,9 4,1 16,6 11,8 1,8 2,4 0,4 1,5 4,1 5,9 0,7 2,2 3,0 4,0 Masculino 5-9 anos Masculino 10-19 anosFeminino 5-9 anos Feminino 10-19 anos 18,0 16,0 14,0 12,0 10,0 8,0 6,0 4,0 2,0 0,0 FONTE: IBGE (2010) 16 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar Observa-se que tanto o excesso de peso quanto a obesidade são classifi cações do estado nutricional encontrados com grande frequência a partir de 5 anos de idade, em todos os grupos de renda e em todas as localidades brasileiras. Já o défi cit de altura nos primeiros anos de vida está concentrado em famílias mais pobres e, do ponto de vista geográfi co, na Região Norte. Esses são alguns dos resultados que foram listados na seção de Antropometria e Estado Nutricional da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2008-2009, realizada em parceria entre o IBGE e o Ministério da Saúde. As entrevistas foram realizadas com 55.970 indivíduos em todos os estados e Distrito Federal. Aferiram-se as medidas de peso e altura para a utilização do índice de massa corporal. No total, foram analisadas mais de 188 mil pessoas de todas as idades. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, uma em cada dez crianças em todo o mundo é obesa, o que representa cerca de 155 milhões de pessoas (OMS, 2013). No Brasil, uma pesquisa da Associação Brasileira para Estudos de Obesidade mostra que a obesidade infantil triplicou nos últimos vinte anos. Atualmente, quase 15% das crianças estão acima do peso e 5% são obesas. A projeção para 2025 é que cerca de 2,3 bilhões de adultos estejam classifi cados com sobrepeso e mais de 700 milhões como obesos. O número de crianças com sobrepeso e obesidade no mundo poderia chegar a 75 milhões, caso medidas preventivas não sejam estabelecidas (ABESO, 2016). Adicionalmente, em uma revisão conduzida por Pedraza et al. (2017), o panorama do excesso de peso da população em geral variou entre 25% e 30% nas Regiões Norte e Nordeste, e entre 32% e 40% nas Regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Além disso, a pesquisa apontou que a população brasileira vem sofrendo intensas mudanças no perfi l alimentar, caracterizada principalmente pela diminuição no consumo de alimentos saudáveis, atrelada ao aumento da ingestão de alimentos ultraprocessados. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, uma em cada dez crianças em todo o mundo é obesa, o que representa cerca de 155 milhões de pessoas (OMS, 2013) A projeção para 2025 é que cerca de 2,3 bilhões de adultos estejam classifi cados com sobrepeso e mais de700 milhões como obesos. O número de crianças com sobrepeso e obesidade no mundo poderia chegar a 75 milhões, caso medidas preventivas não sejam estabelecidas (ABESO, 2016). Historicamente, o consumo de alimentos processados/ ultraprocessados e com baixo valor nutricional teve início com a automatização e o aprimoramento das linhas de produção da indústria alimentar, a qual começou no período entre guerras. 17 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 1 Por que consumimos produtos ultraprocessados e quais as vantagens e as desvantagens desses alimentos? R.: ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Outra questão importante que modula as escolhas alimentares atuais está intimamente relacionada ao tempo e ao espaço. A globalização e o crescente desenvolvimento econômico e social modifi caram a estruturação da dinâmica doméstica, que em anos anteriores era vista como um modelo tradicional da fi gura feminina organizando as escolhas e as preparações alimentares, no entanto, as múltiplas atribuições da mulher na família e no trabalho, a inversão de papéis nos diferentes cenários, possibilitaram a substituição de alimentos in natura ou minimamente processados, por alimentos ultraprocessados e/ou refeições fora de casa. Defi nição dos grupos de alimentos processados e ultraprocessados, de acordo com o Guia Alimentar do Ministério da Saúde de 2014: Alimentos processados: são aqueles fabricados pela indústria, com a adição de sal, açúcar ou outra substância de uso culinário nos alimentos in natura, para torná-los duráveis e mais agradáveis ao paladar, como os extratos ou concentrados de tomate. Estes são produtos derivados diretamente de alimentos e são reconhecidos como versões dos alimentos originais. Alimentos ultraprocessados: são formulações industriais feitas inteira ou majoritariamente de substâncias extraídas de alimentos (óleos, gorduras, açúcar, amido, proteínas), derivadas de 18 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar constituintes de alimentos (gorduras hidrogenadas, amido modifi cado) ou sintetizadas em laboratório com base em matérias orgânicas, como petróleo e carvão (corantes, aromatizantes, realçadores de sabor e vários tipos de aditivos usados para dotar os produtos de propriedades sensoriais atraentes). Exemplos: biscoitos, sorvetes, balas, misturas para bolo, barras de cereal, sopas, macarrão e temperos “instantâneos”. FONTE: BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Guia alimentar para a população brasileira. 2. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2014. Disponível em:<http://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2014/ novembro/05/Guia-Alimentar-para-a-pop-brasiliera-Miolo-PDF-Internet. pdf>. Acesso em: 22 nov. 2018. Fique atento! Para tornar os produtos mais duradouros, tanto no quesito da cor e palatabilidade, ou para encobrir sabores indesejáveis de aditivos, alguns ingredientes são adicionados em maior quantidade, por exemplo, sal, açúcar, gorduras saturadas e hidrogenadas. Por isso, é fundamental que tanto o profi ssional de saúde quanto o consumidor leiam o rótulo para não cair nas armadilhas da indústria alimentícia, uma vez que muitas empresas utilizam nomes técnicos, como carboidrato ao invés de açúcar, para mascarar as quantidades de determinados componentes e assim persuadir o indivíduo a comprar sem questionar os prejuízos para a sua saúde. Hernandes e Valentini (2010) apontam que os fatores de grande infl uência nas causas do sobrepeso da criança podem ser atribuídos ao aumento no consumo de produtos ricos em gorduras com alto valor calórico, diminuição da prática de exercícios físicos, tempo de tela diária e avanços na tecnologia da sociedade moderna. A prática de assistir à televisão durante várias horas por dia, os jogos eletrônicos e o abandono da amamentação são fatores que devem ser considerados na determinação do crescimento da obesidade infantil. Os fatores de grande infl uência nas causas do sobrepeso da criança podem ser atribuídos ao aumento no consumo de produtos ricos em gorduras com alto valor calórico, diminuição da 19 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 Diante disso, destaca-se uma ferramenta que vem exercendo efeitos deletérios na saúde, especialmente de crianças, a propaganda de alimentos. O documentário “Criança, a Alma do Negócio”, produzido em 2008 no Brasil, representa o cenário atual que vivemos. A cineasta Estela Renner analisa e apresenta de maneira clara e objetiva como a sociedade de consumo e as mídias de massa impactam na formação infantil, bem como nas escolhas alimentares e, ainda, como essa indústria descobriu que as crianças são os melhores alvos para vender um produto. Além de ouvi-las, o fi lme dialoga com os familiares dessas crianças, que contam sobre o poder de persuasão que o fi lho exerce nas escolhas de determinados produtos de consumo e o quanto essas escolhas têm ligação com as propagandas, além, é claro, da opinião de especialistas que debatem os efeitos negativos dessa exposição precoce. O documentário aponta ainda que a criança brasileira é a que mais apresenta tempo de tela, tendo como tempo médio de 5 horas por dia, enquanto que o tempo médio de permanência na escola é de 3 horas/dia (BOTELHO, 2016). Do total de informação veiculada ao público infantil no quesito alimentação, 80% são referentes a alimentos com altos teores de: açúcares, gorduras, sal, baixa qualidade nutricional e hipercalóricos. Pode-se dizer que se deu o início da era do imediatismo, da correria e da falta de tempo dos pais. O celular, a televisão, o computador e o tablet tornaram-se os companheiros favoritos do público infantil e de uma quantidade expressiva de adultos, exercendo papel socializador e infl uenciando, entre outras coisas, nas práticas alimentares. Enquanto os pais trabalham fora grande parte do tempo, as crianças fi cam expostas e dependentes ao que a mídia fala, exibe e ensina (CECCATO et al., 2018). prática de exercícios físicos, tempo de tela diária e avanços na tecnologia da sociedade moderna. A prática de assistir à televisão durante várias horas por dia, os jogos eletrônicos e o abandono da amamentação são fatores que devem ser considerados na determinação do crescimento da obesidade infantil. A criança brasileira é a que mais apresenta tempo de tela, tendo como tempo médio de 5 horas por dia, enquanto que o tempo médio de permanência na escola é de 3 horas/ dia Pode-se dizer que se deu o início da era do imediatismo, da correria e da falta de tempo dos pais. O celular, a televisão, o computador e o tablet tornaram-se os companheiros favoritos do público infantil e de uma quantidade expressiva de adultos, exercendo papel socializador e infl uenciando, entre outras coisas, nas práticas alimentares. 20 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar O documentário “Criança, a Alma do Negócio” pode ser acessado no link a seguir: <https://www.youtube.com/watch?v=ur9lIf4RaZ4>. “As crianças são o grande alvo de publicidades errôneas sobre alimentação, sendo frequentemente infl uenciadas a consumir os alimentos com alto teor de açúcar, gordura, sódioe baixo teor nutricional” (NICKEL et al., 2018, p. 41). 1 O que pode ser utilizado como estratégia para informar as crianças e protegê-las das informações inadequadas? R.: ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 21 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 No Brasil, não há ainda uma legislação específi ca para a regulamentação da publicidade e propaganda voltada para o público infantil. No entanto, os limites da propaganda são defi nidos no âmbito legal pela Constituição Federal, pelo Código de Defesa do Consumidor, no Estatuto da Criança e do Adolescente, no Código de Ética dos Profi ssionais de Publicidade e Propaganda e em resoluções, leis complementares e diretrizes lançadas por Organizações Não Governamentais (ONGs) e associações (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE AGÊNCIAS DE PUBLICIDADE, 2016). Uma das normas mais recentes e que mais polêmica gerou, desde sua edição, é a Resolução 163/14 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), órgão este responsável por formular, deliberar e controlar as políticas públicas para a infância e a adolescência, vinculado à Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República e formado por representantes do Governo Federal e de organizações não governamentais que trabalham na proteção a crianças e adolescentes (CECCATO et al., 2018).O CONANDA defi ne como abusiva toda e qualquer publicidade ou outro tipo de comunicação mercadológica direcionada ao público infantil com o intuito de persuadi-la ao consumo de produtos e serviços. No entanto, desde a sua edição em 2014, a Resolução foi objeto de discussões. Alguns dos dirigentes defenderam que o ato normativo é coerente com as funções do CONANDA, e outros defendem a ideia de que o órgão teria ultrapassado suas funções dentro da lei, invadindo a competência do Congresso Nacional, uma vez que essa diligência sobre a propaganda comercial é exclusiva da União legislar, tal como prevê o inciso XXIX do artigo 22 da Constituição Federal (BRASIL, 2016). É necessário cautela e atenção para debater esse tema tão delicado, como é o caso da publicidade destinada ao público infantil, devendo ser observada e respeitada a sensibilidade do público ao qual se dirige, tendo sempre o cuidado em ser coerente com o desenvolvimento cognitivo e faixa etária e, ao mesmo tempo, não infringir os direitos legais protegidos pela Constituição Federal, que é a liberdade de expressão. 22 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar As evidências anteriormente apontadas nos levam a refl etir como a construção dos hábitos alimentares na infância e comportamentos associados à alimentação podem modular o crescimento e o desenvolvimento humano em diferentes aspectos, comprometendo o equilíbrio e favorecendo o descontrole, como as escolhas alimentares, o ganho de peso e a composição corporal com repercussões negativas, levando aos chamados excessos. Subsidiando tais ideias, a Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO), além de vários outros estudos têm demonstrado que a obesidade está profundamente relacionada a um maior risco de desfechos, sejam cardiovasculares, câncer ou mortalidade. No National Health and Nutrition Examination Study III (NHANES III), que envolveu mais de 16 mil participantes, associou-se à obesidade um aumento da prevalência de diabetes tipo 2, dislipidemia, doença arterial, doença da vesícula biliar, hipertensão arterial sistêmica e osteoartrose (MELO, 2011). Na infância, a obesidade é fator de risco de grande importância, com repercussões negativas, como as doenças cardiovasculares na vida adulta, estando associada às alterações no estilo de vida, com destaque ao sedentarismo e ao consumo aumentado de açúcares e gorduras. Um agravo à saúde que tem seu início ainda na infância é a aterosclerose, caracterizada pelo depósito de colesterol nos vasos sanguíneos, formando placas de gordura. Essas placas gordurosas nas artérias coronarianas de crianças podem, em determinadas situações e em alguns indivíduos, progredir para lesões ateroscleróticas avançadas em períodos curtos ou em décadas (PSICOSSOCIAL I, 2010). De maneira complementar, Rodrigues et al. (2011) apontaram em seu estudo que a obesidade é uma condição considerada multifatorial, infl uenciada tanto pela questão genética quanto ambiental. O acúmulo de gordura corporal, sobretudo do tipo androide (Quadro 1) presente na idade escolar, podendo persistir também na adolescência, exerce efeitos deletérios nos aspectos fi siológicos e patológicos, aumentando as chances de mortalidade e morbidade na vida adulta. Além dos efeitos negativos sobre a saúde, a obesidade pode ocasionar problemas psiquiátricos, como a ansiedade e a depressão, a perda da autoestima e a falta de percepção da imagem corporal (HERNANDES; VALENTINI, 2010). 23 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 QUADRO 1 – CONCEITOS E DEFINIÇÕES DOS TERMOS REFERENTES AO ESTADO NUTRICIONAL DE PRÉ-ESCOLARES E ESCOLARES Conceito Defi nição Estado Nutricional É o resultado do equilíbrio entre o consumo de nutrientes e o gasto energético do organismo para suprir as necessidades nu- tricionais. O estado nutricional pode ter três tipos de manifes- tação orgânica: • Adequação Nutricional (Eutrofi a): manifestação produzida pelo equilíbrio entre o consumo e as necessidades nutricio- nais. • Carência Nutricional: manifestações produzidas pela insu- fi ciência quantitativa e/ou qualitativa do consumo de nutrien- tes com relação às necessidades nutricionais. • Distúrbio Nutricional: manifestações produzidas pelo ex- cesso e/ou desequilíbrio. Sobrepeso É o peso corporal que excede do peso normal ou padrão dos indivíduos da mesma raça e sexo baseado na altura, idade e constituição física. Obesidade É uma doença crônica, que envolve fatores sociais, compor- tamentais, ambientais, culturais, psicológicos, metabólicos e genéticos. Caracteriza-se pelo acúmulo de gordura corporal re- sultante do desequilíbrio energético prolongado, que pode ser causado pelo excesso de consumo de calorias e/ou inatividade física. A obesidade é considerada uma doença na qual a gor- dura se acumulou no organismo a tal ponto que a saúde pode ser afetada. Fenótipo da obesidade (tipo I) Caracterizada pelo excesso de massa corporal ou porcentagem de gordura distribuída por todo o corpo. Fenótipo da obesidade (tipo II) Constitui a forma androide e é caracterizada pelo acúmulo de gordura do tronco, particularmente no abdômen. FONTE: SISVAN (2004) 24 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar Os termos sobrepeso e obesidade são usados por muitos autores como se fossem sinônimos, no entanto, do ponto de vista técnico, conforme descrito no Quadro 1, possuem signifi cados distintos. Além disso, para realizar um diagnóstico correto da criança e determinar se ela se encontra em estado de sobrepeso ou obesidade, não basta simplesmente observá-la e compará-la a olho nu. É fundamental que critérios científi cos, revisados e aprovados pelos órgãos e conselhos de saúde estejam alinhados à conduta de acompanhamento e diagnóstico. Diante disso, tanto a OMS quanto o Ministério da Saúde recomendam a utilização de alguns índices antropométricos para classifi car o estado nutricionalde crianças e demais faixas etárias. A seguir, apresentamos os índices antropométricos recomendados para crianças em idade pré-escolar (2 a 6 anos) e escolar (7 a 10 anos). QUADRO 2 – ÍNDICES ANTROPOMÉTRICOS PARA CRIANÇAS EM IDADE PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR Crianças menores de 5 anos Crianças entre 5 a 10 anos Estatura/Idade Estatura/Idade Peso/Idade Peso/Idade Peso/Estatura - IMC/Idade IMC/Idade FONTE: SISVAN (2011) O SISVAN recomenda a classifi cação do Índice de Massa Corporal - IMC -, proposta pela Organização Mundial da Saúde, tanto para menores de 5 anos (WHO, 2006) como para crianças a partir dos 5 anos de idade (WHO, 2007). Importante destacar que as curvas de avaliação do crescimento para crianças dos 5 aos 19 anos foram lançadas recentemente pela OMS. Trata-se de uma releitura dos dados do NCHS de 1977, além de uma reestruturação das curvas no período de transição entre os menores de 5 anos de idade, avaliados segundo o estudo-base dos dados lançados em 2006, e os indivíduos a partir dos 5 anos. Desde 2009, a Coordenação Geral da Política de Alimentação e Nutrição do Ministério da Saúde do Brasil adota as curvas de 2007, desenvolvidas pela OMS, que incluem curvas de IMC desde o lactente até os 19 anos de idade e consideram os pontos de corte para sobrepeso e obesidade os percentis 85 e 97, respectivamente. O SISVAN recomenda a classifi cação do Índice de Massa Corporal - IMC -, proposta pela Organização Mundial da Saúde, tanto para menores de 5 anos (WHO, 2006) como para crianças a partir dos 5 anos de idade (WHO, 2007). Importante destacar que as curvas de avaliação do crescimento para crianças dos 5 aos 19 anos foram lançadas recentemente pela OMS. 25 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 A partir da leitura anterior, para facilitar melhor a sua compreensão, estão listados dois artigos que aprofundam os conhecimentos referentes à construção das curvas de crescimento infantil. Victora e Araújo (2010) afi rmam que as novas curvas de crescimento da OMS apontam diversos aspectos inovadores. Além disso, os autores descrevem ainda que, ao contrário das referências antigas, consideradas tradicionais, como a referência NCHS/OMS, que são primariamente descritivas de uma determinada amostra populacional, as novas curvas já são determinadas como prescritivas ou normativas. Em outras palavras, as novas curvas de crescimento se baseiam no estado da arte do conhecimento atual sobre nutrição infantil para defi nir o que seria um crescimento ideal para crianças pequenas, tanto em termos de alimentação como em termos da ausência de restrições econômicas ou ambientais ao potencial genético de crescimento. As novas curvas de crescimento se baseiam no estado da arte do conhecimento atual sobre nutrição infantil para defi nir o que seria um crescimento ideal para crianças pequenas, tanto em termos de alimentação como em termos da ausência de restrições econômicas ou ambientais ao potencial genético de crescimento. Leia o artigo “Uma nova curva de crescimento para o século XXI” acessando o link a seguir: <http://189.28.128.100/nutricao/docs/ geral/nova_curva_cresc_sec_xxi.pdf>. Os gráfi cos podem ser consultados em: Curva da OMS (2006) 0 a 5 anos: <http://www.who.int/ childgrowth/en/>. Curva da OMS (2007) 5 a 19 anos: <http://www.who.int/ growthref/en/>. 26 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar 1 Com relação aos Quadros 1 e 2, cite as principais variáveis que foram usadas para a construção dos índices e quais os índices recomendados para as crianças em idade pré-escolar e escolar, lembrando que os gráfi cos mais atuais de crescimento da Caderneta de Saúde da Criança foram lançados em 2009. R.: ___________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Para as crianças que têm a caderneta antiga, a classifi cação do estado nutricional é em percentil e nos seguintes pontos de corte: p3; p10 e p97. Os quadros a seguir apresentam as classifi cações, a partir das recomendações do SISVAN (2011), para a determinação do estado nutricional de crianças menores de 5 anos até 10 anos de idade. QUADRO 3 – CLASSIFICAÇÃO DE CRIANÇAS MENORES DE 5 ANOS QUANTO AO ESTADO NUTRICIONAL A PARTIR DE CADA ÍNDICE ANTROPOMÉTRICO, SEGUNDO RECOMENDAÇÕES DO SISVAN Valores críticos Índices antropométricos para menores de 5 anos Peso/ Idade Peso/ Estatura IMC/Idade Estatura/ Idade < Percentil 0,1 < Escore-z -3 Muito baixo peso para a idade Magreza acentuada Magreza acentuada Muito baixa estatura para a idade ≥ Percentil 0,1 e < Percentil 3 ≥ Escore-z -3 e < Es- core-z -2 Baixo peso para a idade Magreza Magreza Baixa estatura para a idade 27 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 ≥ Percentil 3 e < Per- centil 15 ≥ Escore-z -2 e < Es- core-z -1 Peso adequado para a idade Eutrofi a Eutrofi a Estatura adequada para a idade ≥ Percentil 15 ≤ Per- centil 85 ≥ Escore-z -1 ≤ Es- core-z +1 Eutrofi a Eutrofi a > Percentil 85 e ≤ Per- centil 97 > Escore-z +1 e ≤ Es- core-z +2 Risco de sobrepeso Risco de sobrepeso > Percen- til 97 e ≤ Percentil 99,9 > Escore-z +2 e ≤ Es- core-z +3 Peso elevado para a idade Sobrepeso Sobrepeso > Percentil 99,9 > Escore-z +3 Obesidade Obesidade FONTE: SISVAN (2011, p. 76) QUADRO 4 – CLASSIFICAÇÃO DE CRIANÇAS DE 5 A 10 ANOS DE IDADE QUANTO AO ESTADO NUTRICIONAL A PARTIR DE CADA ÍNDICE ANTROPOMÉTRICO, SEGUNDO RECOMENDAÇÕES DO SISVAN Valores críticos Índices antropométricos para crianças de 5 a 10 anos Peso/Idade IMC/Idade Estatura/Idade < Percentil 0,1 < Escore-z -3 Muito baixo peso para a idade Magreza acentuada Muito baixa estatura para a idade ≥ Percentil 0,1 e < Percentil 3 ≥ Escore-z -3 e < Escore-z -2 Baixo peso para a idade Magreza Baixa estatura para a idade ≥ Percentil 3 e < Percentil 15 ≥ Escore-z -2 e < Escore-z -1 Peso adequado para a idade Eutrofi a Estatura adequada para a idade ≥ Percentil 15 ≤ Percentil 85 ≥ Escore-z -1 ≤ Escore-z +1 Eutrofi a > Percentil 85 e ≤ Percentil 97 > Escore-z +1 e ≤ Escore-z +2 Sobrepeso > Percentil 97 e ≤ Percentil 99,9 > Escore-z +2 e ≤ Escore-z +3 Peso elevado para a idade Obesidade > Percentil 99,9 > Escore-z +3 Obesidade grave FONTE: SISVAN (2011, p. 76) 28 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar A diferença predominante entre as faixas etárias (menores de 5 anos e crianças de 5 a 10 anos) quanto à utilização dos índices é que para as crianças maiores não se aplica o índice peso por estatura. Além disso, os valores críticos para classifi cação de sobrepeso e obesidade entre os grupos etários também apresentam diferenças. As curvas e as classifi cações do estado nutricional são fundamentais para o diagnóstico clínico de crianças e demais grupos. A partir dessas ferramentas, é possível conduzir melhores estratégias e orientações apropriadas conforme a necessidade apontada. 2.2 Déficits Nutricionais Segundo o Relatório Mundial de Nutrição de 2016, a desnutrição e a alimentação defi ciente são os principais fatores de aumento da carga mundial de morbidade. Os prejuízos anuais no PIB com o baixo peso, o crescimento infantil insufi ciente e as defi ciências de micronutrientes são em torno de 11% na Ásia e na África (IFPRI, 2016). No Brasil, a situação é mais grave nas regiões Norte e Nordeste, especialmente no que diz respeito aos défi cits nutricionais, como resultado da desigualdade social e da distribuição de renda no país. Conforme foi apontado, o combate àfome justifi ca-se ainda porque coexistem bolsões de pobreza com desnutrição e, em contraponto, famílias tendem a adotar dietas hipercalóricas, que em geral são mais acessíveis, ou seja, de menor custo. Tal cenário pode ser atribuído à falta de informação nutricional, o que requer enfoque na promoção da educação e não na distribuição de alimentos. Fome zero e obesidade zero, com objetivo de alcançar o estado nutricional adequado da população brasileira, precisam fazer parte do cardápio das políticas públicas de nosso país. As ações devem, portanto, incluir um programa de educação nutricional acompanhado de uma melhoria na distribuição de renda, para que as famílias possam ampliar conhecimentos e terem mais acesso aos alimentos de qualidade nutricional (SBP, 2012). Leia mais sobre o assunto “Fome zero” em: <http://www.fao. org/3/i9420pt/I9420PT.pdf>. 29 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 Embora a desnutrição ainda seja um problema grave em diversas regiões do Brasil e outras localidades no mundo, com impactos severos para a saúde (Figura 3), a sua prevalência já é menor do que a de sobrepeso em crianças de baixa renda no país e, como este fato tem ocorrido em um público antes não afetado pelo sobrepeso, a transição nutricional tem se tornado um problema de saúde pública (IFPRI, 2016). FIGURA 3 – EFEITO DA SUBNUTRIÇÃO EM TODAS AS SUAS FORMAS ATRASO NO CRESCIMENTO EMACIAMENTO INFANTIL SOBREPESO INFANTIL SOBREPESO EM ADULTOS OBESIDADE EM ADULTOS DOENÇAS NÃO TRANSMISSÍVEIS DEFICIÊNCIA DE MICRONUTRIENTES A SUBNUTRIÇÃO EM TODAS AS SUAS FORMAS Criança com pouca altura em relação à sua idade Criança com peso baixo em relação à sua altura Criança pesada demais para a sua altura Adulto com excesso de gordura corporal e um índice de massa corporal > 25 Ferro, vitamina A, zinco, iodo e ácido fólico abaixo dos limites saudáveis Adulto com excesso de gordura corporal e um índice de massa corporal > 30 Diabetes, doenças cardíacas e alguns tipos de câncer FONTE: IFPRI (2016) É importante salientar que, no Brasil, o direito à saúde e à alimentação são garantias constitucionais implantadas entre os direitos sociais, trata-se de um conceito multidimensional que perpassa o campo da produção, disponibilidade e acessibilidade aos alimentos, adequadas condições de saúde, educação, moradia e saneamento básico. “A alimentação adequada é um requisito básico para a promoção e a proteção da saúde, sendo reconhecida como um fator determinante e condicionante da situação de saúde individual e coletiva” (BRASIL, 1990, s.p.). Dessa forma, indicadores de múltiplas vulnerabilidades, relacionados ao acesso, consumo e aproveitamento biológico dos alimentos, das condições sociais, econômicas e de estado nutricional são utilizados para caracterização de situações de violação desse direito, ou seja, da insegurança alimentar e nutricional (JAIME et al., 2018). Alguns indicadores de vulnerabilidade, tais como baixa renda familiar, escolaridade, principalmente materna, maior número de fi lhos, excessivo número de moradores em habitações pequenas, condições precárias de acesso a serviços públicos, como saneamento básico e energia elétrica, consumo alimentar inadequado, quanti e qualitativamente, entre outros, caracterizam situações de insegurança alimentar e nutricional que predispõem ao risco de desenvolvimento de diversas doenças carenciais, como a hipovitaminose A e anemia ferropriva, conforme apontada na fi gura anterior (ANDRÉ et al., 2018). “A alimentação adequada é um requisito básico para a promoção e a proteção da saúde, sendo reconhecida como um fator determinante e condicionante da situação de saúde individual e coletiva” (BRASIL, 1990, s.p.). 30 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar O estado nutricional de crianças é considerado um instrumento importante na aferição das condições de saúde e qualidade de vida de uma população. Considerando o seu complexo caráter multifatorial, o estado nutricional infantil é conhecidamente determinado pelas condições de vida da sociedade, principalmente no que concerne aos aspectos sociais e econômicos. “A maioria dos estudos sobre o tema é realizado com menores de cinco anos, o que destaca a necessidade de pesquisas que envolvam crianças em idade escolar” (PEDRAZA et al., 2017, p. 469). Ainda há muito a ser feito para melhorar o cenário atual de desequilíbrio nutricional que vivemos. No entanto, conforme já discutimos em tópicos anteriores, o relatório escrito na Assembleia Mundial de Saúde, em 2016, propõe metas globais para serem cumpridas até 2025 (Figura 4), o que possibilita novas estratégias e a formulação de caminhos mais promissores para a saúde infantil e de outras faixas etárias. O estado nutricional de crianças é considerado um instrumento importante na aferição das condições de saúde e qualidade de vida de uma população. Considerando o seu complexo caráter multifatorial, o estado nutricional infantil é conhecidamente determinado pelas condições de vida da sociedade, principalmente no que concerne aos aspectos sociais e econômicos. FIGURA 4 – METAS GLOBAIS DE NUTRIÇÃO PARA 2025 METAS GLOBAIS DE NUTRIÇÃO PARA 2025 DETER O AUMENTO NA PREVALÊNCIA DE: ATRASO NO CRESCIMENTO EMACIAMENTO INFANTIL SOBREPESO INFANTIL Reduzir o número de crianças com atraso no crescimento em 40% Reduzir e manter o emaciamento infantil em menos de 5% Evitar o aumento do sobrepeso infantil Reduzir a anemia de mulheres em idade reprodutiva em 50% Aumentar para ao menos 50% ANEMIA AMAMENTAÇÃO EXCLUSIVA PESO BAIXO AO NASCER SOBREPESO EM ADULTOS DIABETES EM ADULTOS OBESIDADE EM ADULTOS Reduzir o peso baixo ao nascer em 30% (excesso de açúcar no sangue) FONTE: IFPRI (2016) 31 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 Além da problemática dos défi cits nutricionais, como o baixo peso, a baixa estatura, do ganho de peso excessivo, da obesidade e das doenças relacionadas, precisamos refl etir sobre outro problema associado às questões já discutidas: estamos perdendo nossa identidade cultural alimentar. Pouquíssimas são as regiões que ainda resistem às mudanças, preservando suas características com relação ao consumo de alimentos tradicionais. Muitas crianças não sabem, por exemplo, o que é um tomate ou uma batata, pois só lhes foram apresentados molhos prontos como o ketchup ou as batatas ensacadas e fritas. Discutiremos esse tema nos próximos capítulos! 3 NECESSIDADES, RECOMENDAÇÕES E DESAFIOS NUTRICIONAIS DO PRÉ- ESCOLAR O crescimento e o desenvolvimento infantil estão relacionados às condições de saúde da criança, especialmente nos primeiros anos de vida. O público infantil representa um grupo de maior vulnerabilidade e isso se deve ao rápido crescimento e à imaturidade imunológica e fi siológica. O défi cit de crescimento na fase pré-escolar está associado à maior morbimortalidade, ao surgimento das doenças infecciosas, ao comprometimento do desenvolvimento psicomotor, ao baixo rendimento escolar e à menor capacidade de desempenho na fase adulta. O crescimento e o desenvolvimento infantil estão relacionados às condições de saúde da criança, especialmente nos primeiros anos de vida. 3.1 CaracteriZação do Pré-Escolar O período pré-escolar engloba ainda crianças com a faixa etária entre 2 a 7 anos incompletos, além disso, caracteriza-se por uma estabilização do crescimento estrutural e do ganho de peso. Assim, nessa etapa do desenvolvimento infantil, há uma menor necessidade de ingestão energética quando comparada ao período de zero a dois anos e à adolescência, a criança na fase pré-escolar ganha em torno de 2 a 3 Kg por ano e 5 a 7 cm/ano (SBP, 2012). 32 Políticas e ProgramasPara a Alimentação e Nutrição Escolar Considerando esse decréscimo das necessidades nutricionais e do apetite, esse período torna-se um momento crítico da infância, em que é necessária a sedimentação de hábitos alimentares e comportamentais, uma vez que essa é uma fase, considerada, de transição: a criança sai de um período de completa dependência (lactentes) para entrar em uma fase de maior independência (escolar e adolescência) (SBP, 2012). Nessa faixa etária observa-se também um aumento das habilidades, que incluem, por exemplo, a aprendizagem, a fala, as habilidades motoras, bem como mudanças internas, sendo importante priorizar a qualidade da nutrição. O crescimento linear é um dos eventos que, de forma contundente, expressa o impacto cumulativo das condições sociais, ambientais e econômicas em que a criança está inserida, repercutindo diretamente sobre a saúde infantil (PEREIRA et al., 2007). O desenvolvimento ósseo, a maior maturidade dos sistemas respiratório e circulatório, a habilidade motora (propiciando o uso de talheres), o aumento da resistência física e o desenvolvimento do sistema imunológico possibilitam uma melhor qualidade de vida (lazer ativo, atividade física dirigida, sono, aprendizagem, entre outros) (SBP, 2012). Por volta dos três anos de idade, todos os dentes da primeira dentição, ou dentes de leite, já apareceram, e as crianças podem ingerir diferentes alimentos nas variadas texturas, expondo e amadurecendo o sistema digestório a novas composições alimentares, propiciando ao organismo uma dieta diversifi cada em quantidade e qualidade. Quanto à saúde bucal, observa-se também um maior amadurecimento, sendo o ato de mastigar uma atividade importante para o desenvolvimento da musculatura da face. À medida que os dentes nascem e que haja concomitantemente uma maturidade cognitiva, os alimentos amassados e/ou picados devem ser gradativamente substituídos por alimentos inteiros seguidos de alimentos crus, em pequenos pedaços, como a cenoura e a pera (SBP, 2012). Maus hábitos alimentares também levam à aquisição de deformidades dentárias e de mordida, o que pode levar à criança a ser um respirador bucal. Por outro lado, a não higienização correta ocasiona dor, infecção ou disfunção no sistema estomatognático e pode restringir o consumo de uma dieta adequada às necessidades energéticas, afetando o crescimento infantil, bem como o aprendizado, a interação social e a comunicação (SBP, 2012; ANTUNES, 2018). Alguns autores defendem a ideia de que a criação de hábitos alimentares e de higiene dental deve ser realizada através de métodos adequados ao grau de raciocínio, aprendizagem e psicomotricidade das crianças, e que para construir determinado conhecimento, as concepções infantis devem combinar com as informações advindas do meio. O conhecimento não deverá ser concebido apenas como descoberta espontânea, nem transmitido de forma mecânica pelo meio exterior ou pelos adultos, mas como resultado de uma interação (ANTUNES, 2018). 33 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 Para complementar o que discutimos até aqui, a Universidade Aberta do SUS disponibiliza um acervo de recursos educacionais em saúde e, dentre eles, está a nutrição do pré-escolar e escolar. Leia mais em: <https://ares.unasus.gov.br/acervo/handle/ARES/7737>. 3.2 InfluÊncia do Aleitamento Materno no Estado Nutricional do Pré-Escolar As experiências alimentares nos primeiros anos de vida são um marco relevante na formação dos hábitos alimentares das crianças. Tais momentos podem ser classifi cados em dois períodos importantes: antes dos seis meses e após os seis meses. Na fase inicial (primeiros seis meses), espera-se que a criança esteja em aleitamento materno exclusivo, em caso de impossibilidade materna, intercorrência clínica do binômio mãe-fi lho que impossibilite a amamentação ou o desejo materno de não amamentar, recomenda-se como primeira opção alimentar o bebê com leite humano pasteurizado, advindo de bancos de leite humano. Como segunda opção, o uso de fórmulas infantis nesse período, respeitando a idade do bebê e suas peculiaridades, por último e menos recomendado, o uso de leite de vaca diluído, conforme as recomendações da OMS e do Guia Alimentar para Menores de 2 anos (WHO, 2004). Para entender melhor os processos do aleitamento materno e a introdução da alimentação complementar subsidiando as escolhas alimentares futuras, sugerimos a leitura do Guia Alimentar para Menores de 2 anos, atualizado e disponibilizado em 2018 para a consulta pública. Para isso, acesse o link a seguir: <http:// portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2018/julho/12/Guia- Alimentar-Crianca-Versao-Consulta-Publica.pdf>. 34 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar O segundo momento se inicia a partir dos seis meses de vida do bebê, a criança deve receber uma atenção especial quanto a sua alimentação, especialmente nos primeiros dois anos de vida, período este considerado imprescindível para a formação de hábitos alimentares saudáveis na vida adulta (WHO, 2004). Nas últimas décadas, alguns autores têm concluído que o aleitamento materno exclusivo, nos seis primeiros meses de vida do bebê, atua como estratégia protetora contra o sobrepeso em crianças nas fases pré-escolar e escolar. Pesquisadores nos Estados Unidos concluíram que o pré-escolar que havia sido amamentado apresentava um risco menor de ser obeso, porém não de apresentar sobrepeso. Já um estudo longitudinal realizado na Alemanha evidenciou a importância e o papel protetor do aleitamento materno prolongado também para o não aparecimento do sobrepeso. No Brasil, Albernaz et al. (2008), em uma pesquisa conduzida em Pelotas, no sul do país, com crianças menores de quatro anos, apontaram que a prevalência de sobrepeso em crianças amamentadas por mais de onze meses foi menor do que a observada entre aquelas amamentadas por menos de três meses, destacando mais uma vez o efeito benéfi co e o papel protetor do aleitamento materno na saúde infantil. O aleitamento materno exclusivo, nos seis primeiros meses de vida do bebê, atua como estratégia protetora contra o sobrepeso em crianças nas fases pré-escolar e escolar. 3.3 Formação do Hábito Alimentar do Pré-Escolar Quando a introdução alimentar e os períodos subsequentes da alimentação infantil são realizados de maneira incorreta ou insufi ciente para a criança, especialmente na fase pré-escolar, período este que contempla os primeiros anos de vida, essa conduta pode levar, além da má-formação do hábito alimentar, a carência de micronutrientes, causando imaturação biológica, em especial, dos sistemas nervoso e imune, infl uenciando negativamente na efi cácia de intervenções terapêuticas e propiciando infecções frequentes (SBP, 2012; ALVES et al., 2013). Ademais, um baixo aporte energético pode levar à desnutrição infantil, que está relacionada à altura menor na fase adulta, menor desempenho escolar e anos de estudo, além da diminuição da produtividade e capital humano. Por outro lado, a ingestão dietética oferecida precocemente (antes dos 6 meses) em excesso (nos períodos posteriores) está associada à ocorrência, a médio e longo prazo, de doenças crônicas não transmissíveis, como a dislipidemia, a obesidade, a hipertensão arterial, entre outras complicações clínicas (ALVES et al., 2013). 35 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 3.3.1 Comportamento Alimentar do Pré-Escolar Uma característica marcante das crianças do período pré-escolar é a diminuição do apetite e interesse pela alimentação. Muitas vezes, os familiares e as pessoas próximas ao círculo social da criança atribuem a redução fisiológica do consumo alimentar, frequente nesta fase, à presença de alguma comorbidade, chegando à consulta pediátricacom a queixa de inapetência, que é uma das mais comuns nessa faixa etária. Tal conduta pode levar a diagnósticos incorretos, como determinar que a criança sofre de transtornos alimentares, tais como a anorexia, ou apresentar alguma carência nutricional, levando ao uso inadequado de suplementos, hipercalóricos ou medicamentos (por exemplo, estimulantes do apetite), quando na verdade ela está passando, apenas, por uma fase comum do seu desenvolvimento físico e cognitivo. Além disso, toda essa movimentação, atitudes coercitivas por parte dos pais podem gerar desconforto, insegurança emocional na criança e estresse na família, o que pode ainda favorecer o surgimento e a progressão do excesso de peso e/ou obesidade (SBP, 2012). De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria (2012), outra importante característica dessa fase está relacionada a um comportamento alimentar imprevisível e variável: a quantidade ingerida de alimentos pode oscilar, em alguns momentos, em grande quantidade e, em outro, ausente ou muito restrita; manhas e caprichos podem fazer com que o alimento favorito de hoje se torne um “vilão” no dia ou em semanas seguintes, ou que um mesmo alimento ou um determinado grupo de alimentos seja aceito por muitos dias consecutivos. Caso os familiares não considerem esse comportamento como uma fase passageira e reagirem com medidas extremas, esse período poderá se transformar em distúrbio alimentar real e perdurar em fases seguintes. Por esse motivo, é necessário o conhecimento de alguns pontos importantes da evolução do comportamento alimentar infantil. O pré-escolar pode apresentar duas características de personalidade marcantes, conhecidas por dificultarem o estabelecimento de uma alimentação qualitativamente saudável e diversifi cada: • Neofobia: dificuldade em aceitar alimentos novos ou desconhecidos, isto é, a criança nega-se a experimentar qualquer tipo de alimento desconhecido e que não faça parte de suas preferências alimentares. Atitudes coercitivas por parte dos pais podem gerar desconforto, insegurança emocional na criança e estresse na família, o que pode ainda favorecer o surgimento e a progressão do excesso de peso e/ ou obesidade. 36 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar • PICKY/FUSSYEATING: refere-se à criança que rejeita uma grande variedade de alimentos, com uma dieta caracterizada por uma variedade muito pequena. A criança “picky/fussy” ingere baixas quantidades de alimentos com vitamina E, vitamina C, folato e fibras, provavelmente em decorrência do baixo consumo de vegetais (SBP, 2012). Apesar de os diagnósticos serem diferentes, podem se manifestar de forma conjunta, dependendo da idade e do meio em que a criança está inserida. Além da predisposição inerente à personalidade, a forma como os familiares e/ou cuidadores se alimentam têm importância primordial no comportamento alimentar das crianças (Shim et al., 2011). É importante destacar que existe uma linha tênue entre as características, anteriormente citadas, inerentes ao comportamento comum da fase pré-escolar com a questão da difi culdade persistente e nociva à saúde da criança. Dessa forma, Maranhão et al. (2018, p. 45) ressaltam que: A difi culdade alimentar (DA) pode ser entendida como todo problema que afeta negativamente o processo dos pais ou cuidadores de suprirem alimento ou nutrientes à criança. Esse termo é usado como “guarda-chuva” para diversos distúrbios alimentares, com distintos níveis de gravidade, com possibilidade de repercussão no estado nutricional, na relação entre pais e fi lhos e na interação com os pares. Estima-se que de 8 a 50% das crianças possuam DA, a depender dos critérios diagnósticos utilizados e mais da metade dos pais relatam que seus fi lhos apresentam alta seletividade alimentar ou comem muito pouco. Shim et al. (2011) encontraram que a combinação entre o aleitamento materno exclusivo por seis meses e a introdução da alimentação complementar após essa idade reduz as chances de a criança desenvolver comportamento alimentar seletivo na fase de dois a três anos, o que nos possibilita computar mais um ponto a favor do aleitamento materno! Kerzner et al. (2009, p. 45) propuseram um questionário para avaliar o perfi l da DA entre os pré-escolares, baseado nos sinais clínicos relatados, principalmente pelas mães e que foram mais evidenciados nessa faixa etária (Quadro 5): 37 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 QUADRO 5 – CARACTERÍSTICAS E DIFICULDADES ALIMENTARES NA INFÂNCIA PERFIS CARACTERÍSTICAS Interpretação equivocada dos pais Era pequeno ao nascer ou prematuro. Tem um ou ambos os pais que são pequenos ou cresceram lentamente. Parece saudável e ativo. Ingestão altamente seletiva Come um número limitado de alimentos. Recusa de alimentos por causa de cheiro, gos- to, textura, temperatura e/ou aparência. Só aceita alimentos preparados de uma forma específi ca. Reluta em experimentar novos alimentos. Criança agitada com baixo apetite Não demonstra interesse em comida. Para de comer após algumas colheradas. Con- stantemente tenta sair do cadeirão ou da mesa. Gosta de brincar ou interagir com pessoas as quais está familiarizado. Fobia alimentar Chora ao ver o alimento ou objetos relacionados à alimentação. É intensamente resistente à alimentação. Começou a recusar comida após experiência ruim com alimento, como vômito ou asfi xia. É ou foi alimentado por sonda e sente medo de comer. Presença de doença orgânica Diagnóstico clínico prévio levando à exclusão de determinado alimento ou grupo de alimentos. Criança com distúrbio psi- cológico ou negligenciada É arredio, arisco e se irrita facilmente. Balbucia, fala pouco, não sorri. Mostra pouco interesse em brincar. Choro que interfere na alimentação Irritabilidade, sono e outras características ob- servadas especialmente em crianças menores. FONTE: Kerzner et al. (2009, p. 960) 38 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar Estudos apontam que quanto mais neofóbica a criança, mais os pais usam a persuasão, a recompensa e o preparo de alimentos escolhidos pelos fi lhos, independentemente da qualidade nutricional (SBP, 2012). Outra questão muito comum entre as crianças que apresentam alguma DA é que estas tendem a comer pequenas refeições e de maneira mais lenta, essas crianças ainda podem apresentar alguns comportamentos inadequados no momento das refeições, como: • Recusa alimentar. • Brincadeiras com a comida. • Desinteresse para com o alimento. Diante dessa situação, é muito importante que a família e/ou o cuidador leve a criança a um profi ssional de saúde especializado para o acompanhamento adequado e que as difi culdades e as características individuais de cada criança identifi cada sejam respeitadas e conduzidas para o tratamento. A Sociedade Brasileira de Pediatria (2012) preconiza que sejam realizadas consultas periódicas de puericultura, com o intuito de monitorar o crescimento e o desenvolvimento infantil, a fi m de se evitar os distúrbios nutricionais. Entende-se que as escolhas alimentares da criança, nessa faixa etária, sofrem grandes infl uências das escolhas alimentares da família. A formação do hábito alimentar e as preferências da criança podem decorrer da imitação e da observação das escolhas feitas por familiares ou outras pessoas que a criança possa ter como modelo e/ou exemplo no seu ambiente. As crianças na fase pré-escolar podem apresentar uma relutância em consumir alimentos novos prontamente (neofobia). Para que esse comportamento se altere, alguns autores sugerem que a criança prove o alimento de oito a dez vezes em diferentes preparações e momentos, mesmo que seja em quantidades bem pequenas. Essa estratégia permitirá maiores contatos com o alimento e familiarização das preparações, podendo serestabelecidos novos hábitos alimentares e aceitação de outras formas alimentares. Estudos apontam que quanto mais neofóbica a criança, mais os pais usam a persuasão, a recompensa e o preparo de alimentos escolhidos pelos fi lhos, independentemente da qualidade nutricional (SBP, 2012). É muito importante que a família e/ ou o cuidador leve a criança a um profi ssional de saúde especializado para o acompanhamento adequado e que as difi culdades e as características individuais de cada criança identifi cada sejam respeitadas e conduzidas para o tratamento. Alguns autores sugerem que a criança prove o alimento de oito a dez vezes em diferentes preparações e momentos, mesmo que seja em quantidades bem pequenas. Essa estratégia permitirá maiores contatos com o alimento e familiarização das preparações, podendo ser estabelecidos novos hábitos alimentares e aceitação de outras formas alimentares. 39 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 É importante explicar aos pais que recusas são comuns. O importante é que haja estímulos adequados para a aceitação do alimento. Em qualquer forma de coerção, a chance de o alimento ser recusado é maior, podendo ainda provocar danos comportamentais nas escolhas futuras da criança. Atitudes excessivamente autoritárias ou permissivas são limitadores no estabelecimento de uma conduta saudável. Leia mais sobre o assunto em: <http://ftp.medicina.ufmg.br/ observaped/cartilhas/Cartilha_Orientacao_Nutricional_12_03_13.pdf>. ATIVIDADE DE ESTUDO: 1 A idade pré-escolar apresenta algumas peculiaridades inerentes a esta faixa etária. Diante disso, cite os principais aspectos sobre a evolução do comportamento alimentar neste período. R.: ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ • Crianças no período de formação do hábito alimentar podem não aceitar novos alimentos imediatamente, ou seja, neofobia (aversão a novidades). Para que esse comportamento se altere, é necessário que a criança prove o novo alimento em torno de oito a dez vezes, mesmo que seja em quantidade reduzida. Criança cansada ou superestimulada com atividades intensas pode não aceitar a alimentação de imediato; no verão, seu apetite pode ser ainda menor do que no inverno. • As crianças nessa faixa etária têm como preferência os alimentos de sabor doce e calóricos. Essa escolha ocorre por um processo natural, em que o sabor doce é inato ao ser humano. 40 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar • Quando a criança já alcançar um nível de desenvolvimento motor capaz de fazer com que ela se sirva e se sente à mesa sozinha, essa conduta deverá ser incentivada e permitida. • Devem ser respeitadas as escolhas e o gosto alimentar individual sempre que possível. Quando houver a recusa por parte da criança de um determinado alimento, o ideal é substituí-lo por outro que possua características nutricionais semelhantes. • A recusa a determinados alimentos ou grupos de alimentos pode ser uma estratégia da criança para chamar a atenção dos pais para algo que não está bem. • Algumas atitudes dos pais que visam amenizar ou “resolver” o problema alimentar utilizando de chantagens, recompensas, subornos ou castigos para forçar a criança a se alimentar devem ser evitados, pois podem prejudicar a relação da criança com a comida e também a relação familiar. • Em alguns casos, a criança na fase pré-escolar, especialmente entre 2 e 3 anos, pode apresentar intolerância à lactose por diminuição da enzima lactase. Se houver necessidade de restrição desse açúcar (lactose), os profi ssionais e os responsáveis devem estar atentos para que as fontes de cálcio, fósforo e vitamina A sejam preservadas em outros alimentos fonte. Em situações como essa é possível utilizar: volumes de leite menores, leites com baixo teor de lactose, iogurtes sem lactose, queijos e vegetais verde-escuros, como os brócolis. A criança possui mecanismos fi siológicos de saciedade que determinam e limitam a quantidade de alimentos que precisa, por isso ela deve ser respeitada, especialmente quanto ao controle da ingestão. Corroborando a informação, um estudo foi realizado com crianças entre 3 a 5 anos de idade, foram oferecidos dois pratos de comida para as crianças, sendo que o primeiro era fi xo e o segundo elas escolhiam. Os resultados mostraram que quando o primeiro prato fi xo oferecido era altamente energético, as crianças selecionaram menores quantidades de alimentos no segundo prato, escolhidos por elas, determinando que as crianças podem ajustar a ingestão com base na densidade energética dos alimentos (BIRCH, 1999). Para que a conduta alimentar e nutricional da criança esteja em harmonia, algumas orientações (Quadro 6) são importantes para auxiliar tanto os familiares como os profi ssionais de saúde envolvidos no cuidado infantil. A criança possui mecanismos fi siológicos de saciedade que determinam e limitam a quantidade de alimentos que precisa, por isso ela deve ser respeitada, especialmente quanto ao controle da ingestão. 41 O QUE DEVO SABER SOBRE O ESTADO NUTRICIONAL E A ALIMENTAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR? Capítulo 1 QUADRO 6 – ORIENTAÇÕES GERAIS PARA A CONDUTA ALIMENTAR DE CRIANÇAS EM IDADE PRÉ-ESCOLAR Orientações Conduta alimentar Horários fi xos As refeições e os lanches devem ser oferecidos, pref- erencialmente, em horários determinados, diariamente. Essa estratégia possibilita que a criança regule a sua fome na próxima alimentação. Em geral, o intervalo entre uma refeição e outra deve ser de duas a três horas, podendo ser alterado de acor- do com o estado fi siológico e comportamental de cada criança. Quantidade diária Cinco ou seis refeições diárias, com horários regulares, exemplo: - café da manhã às 8h; - lanche matinal às 10h; - almoço às 12h; - lanche vespertino às 15h; - jantar às 19h; - algumas vezes, lanche antes de dormir. IMPORTANTE: não se deve oferecer leite ou outro ali- mento em substituição à refeição. O tamanho das porções dos alimentos nos pratos deve estar de acordo com o grau de aceitação da criança. O que deve ser controlado? Quando houver guloseimas ou sobremesa, oferecê-las como mais uma preparação da refeição, evitando uti- lizá-la como recompensa ao consumo dos demais ali- mentos. A oferta de líquidos nos horários das refeições deve ser controlada, os líquidos distendem o estômago (estímulo de saciedade precocemente). Oferecer água à vontade nos intervalos das refeições. Os sucos naturais podem ser oferecidos eventualmente, na quantidade máxima de 150 ml/dia. Os refrigerantes não precisam ser proibidos, mas devem ser evitados, assim como salgadinhos, balas e doces. Alimentos que possam provocar engasgos devem ser evitados, como balas duras ou uva inteira. IMPORTANTE: a proibição pode levar a um maior inter- esse da criança pelas guloseimas; é necessário que os pais expliquem que o consumo exagerado pode trazer prejuízo à saúde. 42 Políticas e Programas Para a Alimentação e Nutrição Escolar Ambiente alimentar O ambiente alimentar deve ser tranquilo, sem o uso de celulares ou televisão ou quaisquer outras distrações, como brincadeiras e jogos. A criança deve ser confortavelmente sentada à mesa com os outros membros da família (interação social). A criança deve ser encorajada a comer sozinha, mas sempre com supervisão, para evitar engasgos. Deixá-la comer com as mãos e não cobrar limpeza na hora da refeição. O que fazer para melhorar a relação do pré-escolar com os alimentos? Levar as crianças às compras e permitir que elas auxil- iem nas