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Psicologia Social e Organizacional 02 1. Psicologia Social e Organizacional 4 História da Psicologia Organizacional 4 O Campo de Aplicação 13 O Papel do Psicólogo nas Organizações 14 A Psicologia Social 16 A Psicologia Social do Trabalho 18 2. A Entrevista Psicológica 22 3. A Terceirização e o Contrato Psicológico 26 4. A Inclusão de Pessoas Portadoras de Necessidades no Trabalho - A Visão da Psicologia 35 5. Referências Bibliográficas 46 03 4 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL 1. Psicologia Social e Organizacional Fonte: Poder da Escuta1 História da Psicologia Or- ganizacional exto adaptado de Fabiani Al- meida da Conceição Silva, 2010. A história da psicologia orga- nizacional é uma criação do século XX, com seu início no final do século XIX. Os primeiros estudiosos a rea- lizarem um trabalho de psicologia organizacional foram os psicólogos 1 Retirado em https://www.poderdaescuta.com/psicologia-organizacional-o-que-e-e-como-ela-exponencia- os-resultados-da-sua-empresa/ experimentais que estavam interes- sados em aplicar novos princípios de psicologia para resolver problemas nas organizações, tanto que os pri- meiros trabalhos concentravam-se em questões de desempenho no tra- balho e de eficiência organizacional. Os principais fundadores são Hugo Munsterberg e Walter Dill Scott, psi- cólogos experimentais, ambos ti- nham interesse em seleção de funci- onários e uso de testes psicológicos. T 5 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL Outra influência no campo or- ganizacional foi Frederick Winslow Taylor, engenheiro de profissão, es- tudava a produtividade dos funcio- nários de empresas. Defendia que o trabalho deve ser analisado e para que o modo otimizado de executar as tarefas possa ser especificado, os funcionários também devem ser se- lecionados de acordo com as carac- terísticas relacionadas ao desempe- nho no trabalho. E os mesmos de- vem ser treinados cuidadosamente para executar as tarefas e serem re- compensados por sua produtividade para incentivar a melhoria do de- sempenho. No campo da engenharia Frank e Lílian Gilbreth, aperfeiçoa- ram a ideia de Taylor, estudando maneiras de desempenhar tarefas eficientemente, ou seja, a forma pela qual as pessoas as executam. O es- tudo do tempo e movimento implica na medição e na sincronização das ações executadas pelas pessoas du- rante as tarefas, tendo como objetivo desenvolver uma maneira mais efi- ciente de trabalho. A Primeira Guerra Mundial foi um importante impulso para o de- senvolvimento e reconhecimento da psicologia organizacional. Segundo Muchinsky (2004), comitês de psi- cólogos investigavam a motivação dos soldados, a moral e problemas psicológicos decorrentes da incapa- cidade física e de disciplina. Tam- bém desenvolveram uma série de testes de inteligência geral e pesqui- sas sobre a melhor colocação para os soldados alistados, sempre de acor- do com a sua capacidade física e mental. Com a expansão da psicologia organizacional, em 1924, uma série de experimentos se tornaram clássi- cos na psicologia organizacional, en- tre eles os estudos de Hawthorne, que buscou identificar e determinar o impacto dos níveis de iluminação no desempenho da tarefa dos funci- onários. Para surpresa dos pesquisa- dores, a produtividade aumentou em todos os grupos participantes, não havendo relação direta com me- lhor ou pior iluminação no ambiente de trabalho, mas reagiram positiva- mente ao novo tratamento que esta- vam recebendo, com isso, percebeu- se então que os fatores sociais po- dem ser mais importantes do que os fatores físicos no desempenho do funcionário. Na Segunda Guerra Mundial os psicólogos estavam mais prepara- dos para o seu papel, haviam estu- dado os problemas de seleção e colo- cação de funcionários e haviam apri- morado suas técnicas. E no decorrer da guerra as empresas descobriram que muitas das técnicas eram úteis em empresas, principalmente nas áreas de seleção, treinamento e de- 6 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL senvolvimento de líderes empresari- ais. Durante a década das duas Guerras Mundiais a psicologia orga- nizacional expandiu-se para a maio- ria das áreas nas quais ela é utilizada hoje. As organizações foram ga- nhando maior porte e começaram a contratar psicólogos. A Primeira Guerra Mundial ajudou a psicologia organizacional a formar a profissão e dar-lhe aceitação social, já a Se- gunda Guerra ajudou a desenvolvê- la. Na década de 1960 a pesquisa de psicologia organizacional assu- miu um toque mais organizacional, os psicólogos também começaram a formar empresas de consultoria, oferecendo serviços às organizações mediante remuneração. Houve tam- bém a elaboração de padrões de di- retrizes de contratação pelo governo que os empregados eram obrigados a cumprir e as empresas também eram legalmente obrigadas a de- monstrar através de testes, não dis- criminando nenhum grupo. Assim os psicólogos passaram a ser legal- mente responsáveis por suas ações. O campo da psicologia organi- zacional nasceu de diversas forças e se desenvolveu crescendo por meio do conflito global, hoje o psicólogo organizacional deve ser multidisci- plinar. Mudanças ocorreram veloz- mente nas organizações, principal- mente em fins do século XX, exigin- do dos psicólogos organizacionais uma grande disposição estratégica e capacidade de gerenciamento de pessoas, facilitando mudanças, e também promovendo uma melhor qualidade de vida. As atividades que os psicólo- gos mais realizam dentro da área Organizacional são: recrutamento, seleção, aplicação de teste, acompa- nhamento de pessoal, treinamento, avaliação de desempenho, análise de função/ocupação, planejamento/ execução de projetos, desenvolvi- mento organizacional, cargo admi- nistrativo, assessoria, análise de car- gos/salários, aconselhamento psico- lógico, diagnóstico situacional, su- pervisão de estágios acadêmicos, orientação/treinamento para profis- sionais, psicodiagnóstico e consulto- ria. O psicólogo organizacional não pode ser apenas um aplicador de técnicas, mas sim necessita com- preender o homem como um ser so- cial, que está em constante interação com o meio. Ele precisa consolidar sua identidade profissional para não perder a oportunidade de demons- trar seu papel e que este se torne co- nhecido, bem como suas possibilida- des de contribuir e sua importância estratégica dentro das organizações. 7 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL Deste profissional, também é exigido uma postura proativa, nego- ciadora, perspicaz, atualizada, ética e flexível, que absorva as inovações tecnológicas e comportamentais. O psicólogo organizacional é como consultor interno e externo nas or- ganizações e por isso deve ter um ca- ráter empreendedor, percebendo o grau de responsabilidade no sentido de implantar a capacitação das em- presas frente a novos desafios, adap- tando-as às exigências do mercado atual. Podemos defini-lo como um profissional que tem o papel de aju- dar a organização a pensar, e com isso torná-la capaz de lidar com pro- blemas emergentes das mudanças nas relações entre o capital e o tra- balho. A Psicologia Organizacional e do Trabalho (PO & T) faz interface com a gestão de recursos humanos (ou de pessoas), em organizações dos setores públicos e privados e lida com pessoas que trabalham nessas organizações. A administração de recursos humanos ou gestão de pes- soas é como responsável pela coor- denação de interesses da mão de obra e dos donos do capital, e visa proporcionar à organização um qua- dro de pessoal motivado, integrado e produtivo, estimulado a contribuir para o alcance dos objetivosorgani- zacionais. A prática do psicólogo organi- zacional é diversificada, dentro de suas atividades em uma organização encontramos o Recrutamento e Se- leção. O recrutamento é um con- junto de técnicas e procedimentos que visa a atrair candidatos potenci- almente qualificados e capazes de ocupar cargos dentro da organiza- ção, é realizado sempre de acordo com as necessidades presentes e fu- turas de recursos humanos da orga- nização. Existem dois tipos de recru- tamento, o recrutamento interno, que está fundamentado na movi- mentação de quadro de pessoal da própria organização e o recrutamen- to externo, que ocorre quando não é possível obter-se candidatos às va- gas dentro da organização. Após o processo de recrutamento inicia-se o de seleção, é a tarefa de escolher os candidatos adequados às necessida- des da organização entre os candida- tos recrutados. Nesta etapa são utili- zados testes, provas, entrevistas, di- nâmicas, entre outros. Outra atividade muito solicita- da ao psicólogo organizacional é a de treinamento e desenvolvimento de pessoal. Esta é uma atividade neces- sária tanto para funcionários novos como para os já experientes, envolve o aprendizado e desenvolvimento de novas habilidades, tem com objetivo levá-los a obterem novos conheci- 8 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL mentos e modificar atitudes e com- portamentos. O treinamento é o ato intenci- onal de fornecer os meios para pro- porcionar a aprendizagem. O desen- volvimento de um programa de trei- namento envolve cinco etapas: A primeira é a avaliação das necessidades, determinação de quem precisa de que tipo de treinamento; A segunda é definir os objeti- vos do treinamento; A terceira é projetar o pro- grama de treinamento; A aplicação é a quarta etapa; e, A última é a avaliação do trei- namento para certificar-se de que o objetivo foi atingido, ou seja, o treinamento foi eficaz. Avaliar o desempenho de fun- cionários também é muito impor- tante, os dados sobre o desempenho no trabalho têm múltiplas aplica- ções nas empresas. Como atividade típica de controle administrativo a avaliação de desempenho torna-se parte atuante da estratégia geren- cial, cujo propósito central é conse- guir que os membros da equipe de trabalho orientem seus esforços no sentido dos objetivos da empresa. A avaliação constitui-se numa série de técnicas com a finalidade de obter informações sobre o compor- tamento profissional do avaliado. Em decorrência da avaliação de desempenho vem a política de cargos e salários. As descrições de cargos são utilizadas para descrever tanto os diferentes tipos de traba- lhos quanto às características huma- nas necessárias para o desenvolvi- mento das atividades, pode-se dizer que é o registro das funções, tarefas e responsabilidades atribuídas a uma ou mais pessoas. O salário é uma recompensa para o trabalhador, o sistema de re- compensa, inclui o pacote total de benefícios que a organização oferece aos seus participantes. Esse pacote não envolve apenas o salário, férias, prêmios, promoções, mas também outros aspectos menos visíveis. Do ponto de visa da empresa serve para atrair e manter pessoas altamente qualificadas, recompensar os servi- ços prestados, motivar desempenho futuros. Para o trabalhador a recom- pensa proporciona sentimento de segurança, reconhecimento, um ob- jetivo para ser atingido. Também ao desempenho do funcionário está ligada a sua motiva- ção, que tem a ver com a direção, in- tensidade e persistência de um com- portamento ao longo do tempo. A di- reção refere-se à escolha de compor- tamentos específicos dentro de uma série de comportamentos possíveis. A intensidade, ao esforço que uma 9 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL pessoa empenha na realização de uma tarefa. E a persistência diz res- peito ao contínuo empenho em um determinado tipo de comportamen- to ao longo do tempo. Em outra perspectiva a motivação refere-se ao desejo de adquirir ou alcançar al- gum objetivo, assim a motivação re- sulta dos desejos, vontades e neces- sidades. Maslow para explicar a moti- vação se baseia na teoria das neces- sidades, que parte do princípio de que as necessidades humanas estão em uma pirâmide de importância e de influenciação do comportamento humano, na base na pirâmide estão as Necessidades Fisiológicas (inatas, como fome, sono,...), acima as Ne- cessidades de Segurança (busca de proteção), em seguida as Necessida- des Sociais (indivíduo junto a outras pessoas), acima as Necessidades de Estima (autoavaliação, autoestima) e por último, Necessidades de Au- torrealização (desenvolvimento de capacidades). Chiavenato (2004) faz relação da teoria de Maslow com o trabalho, em relação às necessidades Fisioló- gicas, são satisfeitas através de horá- rios de descansos, conforto físico no trabalho, etc. As necessidades de Se- gurança se satisfazem através de condições de trabalho seguras, re- muneração, estabilidades, entre ou- tras. Necessidades Sociais são supri- das com interações entre colegas, clientes, supervisores. As necessida- des de estima são saciadas com reco- nhecimentos, bons resultados, apoio de superiores. E por último as neces- sidades de Autorrealização são satis- feitas através de desafios, autono- mia, participação em decisões, etc. Percebe-se então que a moti- vação está dentro de cada um e pode ser influenciada por fontes externas ao indivíduo ou pelo seu próprio tra- balho na empresa. A motivação in- trínseca e extrínseca deve ser com- plementar por meio do trabalho ge- rencial. O gerente deve conhecer o potencial interno de motivação de cada subordinado e deve saber como extrair do trabalho as condições ex- ternas para elevar a satisfação pro- fissional. Não é somente na motivação que a liderança tem um papel funda- mental, os líderes são responsáveis diretos pela sobrevivência e pelo su- cesso da organização. A liderança constitui uma necessidade do traba- lho em equipe, o líder deve saber co- mo conduzir as pessoas, ou seja, co- mo liderar e administrar as diferen- ças entre elas. Existem líderes for- mais, gerentes, coordenadores, su- pervisores, diretores, e líderes infor- mais que surgem nos grupos de tra- balho e podem até ter maior influên- cia no comportamento dos outros trabalhadores do que o líder formal. 10 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL Um líder deve ter um bom relaciona- mento com seus subordinados, pois é através deles que ele consegue a execução de tarefas, a alocação de recursos materiais e financeiros, a produção de bens e serviços, e prin- cipalmente o alcance dos objetivos organizacionais. A saúde e segurança também são outros dos aspectos muitos valo- rizados nas organizações. É uma das principais bases para a preservação da força de trabalho adequada. A hi- giene do trabalho é um conjunto de normas e procedimentos que visa à proteção da integridade física e mental do trabalhador, está relacio- nada com o diagnóstico e com a pre- venção de doenças ocupacionais, evitando assim que o trabalhador adoeça e se ausente provisória ou definitivamente do trabalho. A segu- rança do trabalho é um conjunto de medidas técnicas, educacionais, mé- dicas e psicológicas empregadas pa- ra prevenir acidentes, eliminando assim as condições inseguras do am- biente, quer instruindo ou conven- cendo as pessoas da implantação de práticas preventivas. A saúde e segu- rança são fundamentais para o de- senvolvimento do trabalho. O psicólogo nas organizações também é responsável pelo desen- volvimento organizacional, um con- junto de técnicas projetadas para ajudar as organizações a mudar para melhor. Ajuda os funcionários a me- lhorar seu desempenho e interagir com os seus companheiros detraba- lho de forma mais eficiente através de princípios e procedimentos com- portamentais. Uma iniciativa de desenvolvi- mento organizacional muda a forma com que as pessoas trabalham, co- mo elas se comunicam e como coor- denam seus esforços. O desenvolvi- mento organizacional é como “esfor- ço de longo prazo, apoiado pela alta direção, no sentido de melhorar os processos de resolução de proble- mas de renovação organizacional, por meio de um eficaz e colaborativo diagnóstico e administração da cul- tura organizacional, com a assistên- cia de um consultor- facilitador e a utilização da teoria e da tecnologia das ciências comportamentais”. Com o desenvolvimento orga- nizacional surgem novos conceitos de organização, de cultura organiza- cional e de clima organizacional. A organização atua em um meio ambi- ente e sua existência e sobrevivência dependem da maneira de como ela se relaciona com o meio, portanto ela deve ser estruturada em função das condições e circunstâncias que caracterizam o meio em que ela ope- ra. A cultura organizacional é um conjunto de hábitos, crenças, valo- res e tradições, interações e relacio- 11 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL namentos sociais típicos de cada or- ganização, representam o costume e a maneira tradicional de pensar e fa- zer as coisas, sendo assim, cada or- ganização tem sua própria cultura. E o clima organizacional constitui o meio interno ou a atmosfera psicoló- gica, está ligada ao moral e à satisfa- ção das necessidades dos participan- tes, podendo ser assim saudável ou doentio, quente ou frio, satisfatório ou insatisfatório, ou seja, depende do sentimento dos participantes em relação à organização, se a empresa está de acordo com as suas próprias necessidades. O objetivo do desenvolvimen- to organizacional é mudar a cultura e melhorar o clima da organização. A mudança é uma transição, de uma situação para outra situação diferen- te. O processo de mudança implica em ruptura, transformação, pertur- bações, interrupções, que resulta em adaptação, renovação e revitaliza- ção. Segundo o modelo de mudança de Lewin o processo de mudança en- volve três etapas: A primeira o descongelamento do padrão atual de comporta- mento, na qual as velhas ideias são derretidas e desaprendi- das para a implementação de novas, as necessidades de mu- danças são obvias e a organi- zação como um todo rapida- mente a entende. A segunda etapa é a mudança, ela surge quando existe a des- coberta e adoção de novas ati- tudes, valores e comporta- mentos, é a fase em que novas ideias e práticas são aprendi- das, as pessoas passam então a pensar e executar de uma nova maneira. E por último o recongelamen- to, na qual ocorre a incorpora- ção de um novo padrão de comportamento de modo que se torne uma nova norma. Em todo processo de mudança de um lado existem forças positivas que são apoio, e de outro existem forças negativas, que atuam como oposição. Para implementar uma mudança é necessário a análise de ambas as forças, e a neutralização ou remoção das forças negativas. Por- tanto a mudança ocorre somente quando a força impulsionadora e fa- vorável são maiores que as forças restritivas e impeditivas. Para o processo de mudança é necessário o envolvimento de funci- onários em todos os níveis da orga- nização quando existe um programa ou iniciativa de desenvolvimento or- ganizacional. O agente de mudança é a pessoa ou grupo que implemen- ta, é o catalisador da mudança den- tro de uma organização, um especi- alista em trabalhar com organiza- ções para melhorar o seu funciona- 12 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL mento. O agente de mudança, tam- bém pode ser um consultor externo contratado. O trabalho do agente de mu- dança é ser guia e orientador para o processo de desenvolvimento. Pode ministrar aulas, nas quais os funcio- nários são treinados sobre novas formas de comunicação e operação dentro de suas organizações. Tam- bém pode conduzir sessões em gru- po, as quais membros da organiza- ção planejam mudanças que irão melhorá-la, servindo assim como um facilitador e mediador de possí- veis disputas entre as pessoas. O desenvolvimento organiza- cional baseia-se em processos gru- pais, como discussões em grupos, confrontações, conflitos intergru- pais e procedimentos para coopera- ção. Existe um esforço para desen- volver equipes, melhorar as relações interpessoais, abrir os canais de co- municação, construir confiança e encorajar responsabilidades entre as pessoas. O objetivo é construir equi- pes de trabalho, propor a coopera- ção e integração, ensinando como ultrapassar diferenças individuais ou grupais para obter a cooperação e o compromisso. Também o desenvolvimento não segue um procedimento rígido, ao contrário é flexível adaptando-se as ações para adequá-las às necessi- dades específicas e particulares. As- sim os participantes discutem todas as alternativas possíveis e não se ba- seiam exclusivamente em uma única maneira de abordar os problemas. Ele é feito por meio de equipes, as comunicações e interações consti- tuem os espaços fundamentais para obter multiplicação de esforços e di- reção à mudança. O processo de desenvolvimen- to organizacional é um processo de mudança que leva anos e pode conti- nuar indefinidamente. Esse proces- so é dividido em oito etapas: A primeira envolve a decisão da empresa em utilizar o de- senvolvimento organizacional como instrumento de mudan- ça organizacional e escolher um consultor para coordenar o projeto. Na segunda, ocorre o diagnós- tico, na qual o consultor se re- úne com a direção da empresa para definir o programa ou modelo utilizado. Em seguida ocorre a colheita de dados, que é realizada por meio de pesquisa para conhe- cer o ambiente interno, avaliar o clima organizacional e obter dados sobre os problemas comportamentais, através de reuniões com grupos. Então ocorre a retroação de dados e confrontação, nesta etapa grupos de trabalhos são criados para avaliar e rever da- 13 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL dos obtidos, com o objetivo de localizar problemas e estabele- cer prioridades de mudança. A quinta etapa é o planeja- mento de ação e solução de problemas, ou seja, elaboração de planos específicos respon- sáveis pela condução das ações, quando e como elas de- vem ser implementadas. Em consequência ocorre o de- senvolvimento de equipes, na qual gerentes e subordinados são incentivados a trabalha- rem em equipes utilizando a comunicação aberta e confian- ça. Então surge o desenvolvimen- to intergrupal, na qual os gru- pos realizam reuniões de con- frontação com o objetivo de al- cançar melhor relacionamento intergrupal entre as diversas equipes. E por último está a avaliação e acompanhamento, onde o consultor avalia os resultados e desenvolve outros progra- mas nas áreas onde resultados apontam necessidades. O agente da mudança utiliza várias técnicas de desenvolvimento organizacional para realizar a co- lheita de dados, diagnóstico organi- zacional e ação de intervenção. Estas técnicas têm o objetivo de melhorar a eficácia das pessoas, as relações entre pessoas, o funcionamento do grupo, as relações entre os grupos. Com isso ocorre uma melhora na efi- cácia da organização como uma to- talidade. Conclui-se assim que o traba- lho do psicólogo organizacional é amplo e com o tempo ele deixou a análise do indivíduo e passou a en- xergar a organização. Atualmente o psicólogo organizacional cumpre um papel muito mais político e es- tratégico, na elaboração de políticas de recursos humanos, planejamento estratégico, desenvolvimento de car- reiras e planos de sucessos, desen- volvimento de equipes, análise e mudanças da cultura organizacio- nal, programas dequalidade de vida, etc. Atuando assim com o estabele- cimento de estratégias para os vários escalões da empresa, na busca de objetivos de curto, médio e longo al- cance, identificando e propondo so- luções para problemas que envol- vam os recursos humanos (WAN- DICK, 2009). O Campo de Aplicação Segundo Borges-Andrade e Pagotto (2010) a Psicologia Organi- zacional e do Trabalho (PO&T) ou a Psicologia do Trabalho e das Organi- zações (PT&O) pode ser definida co- mo: Subárea de conhecimento - tem o fazer humano enquanto objeto de estudo e os contextos do trabalho e das organizações como locais desse estudo. 14 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL Campo de aplicação de conhe- cimentos ou de intervenção - precisa dar respostas a ques- tões práticas concernentes a interações entre o comporta- mento humano, o trabalho e as organizações onde este com- portamento pode ocorrer, bem como a questões relacionadas às práticas dessas organiza- ções. Aquela subárea e este campo podem passar por processos especí- ficos de desenvolvimento, respecti- vamente relacionados à pesquisa ci- entífica e à atuação profissional. Precisarão periodicamente estabele- cer contatos que permitam que pro- dução e utilização do conhecimento caminhem mais ou menos juntas e que mútuos benefícios possam emergir. Esses benefícios mais facil- mente emergirão se existirem aque- les contatos. Os autores que iniciaram este tópico realizaram uma pesquisa ob- jetivando revisar a produção intelec- tual realizada na subárea de conhe- cimento PT & O ou PO & T. Antes disso, apresentaram alguns dados sobre o campo de aplicação PO&T ou PT&O (profissionais de psicolo- gia) e sobre onde ocorre a produção da sua subárea de conhecimento (pós-graduação) e onde ela é divul- gada (periódicos científicos), mas neste momento nos interessa apenas apresentar o seu campo de aplicação para servir de base ao gestor de equi- pes e liderança, uma vez que, como explicamos introdutoriamente, esse profissional vai lidar e/ou contratar diversos especialistas, portanto, pre- cisa ter um conhecimento mínimo das diversas áreas relacionadas a gestão de pessoas. O campo de aplicação ou de in- tervenção em PT&O deve utilizar o conhecimento gerado pela pesquisa, para solucionar problemas relacio- nados ao comportamento humano no trabalho, à interação entre esse comportamento e a organização on- de ocorre, e às práticas utilizadas pa- ra organizar a ação individual e a co- letiva, visando atingir determinados objetivos (ZANELLI; BASTOS, 2004). O Papel do Psicólogo nas Or- ganizações Segundo Busarello (2009) a presença dos psicólogos organizaci- onais, dentro das empresas, está sendo considerada neste milênio, como a peça fundamental no traba- lho organizacional, pois suas práti- cas são desenvolvidas de acordo com a visão e cultura da empresa, resul- tando em técnicas eficientes no de- senvolvimento de estratégias no se- tor de recursos humanos. Além de desenvolverem e potenciarem as ca- 15 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL pacidades de cada um dos colabora- dores, os psicólogos fazem questão de melhorar as relações interpesso- ais, a comunicação e, claro, a sua adaptabilidade às condições envol- ventes (“ambientais”) da sociedade ou do macro-sistema (BUSARELLO, 2009). A aplicação dos conhecimen- tos da psicologia às empresas tem como enfoque o auxílio ao funciona- mento efetivo dentro do campo or- ganizacional, priorizando o desen- volvimento dos colaboradores, por meio de mudanças planejadas e par- ticipativas, nas quais o homem pos- sa adquirir maior controle em seu ambiente. O psicólogo atua como fa- cilitador das relações entre pessoas e organizações, contribuindo para o desenvolvimento de ambas. A Sociedade de Psicologia In- dustrial e Organizacional (SIOP) descreve como atividade do psicólo- go organizacional: pesquisa de clima organizacional, projetar sistemas de avaliação de desempenho de colabo- radores, seleção / programas de trei- namentos, avaliar a eficácia de uma atividade ou prática, bem como pro- gramar sistemas para mudanças or- ganizacionais, tendo como foco principal o trabalho prático. É possível perceber que cada vez mais se abre um caminho para a psicologia dentro das organizações. É preciso investir em pessoas, pois uma organização só funcionará bem se souber utilizar com competências seus colaboradores, e este é o papel do psicólogo nas organizações: en- tender em profundidade o compor- tamento do colaborador, suas atitu- des e maneiras de lidar com o mun- do (BUSARELLO, 2009). Segundo pesquisadores, as empresas com estrutura vertical, on- de o RH inexista ou ocupem papéis pouco valorizados, irão desaparecer do mercado. Pois as empresas para sobreviverem precisam valorizar o potencial humano, e o desenvolvi- mento de pessoas. Estamos assistin- do atualmente a significativa mu- dança de paradigma na área de re- cursos humanos para uma nova fase da Gestão de Pessoas, pois hoje, o gerador de riqueza de uma empresa é, indiscutivelmente, o ser humano, através da sua mais elevada e com- plexa capacidade: a criação intelec- tual. As pessoas formam a essência de uma organização, e ela só funcio- nará bem se souber utilizar com competência seus colaboradores. E é neste sentido, que os psicó- logos, na qualidade de cientistas ao serviço do homem, têm muito por fazer nas empresas, enfatizando em cada indivíduo a sua automotivação e ajudando a estabelecer objetivos pessoais, algo conseguido através de uma estimulação criativa e, sobre- tudo, da persuasão, potenciando-se, 16 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL paralelamente, as suas capacidades (BUSARELLO, 2009). De acordo Stoner e Freeman (1985) uma organização, define-se onde duas ou mais pessoas traba- lham juntas. Para eles as organiza- ções nos permitem viver em socieda- de de modo civilizado, refletindo ne- cessidades e valores culturalmente aceitos. Elas também preservam co- nhecimentos através das bibliotecas, museus, escolas e universidades, transformando-se em pontes entre as pessoas e os registros ali armaze- nados. Para os mesmos autores, as pessoas acumulam conhecimentos e estudam para transformar todo este potencial armazenado em carreiras, seja em corporações empresariais, repartições públicas, escolas, igre- jas, ou seja, para atuarem em orga- nizações. Chiavenato (2008) enfatiza que as pessoas passam maior parte de seu tempo nos locais onde traba- lham, e que esta longa permanência constitui-se em uma forma de habi- tar. De acordo com ele, os aspectos ambientais do habitar do sujeito po- dem afetar o bem-estar psicológico, intelectual, a saúde mental e a inte- gridade das pessoas. Assim, a intervenção realizada pelo Psicólogo do Trabalho, pautada pelo emprego da Ética dentro das or- ganizações contribuirá para a edifi- cação e solidificação de um ambien- te fomentador de saúde, qualidade de vida e motivação no espaço desti- nado ao trabalho que se constitui nos tempos atuais como forma de sobrevivência. Devido a estas variáveis, e por ser o psicólogo o profissional da área da saúde, acredita-se que as organi- zações são espaços onde o psicólogo deve conhecer e atuar de maneira preventiva e social no contexto do trabalho laboral. A Psicologia Social A psicologia é usualmente de- finida como ciência do comporta- mento humano e a psicologia social como aquele ramo dessa ciência que lida com a interação humana. Um dos maiores propósitos da ciência é o estabelecimento de leis gerais por meio da observação sistemática. Segundo Gergen (2008) para o psicólogo social, tais leis gerais são desenvolvidas a fim de descrever e explicar a interação social. Essa vi- são tradicional da lei científicarepe- te-se de uma ou outra forma em qua- se todas as pesquisas fundamentais do campo. Em sua discussão sobre o papel da explicação nas ciências do comportamento, DiRenzo (1966, p. 11) apontou que uma “explicação completa” nas ciências comporta- mentais “é aquela que assumiu o es- 17 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL tatuto invariável de lei”. Krech, Crutchfield e Ballachey (1962, p. 3) declararam que “enquanto estiver- mos interessados em psicologia so- cial como uma ciência básica ou co- mo uma ciência aplicada, um con- junto de princípios científicos é es- sencial”. Jones e Gerard (1967, p. 42) propagaram esta visão: “a Ciên- cia busca compreender os fatores responsáveis por relações estáveis entre eventos”. Mills (1969, p. 412) colocou que os “psicólogos sociais querem descobrir relações causais que permitam estabelecer princípios básicos que explicarão o fenômeno da psicologia social”. (Todos citados por GERGEN, 2008). Faz parte do trabalho da Psico- logia Social, estudar as manifesta- ções comportamentais suscitadas pela interação de várias pessoas, portanto, a percepção social faz par- te do seu objeto ou objetivo de es- tudo. O processo preceptivo envolve uma série de variáveis que se inter- põem entre o momento da estimula- ção sensorial e a tomada de consci- ência daquilo que foi responsável pela estimulação sensorial. Dentre os fatores que influem no processo perceptivo temos: a. Seletividade Perceptiva - Nos- sos órgãos sensoriais são atingidos por uma variedade de estímulos. Mas só percebemos um subconjunto dos estímulos. Nas interações hu- manas a seletividade perceptiva se evidencia numa série de situações. Ex: percepção de características ne- gativas - pessoas que não gostam as- pectos favoráveis - pessoas que nos agradam - “fechar os olhos” aos de- feitos dos amigos - comportamento preconceituoso. b. Experiência prévia e conse- quente disposição para responder - Nossas experiências passadas facili- tam a percepção de estímulos que anteriormente - entrado em contato. Por exemplo, em mesmo tempo de exposição, as palavras conhecidas são as mais percebidas e as palavras desconhecidas as menos percebidas. Estímulos conhecidos são mais facilmente comunicáveis e de- terminadas disposições a responder podem ser aproveitadas para maior eficácia de uma comunicação persu- asiva. c. Condicionamento - recompen- sar o sujeito quando perceber o vaso branco ou punir quando na situação enxergar o contrário gera o condici- onamento - tendência de enxergar vaso branco. Ex: problemas de comunicação - pessoas de culturas diferentes ou ambientes educacionais - condicio- namento anterior que tiveram = per- cepções distintas. 18 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL d. Fatores Contemporâneos ao fenômeno Perceptivo - Certas condi- ções contemporâneas predispõem o organismo a emitir determinadas respostas. - Fome, pobreza, sede, cansaço podem interferir na percepção do estímulo sensorial. Ex: um empregado ansioso e com medo de ser despedido vê em com- portamentos irrelevantes de seu chefe - sinais de descontentamento e possível demissão. Defesa perceptiva - palavras tabu; Acentuação perceptiva - moe- da de maior valor. A Psicologia Social do Traba- lho De acordo com Sato (2003, p. 168), consolidaram-se no Brasil dois grandes campos teórico-práticos no interior da psicologia, campos que constroem de modos distintos o tra- balho humano como objeto. O pri- meiro abraça problemas e interesses postos pelo corpo gerencial e pelo capital, articulando-se, por exemplo, com a administração e com a enge- nharia. O segundo vale-se da leitura da psicologia social que se articula com as ciências sociais e visa a com- preender o trabalho a partir do olhar de quem o vivencia, o trabalhador. Diferenças de leitura também foram evidenciadas por Spink (1996), que aponta duas tradições de compreensão do que é uma organi- zação. De um lado, uma tradição ins- trumental, de inspiração gerencial, que compreende a organização co- mo uma estrutura que se apresenta ao psicólogo como fonte de proble- mas de gestão a serem resolvidos. De outro, a perspectiva de uma psi- cologia do trabalho que toma a orga- nização como um fenômeno psicos- social (SATO; ESPANHOL BER- NARDO; OLIVEIRA, 2008). Historicamente, a perspectiva da psicologia vinculada aos interes- ses empresariais e gerenciais - que teve origem na psicologia industrial da virada para o século XX e é deno- minada no Brasil e em vários outros países como psicologia organizacio- nal - demarcou o campo da psicolo- gia voltado para as questões do tra- balho e dos processos organizativos e permanece hegemônica na atuali- dade. Ainda que se possam observar mudanças em suas propostas ao lon- go desse tempo - que levaram essa vertente da psicologia a deixar de ser apenas uma área relacionada à apli- cação de técnicas e a incorporar ati- vidades de pesquisa -, tais metamor- foses nas práticas adotadas “não re- fletem uma guinada em termos de objetivos ou de concepção” (SATO, 2003, p. 168). Isso porque o objetivo continua sendo o de fornecer subsí- 19 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL dios para buscar a eficiência e a pro- dutividade (SATO; ESPANHOL BERNARDO; OLIVEIRA, 2008). Por outro lado, na vertente da psicologia social, interessa compre- ender fenômenos como: “identida- de, processos de interação social, processos de percepção e de cogni- ção social e a subjetividade” (Sato, 2003, p. 169). Em geral, tais fenô- menos são estudados entre traba- lhadores e trabalhadoras, focalizan- do os momentos da produção e da reprodução em diversos contextos de trabalho. Além de estudos inter- nacionais que se tornaram referên- cias nesse campo (por exemplo, WEIL, 1996), temos, no Brasil, estu- dos importantes, no âmbito da psi- cologia, que focalizam o universo so- cial, os valores, as trajetórias e as as- pirações de trabalhadores e traba- lhadoras das classes populares, co- mo os de Rodrigues (1978), Mello (1988) e Fonseca (2000), que têm por objeto a vivência de trabalho e a condição dos trabalhadores na soci- edade hierarquizada. Já o olhar para aspectos relaci- onados ao conteúdo e à organização dos processos de trabalho que pos- sam trazer consequências negativas para os trabalhadores, no caso do Brasil, foi possibilitado por um im- portante movimento que construiu o campo da saúde do trabalhador, for- jado a partir do movimento sindical e dos serviços públicos de saúde (Ri- beiro; Lacaz; Dutra; Clemente, 2002; Sato, Lacaz; Bernardo, 2006). A saúde, compreendida como direito e não como recurso necessário à pro- dução, tem sido o mote a partir do qual diversas reivindicações de me- lhorias das condições de trabalho e de direitos sociais são feitas. Embo- ra emerja no campo da saúde cole- tiva e das práticas em saúde pública, a leitura sobre a relação trabalho e saúde está incluída no segundo cam- po teórico prático (a vertente da psi- cologia social), conforme Sato (2003), pois essa leitura está apoi- ada nas ciências sociais e na econo- mia política, que compreendem o processo saúde-doença como um processo social, como formulada pe- la medicina social latino-americana (GARCÍA, 1989; LAURELL; NORI- EGA, 1989) Cabe ressaltar, ainda, que his- toricamente a psicologia do trabalho dedicou pouca atenção às modalida- des de trabalho criadas pelos estra- tos pobres da população, como os pequenos comerciantes, os artesãos e os trabalhadores de ofício. E isso ocorre inclusive em países como os da América Latina, em que a socie- dade salarial, nos termos definidos por Castel (1998), nunca foi uma re- alidade e o mercado comporta a con- vivência entre atividades de trabalho formais e informais degrandes em- 20 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL presas transnacionais com expres- sas finalidades de reprodução do ca- pital a pequenos empreendimentos e trabalhos criados para suprir as necessidades mínimas de sobrevi- vência, como mostrou Ackermann (2007). Além disso, o trabalho rural também tem sido pouco estudado pela psicologia do trabalho no Bra- sil. Uma hipótese para explicar as razões dessa opção, e que merece ser investigada, é a de que a psicologia do trabalho, mesmo nos países sub- desenvolvidos, voltou-se para res- ponder às necessidades gerenciais, ao mercado formal de trabalho e apenas recentemente dá mostras de que reconhece que esse mercado en- globa somente uma parte do traba- lho e das atividades econômicas ca- pazes de gerar renda para as pes- soas. Observa-se, assim, que os es- tudos voltados para o trabalho den- tro da psicologia comportam abor- dagens e focos bastante diferentes. De acordo com Spink (1996, p. 174), “o que é hoje chamado de psi- cologia do trabalho é uma lista de tó- picos tão vasta que perde qualquer significado específico e é difícil con- siderar como um conjunto” (SATO; ESPANHOL BERNARDO; OLIVEI- RA, 2008). 22 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL 2. A Entrevista Psicológica Fonte: Vetor Editora2 entrevista psicológica é um ins- trumento fundamental de tra- balho para o psicólogo e outros pro- fissionais como sociólogo, psiquia- tra e assistente social e se diferencia das outras formas de entrevista de- vido a seus objetivos puramente psi- cológicos (investigação, diagnóstico, terapia, etc.) (SILVESTRE, 2009). Pode ser de dois tipos funda- mentais: aberta e fechada. Na entre- vista aberta há uma maior flexibili- 2 Retirado em https://blog.vetoreditora.com.br/a-entrevista-em-avaliacao-psicologica/ dade, pois o entrevistador conduz o curso das perguntas de acordo com a necessidade e o caso, em detrimen- to da entrevista fechada onde tanto a ordem quanto a maneira de formu- lar as perguntas já estão previstas e não podem ser alteradas. Segundo Silvestre (2009) a es- colha entre a forma mais livre e aberta ou a forma mais fechada e pré-estruturada de entrevista se dá principalmente por suas caracterís- A 23 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL ticas peculiares, para quem pretende investigar mais ampla e profunda- mente a personalidade do entrevis- tado deve optar pela entrevista aber- ta, já quem pretende fazer uma com- paração sistemática de dados deverá optar pela entrevista fechada. Ao pensar na estrutura da en- trevista deve-se levar em considera- ção o problema exposto, assim como é importante associar a perspectiva histórica e uma abordagem dinâmi- ca. Dependendo da problemática e da estrutura da personalidade do paciente, certas áreas e certos confli- tos deverão ser mais explorados do que outros, concentrando-se em de- terminados pontos da vida do paci- ente que sejam potencialmente ca- pazes de fornecer explicações para a emergência e o desenvolvimento do transtorno atual (CUNHA, 2000, p. 60). Segundo Strauss (1999, p. 574) maior ou menor ênfase pode ser da- do a cada tópico de uma entrevista estruturada ou a forma de seleção das informações significativas tem que estar de acordo com o objetivo do exame, tipo de paciente e sua ida- de, ou, ainda, com “as circunstancias da entrevista de avaliação”. A entrevista aberta pode, ain- da, ser configurada de acordo com as variáveis que dependem da persona- lidade do entrevistado. A entrevista psicológica tam- bém pode ser classificada de acordo com o número de entrevistados (in- dividual e grupal) e segundo o bene- ficiário, Bleger (1998) divide da se- guinte forma: Em benefício do entrevistado (consulta psicológica ou psi- quiátrica); Em favor dos resultados (pes- quisa - importam os resulta- dos); Em benefício de terceiros (ins- tituição). Em cada tipo de entrevista su- pracitada deve-se levar em conside- ração as distintas variáveis que en- trarão em ação, como no caso da en- trevista para uma instituição, as res- postas do entrevistado pode ser mais tendenciosa do que em uma pesqui- sa anônima, por exemplo. A entrevista psicológica (em benefício do entrevistado) é a única das três que não precisa de uma ati- tude motivadora marcante por parte do entrevistador, muito devido a existência de motivos individuais por parte do entrevistado que já são auto-motivantes, o que não ocorre nas outras duas formas. Quanto aos objetivos da entre- vista psicológica podemos observar variadas formas, como: Anamnese: tem por objetivo reconstruir a história do sujei- to; 24 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL Orientação: julgar suas apti- dões para uma aprendizagem; Seleção: Sondar as aptidões para um emprego; Arguição Oral: tem por obje- tivo sondar seus conhecimen- tos; Entrevista preliminar a uma psicoterapia: objetiva contri- buir para o diagnóstico, para a indicação e para o tratamento de sujeitos que sofrem distúr- bios psíquicos e/ou relacio- nais; Aconselhamento Psicológico: ajudar o sujeito a enfrentar uma dificuldade pontual na existência; Formação: levar os sujeitos a uma melhor comunicação com outrem. A entrevista pode ser solicita- da pelo interessado (entrevista clíni- ca, aconselhamento), pelo psicólogo (enquete, sondagem de opinião, es- tudo de mercado, pesquisa científi- ca) ou por um terceiro (médico, em- pregador, professor). Para Bleger (1998) “A Entre- vista psicológica consiste em uma relação humana na qual um dos in- tegrantes deve procurar saber o que está acontecendo e deve atuar se- gundo esse conhecimento”. A realização dos objetivos pos- síveis da entrevista (investigação, di- agnóstico, orientação, etc) depende desse saber. O técnico não só utiliza a entrevista para aplicar seus conhe- cimentos psicológicos no entrevista- do, como também essa aplicação se produz precisamente através de seu próprio comportamento no decorrer da entrevista. A regra básica para a Entrevis- ta Psicológica consiste em obter da- dos completos sobre o comporta- mento total do indivíduo no decor- rer da entrevista. A teoria da entrevista foi enor- memente influenciada pelos conhe- cimentos provenientes da psicanáli- se, gestalt, topologia e behavioris- mo. As principais contribuições das abordagens para a teoria da en- trevista: Psicanálise: contribuiu com a inserção do conhecimento acerca da dimensão inconsci- ente do comportamento, como nas resistências, repressões, introjeção, projeção, transfe- rência e contratransferência. Gestalt: contribuiu com a compreensão da entrevista co- mo um todo, onde o comporta- mento do entrevistador é uma das partes que deve ser levada em consideração. Topologia: levou a delinear e reconhecer o campo psicológi- co e suas leis, assim como o en- foque situacional. Behaviorismo: contribuiu com seu enfoque na observação e estudo do comportamento (SILVESTRE, 2009). 26 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL 3. A Terceirização e o Contrato Psicológico Fonte: Portal de Camocim3 o novo contexto do trabalho, proliferam diversas formas de contrato, com variados graus de comprometimento entre empregado e organização. O emprego em tempo integral, de longo prazo e com car- teira assinada passa a coexistir com acordos alternativos tais como ter- ceirização, trabalhos temporários e em tempo parcial. Autores como Al- lan (2000) e Rubery et al. (2003) ci- tados por Lopes e Silva (2008) têm tentado observar os efeitos desta di- versidade de relações para organiza- ções e indivíduos. Outros, como Gio- sa (1993) e Prado e Takaoka (2001), têm verificado as diversas naturezas3 Retirado em http://portaldecamocim.com.br/outros/saude-outros/contrato-psicologico-de-trabalho-fator- de-satisfacao-comprometimento-e-motivacao/ dos contratos constituídos nestas si- tuações. Sparrow (2000 apud Lopes e Silva, 2008) chama a atenção, entre- tanto, para a necessidade de se re- correr a conceitos alternativos àque- les que eram tradicionalmente utili- zados nos estudos sobre a gestão das relações de trabalho, de modo a se dar conta da complexidade dessa nova realidade. O autor assevera, ainda, que é preciso ter cuidado na generalização de análises sobre o comportamento dos indivíduos nes- tas novas relações, ilustrando com a seguinte questão: como explicar que trabalhadores com contratos menos N 27 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL formais, possam ter o mesmo grau de satisfação com o trabalho que ou- tros com empregos mais sólidos? Um conceito importante para que se entendam as novas relações de trabalho é o de contrato psicoló- gico, definido por Rousseau (1995 apud Lopes e Silva, 2008) como a crença individual, moldada pela or- ganização, sobre os termos de um acordo de trocas entre indivíduos e a organização à qual estão vinculados. Nas relações de trabalho tradi- cionais, o contrato psicológico ten- dia a ser baseado na expectativa de uma relação duradoura (Wetzel, 2000), na qual a reciprocidade entre indivíduo e organização era, em grande parte, pactuada por um con- trato formal e reafirmada nas intera- ções cotidianas de um contexto que tendia a ser estável. Percebe-se que, ainda hoje, o foco principal da gestão de pessoas concentra-se nos indivíduos com contratos de trabalho formais e du- radouros, deixando de lado os pro- fissionais com outros tipos de vincu- lação, como, por exemplo, os tercei- rizados. Esses tendem a ser vistos como uma mão de obra sem expec- tativas pessoais e cujas necessidades não são um problema da empresa. Diante desse cenário, Lopes e Silva (2008) elaboraram uma pes- quisa na qual tomaram algumas questões como relevantes: Seria o conceito de contrato psicológico al- go que só faz sentido no caso dos que têm uma relação formal de traba- lho? Como seria a lógica de forma- ção deste contrato, no caso de indi- víduos que mantêm relações com di- ferentes empresas? A compreensão sobre tais questões é importante para que se tente entender parte das inconsis- tências entre o discurso e a prática das organizações atuais que, ao mes- mo tempo em que enfraquecem os vínculos com os trabalhadores, re- forçam um discurso de reconheci- mento da importância das pessoas para o seu sucesso. Impregnadas pelo discurso de flexibilização dos mecanismos de produção (Kumar, 1997), as últimas décadas foram marcadas pela inten- sificação de uma série de práticas ge- renciais. Nos anos 1980, os gestores eram julgados pela habilidade de re- estruturar, alavancar negócios e re- duzir a hierarquia. Entre tais práti- cas, destacavam-se o downsizing e a terceirização. Wetzel (2000, p. 21) define downsizing como “uma eliminação planejada de postos de trabalho e de cargos”. Segundo a autora, as razões do downsizing nas empresas brasi- leiras teriam sido variadas, envol- vendo enxugamento, racionalização, modernização e redução de despe- sas, entre outras motivações. 28 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL Também na década de 1990, as teorias de core competences e as práticas de terceirização ganharam mais espaço nas organizações. Core competences ou competências es- senciais são um conjunto de habili- dades e tecnologias que dão resulta- do, ao apontarem um diferencial fundamental para a competitividade da empresa (RUAS, 2005). Uma competência essencial pode ser identificada por três critérios: pro- ver acesso potencial para uma varie- dade de mercados; contribuir signi- ficativamente para a percepção do cliente quanto aos benefícios trazi- dos ao produto final; não poder ser imitada facilmente. Com a terceiri- zação das atividades não essenciais, as empresas poderiam concentrar seus esforços nas atividades princi- pais, atingindo, assim, melhores re- sultados. Giosa (1993) descreve quatro tipos de terceirização: Tipo 1 - Processos ligados à ati- vidade fim da empresa (ex: produção, distribuição, opera- ção); Tipo 2 - Processos não ligados à atividade fim da empresa, tais como limpeza, manuten- ção e contabilidade; Tipo 3 - Atividades de suporte à empresa, como treinamento, seleção e pesquisas; Tipo 4 - Substituição de mão de obra direta por mão de obra indireta ou temporária. Inicialmente, diz Giosa, o pro- cesso de terceirização limitava-se à contratação de serviços de baixa qualificação (Tipo 2). Posteriormen- te, sua abrangência expandiu- se para áreas críticas como projeto, fa- bricação, distribuição e sistemas de informação (Tipo 1). Além disso, a terceirização passou a ter valor es- tratégico, visto que o resultado do serviço realizado pelas contratadas influencia o resultado da empresa. Para Giosa (1993), a terceirização só é positiva, porém, se as empresas contratantes têm, a seu lado, presta- doras de serviços alinhadas com suas necessidades. Mais do que um mero contrato, a relação deveria ser de parceria. O autor define parceria citando Giosa (1993, p. 15): uma no- va visão de relacionamento comer- cial, onde o fornecedor migra de sua posição tradicional, passando a ser o verdadeiro sócio do negócio, num regime de confiança plena junto ao cliente, refletindo a sua verdadeira e nova função de parceiro. Allan (2000) observa que a li- teratura que aborda a terceirização e outras alternativas de contrato de trabalho tem olhado mais para as vantagens do que para as desvanta- gens decorrentes de sua adoção. En- tre as principais vantagens para a or- ganização, o autor destaca o maior aproveitamento do tempo dos traba- 29 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL lhadores e a redução da taxa de ab- senteísmo e dos custos com encar- gos e benefícios. Quanto às desvan- tagens, o autor aponta: maiores cus- tos administrativos de manutenção, pagamento, supervisão, treinamen- to e recrutamento; alto turno ver; aumento dos custos de equipamen- tos e espaço físico; problemas de comprometimento, motivação, co- municação, e confidencialidade; di- ficuldade de retenção de habilida- des; reação contrária dos emprega- dos formais, criando problemas nas políticas de RH. Nas relações de trabalho tradi- cionais, os funcionários eram alta- mente internalizados, envolvidos com a organização em uma relação de longo prazo e limitados às suas fronteiras legais e administrativas. Os vínculos de longo prazo, com alto grau de internalização, e os de curto prazo, com alto grau de externaliza- ção, não são novos e têm existido por séculos. A inovação estaria na exis- tência dos vínculos de curto-prazo com internalização e nos de longo prazo com externalização (Rous- seau, 1995 apud Lopes e Silva, 2008). Partindo destas premissas, Rousseau identifica quatro tipos principais de perfis de trabalhado- res: os centrais ou fixos, os carreiris- tas, os pooled workers e os indepen- dentes ou autônomos. Funcionários centrais ou fixos são os trabalhadores internos com um relacionamento de longo prazo. Eles seriam importantes para a con- tinuidade da empresa, por meio de suas habilidades essenciais, da assi- milação da cultura e valores organi- zacionais. Espera-se desse grupo al- to grau de comprometimento com a organização e que tenham a vida profissional como um interesse cen- tral. Cappelli (1999 apud Lopes e Silva, 2008) lembra, porém, que, em um mercado caracterizado por mu- danças constantes, tanto as habili- dades essenciais quanto o foco dos negócios podem mudar, tornando complexa a gestão desses trabalha- dores centrais. Rousseauclassifica como car- reiristas os empregados que espe- ram fazer carreira em um nicho do mercado e não necessariamente na mesma empresa. Contratados para executar trabalhos que exijam co- nhecimentos específicos, estes indi- víduos ficam associados a uma orga- nização por um curto período. Seu trabalho é monitorado por resulta- do, sem necessidade de assimilação da cultura organizacional. Eles espe- ram que o mercado permita a conti- nuidade desses curtos vínculos em várias instituições e que não tenham que estabelecer contratos de longo prazo com nenhuma empresa em 30 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL particular. A presença desse grupo seria importante, pois proveria a fle- xibilidade necessária para a sobrevi- vência da organização no mercado. Pooled workers seriam indiví- duos externos contratados para tra- balhar por um período determinado na empresa. Porém, como os contra- tos são renovados periodicamente, podem ficar vinculados à contratan- te por anos consecutivos. Ainda as- sim, o término da relação é mais rá- pido e menos oneroso para ela. Es- ses trabalhadores podem executar funções similares às dos centrais ou fixos e alguns chegam a receber sa- lários até mesmo maiores do que os trabalhadores fixos, como um “alu- guel de lealdade” pago para induzi- los à cooperação e ao esforço duran- te a vigência do contrato. Finalmente, Rousseau classi- fica como independentes ou autôno- mos os trabalhadores temporários que estabelecem um contrato de curto prazo, exercendo atividades bem específicas, como projetos mais curtos. Podem estar ligados a tarefas que exigem baixa qualificação ou ser profissionais mais qualificados, tais como contadores e consultores. Uma característica do contex- to atual das relações de trabalho é o fato de que os indivíduos podem mi- grar de uma configuração para ou- tra, no que se refere aos diferentes tipos de contrato. Rousseau (1995) lembra que o contrato psicológico não é apenas baseado em promessas formais ou documentos escritos, mas também em outras formas de expressão de comprometimento e intenção futu- ra, tais como a tradição e a cultura. Pesariam também na formação e manutenção deste contrato, caracte- rísticas e condições de vida pessoal dos indivíduos (ex: idade, sexo, for- mação, situação familiar), além das experiências anteriores em outros contextos de sua trajetória profissio- nal. Maguire (2001 apud Lopes e Silva, 2008) propõe o modelo three- tier para analisar o contrato psicoló- gico. Neste modelo, em um primeiro nível mais baixo, os empregados as- sumiriam contribuir com níveis ra- zoáveis de responsabilidade - horas de dedicação à empresa, autonomia, controle de suas tarefas e gerencia- mento do excesso da carga de traba- lho - em troca de níveis apropriados de retorno - pagamento, boas condi- ções de trabalho e oportunidade de demonstrar competência. Observando a realidade das empresas na configuração de redes, nas quais coexistem diversos tipos de vínculos empregatícios em um mesmo ambiente de trabalho, Silva et al. (2001) identificam como prin- cipais desafios para a gestão de pes- 31 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL soas, de modo a se obter comprome- timento dos trabalhadores: planeja- mento integrado, comunicação e ne- gociação entre empresas, diferença na política de benefícios, clareza na definição de responsabilidades, ges- tão da carreira dos terceiros (pois nem sempre os gestores da empresa fornecedora estão presentes para avaliação e reconhecimento) e pro- blemas de identificação. Um outro fenômeno que, por vários motivos, tem atraído a aten- ção de psicólogos sociais que se de- dicam ao estudo do mundo do traba- lho são algumas formas alternativas de trabalho derivadas do chamado trabalho associado. Isso não é por acaso, pois as- sistimos nas últimas décadas a um crescimento do interesse de diversos setores sociais de vários países lati- no-americanos pelo cooperativismo. Seja em uma vertente empresarial, na qual as cooperativas de mão de obra aparecem como um caminho para a contratação de trabalhadores sem o peso dos custos trabalhistas legais, seja em uma vertente de eco- nomia solidária ou de ajuda mútua, na qual o cooperativismo aparece para trabalhadores de empresas re- cuperadas ou para os participantes de políticas públicas de fomento à economia solidária como alternativa ao desemprego e como superação da condição de “empregado”. A partir de uma pesquisa sobre as relações cotidianas de trabalho no cooperativismo (Oliveira, 2005), em que foram comparadas cooperativas surgidas a partir das duas vertentes acima apontadas, pôde-se perceber importantes nuances do fenômeno. A pesquisa apontou pelo me- nos dois sentidos distintos do coope- rativismo derivados das vivências de seus trabalhadores. Primeiro, um sentido ajustado ao discurso geren- cial da “flexibilização”, especifica- mente, a flexibilização dos vínculos de trabalho (no caso das cooperati- vas de mão de obra, que são notada- mente desprovidas das característi- cas próprias da autogestão) a serviço da terceirização de mão de obra (LI- MA, 2007; OLIVEIRA, 2007). Se- gundo (no caso das cooperativas de trabalho em que existe de fato a ges- tão do negócio e do trabalho pelos próprios sócio-trabalhadores), um sentido de emancipação que, ao mesmo tempo, enfatiza uma capaci- dade auto-organizativa coletiva. Quando tomadas na vertente da terceirização de mão de obra, as cooperativas seguem o mesmo recei- tuário da flexibilização visto acima a propósito do toyotismo. Não se trata propriamente da flexibilização da produção nesse caso, mas especifi- camente da flexibilização das rela- ções de trabalho: as cooperativas de mão-de-obra apresentam-se como 32 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL uma alternativa dentro do quadro legal brasileiro para a contração de força de trabalho na medida da sua necessidade pela produção. Essas cooperativas são chamadas por Li- ma (2004) de cooperativas “prag- máticas”. Lima (2004) opõe a esses em- preendimentos as cooperativas “de- fensivas”, entre as quais inclui as fá- bricas recuperadas e as cooperativas ligadas à economia solidária. Segun- do Oliveira (2007, p. 76), elas são: “cooperativas que enfatizam os valo- res da autogestão e representam a defesa de interesses em comum en- tre os trabalhadores”. Também encontrou-se nas di- ferentes cooperativas pesquisadas uma ordem cotidiana negociada. No caso das cooperativas de mão de obra, uma ordem atravessada pelas estruturas hierárquicas e em que nada difere da estrutura das empre- sas tradicionais. Quanto às coopera- tivas autogeridas a redundância é necessária para marcar a distinção com a terceirização promovida pelo cooperativismo destacado acima, encontramos processos de negocia- ção marcados pela horizontalidade das relações de poder e pelos confli- tos próprios desses arranjos. A novidade presente no coope- rativismo autogerido está justamen- te na vivência de trabalho distinta que proporciona a seus membros. À vivência de empregado, subordina- do a chefes ou patrões, as cooperati- vas autênticas opõem a vivência co- mo sócio-trabalhador (ESTEVES, 2004). Segundo Oliveira (2007, p. 80), ao analisar as cooperativas que investigou: “Enquanto sócio-traba- lhadores, condição que caracteriza o trabalho associado, os entrevistados (...) reconhecem-se duplamente, com maior ou menor intensidade e clareza, como empreendedores (sentem-se sócios em um negócio coletivo e ao mesmo tempo seu) e como produtores, isto é, como traba- lhadores. Vivenciam isso pela proxi- midade com a gestão e pelas preocu- pações que têm que ter simultanea- mente com o negócio e com o cotidi- ano da produção, gostem disso ou não”. Essavivência confere um ou- tro sentido à realização de diversas atividades pelos trabalhadores en- trevistados. Se na empresa toyotista a chamada “multifuncionalidade” é vivida como aumento da exploração ou como “desvio de função”, nas co- operativas autênticas, a realização de atividades diversas representa o envolvimento do trabalhador (na condição de sócio do empreendi- mento) com o sucesso do negócio. Investigar as vivências, as re- lações de trabalho e os sentidos pro- duzidos sobre o trabalho permitiu, 33 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL primeiro, fazer a distinção entre co- operativas de trabalho e cooperati- vas de mão de obra (OLIVEIRA, 2007). Segundo, permitiu encontrar nas cooperativas de fato autogeridas uma vivência no trabalho distinta daquela dos trabalhadores nas em- presas tradicionais. Esse tipo de vi- vência, marcada pelas relações não assimétricas, distancia-se do toyo- tismo analisado acima e guarda se- melhança com a capacidade organi- zativa autônoma da feira livre (AS- TO; HESPANHOL BERNARDO; OLIVEIRA, 2008). 34 35 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL 4. A Inclusão de Pessoas Portadoras de Necessida- des no Trabalho - A Visão da Psicologia Fonte: Metadados4 processo de inclusão políti- co-sócio-cultural demanda- do por diversos setores da sociedade tem acontecido, embora que ainda de forma bastante parcial. Isso de- monstra a urgência de tratar a inclu- são na contemporaneidade” (MAR- TINS, 2003). Como diz Grisci (1999) (...) já é tempo da psicologia vir a contribuir no sentido de conhecer modos de pensar, apreciar e agir dos sujeitos acerca de temas emergentes da con- 4 Retirado em https://www.metadados.com.br/blog/entenda-a-importancia-da-inclusao-das-pessoas-com- deficiencia/ temporaneidade, ao tomar contex- tos referentes ao mundo de trabalho que passa por reestruturações e re- novações tecnológicas e sobre ele re- pousar um olhar que se caracterize ao mesmo tempo, crítico e criativo. A partir desse contexto, vamos discutir um pouco acerca das rela- ções da psicologia sobre a organiza- ção do trabalho para analisar os im- pactos da inclusão dos portadores de necessidade especiais no mercado de trabalho. “O 36 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL Vale relembrar o conceito de Psicologia Organizacional pelas pa- lavras de Toledo (1986): É o estudo do fator humano na organização. Es- te estudo abrange a atração, reten- ção, treinamento e motivação dos recursos humanos na empresa, as- sim como a criação de condições or- ganizacionais de trabalho e sistemas de recompensa (...) que auxiliem na criação de clima propício para que funcionários possam atingir suas metas de trabalho e desenvolvimen- to profissional. (...) A psicologia or- ganizacional em seu contexto mais amplo, coloca ênfase nos aspectos grupais e organizacionais do traba- lho. Segundo Chiavenato (1999), na maioria das organizações o gran- de diferencial e a principal vantagem competitiva das empresas decorrem das pessoas que nelas trabalham. São as pessoas que geram e fortale- cem a inovação e o que deverá vir a ser. Existe uma tendência das or- ganizações ampliarem seu papel, deixando de ser somente unidades de produção de bens e serviços; para se tornarem, também, espaços soci- ais em que os indivíduos, isolados ou em grupos, possam realizar aprendi- zagens mais significativas para o de- senvolvimento de seus potenciais inexplorados; onde tenham oportu- nidade de usar seus talentos em prol do próprio desenvolvimento e do de- senvolvimento da organização e da sociedade (MOSCOVICI, 1994, p. 73). Para Morin (2001) os momen- tos de transformação organizacional constituem potencialmente uma oportunidade para reorganizar o trabalho de tal forma que a qualida- de de vida e a eficácia organizacional sejam melhoradas; já que o trabalho representa um valor importante, exerce influência considerável sobre a motivação dos trabalhadores e também sobre sua satisfação e sua produtividade. O ser humano não trabalha só pela necessidade de dinheiro para sobreviver, mas também porque o trabalho contribui para a sua digni- dade, seu valor como pessoas. O tra- balho dá ao ser humano mais con- trole sobre sua vida e o conecta com as outras pessoas, afinal, todos vive- mos em uma imensa rede social. Co- mo diz White (s.d. apud SASSAKI, 1997, p. 1) “Sinto-me realmente pri- vilegiado em ser remunerado pelo o que adoro fazer. Toda sociedade que exclui pessoas do trabalho, por qual- quer motivo, sua deficiência ou sua cor ou seu gênero, está destruindo a esperança e ignorando talentos. Se fizermos isso, colocaremos em risco todo o futuro”. Tendo em vista as considera- ções acima, Araújo e Schmidt 37 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL (2006) afirmam que a inclusão é um processo no qual a sociedade se adapta para permitir a participação das pessoas em todos os seus seto- res, inclusive daquelas pessoas com necessidades especiais, e essas, por sua vez, se preparam para assumir seus papéis na sociedade. Nota-se que o acesso ao mercado de trabalho é um dos aspectos do processo de in- clusão; importante por proporcio- nar às pessoas condições para a sa- tisfação de suas necessidades bási- cas, sua valorização e o desenvolvi- mento de suas potencialidades. O Brasil conta com 24 milhões de pessoas com deficiência, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essas pessoas, porém, não circulam nas ruas, nas escolas comuns, nos locais de lazer e cultura e muito menos têm acesso ao trabalho. É hora, portanto, de se re- verter esse quadro. Segundo Abranches (2000), aproximadamente desde 1990 é crescente a pressão social no sentido de que os direitos humanos dessas pessoas sejam respeitados dando cumprimento, entre outras coisas, à oferta de serviços de educação, rea- bilitação, saúde, transporte, empre- go, etc. A história de oferta de profis- sionalização para portadores de ne- cessidade especial passou por diver- sas fases ao longo dos tempos. De acordo com Sassaki (1997), podem- se identificar diferentes momentos nos procedimentos de profissionali- zação adotados pela sociedade e di- recionadas às pessoas portadoras de necessidades especiais, como por exemplo, a fase de exclusão social, de segregação institucional, da inte- gração e da inclusão social. Na fase de integração, diversas modalidades de trabalho eram ofe- recidas às pessoas portadoras de ne- cessidades especiais - o trabalho ple- namente integrado, no qual essas trabalhavam em setores de empre- sas públicas ou privadas sem que houvesse qualquer reestruturação ambiental ou cultural da própria empresa para receber tais funcioná- rios; trabalho integrado, no qual as empresas se dispunham a fazer pe- quenas alterações em seu espaço fí- sico ou nos postos de trabalho para favorecer a colocação desses funcio- nários; e o trabalho semi-integrado, em que eles trabalhavam em setores exclusivos das empresas, portanto segregativos, com ou sem alterações (SASSAKI, 1997). Essas formas de integração fa- vorecem que os funcionários com necessidades especiais tenham difi- culdade em se envolver em progra- mas de treinamento e desenvolvi- mento de recursos humanos, seja por dificuldades de acesso, seja por 38 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL falta de integração social real com os demais participantes da empresa. Na fase da inclusão, o que se pretende é que empregadores, insti- tuições formadoras e os portadores de necessidades especiais enfrentem juntos os desafiosda qualificação, da produtividade e da competitivi- dade. No Brasil, a profissionalização dessas pessoas tem sido oferecida, prioritariamente, por instituições especializadas, por centros de reabi- litação e por associações de pessoas deficientes. As modalidades de pro- fissionalização oferecidas vão desde o treinamento para a colocação em emprego competitivo até o progra- ma de emprego apoiado, passando por alternativas como o trabalho protegido (oficinas) ou programas de pré-profissionalização (SASSA- KI, 1997). A literatura atual tem se mos- trado favorável a programas de em- prego apoiado, como forma viável de inclusão de portadoras de necessi- dades especiais no mercado de tra- balho, apesar de ainda ser uma mo- dalidade pouco difundida entre as agências profissionalizantes (RA- GAZZI, 2001; ARANHA, 2003) Segundo Sassaki (2000), des- de a Carta para o Terceiro Milênio, proclamada em 1999, a meta de to- das as nações é de evoluírem para sociedades que protejam os direitos das pessoas com deficiência medi- ante o apoio ao pleno empodera- mento e inclusão delas em todos os aspectos da vida. No entanto, essa meta depara- se com alguns problemas, como por exemplo, da educação e da emprega- bilidade, em que se destaca o prepa- ro profissional inadequado dos usu- ários de instituições especializadas e o despreparo atitudinal, arquitetô- nico e programático das empresas para receber trabalhadores com de- ficiência (SASSAKI, 2000) Conforme Sassaki (2000), pa- ra uma efetiva educação profissional e colocação no mercado é preciso educar a sociedade para que ela ado- te a visão inclusivista na elaboração e prática das políticas públicas em torno dos direitos e necessidades de todos os segmentos populacionais. Assim é preciso estar atento para não perpetuar, nas novas políticas públicas, certas práticas geradas sob o paradigma da integração social, tais como: criação de subsistemas separados para pessoas com defici- ência (escolas especiais, classes es- peciais, brinquedos separados em parques de diversões etc.). Tais prá- ticas são segregativas, discriminató- rias e reforçadoras de estigmas, en- tre outros aspectos negativos. É preciso uma mudança de ati- tude que envolva a pessoa com defi- 39 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL ciência, sua família, a instituição es- pecializada e a comunidade, em es- pecial o mercado de trabalho. A atu- alização das políticas públicas, as- sim como a elaboração de novas po- líticas públicas, deve passar, por- tanto, pelo prisma da inclusão social a fim de que possamos ter a garantia de que estamos no rumo certo diante das novas tendências mundiais no enfrentamento dos desafios da di- versidade humana e das diferenças individuais em todos os campos de atividade humana. Também é importante que a sociedade, em especial as empresas, mude em termos de filosofia de con- tratação das pessoas deficientes; com a implementação de programas de prontidão simultânea para em- pregar pessoas com deficiência e das pessoas com deficiência para desen- volver sua empregabilidade; imple- mentação de sistemas nacional e es- taduais de educação profissional e colocação no mercado de trabalho; as escolas comuns e as escolas espe- ciais devem tornar-se cada vez mais inclusivas. Por fim, Sassaki (2000) enfa- tiza a atualização das instituições es- pecializadas em termos de filosofia de atendimento à pessoas com defi- ciência, oferecendo programas e ser- viços condizentes com o atual movi- mento de empoderamento e vida in- dependente. A psicologia em geral, em es- pecial a psicologia organizacional, tem, como um de seus papéis, a im- portância de favorecer a inclusão, orientando e formando profissionais dessa área com ênfase no ser huma- no, para permitir uma maior consci- entização popular e acadêmica sobre esta temática, realçando o significa- do do trabalho na vida do homem, como espaço de realização pessoal e de formação de identidade, e o risco à saúde física e psíquica do trabalha- dor advindo da não concretização destas vivências positivas (GRISCI, 1999). O homem não é uma máquina. O homem tem emoções, sentimen- tos e necessidades que, muitas ve- zes, fogem à sua vontade. Cabe ao administrador, gestor de equipes, gestor de pessoas e o psicólogo co- nhecer este ser cada vez mais para visualizá-lo em suas plenas potenci- alidades, seja ele portador de neces- sidades especiais ou não (GRISCI, 1999). Portanto, incluir é reconstruir nossa subjetividade para termos as ferramentas que permitam a sobre- vivência, a solidariedade e o conví- vio com as diferenças. Analisando pelo viés das van- tagens para a organização, uma vez que as empresas têm uma grande ca- pacidade de influir na transforma- ção da sociedade, mesmo as mudan- 40 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL ças de caráter interno repercutem diretamente na vida dos funcioná- rios, suas famílias e na comunidade com a qual a empresa se relaciona. Além da motivação ética e da determinação legal, a empresa tem outro motivo relevante para adotar uma política inclusiva em relação à pessoa com deficiência: ela pode ob- ter benefícios significativos com essa atitude. Um dos ganhos mais impor- tantes é o de imagem. O prestígio que a contratação de pessoas com deficiência traz às empresas está bastante evidente na pesquisa Res- ponsabilidade Social das Empresas - Percepção do Consumidor Brasilei- ro, realizada anualmente no Brasil, desde 2000, pelo Instituto Ethos, jornal Valor e Indicator. Em 2000, 46% dos entrevistados declararam que a contratação de pessoas com deficiência está em primeiro lugar entre as atitudes que os estimula- riam a comprar mais produtos de determinada empresa. Em 2001, essa continuou sendo a atitude mais destacada, com 43% dos consumi- dores entrevistados repetindo essa mesma resposta. Também há ganhos no ambi- ente de trabalho. A empresa inclusi- va reforça o espírito de equipe de seus funcionários, fortalecendo a si- nergia em torno dos objetivos co- muns e expressando seus valores co- letivamente. O ambiente físico ade- quado atenua as deficiências e tor- na-se mais agradável para todos. Enfim, esses fatores humanizam mais o ambiente de trabalho. Com um clima organizacional assim, também é possível obter ga- nhos de produtividade, se as pessoas com deficiência estiverem devida- mente inseridas nas funções onde possam ter um bom desempenho. O diverso traz para a empresa a possi- bilidade de ver novas oportunidades no seu negócio, além de prepará-la para demandas específicas de dife- rentes universos que incorpora. São vantagens cumulativas: O desempenho e a produção das pessoas com deficiência, que muitas vezes supera as ex- pectativas do início do contra- to. O desempenho da empresa que mantém empregados por- tadores de deficiência em geral é impulsionada pelo clima or- ganizacional positivo. Os ganhos de imagem tendem a fixar-se a longo prazo. Os impactos positivos de em- pregar pessoas com deficiên- cia refletem-se sobre a motiva- ção dos outros funcionários. Os empregados portadores de deficiência ajudam a empresa a ter acesso a um mercado sig- nificativo de consumidores com as mesmas característi- cas, seus familiares e amigos. 41 PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL O ambiente de trabalho fica mais humanizado, diminuin- do a concorrência selvagem e estimulando a busca da com- petência profissional (ETHOS, 2002). Antes de ser uma vantagem para a organização a garantia de acesso ao trabalho para as pessoas com deficiência é prevista tanto na legislação internacional como na brasileira. No Brasil, as cotas de va- gas para pessoas com deficiência fo- ram definidas em lei de 1991, porém só passou a ter eficácia no final de 1999,
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