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A responsabilidade civil das entidades da administração pública indireta, consoante o art 280, II, do novo Código Brasileiro de Aeronáutica

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A RESPONSABILIDADE CIVIL DAS ENTIDADES DA 
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA, CONSOANTE O 
ART. 280, II, DO NOVO CÓDIGO BRASILEIRO 
DE AERONÁUTICA 
JosÉ DA SILVA P ACHECO* 
1. Presume-se a eficácia e constitucionalidade da lei; 
2. Onde não houver pessoa jurídica de direito público 
e funcionário público não tem aplicação o art. 107 da 
CF; 3. Não se aplica o art. 107 da CF às pessoas jurídi-
cas de direito primdo encarregadas dos serviços de infra-
estrutura; 4. O art. 280. /l. refere-se a operadores de 
el1tidades de infra-estrutura aeronáutica da administração 
indireta ou privada. mas concessionários ou permissioná-
rios; 5. Do exame da gênese histórica do dispositivo; 6. 
Interpretação literal: 7. Não há inconstitucionalidade 110 
art. 280, /l do CRA; 8. Conclusões. 
1. Presume-se a eficácia e constitucionalidade da lei 
Ao focalizar-se o disposto no art. 280, 11, do novo Código Brasileiro de 
Aeronáutica (CBA), há que se munir, preliminarmente, de alguns princípios 
de hermenêutica, para evitar digressões apressadas de incautos que, à cata de 
inconstitucionalidades. invocam o disposto no art. 107 da Constituição federal 
como impediente de sua vigência. 
Realmente, todéls as preSll'lçÕeS militam em favor da validade e eficácia da 
lei.1 motivo por que "sempre que for possível, sem fazer demasiada violência 
às palavras, interprete-se a linguagem da lei com reservas tais que se torne 
constitucional a medida que ela institui. ou disciplina '',2 
Aliás, é regra básica a que manda preferir a inteligência dos textos que 
torne viável o seu objetivo, ao invés da que os reduz à inutilidade (Commo-
dissimum est. id accipi. quo res de qua agitur, magis valeat quam pereat) , de 
cuja aplicação forçoso é atribuir à lei um sentido de que resulta a validade, 
ao invés da nulidade, a eficácia, em lugar da ineficácia, a constitucionalidade, 
e não a inconstitucionalidade. 
2. Onde não houver pessoa jurídica de direito público e funcionário público 
não tem aplicação o art. 107 da CF 
O texto constitucional do art. 107 estabelece a responsabilidade objetiva e, 
por conseguinte, independente de apuração de culpa: 
a) das pessoas jurídicas de direito público; 
b) em relação a danos causados a terceiros por seus funcionários. 
* Ad"ogado, professor e consultor. 
Cf. Maximiliano. Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. n. 366, 111. 
Id., ibid. n. 367, IV, p. 308-9. 
R. C. paI., Rio de Janeiro, 30(4): 38-46, out./dez. 1987 
Dois elementos destacam-se de forma inequívoca, o primeiro é de pessoa 
jurídica de direito público e o segundo, de funcionário público, de modo que 
se pode ter por apodítica a afirmação de que onde não houver pessoa jurí-
dica de direito público e funcionário público não se há de cogitar da invocação 
do referido dispositivo constitucional. 
3. Não se aplica o art. 107 da CF às pessoas jurídicas de direito privado 
encarregadas dos serviços de infra-estrutura 
O teor do art. 280, 11, do CBA leva à convicção de que cuida de respon-
sabilidade civil: 
a) em serviços de infra-estrutura aeronáutica; 
b) das entidades de infra-estrutura aeronáutica; 
c) por culpa de seus operadores. 
Ora, na realidade prática, os serviços de infra-estrutura são realizados pela 
Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero), Telecomunicações 
Aeronáuticas S.A. (T ASA), Serviços Auxiliares de Transportes Aéreos S.A. 
(SAT A) e antes, pela Aeroporto do Rio de Janeiro S.A. (ARSA), todas enti-
dades com personalidade Jurídica de direito privado, e os demais serviços auxi-
liares são da responsabilidade das transportadoras, como está expresso no 
art. 104 do CBA, in verbis: "Todos os equipamentos e serviços de terra utili-
zados no atendimento de aeronaves, passageiros, bagagem e carga são de 
responsabilidade dos transportadores ou de prestadores autônomos de serviços 
auxiliares. " 
Portanto, não há qualquer óbice no art. 107 da CF à incidência e eficácia 
do art. 280, lI, do CBA em relação à responsabilidade das pessoas jurídicas de 
direito privado nos serviços de infra-estrutura aeronáutica, de que cogita, como 
se vê na epígrafe do capítulo e no próprio texto do dispositivo. 
Tampouco há, nesse dispositivo constitucional, impedimento à eficácia do 
art. 280, 11, em relação aos operadores dos serviços de infra-estrutura aero-
náutica, que não são funcionários públicos. 
4. O art. 280, /I. refere-se a operadores de entidades de infra-estrutura aero-
náutica da administração indireta ou privada, mas concessionários ou 
permissionários 
Quando o art. 280, 11, refere-se a "administração de aeroportos" ou "admi-
nistração pública", fá-lo em relação a "serviços de infra-estrutura", "por culpa 
de seus operadores", o que está a evidenciar: 
1 9 que se cogita da Infraero e Tasa, entidades de infra-estrutura aeronáutica, 
da administração pública indireta, que, consoante os arts. 49 e 59 do De-
creto-lei n9 200/67, integra a administração pública, mas com personalidade 
jurídica de direito privado; 
29 que se trata de operadores que não são funcionários públicos, porque se 
destes houvesse tratado a eles teria se referido. 
Código Brasileiro de Aeronáutica 39 
Em geral, no direito público e, também, no direito que à administração pú-
blica se refere, emprega-se, de preferência, "a linguagem técnica, o dizer ju-
rídico, de sorte que se houver diversidade de significado do mesmo vocábulo, 
entre a expressão científica e a vulgar, inclinar-se-á o hermeneuta no sentido 
da primeira".3 
Desse modo, o art. 107 da CF há de ser entendido como referindo-se estri-
tamente à pessoa jurídica de direito público e ao funcionário público como tal. 
Do mesmo modo, o art. 280, 11, do CBA, ao referir-se a "administração 
pública" em relação a "serviços de infra-estrutura aeronáutica", "por culpa 
de seus operadores", é claro que há de ser entendido como dirigindo-se às 
"entidades de infra-estrutura aeronáutica", como está na epígrafe do capítulo V, 
da administração pública indireta, que, de conformidade com os arts. 4° e 59 do 
Decreto-lei n9 200/67 têm personalidade jurídica de direito privado e atuam, 
por meio de seus empregados ou operadores contratados, os quais não são 
funcionários públicos. 
5. Do exame da gênese histórica do dispositivo 
Se descermos ao exame do dispositivo do art. 280, 11, do CBA, sob o as-
pecto histórico de sua gênese, verifica-se que a Comissão que elaborou o 
anteprojeto havia usado a expressão "administração pública indireta", que foi, 
posteriormente, substituída por "administração pública", sob a justificativa 
de que: 
1. na expressão "administração pública" já está implícita a "a administração 
pública indireta", uma vez que, conforme os arts. 4° e 59 do Decreto-lei 
n9 200. de 1967, a administração pública compreende a indireta, da empresa 
pública (Infraero), e sociedade de economia mista (Tasa e, antes, Arsa); 
2. era preciso, também, resguardar a administração pública direta, exatamente 
na hipótese de ser chamada à responsabilidade, por culpa dos "operadores de 
serviços de infra-estrutura", contratados, autorizatários, concessionários ou per-
missionários, em que o ato lesivo não foi praticado pelo funcionário público, 
no exercício de sua função, pessoa jurídica de direito público; 
3. não se estava regulando a responsabilidade direta, objetiva e sem inda-
gação de culpa de pessoa jurídica de direito público por ato de seu funcio-
nário público, no exercício de função pública, que já estava regulado pelo 
art. 107 da CF, mas somente a eventual responsabilidade indireta, por culpa 
dos operadores de serviços de infra-estrutura, que, geralmente, são de enti-
dades de infra-estrutura aeronáutica, concessionários, permissionários ou con-
tratados. 
6. Interpretação literal 
Na interpretação literal do texto, ainda, há que ter presente que a ex-
pressão "administração pública" tem mais de um sentido, cabendo ao intér-
3 Maximiliano, Carlos. op. cit. p. 306. 
40 R.C.P. 4/87 
prete contornar a escolha com o seu exame em conjunto comos demais 
termos do capítulo e do próprio dispositivo em que se insere. 
Lançando mão da interpretação literal do art. 280, 11, do CBA, insta sa-
lientar, de início, que a epígrafe do capítulo V, em que se situa, esclarece 
a matéria de que se trata, de forma inequívoca: "Capítulo V da Responsabili-
dade ... das entidades de infra-estrutura aeronáutica". 
Tendo em vista que tal epígrafe foi presente ao legislador e aceita como 
acessório da lei, ajuda a deduzir os motivos e o objeto da norma, prestando 
relevante serviço à exegese, no sentido de enfatizar que, no item 11 do art. 280, 
cuida-se, especialmente, da responsabilidade: 
a) das entidades de infra-estrutura aeronáutica da administração pública in-
direta, que têm personalidade jurídica de direito privado, às quais não se 
aplica o art. 107 da CF; 
b) por culpa dos "operadores" dos serviços de infra-estrutura aeronáutica, 
que não são funcionários públicos de pessoas jurídicas de direito público, aos 
quais, também, não se aplica o art. 107 da CF. 
Aliás, sob esse enfoque, cabe assinalar que fora os casos de responsabilidade 
das entidades de serviços de infra-estrutura aeronáutica, que não são pessoas 
jurídicas de direito público, pode ocorrer eventual responsabilidade indireta 
da administração pública somente quando, eventualmente, venha a ser cha-
mada a responder por ato, não dos seus funcionários, mas de "operadores" 
de serviços de infra-estrutura contratados ou pertencentes a concessionárias 
ou permissionárias. 
Basta ler o dispositivo com suas próprias palavras para verificar que ele 
apenas estabelece que se aplicam os limites do CBA à eventual responsabili-
dade da administração dos aeroportos (Infraero) ou da administração pública, 
por culpa dos operadores dos serviços de infra-estrutura. 
As hipóteses que se cogitam em relação à administração pública são duas: 
a) a relativa à administração pública indireta, com personalidade jurídica de 
direito privado, a que não se aplica o art. 107 da CF; 
b) a relativa à eventual responsabilidade indireta da administração por atos 
dos operadores dos serviços de infra-estrutura aeronáutica. Os "operadores", 
neste caso, não são do Poder Público, porque se o fossem seriam "funcioná-
rios", termo técnico que não foi usado porque o dispositivo a eles não se 
refere. Os "operadores" são dos serviços de infra-estrutura aeronáutica, que, 
geralmente, são empregados das entidades de que cogita a epígrafe do capí-
tulo, ou de prestadores autônomos de serviços auxiliares (art. 104, artigo 91, 
parágrafo único, do CBA). 
7. Não há inconstitucionalidade no art. 280, lI, do eBA 
O art. 107 da CF de 1969 dispõe que "as pessoas jurídicas de direito pú-
blico responderão pelos danos que seus funcionários, nessa qualidade, causa-
Código Brasileiro de Aeronáutica 41 
rem a terceiros", cabendo ação regressiva contra o funcionário responsável, nos 
casos de culpa ou dolo. Da análise desse dispositivo, resulta evidente: 
a) que se trata de responsabilidade civil em contraposição a responsabilidade 
penal ou criminal; 
b) que se cuida de responsabilidade civil de pessoas jurídicas de direito pú-
blico, com exclusão de todas aquelas que sejam pessoas jurídicas de direito 
privado; 
c) que se focalizam os danos causados a terceiros e não os danos causados 
por terceiros a si próprios, o que evidencia que se há culpa da vítima não há 
como invocar-se a responsabilidade da pessoa jurídica; 
d) que se tem em vista danos causados por funcionários que atuem nessa 
qualidade de funcionários públicos, o que exclui os casos em que o serviço 
é prestado por terceiros e não por funcionários; 
e) se houver culpa ou dolo do funcionário, caberá à pessoa jurídica de direito 
público ação regressiva contra ele; 
f) os pressupostos e a extensão da indenização são os da lei ordinária. 
Feitos esses enfoques do referido dispositivo constitucional em vigor por 
ocasião da edição do Código, surge a questão sobre se há nele qualquer óbice 
à vigência do art. 280, lI, que manda aplicar, conforme o caso, os limites 
estabelecidos no CBA, à eventual responsabilidade da administração dos aero-
portos ou da administração pública. em serviços de infra-estrutura, por culpa 
de seus operadores em acidentes que causem danos a passageiros ou coisas. 
Para a resposta, insta analisar este artigo do Código. Dessa análise, advém que: 
a) manda-se aplicar os limites estabelecidos no CBA à eventual indenização, 
o que não encontra empecilho no art. 107 da CF de 1969, porque, como ensina 
Pontes de Miranda, "os pressup:)stos e a extensão da indenização são os da lei 
ordinária" (Com. à CO/lSt. fed .. ao art. 107); 
b) tais limites são aplicáveis à eventual responsabilidade da administração dos 
aeroportos. que, geralmente. é da Infraero. empresa pública de direito privado, 
a que não se aplica o art. 107 da CF. que só à pessoa jurídica de direito público 
se refere; 
c) tais limites são aplicáveis também à eventual responsabilidade em servicos 
de infra-estrutura aeronáutica (arts. 25 a 105), por culpa de seus operadores 
que, geralmente, não são funcionários públicos que atuem nessa qualidade e, 
por conseguinte, não há impedimento no art. 107 da CF, que só cogita de danos 
praticados por funcionários públicos que atuem nessa qualidade; 
d) tais limites são aplicáveis à responsabilidade da administração pública indi-
reta (Dec.-Iei nl? 200/67, arts. 41? e 51?) quando desta a execução dos serviços 
de infra-estrutura aeronáutica, como ocorre, por exemplo. com a Tasa e a 
própria Infraero, que não são pessoas jurídicas de direito público e, desse modo, 
não encontram obstáculo no art. 107 da CF; 
42 R.C.P. 4/87 
e) o art. 280, 11, refere-se, expressamente, à culpa dos operadores de serviços 
de infra-estrutura aeronáutica e não a funcionários públicos de pessoa jurídica 
de direito público que atuem nessa qualidade, o que exclui a incidência do art. 
107 d[; CF. 
Confrontando-se a análise do art. 107 da CF e do art. 280, 11, do CBA, veri-
fica-se que não há naquele qualquer estorvo à incidência deste. 
Como salienta Pontes de Miranda, "quando a pessoa estranha ( ... ) presta 
à administração pública serviço, necessário ou reclamado para o seu andamento, 
sem que o faça investido do cargo público ( ... ) Não se dá a responsabilidade 
funcional do art. 107. Os princípios que regem a responsabilidade são, em 
tais casos, os princípios do direito comum ordinário, ainda que se tenha de 
chamar à responsabilidade o Estado" (Com. à Consto federal, com. ao art. 107). 
Na lição desse mestre, "a responsabilidade do Estado, mesmo sem haver culpa, 
que se estabelece no art. 107. somente se refere a ato lesivo, praticado, em fun-
ção, pelo funcionário público, mesmo se esse, praticando o ato, usurpa fun-
ções" (op. cit., com. ao art. 107). 
Carlos Maximiliano, em comentários ao art. 194 da Constituição de 1946, 
que correspondia ao art. 107 da CF de 1969, salientava que "hoje prevalece 
a tese nova seguinte: o essencial é que a transgressão seja cometida pelo servi-
dor do Estado, no exercício de suas funções, quer se trate de falta pessoal, 
quer do serviço. Impõe-se o concurso de quatro requisitos: 
a) existir efetivamente o fato ilícito cometido por funcionário em violação do 
direito de outrem; 
b) ter aquele praticado o fato na qualidade de empregado público; 
c) no exercício de suas funções; 
d) dever o fato conter excesso de poder ou de atribuições por parte do fun-
cionário".4 
Themístocles Brandão Cavalcanti, em comentários ao mesmo dispositivo, põe 
em realce que: "delineia-se. de modo preciso, o princípio da representação que 
teve em nossa tradição jurídica tão vigorosos adeptos. Sem a finalidade fun-
cional, sem a representação, não se caracteriza a responsabilidade".5 
Hely Lopes Meirelles6 é bastante enfático ao distinguir: "O que a Constitui-
ção distingue é o dano causado pelos agentes da administração (funcionários) 
dos ocasionados por atos de terceiros, ou por fenômenos de natureza. Observa-
se queo art. 107 só atribui responsabilidade objetiva à administração pelos 
danos que seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros. Portanto, o 
legislador constituinte só cobriu o risco administrativo da atuação ou inação dos 
servidores públicos, não responsabilizou objetivamente a administração por 
atos predatórios de terceiros, nem por fenômenos naturais que causem danos 
a particulares.... 
Maximiliano. Carlos. Comentários à Constituição de 1946. 1954. V. 3. p. 260. 
Cavalcanti. ThemístocIes Brandão. Comentários à Constituição de 1946. 1953. V. 4, 
p. 204. 
~ MeireIles, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 13. ed. 1987. p. 553-4. 
Código Brasileiro de Aeronáutica 43 
Nestas hipóteses, a indenização pela Fazenda Pública só é devida se se com-
provar a culpa da administração. E, na exigência do elemento subjetivo culpa, 
não há qualquer afronta ao princípio objetivo da responsabilidade sem culpa 
estabelecido no art. 107 da CF, porque o dispositivo constitucional só abrange 
a atuação funcional dos servidores públicos e não os atos de terceiros e os fatos 
da natureza. Para situações diversas, fundamentos diversos". 
Como assevera Manoel Gonçalves Ferreira Filho,7 "note-se que funcionário 
público, no texto em exegese, abrange todo aquele que exerce função pública, 
seja a que título for. Abrange, portanto, os servidores de regime especial, nos 
termos do art. 106, os eventualmente sujeitos ao regime trabalhista, etc."8 
No art. 280, 11 não se cogita de prejuízo causado por funcionário público 
no exercício de sua função, mas de danos provocados por simples operadores 
de serviços de infra-estrutura aeronáutica, que não são funcionários públicos 
nem atuam nessa qualidade. Nesse caso, como acentua Pontes de Miranda, não 
se dá a responsabilidade funcional do art. 107. A administração pública indi-
reta, constituída de empresa pública ou de sociedade de economia mista, que 
opera em serviços de infra-estrutura aeronáutica, são pessoas jurídicas de direito 
privado e seus empregados não são funcionários públicos. E quando, eventual-
mente, a administração direta é chamada por ter autorizado ou permitido tal 
serviço, não ocorre responsabilidade funcional do art. 107. 
Ademais, ainda que por hipótese, se tratasse de responsabilidade íuncional 
da administração direta, não haveria impedimento que se estabelecesse limite 
à indenização, por meio de lei ordinária. No caso em exame, porém, não se 
cogita da responsabilidade direta da administração pública por ato de seu fun-
cionário. 
O art. 280, lI, do CBA, não tolhe a vítima ou o prejudicado de invocar a 
"responsabilidade direta ou exclusiva da pessoa jurídica de direito público" 
nos precisos termos do art. 107 da CF. 
Completa, porém, o dispositivo constitucional, regulando a hipótese, não pre-
vista por aquele dispositivo da CF, quando não ocorra essa responsabilidade 
direta e exclusiva mas possa a União ser chamada à eventual responsabilidade 
indireta por ato de "operador" de serviço de infra-estrutura aeronáutica, contra-
tado ou permissionário, como, por exemplo, se o "operador" abandonou o posto 
no aeroporto por não ter o Poder Público contido a invasão ou depredação 
provocada por motins. distúrbios ou outras perturbações da ordem pública, 
como, aliás, salienta Pontes de Miranda,9 referindo-se ao RE nO 4.622, do STF. 
O art. 280, lI, de modo algum, obriga a vítima ou o prejudicado a pro-
curar o "funcionário culpado", nem a provar a "culpa do funcionário", porque 
não cogita de "funcionário", mas de simples "operador" de serviço de infra-
estrutura aeronáutica de entidade da administração indireta de personalidade 
jurídica de direito privado ou de prestadores autônomos de serviços auxiliares 
de infra-estrutura, empregados ou contratados. 
O art. 280, 11, do CBA, não nega a responsabilidade objetiva da pessoa jurí-
dica de direito público por ato de seu funcionário, cogitando, apenas, de even-
tual responsabilidade indireta por ato de terceiros, operadores de entidades de 
infra-estrutura ou prestadores autônomos, que não são funcionários públicos. 
7 Ferreira Filho, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição de 1969. v. 2, p. 219. 
44 
Cf. Pontes de Miranda. Comentários à Constituição de 1967, t. 3, p. 543. 
Pontes de Miranda. Comentários à Constituição de 1967, p. 524. 
R.C.P. 4/87 
Os serviços de infra-estrutura aeronáutica são todos os que, situados em 
terra, visam dar apoio à navegação aérea, tais como os mencionados no art. 25 
do CBA. 
A sua instalação e funcionamento dependem, sempre, de prévia autorização 
do Ministério da Aeronáutica (§ 19 do art. 25 do CBA). 
Os serviços auxiliares do transporte aéreo incluem-se entre os serviços de 
infra-estrutura aeronáutica (art. 102 a 104), e, desse modo, devem ser autori-
zados pelo Poder Público (§ 19 do art. 25), embora tenham como "operadores" 
os próprios transportadores ou os prestadores autônomos, tais como a Sata. 
Desse modo, se por culpa desses "operadores", nos acidentes que causem 
danos a passageiros ou coisas, pretender o prejudicado invocar eventual res-
ponsabilidade indireta da administração pública por ter autorizado referida ope-
ração, aplicam-se os limites do CBA. 
Como o destinatário da concessão é o público usuário, "mantém certa seme-
lhança com a instituição privada de estipulação em favor de terceiros. Tam-
bém, aqui, como nesse instituto, observa-se a existência de três partes distintas 
na relação: o poder concedente, que delega o serviço; o concessionário, que 
irá executá-lo e o usuário, que será beneficiário da prestação. O poder conce-
dente e o concessionário são solidários contratualmente na prestação pública, 
em face do usuário, que, por se tratar de um serviço de utilidade pública, e ser 
ele parte indeterminada, mas determinável na tríplice relação estabelecida, terá 
direito subjetivo público contra ambos, indistintamente, de exigir a prestação"IO 
e, conseqüentemente, poderá vir a exigir eventual reparação de danos. 
Outro exemplo de aplicação do art. 280, 11, em relação à eventual respon-
sabilidade indireta da administração pública poderia ocorrer no caso de ter 
havido imperícia ou negligência do "operador" de serviços de infra-estrutura 
aeronáutica, sob a alegação de que cabe ao Ministério da Aeronáutica expedir 
licença ou certificado de controladores do tráfego aéreo ou de outros profis-
sionais dos diversos setores de atividades vinculadas à infra-estrutura aeronáu-
tica (parágrafo único do art. 100 do CBA) e, desse modo, poderia tornar-se 
responsável pela sua perícia e capacidade técnica. 
8. Conclusões 
Em face do exposto, parece-nos que: 
1. todas as presunções militam em favor da validade, eficácia e constitucio-
nalidade da lei; 
2. o art. 107 da CF e o art. 280, 11, do CBA tratam de situações e de fatos 
absolutamente diversos e, desse modo, como acentua Hely Lopes Meirelles, "para 
situações diversas, fundamentos diversos"; 
3. o art. 107 da CF somente abrange a atuação funcional dos funcionários e 
servidores públicos e não os atos de "terceiros", operadores dos serviços ou de 
entidades de infra-estrutura aeronáutica; 
4. onde não houver pessoa jurídica de direito público e funcionário público 
no exercício de sua função não tem aplicação o art. 107 da CF; 
1<1 Moreira Neto, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo. v. 2, p. 166. 
C6digo Brasileiro de Aeronáutica 45 
5. não se aplica o art. 107 da CF às pessoas jurídicas de direito privado en-
carregadas de serviços de infra-estrutura aeronáutica; 
6. o art. 280, lI, do CBA refere-se a operadores de entidades de infra-estrutura 
aeronáutica da administração indireta ou de prestadores autônomos, concessio-
nários, autorizatários ou permissionários; 
7. a gênese histórica do art. 280, 11, leva à conVlcçao de que apenas regula 
eventual responsabilidade indireta da administração por culpa dos operadores 
dos serviços de infra-estrutura aeronáutica; 
8. a interpretação lógica e sistemática não destoa da literalque decorre da 
própria ordem direta do art. 280, 11, in verbis: "os limites do CBA são aplicá-
veis à eventual responsabilidade da administração pública em acidentes que 
causem danos a passageiros ou coisas por culpa dos operadores das entidades 
de serviços de infra-estrutura aeronáutica". O pronome seus que antecede ope-
radores refere-se aos serviços de infra-estrutura aeronáutica e não à adminis-
tração de aeroportos ou administração pública; 
9. a responsabilidade da administração pode ser: 
I. direta e, nesse caso, é, consoante o art. 107 da CF: 
a) objetiva; 
b) integral; 
11. indireta e, nessa hipótese, de acordo com o art. 280, II. do CRA, pode: 
a) não ser objetiva: 
b) ser limitada; 
10. sendo duas hipóteses diferentes, duas espeCles diversas, resulta inequívoca 
a inexistência de conflito, incompatibilidade ou inconstitucionalidade; 
11. não há, pois, qualquer inconstitucionalidade no art. 280, lI, do CBA. 
46 R.C.P. 4/87

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