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para civilizar os nossos cães por hereditariedade. Demais, o hábito fez perder in-
teiramente aos pintainhos este terror do cão e do gato, que era sem dúvida algu-
ma primitivamente instintivo neles; o capitão Hutton diz-me, com efeito, que os 
franguinhos de origem igual, o Gallus bankiva, quando mesmo chocados na Índia 
por uma galinha doméstica, são, contudo, de uma selvajaria extrema. 
O mesmo acontece com os faisõezinhos criados na Inglaterra por uma gali-
nha doméstica. Não é porque os frangos tenham perdido todo o temor, mas uni-
camente o medo dos cães e dos gatos; porque, se a galinha dá o sinal de perigo, 
eles deixam-na logo (os novos perus principalmente), e vão procurar um refúgio 
nos alpendres vizinhos; circunstância cujo fim evidente é permitir à mãe voar, co-
mo se vê em muitas aves terrestres selvagens. Este instinto, conservado pelos 
frangos, é além disso inútil no estado doméstico; a galinha, por falta de uso, tem 
perdido toda a aptidão do vôo. 
Podemos concluir que os animais reduzidos à domesticidade perderam cer-
tos instintos naturais e adquiriram outros, tanto pelo hábito como pela seleção e 
acumulação que fez o homem durante gerações sucessivas, de diversas disposi-
ções especiais e mentais que apareceram, contudo, sob a influência de causas 
que, na nossa ignorância, chamamos acidentais. Em alguns casos, simplesmente 
bastam hábitos forçados para provocar modificações mentais tornadas hereditá-
rias; noutros, estes hábitos não entraram para nada no resultado, devido aos efei-
tos da seleção, tanto metódica como inconsciente; mas é provável que, na maior 
parte dos casos, as duas causas tenham atuado simultaneamente. 
 
INSTINTOS ESPECIAIS 
 
É estudando alguns casos particulares que chegaremos a compreender 
como, no estado de natureza, a seleção pôde modificar os instintos. Não apresen-
tarei aqui mais que três: o instinto que possui o cuco de por os ovos no ninho das 
outras aves, o instinto que certas formigas possuem em procurar escravas, e a 
faculdade que a abelha tem de construir suas células. Todos os naturalistas con-
cordam com razão em considerar estes dois últimos instintos como os mais mara-

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