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Pancreatite Aguda 1 Pancreatite Aguda PREVALÊNCIA 5 REVISÃO A pancreatite aguda é uma doença inflamatória do pâncreas, de potencial gravidade e manifestação clínica ampla. Tem como causa diversos agentes de potencial injúria pancreática, que levarão à autólise pancreática. Como consequência, haverá repercurssão inflamatória local e sistêmica em graus variados, determinando as manifetações clínicas do paciente. Em relação ao quadro clínico, o paciente se apresenta com uma queixa de dor abdominal importante, progressivamente intensa, acompanhada de náuseas e vômitos, e com grande queda do estado geral. A dor abdominal é epigástrica, em faixa no andar superior do abdome, irradiando-se para o dorso. O paciente desenvolverá uma importante resposta inflamatória. Esta, a depender da sua intensidade e da SIRS, será capaz de produzir repercussões clínicas de maior ou menor gravidade. A depender da gravidade da doença, haverá sinais de piora clínica decorrente da disfunção orgânica alcançada como dispneia, instabilidade hemodinâmica, desidratação e oligúria, e rebaixamento do nível de consciência. Ao cursar com complicações locais de necrose/hemorragia, a pancreatite pode levar a sinais de exame físico de sangramento peritoneal, como o Sinal de Cullen (equimose periumbilical) e de Grey Turner (equimose de flancos). Em casos graves e de exceção, pode haver sintomas de irritação peritoneal. O diagnóstico se dá pela presença de 2 dos 3 critérios a seguir: Dor abdominal. Elevação de enzimas (amilase e lipase). As enzimas elevam-se dentro de 6h do início da dor. Considera-se positiva uma elevação acima de 3x o limite superior da normalidade 300. Não há relação entre o grau de elevação das enzimas pancreáticas com a gravidade da doença. A lipase é mais representativa, pois tem maior sensibilidade e especificidade, além de manter-se elevada por até 7 dias. A amilase Pancreatite Aguda 2 normaliza-se ao final do 3º dia. TC de abdome com alterações de pancreatite. A TC geralmente é solicitada em pacientes inconscientes e em casos de dúvida diagnóstica. Nesses casos, revelará como achados positivos o edema do pâncreas e borramento da gordura adjacente, com líquido livre associado. Além disso, poderá mostrar achados de gravidade, como necrose do parênquima e coleções peripancreáticas. Após diagnosticar a pancreatite, devemos buscar a causa e avaliar a gravidade da doença. As causas possíveis são muitas e devem ser buscadas ativamente no paciente. As principais causas são: biliar, alcóolica ou idiopática. Outras causas incluem: medicamentos, autoimune, hipercalcemia, hipertrigliceridemia e trauma. A litíase biliar é a causa mais frequente de pancreatite aguda. Os principais medicamentos capazes de causar pancreatite incluem: diuréticos (furosemida e tiazídicos), antibióticos (metronidazol, tetraciclina e sulfatrimetoprim), imunossupressores (azatioprina, aminossalicilatos), anticonvulsivantes (ácido valpróico, carbamazepina) e estrógenos. Em uma pancreatite aguda sem causa identificada, uma droga recém introduzida na terapia do paciente pode ser a causa. A investigação deve seguir os passos abaixo: � Procurar causa biliar. a� A litíase biliar é a principal causa. No laboratório inicial já haverá pistas, com alterações em TGO, TGP, FA, GGT e bilirrubinas. O achado de colestase ou elevação de 3x da TGO aponta para causa biliar. b� O diagnóstico é firmado por USG abdominal. Ao identificar cálculos na vesívula, trataremos como pancreatite biliar. O exame mais sensível é a ecoendoscopia. É interessante a realização de colangiorressonância, para a pesquisa de coledocolitíase associada. � Se não encontrar litíase biliar, investigar ouras causas. a� Álcool: procurar história de ingesta alcoólica “aguda .ˮ A ausência de litíase biliar e a presença de ingesta alcóolica alta recente firmam o diagnóstico. Pancreatite Aguda 3 b� Idiopática: o diagnóstico ocorre após afastadas as demais causas. Hoje sabe-se que muitas das pancreatites diagnosticadas como idiopáticas são, na realidade, causadas por microlitíase biliar, visualizadas na ecoendoscopia. c� Medicamentos: buscar medicamentos novos, recém-introduzidos. d� Autoimune: diagnóstico difícil, firmado por achados específicos de imagem e dosagem de anticorpos também específicos, além de pesquisa de IGG4. e� Hipercalcemia: dosar cálcio sérico e, estando elevado, deve ser o culpado. f� Hipertrigliceridemia: triglicérides aumentados no contexto de dislipidemia ou nutrição parenteral total implicam sério risco de pancreatite aguda. A pancreatite pode ser classificada em leve, moderada ou grave. A pancreatite leve é aquela que cursa com sintomas típicos sem disfunção orgânica ou complicações locais. Paciente em BEG, FC normal, SatO2 normal, dor abdominal leve/moderada e sem sinais de peritonite, diurese preservada e, ao laboratório, creatinina e Hto normais. Exames radiológicos normias. A pancreatite moderadamente grave cursa com apenas uma disfunção orgânica, com duração 48h e/ou complicações locais (necrose, pseudocisto, coleçoes peripancreáticas e etc). A presença de uma ou mais das alterações a seguir deve gerar alerta para disfunção orgânica e potencial pancreatite moderada/grave: Ascpectos clínicos de regular/mau estado geral, taquicardia, dessaturação, dor abdominal intensa e/ou sinal de peritonite e oligúria — apontam para disfunções orgânicas. A piora e a intensificação progressiva da dor apontam para um curso desafavorável. Laboratório com leucocitose importante, Hto 44% ou crescendo, creatinina 1,8 e PCR 150. Exame de imagem com derrame pleural, infiltrado pulmonar apontando para disfunção pneumológica, ou complicações locais como necrose de parênquima e/ou coleções peripancreáticas. Pancreatite Aguda 4 A pancreatite grave apresenta-se com disfunção orgânica que persiste por mais de 48h ou múltiplas disfunções orgânicas. Sinais de disfunção orgânica incluem: hipotensão, elevação de creatinina, oligúria, dessaturação e insuficiência respiratória, necessidade de drogas vasoativas e intubação, rebaixamento do nível de consciência e etc. Os fatores de risco para pior prognóstico incluem: Idade 55 anos. IMC 30. Comorbidades graves. Nível de consciência comprometido (não referirão dor). As complicações locais da pancreatite ajudam na manutenção da inflamação e podem levar à piora e agravamento da doença. Podemos destacar: Coleções peripancreáticas: extravazamento do suco pancreático precocemente, num pâncreas lesado, ocasionando coleção local. Pode ter autorresolução e ser reabsorvida ou se organizar em um pseudocisto. Necrose do pâncreas: injúria do pâncreas associada à deterioraçao clínica com má perfusão esplâncnica favorece necrose pancreática. Infecção da necrose do pâncreas: após translocação bacteriana, infecção do material necrótico. Após a pancreatite aguda, podemos ter complicações císticas sequelares, como: Pseudocisto: consequência tardia de uma coleção, que se organiza numa estrutura cística, com paredes formadas pelo processo cicatricial da inflamação. À princípio, é uma complicação benigna de baixo potencial de complicação subsequente e tem comportamento oligossintomático. Sua conduta é expectante na maioria dos casos, pois tende a ter autorresolução ou se tornarem assintomáticos. Alguns pacientes têm tendência a necessitar de intervenções, como: pacientes jovevns, pseudocistos grandes 6cm, pseudocistos que comunicam com o ducto pancreático principal, sintomáticos. O pseudocisto pode manifestar clínica de: infecção, reativação da pancreatite, efeito de massa e sangramento digestivo alto. Pancreatite Aguda 5 O pseudocisto infectado pode ser tratado de forma conservadora com antibióticos ou pode ter seu tratamento por drenagem percutânea ou endoscópica, a depender da localização e dos recursos. Os que se infectam de forma repetida são candidatos a um tratamento definitivo. Necrose de paredes espessadas:de forma análoga ao pseudocisto, é a formação de uma estrutura cística contendo uma incompleta reabsorção da necrose. Quando sintomática, se manifesta por infecções locais recorrentes e sintomas inflamatórios persistentes de baixo grau (astenia, inapetência, náuseas, vômitos, perda ponderal, queda de cabelo e etc). As infecções são tratadas de forma conservadora, mas podem necessitar de drenagem percutânea. A necrose de paredes espessadas pede uma intevenção mais intensa como regra, não como exceção. Não existe tratamento específico para a pancreatite. Assim, em relação ao manejo, temos que: Inicialmente, todo paciente deverá sem compensado clinicamente. Para isso, ele deve ser colocado em jejum para repouso pancreático e receber hidratação venosa vigorosa — passo mais importante! A hidrataçao é o que evita que o pâncreas evolua para necrose ou, caso haja necrose, é o que preserva a “zona de penumbra ,ˮ evitando aumento do volume necrótico. Além disso, o controle sintomático com analgesia e anti-heméticos é importante. Dependendo da gravidade, devemos oferecer oxigênio e medidas de suporte avançado de vida. Casos leves podem ficar na enfermaria. Casos moderadamente graves ou graves são levados para ambiente intensivo. O tratamento inicial é sustentado enquanto se aguda melhora da doença, quando as medidas vão sendo gradualmente retiradas. Espera-se que a grande maioria das pancreatites apresente sinais de melhora em 3 dias e se resolva em 7. A dieta para adequado suporte nutricional deve ser introduzida o mais precocemente o posível, assim que o paciente apresente controle adequado da dor com medicações simples. A via de escolha é oral. A nutrição em pancreatite é a forma mais efetiva em se evitar infecções, ao se evitar a translocação bacteriana intestinal. Pancreatite Aguda 6 A hidratação venosa deve ser guiada pelo débito urinário, objetivando-se de 0,5 a 1ml/kg/h. Quando não há melhora após 3 dias de curso com tratamento adequado, o paciente aponta que há algo promovendo manutenção do estado inflamatório, possivelmente uma coleção peripancreática, sendo indicada uma TC. Se observada uma coleção, está indicado tratamento conservador inicialmente, com vigilância ativa para infecção dessa coleção. Se houver piora do paciente após o 7º dia de tratamento, podemos suspeitar de necrose do pâncreas como causa da SIRS reativada, que também tem indicação de TC. A conduta também é inicialmente conservadora. Após 10 a 14 dias de curso da doença, o paciente está sujeito a complicações infecciosas locais, como infecção da necrose e/ou da coleção peripancreática — a infecção na pancreatite aguda complicada é um evento tardio. A suspeita do diagnóstico se dá pela piora clínica tardia nessa fase do tratamento e diagnóstico pode ser feito por uma TC, que evidenciará presença de gás/bolhas em meio ao material necrótico. O tratamento da necrose pancreática infectada é feita pela abordagem em degraus: Tratamento conservador com antimicrobianos (meropenem, carbapenêmicos). Drenagem percutânea ou drenagem endoscópica transgástrica: indicada na falha da terapia conservadora inicial, após 48h. Debridamento cirúrgico minimamente invasivo: indicada na falha da drenagem percutânea ou endoscópica. Necrosectomia pancreática cirúrgica aberta: cirurgia de ALTA morbimortalidade. É o último degrau, indicado na ausência de resposa às terapias anteriores. Não há indicação de antibiótico profilático, pois esse aumenta o risco de sepse fúngica, sem trazer benefício real de prevenção infecciosa. Para se prevenir a infecção, a estratégia é a hidratação adequada do paciente e introdução precoce de dieta. Então, a TC está indicada nos seguintes casos: Admissão do paciente quando há dúvida diagnóstica. Pancreatite Aguda 7 Ausência de melhora clínica após 72h de tratamento, para pesquisar coleções. Piora clínica após o 7º dia de tratamento, para pesquisar necrose. Piora clínica tardia, após o 10º a 14º dia, para pesquisar infecção da necrose. O tratamento conservador é o padrão na pancreatite e suas complicações em geral. Entretanto, algumas situações podem demandar tratamento intervencionista, como: Na presença de colangite associada à pancreatite aguda biliar, a CPRE (colangiopancreatografia retrógrada endoscópica) está indicada. Nesses casos, o paciente se manifesta com agravamento, com icterícia ascendente clinicamente associada à piora colestática laboratorial. Na presença de complicação infecciosa local (infecção de coleções, pseudocistos e da necrose pancreática), a punção por agulha fina é útil. Pode ser realizada, também, a drenagem percutânea, drenagem endoscópica, drenagem cirúrgica minimamente invasiva e necrosectomia cirúrgica. A intervenções cirúrgicas devem ser evitadas ao máximo e, quando indicadas, devem ser realizadas tardiamente, no mínimo 6 semanas após o início do quadro. Nas pancreatites biliares agudas leves, aproveitamos a mesma internação do paciente e, após resolvida a pancreatite aguda (ou seja, o paciente já se alimenta e não tem dor importante), procede-se à colecistectomia. Nos casos moderados ou graves, as disfunções orgânicas e a debilidade promovida pela doença elevam seu risco de complicações. Nesse cenário, o paciente recebe alta para que tardiamente, após 6 a 12 semanas, seja programada uma colecistectomia.
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