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FOCO NO MERCADO DE TRABALHO
QUAIS SÃO AS CARACTERÍSTICAS DO CONHECIMENTO
CIENTÍFICO?
Douglas Rodrigues Aguiar de Oliveira
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SEM MEDO DE ERRAR
Para resolver o problema, é necessário pensar nas circunstâncias sociais que
moldam a administração e gestão universitária.
Desse modo, pode-se concluir que a pseudociência mantém algum nível de prestígio
e lugar na universidade, não por razões teóricas ou níveis de verdade, mas
simplesmente pela pressão social exercida pelos próprios praticantes da disciplina,
de modo que a simples existência de grupos fechados, onde apenas profissionais
certificados da área sejam tolerados, contribui para o impedimento da livre
circulação de ideias sobre os problemas que o campo enfrenta.
Ao impedir que profissionais de outros campos relacionados tenham direito ao
debate, como psicólogos experimentais, neurocientistas cognitivos e biólogos
evolutivos, revela-se o indicador de dogmatismo, que está presente em qualquer
pseudociência e visa impedir o fomento da crítica científica responsável com o
objetivo não apenas de análise dos problemas de um campo, mas também de
procurar ajustar suas hipóteses aos melhores dados disponíveis da investigação
comportamental.
Fonte: Shutterstock.
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Revelados seus aspectos opostos ao do conhecimento científico, justifica-se que um
campo ou disciplina não se constitui de um saber científico autêntico. Então, é
necessário também procurar saber as motivações que os envolvidos na prática
teriam apenas para manter o ensino de psicanálise em instituições de educação,
como a questão da remuneração excessiva envolvida e a reputação da qual gozam
em certos setores universitários e da grande mídia.
AVANÇANDO NA PRÁTICA
ANÁLISE DA SUPOSTA REIVINDICAÇÃO CIENTÍFICA POR
COACHES
O mundo empresarial está repleto de “choaches profissionais”, que são sujeitos que
alegam dedicar-se ao desenvolvimento cognitivo, comportamental e organizacional
da classe trabalhadora por meio de técnicas que devem ser aplicadas diariamente
para maximizar a capacidade de trabalho. O coaching, porém, não é uma profissão
regulamentada e, constantemente, choca-se com o mesmo tipo de problema que é
tratado por profissionais certificados, como psicólogos, psiquiatras, técnicos de
administração e de gestão de empresas. Os coaches, de forma rotineira, fazem uso do
jargão científico, alguns reivindicam até que suas ideias são compatíveis com a física
quântica, com o objetivo de enfatizarem que suas técnicas possuem respaldo da
ciência. Com base no que você aprendeu ao longo do livro, como alguém poderia
saber se as reivindicações dos coaches são realmente baseadas em evidência?
RESOLUÇÃO
O primeiro indicativo de que o coaching não é baseado em evidência é a falta de
regulamentação profissional para um campo que reivindica técnicas para a
saúde mental, a segurança e a gestão no trabalho.
O segundo indicativo é o excesso de autodenominados coaches que alegam
possuir técnicas próprias e/ou originais baseadas em ciência, porque uma
técnica testada não é um produto “original”. Uma técnica baseada em ciência
geralmente é aperfeiçoada ao longo do tempo, por mais de uma pessoa, de modo
que sua originalidade individual é extirpada pelo enriquecimento da
contribuição coletiva da ciência. No entanto, os coaches não alegam que sua
técnica foi produto de estudo colaborativo da ciência, embora reivindiquem o
status de cientificidade.
O terceiro indicativo é a busca por papers, ou seja, artigos científicos que são
publicados em revistas acadêmicas especializadas. Esses papers passam por um
processo de revisão por pares, que é basicamente um processo de crítica
responsável feita por pesquisadores independentes para avaliar a consistência
dos dados com a hipótese proposta e procurar possíveis indicações de fraudes
e/ou falhas metodológicas ao longo da estrutura do trabalho submetido. Se o
coaching, por exemplo, não tem trabalhos publicados em revistas especializadas
com alto fator de impacto, confirmando assim suas principais hipóteses, então o
campo é qualquer coisa, exceto ciência e técnica baseada em evidência.
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O quarto indicativo é o apelo à física quântica, uma falácia lógica
contemporânea, que consiste em reivindicar a autoridade da teoria quântica
para supostamente embasar alguma afirmação extraordinária. Pelo fato de a
física quântica possuir uma matemática complexa, ela geralmente acaba sendo
mal compreendida pelo público leigo, de modo que hoje coaches e outros
pseudocientistas a invocam para explicar qualquer coisa sobre o mundo. A física
quântica, no entanto, não lida diretamente com aspectos comportamentais dos
seres humanos e nem endossa qualquer alegação de autoajuda individual e
empresarial. Ela também não diz nada sobre o pensamento alterar a realidade.
Normalmente, a física quântica lida com o estudo de objetos pequenos, como
campos e partículas elementares, bem como algumas de suas aplicações para
estudar fenômenos biológicos (como a bússola magnética dos pássaros) e
químicos. Essas concepções equivocadas da teoria quântica surgem de uma
confusão envolvendo o conceito de observador (uma noção propagada pelo
documentário pseudocientífico Quem Somos Nós, de 2004), que, contrariamente
à crença popular e ao significado da linguagem ordinária, não significa
consciência, pensamento ou seres humanos, mas, sim, instrumento de medida –
ou seja, o aparato técnico que faz a medição da partícula. Então, quando um
suposto profissional diz que a física quântica explica o comportamento, a
sociedade, a mente, ou que ela alega que o pensamento pode mudar realidade,
significa que essa pessoa não entende de física quântica ou está sendo bem mal-
intencionada para vender alguma receita milagrosa e, consequentemente, falsa.
Por conta desses indicativos, é razoável supor, com um grande nível de certeza,
que a disciplina reivindicada, como o coaching (autoajuda empresarial),
constitui um exemplo de campo não baseado em evidência. Mais ainda, em
razão de o campo apelar à ciência para justificar suas alegações que carecem de
evidências (ou simplesmente são falsas), é seguro sentenciar que o coaching
constitui um exemplo de pseudociência. 
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NÃO PODE FALTAR
COMO AGIR COM ÉTICA NA PESQUISA CIENTÍFICA?
Douglas Rodrigues Aguiar de Oliveira
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PRATICAR PARA APRENDER
Provavelmente, em algum momento de sua vida, você já pensou sobre as possíveis
consequências éticas do uso de animais na pesquisa científica, ou mesmo sobre os
experimentos nazistas com humanos. Com base nesses exemplos, é possível que você
tenha considerado que a ciência poderia estar isenta de princípios éticos, ao menos é
o que algumas pessoas defendem.
No entanto, será que a ciência é um “tudo vale”, em que reflexões sobre a ética e a
saúde dos indivíduos ou animais de laboratórios não são consideradas? Será que a
ética representa um empecilho para o desenvolvimento pleno da ciência? Até que
ponto devemos estar cientes da importância dos postulados éticos que norteiam a
pesquisa científica?
Na corrida não apenas por um entendimento profundo sobre doenças emergentes,
mas também pelo desenvolvimento de medicamentos e vacinas, certos protocolos
éticos desempenham sua importância na investigação científica. Além disso, a ética,
enquanto campo de investigação, tem conseguido acompanhar a ciência com o
objetivo de enriquecê-la ao estudar seus potenciais problemas éticos.
Com base no estudo recíproco entre ciência e ética, alternativas cada vez mais
humanísticas para o estudo em laboratório têm sido apresentadas, com o objetivo de
evitar o uso e o teste desenfreados com animais. Mesmo o campo da tecnologia, que
Fonte: Shutterstock.
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mantém uma relação bilateralcom a ciência, também tem levado em consideração o
raciocínio ético, principalmente ao pensar nas possíveis consequências sobre o
desenvolvimento de armas e robôs automatizados em um contexto de guerra.
Aqui, convido você a concentrar-se nos fundamentos éticos da pesquisa científica,
analisando seus possíveis impactos e benefícios no desenvolvimento da ciência.
Um grupo de cientistas quer investigar o cérebro humano e, para isso, eles lançam
uma ficha de inscrição solicitando voluntários para sua pesquisa. A pesquisa é
apresentada como tendo grande potencial para a área da saúde, com o objetivo de
testar um futuro medicamento para a doença de Alzheimer. No entanto, a ficha de
inscrição não diz nada sobre os possíveis riscos aos voluntários ao serem submetidos
ao teste experimental. Em resumo, não há avaliação dos riscos sendo apresentada
para os voluntários.
Mesmo na ausência de protocolos de riscos, diversos voluntários assinam a ficha de
inscrição com o objetivo de contribuírem para a ciência. Então, o grupo de cientistas
inicia sua pesquisa neurocientífica.
No experimento, os cientistas dividem seus voluntários em dois grupos: o grupo A e
o grupo B. O grupo A recebe uma droga com potencial de reparar danos nas células
cerebrais e maximizar a memória, enquanto o grupo B recebe placebo. Quem está
incumbida de ministrar os comprimidos é uma enfermeira voluntária.
No decorrer do experimento, o grupo A começa a relatar cefaleia, náuseas, vômitos,
diarreias e perda de apetite. O grupo B, no entanto, relata apenas uma sensação de
relaxamento. Então, após os cientistas decidirem dosar uma segunda leva de
comprimidos, ocorre a morte de um voluntário no grupo A.
O grupo de cientistas, então, decide que o experimento deve ser encerrado, por conta
da morte e dos efeitos graves provocados pela ingestão da substância.
acordo com a situação-problema, quais foram as violações éticas que o grupo de
cientistas cometeu e que contribuíram para o fracasso do experimento científico?
CONCEITO-CHAVE
A ÉTICA NA PESQUISA CIENTÍFICA: A QUESTÃO DOS
VOLUNTÁRIOS
A ética é um campo de conhecimento filosófico que estuda os princípios éticos. No
entanto, existe também uma ética científica, que é o enfoque multidisciplinar que,
em conjunto com a ciência, busca avaliar a plausibilidade da adoção de certos
princípios éticos e normas sociais. No geral, esse campo pode ser visto como o estudo
do comportamento moral com base na antropologia, na psicologia, na sociologia e na
história, tratando de abordar o surgimento, a manutenção, a reforma e o declínio
das normas sociais, enquanto a ética filosófica analisa conceitos éticos, como
O progresso científico, guiado pelos princípios morais delineados nos demais mandamentos,
é a condição indispensável do progresso humano e das liberdades individuais e por isso ele
não será jamais obstado por qualquer princípio religioso, por relativismos culturais ou
particularismos sociais que possam existir."
— Richard Dawkins.
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altruísmo, bondade e cooperação, bem como filosofias éticas ou simplesmente
preceitos morais, ou seja, ações justificadas por princípios éticos filosóficos que
podem ser benéficas ou nocivas para outras pessoas.
A ética também estuda a ciência – especialmente, as normas éticas que vigoram na
comunidade científica. Ela estuda ainda o impacto ético de certos estudos que são
feitos com animais e humanos. Além disso, a ética está interessada no
comportamento inadequado durante o desenvolvimento de uma pesquisa –
principalmente, na motivação do cientista em fraudar resultados. De fato, a ética é
uma disciplina abrangente por conta de sua ampla gama de problemas estudáveis,
sobretudo da ciência.
Entre os diversos problemas éticos que advém da atividade científica, três merecem
atenção: a questão do consentimento dos voluntários para o desenvolvimento de
uma pesquisa, o problema da preservação de identidade e integridade e, por último,
a relação entre voluntários e pesquisadores no decorrer da investigação científica.
O primeiro problema ético, que envolve a questão do consentimento dos voluntários,
refere-se à autorização prévia de uso de certos dados dos participantes na pesquisa
científica. De outro modo, uma pesquisa que utiliza de forma indevida dados de seus
voluntários sem o consentimento necessário está violando princípios éticos e,
consequentemente, prejudicando a qualidade da pesquisa.
O segundo problema ético, referente à preservação de identidade e integridade,
refere-se à proteção de informações sensíveis dos participantes de um estudo
experimental. Também se refere ao princípio de que os participantes devem estar
cientes dos riscos envolvidos no teste experimental do qual serão voluntários – nesse
caso, é importante deixar claros os possíveis riscos trazidos aos voluntários ao se
submeterem ao experimento.
O terceiro problema ético envolve a relação entre voluntários e pesquisadores. Nesse
sentido, o problema mais evidente é a possível manipulação do comportamento dos
voluntários de acordo com a intenção do cientista de obter um resultado específico
em um estudo clínico. Por exemplo, um voluntário poderia agir de acordo com as
expectativas do pesquisador ao ser submetido a um teste clínico para investigar a
eficácia de algum fármaco – o que, consequentemente, enviesaria os resultados,
prejudicando a qualidade da evidência. O voluntário poderia dizer que, ao ingerir o
fármaco testado, ele conseguiu obter os melhores benefícios à saúde, mesmo que o
relato, de fato, não proceda. Portanto, durante a condução de testes clínicos,
principalmente no âmbito da saúde, é necessário que os voluntários sejam
selecionados de forma aleatória (randomizados), que exista uma amostragem
significativa para ser representativa e, mais ainda, que existam grupos de controle
de placebo – especialmente para identificar a possibilidade de o resultado obtido
sobre a eficácia do fármaco ser estatisticamente significativo quando comparado ao
grupo que tomou placebo (por exemplo, uma pílula de farinha que visivelmente
parece ser o fármaco real, mas sem suas propriedades farmacológicas).
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ÉTICA COM OS DADOS DA PESQUISA
A ética também está relacionada à forma como o trabalho científico é produzido e
apresentado na hora da avaliação pelos pares, de modo que plágios, manipulações
de dados estatísticos e falsificações não são tolerados quando descobertos pelos
revisores. Na pseudociência, acontece o contrário: a manipulação e falsificação de
dados é sempre tolerada em nome do convencimento público em favor de uma
hipótese. Por exemplo, o caso envolvendo o hoteleiro Erich von Däniken, autor do
livro Eram os Deuses Astronautas? (2018), que falsificou dados para apoiar a sua
reivindicação de que os alienígenas teriam visitado a Terra no passado e ajudado as
civilizações antigas a construírem artefatos megalíticos; e o caso relatado pelo crítico
literário Frederick Crews, em seu livro Freud: The Making of an Illusion (2017), que
expõe diversas fraudes cometidas pelo médico e neurologista Sigmund Freud no
decorrer da história da psicanálise – especialmente, quando Freud mentiu sobre os
benefícios da cocaína em pacientes viciados em morfina, ou quando se apropriou
dos escritos de outros autores que já haviam produzido trabalhos sobre o
inconsciente e quando reforçou, sem qualquer evidência, a histeria como um
comportamento estereotipado do sexo feminino.
A parapsicologia é um excelente exemplo histórico que mostra como a ética pode ser
vital para a questão da validade de um campo de investigação, pois é uma disciplina
que nasceu no século XIX como sendo um exemplo de ciência, mas que caiu no
esquecimento após um enriquecimento de seus protocolos éticos de pesquisa.
Basicamente, a parapsicologia nasceu com o objetivo de estudar o suposto fenômeno
paranormal, que era tratado como real pelos parapsicólogos. No entanto, com o
auxílio de mágicos e ilusionistasentre o final do século XIX e início do século XX,
como o famoso cético Harry Houdini, o fenômeno paranormal começou a ser
identificado como meros truques de ilusão, sendo apenas produtos de fraude
intencional, nos quais os cientistas acreditavam porque não estavam instruídos
sobre seus pontos cegos. Com a orientação de Houdini e, muito mais tarde, de outros
mágicos que surgiram em meados dos anos 1980, como James Randi, os protocolos
de pesquisa científica de pesquisa parapsicológica começaram a ser projetados por
ilusionistas e céticos interessados nesse tipo de investigação. Após a implementação
desses protocolos, seguida pela constante revisão de estudos do campo da
parapsicologia, absolutamente nenhuma evidência foi encontrada a favor do suposto
fenômeno paranormal. Desde então, estudos do campo da ética sobre a pesquisa
científica têm utilizado a parapsicologia como um expressivo exemplo de como
fraudes e manipulação de dados levam à degradação de um campo de investigação e
à consequente classificação de pseudociência, pois ainda que a hipótese do
fenômeno paranormal nunca fosse confirmada experimentalmente, os
parapsicólogos, caso estivessem orientados pela ética em sua pesquisa, poderiam
realizar estudos investigando os fatores sociais que levariam as pessoas a
acreditarem em crenças paranormais ou espirituais, sem precisarem pressupor que
elas são reais. 
Na comunidade científica, esses exemplos de comportamentos antiéticos não são
tolerados sob nenhuma forma – por isso, nenhum astrônomo ou astrobiólogo
responsável considera como plausível a noção de que extraterrestres já visitaram a
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Terra; nenhum filósofo científico, psicólogo experimental ou neurocientista
cognitivo considera a psicanálise como um campo válido do conhecimento científico;
e, claro, nenhum físico ou psicólogo experimental considera a parapsicologia uma
ciência.
Um trabalho científico orientado eticamente é original, com dados normalmente
refletindo as consequências reais do estudo. De fato, podem ocorrer casos em que os
revisores independentes encontram falhas, mas um cientista que preza pela ética
buscará corrigir o trabalho que apresentar problemas. Também é possível a violação
dessas condutas éticas durante a investigação científica, mas quando isso acontece,
os pesquisadores são punidos, em vez de recompensados – por exemplo, na
pseudociência, como nos casos de Däniken e de Freud, eles são considerados
revolucionários, em vez de charlatões, pelo grande público.
ASSIMILE
1. A ética é um campo de investigação filosófico que pode usar os dados da
ciência para avaliar princípios éticos ou normas sociais.
2. A ética também é um princípio filosófico que norteia a pesquisa
científica, de modo que não é possível a existência da ciência sem
princípios éticos ou normas sociais (como o ethos da ciência clarificado
pelo sociólogo da ciência Robert K. Merton).
3. Apenas a pseudociência negligencia os princípios éticos, de modo que a
trapaça é considerada válida para moldar a crença ou opinião de algum
indivíduo.
ÉTICA COM O RIGOR CIENTÍFICO
A atitude ética na investigação científica representa o cuidado que os pesquisadores
devem ter ao elaborarem seus projetos de pesquisa, pois existem órgãos reguladores
que avaliam as consequências sobre certos tipos de estudos que usam animais e
humanos – por exemplo, estudos com impactos nocivos à saúde dos indivíduos
geralmente não são aprovados, especialmente por conta de experiências relatadas
anteriormente em investigações psicológicas, como o famoso experimento de
aprisionamento de Stanford, cujo objetivo era analisar o comportamento humano
numa sociedade na qual os indivíduos eram apenas definidos pelo grupo. Esse
experimento teve que ser interrompido bem antes de sua conclusão porque os
voluntários começaram a usar formas de tratamento abusivas com outros
participantes, como violência física e verbal.
A orientação ética na pesquisa científica destaca que o cientista também deve ter
cuidado durante a coleta de dados, de modo a evitar possíveis contaminações e/ou
enviesamento cognitivo, pois poderiam prejudicar a qualidade do trabalho.
Resultados obtidos de forma duvidosa levam ao desperdício de recursos essenciais –
às vezes, dinheiro público –, que poderiam ser usados em pesquisas mais bem
projetadas. Por essa mesma razão, a replicação de estudos é vista como uma tarefa
fundamental para identificar o risco de contaminação e enviesamento nos
resultados de um estudo individual.
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Um cientista deve ser orientado pelos riscos que uma pesquisa malfeita pode trazer
a longo prazo, principalmente em uma sociedade com recursos escassos que esteja
passando pelo enfrentamento de crises econômicas ou pandemias. A ética revela o
nível de responsabilidade do cientista com sua produção intelectual, de modo que
negligenciá-la só contribuirá para a justificação ideológica de corte orçamentário da
pesquisa científica – pelo menos, é o pretexto mais frequentemente utilizado por
governos anticientíficos, pois não enxergam a ciência como um investimento vital
para o progresso social, mas como um gasto desnecessário, sob a desculpa do
suposto excesso de fraudes, vieses cognitivos e erros ao longo da história da ciência.
REFLITA 
1. Qual lição podemos aprender ao adotarmos princípios éticos na
elaboração das pesquisas científicas?
2. Como a ciência pode contribuir com a ética?
3. Por que a rejeição dos princípios éticos leva ao florescimento da
pseudociência?
INSTÂNCIAS ÉTICAS
Quando um cientista é denunciado por fraude, uma comissão de ética pode ser
convocada para analisar o caso, podendo ocorrer até a perda da titulação acadêmica
do pesquisador. Em outras situações, dependendo do nível da ocorrência, a
retratação pública do próprio cientista pode ser vista como suficiente em um caso
não intencional de erro na elaboração de sua pesquisa.
Órgãos regulatórios também contribuem para analisar de que forma os animais
usados em experimentos estão sendo tratados, de modo que a violência e o
sofrimento não são toleráveis no ato da pesquisa científica. A violação das normas
éticas de proteção animal pode levar ao encerramento imediato da investigação
científica e o autor poderá responder a processo por conta dessa violação – além, é
claro, do possível impedimento no exercício de futuras pesquisas experimentais.
Finalmente, os cientistas adotam tacitamente um conjunto de princípios éticos em
comunidade, também chamados de ethos da ciência – primeiramente percebido e
estudado pelo sociólogo da ciência Robert K. Merton –, que consistem em
universalidade, desinteresse, ceticismo coletivo, comunismo epistêmico e
originalidade. A universalidade se refere à ciência poder ser praticada por qualquer
pessoa, independentemente de sua etnia ou localização geográfica. O desinteresse se
refere à necessidade de os anseios coletivos estarem acima dos interesses
individuais/privados. O ceticismo coletivo (ou ceticismo científico) se refere à dúvida
metódica, em que hipóteses e teorias são sujeitas à crítica responsável pela
comunidade científica. O comunismo epistêmico, que não tem nenhuma relação com
o conceito de comunismo político, refere-se à noção de que a ciência é uma
propriedade de todos, acessível a todos, independente da situação socioeconômica.
Por último, mas não menos importante, a originalidade se refere ao estimulo à
produção de novas pesquisas e teorias. 
EXEMPLIFICANDO
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1. A ética orienta os cientistas na produção de pesquisas mais sofisticadas,
proporcionando o conhecimento dos impactos que afetariam sua
qualidade.
2. A ética é um incentivo na busca pela verdade, porque contribui para a
rejeição de atitudes que possam levar ao comportamento fraudulento.
3. Existem órgãos e comissões de ética responsáveis por avaliar um projeto
de pesquisa, tendo a cautela de olhar para a questão do cuidado animal e
humano na investigaçãocientífica.
A ética é o princípio norteador da investigação científica, contribuindo não apenas
para a elaboração de pesquisas mais bem executadas, mas também para que os
cientistas mantenham um elevado nível de responsabilidade com seus projetos
experimentais. Sem ética, a ciência não seria possível, pois a preocupação coletiva
com a saúde dos indivíduos, sobretudo dos voluntários de pesquisa, seria substituída
pelo interesse individual. O princípio ético humanista, cultivado nas ciências da
saúde e na prática da medicina, seria substituído pelo comercialismo. A preocupação
com a verdade daria cada vez mais espaço para a necessidade de ganho financeiro
elevado. Portanto, uma disciplina ausente de princípios éticos, principalmente em
nível de comunidade, não pode ser considerada uma ciência, mas uma
pseudociência em sua mais pura essência.
FAÇA VALER A PENA
Questão 1
A ética é um campo de investigação filosófico e, ao mesmo tempo, o princípio que
norteia a atividade científica. Ela contribui de diversas formas para o conhecimento
científico e tecnológico e tem servido como indicador em inúmeros trabalhos de
filosofia da ciência para detectar produções de qualidade altamente duvidosa e
disciplinas com tendências pseudocientíficas. Inclusive, a ética já foi usada em
conjunto com procedimentos experimentais para avaliar os experimentos
conduzidos por um campo que nasceu como ciência, mas se tornou pseudociência.
Qual é o campo que nasceu como ciência e se tornou pseudociência com a aplicação
de princípios éticos na avaliação dos trabalhos experimentais?
a. Astronomia.
b. Psicologia.
c. Psicanálise.
d. Ufologia.
e.  Parapsicologia.
Questão 2
O ethos da ciência é o conjunto de princípios éticos ou normas sociais que norteia
toda a comunidade científica. Esses princípios são conhecidos como Normas de
Merton. No entanto, existem também as chamadas contranormas, que são atitudes
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as quais não se esperam de uma comunidade científica. Algumas dessas normas
opostas às da ciência são facilmente identificáveis em exemplos de pseudociência.
Quais são as contranormas identificadas pelo sociólogo da ciência Robert K. Merton?
a. Ceticismo, comunismo, desinteresse e originalidade.
b. Dogmatismo, isolamento, particularismo e desinteresse.
c. Dogmatismo, isolamento, particularismo e interesse.
d. Ceticismo, socialismo, comunismo e desinteresse.
e. Dogmatismo, comunismo, ceticismo, individualismo.
Questão 3
Os princípios éticos norteiam não apenas a prática da atividade científica, mas
também a atividade médica, pois levam aos médicos e pesquisadores a reflexão
sobre a importância de todos os envolvidos numa pesquisa médica. O princípio ético
humanista, por exemplo, enfatiza que a prática médica deve ser vista como
destituída de motivações financeiras, de modo que seu foco é centrado no bem-estar,
e não no lucro comercial.
Por que os princípios éticos são essenciais para a elaboração de experimentos nas
ciências da saúde?
a. Os princípios éticos levantam preocupações legítimas sobre os potenciais riscos envolvidos no quadro
de saúde dos voluntários e auxiliam na informação prévia para consentimento das pessoas que
participarão dos experimentos como voluntárias.
b. Os princípios éticos servem para alertar os voluntários de que a ciência não é confiável.
c. A ciência funciona de forma isenta de valores e princípios éticos.
d. Os princípios éticos são adotados durante a investigação pseudocientífica.
e. Os princípios éticos não desempenham nenhuma tarefa na ciência, pois são considerados exemplos que
freiam o progresso científico. 
REFERÊNCIAS
BUNGE, M. Ética, ciencia y técnica. [S.l.]: Editora Sudamericana, 1996.
BUNGE, M. La Ciencia, su Método y su Filosofía. [S.l.]: Editora Sudamericana, 2014.
MERTON, R. K. Sociologia: teoria e estrutura. [S.l.]: Editora Mestre Jou, 1968.
SAGAN, C. O Mundo Assombrado Pelos Demônios: a ciência vista como uma vela no
escuro. [S.l.]: Editora Companhia de Bolso, 2006.
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FOCO NO MERCADO DE TRABALHO
COMO AGIR COM ÉTICA NA
PESQUISA CIENTÍFICA?
Douglas Rodrigues Aguiar de Oliveira
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SEM MEDO DE ERRAR
Ocorreram diversas violações éticas no desenvolvimento do projeto de
pesquisa e na forma como foi apresentada a ficha de inscrição para os
voluntários.
Primeiro: os cientistas desconsideraram potenciais riscos na ingestão da
substância prometida para contribuir para a melhora cognitiva. Em uma
pesquisa científica, os cientistas devem avaliar as condições de risco,
incluindo possíveis sintomas e a possibilidade de morte de voluntários.
Segundo: o grupo não deixou totalmente claros os eventuais riscos aos
quais os voluntários estariam expostos ao participar da pesquisa
científica. Na investigação científica, os riscos devem ser claros para os
voluntários que decidirem participar, até mesmo para se avaliar a
Fonte: Shutterstock.
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compatibilidade do grupo-alvo com o objetivo da pesquisa e salientar
possíveis problemas de saúde dos participantes, já que integrar a
pesquisa poderia contribuir para seu agravamento clínico.
Terceiro: o experimento não deveria seguir sem a aprovação de uma
comissão regulatória de ética. Normalmente, os cientistas interessados em
testar a eficácia de alguma substância devem submeter seus protocolos
com o “desenho” de pesquisa (projeto experimental), destacando os
objetivos e os possíveis riscos à saúde dos voluntários. Além disso, o
projeto deve passar por uma banca para avaliação e, consequentemente,
aprovação, rejeição ou melhor adequação com os protocolos éticos de
pesquisa biomédica.
Um experimento bem projetado informaria os participantes com os dados
necessários sobre os possíveis riscos de participação causados pelos
experimentos, utilizando uma linguagem clara e solicitando
consentimento para uso e extração de dados relevantes para o
desenvolvimento do estudo. Além disso, o grupo de cientistas submeteria
o projeto de pesquisa a uma comissão de avaliação para averiguar a
adequação aos protocolos éticos de investigação científica. Dessa forma,
punições por não cumprimento de normas da pesquisa científica seriam
evitadas.
AVANÇANDO NA PRÁTICA
A EMPRESA QUE BUSCOU ESTUDAR O
COMPORTAMENTO DE SEUS FUNCIONÁRIOS
Uma empresa estava interessada em estudar o comportamento de seus
funcionários durante o horário de trabalho, na intenção de usar os
resultados para estabelecer políticas mais efetivas que ajudassem a
maximizar a produtividade de cada setor. Então, a empresa decidiu: (A)
monitorar o acesso, (B) filmar as expressões faciais com a webcam dos
computadores, (C) instalar escutas em cada computador e (D) monitorar à
distância a tela dos celulares. A empresa conseguiu: (A) registrar dados de
login dos usuários, com base no monitoramento de acesso; (B) detectar
expressões faciais de insatisfação após receberem a ordem de um chefe;
(C) ouvir a insatisfação dos funcionários com o trabalho, o chefe e as
políticas da empresa, bem como registrar conversas de natureza
altamente íntima; e (D) capturar mensagens privadas de funcionários,
trocadas com suas famílias e amigos.
Em seguida, a empresa, com base nos dados recolhidos, decidiu demitir os
funcionários insatisfeitos por justa causa, fortificou as políticas de
monitoramento e começou a oferecer recompensas financeiras para
quem conseguisse ser mais produtivo durante o mês.
Com base no que foi visto no texto, a empresa agiu de forma ética?
Justifique sua resposta.
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RESOLUÇÃO
A empresa não agiu de forma responsável, porque violou diversos
protocolos éticos e a privacidade de seus funcionários ao capturar
dados particulares sem qualquer consentimento, incluindo
informações sobre a vida privada e dados de acesso de contas não
correspondentes aos serviços da empresa. A empresa também agiu de
má-fé ao decidirdemitir os funcionários insatisfeitos, ao invés de ter
sido mais clara e aberta sobre seus objetivos profissionais e
estratégicos para aumentar a produtividade
A empresa poderia, por exemplo, criar uma enquete em que os
funcionários pudessem opinar sobre o que contribuiria para elevar
seus níveis de produtividade no trabalho. Com base nos resultados,
ela poderia propor políticas mais eficazes, sem a necessidade de
violar a privacidade e a conduta ética de seus funcionários – evitando,
inclusive, a recolha de dados que sequer seriam úteis para a proposta
inicial do estudo da empresa.
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