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LEGISLAÇÃO CIVIL APLICADA II Eduardo Zaffari Revisão técnica: Gustavo da Silva Santanna Bacharel em Direito Especialista em Direito Ambiental Nacional e Internacional e em Direito Público Mestre em Direito Professor em cursos de graduação e pós-graduação em Direito Miguel do Nascimento Costa Bacharel em Ciências Sociais Especialista em Processo Civil Mestre em Direito Público Catalogação na publicação: Karin Lorien Menoncin - CRB -10/2147 L514 Legislação civil aplicada II / Fabiana Hundertmarck Leal... [et al.] ; [revisão técnica: Gustavo da Silva Santanna, Miguel do Nascimento Costa]. – Porto Alegre: SAGAH, 2018. 380 p. : il. ; 22,5 cm ISBN 978-85-9502-428-1 1. Direito civil. I. Leal, Fabiana Hundertmarck. CDU 347 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 2 22/05/2018 13:31:12 Doação Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Conceituar doação. Explicar as características, a natureza jurídica, os efeitos e a extinção da doação. Analisar as espécies de doação. Introdução A doação é um instituto que remonta à Antiguidade, embora as suas caracte- rísticas hoje sejam menos abrangentes do que nos tempos remotos. Apesar de o texto legal apontar um conceito simples para a doação, devemos ter cuidado para não a confundir com outros institutos afins, pois muitas vezes o traço da liberalidade não é compreendido nas doações com encargos. As características desse contrato determinam a sua natureza jurídica e a tipicidade das suas formas de extinção, que são bastante específicas. As diferentes espécies de doação apresentam o traço comum da gratuidade, mesmo naquelas doações em que se atribui um encargo a quem recebe. Neste capítulo, você vai estudar o conceito de doação, as suas carac- terísticas, os seus efeitos e a sua extinção. Você também vai analisar as diferentes espécies de doação. Conceito de doação O instituto da doação é muito antigo, encontrando as suas primeiras manifes- tações por escrito na legislação do Direito Romano, no século II a.C. Advém da palavra latina donum, que se refere ao dom de receber algo sem qualquer contraprestação. Diferentemente de outras formas de dar algo a alguém, essa atribuição não tem uma causa subjacente. Pontes de Miranda (2012, p. 269) recorda que a Lex Cincia, de 204 a.C., previa a doação como uma das formas de aquisição da propriedade. Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 115 22/05/2018 13:31:28 Contemporâneo do jurista Pontes de Miranda, Abelardo da Cunha Lobo foi um grande romanista e influenciador de reflexões sobre o Direito Romano. Saiba mais sobre o autor e os seus estudos sobre a Roma antiga em Curso de Direito Romano: história, sujeito e objeto de Direito (LOBO, 2006). Diferentemente do conceito abrangente que os romanos davam à doação, hoje ela apresenta características que a distinguem de outras formas con- tratuais, como a compra e venda, o empréstimo e o comodato. Os romanos entendiam que qualquer ato dedar (dare) era doação, independentemente da concordância de quem recebia. Prevista no art. 538 do Código Civil de 2002, a doação é conceituada como “[...] contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere de seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra” (BRASIL, 2002, documento on-line). Entretanto, há que se destacar os pontos mais importantes do conceito legal. O ato de doação não deverá ter causa subjacente, expressando apenas a vontade do doador. Haverá o chamado animus donandi, ou seja, a vontade de doar. Isso não significa que o doador não tenha, no seu íntimo, um motivo pessoal que lhe anima a doar. A distinção reside apenas no fato de que, na doação, essa vontade não é expressa e não importará para o ato de doação. Na doação, não interessa a vontade do doador de aumentar o patrimônio do donatário ou sua intenção de enriquecê-lo. Como se trata de uma atribuição patrimonial, importa tão somente a vontade do doador de atribuir patrimônio ao donatário. Por essa razão, diz-se que a doação se dá por liberalidade do doador em favor do donatário. A liberalidade é a causa da doação. Não é necessário explicitara causa, tampouco exteriorizá-la a qualquer título. Os motivos que levam o doador a efetuar a doação em benefício do donatário poderão ser os mais diversos, como gratidão, benemerência, caridade, entre outros sentimentos nobres. Mas esses motivos não interessam para a doação, e apenas a liberalidade será considerada a causa. Ocorre a desvinculação entre os motivos e a doação. Quem doa terá, necessariamente, uma redução no seu patrimônio. Qualquer espécie de liberalidade que não comporte uma efetiva redução no patrimônio daquele que dá, consistirá em outra espécie jurídica. Por exemplo, se alguém construir em terreno alheio em favor de outra pessoa, não estará diminuindo Doação116 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 116 22/05/2018 13:31:28 o seu patrimônio, o que significa dizer que estará fazendo uma liberalidade em favor de alguém, mas não estará doando algo seu. Em contrapartida, o patrimônio de quem recebe deverá aumentar pelo ato de doação. Observe que não significa, necessariamente, enriquecimento por aquele que recebe o bem doado, mas tão somente aumento patrimonial. Isso porque o donatário, isto é, quem recebe, poderá receber um bem cujo valor econômico é inexpressivo, ou até mesmo inexistente, mas com grande valia afetiva. Um exemplo é uma gravura confeccionada por um ancestral comum, sem valor de venda em mercado. Ainda assim, haverá a doação, com um au- mento patrimonial de quem recebe e uma redução do patrimônio de quem doa. Pouco importa, também, a utilidade do bem doado ou da doação. Um bem útil ao doador poderá ser inútil na propriedade daquele que o recebe. O inverso também é verdadeiro, pois o doador poderá doar ao donatário um bem que julgara inútil, mas que nas mãos do donatário é de grande valia. Considerando que a doação acarreta a redução e o aumento patrimonial, doador e donatário deverão declarar, dependendo do bem doado, nas suas Declarações de Ajuste Anual de Rendimentos, sob pena de omissão patrimonial passível de autuação pela Receita Federal. Qualquer espécie de bem poderá ser doado, desde que seja de propriedade do doador. Nestes se incluem os bens corpóreos e incorpóreos, fungíveis e infungíveis, consumíveis ou não consumíveis. Desde bens fungíveis como o dinheiro, até incorpóreos como uma marca comercial poderão ser doados. O crédito poderá ser igualmente doado. Aquele que abre mão de receber do devedor os juros a que tinha direito, já constituídos e devidos, estará doando em favor deste. Observe que o texto legal fala em vantagens, o que comprova que a doação poderá ser não apenas de bens corpóreos e infungíveis. O bem doado não precisa estar na posse do doador, do donatário, ou de qualquer destes. Tratando-se de atribuição patrimonial, em que a proprie- dade será transferida do doador para o donatário, independe-se da posse. O doador poderá doar ao donatário um imóvel locado a terceiros, sem que haja 117Doação Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 117 22/05/2018 13:31:28 a necessidade de retomada da posse pelo beneficiado, que passará a receber os frutos de aluguéis do bem. Observe que, além da doação, discute-se a possibilidade da promessa de doação, em que o doador promete doar ao donatário determinado bem. Alguns doutrinadores, como Caio Mário da Silva Pereira, afirmam que não poderia o donatário exigir do doador o cumprimento da promessa, tampouco seria possível a conversão em perdas e danos da promessa de doação não cumprida. Venosa (2005, p. 143) afirma que “a promessa se inclui dentre os pré-contratos e que, se a vontade do doador não apresentar vícios, não se pode desconsiderar a possibilidade da promessa de doação”. Características, natureza jurídica, efeitos e extinção da doação A doação é um contrato unilateral e um negócio jurídico bilateral causal. Essas características explicama natureza jurídica da doação, mas causam controvérsias pela difi culdade de distinção entre esta e outros institutos se- melhantes, como a renúncia à herança, usualmente confundida com a doação. É um contrato unilateral porque há apenas uma prestação pelo doador, inexistindo uma contraprestação pelo donatário. Existindo uma contrapres- tação pelo donatário, caracterizará outro contrato, como a locação, a compra e venda ou a prestação de serviços, entre outros. Não se pode confundir a unilateralidade característica da doação com o fato de esta ser um negócio jurídico bilateral. A doação é considerada um negócio jurídico bilateral porque o mundo jurídico a admite na legislação, diferenciando-a dos demais institutos. Foi precisamente a disposição legal que tornou esse instituto menos abrangente do que na época romana. A bilateralidade do negócio decorre da necessidade de aceitação da doação pelo donatário. Venosa (2005) recorda que, diferentemente de outras legislações (como a francesa, por exemplo), a doutrina mais moderna e o sistema brasileiro adotaram a teoria da bilateralidade do contrato de doação. A consequência da adoção da bilateralidade na doação gera a distinção de outros institutos, como a renúncia de herança, que não se confunde com a doação. Também, considerando que a doação importará na atribuição patrimonial mesmo de bens sem utilidade para o donatário, a doação necessita da concordância de quem a recebe. Doação118 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 118 22/05/2018 13:31:28 Venosa (2005) afirma que a bilateralidade decorreria do fato de a doação ser um contrato. Já segundo Bruno Miragem, comentando as lições de Pontes de Miranda, “[...] a doação supõe bilateralidade do negócio jurídico, sem bi- lateralidade do contrato, de modo que quem doa contrata, porém o donatário apenas aceita o contrato, que é unilateral” (MIRANDA, 2012, p. 278). A doação será também ato inter vivos, visto que não se admite, em nosso sistema, a doação após a morte. A forma de atribuição patrimonial causa mortis por ato de vontade do proprietário é o testamento. Apenas pessoas vivas poderão doar e receber em doação. O debate doutrinário sobre a necessidade de aceitação da doação pelo donatário pode ser conferido no estudo desenvolvido por Paulo de Tarso Sanseverino, em Contratos Nominados II (2011), nas páginas 71 e 72. A legislação anterior, isto é, o Código Civil de 1916, trazia no conceito de doação, na parte final, a expressão “[...] que os aceita”. A exclusão da expressão levou à discussão doutrinária sobre a desnecessidade de aceitação da doação pelo donatário. Entretanto, a doutrina já superou essa discussão, entendendo que é necessária a aceitação pelo donatário para que se carac- terize a doação. A aceitação pelo donatário poderá ser expressa, tácita ou presumida. O donatário poderá concordar expressamente em receber o bem doado (aceitação expressa), ou poderá adotar atos que demonstrem que aceitou o bem doado (aceitação tácita). Um exemplo de aceitação tácita se dá quando o donatário passa a exercer a posse e assumir a propriedade plena do bem doado. O art. 543 do Código Civil apresenta a aceitação presumida, ao referir que “se o donatário for absolutamente incapaz, dispensa-se a aceitação, desde que se trate de doação pura” (BRASIL, 2002, documento on-line). Também consistirá em aceitação presumida quando o bem doado para o nascituro for aceito pelos representantes legais, na forma do art. 542 do Código Civil, e nos casos de silêncio do donatário quando o doador fixar prazo para a manifestação pelo donatário. A aceitação presumida pelo silêncio do donatário vem prescrita no art. 539 do Código Civil (BRASIL, 2002). 119Doação Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 119 22/05/2018 13:31:29 Observe que os tutores e curadores não poderão doar bens dos seus tutelados ou curatelados enquanto estiver vigente a curatela e a tutela, e ainda não tiverem sido prestadas as contas, conforme prescreve o art. 1.749 do Código Civil. A proibição tem índole moral. A gratuidade, decorrente da liberalidade do doador, é característica funda- mental para a doação. O doador doa para o donatário de forma gratuita, e quem recebe tem que concordar em aceitar gratuitamente. Se o donatário se recusa a receber gratuitamente a doação, obrigando-se a contraprestar algo, não se caracteriza a doação, porque não será um ato gratuito (tampouco unilateral). Deverá haver, para a existência da doação, a vontade de doar gratuitamente pelo doador e a vontade de receber gratuitamente pelo donatário. No contrato de doação, o doador entrega, ou promete entregar, o bem doado ao donatário ou em benefício deste. A entrega poderá se dar pela tradição, em relação aos bens móveis, ou por escritura pública, quanto aos bens imóveis. O doador não responderá pelos vícios redibitórios ou pela evicção, salvo se expressamente declarar que se responsabiliza por tais defeitos do direito. Evidentemente responderá o doador por dolo ou má-fé. O donatário, especialmente por ser um contrato unilateral, apenas terá a obrigação de receber o bem doado a partir de sua aceitação da doação, seja ela expressa, tácita ou presumida. Como efeito, ainda haverá a redução do patrimônio do doador com o respectivo aumento do patrimônio do donatário. A doação poderá ser revertida pela premoriência, ou seja, o doador poderá estipular a reversão dos bens doados ao seu patrimônio quando o donatário falecer antes do doador. Proíbe-se a reversão dos bens doados ao patrimônio de terceiros, nos termos do parágrafo único do art. 547 do CC. É a imposição de uma cláusula resolutória do negócio jurídico. Como todo negócio jurídico, além da resolução inerente a todos os contra- tos (como o mero distrato, por exemplo), o Código Civil prescreve hipóteses especiais de resolução para a doação. Consistem essas nas previstas nos incisos I a IV do art. 557 do Código Civil, relativas à revogação por ingratidão do donatário. São situações taxativas, que visam à proteção moral do doador. Para não depender da vontade arbitrária do doador, este não pode renunciar Doação120 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 120 22/05/2018 13:31:29 antecipadamente o seu direito de revogar a liberalidade da doação, conforme art. 556 do mesmo Código (BRASIL, 2002). As hipóteses específicas de extinção da doação por ingratidão do donatário são as seguintes: se o donatário atentou contra a vida do doador ou cometeu crime de homicídio doloso contra ele; se cometeu contra ele ofensa física; se o injuriou gravemente ou o caluniou; se, podendo ministrá-los, recusou ao doador os alimentos de que este necessitava. Observe que algumas espécies de doação não admitem a revogação por ingratidão, visto que o legislador pretendeu retirar a instabilidade de uma relação contratual que poderia envolver terceiros. São elas: as doações remuneratórias; as doações oneradas com encargos; as doações sem cumprimento de obrigação natural; as doações realizadas em razão de determinado casamento. A ação competente para revogar a doação é a Ação Revogatória, cujo prazo decadencial é de um ano a partir da ciência pelo doador do ato de ingratidão, conforme art. 559 do Código Civil (BRASIL, 2002). O doador tem a liberdade, se assim desejar, de perdoar o ato de ingratidão do donatário, validando a doação. Análise das espécies de doação A doação poderá se dar de diversas formas, conforme a sua espécie. Poderá ser ela doação pura e simples, doação por merecimento do donatário, doação remuneratória, doação como subvenção periódica, doação conjuntiva, doação feita em contemplação de casamento futuro e doação modal. A doação pura e simples é aquela em que a liberalidade é plena, ou seja, sem qualquer condição ou encargo. Venosa (2005) recorda que a imposição de cláusulas restritivas, como a incomunicabilidade, impenhorabilidade ou inalienabilidade, não desnaturam a simplicidade ou purezado ato de doação. 121Doação Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 121 22/05/2018 13:31:29 O art. 1.911 do Código Civil estabelece que “a cláusula de inalienabilidade, imposta aos bens por ato de liberalidade, implica impenhorabilidade e incomunicabilidade” (BRASIL, 2002, documento on-line). A doação por merecimento, ou contemplativa, é aquela em que o doador anuncia expressamente o motivo da doação, seja em razão de uma amizade, ou até mesmo por ter o donatário uma qualidade especial (ser um filantropo ou um cientista). Nessa espécie de doação, não se perde o caráter de liberalidade, e a enunciação do motivo em nada altera o ato de doar. O art. 540 do Código Civil deixa clara a liberalidade mesmo quando expresso o motivo. A doação remuneratória é aquela realizada pelo doador ao donatário em razão de serviços prestados pelo recebedor ao doador. Observe-se, porém, que se trata de liberalidade porque, mesmo tendo o doador recebido serviços do donatário, não se torna este credor do doador. Ao prestar serviços ao doador, o donatário havia feito despretensiosamente, o que lhe retira a possibilidade posterior de cobrar por tais serviços. Em reconhecimento, o doador poderá efetuar, se assim o desejar, uma doação remuneratória ao donatário. O exemplo doutrinário clássico é quando o donatário salva a vida do doador, que lhe retribui no futuro com uma doação remuneratória. Ao explicar essa modalidade de doação, Pontes de Miranda (2012, p. 283) bem explica que “não há reciprocidade, porque o que se remunera já foi pres- tado; nem há pagamento, porque nada se deve. A doação remuneratória de modo nenhum se pode colocar no rol das donationes reciprocae”. A subvenção periódica é aquela em que o doador dá ao donatário um subsídio ou uma subvenção periódica em dinheiro, alimentos, rendas ou qualquer outra forma de vantagem. Trata-se de um benefício concedido pelo doador por períodos, no qual os subsídios poderão ser doados a cada período de dias, meses ou anos. Essa subvenção poderá ter prazo deter- minado ou não. O art. 545 do Código Civil prescreve expressamente que a subvenção periódica se extinguirá com a morte do donatário, não se transmitindo aos seus herdeiros (BRASIL, 2002). Atente-se que o doador, nesse caso e em ato inter vivos, poderá expressamente dispor que a subvenção periódica continue a ser paga após a sua morte, o que deverá ser cumprido por seus herdeiros até o prazo estipulado ou exaurimento da herança. Doação122 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 122 22/05/2018 13:31:29 Entretanto, não confunda a doação como subvenção periódica com o legado de subvenção periódica, que será aquele deixado em testamento pelo testador e que será pago a partir de sua morte. Ambos são subvenções, porém a doação de subvenção periódica consiste em ato inter vivos, enquanto o legado de subvenção periódica consiste em ato causa mortis. Um exemplo de doação de subvenção periódica é a assunção de pagamento, pelo doador, de mensalidade escolar do filho de um amigo. A doação conjuntiva é aquela em que o doador doa para mais de um donatário, presumindo-se, não havendo estipulação em sentido contrário, que doou para todos os beneficiados em iguais partes. Doações conjuntivas realizadas para casais, falecendo um dos cônjuges, serão acrescentadas à quota-parte do cônjuge sobrevivente, nos termos do parágrafo único do art. 551 do Código Civil (BRASIL, 2002). A redação deixa claro que, não sendo casal, a doação apenas acrescerá à quota-parte dos demais beneficiados, quando expressamente constante na doação pelo doado. Embora na redação do texto do art. 551 do Código Civil conste o direito de acrescer entre homens e mulheres casados, a nova interpretação legislativa desde a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, do ano de 2011, estendeu iguais direitos a casais homoafetivos. A doação feita em contemplação a casamento futuro independe de aceitação expressa e vem prevista no art. 546 do CC. Ela se dá na modalidade de condição suspensiva e fica sem efeito até que haja o casamento. Nessa modalidade, já há pessoa certa e a possibilidade de casamento é real, o que impede a confusão com a cláusula condicional (se o donatário se casar rece- berá doação, por exemplo). Chama-se de doação propter nuptias. É possível também a doação para os filhos dos nubentes, e apenas subsistirá a doação com o nascimento com vida dos filhos do casal (BRASIL, 2002). A doação modal, igualmente chamada de doação onerosa, ou com encargo, é aquela em que o donatário fica vinculado a um determinado encargo em favor do doador, de um terceiro ou no interesse geral. Um exemplo é a doa- ção de um determinado prédio para que seja utilizado na instalação de uma 123Doação Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 123 22/05/2018 13:31:29 escola, ou para a construção de uma área de lazer. O doador deverá estipular um prazo para que o encargo seja cumprido, e caso não o cumpra o donatário, este perderá o bem doado, revogando-se a doação. Caso o doador não estipule prazo para o cumprimento do encargo, o doador e o Ministério Público – se a condição for estipulada em favor da coletividade –, poderão constituir o donatário em mora e exigir o cumpri- mento sob pena de perda da doação. Os sucessores do doador têm igual legitimidade para exigir o cumprimento do encargo. Pontes de Miranda (2012) recorda que o encargo é uma determinação anexa que faz parte da doação de forma inseparável e, por essa razão, não poderá ser onerosa ao donatário nem importar em aumento patrimonial. Caso seja onerosa demais para o donatário, não se estará diante de uma doação. Na doação modal, a eficácia surge a partir do momento em que o doador efetua a doação com o encargo, nascendo a pretensão de cumprimento do encargo a partir do prazo assinalado pelo doador. Entretanto, o doador poderá estipular que o encargo seja cumprido a partir de determinada data, o que não retira a eficácia desde o momento da doação com encargo. O doador poderá, em qualquer momento enquanto for vivo (o que exclui a vontade testamentária), renunciar ao encargo estipulado na doação. Ademais, a impossibilidade superveniente de cumprir o encargo sem culpa do donatário exime-o de cumprir o encargo sem a perda da doação. O art. 122 do propter nuptias estabelece que “são lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes” (BRASIL, 2002, documento on-line). Doação124 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 124 22/05/2018 13:31:29 1. A doação é um ato de liberalidade. A esse respeito, marque a alternativa correta. a) Isso significa que a doação será realizada independentemente da vontade do donatário. b) Isso não significa, necessariamente, o enriquecimento do donatário. c) Isso importará na redução patrimonial do donatário. d) O doador deverá expressar os motivos da doação. e) Nas doações onerosas, não há liberalidade. 2. Com relação às características da doação, marque a alternativa correta. a) A doação não é negócio jurídico bilateral, pois não necessita da concordância do donatário. b) Não se pode afirmar que a doação é um contrato unilateral. c) A exclusão da parte final do conceito de doação na legislação civil, “[...] que os aceita”, mudou a necessidade da aceitação pelo donatário. d) Poderá existir uma contraprestação pelo donatário. e) Encargo não se confunde com contraprestação. 3. A doação se extingue pela(s): a) morte do donatário, nas doações puras e simples. b) hipóteses previstas nos incisos I a IV do art. 557 do propternuptias, somente. c) tentativa contra a vida do doador. d) ingratidão do donatário, mesmo que haja o perdão pelo doador. e) calúnia, unicamente. 4. Qual destas espécies de doaçãoestá corretamente descrita? a) A doação pura e simples é aquela que exige motivo pelo doador. b) Na doação contemplativa, há a premiação por reconhecimento. c) Na doação remuneratória, os serviços serão prestados após a doação. d) A subvenção periódica necessariamente deverá ser em dinheiro. e) A doação conjuntiva não admite o acréscimo ao outro donatário. 5. Assinale a alternativa correta. a) O bem doado necessita estar na posse do doador para que seja realizada a doação. b) Apenas bens infungíveis poderão ser doados. c) Bens incorpóreos também poderão ser doados. d) Caso o donatário não cumpra o encargo, apenas o doador poderá constituí-lo em mora. e) Após instituído o encargo, não poderá o doador modificá-lo. 125Doação Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 125 22/05/2018 13:31:30 BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 8 maio 2018. LOBO, A. da C. Curso de Direito Romano: história, sujeito e objeto de direito: instituições jurídicas. Brasília, DF: Senado Federal: Conselho Editorial, 2006. MIRANDA, P. de. Direito das Obrigações: contratos e seguro (continuação). São Paulo: RT, 2012. (Coleção tratado de direito privado: parte especial; 46). SANSEVERINO, P. de T. Contratos nominados II. São Paulo: RT, 2011. VENOSA, S. de S. Direito Civil: direitos reais. São Paulo: Atlas, 2005. Doação126 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 126 22/05/2018 13:31:30 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Conteúdo: