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Crimes Contra a Concorrência

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CRIMES CONTRA A CONCORRÊNCIA
HEIDI ROSA FLORÊNCIO NEVES
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Crimes contra a concorrência
Histórico
O direito antitruste surgiu nas duas últimas décadas do século XIX:
1889 - Act for the Prevention and Suppression of Combinations Formed in Restraint of Trade – Canadá.
1890 - Sherman Act – Estados Unidos da América - punia criminalmente as pessoas envolvidas em práticas antitrustes. Pena de multa para corporação até 10 milhões de dólares e de 350.000 dólares, ou pena de prisão não superior a três anos, ou ambas, a critério do tribunal, para a pessoa física. 
Crimes contra a concorrência
No Brasil:
Constituição de 1934 -  Art. 115 – “A ordem econômica deve ser organizada conforme os princípios da Justiça e as necessidades da vida nacional, de modo que possibilite a todos existência digna. Dentro desses limites, é garantida a liberdade econômica”.
 Constituição de 1937 – Art. 141 – “A lei fomentará a economia popular, assegurando-lhe garantias especiais. Os crimes contra a economia popular são equiparados aos crimes contra o Estado, devendo a lei cominar-lhes penas graves e prescrever-lhes processos e julgamentos adequados à sua pronta e segura punição.”
Crimes contra a concorrência
Decreto-Lei – 869/1938 – Define os crimes contra a economia popular.
 Art. 2º São crimes dessa natureza:  (...) III - promover ou participar de consórcio, convênio, ajuste, aliança ou fusão de capitais, com o fim de impedir ou dificultar, para o efeito de aumento arbitrário de lucros, a concorrência em matéria de produção, transporte ou comércio;   Pena: prisão celular de 2 a 10 anos e multa de 10:000$000 a 50:000$000.
Art. 3º São ainda crimes contra a economia popular, sua guarda e seu emprego: I - celebrar ajuste para impor determinado preço de revenda ou exigir do comprador que não compre de outro vendedor;       Pena: prisão celular de 6 meses a 2 anos e multa de 2:00$000 a 10:000$000.
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Decreto-lei 7.666 de 1945 – Dispõe sobre à ordem moral e econômica.
Art. 1º Consideram-se contrários aos interesses da economia nacional:
 I – os entendimentos, ajustes ou acordos entre empresas comerciais, industriais ou agrícolas, ou entre pessoas ou grupo de pessoas vinculadas a tais empresas ou interessadas no objeto de seus negócios, que tenham por efeito: a) elevar o preço de venda dos respectivos produtos; b) restringir, cercear ou suprimir a liberdade econômica de outras empresas; e c) influenciar no mercado de modo favorável ao estabelecimento de um monopólio, ainda que regional;
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Constituição de 1946 -  Art. 148 – “A lei reprimirá toda e qualquer forma de abuso do poder econômico, inclusive as uniões ou agrupamentos de empresas individuais ou sociais, seja qual for a sua natureza, que tenham por fim dominar os mercados nacionais, eliminar a concorrência e aumentar arbitrariamente os lucros”.
Lei 4.137/1962 – Lei de Abuso ao Poder Econômico – Criação do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), o qual teve como incumbência apurar e reprimir os abusos do poder econômico.
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Constituição de 1988 – Título VII – Cap. I – Dos princípios gerais da atividade econômica
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I - soberania nacional;
II - propriedade privada;
III - função social da propriedade;
IV - livre concorrência;
V - defesa do consumidor; (...)
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Constituição de 1988
Art. 173, § 4º - “A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros”.
Art. 173, § 5º - “A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular”.
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Lei 8.137/1990 - Lei dos Crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as leis de consumo.
Lei 8.884/1994 - Transforma o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) em Autarquia, dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica.
Lei 12.529/2011 (vigência a partir do dia 29.05.12) revogou a Lei 8.884/1994.
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Lei 12.529/2011 - Art. 36. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados:
I - limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa;
II - dominar mercado relevante de bens ou serviços;
III - aumentar arbitrariamente os lucros; e
IV - exercer de forma abusiva posição dominante.
Crimes contra a concorrência
Definição de cartel – CADE:
Cartel é qualquer acordo ou prática concertada entre concorrentes para fixar preços, dividir mercados, estabelecer quotas ou restringir produção, adotar posturas précombinadas em licitação pública, ou que tenha por objeto qualquer variável concorrencialmente sensível. Os cartéis, por implicarem aumentos de preços e restrição de oferta e nenhum benefício econômico compensatório, causam graves prejuízos aos consumidores tornando bens e serviços completamente inacessíveis a alguns e desnecessariamente caros para outros. 
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Consequências do cartel:
Prejuízos socioeconômicos;
Aumento de preços;
Restrição da oferta;
Aumento dos custos operacionais dos os agentes econômicos envolvidos;
Redução ou supressão total de incentivos à inovação;
Aumento de barreiras à entrada de novos atores econômicos no setor. 
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Publicações da OCDE sobre o tema de cartéis trazem exemplos de sobrepreços impostos por cartéis em diferentes jurisdições, com percentuais variando de 16,5% a 70%.
“Nossos concorrentes são nossos amigos, o consumidor é o inimigo”.
Essa frase foi dita por um alto executivo de empresa que confessou participação no cartel de lisinas, nos EUA.
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Tipo Penal - Art. 4° - Lei Federal n. 8.137/1990 (Redação dada pela Lei nº 12.529, de 2011):
Constitui crime contra a ordem econômica:
I - abusar do poder econômico, dominando o mercado ou eliminando, total ou parcialmente, a concorrência mediante qualquer forma de ajuste ou acordo de empresas.
II - formar acordo, convênio, ajuste ou aliança entre ofertantes, visando: 
a) à fixação artificial de preços ou quantidades vendidas ou produzidas; 
b) ao controle regionalizado do mercado por empresa ou grupo de empresas; 
c) ao controle, em detrimento da concorrência, de rede de distribuição ou de fornecedores. 
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos e multa.
Crimes contra a concorrência
Momento consumativo do crime de cartel: Formação do acordo.
O núcleo do tipo penal, no inciso II, é o verbo FORMAR. Esse verbo se realiza uma única vez, de forma instantânea e determinada. Ele não é contínuo, como ocorre com os verbos contidos nos crimes permanentes, tais como “portar, manter, privar”. Uma vez formado o acordo, o crime está configurado. Trata-se de crime instantâneo. 
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Decisão da 22ª Vara do Foro Central Criminal Barra Funda (autos nº 0032795-16.2017.8.26.0050), proferida em 18.07.17:
Crimes contra a concorrência
Prescrição
Crime instantâneo
Art. 111 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr: 
I - do dia em que o crime se consumou;  
 
Crimes Permanentes
Art. 111 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr: 
III - nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência;  
 
Crime continuado
Art. 119 - No caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cadaum, isoladamente. 
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Súmula 711, STF
O Supremo Tribunal Federal tem entendimento sumulado no sentido de que, em relação aos crimes continuado ou permanentes, é aplicada a legislação mais grave se a situação de permanência é encerrada após a alteração da lei:
Súmula 711/STF: A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.
Crimes contra a concorrência
Consequências da Súmula 711, STF:
pena de multa cumulativa ou alternativa?
Possibilidade ou não de suspensão condicional do processo?
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Suspensão condicional do processo
Antes da alteração promovida pela Lei 12.529/2011, a possibilidade da aplicação alternativa da pena de multa autorizava a aplicação da suspensão condicional do processo, prevista no art. 89 da Lei 9.099/1995, segundo entendimento jurisprudencial sedimentada no STJ e no STF.
A pena prevista para o artigo 4º era: “Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, ou multa”.
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Competência para julgamento: Justiça Federal ou Estadual?
O STJ desde 2004 vem reiterando que a competência será fixada de acordo com a complexidade e a localização dos efeitos atuação do cartel. Se o cartel tiver efeito apenas local, a Justiça Estadual será competente. No entanto, se a atuação do cartel causar efeitos em vários Estados da nação, a competência da Justiça Federal.
O fundamento utilizado é o artigo 109 da Constituição da República:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
(...)
VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira;
Crimes contra a concorrência
HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM ECONÔMICA. CARTELIZAÇÃO. LEI 8.137/90. COMPETÊNCIA. INTERESSE NACIONAL. RESTRIÇÃO À ATIVIDADE PROFISSIONAL EM VÁRIOS ESTADOS. JUSTIÇA FEDERAL. Inexistindo determinação expressa, os crimes contra a ordem econômica, previstos na Lei 8.137/90, reclamam a jurisdição estadual ou federal na medida em que restar comprovado o interesse em jogo, se local ou se nacional. In casu, ante a figura do crime sobrevindo da prática de cartel, onde a atuação do agente teve reflexo em vários estados-membros, restringindo o livre exercício da atividade profissional de transportadores pelo Brasil afora, resta patente o interesse supra-regional pelo qual se firmam a necessidade de interferência da União e a competência da Justiça Federal. Tal se dá porque, apesar de a conduta ilícita ser oriunda de um núcleo determinado, a sua propensão ofensiva à ordem econômica se faz sentir em localidades diversas e em territórios distintos. Ordem denegada. (STJ, HC 32.292/RS, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, DJU 03.05.04).
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Cartel e associação criminosa
Associação Criminosa
Art. 288.  Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes: (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013) 
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.  
Os dois são crimes de concurso necessário (plurissubjetivos), em que a pluralidade dos agentes é essencial para configuração do crime.
Crimes contra a concorrência
Incide sobre a conduta de cartel duas normas incriminadoras: a de cartel e a do artigo 288. Há, um conflito aparente de normas, resolvido pelo princípio da especialidade. 
A imputação do crime de cartel e de associação criminosa configura bis in idem.
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Cartel e Licitação
Art. 4° Constitui crime contra a ordem econômica:
II - formar acordo, convênio, ajuste ou aliança entre ofertantes, visando: 
a) à fixação artificial de preços ou quantidades vendidas ou produzidas; 
b) ao controle regionalizado do mercado por empresa ou grupo de empresas; 
c) ao controle, em detrimento da concorrência, de rede de distribuição ou de fornecedores. 
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos e multa
Art. 337-F, Código Penal - Frustrar ou fraudar, com o intuito de obter para si ou para outrem vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação, o caráter competitivo do processo licitatório: (Incluído pela Lei nº 14.133, de 2021) Pena - reclusão, de 4 (quatro) anos a 8 (oito) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 14.133, de 2021)
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Acordo de Leniência
Definição de Grandino Rodas: “Acordos de leniência são aqueles firmados entre um integrante-delator do cartel e a autoridade antitruste com vistas a reduzir ou afastar as sanções que seriam aplicadas ao primeiro em troca de cooperação nas investigações. O objetivo é criar um incentivo para a delação, aproveitando-se da instabilidade inerente aos cartéis”.
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Art. 86 – Lei 12.529/2011 - O Cade, por intermédio da Superintendência-Geral, poderá celebrar acordo de leniência, com a extinção da ação punitiva da administração pública ou a redução de 1 (um) a 2/3 (dois terços) da penalidade aplicável, nos termos deste artigo, com pessoas físicas e jurídicas que forem autoras de infração à ordem econômica, desde que colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo e que dessa colaboração resulte:
I - a identificação dos demais envolvidos na infração; e
II - a obtenção de informações e documentos que comprovem a infração noticiada ou sob investigação.
Crimes contra a concorrência
§ 1º O acordo de que trata o caput deste artigo somente poderá ser celebrado se preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - a empresa seja a primeira a se qualificar com respeito à infração noticiada ou sob investigação;
II - a empresa cesse completamente seu envolvimento na infração noticiada ou sob investigação a partir da data de propositura do acordo;
III - a Superintendência-Geral não disponha de provas suficientes para assegurar a condenação da empresa ou pessoa física por ocasião da propositura do acordo; e
IV - a empresa confesse sua participação no ilícito e coopere plena e permanentemente com as investigações e o processo administrativo, comparecendo, sob suas expensas, sempre que solicitada, a todos os atos processuais, até seu encerramento.
 
Crimes contra a concorrência
Art. 87 – Lei 12.529/2011 - Nos crimes contra a ordem econômica, tipificados na Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990 , e nos demais crimes diretamente relacionados à prática de cartel, tais como os tipificados na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, e os tipificados no art. 288 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, a celebração de acordo de leniência, nos termos desta Lei, determina a suspensão do curso do prazo prescricional e impede o oferecimento da denúncia com relação ao agente beneficiário da leniência.
Parágrafo único. Cumprido o acordo de leniência pelo agente, extingue-se automaticamente a punibilidade dos crimes a que se refere o caput deste artigo.
Crimes contra a concorrência
Art. 208 – RICADE - Uma vez declarado o cumprimento do acordo de leniência pelo Cade, será decretada em favor do signatário do acordo de leniência: I - a extinção da ação punitiva da administração pública, nas hipóteses em que a proposta do acordo de leniência tiver sido apresentada à Superintendência-Geral sem que essa tivesse conhecimento prévio da infração noticiada; ou II - nas demais hipóteses, a redução de um a dois terços das penas aplicáveis na seara administrativa. Parágrafo único. Nas duas hipóteses referidas acima, extingue-se automaticamente a punibilidade dos crimes tipificados na Lei nº 8.137, de 27 de novembro de 1990, e nos demais crimes diretamente relacionados à prática de cartel, tais como os tipificados na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993 e os tipificados no art. 288 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940.
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Estatísticas – Acordo de Leniência – CADE 
https://www.gov.br/cade/pt-br/assuntos/programa-de-leniencia/estatisticas
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Termo de Compromisso de Cessação e Aspectos Penais Lei - 12.529/2011
 
Art. 85. Nos procedimentos administrativos mencionados nos incisos I, II e III do art. 48 desta Lei, o Cade poderá tomar do representado compromisso de cessação da prática sob investigação ou dos seus efeitos lesivos, sempre que, em juízo de conveniência e oportunidade, devidamente fundamentado, entender que atende aos interesses protegidos por lei.
 9º O processo administrativo ficará suspenso enquanto estiver sendo cumprido o compromisso e será arquivado ao término do prazo fixado, se atendidas todas as condições estabelecidas no termo.
§ 14. O Cade definirá, em resolução, normas complementares sobre o termo de compromisso de cessação.
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Art. 185 – RICADE: Tratando-se de investigação de acordo, combinação, manipulação ou ajuste entre concorrentes, o compromisso de cessação deverá, necessariamente, conter reconhecimento de participação na conduta investigada por parte do compromissário.
 
Consequências para a pessoa jurídica e para a pessoa física?
O cumprimento integral das obrigações acordadas no Termo de Compromisso acarretará, em relação aos compromissários, o arquivamento do Processo Administrativo.
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Confissão qualificada pela delação
Art. 16, Lei 8.137/1990. Qualquer pessoa poderá provocar a iniciativa do Ministério Público nos crimes descritos nesta lei, fornecendo-lhe por escrito informações sobre o fato e a autoria, bem como indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção.
Parágrafo único. Nos crimes previstos nesta Lei, cometidos em quadrilha ou co-autoria, o co-autor ou partícipe que através de confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa terá a sua pena reduzida de um a dois terços. (Parágrafo incluído pela Lei nº 9.080, de 19.7.1995)
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