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1 PLANEJAMENTO EMPRESARIAL HOSPITALAR 1 SUMÁRIO 1. Introdução ............................................................................................................ 2 2. Vale a Pena Planejar .......................................................................................... 17 3. Planejamento Estratégico e Operacional em Saúde ....................................... 27 3.1 A Arte de Gerenciar Estrategicamente .............................................................. 31 Referências................................................................................................................. 53 2 1. Introdução Gerir hospitais no século XXI é uma tarefa cada vez mais complexa, visto, dentre outros fatores, o aumento da expectativa de vida da população e o contínuo aumento de doenças crônicas, que contribuem para o aumento na demanda nos hospitais, independentemente da região e do tipo de gestão, seja pública ou privada. Você já parou para pensar que vivemos em um mundo de organizações que funcionam em diferentes ambientes e que são influenciadas por fatores econômicos, políticos, sociais, legais, tecnológicos, culturais e demográficos dinâmicos, imprimindo a elas maior complexidade e instabilidade? E que para que essas organizações sobrevivam, cresçam e sejam bem-sucedidas em seus objetivos, elas precisam ser administradas? A administração é considerada como uma das mais importantes áreas da atividade humana, uma vez que lida com toda a complexidade que envolve as organizações; com mudanças e com o cenário incerto em que vivemos atualmente. Seu principal papel é fazer as coisas acontecerem, por meio da combinação e integração de vários recursos e da mobilização das pessoas em torno dos objetivos organizacionais. Dessa forma, é função da administração compreender e interpretar os objetivos estabelecidos pela organização, transformando-os em ações que permitam seu alcance, por meio de planejamento, organização, direção e controle dos esforços gerados nos diversos âmbitos da organização. SAIBA MAIS São funções da administração: planejar (definir objetivos e desenvolver estratégias e planos de ação para alcançá-los); organizar (reunir, alocar e coordenar recursos e esforços necessários); dirigir (gerir pessoas no sentido de alcançar os objetivos) e controlar (monitorar e avaliar o desempenho da organização para garantir o alcance dos objetivos). E o hospital? Você já parou para pensar na função que ele exerce na vida das pessoas? O Ministério da Saúde (MS) define o hospital como uma instituição 3 necessária, pois, tem como função a promoção do cuidado com a saúde da sociedade, desde seu nascimento, doença e morte. Ou seja, o hospital é uma organização médica e social cuja principal finalidade é oferecer à população assistência médica integral, curativa e preventiva, independente do modelo de atendimento, inclusive o domiciliar. Além disso, constitui-se ainda como um centro de educação e pesquisa em saúde, com capacidade para formar recursos humanos. Assim podemos afirmar que as organizações hospitalares têm como funções. prevenir doenças por meio da mobilização de recursos humanos e tecnológicos e da capacidade instalada, promovendo assistência e vigilância em saúde; recuperar a saúde, diagnosticando e tratando as enfermidades em geral; promover pesquisa e ensino por meio de teste e aplicação de novas técnicas e instrumentos descobertos pela ciência, ou seja, manter-se atualizado diante dos avanços da medicina e tecnológicos, com a finalidade de investigar os males orgânicos e psíquicos que afetam a população, buscando soluções capazes de manter e/ou restaurar a saúde e prevenir a doença; colocar seus serviços à disposição para a formação de profissionais de saúde de todas as categorias, recebendo preceptores e estagiários em suas instalações, para a prática profissional. Como você pode observar, a função de um hospital ultrapassa o aspecto sanitário curativo e preventivo, abrangendo também o aspecto social, uma vez que envolve o homem no ambiente social, familiar e de relacionamento onde está inserido. Nesse contexto, podemos afirmar que os hospitais são unidades sociais compostas por sistemas complexos e dinâmicos, ou seja, estão em constante transformação e sob influência de forças ambientais, exigindo dos gestores a capacidade de lidar a todo o momento com a incerteza e a imprevisibilidade. Isso quer dizer que os hospitais são organizações complexas marcadas por diferentes necessidades e especificidades, onde todos os setores e profissionais são interdependentes, ou seja, o trabalho de cada setor e de cada profissional impacta nos demais setores e no trabalho de outros profissionais, e, por esse motivo, o ideal 4 é que cada um busque otimizar não apenas o resultado de seu trabalho ou do setor onde atua, como também o resultado da organização como um todo. 5 Mas você deve estar se perguntando: quais as funções de um administrador hospitalar? Vamos lá! Não existe uma receita pronta para isso, até porque, como os hospitais são organizações que recebem influência de seu meio externo, possuem diferenças entre si em sua demanda, no tipo de usuários, no capital investido, nos recursos necessários, entre outros. Lembrando ainda que existem outras particularidades se os hospitais forem públicos, ou seja, financiados pelo governo, ou particulares, financiados por instituições privadas. Cabe destacar que, apesar dessas diferenças, todos os hospitais possuem a mesma subdivisão, podendo ser gerais ou especializados. Para exercer sua função e alcançar seus objetivos, o administrador hospitalar deve ser o responsável pelas funções de planejamento, organização, direção e controle, de modo a atender as necessidades de demanda dos usuários do sistema de saúde e dos profissionais que atuam no hospital. Ao planejar, o administrador determina antecipadamente o que será feito, quais objetivos deverão ser alcançados e como isso se dará, de preferência com o mínimo de esforço e menor custo, ou seja, o planejamento é a função que serve de base para as demais, pois é nessa primeira fase que se definem as estratégias que irão orientar o trabalho dos administradores e que se desenvolvem os planos de ação que irão coordenar as atividades necessárias à consecução dos objetivos. Ao executar a função de organizar, o administrador lida com todos os recursos disponíveis e necessários para o funcionamento das atividades hospitalares, ou seja, organizar significa reunir, alocar e coordenar os recursos humanos, financeiros, físicos, de informação e outros necessários para o alcance dos objetivos da organização. Nessa função o administrador também faz a divisão do trabalho; o agrupamento de atividades em uma estrutura lógica; a distribuição das pessoas para execução das atividades e a coordenação dos serviços por meio de diretrizes claras. A função da direção diz respeito a garantir que a organização funcione por 6 meio das pessoas, ou seja, essa é a função administrativa referente à gestão de pessoas, cujas atividades envolvem liderar, motivar e coordenar os trabalhadores para que desenvolvam suas atividades; estimular a capacitação e inovação permanentes do conhecimento; comunicar; gerir conflitos; reconhecer e recompensar; manter o 7 incentivo, o comando e a disciplina; e resolver problemas. Essa função é uma das que mais exige do administrador, e exige mais ação do que o planejamento e a organização. Nesse sentido, o administrador deve promover um ambiente favorável à realização de um trabalho de qualidade, onde os profissionais se sintam motivados e comprometidos com a missão do hospital. Controlar, por sua vez, consiste em monitorar e avaliar o desempenhoda organização, verificando se os objetivos planejados estão sendo alcançados ou se existe a necessidade de realizar ajustes nas estratégias e nos planos de ação. Assim, podemos dizer que nenhum plano estará totalmente acabado se não possuir meios para avaliar seus resultados e consequências. Dentre as funções de controle estão: definir medidas de desempenho; verificar e monitorar o desempenho; compará-lo com os padrões e objetivos determinados; e estabelecer medidas corretivas, garantindo o alcance dos objetivos. Além das funções apresentadas acima, destacamos outras funções, como? Prever, programar e supervisionar as áreas de recursos humanos; recursos econômicos e financeiros, instalações, equipamentos e materiais; serviços assistenciais; serviços complementares e de apoio; serviços acadêmicos e de pesquisa; sistemas de informação. Atuar como porta-voz da instituição, ou seja, responder oficialmente pela instituição, buscando apoio e comunicando permanentemente as atividades realizadas e planejamentos elaborados. Propor novas políticas, apresentar propostas de melhorias e de inovação, criar ou suspender serviços de acordo com as necessidades da instituição e com base nos avanços científicos e tecnológicos, bem como na legislação vigente. Fornecer informações relacionadas ao desempenho do hospital e à gestão desenvolvida, além de outras informações sobre os vários setores e serviços do hospital, de forma clara, ao conselho diretor. Coordenar e executar políticas de saúde de iniciativas próprias do hospital, voltadas às necessidades da população local, por meio de atividades que 8 impactem positivamente em sua qualidade de vida. Possuir conhecimentos técnicos-científicos administrativos e conhecimentos na área de saúde e de assistência médica e hospitalar, de modo que possa 9 equilibrar custos e benefícios; desenvolver melhores políticas e processos de trabalho; executar os planos de ação e cumprir com a missão do hospital. Promover a atualização constante do corpo de profissionais de saúde e avaliar programas de estágio para estudantes. Cumprir as exigências dos órgãos de saúde. Dar atenção a pacientes e seus familiares. É importante destacar que os administradores enfrentam muitos problemas em sua gestão, assim como todos os administradores em outros tipos de organização. Em todas elas os administradores enfrentam problemas internos, como conflitos entre profissionais, falta de recursos suficientes para o bom funcionamento da organização, resistência dos funcionários diante de mudanças, falhas na comunicação, rotatividade de pessoal, recursos financeiros limitados, etc., e problemas externos, como mudanças de legislação, de cenário econômico, nas políticas públicas, etc. Como você pode observar, administrar um hospital não é algo simples e fácil: são tantas funções e responsabilidades que administrá-lo torna-se um desafio diário. Por serem instituições com grande função social, marcadas por características científicas, técnicas, administrativas, tecnológicas e econômicas, além da característica não linear de suas atividades, ou seja, muitas atividades e muitos processos não definidos de forma clara e, com a grande diversidade entre os atores, ou seja, pessoas com diferentes formações e funções, os hospitais são unidades altamente complexas, que exigem dos administradores maior qualificação e capacidade de adaptação e resposta em um ambiente em constante transformação. Você já sabe que o setor da saúde é marcado por grandes e contínuas transformações que contribuem cada vez mais para o aumento da complexidade de suas organizações. Os avanços tecnológicos, a evolução da medicina, o crescimento de doenças crônicas e o aumento da expectativa de vida da população são alguns aspectos que vêm contribuindo para isso. Aqui no Brasil, as instituições de saúde têm sido cada vez mais cobradas, no sentido de oferecer serviços de saúde com maior qualidade à sociedade e, portanto, necessitam de uma gestão qualificada, com 10 práticas de gestão inovadoras e capazes de aumentar a produtividade e a qualidade da organização. 11 Com certeza você também sabe que as pessoas são vistas hoje pelas organizações como elementos chave para seu sucesso e sobrevivência. Ou seja, são as pessoas que assumem maior importância no contexto das organizações, uma vez que são capazes de aumentar ou diminuir a produtividade, de melhorar ou piorar a qualidade dos serviços e de gerar maior ou menor lucro para elas. Dessa forma, podemos dizer que não bastam as melhores estruturas, recursos e tecnologia, se as empresas não puderem contar com profissionais qualificados e comprometidos, ou seja, o funcionamento das organizações e também dos hospitais depende muito de seus funcionários. Um dos relatórios da Organização Mundial da Saúde (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2007) destaca a importância dos recursos humanos nos sistemas de saúde e sua qualificação. No Brasil, essa importância é reconhecida, e há grande preocupação com a formação, o desempenho e a gestão desses profissionais, uma vez que é comprovado que sua atuação afeta significativamente a qualidade dos serviços prestados e o grau de satisfação daqueles que o utilizam. Essa realidade exige do administrador, a adoção de políticas e práticas de gestão de pessoas capazes de responder às necessidades atuais e futuras. Para que isso aconteça, o administrador deve abandonar a mentalidade tradicional de gestão e adotar um conjunto de políticas, práticas e padrões atitudinais, empregar ações e instrumentos capazes de interferir no comportamento humano e direcioná-lo no ambiente de trabalho, como por exemplo, estruturas de trabalho mais flexíveis; descentralização dos processos decisórios; implementação de mudanças; maior envolvimento entre todos os setores da organização na busca por resultados comuns e incentivo a relações de trabalho mais integradas e dinâmicas. É papel ainda do administrador, e isso cabe também para as unidades de saúde e hospitais, adotar na gestão de pessoas um conjunto de políticas e práticas integradas que atendam, ao mesmo tempo, aos interesses e expectativas da organização e das pessoas. Cabe destacar que equilibrar esses interesses e expectativas para que essa relação seja produtiva e as responsabilidades compartilhadas é um dos desafios da gestão de 12 pessoas. Cabe à organização estimular e dar o suporte necessário para que as pessoas possam entregar o que têm de melhor, oferecendo a elas também o seu melhor. 13 É importante ressaltar que até pouco tempo atrás as organizações consideravam as pessoas como peças de um processo produtivo, ou seja, as práticas tradicionais de gestão de recursos humanos enxergavam o homem como um coadjuvante no processo produtivo. No entanto, as grandes mudanças ocorridas a partir dos anos 1990, ocasionadas pela globalização e pelo desenvolvimento tecnológico, mudaram a visão dos gestores em relação ao papel das pessoas nas organizações, imprimindo a elas o papel de principais responsáveis pela transformação e desenvolvimento da organização, como já comentado anteriormente. Hoje, a gestão estratégica de pessoas privilegia o contínuo desenvolvimento de seus funcionários, entendendo competências como um conjunto de capacidades e saberes que se manifestam nas atividades realizadas pelos funcionários. No setor da saúde, as políticas de gestão de pessoas enxergam os profissionais como a maior riqueza da organização, uma vez que a relação destes com o cliente é fundamental para que os objetivos e a missão da organização sejam alcançados. São algumas funções da gestão de pessoas nas organizações e também nas unidades de saúde. agregar pessoas: atrair, selecionar e integrar novos funcionários. Nessesentido é importante elaborar políticas eficazes de atração e retenção do capital humano. aplicar pessoas: mapear as atividades, analisar e descrever cargos, viabilizar planos de carreira, avaliar o desempenho e disseminar a cultura organizacional. É importante que as funções estejam alinhadas às estratégias da organização e que a gestão do desempenho seja baseada em políticas eficazes. recompensar pessoas: remunerar e reconhecer em razão do trabalho realizado. Uma boa política de remuneração e reconhecimento também é uma forma de atrair e reter talentos. desenvolver pessoas: capacitar e desenvolver os profissionais; levantar as necessidades para a execução de programas de desenvolvimento; executar programas de gestão de mudança e de comunicação interna. O treinamento e 14 o desenvolvimento dos profissionais deve ser contínuo e alinhado a seus perfis individuais de competência e às demandas organizacionais. Deve ter conteúdo motivador e contribuir para a melhoria do desempenho individual, da equipe e da organização. 15 manter pessoas: criar e manter um bom clima e cultura organizacional, gerir programas de saúde; segurança do trabalho, higiene e qualidade de vida. Ou seja, é fundamental a implantação e manutenção de um ambiente de trabalho satisfatório e seguro. monitorar pessoas: acompanhar e gerir pessoas por meio de resultados. O acompanhamento das pessoas deve ser operacionalizado por meio de reuniões periódicas com os envolvidos, com a finalidade de analisar o desenvolvimento do trabalho e os resultados alcançados. Todas as funções acima são imprescindíveis para o sucesso da gestão de pessoas e para atender o contexto organizacional contemporâneo. Assim é notório que atualizar a forma de lidar com as pessoas no trabalho é fundamental. Os profissionais de saúde devem ser motivados, capacitados e preparados para exercer suas atividades, principalmente, porque lidam todos os dias com a vida das pessoas, ou seja, devem se relacionar com os pacientes e seus familiares. É importante que cada um deles tenha consciência de sua responsabilidade e que possuam a capacidade de posicionar-se corretamente diante dos desafios de um ambiente em constante transformação, atendendo às necessidades da população, cada vez mais exigente. Cabe ao administrador de saúde se empenhar para transformar os conhecimentos, habilidades e atitudes das pessoas em níveis crescentes de excelência, fazendo com que as coisas “aconteçam” e gerando uma grande transformação no dia a dia da organização. É fundamental, ainda, que ele estimule as boas relações humanas, desenvolva novos líderes, identifique o potencial de cada funcionário nos diferentes setores da organização, estimule o trabalho em equipe, trace estratégias para o enfrentamento de pressões externas, defina prioridades, entre outras ações necessárias ao alcance dos objetivos da organização. No entanto, apesar de tantas ações positivas, a gestão de pessoas nas organizações ainda é um desafio para os gestores. Não é diferente nas unidades de saúde e hospitais, principalmente pela complexidade que os envolve, aliada à 16 diversidade dos profissionais que compõem seu quadro, ou seja, são diferentes formações e níveis de complexidade de atuação e uma grande variedade de atividades em todos os níveis e setores, que necessitam ser gerenciados. 17 No cenário nacional e internacional, são desafios organizacionais comuns na área de gestão de pessoas: aumentar a cobertura e as equipes de profissionais, garantindo a assistência de saúde de forma adequada e igualitária; desenvolver e manter competências e habilidades essenciais para os profissionais de saúde; melhorar o desempenho da equipe de profissionais de acordo com os objetivos definidos; fortalecer a capacidade de planejamento e gerenciamento do setor de gestão de pessoas na saúde; fortalecer e melhorar as práticas de recrutamento e diminuir a rotatividade dos trabalhadores. Esse e outros desafios a que as organizações estão sujeitas devem ser enfrentados para que estas se tornem efetivas no mercado em que atuam, principalmente para que consigam determinar uma nova postura em relação aos seus colaboradores e uma ação direcionada à gestão de pessoas, estimulando o comprometimento de todos com os resultados da organização. 2. Vale a Pena Planejar Para aqueles que não sabem para onde vão, qualquer vento serve. Partindo dessa condição, a ausência de um claro norte empresarial é um dos fatores preponderantes para que se iniciem as dificuldades de implantação dos processos de planejamento. Apesar de que pareça intuitivamente evidente que o esforço de planejar vale a pena de ser empreendido, a questão central é como colocá-lo no contexto do que é viável de ser feito e qual é o grau de efetividade que as companhias têm de fato condições de obter. Para realizar esse intento, lembro-me de que certa vez, a respeito de uma tese de mestrado apresentada para apreciação da banca examinadora, o coordenador dessa teria comentado que o trabalho apresentado possuía coisas boas e coisas novas. O problema residia no fato de que as coisas boas não eram novas e as coisas novas não eram boas. Feita essa ressalva, para empreender a discussão sem incorrer 18 em dramas de consciência em relação à proposta, a alternativa que vem à mente é tentar conduzir a avaliação buscando entender qual seria o objetivo a que se propõe uma empresa que decide ingressar em um processo de planejamento. 19 Ou seja, busca-se saber qual seria o exato ganho econômico e organizacional que essa pretende obter ao se lançar em uma atividade que, em princípio, é financeiramente dispendiosa, de elevado consumo de tempo e esforço para seus executivos e que, inexoravelmente, porá a nu as forças e as fraquezas da empresa e, porque não dizer, de seus executivos mais importantes. O impulso inicial para confrontar esse questionamento consiste em constatar que a resposta mais provável possa estar centrada em três possíveis dimensões: a primeira, de natureza conceitual, tem a ver com a elaboração de um conjunto de planos e projetos que têm por objetivo conferir à organização um sentido de longo prazo ao mesmo tempo em que se procura dotá-la de salvaguardas técnicas para diminuir suas fragilidades corporativas; a segunda, de natureza mais pragmática, está apoiada na esperança que a empresa venha a errar menos no futuro e que o processo de planejamento, por se traduzir em um momento de reflexão empresarial sobre os erros e acertos da organização no passado, possa permitir que dele sejam tiradas lições organizacionais úteis; a terceira, de natureza mais dinâmica, está na expectativa de que, ao final da execução do processo, a empresa poderá́́́ ainda não estar onde deseja, mas também não mais estará́́́ onde se encontrava ao início do processo. Em termos práticos, a adoção e a integração dos três estímulos mencionados significam reconhecer de forma explícita que a colocação em prática dos processos e planos conceituais corresponde para a organização assumir que empreender ações é uma alternativa empresarial muito melhor que depender dos efeitos da inércia organizacional e que, igualmente, fazer algo ou, no mínimo, ter-se a sensação que se está́́́ fazendo algo, é bem mais reconfortante que permanecer imóvel. A partir dessas considerações, o que se pode esperar da aplicação da metodologia de planejamento é que essa resulte em um processo que, minimamente, levará a empresa a uma fase de autoanalise, muito semelhante a uma sessão de 20 psicologia de grupo, entendida como a fórmula empresarial para que a companhia passe a obter um maior conhecimento do seu “eu corporativo”, concomitantemente com a avaliação do ambienteexterno em que vive e compete. 21 Portanto, da mesma forma que ocorre na psicologia dos indivíduos, a companhia poderá́́́ ao final do processo esperar um modelo de atuação mais adaptado ao seu ambiente e obterá́́́ a possibilidade de uma melhor convivência com suas virtudes e idiossincrasias e que, em razão desses fatores, poderá́́́ conseguir obter uma melhor ação gerencial ao lograr cooptar o conjunto dos colaboradores no sentido desejado. Em linha com esse raciocínio, outro aspecto a ser considerado é que, ao mesmo tempo, a organização passará a melhor se qualificar para descobrir os caminhos que a levarão a quebrar os paradigmas internos que, no momento, podem estar tolhendo sua movimentação, tanto no merca- do competitivo como internamente entre seus colaborado- res. Aliás, quando nos referimos aos colaboradores, cabe constatar que apesar desses se constituírem no recurso mais importante das corporações e se apresentarem como uma variável crítica para a gestão empresarial, o tratamento que às vezes a eles é concedido nem sempre é condizente com o discurso interno provido pela área de RH. O importante nesse aspecto não é apenas perceber e valorizar o que a organização faz bem ou então a forma com que atua de forma diferente das outras, mas, igualmente, avaliar: como se consegue criar um ambiente organizacional com adequados estímulos pessoais para se atingir os parâmetros conceituais requeridos; qual é a dose de importância que a empresa dedica à forma como seus colaboradores logram fazer coisas em comum; qual é o nível de desgaste organizacional ou pessoal envolvido em tais ações; e qual é a vontade da empresa em, efetivamente, passar a assumir novos padrões de comportamento. Aí sim estaremos dando um passo adiante, tanto em termos do processo de planejamento propriamente dito como em termos da gestão de mudanças e daí decorre mais um ganho explicito a ser obtido, que está relacionado com a constatação 22 de que, em princípio, uma empresa que tem projetos efetivamente partilhados entre os seus colabora- dores vale mais do que as outras. 23 Quanto aos efeitos de uma postura adequada, esses podem ser facilmente percebidos, dado que permitirão à empresa: agregar maior valor para a clientela através da busca de soluções inovadoras por meio de processos mais eficientes, ao invés de apenas enveredar em ações de redução de custos que, no longo prazo e pela sua própria lógica interna se tratadas da forma incorreta – chegam a colocar em perigo a própria sobrevivência da companhia; criar estruturas estimuladas, com mecanismos de reconhecimento e com a criação de reais oportunidades de desenvolvimento para os colaboradores identificados como de alto potencial e que esses, em consequência, podem encontrar meios lícitos de aumentar sua autoestima e realização profissional; reduzir o atrito e os altos custos de desenvolvimento em novos produtos ou soluções de negócios. Mesmo que o planejamento empresarial não possa oferecer garantias definitivas de sucesso, o uso do método efetivamente implica no aumento das chances de sucesso da organização e no aumento do grau de confiança para com possíveis investidores. Em resumo, com o uso do planejamento empresarial criam-se condições objetivas para transformar situações potencialmente reativas em situações proativas diminuindo, concomitantemente, as fragilidades empresariais existentes. Como consequência adicional, também é razoável afirmar que o conceito subliminar que as companhias tendem a endossar ao se renderem ao processo de planejamento é que esse implica em avaliar e exercitar novos modelos de gestão corporativa. Nesses casos, a concepção de cenários alternativos – condição fundamental de sucesso – demonstra que tais atitudes implicam em aceitar que se possa errar repetidamente, mas que, ao final de cada ciclo de processo, espera-se que os desacertos passem a se repetir com frequência cada vez menor. Em sentido reverso, não deve restar qualquer dúvida ao leitor sobre o fato que a busca da mediocridade 24 normalmente é bem-sucedida. 25 A partir dessas constatações podemos assumir que o objetivo a desenvolver possa seguir por quatro naturezas distintas de raciocínio para tentar demonstrar que, apesar das dificuldades, o processo de planejamento se justifica tanto como um fim como pelos mecanismos em que o pro- cesso se desenvolve. São elas: a elaboração das sugestões conceituais tradicionais – visão, missão, valores, objetivo, metas e planos – como elementos iniciais de agregação para o direcionamento da gestão empresarial; o estabelecimento de recomendações organizacionais para o melhor direcionamento da estrutura de governança e para o suporte aos processos operacionais; a criação de um adequado modelo de comunicação empresarial; a definição de um conjunto de indicadores de avanço dos planos e projetos colocados em marcha construídos em linha com os objetivos estratégicos da organização. A partir do que foi colocado, é importante considerar que os esforços delineados devem ser conduzidos no sentido da quebra dos tabus que possivelmente não mais atendem às demandas das empresas modernas. Para tanto, devemos considerar: um primeiro nível de preocupações, que trata das posturas organizacionais a partir da visão analítica das informações disponíveis, definindo que a organização deverá ter objetivos de minimização da formalidade burocrática e eliminar superposições decisórias agindo em paralelo com a maximização dos mecanismos de autocontrole dos intervenientes, em um processo conhecido como risk self asses- sment; um segundo grupo que buscar definir a descentralização como um importante mecanismo redutor de riscos organizacionais, que implica em consequências sobre a forma de trabalho em equipe e em relação 26 à sinergia de funções; 27 um terceiro grupo de análises que se preocupa em unificar as visões e identificar quais são os incrementos mensuráveis para direcionar o desempenho e para permitir a agilidade da decisão; um quarto grupo que trata do acompanhamento dos avanços dos planos e projetos, permitindo, através dos mecanismos da retroalimentação, que sejam implantados os ajustes que certamente se farão necessários. Todo esse conjunto deve ser executado sem deixar de considerar, conforme o que foi anteriormente observado, que os recursos humanos são um valor intrínseco das organizações e que, normalmente, as constatações que aqui observamos demandam dos administradores um elevado grau de alinhamento empresarial e de criatividade organizacional se, de fato, houver interesse em concretizá-las. Uma vez aceitas essas direções iniciais, a ideia proposta é passar a discutir algumas posturas empresariais, pessoais e organizacionais capazes de permitir a minimização dos problemas e das fragilidades que são resultantes da ação de incursão da organização no processo de diagnóstico empresarial, bem como a melhor forma de preparar os passos a serem empreendidos nesse tipo de projeto. Ao mesmo tempo, há que se considerar que o grande feito do administrador bem-sucedido é seu legado no longo prazo. 3. Planejamento Estratégico e Operacional em Saúde Os hospitais são instituições prestadoras de serviço, de grande importância social, que se configuram como sistemas abertos, pois, além de sofrerem a ação do meio, são influenciados continuamente pelas mudanças que ocorrem em todos os campos sociais. Conhecer a história, a evolução e o funcionamento dos hospitais é fundamental para conhecer as forças que determinam o planejamento estratégico em saúde. 28 A palavra hospital deriva da forma latina culta hospitale, que significa“relativo a hóspede ou hospitalidade”. De fato, a palavra latina hospes, hóspede, originou as palavras hospitalise hospitium, que designavam o local onde se abrigavam na 29 antiguidade os enfermos, viajantes e peregrinos, além de significar estabelecimento que se ocupava de pobres, incuráveis e insanos, originando a palavra hospício. Nosocômio, sinônimo de hospital, tem origem na palavra grega nosocomium, que significa “lugar para tratar doentes, ou asilo de enfermos”. É possível encontrar registros que apontam a existência de hospitais em civilizações antigas como a indiana, a egípcia, a grega e a romana. Nestas duas últimas, os templos serviam como hospitais e os doentes eram atendidos tanto em suas necessidades corporais quanto espirituais. Com as contribuições de Hipócrates (460-351 a.C.) e a disseminação dos seus ensinamentos baseados na compreensão integral do homem, os templos passaram a assumir cada vez mais características de hospitais. São Basílio foi o responsável pela construção das primeiras instituições hospitalares, em Cesárea, capital da Capadócia, na segunda metade do século IV. Ainda nesse século, Fabíola teve a incumbência de construir o primeiro hospital cristão em Roma. Durante um longo período, entre os séculos IV e XVIII d.C., a igreja católica, tanto na Europa como em outras partes do mundo, dirigiu as instituições que hoje conhecemos como hospitais. Sob a influência do cristianismo, essas instituições, que inicialmente abrigavam doentes e indigentes, adquiriram cunho eclesiástico. Em virtude disso, os sacerdotes e religiosos que ali atuavam consideravam apenas a alma do doente como merecedora de socorro e, portanto, a cura do seu corpo não era uma meta a ser atingida. Intervenções cirúrgicas e dissecções não eram realizadas, por serem consideradas sacrilégio. O Renascimento, no século XV, trouxe um novo impulso cultural à Europa, reativando os estudos científicos da Medicina. Nos séculos XVIII e XIX, começaram a surgir os grandes hospitais, que tiveram suas condições de higiene e assepsia aprimoradas com as contribuições de Pasteur, Koch e Lister. Até o século XIX, o funcionamento dos hospitais ainda se encontrava em 30 íntima relação com o mundo religioso e militar. O processo de industrialização resultou em intenso êxodo das populações para as áreas urbanas e na busca de soluções para os problemas de saúde pública, o que, aliado ao desenvolvimento tecnológico e da medicina científica, modificou os papéis desempenhados pelo hospital. Este deixava 31 de ser um local para doentes e pobres morrerem e transformava-se na instituição privilegiada para o tratamento das enfermidades, com as condições de infraestrutura adequadas que não poderiam ser deslocadas para a residência dos pacientes. Assim, passava-se ao Estado a responsabilidade da assistência aos doentes. Borba e Teixeira afirmam que o hospital moderno tem diferentes funções, sendo elas: a restaurativa, a preventiva, a educativa, a de pesquisa e de integração, todas abrangendo desde a assistência e prevenção à saúde da comunidade, passando pelo ensino como instrumento para aprimorar os recursos humanos em saúde e pela prevenção graças ao enriquecimento da cultura popular, até́́́ o desenvolvimento de pesquisas visando à captação de recursos e ao progresso da sociedade. Um modo de entender o hospital é vê-lo como uma organização de características próprias que o diferenciam de outras organizações ou instituições. O hospital é uma organização humanitária, sendo até́́́ certo ponto burocrática e autoritária, com extensa divisão de trabalho especializado, coordenado hierarquicamente segundo certos princípios e métodos. O alto grau de profissionalização encontrado nesse universo determina o aparecimento de normas e valores comuns aos membros dos grupos e que são essenciais para a integração organizacional. Entretanto, há a necessidade, dentro da organização hospitalar, de uma filosofia integradora que possibilite operacionalizá-la, fazendo conviver assistência, ensino e pesquisa, quando essas atividades estiverem presentes. 3.1 A Arte de Gerenciar Estrategicamente O estudo da Administração Estratégica foi definido pela primeira vez em 1950, quando a Fundação Ford e a Carnegie Corporation patrocinaram uma pesquisa no currículo das escolas de negócio, surgindo daí́́ uma área de estudo denominada política de negócios. Mais tarde, esse enfoque inicial foi ampliado, passando a incluir a consideração da organização global e seu ambiente. Isso trouxe para o foco 32 questões como responsabilidade social e ética, bem como o impacto potencial de fatores políticos, legislativos e econômicos sobre o êxito organizacional. 33 A gestão estratégica pode ser entendida como um “conjunto de decisões e ações estratégicas que determinam o desempenho de uma organização no longo prazo”. Inclui a análise profunda dos seus ambientes interno e externo, os quais serão chamados aqui de cenários (interno e externo), além da formulação, implementação, avaliação e controle da estratégia. Estudos apontam que, geralmente, as organizações que adotam uma gestão estratégica apresentam melhor desempenho do que outras que não o fazem. Esse tipo de gestão determina o caminho desejado e possível de crescimento e desenvolvimento da organização e, por isso, deve ser entendido como ponto de partida e fonte para seu processo de planejamento integral. Seu verdadeiro valor, muitas vezes, está mais na visão de futuro que oferece do que no plano formal. Cenários: o hospital interagindo com o ambiente As mudanças nos panoramas político, econômico, social, tecnológico, cultural, demográfico e ecológico têm sido precursoras de grandes transformações nas estratégias organizacionais. Para enfrentar essa nova conjuntura, as instituições necessitam de flexibilidade, adaptabilidade e responsividade às necessidades dos clientes e do mercado, tendo em vista que elas próprias também estão em continua mudança. As alterações são tão intensas que o momento em que vivemos está́́́ sendo classificado como a “era da mudança da mudança”. Drucker afirma que nenhum século da história da humanidade passou por tantas transformações radicais quanto esse que terminou. Diante disso, é sabido que as organizações não têm o controle das condições ne- cessarias a sua própria sobrevivência, sendo elas dependentes de recursos externos. As organizações precisam ser permeáveis ao meio ambiente e estar atentas a suas alterações, não deixando de perder de vista o referencial ambiental como o principal tópico do processo de mudança e adaptação estratégica, num momento em que se vive um cenário instável e mutante. A mudança organizacional resulta dos interesses e compromissos do 34 indivíduo e dos grupos dentro da organização, bem como da escolha e da interação de forças políticas e econômicas com essa organização. Tal realidade nos conduz, a discutir as dimensões do conceito de cenários, tendo em vista que a organização não se faz apenas por aquilo que a compõe internamente e por aquilo que ela se propõe 35 a ser, isto é, seu funcionamento não é definido apenas por seu cenário interno. A conjuntura política, econômica e social – o cenário externo – resultará em demandas específicas às quais a organização terá́́́ de responder e adaptar o cenário interno para não prejudicar seu bom funcionamento. Cenários internos e externos podem ser compreendidos como descrições qualitativas de possibilidades ou desejos futuros que visam enriquecer a tomada de decisão. Seu propósito fundamental é aprofundar a compreensão e ampliar a visão dos responsáveis pelas decisões em todos os níveis. Quando se pensa no cenário interno de uma instituição, leva-seem conta todo o funcionamento dela, o que inclui a missão, a visão, os valores, objetivos e as diretrizes internas; já quando a preocupação é avaliar o cenário externo, está em foco o contexto em que está inserida a organização e isso exige que suas ações e diretrizes para o futuro sejam repensadas. Ao elaborar cenários é importante descrevê-los de maneira resumida, precisa e objetiva. Os níveis de análise dos vários cenários devem traduzir a situação encontrada, mesmo insuficiente, negativa ou má́́́ , para que no futuro essa situação possa ser alterada e se concretize o cenário desejado. Nos instrumentos de análise com apenas dois cenários, um expressará a situação atual, que constitui o problema e que se deseja transformar; e o outro expressará o desejado naquele momento, o cenário estratégico. As organizações podem responder às mudanças em seu ambiente iniciando processos de mudança estratégica. A energia para essa mudança virá do reconhecimento da pressão do cenário externo e da compreensão das dicotomias existentes entre a organização do presente e seus desejos futuros de relacionamento, aspectos ligados ao cenário interno em interação com seu contexto histórico. O planejamento estratégico precisa estabelecer ou reforçar os elos entre os diferentes níveis da instituição e o cenário externo, em particular com os clientes, entidades representativas da sociedade, órgãos de governo e sindicatos, entre outros. Esses elos têm a função de promover mudanças internas e continuamente ajustá-las 36 às mudanças externas na gestão estratégica. Com a ampla análise dos cenários internos e externos é possível estabelecer a missão organizacional. Diferentes grupos de especialistas em planejamento utilizam a elaboração de cenários para formular planos de governos, setores, empresas e cidades; para avaliar 37 iniciativas estratégicas, distribuição de recursos, controle e resultados; para analisar futuros alternativos quanto a planos de desenvolvimento regionais e locais; para elaborar planos de desenvolvimento nas áreas militar, científica, tecnológica, social e espacial. Planejamento: ferramenta para gestão O planejamento é uma das funções básicas do processo administrativo, juntamente com as funções de organização, direção, controle e avaliação. Antes de iniciar essa discussão, conceituaremos alguns termos pertinentes ao assunto. O termo planejamento é definido pelo dicionário Aurélio como a “elaboração, por etapa, de planos e programas com objetivos definidos”. Tal conceito revela-se insuficiente para o trabalho em questão, já́́́ que planejamento decorre da necessidade de criar ou modificar realidades. Encontramos em Allen a definição de planejamento como sendo elaboração de plano(s) com objetivos específicos para anular problemáticas, por meio de ações sequenciais corretivas. Esse conceito parece traduzir a complexidade do tema, abarcando sua diversidade. Na primeira etapa da elaboração do planejamento, a análise diagnostica prévia identifica a existência de problemáticas, as quais podem ser definidas como situações limitantes que se interpõem ao ideal de perfeição concebido no imaginário. Em segui- da, é criado um organismo para solucionar essas situações, identificadas na problemática. Dessa forma, a criação de um organismo é o efeito, ou a consequência, de um problema-causa e traz consigo o exercício da missão e da competência de atuar em sua área específica. SAIBA MAIS A missão é a frase síntese do organismo, em que se deve expressar do modo mais econômico possível sua incumbência e os motivos que justificam sua criação. Compreende o que fazer, para quê, para quem e objetivando o quê, além dos valores, conceitos de ética e conduta, adotados pela organização e seus colaboradores, sobre os quais todas as relações estão baseadas. Rivera propõe-se a definir racionalmente a missão de um hospital, situando-o na perspectiva de uma rede de cuidados de saúde, o que equivale a entender a 38 organização hospitalar como uma organização proativa, centrada no exterior, que assume o ambiente como recurso (e não como restrição). Isso significa que a missão terá́́́ de ser negociada com o cenário externo institucional, incluindo os outros hospitais da área. Dessa maneira, o adjetivo proativa se refere à capacidade de atuar dinamicamente sobre o ambiente. Muitas empresas apenas emolduram sua missão em um quadro, mas não cuidam para que todos a adotem; nesse caso, ela não passará de um enfeite e a empresa não transmitirá credibilidade aos envolvidos. Atrelado à missão, o conceito de visão organizacional também fornece subsídios para o processo de planejamento estratégico. Aliás, a diferenciação entre os dois termos – missão e visão – não é consenso entre os autores consultados, já́́́ que ambos aparecem na literatura ora como sinônimos, ora como conceitos distintos que se complementam. De qualquer forma, o conceito de visão nunca foi tão importante quanto hoje, quando vemos organizações cada vez menos hierarquizadas e mais descentralizadas. Visão clara é importante para as empresas e pessoas que nela trabalham, considerando que, quando a visão é muito calcada em números e fatos, ela desinteressa as pessoas. Assim, é necessário corrigir essas falhas envolvendo a mente e o espírito dos colaboradores. A criação da visão passa pelo modo como vemos a nós mesmos. De acordo com Allen, a visão pode fornecer o mapa do caminho futuro e gerar entusiasmo quanto a ele, além de colocar “ordem no caos” e fornecer critérios para medir o êxito. Para ser eficaz, a visão precisa ser coerente com as visões individuais e organizacionais; assim, será́́́ capaz de criar uma imagem identificável de futuro. Deve também ser convincente, para gerar comprometimento com o desempenho, e deixar claro o que pode e o que deve ser feito. Portanto, a visão tem implícitos em si componentes racionais, já́́́ que é produto de análise, e emocionais, pois resulta da imaginação, intuição e valores dos envolvidos. A visão, além de ser o mais atemporal possível, deve responder a questões 39 simples, tais como: Quem somos? Como queremos ser reconhecidos? Quem queremos ser? 40 Qual o nosso objetivo? Qual a força que nos impulsiona? Quais são nossos valores básicos? O que fazemos de melhor? O que gostaríamos de mudar? O que desejamos realizar? O que a organização precisa fazer para que eu me sinta orgulhoso dela? A metodologia para o estabelecimento da visão/missão deve reportar o gestor ao uso de ferramentas adequadas. O âmbito da missão/visão depende do escopo traçado para a organização. Entenda-se por escopo o leque de possibilidades de atuação da organização, seus limites, matéria-prima, produtos e assuntos com os quais vai trabalhar. Em seguida, devem ser tomadas providências para reverter a problemática diagnosticada, por meio da ativação de ações corretivas, que, por sua vez, movimentam a missão fazendo despontar objetivos e metas. Esses dois termos são frequentemente utilizados como sinônimos. Objetivo refere-se à intenção de produzir algo novo, criando uma realidade ou modificando uma preexistente. Os objetivos podem ser gerais ou específicos. Já́́́ a definição de meta refere-se à antecipação do porvir de nova realidade, a qual dependerá da conclusão do objetivo. Surge como uma expectativa que deriva do enunciado implícito ou explicito nele próprio. A execução dos objetivos e das metas se dará pelas ações, as quais resultam de um processo volitivo que levará à criação ou modificação da realidade. As ações são operacionalizadas por meio de diretrizes e estratégias. Diretriz é o conjunto de instruções que normatizam a fase de planejamento que antecede a ação, isto é,normatizam as instruções que implementarão o objetivo. As estratégias estão ligadas à capacidade ou talento de aplicar recursos materiais e humanos para a consecução do objetivo explicitado na diretriz. Dizem respeito à arte de explorar condições favoráveis e otimizá-las, especificando como, quando, onde, quantos etc., e atingindo os objetivos ao menor custo, bem como de explorar condições desfavoráveis e ainda 41 assim cumprir o objetivo aproveitando as oportunidades. Por fim, a avaliação acontece com a apresentação dos resultados, para que se possa, em seguida, avaliar também a meta em relação à expectativa original. 42 Nesse processo é necessária a análise dos desvios entre o que se planejou e o que foi realizado, avaliando-se o nível de adequação das estratégias selecionadas às condições do ambiente externo. Pensando na realidade do planejamento em saúde no Brasil, conforme detalhamos anteriormente, o desenvolvimento da rede hospitalar e do sistema de saúde como um todo não corresponde a um processo de planejamento estruturado, configurando-se mais como um aglomerado de acontecimentos que foram sendo improvisados com o desenrolar da História. De maneira geral, tal desenvolvimento se deu muito mais por necessidades sentidas, definições políticas localizadas e interesses particulares de grupos do que em função de uma política nacional de saúde. Planejamento Estratégico O termo planejamento estratégico vem sendo utilizado, cada vez com mais frequência, no cenário da administração das empresas. No entanto, muitas vezes esse termo corres- ponde apenas a um modismo terminológico. De acordo com Lobão, durante o processo de elaboração do planejamento estratégico, o estabelecimento de metas e a formulação de planos para atingi-las é frequentemente antiquado e mal conduzido pelos gestores. Organizações perdem muito tempo e energia intelectual tentando eliminar seus pontos fracos, reais e/ou imaginários, e realizando planos estratégicos grandiosos, os quais, em geral, pouco contribuem para o sucesso da gestão. O processo de planejamento estratégico pode ser entendido como uma ciência artística ou arte científica, que requer disposição para questionar as próprias incertezas e, ao mesmo tempo, para assumir integralmente o compromisso com uma causa comum e levá-la adiante. Nesse processo, não existe uma única fórmula aceita universalmente, já́́́ que por trás dele é importante a existência de raciocínio exploratório e não determinista, capaz de identificar fatores críticos e definir o valor percebido pelo cliente. 43 É essencial a capacidade do gestor de identificar os pressupostos, que perpassam as definições construídas. 44 Segundo Machline: “[o] planejamento estratégico é composto por um conjunto de ações que visam alcançar uma situação futura diferente da passada, tendo a instituição condições de agir e influenciar nos fatores e variáveis que determinarão essa situação. É a forma pela qual a organização busca controlar sua vida e interferir no seu futuro, realizando uma intervenção deliberada na realidade.” Assim, o planejamento estratégico serve para que a organização ressalte seus pontos fortes e reduza seus pontos fracos, aproveite oportunidades, responda às necessidades e administre as restrições apresentadas pelo ambiente. Rasmussen indica quatro fases básicas para a elaboração e implantação do planeja- mento estratégico. Considerando as ideias desse autor, retomaremos alguns conceitos já́́́ apresentados: diagnóstico estratégico; missão; instrumentos prescritivos e quantitativos; controle e avaliação das estratégias. Na fase do diagnóstico estratégico, determina-se “como se está” ou “onde se está”. Trata de uma análise interna dos pontos fortes e fracos e da análise externa das oportunidades e ameaças. Devem-se também avaliar os pontos neutros para a organização. É recomendável desenvolver planos por departamentos e divisões, integrando-os ao plano principal. Além disso, nessa fase estudam-se os programas atuais, a natureza dos serviços prestados à comunidade e as relações interprogramáticas. Na fase em que se define a missão da organização, determina-se o motivo central do planejamento estratégico – aonde a empresa quer chegar. É importante para o executivo estabelecer os propósitos da organização dentro da missão e manter postura estratégica, identificar lacunas programáticas para futuras inovações, e 45 estabelecer relações com outras instituições, visando a parcerias em projetos futuros. Na fase dos instrumentos prescritivos e quantitativos, é importante que se deter- mine como chegar à situação desejada e que se investigue, continuamente, 46 características socioeconômicas, políticas e culturais da comunidade para aumentar a capacidade de resposta do hospital. Durante o controle e avaliação das estratégias, o processo de desenvolvimento e avaliação institucional deve ser organizado e o programa de controle das atividades planejadas deve ser permanentemente mantido. A função de controle e avaliação é crucial em toda organização. Sua finalidade é assegurar que os resultados obtidos atinjam os objetivos almejados no planejamento. A avaliação é um processo que deve estar presente em cada etapa do planejamento, influenciando e sendo influenciada por ele. É ela que permite verificar cada ponto forte e todas as oportunidades de melhorias que poderão constar nos próximos planos. Essa avaliação viabiliza a realimentação das etapas do processo de administração estratégica. Pode- se dizer, até́́́ , que ela está́́́ do outro lado da moeda, em oposição ao planejamento estratégico e formando com ele o sucesso da gestão. Encontramos também na literatura referências ao método do planejamento estratégico situacional (PES), introduzido por Carlos Matus, o qual prevê̂ quatro momentos para o processamento técnico-político dos problemas, quais sejam: o explicativo, no qual se busca justificar os porquês da situação atual; o normativo, no qual se estabelece o que se deseja fazer; o estratégico, no qual se analisa a viabilidade das operações planejadas; o tático-operacional, no qual se cuida da implementação das operações no dia- a-dia. O planejamento estratégico situacional é indeterminista com predições incertas, seu objetivo é “subjetivo” e está́́́ relacionado a uma apreciação situacional. Esse tipo de planejamento realiza várias apostas em cenários, seus planos são por problemas, seu cálculo é tecnopolítico, seus sujeitos são vistos como atores e seu sistema é aberto, apresentando várias possibilidades. Diversos problemas podem afetar a implementação de um plano estratégico. Dentre eles podemos destacar: 47 utilização de cenários como mecanismos para prever, em vez de compreender, o futuro; 48 objetivos institucionais estabelecidos pelo planejador, sem a participação dos usuários do processo; pouco envolvimento dos colaboradores na elaboração do plano e nas decisões tomadas pelo planejador; em geral, a alta administração é que está́́́ mais envolvida. No contexto da saúde, o planejamento estratégico possui algumas características particulares, caracterizando-se por uma orientação mais dirigida à comunidade que aos prestadores de serviço, além de estar mais preocupado com a necessidade dos pacientes do que com os serviços que os prestadores querem oferecer. Apontam-se, como algumas das variáveis determinantes do planejamento no setor de saúde, o volume de atendimentos, a configuração da demanda, o perfil dos profissionais, a tecnologia existente e os equipamentos e serviços disponíveis. O planejamento estratégico em saúde se diferencia de outros processos de planejamentosetoriais por olhar além dos valores institucionais, vislumbrando necessidades sociais, por meio da utilização do “cálculo social”, o que envolve processos políticos e de negociação. Ele valoriza o processo gerencial e o considera fundamental à tomada de decisões, bem como ao ajuste e resolução dos problemas. O planejamento estratégico agirá como diretriz para o hospital elaborar seu planejamento operacional. Quanto mais eficaz for o processo de raciocínio no nível estratégico, mais elaborado será́́́ o planejamento nos níveis tático e operacional. O planejamento estratégico não pode deixar de ser visto como um processo de mudança organizacional e, portanto, como processo de aprendizagem, em que a instituição está́́́ permanentemente reavaliando seu processo para detectar os pontos de acerto e os pontos em que foram cometidos desvios. A superutilização do termo planejamento estratégico, bem como o ritmo acelerado de mudanças no cenário da administração que reduzem a relevância de planos de longo prazo, fez surgir entre alguns autores orientações alternativas no processo de gestão. Parece ter havido deslocamento no foco da atenção gerencial: deixou-se de dar atenção à definição de 49 posições sustentáveis de produção no mercado e passou-se a investigar como desenvolver a capacidade da organização para sentir e reagir de forma rápida e flexível às mudanças. 50 Três características são consideradas chave para o acompanhamento das mudanças no cenário atual: buscar as pessoas mais adequadas à organização, isto é, investir em adequado processo de recrutamento e desenvolvimento do fator humano; ligar esses potenciais por fluxos horizontais, isto é, montar novos canais de comunicação que facilitem a difusão rápida de informações estratégicas; em outras palavras, não basta escolher pessoas adequadas e apenas cultivar “ilhas de informação e experiência”; criar uma cultura baseada na confiança, a fim de manter unida a organização. Esse último processo talvez seja o mais difícil, já́́́ que muitas vezes implica fazer com que as pessoas troquem informações e experiências que até́́́ então constituíam fonte de poder pessoal. Ao mesmo tempo, é importante perceber que apenas boas ideias ou boas decisões não levam necessariamente a bons resultados; é a “[...] implantação com excelência que consegue isso, o que pressupõe ação, fazendo tudo com o coração e buscando um padrão nota 10”. Na realidade, todo ser humano tem boas ideias; algumas pessoas, às vezes, nem têm uma ideia tão fenomenal, mas têm o espírito de ação voltado ao empreendedorismo. A ação pressupõe a quebra de hábitos – mudar o jeito de ser e de fazer das pessoas. Algo difícil, mas possível de ser realizado e que hoje se constitui no grande desafio da gestão. O desejo de mudar traz receios e racionalizações sobre uma série de obstáculos que o ser humano coloca a si mesmo, embora sabendo que é livre para dirigir a própria vida. Bartlett e Ghoshal questionam o que os executivos contemporâneos realmente querem para suas empresas. Estas devem ter o poder analítico de um grande mestre de xadrez ou a flexibilidade e energia competitiva de uma criança jogando videogame? Aqueles que tiverem dúvida sobre a resposta podem estar no caminho certo. Organizações com bons resultados dependem de poder analítico, de 51 flexibilidade e energia competitiva, o que mostra a necessidade de ampliar os esforços na direção do planejamento e do aprendizado organizacional. 52 Nesse processo, a integração entre afeto e razão é o elemento fundamental para uma visão sistêmica da organização e o alcance de um funcionamento harmônico. 53 Referências ALLEM, A. C. Termos e definições críticos em planejamento. Revista de Administração Pública, São Paulo, v. 33, n. 5, p. 143-152, set.-out. 1999. ALLEN, R. O processo de criação da visão. HSM Management, São Paulo, n. 9, p. 18-22, jul.-ago. 1998. ALMEIDA, M. I. R. 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