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SAÚDE ÚNICA AULA 5 Prof. Benísio Ferreiro da Silva Filho Profª Ivana Maria Saes Busato 2 CONVERSA INICIAL VIGILÂNCIA EM SAÚDE E EPIDEMIOLOGIA Vamos entender a Vigilância em Saúde como informação para ação em saúde única, que possibilita análise situacional de um território, de forma integrada, compreendendo quatro vigilâncias: sanitária, epidemiológica, saúde do trabalhador e ambiental, que trabalham multi e interdisciplinarmente. TEMA 1 – CONCEITO DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE A vigilância em saúde tem por objetivo a “observação e análise permanente da situação de saúde articulando um conjunto de ações destinadas a controlar determinantes, riscos e danos à saúde de populações que vivem num território, garantindo a integralidade da atenção, o que inclui tanto a abordagem individual como coletiva dos problemas de saúde” (Teixeira; Pinto; Vilasboas, 2004). Conforme Brasil (2005a, p. 13), Alexandre Langmur, em 1963, conceituou a vigilância em saúde como: [...] observação contínua da distribuição e tendências da incidência de doenças mediante a coleta sistemática, análise da morbidade e mortalidade, e outros dados relevantes, e a regular disseminação dessas informações a todos os que necessitam conhecê-la. A vigilância em saúde tem como foco principal controlar os fatores de risco, os determinantes e as condicionantes da saúde por meio de um conjunto de ações. “O principal objetivo da vigilância em saúde está na garantia da integralidade da atenção diante dos problemas de saúde, incluindo a abordagem individual e a coletiva” (Brasil, 2006). São componentes da vigilância em saúde: vigilância ambiental, vigilância sanitária, vigilância epidemiológica e saúde do trabalhador, todas integradas pela promoção da saúde. As vigilâncias ambiental, sanitária, epidemiológica e saúde do trabalhador, que compõem a vigilância em saúde, intercambiam suas especificidades, no monitoramento situacional de populações, no contexto de saúde única. 3 1.1 Vigilância de saúde do trabalhador e ambiental Avalia e analisa qualquer mudança do ambiente que pode interferir nos fatores que determinam e condicionam a saúde. Ela tem a função de recomendar e adotar medidas de prevenção e controle dos fatores de risco ambiental relacionados às doenças e outros agravos à saúde, com prioridade em: vigilância da qualidade da água para consumo humano, do ar, e do solo; desastres de origem natural; substâncias químicas e acidentes com produtos perigosos; fatores físicos; e o ambiente de trabalho (Brasil, 2002, p. 7-8). A saúde do trabalhador, outro componente da vigilância em saúde, utiliza todos os conhecimentos das vigilâncias para identificar, monitorar e prevenir os riscos ambientais ocupacionais que comprometem o ambiente de trabalho, além da proposição de medidas de prevenção e promoção da saúde do trabalhador. 1.2 Vigilância sanitária e Agência Nacional de Vigilância Sanitária A vigilância sanitária tem como missão a proteção e promoção à saúde da população e defesa da vida. Para alcançar essa missão, a vigilância sanitária deve interagir fortemente com a sociedade, buscando prioritariamente ações de interesse coletivo. Ela é um conjunto de ações capaz de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde e de intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio ambiente, da produção e circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde (Brasil, 2006). A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) foi instituída pela Lei n. 9.782, de 26 de janeiro 1999. Compõe o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, dentro do Sistema Único de Saúde. A Anvisa é uma autarquia sob regime especial, que tem sede e foro no Distrito Federal, e está presente em todo o território nacional por meio das coordenações de portos, aeroportos, fronteiras e recintos alfandegados. Tem por finalidade institucional promover a proteção da saúde da população, por intermédio do controle sanitário da produção e consumo de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionados. 4 TEMA 2 – O TRABALHO DA EPIDEMIOLOGIA NA SAÚDE ÚNICA O estudo do processo saúde-doença em grupos distintos e diferentes populações se dá por meio de ferramentas observacionais, matemáticas e técnicas de ciências da saúde compreendida como “Epidemiologia”. Sendo assim, se quisermos saber a origem, o curso de uma doença, como ela é transmitida e qual o risco de uma população frente a essa doença, recorremos aos trabalhos epidemiológicos para estabelecer prevenção e ações e combate às doenças. É de suma importância que os profissionais de saúde saibam usar o conhecimento epidemiológico; afinal, todos os profissionais estão diariamente observando o que ocorre na população, seja por relatos, novos sinais e sintomas, aumento do número de casos de uma determinada condição ou até mesmo pelo aumento do número de óbitos de um determinado local para que se inicie o processo de investigação e monitoramento. Segundo Gomes (2015), a Epidemiologia de forma simplificada deve ser compreendida como o estudo direcionado para o campo da saúde que observa aquilo que afeta a população. Esse estudo utiliza as três áreas principais de conhecimento: a estatística, as ciências biológicas e as ciências sociais. O uso da Epidemiologia na descrição das condições de saúde de uma determinada população, na investigação de fatores determinantes da situação de saúde bem como da avaliação do impacto das ações capazes de alterar uma condição que está prejudicando a saúde de uma população permite que saibamos o que fazer em tempo hábil para garantir a manutenção da saúde de uma população. 2.1 O que a Epidemiologia deve olhar? Indicadores As ferramentas de observação, estatística e intervenção em saúde avaliam o cenário de uma população, sua saúde, desenvolvimento social e econômico. Com um olhar voltado para saúde única, mostra a situação da organização e infraestrutura dos serviços de saúde, além da informação, percepção e educação da população em relação ao que está acontecendo. Os indicadores são, portanto, dados importantes para o acompanhamento e parâmetros para tomadas de decisão e políticas que intervenham com intuito de trazer melhorias. 5 Vamos considerar como importantes indicadores de saúde as medidas de frequência de doenças, indicadores de mortalidade e indicadores de morbidade. Existem outros, que não devem ser menosprezados, porém o impacto causado por esses três faz com que rapidamente decisões sejam tomadas a curto prazo. Logo, daremos ênfase aos três. As medidas de frequências de doenças olham os descritores socioeconômicos e avaliam a vida e a saúde de uma população por seus índices, ou seja, valores quantitativos que nos dão uma noção de aumento ou diminuição de algo, o que permite inferir, por exemplo, se aumentou o número de pessoas com problemas intestinais ou não. Sendo assim, precisamos ver a incidência que é a frequência de novos casos de determinada condição de saúde em um período temporal específico e que está no momento da observação. Fica fácil, então, perceber que os casos novos são aqueles que ocorrem na população logo após o início da observação epidemiológica. A incidência é uma medida de frequência importante para a investigação etiológica (investigar a causa da doença). Outra medida é a prevalência, importante para o planejamento de ações e serviços e políticas, sendo essa diferente da incidência, pois é uma medida a ser usada em observações de longa duração, ideal para doenças crônicas, por exemplo. O aumento ou diminuição da incidência influencia na prevalência, entenda então a incidência com algo mais dinâmico, com um tempo de observação menor e a prevalência como uma medida que defineo que é mais frequente ou não por ter um tempo de observação muito maior. A mortalidade é o mais antigo e bem definido indicador de saúde. É o mais empregado e indicado como principal índice de avaliação de saúde. Cada óbito será registrado, e os dados são fáceis de serem coletados, percebidos em determinado período provocando ações de urgência ou não. A mortalidade não se restringe somente ao óbito individual, podendo ser apresentado de acordo com o sexo e a faixa etária, auxiliando, assim, na investigação etiológica. Obtendo dados de forma correta e confiável, é possível obter informação sobre a morbidade, que é o índice de indivíduos portadores de determinada doença em uma população estudada no mesmo período em que os demais índices estão sendo observados. Portanto, os indicadores devem ser vistos como dados informativos cujo profissional que está trabalhando na investigação epidemiológica possa guiar os 6 profissionais de saúde e aqueles que consultam e pedem informações para tomada de decisão. Se necessário, os profissionais de saúde devem realizar inquéritos epidemiológicos caso os dados não sejam por diversos motivos confiáveis, em sua grande maioria, com relação a obtenção, ausência de informação, detecção de erros etc. Figura 1 – A epidemiologia observa e coleta dados que irão guiar os profissionais nas tomadas de decisão causando impacto direto na saúde Crédito: Pongimages/Shutterstock. TEMA 3 – VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA: HISTÓRIA E CONCEITO A história da vigilância epidemiológica remonta a história das civilizações, representada por registros de dados, como o número de nascimentos, o de mortes e o de aglomerados, de casos de doenças, a descrição das doenças, e as propostas de tratamentos, em especial das doenças transmissíveis. As primeiras medidas associadas à vigilância epidemiológica foram: quarentena e isolamento de doentes. No Brasil, século XIX, as principais medidas relacionadas à vigilância eram representadas pela contagem de população, principalmente de escravos, https://www.shutterstock.com/g/pongampaphoto 7 além do combate e descrição das doenças infecciosas, que afetavam as cidades portuárias, ambas com finalidades comerciais. A vigilância epidemiológica, que integra a Vigilância em Saúde, possibilita o planejamento e a organização dos serviços, monitoramento e acompanhamento da saúde de territórios, além de propor ações de prevenção das doenças e promoção da saúde. Na década de 1970, o Ministério da Saúde instituiu o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SNVE), por recomendação da 5ª Conferência Nacional de Saúde, de 1975, na Lei n. 6.259/1975 e no Decreto n. 78.231/1976. A Lei n. 6.259/1975, no art. 1º, define que o Ministério da Saúde coordena as ações relacionadas com o controle das doenças transmissíveis, orientando sua execução inclusive quanto à vigilância epidemiológica, à aplicação da notificação compulsória, ao programa de imunizações e ao atendimento de agravos coletivos à saúde, bem como os decorrentes de calamidade pública (Brasil, 1975; 1976). Com a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS), o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica tornou-se parte integrante do SUS, e foi regulamentado na Lei n. 8080/1990, que define a vigilância epidemiológica como [...] um conjunto de ações que proporciona o conhecimento, a detecção ou prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar as medidas de prevenção e controle das doenças ou agravo. (Brasil, 1990, art. 6º, parágrafo 1º). Brasil (2002, p. 12) aponta que a vigilância epidemiológica fornece orientação técnica permanente para os profissionais de saúde, para as ações de controle de doenças e agravos, disponibilizando informações atualizadas sobre a ocorrência de doenças e agravos, bem como os fatores de risco em determinada área geográfica ou população definida. As funções devem ser desempenhadas nos três níveis do sistema de saúde (municipal, estadual e federal) com graus de responsabilidade variáveis. A vigilância epidemiológica tem as funções de: realizar a coleta de dados; o processamento de dados coletados; a análise e interpretação dos dados processados; recomendação das medidas de prevenção e controle apropriadas; promoção das ações de prevenção e controle indicadas; avaliação da eficácia e efetividade das medidas adotadas; e divulgação de informações pertinentes. 8 A vigilância epidemiológica instrumentaliza os profissionais de saúde e gestores na interpretação do diagnóstico da situação de saúde, na análise das condições de vida e saúde, identificando os problemas e necessidades que exijam maior atenção, e o monitoramento das condições de saúde de populações. 3.1 Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SNVE) O SNVE é um dos componentes do SUS, que, na Lei n. 8.080/1990, redefiniu a vigilância epidemiológica como um conjunto de ações que proporciona o conhecimento, a detecção ou a prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar as medidas de prevenção e controle das doenças ou agravos (Brasil, 1990). Com o SNVE dentro do SUS, as ações de vigilância epidemiológica passaram a ser operacionalizadas em um contexto de reorganização do sistema de saúde brasileiro, caracterizada pela descentralização de responsabilidades, pela universalidade, integralidade e equidade na prestação de serviços. As ações de vigilância epidemiológica executadas pelo SNVE, nas três esferas de gestão do SUS, são desenvolvidas de modo ininterrupto e consistem em coletar, processar, analisar e interpretar dados; propor medidas de prevenção e de controle; avaliar a eficácia e a efetividade de medidas adotadas; e divulgar informações. A vigilância epidemiológica utiliza dados de dois tipos de fonte: primária, com dados coletados pelas equipes de saúde no território ou na área de abrangência de cada Unidade de Saúde, em especial pelo Sinan; e fonte secundária, com dados coletados de outros órgãos e de instituídos oficiais municipais, estaduais e nacionais; por exemplo, hospitais sentinelas, laboratórios centrais. A coleta de dados deve ser feita no ponto de ocorrência do evento sanitário (Brasil, 2009a, p. 19). Segundo o Guia de Vigilância Epidemiológica (Brasil, 2009a, p. 23), os achados de investigações epidemiológicas de casos e de emergências de saúde pública, surtos ou epidemias “complementam as informações da notificação, no que se referem a fontes de infecção e mecanismos de transmissão, dentre outras variáveis. Também podem possibilitar a descoberta de novos casos que não 9 foram notificados”. Devem ser consideradas, também, informações oriundas da imprensa e da própria comunidade como fontes importantes de dados. 3.2 Centro de informações estratégicas em vigilância em Saúde (CIEVS) A globalização integrou os países, refletindo no aumento da circulação de pessoas e mercadorias, e com as mudanças demográficas e epidemiológicas, contribui na ocorrência de epidemias e pandemias por doenças emergentes ou reemergentes, o que deve ser primordial aprimorar os serviços de vigilância em saúde mundiais. A Portaria n. 30, de 7 de julho de 2005, institui o Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde, define suas atribuições, composição e coordenação. [...] a finalidade de fomentar a captação de notificações, mineração, manejo e análise de dados e informações estratégicas relevantes à prática da vigilância em saúde, bem como congregar mecanismos de comunicação avançados. (Brasil, 2005b, art 1º). Com a implantação do CIEVS, dentro da estrutura do Sistema Único de Saúde, promoveu-se sua ampliação e descentralização nos diferentes níveis do sistema de saúde (nacional,estadual e municipal). O objetivo da Rede CIEVS é aperfeiçoar os mecanismos de detecção, monitoramento e resposta a emergências em saúde pública, organizando processos de trabalho padronizados entre as três esferas de comando do SUS, para a gestão coordenada dessas ocorrências. Os CIEVS de todos os níveis (nacional, estadual e municipal) devem trabalhar de forma integrada para identificar as emergências epidemiológicas, de modo contínuo e sistemático, utilizando a notificação telefônica, eletrônica, e buscando as informações nos principais meios de comunicação, especialmente no uso do Clipping Cievs, que resume essas informações coletadas. As competências do CIEVS incluem o desenvolvimento de atividades de manejo de crises agudas, incluindo o monitoramento de situações sentinelas e apoio ao manejo oportuno e efetivo de emergências epidemiológicas, facilitando a formulação de respostas rápidas e integradas nas diferentes esferas de gestão do SUS. A Rede tem a responsabilidade da identificação de emergências epidemiológicas, em conjunto com as demais áreas técnicas e o 10 aperfeiçoamento dos mecanismos de triagem, verificação e análise de riscos e notificações para identificar e desencadear resposta a emergências epidemiológicas. TEMA 4 – SAÚDE ÚNICA GLOBAL E EPIDEMIOLOGIA NO SÉCULO XXI Algumas doenças ficavam restritas devido à geografia, e, principalmente, pelas distâncias que deveriam ser vencidas para que indivíduos de um determinado local fosse até outro, levando consigo vírus, bactérias, fungos e até parasitas. Com o surgimento das primeiras rotas comerciais vieram os primeiros casos históricos de grandes surtos de doenças, com alta mortalidade. Por exemplo, a peste negra, causada pela bactéria Yersinia pestis, melhor descrita entre 1346 a 1353, saiu da China para Índia através de rotas mercantes, especialmente a rota da seda, chegou à Europa pela Crimeia. Como conseguimos apresentar esse resumo para você? Por meio de informações “epidemiológicas”. Podemos afirmar a gravidade, pois temos os números de mortos e o período em que esses casos ocorreram. Sabemos da gravidade da peste negra e podemos comparar com outros casos por meio dos dados. Hoje temos ferramentas modernas de investigação e sabemos que esse não foi o primeiro caso de surto da peste negra. Técnicas moleculares como o PCR e o sequenciamento de DNA confirmaram que 3000 anos a.C. já havia casos de peste na própria Europa, derrubando o discurso inicial de que surgiu na China (Rasmussen et al. 2015). Os trabalhos epidemiológicos mapearam a peste negra de tal forma que sabemos, hoje em dia, o que deve ser feito para que possamos conter o avanço da doença caso surja novamente com a mesma velocidade. 11 Figura 2 – Hoje temos, além das ferramentas matemáticas e de observação, técnicas modernas que auxiliam no trabalho epidemiológico Crédito: Tilialucida/Shutterstock. Precisamos, hoje, dentro do conceito de saúde única, usar todas as ferramentas e as especialidades para usar o trabalho epidemiológico frente aos avanços da modernidade. Antes nós tínhamos as rotas mercantes e as grandes navegações. Muitos morreram na América do Sul, Central e América do Norte após a chegada dos Europeus. Eles trouxeram consigo microrganismos que causaram a morte de milhares. Uma doença foi deslocada de um local para outro nesse exemplo, e isso acontece ainda hoje. Por isso que a epidemiologia é mais importante do que nunca. Figura 3 – Com a evolução da tecnologia, ocorreu também o avanço na distribuição de causas de diversas doenças Crédito: Anutaberg/Shutterstock. https://www.shutterstock.com/g/anyaivanova https://www.shutterstock.com/g/AnutaBerg 12 Lembre-se do que ocorreu nestes últimos anos de 2020, 2021 e início de 2022. Todo o trabalho de observação, levantamento de dados de mortalidade, morbilidade, os índices que chegaram a ser divulgados semanalmente e em alguns países diariamente, permitiram monitorar, avaliar quais os períodos que deveriam ter uma intervenção mais radical, diminuir as restrições, confirmar eficiência das vacinas através da diminuição de índices de um grupo em específico que começou a ser vacinado antes. Temos, recentemente, um período de valorização do trabalho epidemiológico. 4.1 Mais modernidade exige mais velocidade no monitoramento O movimento de pessoas no mundo aumento, e, hoje, com a globalização, o deslocamento rápido de um microrganismo ocorre em questão de, no máximo, 24 horas. As conexões permitem que o que ocorria antes em questão de meses, anos, ocorra hoje em dia em menos de uma semana. As conexões de todas as linhas aéreas representam a maior for de disseminação de um microrganismo ao redor do mundo. Estamos preparados não só para detectar o início de um problema de saúde, levantar dados e analisá-los, mas também temos condições de realizar o monitoramento mundial de um problema de saúde, pela rápida comunicação da internet. Figura 4 – O mundo está conectado pelo transporte marítimo e, principalmente, o aéreo. Veja toda a malha de conexões de voos civis no mundo Crédito: Underdog_Cg/Shutterstock. https://www.shutterstock.com/g/cetus 13 O Regulamento Sanitário Internacional (RSI) é o marco legal aprovado pelos países na 58ª Assembleia Mundial da Saúde que estabelece os procedimentos para proteção contra a disseminação internacional de doenças. A primeira versão do Regulamento foi instituída em 1951, sendo revisado em 1969, sofrendo alterações até a publicação de 2005 (Brasil, 2009b). O propósito e a abrangência do Regulamento são: “prevenir, proteger, controlar e dar uma resposta de saúde pública contra a propagação internacional de doenças, de maneiras proporcionais e restritas aos riscos para a saúde pública, e que evitem interferências desnecessárias com o tráfego e o comércio internacionais” (Brasil, 2009b). Esse regulamento determina as ações de definições, propósito e abrangência, princípios e autoridades responsáveis, informação e resposta em saúde pública, recomendações, pontos de entrada e as medidas de saúde pública. O Decreto Legislativo n. 395, de 9 de julho de 2009, confirma a aderência do Brasil. O RSI tem como finalidade aumentar a segurança sanitária mundial com a mínima interferência nas viagens e comércio internacional. Ao adotar o RSI, a comunidade internacional concordou em trabalhar em conjunto para cumprir esses desafios. É juridicamente obrigatório em qualquer Estado-membro da Organização Mundial da Saúde (OMS) (Busato, 2016, p. 174). TEMA 5 – EMERGÊNCIA DE SAÚDE PÚBLICA DE IMPORTÂNCIA INTERNACIONAL E NACIONAL O termo Emergência de saúde pública de importância internacional foi definido no RSI (2005) como evento extraordinário, o qual é determinado por constituir um risco de saúde pública para outro Estado pela propagação internacional de doenças e por requerer uma resposta internacional coordenada. No Brasil, as emergências de saúde pública de importância nacional se deram pela implantação do Centro de Informações Estratégias e Respostas em Vigilância em Saúde, pela Portaria n. 30/2005, visto que permite o monitoramento contínuo de eventos que podem se constituir em emergências de importância nacional, após avaliação de risco, utilizando processo de análise semelhante ao adotado pelos países e pela OMS, com os instrumentos criados a partir da entrada em vigor do RSI (2005). O Decreto n. 7.616, de 18 de novembro de 2011, definiu as regulamentações sobre a declaração de Emergência em Saúde Pública de 14 Importância Nacional (Espin), e instituiu a Força Nacional do Sistema Único de Saúde. A declaração e suspensão de Espin é de responsabilidade exclusiva do Ministério da Saúde. O art. 3º do Decreto define que será declarada Espin em virtude da ocorrência de situações, e epidemiológicas, de desastres;ou de desassistência à população. No parágrafo 1º as situações epidemiológicas, os surtos ou epidemias que apresentem risco de disseminação nacional; que sejam produzidos por agentes infecciosos inesperados; que representem a reintrodução de doença erradicada; que apresentem gravidade elevada; ou que extrapolem a capacidade de resposta da direção estadual do Sistema Único de Saúde. 5.1 Globalização de doenças infecciosas A globalização potencializou a migração de pessoas de um país a outro e entre continentes. O impacto da mobilidade populacional na saúde e na utilização dos serviços de saúde dos países anfitriões está mais importante. Seja um processo de migração de pessoas por questões econômicas ou por conflitos, surge uma necessidade de gestão e controle de doenças infecciosas em áreas de recepção dos imigrantes. Um trabalho importante tanto na observação e detecção de patógenos que não são comuns do local que recebe essas pessoas como no processo de comunicação do que está sendo detectado. É preciso deixar claro aqui que, sim, existem casos em que uma doença é transportada de outras formas, através de objetos e alimentos de origem animal, por exemplo, mas o potencial é o transporte desses patógenos através de pessoas. Quando viajam, as pessoas levam consigo doenças, mesmo naquele período da janela imunológica, em que a pessoa não apresenta debilidade nem sintomas e estão infectadas. É nesse momento que patógenos viajam, junto com as pessoas e por conta da globalização, mais rápido e mais longe. Pessoas que estão se sentindo mal, não viajam, porém, caso estejam bem, e estiverem infectadas, levarão consigo os patógenos. 15 Figura 5 – Até começarem os sinais clínicos as pessoas mesmo infectadas irão se locomover. Esse tempo até começarem os primeiros sintomas é o que permite a rápida disseminação de doenças Crédito: Tynyuk/Shutterstock. O trabalho epidemiológico para esses casos globalizados deve ser pensado pelos governos da seguinte forma: desenvolvimento de orientações de gestão, particularmente para doenças não endêmicas; acesso a intervenções diagnósticas e terapêuticas para as apresentações clínicas exóticas ou raras; e monitorização da utilização dos serviços de saúde e resultados de saúde, tanto para imigrantes quanto a populações locais (Gushulak; Macpherson, 2004). É necessário que os novos profissionais de saúde saibam das ferramentas modernas capazes de realizar o trabalho epidemiológico globalizado em saúde única, integração de novas fontes de informação molecular e digital na vigilância de doenças, a assimilação de tais dados em modelos de disseminação de patógenos e a crescente contribuição de modelos para a prática de saúde pública. É importante que sejam formados e que sejam capazes de coordenar, executar ações e pôr em prática estratégias para responder com análises, detecção, correlacionar sinais clínicos a microrganismos, abordagens, tratamentos e administração de políticas de vacinação. NA PRÁTICA De forma rápida, como foi todo o trabalho de identificação do SARS-CoV- 2 ao redor do mundo? https://www.shutterstock.com/g/Alexey0210 16 Faça uma análise pelo conceito de saúde única. FINALIZANDO Fique sempre em alerta, pois a saúde única requer um trabalho contínuo. Apesar dos esforços contínuos para melhorar os sistemas de saúde em todo o mundo, as epidemias de patógenos emergentes continuam sendo uma grande preocupação de saúde pública. A resposta eficaz a esses surtos depende de uma intervenção oportuna, idealmente informada por todas as fontes de dados disponíveis. Figura 6 – A coleta de dados é a parte mais importante na compreensão de uma nova doença Crédito: Cryptographer/Shutterstock. Avanços recentes levaram ao surgimento da análise de surtos, mais rápida e eficiente, uma ciência emergente focada nos aspectos tecnológicos e metodológicos modernos, desde a coleta até a análise, modelagem e relatórios para informar a resposta a surtos. https://www.shutterstock.com/g/cryptography 17 REFERÊNCIAS BRASIL. Lei n. 6.259, de 30 de outubro de 1975. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 31 out. 1975. ______. Decreto n. 78.231, de 12 de agosto de 1976. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 13 ago. 1976. ______. Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990. Diário Oficial da União, Seção 1: Brasília, DF, 19 set. 1990. ______. Fundação Nacional de Saúde. Guia de vigilância epidemiológica. 5. ed. Brasília: Funasa, 2002. ______. Secretaria de Vigilância em Saúde. Curso básico de vigilância epidemiológica. Brasília: Ministério da Saúde, 2005a. ______. Portaria n. 30, de 7 de julho de 2005b. Institui o Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde, define suas atribuições, composição e coordenação. Disponível em: <https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/svs/2005/prt0030_07_07_2005.ht ml>. Acesso em: 11 abr. 2022. ______. Secretaria Executiva. Departamento de Apoio à Descentralização. Coordenação-Geral de Apoio à Gestão Descentralizada. Diretrizes Operacionais dos Pactos da Vida, em Defesa do SUS e de Gestão. Brasília: Ministério da Saúde, 2006. ______. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Guia de vigilância epidemiológica. 7. ed. 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Disponível em: <https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prc0004_03_10_2017.html >. Acesso em: 26 abr. 2022. ______. Secretaria de Vigilância em Saúde. Coordenação-Geral de Desenvolvimento da Epidemiologia em Serviços. Guia de Vigilância em saúde: volume único. 2. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2017b. ______. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Coordenação- Geral de Desenvolvimento da Epidemiologia em Serviços. Guia de Vigilância em Saúde: volume único [recurso eletrônico] 3. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2019. ______. Decreto n. 7.616, de 18 de novembro de 2011. Dispõe sobre a declaração de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional - ESPIN e institui a Força Nacional do Sistema Único de Saúde - FN-SUS. Diário Oficial da União, Seção 1: Poder Executivo, Brasília, DF, 18 nov. 2011, p. 14-15. BUSATO, I. M. S. Epidemiologia e processo saúde-doença. Curitiba: InterSaberes, 2016. ______. Planejamento estratégico em saúde. 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