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Pesquisa: Teorias e Fundamentos Graduação Copyright © 2023 Delinea Tecnologia Educacional 3 Introdução Em um tempo e espaço remotos, quando um homem desconhecido friccionou uma pedra na outra em um apanhado de madeira e, de repente, aconteceu algo surpreendente, que mudou a história – fogo, fogo! –, isso teria sido ajuda de algum deus, que interveio aparentemente do nada? Seria uma punição de um ente enfurecido que estava se manifestando através do fenômeno? Seria um acaso? Para que aquilo servia? Foi necessário passarem alguns séculos para se ter um entendimento sobre o que era fogo, suas propriedades e usos, mas, em um primeiro momento, talvez a percepção inicial tenha sido a de que o divino foi a causa do fogo. Ou seriam deuses? Nessa unidade, vamos discutir e caracterizar as noções de conhecimento religioso e conhecimento mítico. Objetivos da aprendizagem • Definir e caracterizar os conhecimentos mítico e religioso. Palavras-chave: mitos, gregos, povos indígenas, dogmas, tipos de conhecimento. Conhecimento mítico e conhecimento religioso Pesquisa: Teorias e Fundamentos 4 Conhecimento mítico e conhecimento religioso: semelhanças e diferenças Os tipos de conhecimento podem ser considerados modos de observar e interagir com o mundo real. Cada um tem suas especificidades, mas eles compartilham um princípio básico: há alguém que observa, o sujeito, e o que está sendo observado, o objeto, a partir do qual se elaboram informações, percepções e variações. Na relação entre sujeito e objeto, estabelece-se uma perspectiva, que é um ponto de vista para dar significado aos acontecimentos. Existem diferentes modos de conhecer o mundo que nos cerca, que variam de acordo com o modo de observar e com os critérios de observação. Neste momento, vamos conhecer mais detalhadamente dois tipos de conhecimento, o mítico e o religioso. Um dos primeiros modos de conhecer partiu da intuição, da observação e da repetição dos acontecimentos com base na experiência, que é o conhecimento mítico. Para Heitor Matallo Júnior, uma das “principais características da visão mítica do mundo é o seu humanismo, pelo qual desejos e vontades são atribuídos à natureza” (CARVALHO, 2021). Nesse sentido, o conhecimento mítico ocorre através de simbolizações do cotidiano e das crenças de uma comunidade em um sistema de divindades que se relacionam com a natureza. O que é mito? O que é mito? Mito é um conjunto de narrativas que elaboram uma cosmovisão sobre o mundo de seres e eventos sobrenaturais. É considerado um dos tipos de narrativa mais tradicionais da cultura de um povo. Exemplos de comunidades – conhecimento mítico Um exemplo são as comunidades indígenas, que vivem há séculos e mantêm vivo o conhecimento ancestral em diferentes regiões do planeta, especialmente no Brasil. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 5 Outro exemplo de comunidade com conhecimento mítico são os gregos, conhecidos pela crença na pluralidade de deuses. Havia a deusa do amor, Afrodite, o deus do trovão, Zeus, o deus do mar, Poseidon, entre vários outros. Apesar da pluralidade, cada deus tem suas particularidades, como as cores, as oferendas, interesses. Por exemplo, por ser a deusa do amor, da sexualidade e das relações com pessoas, Afrodite é a responsável por direcionar os assuntos relacionados ao prazer, à alegria e ao contentamento. Por isso, as ofertas a ela poderiam ser frutas doces, produtos para a beleza e elementos que remetessem às suas características. Os rituais a Afrodite eram feitos no templo dedicado à deusa, na cidade de Afrosidias, para homenageá-la e honrá-la, além de pedir suas benesses e apoio. Um exemplo de tragédia grega: Édipo Rei Édipo Rei é um mito que foi elaborado em uma tragédia por Sófocles. Trata-se da primeira peça de uma trilogia, na qual podemos notar alguns dos valores gregos, como a crença em profecias divinas, a força do destino e a impossibilidade de fugir dele. A imagem a seguir retrata o momento do encontro entre Édipo e a Esfinge – uma criatura horrenda com cabeça de mulher, corpo de leão e asas –, que propõe a ele um enigma. A consequência de não saber a resposta é ser morto, ou responder e escapar da situação. Édipo Édipo foi o único a enfrentar e vencer a Esfinge e, por isso, a cidade de Tebas acaba por agraciá- lo com o trono e a mão da rainha, o que resulta em grande tormento para sua vida. Mito de Édipo – Édipo e a esfinge Fonte: Plataforma Deduca (2023). #ParaTodosVerem: ilustração do mito de Édipo, com um homem sentado com as pernas cruza- das e uma das mãos no queixo. Diante dele, está uma criatura sentada sobre uma coluna. Ela tem corpo de leão, asas e cabeça humana. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 6 O enigma O enigma proposto a Édipo era: qual é o animal que inicia a vida com quatro patas, chega à idade adulta com duas e quando está envelhecido e mais fraco tem três? É o homem, respondeu Édipo Busto de Sócrates, autor da peça de teatro Édipo Rei Fonte: Cultura Genial (2023). #ParaTodosVerem: o busto de Sócrates, feito em mármore. É um homem de barba comprida e cabelo ondulado. No caso dos indígenas, as crenças estabelecidas são passadas de geração em geração através das narrativas míticas, geralmente pelos iniciados (idosos, xamãs etc.) que, ao mesmo tempo em que contam as origens da comunidade, ensinam valores e aprendizados advindos da experiência dos antepassados. Ou seja, há uma continuidade dos saberes, que são elaborados pela comunidade e passados de pai para filho, de avós para netos, de pajé para comunidade. Nesse sentido, conhecer os rios, as águas, as montanhas, as árvores, estabelecer relações e comunicar-se com eles, é essencial para esse tipo de conhecimento. Rios Fonte: Freepik, 2023. #ParaTodosVerem: fotografia de um rio com muitas árvores ao redor. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 7 Essas narrativas têm o propósito de manter viva a tradição cultural, ao formar sujeitos que podem aproveitar as vivências anteriores para a continuidade dos saberes, em que há a manutenção do lugar onde se vive. Em sua origem, os povos indígenas têm como princípio a mobilidade, de acordo com as estações do ano, pois não consideram que precisam estar sempre no mesmo lugar, já que a natureza é abundante e é possível movimentar-se nela. Como exemplo de continuidade dos saberes, há um tipo de árvore próxima da aldeia cuja folha é eficiente para curar dor de barriga. É possível que esse conhecimento, testado e aprovado pelas pessoas há gerações, seja incorporado às memórias ancestrais e passado adiante através do saber coletivo, patrimônio da comunidade. Comunidade reunida com instrumentos musicais Fonte: Plataforma Deduca (2023). #ParaTodosVerem: três indígenas, dois homens e uma mulher, vestidos com roupas típicas, com cocares e colares de penas em uma oca. Os homens estão com instrumentos de sopro. Deve-se também notar o caráter da oralidade para a transmissão desse tipo de conhecimento, que pode ocorrer através da educação e da recitação de poemas e narrativas, repletos de imagens e exemplos. Tanto em rituais quanto no cotidiano, as informações vão sendo assimiladas pelo ritmo, pela repetição e pela entonação que é dada a cada história, o que facilita a memorização e a provável repetição das informações no futuro para as crianças. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 8 Dois autores para entender o conhecimento mítico no Brasil contemporâneo Ailton Krenak O autor tem discutido o desenvolvimento da ciência e da tecnologia. Ideias para adiar o fim do mundo (2020) é um compilado de textos que apresentam a visão de mundo pela etnia crenaque. Davi Kopenawa e Bruce Albert A queda do céu (2015), escrito durante vinte anos por um antropólogo francês e um xamã, dá conta da visão de mundo indígena e convida os leitores a ingressarem nas narrativas ancestrais do povo yanomami. Aldeias Fonte: Freepik (2023). #ParaTodosVerem: uma oca verde e bege, e outra laranja e bege, feitas em lona e cerca-das por porções de grama. Com a atuação do pajé, geralmente um dos habitantes mais antigos da aldeia que serve como um iniciado aos mistérios, há a manutenção dos conhecimentos e das tradições ancestrais de alimentos, plantas e remédios naturais, adquiridos através de séculos. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 9 Outro conhecimento é o religioso, relacionado com a crença de que existe um ente superior, espíritos ou um mistério para além da matéria. As religiões se pautam pela leitura dos livros sagrados, ao qual buscam seguir, pois seria uma lei vinda do divino. Geralmente, esse tipo de conhecimento, movido pela fé e pela transcendência (APPOLINÁRIO, 2012) e parte de dogmas, crenças fundamentais que não são questionáveis e servem como maneira de justificar como o mundo funciona, ao estabelecer uma visão do mundo. Desse modo, toda religião parte de crenças que não podem ser questionadas e testadas, pois não há como comprovar sua validade. Não há como comprovar que um espírito conversou com uma pessoa, embora haja tentativas de validar cientificamente a crença. Nessa situação, ou acreditamos ou não. Dois exemplos de dogmas são acreditar que existe uma vida após a morte ou que anjos e santos existem. Para o pensamento religioso, quando uma pessoa tem um pedido impossível ou difícil de conseguir, é possível fazer uma promessa para um santo. Se o divino considerar que o fiel agiu bem durante o tempo em que se comprometeu e deve ter a graça atendida, haverá uma dívida a ser paga que apenas o fiel sabe. Revelação divina como forma de conhecimento Para o conhecimento religioso, a revelação divina é uma das maneiras de conhecer o mundo e seu funcionamento. Através dela, é possível estabelecer uma conexão entre ações humanas e planos divinos. Mulher exercendo sua fé Fonte: Freepik (2023). #ParaTodosVerem: mãos entrelaçadas em frente a uma Bíblia de capa azul aberta. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 10 Para Cervo, Bervian e Silva (2007), “O conteúdo da revelação, feita a crítica dos fatos ali narrados e comprovados pelos sinais que a acompanham, reveste-se de autenticidade e de verdade”. Um sonho ou uma visão podem ser modos de revelação do futuro, a partir de sinais que se revelam e estabelecem uma ligação com o sistema de crenças. Já a epifania se relaciona com a compreensão súbita de algo, inspirada pelo divino através da liturgia, que não havia sido percebido antes. Uma semelhança entre os dois tipos é que tanto conhecimento mítico quanto conhecimento religioso partem de um sistema de crenças e do exercício de rituais. No caso do conhecimento mítico, os rituais estão relacionados às divindades e à natureza e mantêm a comunidade pela tradição. Já para o conhecimento religioso, o ritual é uma liturgia, em que há vários momentos para o culto à divindade, e varia de religião para religião. Por exemplo, um dos rituais do Rosh Hashana, festividade que marca o Ano Novo para os judeus, é o toque do Shofar, um instrumento de sopro feito do chifre de carneiro, para despertar a alma para o arrependimento pelas más ações feitas no ano anterior, e o consumo de frutas e alimentos doces, para que o ano seja repleto de bons acontecimentos. Outro ritual é o Ramadã, que é o nono mês do calendário islãmico, em que há uma série de jejuns do dia até a noite e festas noturnas. Há diversos outros exemplos, mas o que precisa ser ressaltado é que, por meio dos rituais, há uma conexão com o divino. Lakatos e Marconi fazem uma síntese sobre as características do conhecimento religioso: Conhecimento religioso Conhecimento teológico (ou religioso) Valorativo Inspiracional Sistemático Não verificável Exato Fonte: Lakatos e Marconi (2017). Pesquisa: Teorias e Fundamentos 11 O conhecimento mítico pode ser entendido com os mesmos critérios propostos por Lakatos, pois a natureza da investigação é parecida. Por outro lado, uma diferença importante entre conhecimento mítico e religioso é que, embora ambos sejam baseados em crenças, o mítico está relacionado a narrativas ancestrais, que se atualizam com a experiência. Já o conhecimento religioso está, em sua maior parte, pautado em livros sagrados escritos há muitos séculos e tem menos modificações com o passar do tempo, pois os dogmas não se modificam. Embora haja diferentes interpretações do texto sagrado, o que origina a proliferação de diferentes vertentes religiosas, todas elas mantêm os dogmas, que podem ser observados de maneira mais rigorosa ou mais moderna, a depender da interpretação. Normalmente, quando falamos a palavra “conhecimento”, pensamos na ciência e em bibliotecas repletas. Nesse sentido, é importante saber que, embora o conhecimento científico tenha grande importância, ele não é o único possível. Como dito antes, o conhecimento é uma produção a partir da relação entre sujeito e objeto. Assim, ainda que os dois tipos de conhecimentos abordados nesta unidade tenham estratégias de investigar diferentes do conhecimento científico, eles são válidos em sua observação dos acontecimentos. No entanto, não podemos colocá-los como mais ou menos verdadeiros do que a ciência ou a filosofia, por exemplo. Deve-se ter em conta que na ciência não se colocam as questões metafísicas nem a filosofia parte de um sistema de crenças fixo, pois é de sua natureza questionar o que está posto. Por isso, deve-se ressaltar o fato de que cada conhecimento tem seus objetos e métodos, que não podem ser comparados entre si, pois há preocupações diferentes que o guiam. A ciência não pode se pautar pela fé, nem a fé deve se pautar pela reflexão metafísica, nem a reflexão metafísica precisa considerar mitos para suas reflexões. Ainda assim, cada um dos tipos de conhecimento continua válido. Talvez você tenha mais afinidade com um do que com o outro e está tudo bem, pois somos seres individuais. É importante a compreensão de que os conhecimentos coexistem e alguns são mais adequados a certas finalidades do que outros. Ao perder um parente próximo, você provavelmente não vai a um laboratório para se conformar com sua perda. Ou, ao ter uma gripe, não vai procurar um filósofo. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 12 Saiba mais Para saber mais, assista ao vídeo A consciência mítica (sobre o mito grego e sua conexão com a Filosofia), de Marcos Ramon, que aborda o mito grego e sua relação com a filosofia e o conhecimento. RAMON, M. A consciência mítica (sobre o mito grego e sua conexão com a Filosofia). Disponível em: https://youtu.be/Rh7CTZ3kxn0. Acesso em: 10 ago. 2023. Dica de leitura Para que você possa conhecer o pensamento mítico e estabelecer relações com a ciência, leia o artigo: A relação entre mito e ciência: o sentido do conhecimento, no qual os autores discorrem sobre três pontos importantes, a saber: • Relação entre mito e cientista. • Conceitos e funções dos mitos. • O que o mito tem a dizer sobre o conhecimento. PICOLLI DA SILVA, A. L.; RAMOS, A. de R. A relação entre mito e ciência: o sentido do conhecimento. Revista Diaphonia, v. 6, n. 2, p. 175–182, 2020. Disponível em: https://e-revista.unioeste.br/index.php/diaphonia/ article/view/26680. Acesso em: 12 jul. 2023. https://youtu.be/Rh7CTZ3kxn0 https://e-revista.unioeste.br/index.php/diaphonia/article/view/26680 https://e-revista.unioeste.br/index.php/diaphonia/article/view/26680 Pesquisa: Teorias e Fundamentos 13 Conclusão Como foi visto, o conhecimento mítico e o conhecimento religioso compartilham pontos em comum e algumas diferenças entre si. O conhecimento mítico está baseado nos mitos e na relação com a natureza e é compartilhado e transmitido de geração em geração pela comunidade e pelo xamã. Já o conhecimento religioso tem base na fé, nos dogmas e nas escrituras. Há também a crença na transcendência para além da matéria. Os dois tipos de conhecimento são modos de se relacionar com o mundo e, nesse sentido, um não pode ser considerado melhor ou pior que o outro. Comparação entre conhecimento mítico e religiosoTipo de conhe- cimento Base Forma de aquisição Validação Transmissão Mítico Crença Narrativas míticas Tradição Rapsodos Religioso Crença (fé) Escrituras Dogmas Teólogos/Líderes religiosos Fonte: adaptado de Toda Matéria (s.d.). Na tabela, há uma comparação entre conhecimento mítico e conhecimento religioso. Ao aproximá-los, pode-se notar que a principal diferença entre um e outro são as fontes das crenças. Enquanto o conhecimento mítico está relacionado com a natureza, o meio ambiente e a visão de mundo dos povos, o conhecimento religioso possui dogmas presentes nos livros sagrados. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 14 Referências APPOLINÁRIO, F. Metodologia da ciência: filosofia e prática da pesquisa. 2. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2012. CARVALHO, M. C. M. (org.). Construindo o saber: Metodologia científica – Fundamentos e Práticas. Campinas: Papirus, 2021. CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A.; SILVA, R. Metodologia científica. 6. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007. LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Fundamentos de metodologia científica. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2017. Referências complementares Referências iguais ao Plano de Ensino conforme ABNT 6023. ALBERT, B.; KOPENAWA, D. A queda do céu. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. KRENAK, A. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2020. MENEZES, P. Tipos de conhecimento. Toda Matéria, [S.d.]. Disponível em: https:// www.todamateria.com.br/tipos-conhecimento/. Acesso em: 13 jul. 2023. https://www.todamateria.com.br/tipos-conhecimento/ https://www.todamateria.com.br/tipos-conhecimento/ 15 Conhecimento artístico e filosófico Introdução Ao ouvir a melodia de um piano ao vivo, já sentiu um arrepio percorrendo sua pele e um súbito momento de emoção inesperada? Já esteve em um museu repleto de expressões artísticas, como esculturas, pinturas e instalações e sentiu, de alguma maneira, que o lugar também se comunica por meio de suas paredes e corredores e é fundamental para a percepção das obras? Ou, ainda, já viu uma peça de teatro, riu em momentos e se divertiu com os gracejos dos atores? Todas as perguntas anteriores se relacionam com atividades artísticas, expressas através de diferentes linguagens, na confecção de objetos ou em práticas que evidenciam algum valor estético. Isso é o que chamamos de conhecimento artístico, que mobiliza a sensibilidade dos artistas e das pessoas que apreciam as artes. Por outro lado, há um tipo de conhecimento de natureza diversa, rigoroso e racional, que é o conhecimento filosófico. Em algum momento durante sua escolarização, você deve ter sido convidado a pensar sobre o sentido da vida, sobre o que é amar ou ainda sobre o que é certo e errado. Esses são temas que se relacionam ao ato de filosofar, o amor ao saber, em que as perguntas são tão importantes quanto as respostas. Esse tipo de conhecimento permeia todos os outros ao sistematizá-los e refletir sobre a produção de conhecimento humano em diferentes tempos e espaços. Ao longo das próximas páginas, vamos definir e caracterizar o conhecimento artístico e filosófico. Objetivos da aprendizagem • Definir e caracterizar os conhecimentos artístico e filosófico. Palavras-chave: arte, intertextualidade, filosofia, epistemologia, tipos de conhecimento. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 16 Dois tipos de conhecimentos distintos: conhecimento artístico e conhecimento filosófico Na unidade anterior, falamos de dois tipos de conhecimentos: o mítico e o religioso, baseados em crenças que podem ser dogmáticas ou tradicionais. Para dar prosseguimento à apresentação dos tipos de conhecimento, vamos abordar o conhecimento artístico e o conhecimento filosófico. De modo geral, o conhecimento artístico se relaciona com a estética, a criatividade e a imaginação, tanto do artista, que age para compor, quanto do observador, que aprecia a obra. Por isso, esse tipo de conhecimento depende da subjetividade do sujeito e das capacidades do sujeito se relacionar com as diferentes materialidades. Música, dança, desenho, pintura, escultura, teatro, fotografia, ilustração, cinema, literatura… são várias as expressões artísticas, de modo que é possível conhecer essa forma de investigar o mundo através da fruição e da apreciação das manifestações artísticas. Para Appolinário (2012), o conhecimento artístico tem como base a emoção e a intuição, o que se relaciona, por exemplo, com a sensação de não conseguir colocar em palavras todas as sensações que uma obra de arte evoca e, nesse sentido, tanto a obra quanto a observação são fonte inesgotável de significados. Vamos supor que, se você e seu amigo assistirem a um filme, embora uma história esteja sendo mostrada, é bastante provável que os dois tenham diferentes impressões sobre ela. Por isso, nenhum estará errado, pois qualquer obra artística tem como pressuposto de leitura a existência de múltiplos significados. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 17 Pintura: um exemplo de expressão artística Fonte: Freepik, (2023). #PraTodosVerem: fotografia da ponta de um pincel selecionando tinta em suporte com tintas de cores diversas. Embora as artes sejam plurais, cada uma tem um suporte específico. Seja a voz, o som, o gestual, a tinta, as palavras, todos têm suas especificidades, sua linguagem, seus repertórios. Alguns são impressos, outros falados, outros encenados. O livro é um suporte material, enquanto que a voz é um suporte sonoro, e cada suporte interfere na maneira como nos relacionamos com as obras. Por isso, deve-se levar em consideração o fato de que a obra de arte não pode ser transportada de um suporte para outro sem que haja a perda e/ou a reelaboração de sentidos. Por vezes, diferentes obras dialogam entre si, seja pela abordagem do mesmo tema, pela similaridade dos recursos utilizados, ou por terem sido feitas no mesmo momento histórico. Você já viu a imagem da Monalisa, de Leonardo Da Vinci? Há várias releituras que podem ser pesquisadas. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 18 Duchamp - L.H.O.O.Q Em 1919, Marcel Duchamp fez sua própria releitura do quadro, com a pintura “L.H.O.O.Q.”, em que a mulher retratada foi acrescida de bigode. Monalisa de Duchamp Fonte: Singulart (2020) #ParaTodosVerem: fotografia do quadro Monalisa de Duchamp. Monalisa de Botero Em 1959, foi pintada outra versão por Fernando Botero, em que a mulher é retratada como obesa, conforme o estilo do autor colombiano. Monalisa de Botero Fonte: Pubic Delivery (s/d). #PraTodosVerem: fotografia do quadro Monalisa de Botero. Antes de comentarmos a obra, cabe perguntar: essa é a Monalisa? Na imagem, vemos o retrato baseado na obra de Da Vinci, mas há uma diferença. Um pequeno bigode e um cavanhaque se salientam na imagem. Nessa versão, trata-se de um homem ou uma mulher? Para responder à primeira pergunta, note que, ao modificar algum elemento da obra, essa já não é mais a Monalisa, mas sim um comentário sobre ela, que amplia o sentido da obra, ao mesmo tempo que estabelece uma relação com a anterior. Deve-se ressaltar também um certo humor entre uma e outra, pois a releitura evidencia um comentário sobre Leonardo Da Vinci. Nessa segunda releitura, pode-se imediatamente perceber as diferenças entre a obra de Da Vinci ou ainda a de Duchamp. A mulher retratada tem traços redondos, não completamente realistas, ao mesmo tempo em que as roupas, as cores e o cenário Pesquisa: Teorias e Fundamentos 19 remetem à Monalisa original, embora com algumas diferenças. Note também que os olhos são desproporcionais ao rosto e que o cenário tem uma cor mais viva. Deve-se apontar que o artista pintou várias releituras do quadro de Da Vinci, em releituras com a personagem em idades distintas, sendo essa a mais famosa. O exemplo das releituras acima mostra que pode haver um diálogo entre obras, pois, ao colocar uma modificação (no estilo, nas cores, na abordagem etc.), há uma atualização de seus significados. Ao mesmo tempo, não seria possívelentender a atualização em toda sua possibilidade de significações se não conhecêssemos a obra original. Esse fenômeno entre obras é chamado intertextualidade, e ocorre também na música, na pintura, na literatura, no cinema, entre outros. No cinema, diretores costumam recorrer a seus filmes prediletos e geralmente compõem cenas inspiradas em frames, em que as cores e a montagem do cenário evocam outros filmes, de outras épocas. Um exemplo disso são os filmes do diretor Quentin Tarantino, que realiza seus filmes a partir de inspirações como quadrinhos, cultura japonesa, faroeste, gangsters, entre outros. Alguns de seus filmes, como Bastardos inglórios (2009), utiliza o recurso de dividir as cenas em capítulos que, a partir de ilustrações, remetem imediatamente ao gênero HQ, ou ainda Pulp fiction (1994), que utiliza uma diversidade de fontes, como filmes de detetives. Paráfrase Paráfrase é a produção de um texto/objeto com características similares ao texto modelo e poucas alterações no sentido, embora possa ter características distintas do original. Paródia A paródia tem o caráter de se apropriar das características básicas de uma obra e suas principais ideias para conferir outro sentido, que geralmente é oposto ao da primeira. Pastiche Imitação de um gênero ou estilo de um autor sem a intenção de ironizar ou questionar o modelo. No pastiche, há uma extrapolação dos sentidos propostos na obra em que foi baseado. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 20 Um exemplo de paráfrase são as traduções do poema O corvo, do escritor americano Edgar Allan Poe. Este poema foi traduzido por Fernando Pessoa, Machado de Assis, Gondin da Fonseca, entre muitos outros tradutores. Embora trate-se do mesmo poema, cada um dos tradutores fez escolhas diferentes para as palavras, o que interfere no ritmo e na métrica. Ainda assim, a tradução se refere ao mesmo poema e não tem nenhuma intenção de modificar os sentidos da obra. Quando o autor parafraseia o original de modo que há um estilo próprio, ainda que as ideias permaneçam mais ou menos parecidas, há um subtipo de paráfrase. Esse fenômeno é chamado de estilização. Conhecimento Fonte: Freepik, 2023. #ParaTodosVerem: ilustração de uma pilha de livros com capas de cores diversas. Apoiadas nessa pilha, há cinco escadas também de cores diversas. Na literatura, um exemplo de paródia é Dom Quixote, que foi escrito por Miguel de Cervantes a partir das características estilísticas do modelo de romances de cavalaria, muito populares em sua época. No entanto, ao retomar o modelo, o romance de Cervantes tem outros significados que o ironizam. Um exemplo de pastiche é Orgulho e preconceito e zumbis, inspirado na obra de Jane Austen. Embora o universo ficcional da Inglaterra do século XIX se mantenha, a mudança para o universo zumbi propõe novos significados para a trama. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 21 Decorrente disso, há também a discussão sobre originalidade e cópia, em que alguns autores entendem que não existe originalidade per se e que toda expressão artística, em alguma medida, maior ou menor, é cópia. Nesse sentido, deve-se investigar de que modo as apropriações acontecem e em que medida elas são originais, pois nem todo autor pode imitar outro da mesma maneira, há sempre peculiaridades. Sobre as características do conhecimento artístico, Appolinário também considera o conhecimento artístico como não racional e difícil de ser capturado pela lógica. São muitas as percepções sobre o objeto artístico. Para os estudiosos da arte, uma parte acredita que a expressão artística pode se relacionar com o contexto social em que ela foi elaborada. Outra linha de pensamento acredita que a arte não tem qualquer vínculo com o real e está isenta de compromissos. O único compromisso da arte, para esse modo de analisar, é a estética por si mesma. Outro tipo de conhecimento é o filosófico. Para Cervo, Bervian e Silva (2007), o conhecimento filosófico se caracteriza através do “objeto de investigação e pelo método”. Quando falamos de filosofia, podemos lembrar de Sócrates e seu modo de fazer filosofia, a maiêutica, que se aproxima de um parto de ideias e ideais através de sucessivas tentativas de chegar ao núcleo do argumento, para aceitá-lo ou derrotá-lo. Em um exercício de imaginação, pode-se até pensar em um senhor nas redondezas da praça de Atenas, por horas, à espera de alguém que estivesse à procura de dialogar. Ou podemos lembrar ainda de Aristóteles e seus importantes trabalhos sobre temas diversos, como política, ética, metafísica e lógica. O que poderia unir áreas tão diferentes, à primeira vista? Para responder a essa questão de maneira provisória, pode-se dizer que o método de investigação delas é o uso da razão para analisar dados abstratos. Três exemplos de temas filosóficos contemporâneos Conhecimento teológico (ou religioso) Fake news e a pós-verdade Bioética e limites éticos na pesquisa Interações digitais e Filosofia da Tecnologia Fonte: adaptado de Fundação Telefônica Vivo (2020). Pesquisa: Teorias e Fundamentos 22 Para Mascarenhas (2018), a filosofia “inclui e orienta ao mesmo tempo várias áreas do conhecimento” (2018, p. 23), isto é, embora seja um tipo de conhecimento específico, é a disciplina que pensa por excelência sobre princípios, métodos e avanços das áreas de conhecimento científico. O que é epistemologia? A epistemologia é uma área da filosofia que investiga a gênese, o estabelecimento e a mudança das ideias ao longo do tempo. Há a epistemologia da ciência, da educação, da arte, entre outras. Origem da palavra epistemologia A palavra epistemologia se divide em duas: episteme, do grego, conhecimento, e logos, a ciência. Ou seja, a epistemologia é a ciência do conhecimento. Gênese do termo Na Grécia, usavam-se duas palavras para falar sobre o modo de conhecer: a episteme e a doxa. Doxa versus episteme A doxa era aproximada da opinião, do senso comum. Era um conhecimento sem muito esforço, pouco qualificado ou refinado. Já a episteme era o conhecimento científico, refletido e confrontado com outros. Nesse sentido, Cervo, Bervian e Silva (2007) entendem que o objeto de conhecimento da filosofia se constitui por realidades mediadas, ou seja, realidades que são mediadas por outra materialidade que não a coisa em si. Dito de outro modo, para a filosofia, é necessário se aproximar do objeto por meio de uma observação parcial dos fenômenos através da linguagem. Assim, não é possível chegar à totalidade do objeto, pois não se pode obtê-lo. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 23 Filosofia: ato de pensar o pensamento Fonte: Freepik (2023). #ParaTodosVerem: ilustração com duas mãos segurando, cada uma, a ponta de um barbante que está emaranhado, como representação do fluxo de pensamento. Disso pode-se compreender que tais realidades, mediadas pelas palavras, são imperceptíveis aos sentidos físicos. Essa é uma das diferenças entre ciência e filosofia que, apesar de se pautarem na primazia da razão, não compartilham o modo de verificar seus resultados. Na ciência, frequentemente, os experimentos podem ser repetidos para verificar os acertos, as falhas e chegar a conclusões exatas. Na filosofia, cada investigação é única, embora não seja feita de maneira amadora. Sempre há uma recuperação do que já foi feito sobre determinado objeto de investigação mas, pelo objeto ter sempre uma mediação, o modo proposto de observá-lo para a análise pode ser diferente dos anteriores, ainda que por vezes baseado nos textos dos mesmos autores. Percebe-se também a importância das palavras e de seu significado para a investigação filosófica. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 24 Lógica A lógica é uma área da filosofia em que há sentenças lógicas, deduções da teoria matemática de conjuntos, que permite avaliar a força dos argumentos em termos de validade ou falsidade. Hermenêutica Área da filosofia, com relação com a literatura e as artes, que estuda a interpretaçãoa partir de materialidades textuais. Outra característica do objeto do conhecimento filosófico é ser de ordem suprassensível, o que ultrapassa a experiência. Diferente da ciência, em que os fenômenos podem ser verificados por experimentos, a filosofia lida com ideias que não podem ser reproduzidas, isto é, se uma pessoa pesquisar um objeto que já foi pesquisado antes, é improvável que a observação seja a mesma, embora haja pontos de contato entre as percepções do fenômeno observado. Comparação entre conhecimento artístico e conhecimento filosófico Conhecimento artístico Conhecimento filosófico Valorativo Valorativo Inspiracional Racional Não-sistemático Sistemático Não-verificável Não-verificável Não se aplica Exato Fonte: Adaptado de Lakatos e Marconi (2017). Diferente dos conhecimentos mítico e religioso, o conhecimento artístico é distinto do conhecimento filosófico. Embora ambos não sejam verificáveis e compartilhem a característica de serem valorativos, a filosofia utiliza a razão para a avaliação das questões, o que inclui estratégias racionais para chegar às respostas e que tem como característica a exatidão dos resultados, embora não sejam os únicos possíveis. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 25 Diferentes tipos de conhecimento Fonte: Freepik, 2023. #pratodosverem: ilustração mostra o desenho de um rosto humano de perfil. O cérebro forma o desenho de uma lâmpada acesa. O conhecimento artístico, por outro lado, está mais interessado no que a obra pode evocar do observador, e inclui a subjetividade na criação de sentidos, que são múltiplos. Na feitura da obra, o artista alia a inspiração com diversas técnicas ao realizar seu trabalho. Por exemplo, é bastante difundida a percepção de que o autor, quando escreve um texto literário, precisa estar inspirado. Essa ideia é ligada ao Romantismo, que buscava a individualização do autor. No entanto, embora o conhecimento artístico seja inspiracional, isso não significa que os processos de composição sejam completamente fruto da inspiração (sem trabalho objetivo). O momento de iluminação em certos casos pode existir, mas não é a única fonte para a produção de obras artísticas. Isso vale também para outros suportes, pois há trabalho massivo por trás de um espetáculo de teatro, cinema, música etc. Pode-se dizer também que a filosofia é uma das áreas do conhecimento que abrange todas as outras, pois nela são elaboradas discussões sobre a natureza dos conhecimentos. Há a filosofia da ciência, a filosofia da arte, filosofia política, entre outras, em que são sistematizadas as reflexões sobre as áreas do conhecimento como um todo. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 26 Saiba mais Para saber mais, assista ao vídeo Como a arte influencia sua vida (sem você perceber!), de Mika Serur, que aborda a importância da arte no cotidiano e apresenta vários exemplos. SERUR, M. Como a arte influencia sua vida (sem você perceber!). Disponível em: https://youtu.be/BHM65hsbiPo. Acesso em: 10 ago. 2023. Dica de leitura Para que você possa entender mais a relação entre filosofia e ciência, leia o artigo Por que a filosofia é importante no ensino de ciência nas universidades, da professora americana Subrena E. Smith, que discorre sobre quatro pontos importantes, a saber: • Conexão entre filosofia e ciência. • Apropriação de questões filosóficas para questionar e aprimorar o método científico. • Impressões erradas que estudantes universitários têm da filoso- fia. • Quatro razões pelas quais a filosofia costuma ser dissociada da ciência pelos estudantes. SMITH, S. E. Por que a filosofia é importante no ensino de ciência nas universidades. Folha de São Paulo, São Paulo, 29 jun. 2018. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2018/06/por-que-a-filosofia-e- importante-no-ensino-de-ciencia-nas-universidades.shtml. Acesso em: 15 jul. 2023. https://youtu.be/BHM65hsbiPo https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2018/06/por-que-a-filosofia-e-importante-no-ensino-de-ciencia-nas-universidades.shtml https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2018/06/por-que-a-filosofia-e-importante-no-ensino-de-ciencia-nas-universidades.shtml Pesquisa: Teorias e Fundamentos 27 Conclusão Por meio do que foi discutido, destacamos algumas das principais características de dois tipos de conhecimento: o artístico e o filosófico. Lançando mão de exemplos de obras artísticas, como os quadros da Monalisa, a referência a filmes e livros, buscamos caracterizar o conhecimento artístico como subjetivo, inspiracional, e ressaltar o valor da criatividade para a recepção dos objetos e práticas artísticas. Percebemos também que a exatidão está fora do escopo desse tipo de conhecimento, embora a razão seja utilizada para a criação artística, em uma articulação entre razão e inspiração. Buscamos também destacar o conhecimento filosófico, suas características, como o uso da razão e da exatidão, e a existência de uma área da filosofia responsável por entender a produção dos conhecimentos, a epistemologia. Vimos a importância da mediação entre objetos de reflexão e a importância da linguagem para que ocorra a relação entre objeto e sujeito. Ao mesmo tempo, entendemos por que o conhecimento filosófico não é verificável, dada a natureza suprassensível dos objetos investigados. Assim, foi possível compreender esses dois tipos de conhecimento, ao caracterizar suas peculiaridades e diferenças. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 28 Referências APPOLINÁRIO, F. Metodologia da ciência: filosofia e prática da pesquisa. 2. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2012. CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A.; SILVA, R. Metodologia científica. 6. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007. LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Fundamentos de metodologia científica. 8. ed. São Paulo : Atlas, 2017. MASCARENHAS, S. A. Metodologia científica. 2. ed. São Paulo: Pearson, 2018. Referências complementares Filósofos do século XXI “traduzem” conceitos e teorias para exemplos do dia a dia. Disponível em: https://www.fundacaotelefonicavivo.org.br/noticias/ filosofos-do-seculo-xxi-traduzem-conceitos-e-teorias-para-exemplos-do-dia- a-dia/. Acesso em: 10 ago. 2023. SANT’ANNA, A. R. Paródia, Paráfrase & Cia. São Paulo: Ática, 2004. https://www.fundacaotelefonicavivo.org.br/noticias/filosofos-do-seculo-xxi-traduzem-conceitos-e-teorias-para-exemplos-do-dia-a-dia/ https://www.fundacaotelefonicavivo.org.br/noticias/filosofos-do-seculo-xxi-traduzem-conceitos-e-teorias-para-exemplos-do-dia-a-dia/ https://www.fundacaotelefonicavivo.org.br/noticias/filosofos-do-seculo-xxi-traduzem-conceitos-e-teorias-para-exemplos-do-dia-a-dia/ 29 Conhecimento e letramento científico Introdução A partir do que vimos sobre os tipos de conhecimento, podemos discutir e caracterizar as peculiaridades do conhecimento científico e explicitar os procedimentos que tornam científico um estudo. Veremos com mais detalhes o que é a ciência, suas origens e como são feitos estudos científicos. Em seguida, vamos abordar a questão do letramento científico e usar um exemplo para ilustrar a importância de adotar uma postura cética em relação aos dados de pesquisas divulgadas na mídia. Por último, elaboramos uma breve discussão sobre informação e conhecimento, uma vez que é necessário diferenciar um do outro pois, com o acesso ao grande fluxo de informações disponibilizadas na internet todos os dias, deve-se ter discernimento para diferenciar fatos e mentiras. Objetivos da aprendizagem • Definir e caracterizar o conhecimento científico e a ciência moderna: as- pectos históricos e o fundamento da verdade científica. Palavras-chave: conhecimento científico, indução, dedução, letramento científico, tipos de conhecimento. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 30 Conhecimento e letramento científico: uma discussão sobre o fazer científico e a popularização da ciência Ao navegar pelo YouTube, talvez você tenha clicado em algum vídeo no feed que aponta categoricamente que “x não é ciência” ou“y não é ciência”. Mas, afinal, o que é ciência? O conhecimento científico consiste na elaboração de hipóteses e teorias, que se aperfeiçoam com o passar do tempo e que podem ser aceitas ou refutadas com a sequência de testes. Ou seja, caso seja realizado um teste com os devidos parâmetros de imparcialidade e qualidade, qualquer teoria pode ser refutada, o que significa que sua validade é datada. A ciência como a conhecemos não é dessa maneira desde o início dos tempos, embora conhecimentos de matemática, astronomia, física e química tenham sido descobertos e investigados na Grécia, na Babilônia, no Egito antigo e em outras regiões. Ciência Para Mascarenhas (2018), a ciência foi concebida entre os séculos XV e XVI, a partir de um momento histórico em que aconteceram várias descobertas, como as grandes navegações, que possibilitaram o desenvolvimento de tecnologias até então desconhecidas. Navegações Fonte: Freepik, 2023. #pratodosverem: ilustração de uma caravela, representando o período das navegações. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 31 Durante o Renascimento, estimulado pelo desenvolvimento das cidades e pela gradual substituição do sistema feudal para o sistema mercantil, houve uma primavera das artes e dos conhecimentos. Esse momento histórico que envolve dois séculos, ficou conhecido como revolução científica. Houve a valorização da investigação em detrimento das justificativas dadas pela fé religiosa, que também é retratada na arte, na pintura e escultura de corpos com detalhes realistas, o que era impensável na Idade Média. Isso também acontecia nas pesquisas de cunho científico, com a investigação dos corpos, das propriedades dos materiais e das invenções científicas, em que foram abandonadas as explicações divinas e partiu- se para uma investigação do universo e da materialidade por ela mesma. Para Mascarenhas (2018), um dos principais objetivos dos intelectuais desse momento era tornar a investigação científica imparcial e objetiva. Isso fica explícito em Discurso do método (1637), em que René Descartes elabora procedimentos matemáticos e lógicos para a investigação de questões científicas, o que ficou conhecido posteriormente como cartesianismo. Descartes e outros nomes, como Francis Bacon, Galileu Galilei, Nicolau Copérnico, foram os responsáveis pela criação do método experimental, que prevê um conjunto de experimentos em um ambiente controlado em que o pesquisador conheça os fatores envolvidos. Com a execução da investigação, haverá evidências científicas, que podem ser repetidas por outros cientistas nas mesmas condições, para validar ou refutar a hipótese inicial. Para Lakatos e Marconi (2017), as ciências possuem: a) objetivo ou finalidade – toda pesquisa deve buscar uma explicação (leis gerais ou características comuns) para os eventos; b) função – toda pesquisa deve contribuir, em maior ou menor medida, com o acervo das áreas de conhecimento e servir para conhecer e/ou aprimorar a relação entre as pessoas e o mundo; c) objeto – toda pesquisa tem seu objeto, que pode ser material ou formal. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 32 Divisão das áreas da ciência Fonte: Lakatos e Marconi (2017, p. 94) #ParaTodosVerem: esquema da divisão das áreas da ciência segundo Lakatos e Marconi. É comum ouvirmos de vez em quando a expressão quebra de paradigma. O conceito de paradigma foi proposto por Thomas Kühn em Estrutura das revoluções científicas (1962). Paradigma A ciência avança a partir dos paradigmas, que são descobertas científicas reconhecidas e legitimadas universalmente pelas comunidades científicas. Ciência: processo de construção e ruptura de paradigmas Fonte: Freepik (2023). #ParaTodosVerem: ilustração colorida com elementos que remetem à ciência, como tubos de ensaio, sequências de DNA e cadernos. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 33 Quebra de paradigma As quebras possibilitam uma reavaliação sobre o que vai permanecer e o que precisa ser repensado. Rearticulação dos conhecimentos a partir da ruptura do paradigma vigente Fonte: Freepik (2023). #ParaTodosVerem: ilustração que remete a redes neurais, com fundo azul escuro, uma trama em azul mais claro e pontos brancos nas conexões dessa trama. Nesse sentido, a partir do estabelecimento dos paradigmas, são determinados problemas, métodos e soluções recorrentes para as questões da época. Assim, quando ocorre uma fratura, por uma descoberta que rompe com os padrões anteriores, acontece uma quebra de paradigma, o que implica a necessidade de rever teorias, métodos, hipóteses e soluções possíveis. Em nível menor, pode-se afirmar que cada área do conhecimento tem suas rupturas de paradigmas, que promovem a renovação na área. Conhecimento científico Fonte: Freepik, 2023. #pratodosverem: a ilustração de fundo azul mostra um tubo de ensaio com um líquido vermelho dentro; uma cartela de comprimidos; uma lâmina com bactérias; uma caneta e uma prancheta, com uma cruz vermelha no papel. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 34 O conhecimento científico é produzido também a partir da articulação entre formas de raciocínio e sua relação com os objetos de pesquisa. Para Cervo, Bervian e Silva (2007), “O método científico aproveita a observação, a descrição, a comparação, a análise e a síntese, além dos processos mentais da dedução e da indução, comuns a todo tipo de investigação, quer experimental, quer racional.”. Para entender os processos mentais envolvidos na investigação e interpretação de dados, devemos conhecer os quatro tipos de raciocínio utilizados para isso: Quatro tipos básicos de raciocínio Tipos de raciocínio Indução Dedução Intuição Inferência Fonte: adaptado de Cervo, Bervian e Silva (2007). Conforme Cervo, Bervian e Silva (2007), a indução é um modo de pensar que considera uma analogia cuja conclusão está para as premissas como o todo está para as partes. Baseando-se nisso, a indução tem por fundamento quatro princípios: 1. A natureza é regida por leis. 2. As causas atuam de maneira uniforme. 3. As mesmas causas produzem os mesmos efeitos. 4. Toda relação de causa e efeito é constante. Para entender o raciocínio a partir da indução, consideremos um exemplo de Alan Chalmers (2014, p. 29-30): 1. Água razoavelmente pura congela a cerca de 0 °C (se for dado tempo suficiente). 2. O radiador de meu carro contém água razoavelmente pura. 3. Se a temperatura cair abaixo de 0 °C, a água no radiador de meu carro vai congelar (se for dado tempo suficiente). Pesquisa: Teorias e Fundamentos 35 Perceba que, nesse exemplo, há as premissas 1 e 2, que são aceitáveis para a vida real. A partir da validade das duas, a premissa 3 será verdadeira. Esse tipo de raciocínio parte de premissas observadas nos fenômenos e, ao contrário do que pode parecer à primeira vista, é a experiência que orienta a investigação indutivista e não a lógica. A indução foi criticada veementemente por Karl Popper por ser pouco rigorosa. Ainda assim, ela é utilizada nas pesquisas, especialmente as que têm objetos mais inconstantes e lidam com a experiência. Já a dedução, para Cervo, Bervian e Silva (2007), é a relação lógica que se estabelece entre proposições, um modo de argumentar que “torna explícitas verdades particulares contidas em verdades universais”. No exemplo anterior, a premissa 3 é uma dedução, feita a partir das premissas anteriores. Ou seja, perceba que indução e dedução não são raciocínios isolados, mas complementares. Outro exemplo de dedução: premissa 1: todo pássaro voa; premissa 2: a águia é um pássaro. Logo, a águia voa. Pode-se perceber que, nas premissas 1 e 2, estão contidas as ideias de pássaro, o que permite inferirmos a premissa 3. A intuição é um tipo de raciocínio relacionado com uma percepção, um insight, que acontece a partir de uma certa disposição de elementos que o despertam. Na pesquisa científica, embora tenhamos falado de métodos, provas, evidências, a intuição também acaba por ser utilizada para a produção doconhecimento. Coração versus razão Fonte: Freepik, 2023. #pratodosverem: a ilustração de duas pessoas e uma gangorra. À esquerda, uma mu- lher, com um coração sobre a gangorra, mais pesado; à direita, um homem e, sobre a gangorra, um cérebro. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 36 Uma pesquisa científica não pode ser feita apenas com intuição, mas ela exerce o importante papel de desacomodar as ideias, de experimentar o que ainda não foi pensado, de descobrir o novo acidentalmente. Combinar a intuição com o rigor na produção de uma pesquisa pode render bons resultados. Para Cervo, Bervian e Silva (2007), a elaboração de um problema de pesquisa pode acontecer a partir da intuição e apenas depois segue-se para a parte de observação objetiva e racional da pesquisa. Para Mascarenhas (2018), não é necessário abandonar a subjetividade em prol da objetividade, ou o oposto, pois há melhores resultados quando se pode combinar as duas. A inferência é um tipo de raciocínio que permite encontrar um valor comum a partir de uma ou mais proposições em que está contida de modo implícito (Cervo, Bervian e Silva, 2007). Assim como a dedução no exemplo da água, você pode perceber que utilizamos inferências para a dedução. Estabelecemos um juízo de valor entre sentenças, uma comparação para chegar a termos comuns. Comunicação e divulgação científica Sabia que existe uma diferença entre esses dois termos? A comunicação científica acontece entre cientistas, sejam da mesma área ou não, que escrevem para seus pares. Intenção da comunicação científica Compartilha os avanços e o estado da arte atual e ocorre através de eventos especializados e publicação em periódicos. Intenção da divulgação científica Divulga os fazeres da ciência para a população, com a finalidade de difundir o que é produzido na universidade ou em institutos de pesquisa e contribuir com a democratização do conhecimento. Destacamos algumas das peculiaridades da ciência. Agora, vamos discutir brevemente o letramento científico. Um dos critérios elencados nas provas do Programme for International Student Assessment (PISA), exame que avalia estudantes do Ensino Médio no mundo todo, é o letramento científico. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 37 Letramento Fonte: Freepik, 2023. #pratodosverem: a imagem mostra uma mesa sobre a qual há várias letras do alfabeto recortadas em papel branco. Uma criança encaixa as letras recortadas em uma folha com todas as letras coloridas. De acordo com documento disponível no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP, 2010), o letramento científico é a “capacidade de empregar o conhecimento científico para identificar questões, adquirir conhecimentos, explicar fenômenos científicos e tirar conclusões baseadas em evidências sobre questões científicas”. Isso significa que, para uma pessoa ser considerada alfabetizada na ciência, é necessário que ela compreenda os métodos e características que diferenciam a ciência de outros tipos de conhecimento, bem como seja capaz de aplicá-los. Outro ponto importante para que uma pessoa seja considerada proficiente no letramento acadêmico é a compreensão de como a ciência e a tecnologia afetam o mundo e a vida em sociedade, ao proporcionar mudanças tanto no meio ambiente como no modo de vida das pessoas. De acordo com o Indicador de Letramento Científico (ILC) de 2014, em pesquisa da Fundação Carlos Chagas, 48% dos entrevistados foram nivelados no descritor 2 – letramento científico rudimentar, em uma escala de 1 a 4, em que 4 é uma pessoa proficiente. Somente 5% dos entrevistados foram avaliados no nível 4. Para a avaliação, a pesquisa considera três itens: domínio da linguagem, saberes práticos e Pesquisa: Teorias e Fundamentos 38 visão de mundo. A amostra abrange 2002 pessoas escolarizadas, com pelo menos 4 anos de estudo, idades entre 15 a 40 anos e que vivem nas cidades metropolitanas. A partir dos resultados nas provas, é possível notar que o Brasil é um país que precisa de avanços na divulgação científica, que ainda não cumpre totalmente seu papel social, e precisa ampliar o acesso à informação e a compreensão dos métodos para a população. Nesse sentido, é necessária não apenas a divulgação, mas a realização de práticas de aprendizagem para melhorar esse cenário. Você já viu aquelas notícias que, em um momento, descrevem um estudo científico afirmando que determinado alimento faz mal e, alguns meses ou anos depois, outra notícia defendendo o consumo do mesmo alimento? Isso é divulgação da ciência? Pensemos em dois exemplos: o caso do ovo e o caso do álcool. Nos dois casos, de modo recorrente, há notícias que defendem ou condenam o consumo. Ovos e vinho: vilões ou mocinhos? Ovo No caso do ovo, ele é condenado por ser uma fonte de colesterol que traz mais malefícios que benefícios. Há também estudos que apontam que o colesterol do ovo não traz riscos para o organismo. Álcool No caso do álcool, diz-se que ele é um depressor do sistema nervoso central e que não há benefícios ao consumi-lo de modo recorrente. Ao mesmo tempo, foram publicados estudos em que são apontados os benefícios do consumo de um cálice de vinho diariamente. Percebe que há uma contradição entre as duas informações sobre álcool e ovo? Na verdade (salvo poucas exceções), esse tipo de texto costuma ser escrito por jornalistas não especializados em conhecimento científico, que acabam por informar de modo enviesado apenas uma questão de um estudo que, caso lêssemos o original, descobriríamos ser secundária para a pesquisa. Isso é importante para que você fique atento e sempre investigue o que está por trás desse tipo de publicação cotidiana. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 39 A universidade, enquanto instituição de conhecimento, busca articular pesquisa e ensino para a comunidade através da extensão, porém são ações isoladas ao meio universitário. No YouTube, há vários canais de divulgação científica, que cumprem uma função louvável, mas o aprendizado do método científico precisa de atividades práticas e dos materiais necessários para as práticas. No Ensino Básico, escolas do sistema público de ensino têm poucos recursos materiais, como laboratórios e reagentes. Ainda temos muito a fazer nesse cenário e, quem sabe, você possa contribuir para isso. O aprendizado do conhecimento científico pode ajudar as pessoas também para que elas possam tomar melhores decisões em relação aos produtos que consomem, às práticas terapêuticas que escolhem, às notícias que acessam. Através da pesquisa, é possível saber que uma notícia é tendenciosa e achar um contra-argumento que a invalide. Com a condição provisória da ciência, que está em um processo de constante desenvolvimento e melhoria, não temos certezas eternas, mas verdades provisórias que, embora não façam promessas, possibilitam escolhas melhores quando estamos em contextos em que é necessário ser crítico e cético em relação a soluções e verdades fáceis. Saiba mais Para saber mais, assista ao vídeo O que é letramento científico?, de Raphael Bender, que aborda esse conceito e sua importância para a sociedade. BENDER, R. O que é o letramento científico? YouTube, 2020. Disponível em: https://youtu.be/N5VeirBaGRU. Acesso em: 10 ago. 2023. https://youtu.be/N5VeirBaGRU Pesquisa: Teorias e Fundamentos 40 Dica de leitura Para que você possa conceituar letramento científico, leia o texto Transgênicos, letramento científico e cidadania, de Beatriz Ceschim e Thais Benetti de Oliveira, no qual as autoras discorrem sobre quatro pontos importantes, a saber: • Exemplo de abordagem do tema transgênicos na perspectiva do letramento científico. • Discussão de como mediar conceitos científicos para a sociedade. • Discussão sobre o conceito de letramento científico e alfabetiza- ção científica e tecnológica. • Dimensão sociocientífica do conceito de transgênicos. CESCHIM, B.; OLIVEIRA, T. B. Transgênicos, letramento científico e cidadania. In: Revistabrasileira de. Ensino de Ciência e Tecnologia, Ponta Grossa, v. 11, n. 1, p. 131-154, jan./abr. 2018. Disponível em: https://periodicos.utfpr.edu.br/ rbect/article/view/5411/pdf. Acesso em: 17 jul. 2023. Conclusão A partir do que foi exposto, buscamos apresentar algumas das principais características do conhecimento científico, um pouco de sua história e origens, suas especificidades e que formas de pensamento são utilizadas no fazer ciência, a saber, a indução, a dedução, a intuição e a inferência. Entre os tipos apresentados, entendemos que as pesquisas são produzidas pela articulação entre os diferentes modos de pensar, que se complementam no processo de investigação dos objetos. Buscamos expor algumas das diferenças entre comunicação científica e jornalismo sobre ciência, bem como entre a comunicação e a divulgação científica. Por último, trouxemos informações sobre o letramento científico no Brasil, o que permite conhecer a necessidade de propor novas soluções de atividades científicas para o público, para aumentar o acesso e o interesse da população por esse tipo de conhecimento, pois há uma porcentagem muito pequena de pessoas, em proporção à população do país, considerada letrada cientificamente. https://periodicos.utfpr.edu.br/rbect/article/view/5411/pdf https://periodicos.utfpr.edu.br/rbect/article/view/5411/pdf Pesquisa: Teorias e Fundamentos 41 Referências APPOLINÁRIO, F. Metodologia da ciência: filosofia e prática da pesquisa. 2 ed. São Paulo: Cengage Learning, 2012. CARVALHO, M. C. M. (org.). Construindo o saber: metodologia científica – Fundamentos e práticas. Campinas: Papirus, 2021. CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A.; SILVA, R. Metodologia científica. 6. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007. LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Fundamentos de Metodologia Científica. 8. ed. São Paulo : Atlas, 2017 Referências complementares CHALMERS, A. F. O que é ciência, afinal? Tradução de Raul Fiker. São Paulo: Brasiliense, 2014. Indicador de Letramento Científico – Sumário executivo de resultados. Disponível em: http://iblc.org.br/wp-content/uploads/2018/01/1-relatorio-executivo-ilc- fcc.pdf. Acesso em: 19 jul. 2023. INSTITUTO Brasileiro de Letramento Científico (IBLC). Letramento científico: um indicador para o Brasil. São Paulo: IBLC, 2017. Disponível em: http://iblc.org.br/ wp-content/uploads/2018/01/3-publicacao-ilc.pdf. Acesso em: 19 jul. 2023. INSTITUTO Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP). Letramento científico. [S.l.: s.n.], 2010. Disponível em: https://download.inep.gov.br/download/ internacional/pisa/2010/letramento_cientifico.pdf#:~:text=Letramento%20 cient%C3%ADfico%20.%20Defini%C3%A7%C3%A3o%20.%20Entende-se%20 como%20letramento,tirar%20conclus%C3%B5es%20baseadas%20em%2- 0evid%C3%AAncias%20sobre%20quest%C3%B5es%20cient%C3%ADficas. Acesso em: 19 jul. 2023. http://iblc.org.br/wp-content/uploads/2018/01/1-relatorio-executivo-ilc-fcc.pdf http://iblc.org.br/wp-content/uploads/2018/01/1-relatorio-executivo-ilc-fcc.pdf http://iblc.org.br/wp-content/uploads/2018/01/3-publicacao-ilc.pdf http://iblc.org.br/wp-content/uploads/2018/01/3-publicacao-ilc.pdf https://download.inep.gov.br/download/internacional/pisa/2010/letramento_cientifico.pdf#:~:text=Letramento%20cient%C3%ADfico%20.%20Defini%C3%A7%C3%A3o%20.%20Entende-se%20como%20letramento,tirar%20conclus%C3%B5es%20baseadas%20em%20evid%C3%AAncias%20sobre%20quest%C3%B5es%20cient%C3%ADficas. https://download.inep.gov.br/download/internacional/pisa/2010/letramento_cientifico.pdf#:~:text=Letramento%20cient%C3%ADfico%20.%20Defini%C3%A7%C3%A3o%20.%20Entende-se%20como%20letramento,tirar%20conclus%C3%B5es%20baseadas%20em%20evid%C3%AAncias%20sobre%20quest%C3%B5es%20cient%C3%ADficas. https://download.inep.gov.br/download/internacional/pisa/2010/letramento_cientifico.pdf#:~:text=Letramento%20cient%C3%ADfico%20.%20Defini%C3%A7%C3%A3o%20.%20Entende-se%20como%20letramento,tirar%20conclus%C3%B5es%20baseadas%20em%20evid%C3%AAncias%20sobre%20quest%C3%B5es%20cient%C3%ADficas. https://download.inep.gov.br/download/internacional/pisa/2010/letramento_cientifico.pdf#:~:text=Letramento%20cient%C3%ADfico%20.%20Defini%C3%A7%C3%A3o%20.%20Entende-se%20como%20letramento,tirar%20conclus%C3%B5es%20baseadas%20em%20evid%C3%AAncias%20sobre%20quest%C3%B5es%20cient%C3%ADficas. https://download.inep.gov.br/download/internacional/pisa/2010/letramento_cientifico.pdf#:~:text=Letramento%20cient%C3%ADfico%20.%20Defini%C3%A7%C3%A3o%20.%20Entende-se%20como%20letramento,tirar%20conclus%C3%B5es%20baseadas%20em%20evid%C3%AAncias%20sobre%20quest%C3%B5es%20cient%C3%ADficas. 42 Senso comum e ciência Introdução No tema anterior, vimos alguns aspectos do conhecimento científico, suas origens e tipos de pensamento. Neste capítulo, vamos investigar mais alguns aspectos relevantes ao fazer científico, como as noções de conceitos, leis e teorias, bem como vamos discutir a verdade e a certeza no processo do fazer científico. Trataremos também do senso comum, que também é um tipo de conhecimento, feito a partir da observação empírica e da experiência humana acumulada por gerações. Com base em exemplos, os ditados populares – frases elaboradas ao longo do tempo pelas pessoas e que servem para condensar o senso comum em uma síntese – vamos entender suas características, o uso metafórico de palavras para ampliar os sentidos, a verdade que pode ser percebida por meio de sua leitura e compará-las com o fazer científico. Ao final, faremos uma retomada dos cinco tipos de conhecimento estudados nesse e-book e vamos destacar aspectos relevantes deles para o entendimento geral dos conhecimentos humanos. Objetivos da aprendizagem • Diferenciar senso comum da ciência. Palavras-chave: senso comum, conhecimento científico, ciência, conhecimento popular, evidências científicas. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 43 Senso comum e ciência: opostos ou apenas diferentes? Uma das frases mais conhecidas sobre o que diferencia o raciocínio humano do de outros animais é “Penso, logo existo”, de René Descartes. A partir dela, pela relação lógica que se estabelece entre existir e pensar, podemos entender o pensamento como uma característica própria do ser humano. Até agora, vimos quatro tipos de conhecimento que, embora com características distintas, possibilitam diferentes perspectivas sobre os fenômenos e se complementam. Nesta unidade, vamos conhecer o quinto tipo de conhecimento, o senso comum, e vamos compará-lo com a ciência, para que seja possível entender suas semelhanças e diferenças. Para Mascarenhas (2018), o senso comum pode ser entendido como “conhecimento que construímos dia a dia com a ajuda da intuição e do bom senso” (2018, p. 12), para solucionar problemas e satisfazer necessidades recorrentes. Dessa maneira, Cervo, Bervian e Silva (2007) consideram esse conhecimento como empírico, isto é, adquirido com a experiência. Diferente do conhecimento científico, o senso comum não tem um método específico nem é sistematizado e é compartilhado de geração para geração. Senso comum: conhecimento compartilhado pela comunidade de uma língua comum Fonte: Freepik, 2023. #ParaTodosVerem: ilustração com grupo de pessoas andando na mesma direção, for- mando uma seta vista de cima, com algumas pessoas andando também aos lados da formação. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 44 O senso comum está no cotidiano e incorpora-se à cultura de uma língua. Em algum dia frio, sua mãe ou algum parente próximo pode ter dito a você: “coloca mais roupa, senão você vai pegar gripe”. Na verdade, o frio em si não aumenta a chance de pegar frio, embora as condições para o contágio no frio aumentem, como aglomerações, ambientes mal ventilados, contato com pessoas infectadas etc. Esse conhecimento provém do senso comum e não é científico. Frio causa gripe? Fonte: Freepik, 2023. #ParaTodosVerem: fotografia de uma pessoa sentada em um sofá, com cobertor azul sobre a cabeça. Ela assoa o nariz. Sobre o sofá, vários lenços de papel já usados e amassados.No fundo, existe um teor de verdade ao associar frio e doença, mas isso não significa que seja uma verdade válida para a doença específica, a gripe. Appolinário (2012) considera que o senso comum é valioso para que sejam tomadas decisões necessárias sem que haja um esforço intelectual descomunal para ações cotidianas. Para esse tipo de conhecimento, não é necessário comprovar a relação entre um elemento e outro, pois a suspeita de que existe uma relação, comprovada pelo crivo da experiência, é suficiente para que ela seja considerada. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 45 Senso comum: recorrência das experiências do cotidiano Fonte: Freepik, 2023. #ParaTodosVerem: ilustração da silhueta de uma cabeça na cor branca, em um fundo amarelo. A parte de cima está cortada e aberta como uma tampa. Acima da abertura da cabeça, há quatro emojis sorridentes nas cores azul, vermelho, amarelo e azul. A ciência, através de sucessivas observações e experimentações, é considerada factual e verificável, isto é, apenas fatos validados através de experimentos são considerados verdadeiros e, caso não se tenha certeza, pode-se repetir a experiência que provavelmente terá um resultado idêntico ou muito aproximado. Ela também é considerada sistemática, pois com o acúmulo de fatos são produzidas teorias, que permanecerão vigentes até o momento em que apresentarem erro, quando serão invalidadas e substituídas pelas novas evidências e explicações. Por isso, a ciência é considerada falível, pois se existirem novos fatos que refutam alguma explicação vigente, ela será considerada errada e retificada. Comparação entre senso comum e conhecimento científico Senso comum Conhecimento científico Valorativo Factual Tradição oral, observação e reflexão Observação e experimentação sistemática Assistemático Sistemático Verificável Verificável Falível Falível Inexato Aproximadamente exato Fonte: Appolinário (2012). Pesquisa: Teorias e Fundamentos 46 Termos importantes para o conhecimento científico Evidência Uma evidência é um resultado comprovado cientificamente através de “manifestações claras” (MASCARENHAS, 2018) sobre um processo. Quando se faz uma pesquisa experimental para avaliar a eficácia de um produto novo, vamos supor que seja um estudo duplo-cego, em que não se sabe se a amostra utilizada é o produto ou um placebo, haverá um acompanhamento das reações de todas as pessoas que participaram e uma análise da comparação entre o que as pessoas perceberam depois de ingerir ou utilizar o produto e o resultado das pessoas que usaram placebo. Placebo Fonte: Freepik, 2023. #pratodosverem: imagem mostra uma lâmina de laboratório com um líquido amarelo dentro. Sobre ela, uma ponta de pinça segura uma cápsula também amarela. Há um fenômeno, o efeito placebo, que aponta que uma porcentagem das pessoas que utilizaram placebo considera que houve efeitos benéficos depois do uso. A partir da porcentagem padrão do efeito placebo, observa-se se a porcentagem das pessoas que receberam o princípio ativo é maior e em que proporção. A partir disso, se for maior do que a porcentagem da amostra com placebos, há uma evidência, comprovada pela análise dos resultados do experimento, de que o princípio ativo tem efeitos reais para determinado problema. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 47 Verdade Diferente de outros conhecimentos, a pesquisa científica tem tempo de validade, estando à mercê das transformações. Como destacamos antes, na ciência, as teorias e seus resultados são provisórios, estando sempre sujeitos a novos estudos, aprofundamentos teóricos e repetições dos experimentos, que podem invalidar seus resultados no futuro. No entanto, embora provisória, a verdade é fundamental na ciência, para garantir a confiabilidade da pesquisa e dos dados. Por outro lado, vale lembrar a implicação da perspectiva na observação dos objetos, que não podem ser vistos em totalidade, o que envolve sempre parcialidade e ponto de vista. Há uma diversidade de vieses para observar um objeto e, a depender do viés, pode-se observar determinado aspecto dos objetos de pesquisa. Nesse sentido, Mascarenhas (2018) considera verdade a manifestação da essência de um objeto. Certeza A certeza se relaciona, de acordo com Cervo, Bervian e Silva (2007), com uma adesão firme a uma verdade, que não possibilita qualquer chance de engano. Essa adesão ocorre, ainda usando o exemplo anterior, quando é possível perceber, pelas evidências experimentais, que a pesquisa com um elemento ativo comprovou que ele funciona para determinado problema. Por outra perspectiva, deve-se pensar no caso oposto, em que um estudo não conseguiu achar uma correlação entre os dados e não foi possível chegar a resultados conclusivos sobre a questão. Nesse caso, que é comum no fazer ciência, deve-se descrever avanços e problemas durante a pesquisa. Não é por não ter evidência que uma pesquisa não tem utilidade. Na verdade, pode-se dizer que erros fazem parte do processo e podem ser úteis para outros pesquisadores que pretendem fazer uma pesquisa sobre o mesmo objeto. Assim como os outros tipos de conhecimento, o senso comum não é um conhecimento melhor ou pior. O senso comum é a doxa grega, uma opinião a partir de uma dada realidade compartilhada entre as pessoas que pertencem a uma determinada comunidade. Esse tipo de conhecimento também está Pesquisa: Teorias e Fundamentos 48 relacionado às comunidades falantes de uma língua, que compartilham o mesmo substrato cultural, pois as rotinas mudam de região para região, assim como o clima, os hábitos culturais, os valores sociais etc. Em relação ao senso comum, já ouviu algum ditado popular e provérbio? Por exemplo, “água mole, pedra dura, tanto bate até que fura”, “quem tem boca vai a Roma”, “a cavalo dado não se olha os dentes”, “gato escaldado tem medo de água fria”, entre vários outros. Esses ditos, geralmente curtos, são fruto da experiência e encapsulam, em poucas palavras, uma síntese válida para a vida de modo geral. A seguir, confira outros exemplos de senso comum. Ditados populares e provérbios Os ditados populares são a elaboração máxima de conhecimento popular, que é partilhado de geração em geração. Ditados populares Fonte: Freepik (2023). #ParaTodosVerem: ilustração de pessoas aglomeradas, de diferentes etnias e faixas etárias, mui- tas delas sorrindo. Gato escaldado tem medo de água fria Em “gato escaldado tem medo de água fria”, pode-se inferir que, quando alguém teve um problema inesperado, essa pessoa fica com medo de acontecer novamente. Gato escaldado Fonte: Freepik (2023). #ParaTodosVerem: fotografia de um gato cinza no canto inferior direito, olhando para o canto superior esquerdo. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 49 Nesse ditado, há uma tentativa de prevenir a pessoa, para que ela esteja atenta às situações e não tenha dificuldade. Embora seja um gato o sujeito da oração, percebe-se uma metáfora entre o medo do gato e o medo da pessoa quando é colocada em uma situação desfavorável que poderia ter sido evitada se ela tivesse se precavido. Por outro lado, se pensarmos nas características dos objetos que queremos conhecer, devemos levar em consideração que tipo de conhecimento é predominante e temos um desejo de pesquisar a fundo o que existe a respeito dele. Nesse sentido, percebe-se que o tipo de conhecimento mais adequado para essa finalidade é o científico, que é trabalhoso, pois pretende descobrir relações a partir de experimentos, e envolve investimento financeiro e intelectual. Os resultados vão compor um repositório de conceitos, leis, teorias e doutrinas, que acaba sendo refinado e aperfeiçoado. Confira três ferramentas para a elaboração do conhecimento científico. Conceitos O conceito pode ser entendido de diferentes maneiras como ideia, abstração ou definição (MACARENHAS, 2018). De qualquer modo, um conceito é uma articulação de ideias para explicar um determinado fenômeno. Há uma diferença, apontadapor Cervo, Bervian e Silva (2007), entre os teóricos e as pessoas mais ligadas à prática. Para os teóricos, conceitos são conjuntos de práticas que servem para entender um fenômeno em termos de medição ou em suas reações. Os cientistas práticos entendem o conceito a partir da possibilidade de explicação ou reprodução de um fenômeno. Leis Na ciência, as leis servem para definir um padrão de comportamento de um fenômeno (MACARENHAS, 2018) e para separar objetos em categorias ou prever o comportamento do objeto nas etapas do experimento. Cervo Cervo, Bervian e Silva apontam três tipos de relação para as leis: relação de existência, de causalidade e finalidade. É importante lembrar que as leis estão presentes tanto nas ciências exatas quanto nas humanas e sociais. Pesquisa: Teorias e Fundamentos 50 Teorias Para o propósito do conhecimento científico, uma teoria é o resultado de sua construção, de seus erros e acertos (MASCARENHAS, 2018). Nesse sentido, a teoria se constitui como um conjunto de explicações para certo fenômeno. As teorias existem em todas as áreas do conhecimento científico e são produzidas com base em trabalho científico e filosófico sobre os objetos de pesquisa, com peculiaridades próprias a cada área. Para Lakatos e Marconi (2017), as formas de conhecimento podem coexistir na mesma pessoa, pois um engenheiro pode ser praticante de determinada religião, estar ligado a um sistema filosófico e, em muitos aspectos de sua vida cotidiana, agir segundo conhecimentos provenientes do senso comum. Ou profissionais da área da saúde podem utilizar conhecimentos provenientes do senso comum em sua rotina, ou ainda um profissional de economia pode estar atualizado em relação aos avanços científicos através da leitura de papers. Embora pareçam distantes uma da outra, a arte tem relação no processo de elaboração da ciência. O sociólogo Wright-Mills (2009) aborda a noção de artesanato intelectual, que entende a importância do trabalho do pesquisador como um fazer artesanal que combina os dados da pesquisa com a percepção de quem lida com eles. Quando fazemos uma pesquisa, por mais planejada que tenha sido, há certo grau de incerteza sobre o que vai ocorrer na coleta de dados. Nesse sentido, especialmente com questões de ciências humanas e sociais, deve-se lidar com a incerteza e com o que se pôde fazer com os dados possíveis de acessar. Saiba mais Para saber mais, assista ao vídeo Exemplos de senso comum, que trata da temática e apresenta suas características e vários exemplos. CONEXÃO filosófica. Exemplos de senso comum. [S.l.: s. n.], 2023. Disponível em: https://youtu.be/K0d0IjEuz8U. Acesso em: 11 ago. 2023. https://youtu.be/K0d0IjEuz8U Pesquisa: Teorias e Fundamentos 51 Dica de leitura Para que você possa conceituar senso comum e ciência, leia o texto Senso comum e ciência: uma análise hermenêutica e epistemológica do senso comum de oposição, de Ivan Penteado Dourado, no qual o autor discorre sobre quatro pontos importantes, a saber: • Conceito de senso comum. • Conceito de ciência. • Suposta oposição entre os dois tipos de conhecimento. • Revisão bibliográfica sobre o que foi produzido sobre o assunto. DOURADO, I. P. Senso comum e ciência: uma análise hermenêutica e epistemológica do senso comum de oposição. In: Educar em revista, v. 34, n. 70, jul.-ago. 2018. Disponível em: https://www.scielo.br/j/er/a/ Yt4ggdnqqGXZkCMjCXP8GZC/#. Acesso em: 19 jul. 2023. Conclusão A partir do que vimos, apresentamos as principais características do senso comum, que é um conhecimento adquirido através da experiência em uma comunidade, que compartilha língua e cultura. Um exemplo do senso comum são os ditados populares, que condensam a experiência de vida para que outros possam evitar problemas. Apresentamos mais algumas características do conhecimento científico, como evidência, certeza e verdade, para discutir sua falibilidade e o processo de aprimoramento do conhecimento, em que as verdades são provisórias. Abaixo, há um quadro sintético com os cinco tipos de conhecimento vistos nas quatro unidades. Perceba que há características compartilhadas entre os tipos de conhecimento. Por exemplo, a ciência e o senso comum, apesar de suas diferenças, são conhecimentos falíveis. Aproveitamos para lembrar que os tipos de conhecimentos são complementares e servem para situações distintas de observação de um objeto. Compare os conhecimentos em relação às seis características definidas, a https://www.scielo.br/j/er/a/Yt4ggdnqqGXZkCMjCXP8GZC/# https://www.scielo.br/j/er/a/Yt4ggdnqqGXZkCMjCXP8GZC/# Pesquisa: Teorias e Fundamentos 52 saber, vinculação com a realidade, origem, ocorrência, comprobabilidade, eficiência e precisão. Quadro – Comparação entre as diversas formas de conhecimento Caracterís- ticas Formas de conhecimento Senso co- mum Artístico Religioso Filosófico Científico Vinculação com a realidade Valorativo Valorativo Valorativo Valorativo Científico Origem Tradição oral, observação e reflexão Inspiração Fé Inspiração Razão Factual Ocorrência Assistemático Assistemático Sistemático Sistemático Observação e experimentação sistemática Comprobabilidade Verificável Não verificável Não verificável Não verificável Sistemático Eficiência Falível Infalível Infalível Infalível Verificável Precisão Inexato Não se aplica Exato Exato Falível Fonte: Appolinário (2012). Pesquisa: Teorias e Fundamentos 53 Referências APPOLINÁRIO, F. Metodologia da ciência: filosofia e prática da pesquisa. 2. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2012. CARVALHO, M. C. M. (org.). Construindo o saber: Metodologia científica - Fundamentos e Práticas. Campinas: Papirus, 2021. CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A.; SILVA, R. Metodologia científica. 6. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007. LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Fundamentos de metodologia científica. 8. ed. São Paulo : Atlas, 2017. Referências complementares MILLS, C. W. Sobre o artesanato intelectual e outros ensaios. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2009.