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<p>22</p><p>UNIVERSIDADE PÚNGUÈ</p><p>Departamento de Letras, Ciência Sociais e Humanidades</p><p>Tema Transversal</p><p>Relação de Género</p><p>-Situação da mulher em Moçambique (desde a luta de libertação nacional);</p><p>-Estatuto da mulher na sociedade moçambicana (sociedades Matriarcais e Patriarcais); e</p><p>-A construção das masculinidades e feminilidades.</p><p>Curso de Licenciatura em Ensino de Português</p><p>Iracelma Agostinho;</p><p>Guente Mateus Rimpo Guente;</p><p>Maria Mário Pedro Viandro;</p><p>Micheque Fambissai Raice; e</p><p>Miguel Fernando.</p><p>Tete</p><p>Agosto, 2024</p><p>Iracelma Agostinho;</p><p>Guente Mateus Rimpo Guente;</p><p>Maria Viandro;</p><p>Micheque Fambissai Raice; e</p><p>Miguel Fernando.</p><p>Relação de Género</p><p>-Situação de da mulher em Moçambique (desde a luta de libertação nacional);</p><p>-Estatuto da mulher na sociedade moçambicana (sociedades Matriarcais e Patriarcais); e</p><p>-A construção das masculinidades e feminilidades.</p><p>Trabalho em Grupo à ser apresentado no curso de Português na cadeira de Tema Transversal para fim de avaliação.</p><p>Docente: Mestre Nolito Ezequiel Gordinho</p><p>Tete</p><p>Agosto, 2024</p><p>Índice</p><p>1. Introdução 4</p><p>Objectivos 5</p><p>Objectivos Gerais 5</p><p>Objectivos Específicos 5</p><p>2. Relações de género 6</p><p>2.1. Situação da mulher em Moçambique (desde a luta de libertação nacional) 6</p><p>2.1.1. As mulheres nas sociedades tradicionais Moçambicanas 6</p><p>2.1.2. A criação do destacamento feminino 8</p><p>2.2. A situação atual das mulheres em Moçambique 10</p><p>2.2.1. Políticas sociais para a igualdade de género 10</p><p>2.2.2. As mulheres no ensino 11</p><p>2.2.3. As mulheres no mercado de trabalho 12</p><p>2.2.4. As mulheres na política 13</p><p>2.2.5. Violência contra a mulher 14</p><p>2.3. Estatuto da mulher na sociedade Moçambicana (sociedades matriarcais e patriarcais) 15</p><p>2.3.1. Sociedades patriarcais 16</p><p>2.4. A construção das masculinidades e feminilidades 17</p><p>2.5. Ritos de iniciação e mutilação genital feminina 18</p><p>2.5.1. Mutilação genital feminina 18</p><p>2.5.2. Como é praticada a MGF 18</p><p>2.5.3. Efeitos da MGF 19</p><p>2.5.4. Efeitos sobre a sexualidade 19</p><p>2.5.5. Efeitos psicológicos 19</p><p>Conclusão 21</p><p>Referências Bibliográficas 22</p><p>1. Introdução</p><p>O conceito de relações de gênero emerge como uma categoria científica profundamente interligada ao desenvolvimento histórico do movimento feminista, que, desde o século XIX, tem levantado questões fundamentais sobre a posição da mulher nas sociedades ocidentais. Inicialmente, as demandas feministas estavam centradas no sufragismo, com o objetivo principal de garantir o direito ao voto para as mulheres. No entanto, a partir da década de 1960, as feministas passaram a produzir uma vasta gama de livros e artigos, abordando de forma incisiva a situação de opressão vivenciada pelas mulheres.</p><p>A compreensão das relações de gênero é multifacetada, abrangendo desde a construção e aprendizado dos papéis masculinos e femininos, que formam a identidade dos indivíduos, até questões complexas como a sexualidade, a violência contra a mulher e as masculinidades. Essas discussões trazem à tona a interseção entre gênero e poder, evidenciando que a subordinação feminina não é uma condição natural, estática ou imutável, mas sim uma construção social passível de transformação. Ao longo da história, torna-se evidente que as identidades de gênero não são fixas; pelo contrário, são plurais, diversas e sujeitas a mudanças. Nesse contexto, o gênero passa a ser compreendido como uma construção relacional, ou seja, um conceito que emerge das relações sociais entre os sujeitos e serve como uma maneira de significar as dinâmicas de poder.</p><p>Objectivos</p><p>Objectivos Gerais</p><p>· Refletir em torno do tema Relações de Género em Moçambique</p><p>Objectivos Específicos</p><p>· Analisar a situação da mulher em Moçambique (desde a luta de libertação nacional);</p><p>· Refletir sobre estatuto da mulher na sociedade moçambicana (sociedades Matriarcais e patriarcais);</p><p>· Entender como e feita a construção da Masculinidade e da Feminilidade e</p><p>· Refletir sobre os ritos de iniciação e a mutilação genital feminina e seus efeitos</p><p>2. Relações de género</p><p>Em primeiro lugar é importante definir cada um desses conceitos já que, com frequência, eles erroneamente são usados como sinônimos.</p><p>Sexo: refere-se às características biológicas de homens e mulheres, ou seja, às características específicas dos aparelhos reprodutores femininos e masculinos, ao seu funcionamento e aos caracteres sexuais secundários decorrentes dos hormônios.</p><p>Gênero: refere-se às relações sociais desiguais de poder entre homens e mulheres que são o resultado de uma construção social do papel do homem e da mulher a partir das diferenças sexuais.</p><p>O papel do homem e da mulher é constituído culturalmente e muda conforme a sociedade e o tempo. Esse papel começa a ser construído desde que o(a) bebê está na barriga da mãe, quando a família de acordo à expectativa começa a preparar o enxoval de acordo ao sexo. Dessa forma, cor de rosa para as meninas e azul para os meninos. Depois que nasce um bebê, a primeira coisa que se identifica é o sexo: “menina ou menino” e a partir desse momento começará a receber mensagens sobre o que a sociedade espera desta menina ou menino. Ou seja, por ter genitais femininos ou masculinos, eles são ensinados pelo pai, mãe, família, escola, média, sociedade em geral, diferentes modos de pensar, de sentir, de atuar.</p><p>2.1. Situação da mulher em Moçambique (desde a luta de libertação nacional)</p><p>2.1.1. As mulheres nas sociedades tradicionais Moçambicanas</p><p>Perante o direito costumeiro Moçambicano, a mulher não era considerada pessoa legal, tanto que dentro das sociedades onde se encontravam inseridas, não eram tidas como adultas e negava-se-lhes o direito de falar em público. Como efeito, não tinham qualquer interferência na elaboração das decisões políticas sendo estas controladas inteiramente pelos homens (A.Isaacman & Stephen, 1984).</p><p>Segundo (B.Isaacman & Stephen, 1984), as mulheres tinham certas atribuições importantes. Forneciam a força de trabalho necessária à produção de bens e através da sua capacidade procriadora geravam novos trabalhadores para a pessoa ou grupo de pessoas a quem pertenciam. Estas duas</p><p>21</p><p>características fizeram das mulheres mercadorias valiosas em todas as sociedades tradicionais de Moçambique, assim como nas sociedades tradicionais africanas.</p><p>Em Moçambique, o controlo do potencial produtivo e reprodutivo da mulher era regulado pela prática do lobolo. Assim sendo, uma vez pago o lobolo à linhagem da mulher, pelo marido, todos os filhos nascidos da união pertenciam à linhagem do marido. Esta prática, além de reduzir a mulher a um objeto de comercialização, teve também um papel extremamente importante ao assegurar a estabilidade matrimonial. Apesar das diferenças entre as sociedades matrilineares e patrilineares, em todas elas os homens controlavam as posições de poder e as mulheres eram sempre consideradas inferiores. Esta inferioridade era reforçada pelas práticas educacionais, ritos de iniciação, que caraterizavam estas sociedades (B.Isaacman & Stephen, 1984).</p><p>A situação das mulheres em Moçambique agravou-se com a implementação do governo colonial português. Ou seja, antes da imposição do regime colonial, a mulher tinha duas tarefas principais: a de produtora e a de reprodutora. O regime colonial veio acrescentar outras responsabilidades, mantendo-se as tarefas tradicionais inalteradas. Devido a implementação do trabalho migratório, que exigia o recrutamento de mão-de- obra masculina para as companhias concessionárias, o que originava a escassez de mão- de-obra para o trabalho nas plantações de algodão, os portugueses foram obrigados a recorrer a contratação de mão-de-obra feminina. Com isto, esperava-se que elas realizassem o trabalho nas plantações de algodão juntamente com as suas tarefas domésticas tradicionais em suas casas, (B.Isaacman & Stephen, 1984).</p><p>2.1.2. A criação do destacamento feminino</p><p>Durante o período colonial o povo moçambicano nunca se manteve passivo, tendo organizado várias formas de resistência. Tanto as mulheres como os homens tomaram parte nessa resistência. Desde o início, as mulheres participaram</p><p>em atividades nacionalistas que culminaram na decisão da FRELIMO de empreender uma luta armada contra o colonialismo português. No sul de Moçambique, estudantes do sexo feminino membros do Núcleo de Estudantes Secundários Africanos de Maputo (NESAM),</p><p>participaram na elaboração e distribuição de propaganda antigovernamental (B.Isaacman & Stephen, 1984).</p><p>O NESAM foi responsável por incutir nas mulheres, sobretudo na camada estudantil de Lourenço Marques, a vontade de se juntar à causa da independência (Santana, 2009).</p><p>Nas aldeias de Cabo Delgado, norte de Moçambique, mesmo antes do início da luta armada, as camponesas desempenharam um papel importante na difusão de notícias sobre a FRELIMO. Tanto rapazes como raparigas estavam envolvidos no movimento da juventude que se expandiu naquela área antes da eclosão da guerra. Com efeito, em 1966 o comité central da FRELIMO decidiu que a emancipação da mulher era parte integrante da luta de libertação nacional. No início a participação das mulheres restringia-se a tarefas de apoio ao combate. Contudo, também desempenharam um papel importante na mobilização dos aldeões, na explicação da política da FRELIMO e da necessidade de apoiar a luta armada (B.Isaacman & Stephen, 1984).</p><p>As mulheres estavam de tal forma empenhadas em participar na luta que pressionaram as chefias do partido para que lhes fosse facultado treino militar (B.Isaacman & Stephen, 1984). Foi para dar resposta a estas solicitações que a FRELIMO enviou, em 1967, o primeiro grupo de raparigas de Cabo Delgado para o centro de instrução Político Militar em Nachingwea, na Tanzânia, para receber treino político militar. Este grupo era constituído por 25 jovens na sua maioria analfabetas. O envio destas raparigas para receber treino militar foi inicialmente uma experiência para ver até que ponto a mulher seria capaz de contribuir na revolução. Contudo, a experiência alcançou resultados positivos e as raparigas desse primeiro grupo tornaram-se membros fundadores do primeiro Destacamento Feminino (DF). Com isto provou-se que a mulher também podia desempenhar um papel importante no campo militar (Mondlane & Machel, 1975; Jornal Notícias apud Moçambique para todos, 2012, fevereiro 26). Desde a altura em que as primeiras raparigas concluíram o treino político militar, em 1968, as mulheres começaram a participar em todos os aspectos da luta armada organizadas no DF (B.Isaacman & Stephen, 1984).</p><p>De acordo com a declaração feita aquando da realização do segundo congresso da FRELIMO, em 1968, a criação do DF visava tornar mais completa e eficiente a participação da mulher na luta armada (Mondlane e Machel, 1975; J. Machel, 1976).</p><p>Embora ainda houvesse tendência para desempenharem em grande parte tarefas sociais pela primeira vez as mulheres pegaram em armas e combateram. Em consequência o DF gerou muita controvérsia no seio do movimento revolucionário entre duas linhas políticas, processo que resultou na expulsão de alguns membros do partido (B.Isaacman & Stephen, 1984).</p><p>2.2. A situação atual das mulheres em Moçambique</p><p>2.2.1. Políticas sociais para a igualdade de género</p><p>Como se vem mostrando, a preocupação com a mulher em Moçambique tem sido levada em consideração desde a luta de libertação nacional. Como se esperaria, as questões relacionadas com a igualdade de género foram tidas em conta na constituição da República em 1975 (Hanlon, Wlsa, Raimundo). As constituições seguintes defendem o mesmo princípio, o da igualdade de género, e proíbem a discriminação com base no sexo. Do mesmo modo, este princípio é reforçado pela ratificação da convenção para eliminação de todas as formas de descriminação contra as mulheres (CEDAW) (Bergh-Collier, 2007).</p><p>Além da CEDAW, Moçambique ratificou ainda a Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos (1981), o Protocolo à Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, relativo ao Direito das Mulheres em África (2005), a Declaração solene sobre Igualdade de Género em África (2004), a Declaração da SADC sobre Género e Desenvolvimento (1991), a Adenda à Declaração da SADC (1998), os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (2000) e a Plataforma de Ação de Beijing (1995) (Andrade apud Wlsa, 2006).</p><p>Com a assinatura de tais tratados, o país compromete-se a rever as leis discriminatórias e a formular novas políticas e programas para o benefício das mulheres. Tomemos como exemplo a recente revisão da lei de família, “esta que talvez seja a lei mais importante existente que defenda a mulher e a igualdade de género em Moçambique” (Assembleia da República apud Tvedten, Paulo & Montserrat, 2008, p.38).</p><p>Além destas leis foi também implementado o Plano Nacional para o Avanço da Mulher, com duas edições (PNAM 2002-2006 e PNAM 2007-2009). A última edição contemplou sete áreas críticas de intervenção: pobreza e emprego; saúde e HIV/SIDA; educação e formação das raparigas, direitos das mulheres e violência; poder e presença nos</p><p>organismos de tomada de decisão; meio ambiente e agricultura; e mecanismos institucionais para o avanço da mulher. As leis e políticas assinaladas tiveram, no entanto, efeitos limitados, para isso contribuindo a falta de enquadramento político e o facto de muitas mulheres desconhecerem os seus direitos e/ou a forma de os exercer. A aprovação, em 2007, da Política de Género e a Respetiva Estratégia para a sua Implementação (PGEI) constituiu uma tentativa de superar essas dificuldades. As questões de igualdade do género foram, pois, assumindo uma posição de destaque na agenda política. A criação, em 2000, do Ministério da Mulher e da Acção Social (MMAS) e a Direção Nacional da Mulher (DNM), no interior do MMAS constituem exemplos, (Tvedten, Paulo & Montserrat, 2008, pp. 38-39).</p><p>2.2.2. As mulheres no ensino</p><p>Desde a independência de Moçambique, o acesso à educação tornou-se um direito assegurado pela constituição a todos os cidadãos, como um dos pilares fundamentais para o desenvolvimento do país. Logo após a independência, o governo da FRELIMO implementou a nacionalização da educação, tornando-a gratuita para todos. Isso resultou em um aumento significativo no número de jovens matriculados nas escolas primárias, crescendo de 586.868 em 1973 para 1.419.297 em 1978, um aumento impressionante de 170% (B. Isaacman & Stephen, 1984).</p><p>No entanto, o progresso alcançado nas décadas de 70 foi interrompido nos anos 80 e 90, quando o sistema educacional sofreu uma estagnação devido à destruição de infraestruturas sociais e econômicas provocada pela guerra civil (Norte apud Cuambe, 2010). Essa devastação não apenas afetou a qualidade e a disponibilidade de educação, mas também comprometeu os avanços que estavam sendo feitos na educação das mulheres, criando barreiras adicionais para o seu desenvolvimento educacional.</p><p>Em 2024, a situação da educação das mulheres em Moçambique reflete tanto os desafios históricos quanto os esforços contínuos para promover a igualdade de gênero. Dados recentes, baseados em indicadores nacionais e internacionais, mostram que embora tenham sido feitos progressos notáveis desde o início do século XXI, persistem desafios significativos. A alfabetização e a participação das mulheres em todos os níveis de ensino continuam a ser áreas prioritárias, especialmente em zonas rurais, onde as disparidades de gênero são mais pronunciadas.</p><p>Relatórios atuais, como o Censo da População Moçambicana de 2017, o Global Gender Report do World Economic Forum e os dados do African Development Bank, destacam que, embora o número de mulheres matriculadas em instituições de ensino tenha aumentado, ainda existem lacunas consideráveis em termos de acesso e qualidade da educação. A situação é particularmente complexa para as meninas e mulheres nas zonas rurais, onde a falta de infraestruturas adequadas, o casamento precoce e a gravidez na adolescência continuam a ser barreiras significativas para a continuidade dos estudos.</p><p>A educação das mulheres em Moçambique, em 2024, permanece uma questão crucial, demandando políticas e ações específicas que considerem tanto os contextos</p><p>urbanos quanto rurais, e que promovam uma educação inclusiva e equitativa para todos</p><p>2.2.3. As mulheres no mercado de trabalho</p><p>Após a independência, Moçambique assumiu um papel de destaque na promoção da igualdade de oportunidades para as mulheres, particularmente no mercado de trabalho. Segundo Isaacman e Stephen (1984), o país rapidamente adotou medidas significativas para garantir essa igualdade. Moçambique é signatário de oito convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT), incluindo a Convenção 111, que exige igualdade de gênero no acesso ao emprego e nas condições de trabalho, e a Convenção 100, que estabelece o princípio de "salário igual para trabalho igual", independentemente do sexo (Klaveren, at al, 2009).</p><p>Além disso, a legislação trabalhista moçambicana reforça essas proteções. A Lei do Trabalho, no seu artigo 11º, assegura direitos específicos para as trabalhadoras, incluindo a proteção durante a gravidez e após o parto (Lei n.º 23/2007). Em 2024, essas disposições continuam a ser fundamentais para promover a equidade de gênero no mercado de trabalho moçambicano, embora desafios persistam, como a disparidade salarial e o acesso a cargos de liderança.</p><p>De acordo com relatórios recentes, apesar do progresso, ainda existem barreiras significativas para as mulheres no mercado de trabalho em Moçambique. Questões como a informalidade do trabalho, a predominância de mulheres em setores de baixa remuneração e a necessidade de políticas mais eficazes para a conciliação entre trabalho e responsabilidades familiares continuam a exigir atenção.</p><p>Essas questões refletem a necessidade contínua de fortalecer as políticas públicas e as iniciativas privadas que promovam a igualdade de gênero no mercado de trabalho, garantindo que as mulheres tenham acesso igualitário a oportunidades de emprego e condições de trabalho justas.</p><p>2.2.4. As mulheres na política</p><p>Moçambique tem sido frequentemente reconhecido pelo aumento contínuo da participação feminina em cargos de liderança na esfera pública (Bergh-Collier, 2007). Um exemplo desse avanço foi a atribuição do Prémio Africano de Género em 2010 pela organização Femmes Africa Solidarité, que destacou os esforços do país no empoderamento das mulheres moçambicanas (Fórum Mulher, 2010).</p><p>No período imediatamente após a independência, apenas uma mulher fazia parte do governo de Moçambique (Tétreault, 1994). Atualmente, a situação é significativamente diferente, com 8 ministras em um total de 29 ministérios, 5 vice-ministras, 3 governadoras provinciais em 11 províncias, 36 administradoras distritais entre 140 distritos, e 3 mulheres à frente de conselhos municipais dos 11 existentes no país (Portal do Governo de Moçambique, 2024).</p><p>A participação feminina nos níveis ministerial e distrital é comparável, com cerca de 25,5% de ministras e 25% de administradoras distritais. A maior presença feminina é notada nos governos provinciais (27,3%) e na Assembleia da República (37,2%). No entanto, as autarquias locais ainda apresentam uma menor representação feminina, com apenas 7%.</p><p>A criação do Núcleo de Promoção da Mulher na Função Pública em 1995, com o objetivo de incentivar a participação feminina no setor público, tem sido um fator crucial para essas conquistas (Bergh-Collier, 2007). Além disso, o sistema de quotas adotado pela FRELIMO, que exige que um terço das candidaturas seja ocupado por mulheres, tem contribuído significativamente para a alta porcentagem de mulheres no parlamento. As metas estabelecidas pela SADC, que estipulavam que até 2005 a participação feminina em postos de decisão deveria alcançar 30%, também desempenharam um papel importante nesse progresso.</p><p>Apesar das barreiras que ainda persistem, é evidente que as mulheres em Moçambique têm feito avanços significativos rumo à paridade de gênero nos órgãos de tomada de decisão. Conforme observado por Bergh-Collier (2007), esses passos largos indicam um progresso contínuo, embora ainda haja desafios a serem superados para alcançar uma representação totalmente equitativa.</p><p>2.2.5. Violência contra a mulher</p><p>A violência contra a mulher é considerada um problema extremamente grave e uma barreira significativa para o desenvolvimento feminino em Moçambique. Dados do Ministério do Interior indicam que a violência doméstica atingiu níveis alarmantes nos últimos anos, embora esses números não reflitam completamente a realidade, devido ao fato de muitas vítimas ainda não denunciarem os abusos por razões culturais, sociais ou econômicas (Governo de Moçambique, 2008).</p><p>A violência contra a mulher manifesta-se em diversos ambientes, incluindo locais de trabalho, escolas, espaços públicos e, principalmente, no âmbito privado do lar, onde é classificada como violência doméstica. A violência doméstica é a forma mais prevalente de agressão contra mulheres em Moçambique, e, como tal, várias organizações têm se mobilizado para combater esse problema (WLSA, 2003).</p><p>Em muitos casos, a violência doméstica está profundamente enraizada nas tradições e na cultura popular, o que faz com que não seja sempre reconhecida como uma violação de direitos humanos. Nesse contexto, a violência é muitas vezes vista como uma ferramenta para estabelecer e reforçar normas de comportamento consideradas apropriadas. Especificamente, a violência doméstica é frequentemente justificada como uma resposta a transgressões ou como uma medida dissuasora para evitar futuras infrações (WLSA, 2003).</p><p>O governo de Moçambique, em parceria com organizações internacionais, tem feito esforços significativos para enfrentar essa questão, elaborando o Plano Nacional de Prevenção e Combate à Violência Contra a Mulher. Este plano serve como um instrumento operacional para várias iniciativas governamentais, incluindo o Plano Quinquenal do Governo (PQG), o Plano de Ação para a Redução da Pobreza (PARPA III), a PGEI e o PNAM (Governo de Moçambique, 2008).</p><p>Além desse plano, foi implementada a Lei n.º 29/2009, que trata especificamente da violência doméstica contra a mulher. Essa legislação visa punir os infratores, fornecer a necessária proteção às vítimas e garantir que os órgãos do Estado disponham dos instrumentos necessários para eliminar a violência doméstica.</p><p>Em 2024, embora esses esforços tenham gerado avanços significativos, a violência contra a mulher permanece um desafio crítico em Moçambique. Relatórios recentes indicam que, apesar das iniciativas e legislações em vigor, ainda há uma necessidade urgente de fortalecer a aplicação das leis, promover a conscientização pública e fornecer suporte adequado às vítimas. A colaboração contínua entre o governo, organizações não-governamentais e a comunidade internacional é essencial para combater de forma eficaz a violência de gênero e promover um ambiente seguro e igualitário para todas as mulheres em Moçambique.</p><p>2.3. Estatuto da mulher na sociedade Moçambicana (sociedades matriarcais e patriarcais)</p><p>Para STRAUSS (1974:17) a família é um grupo social que tem origem no casamento, é uma união legal com direitos e obrigações económicas, religiosos, sexuais e de outro tipo. Mas também associada a sentimentos como o amor, o afeto, o respeito ou o temor.</p><p>Na organização social das comunidades moçambicanas, distinguimos dois tipos de linhagens:</p><p>Sociedades matriarcais</p><p>Na região norte do Zambeze, as sociedades matriarcais se desenvolveram como resultado de fatores ambientais e culturais específicos. Devido à presença da mosca Tsé-Tsé, que prejudicava a criação de gado bovino, a prática da pecuária foi inicialmente limitada, favorecendo a agricultura como principal atividade econômica. Como a agricultura era predominantemente realizada por mulheres, isso conferiu a elas um papel central e poderes significativos nas comunidades, levando ao surgimento de sociedades matrilineares.</p><p>Nessas sociedades, características matriarcais se consolidaram, onde os filhos pertenciam ao grupo de parentesco da mãe, e os bens e poderes eram herdados por via materna. O casamento nessas comunidades era matrilocal, o que significava que o homem</p><p>se mudava para a residência da família da mulher após o casamento, uma prática conhecida como uxorilocalidade. Além disso, as funções políticas e jurídicas eram desempenhadas pelo tio materno, reforçando o papel dominante da linhagem feminina.</p><p>Outra prática cultural importante nessas sociedades era o Sororato, onde, em caso de morte da esposa, o marido era obrigado a casar-se com a irmã da falecida, assegurando a continuidade das alianças familiares e a manutenção do poder e dos bens dentro da mesma linha materna. Essas estruturas sociais destacam o papel central das mulheres e o poder que elas exerciam nas sociedades matriarcais ao norte do Zambeze.</p><p>2.3.1. Sociedades patriarcais</p><p>As sociedades patriarcais, desenvolvidas ao sul do Zambeze, contrastam significativamente com as sociedades matriarcais do norte. Nessas comunidades, a prática predominante era a pastorícia, uma atividade exercida principalmente por homens, o que lhes conferia maior poder sobre as mulheres. Nessa estrutura, o estatuto dos filhos pertencia à família do pai, e a herança de bens e poderes era transmitida por via paterna, do pai para o filho.</p><p>O casamento nessas sociedades era patrilocal, significando que o casal se estabelecia na residência do marido, uma prática conhecida como virilocalidade. Quando o homem morria, a esposa era obrigada a casar-se com o irmão do falecido, prática chamada liverato, garantindo a continuidade das responsabilidades familiares e a preservação do patrimônio dentro da linhagem masculina.</p><p>Nas sociedades patriarcais, a propriedade da terra é um ponto crucial de conflito. Embora oficialmente, segundo a Constituição e a Lei de Terras, a terra seja inalienável e propriedade do Estado, em casos de divórcio ou morte do marido, as mulheres enfrentam o risco de perder suas terras e pertences para outros membros da família do falecido, mesmo que elas sejam responsáveis por cuidar dos filhos e outros dependentes.</p><p>Gonçalves Cota (1944) descreve uma dinâmica econômica dentro dessas sociedades: "as famílias patriarcais equilibram a perda de uma filha que casa recebendo por ela dinheiro ou quaisquer valores econômicos que lhes permitem adquirir outra mulher para um filho que ficará sob autoridade do pai e o auxiliará." Em contraste, as famílias matriarcais, embora não adotem esse sistema, alcançam um equilíbrio semelhante ao adquirir o próprio noivo para trabalhar para a família da esposa, permanecendo sob a autoridade dos sogros. Esse equilíbrio reflete as diferenças fundamentais entre as dinâmicas sociais e econômicas das sociedades patriarcais e matriarcais na região do Zambeze.”</p><p>2.4. A construção das masculinidades e feminilidades</p><p>A socialização ou construção de género refere-se ao processo, à educação e à aprendizagem que o homem e a mulher apresentam perante determinada situação, de acordo com a educação que lhes foi transmitida ao longo da sua infância. Giddens, refere que a “socialização de género começa assim que a criança nasce”, isto é, a criança tem uma “aprendizagem de papéis de género através de fatores sociais, como a família e os meios de comunicação.” Desde de cedo, “as crianças são levadas a se identificarem com modelos do que é feminino e masculino para melhor desempenharem os papéis correspondentes.”, ou seja, a educação atribui ao homem e à mulher uma forma diferente de se comportar, de vestir, de falar que influenciam a socialização do género. “De uma forma clara, a socialização do género é uma força muito poderosa, e desafiá-la pode ser bastante perturbador,” pois a partir do momento que se nasce, menino ou menina, a sociedade espera um determinado tipo de comportamento deles, que cumpram e correspondam às expectativas criadas e que se identifiquem com o seu género.</p><p>Deduz-se, então, pelo que foi referido anteriormente, que a socialização de género reflete a forma como o homem e a mulher se sentem e assumem, reflete-se na forma como cada um se vê, isto é, a partir do momento que a pessoa nasce, começa a construir uma imagem de si mesma e à medida que cresce, vai tendo atitudes e comportamentos que correspondem a essa mesma imagem e os outros esperam, formando, assim a sua identidade. No entanto, convém referir que a identidade de uma pessoa não é redutível ao género e jamais pode declarar-se concluída, adquirida, acabada, uma vez que sofre alterações, transformações e modificações devido às influências genéticas, sociocomunitárias e resultado de experiências pessoais, quer positivas, quer negativas. Assim, ao longo da sua vida o ser humano vai construindo a sua identidade condicionando fortemente a sua forma de estar na vida, de se relacionar consigo próprio e com os outros. E é na relação intersubjetiva, que o ser humano melhor percebe a sua identidade de género.</p><p>2.5. Ritos de iniciação e mutilação genital feminina</p><p>Segundo Dade (2012, p. 47), os ritos de iniciação consistem em passar de uma idade para outra e revela a separação entre o mundo da infância e o mundo adulto. Portanto, os ritos de iniciação visam garantir a integração pessoal, social e cultural do indivíduo. Esta integração, possibilita ao indivíduo trocar experiências, partilhar o mesmo espaço físico- social.</p><p>2.5.1. Mutilação genital feminina</p><p>A mutilação genital feminina (MGF) é uma prática em que uma parte ou a totalidade dos órgãos sexuais de mulheres e crianças são removidos. Há vários tipos, que por sua vez têm gravidadas diferentes. Segundo as várias tradições são removidos o clítoris ou os lábios vaginais. Uma das práticas de maior gravidade chamada infibulação – consiste na costura dos lábios vaginais ou do clítoris, deixando uma abertura pequena para a urina e a menstruação. Aproximadamente 15 % das mutilações em África são infibulações.</p><p>A MGF é levada a cabo em várias idades, desde depois do nascimento até à primeira gravidez, tendo a maioria lugar entre os quatro e oito anos.</p><p>2.5.2. Como é praticada a MGF</p><p>A MGF pode ser realizada em clínicas por médicos, mas mesmo desta maneira, com anestesia, trata-se de mutilação genital feminina. No entanto, a maioria dos casos são realizados por mulheres da comunidade em que vive a mulher ou criança, com instrumentos de corte inapropriados (faca, caco de vidro, ou navalha). Estes instrumentos são raramente esterilizados e anestesiados, podendo levar à transmissão da SIDA ou HIV, ou à morte. Em casos de infibulação, podem ser usados pontos ou espinhos para manter os lábios vaginais juntos, tendo as raparigas de ter as pernas atadas durante quarenta dias.</p><p>A MGF não é um costume inofensivo. Causa danos físicos e psicológicos irreversíveis, podendo ainda levar à morte de raparigas de todas as idades. Esta mutilação viola o direito da jovem a desenvolver-se psico-sexualmente de um modo saudável e natural. O que também deve ser considerado são os custos do tratamento contínuo devido às complicações físicas e psicológicas. A MGF é uma ofensa grave aos direitos humanos em geral, e aos direitos da mulher e criança, em especial.</p><p>2.5.3. Efeitos da MGF</p><p>Os efeitos da MGF podem, como acima referido, levar à morte. Na maioria dos casos, os efeitos consistem em infecções crónicas, sangrar intermitentemente, abcessos e pequenos tumores benignos no nervo, causando desconforto e extrema dor. A infibulação pode ter efeitos mais duradouros e mais graves, incluindo: infecção crónica do tracto urinário, pedras na vesícula e uretra, danos aos rins, infecções no tracto reprodutor devido a obstruções do fluxo menstrual, infecções pélvicas, infertilidade, e tecido excessivo da cicatriz. Durante o parto, o tecido cicatrizado existente nas mulheres mutiladas pode romper. Mulheres infibuladas, que têm os lábios vaginais fechados, têm de ser cortadas para deixarem espaço para a criança nascer. Depois do parto, têm de voltar a ser fechadas para assegurar o prazer dos maridos.</p><p>2.5.4. Efeitos sobre a sexualidade</p><p>A MGF pode tornar a primeira relação sexual da mulher muito dolorosa, sendo mesmo perigosa no caso da mulher sofrer um corte aberto. Em certos casos, as relações sexuais das mulheres continuam</p><p>dolorosas ao longo da vida.</p><p>2.5.5. Efeitos psicológicos</p><p>Os efeitos psicológicos da MGF são mais difíceis de investigar do que os efeitos físicos. Alguns destes efeitos incluem ansiedade, terror, humilhação e traição, todos dos quais terão possíveis efeitos de longa duração. Alguns especialistas sugerem que o choque e trauma da operação podem contribuir para os comportamentos mais calmos e dóceis, consideradas características positivas em sociedades que praticam MGF.</p><p>Adicionalmente, quando ocorrem problemas, estes são raramente atribuídos às pessoas que executam a operação. Na maioria dos casos, a suposta promiscuidade das raparigas é considerada a causa. Estas acusações podem aumentar os sentimentos de culpa, de humilhação e ansiedade destas raparigas. Porque se faz MGF Muitas vezes são os pais que pagam ou iniciam a prática para que as filhas possam casar com homens que não aceitariam mulheres não circuncisadas. Algumas culturas acreditam que os órgãos femininos são impuros e têm de ser purificados, e por isso erradicados. Esta prática permite que somente os homens possam desfrutar o prazer sexual.</p><p>Também se pensa que a MGF melhora a fertilidade e desencoraja a promiscuidade sexual. No entanto, esta prática leva à frigidez das suas vítimas e os seus maridos evitam o relacionamento sexual com as suas esposas, procurando relacionamentos extraconjugais.</p><p>Conclusão</p><p>Concluímos refletir sobre as relações de gênero nos subsidiamos teoricamente para o entendimento das identidades e desigualdades de gênero, discussão tão primordial na contemporaneidade, ao expor publicamente que homens e mulheres possuem papéis e funções sociais diferenciadas, distinção esta que coloca tais sujeitos, conforme sua identidade de gênero, em processos desiguais nas suas condições de vida, no trabalho e nas relações afetivas e sexuais.</p><p>Mas, contudo, podemos ver grandes avanços na emancipação da mulher, em especial em Moçambique, onde a cultura e o tabu dos povos antigos já não influenciam tanto assim, hoje em Moçambique podemos observar mulheres em grandes cargos no trabalho, e direitos contra a opressão da mesma.</p><p>Mais ainda carece de mais leis, e mais debates sofre o assunto de relações de género em Moçambique, e que assim alcancemos a igualdade e a emancipação da mulher em geral nas sociedades.</p><p>Referências Bibliográficas</p><p>Carreiras, Helena (1997). Mulheres nas Forças Armadas Portuguesas. Lisboa: Edições Cosmos.</p><p>Curry, Ginette (2004). Awakening the African Women: The Dinamics of the Change. Amersham: Cambridge Scholars Press.</p><p>Isaacman, Allen e Isaacman, Barbara (1983). Mozambique: from colonialism to revolution 1900-1982. Boulder, Colorado: Westview Press.</p><p>Isaacman, Barbara e Stephen, June (1984). A mulher Moçambicana no Processo de Libertação. (s.l): Instituto do Livro e do Disco.</p><p>Mondlane, Eduardo e Machel, Samora (1975). A Frelimo e a revolução em Moçambique (Vol.4, pp.141). (Coleção libertação nacional). Lisboa: Edições Maria da Fonte.</p><p>Giddens, Anthony.( 2000.) “Sociologia”, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2º Edição.</p><p>image1.png</p>