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1 TEORIA DAS ORGANIZAÇÕES CASOS EMPRESARIAIS Saturn Corporation Dave Steadman graduou-se no ensino básico e imediatamente alistou-se na Guarda Costeira da Marinha norte-americana. Ao ser dispensado do serviço militar, Dave foi contratado para trabalhar na linha de montagem da fábrica da General Motors em Flint, Michigan. Ele foi demitido no início da década de 1990, em virtude da crise econômica que se abateu sobre a América. Depois disso, Dave passou dez anos sem trabalhar. Quando foi inaugurada a planta fabril da Saturn Corporation em Nashville, ele se mudou para o Tennessee e desde então faz parte do corpo de trabalhadores permanentes da fábrica. Nascida em 1982 de uma divisão da própria General Motors e também dedicada à produção de automóveis, a Saturn propõe-se a ser uma organização "totalmente focada nas pessoas". Dave Steadman é uma dessas pessoas. Dividindo seu posto com mais três funcionários, Dave cumpre sua rotina de trabalho ao redor de uma imensa máquina rotatória que injeta espuma preparada em moldes para fazer painéis de automóveis. A pesada máquina é de fato um robô, e o trabalho de Dave é alimentá-lo. Mais especificamente, Dave tem como incumbências acoplar um dispositivo injetor em um orifício, pegar um molde plástico de uma caixa a seu lado, encaixar o molde em uma plataforma metálica da máquina, pressionar com seu joelho uma alavanca que faz descer quatro travas que mantêm preso o molde na estação, checar as travas e pressionar um botão azul que faz com que o molde plástico gire para a posição correta, de forma que o próximo sujeito na máquina possa continuar a trabalhar naquela unidade. Daí passam-se dois segundos antes que a máquina gire novamente e apresente a Dave uma nova plataforma vazia, pronta para receber o dispositivo injetor e o molde. O processo inteiro leva dez segundos exatos. E Dave repete a mesma seqüência de ações 360 vezes por hora, durante oito horas por dia, parando apenas para o almoço no refeitório da fábrica. "Acabo de completar 40 anos", resmunga Dave. "Isso quer dizer que só faltam 17 anos para o fim". Mais dezessete anos nessa rotina e Dave Steadman pode sentir-se livre para engrossar as fileiras de aposentados da indústria norte-americana. Em pouco tempo na função, Dave conseguiu perceber o quanto sua tarefa é simples, repetitiva e maçante. No entanto, considerando os bônus recebidos por produtividade, seu salário anual chega a US$ 55 mil. "Eles me dão esse dinheiro para que eu fique entediado", acredita Dave. Com o propósito de enriquecer as discussões necessárias ao processo de ensino-aprendizagem, os casos apresentados neste documento foram livremente adaptados a partir dos textos originais referenciados. 2 Ainda que sua rotina pareça bem mais lenta do que os dez segundos de duração do ciclo que Dave tem que completar incessantemente, ele é bastante rápido para falar sobre os pontos positivos de seu trabalho. Não é preciso realizar grandes malabarismos intelectuais para alimentar a máquina- robô, e ainda há tempo de sobra para jogar conversa fora com os demais funcionários que se distribuem ao redor da pesada estrutura metálica. Além disso, há outras vantagens de se trabalhar na fábrica da Saturn. "É tudo muito solto. Dentro de nosso time, nós mesmos decidimos quando fazer um descanso, determinamos nossos turnos e cronogramas, agendamos nossas férias, fazemos nosso próprio controle de qualidade e até revezamos as tarefas entre os membros do grupo", reporta Dave. "Há 14 de nós e a gente se vira bem, mas fora isso trata-se apenas de mais um trabalho na linha de montagem". Quando veio à tona o tópico do controle de qualidade, Dave pareceu preocupado em racionalizar os defeitos ocasionais. "Digamos que de vez em quando a máquina range sozinha, ou talvez por causa de um fio solto as coisas saiam um pouco dos eixos. Eu acredito que houve uma ocasião somente em que um cara estava meio abobalhado na sua estação, ou talvez ele tenha tido uma discussão com a esposa ou problemas com as crianças", conta Dave. "A mente do sujeito estava longe da máquina. Você sabe como é... não dá para manter a cabeça o tempo todo em sintonia com o robô. Você deve ser inumano para não se distrair. E então os problemas acontecem". Quando Dave Steadman foi questionado acerca da razão pela qual os carros norte-americanos parecem ter a qualidade mais elevada atualmente, sua resposta foi parecida com aquela que outros milhares de operários da indústria automobilística poderiam ter dito. "Nós temos medo dos nossos trabalhos. Há dez ou quinze anos, nunca ocorria a um trabalhador que ele poderia ser demitido. Você ganhava uma carteirinha do sindicato e o emprego era seu pelo resto da vida, então não havia razão para trabalhar duro ou para se preocupar com controle de qualidade. Agora a gente sabe o que pode acontecer". Depois de um dar sorriso amarelado, Dave arremata: "Além disso, tenho uma dúzia de operários na minha equipe que vão me dar uma prensa se eu não desempenhar minha tarefa corretamente, e mais trinta outros caras do lado de fora da fábrica entregando seus currículos e querendo minha vaga na frente do robô". ROBBINS, S. Organizational behavior. 9 ed. Upper Saddle River: Prentice Hall, 2001. Cia. Afrodite Humberto Gomes começou a trabalhar para a Companhia Afrodite de Comércio e Indústria – uma grande empresa sediada na capital paulista e que atua no ramo têxtil e de confecções – há cerca de 14 anos. Nos últimos dez anos, Humberto tem integrado uma equipe de cinco vendedores. Três deles atendiam a zonas de varejo racionalmente subdivididas na região sul de São Paulo, cada uma composta de aproximadamente 200 clientes, em sua maioria de pequeno porte. Outro vendedor atendia a uma zona especializada de atacadistas, a qual respondia por cerca de 20% do faturamento da equipe. Finalmente, Humberto, o mais experiente dentre os vendedores, atendia a uma zona especializada em grandes organizações, tais como cadeias de varejo, supermercados e lojas de departamentos. O setor coberto por Humberto respondia, sozinho, por 60% do faturamento do grupo. 3 O supervisor de Humberto Gomes – um homem de temperamento forte e marcante denominado Sérgio Telles – era um gerente de grande competência, reconhecido por todos na empresa por ser muito hábil nas funções de planejamento e controle. Na opinião dos que trabalhavam com ele – e também de seus superiores – Sérgio era o tipo de profissional com autoridade indiscutível. A intervalos regulares, Sérgio convocava cada um de seus vendedores à sua presença e, olhos nos olhos, lhe dizia cuidadosamente o que deveria ser feito, com base numa lista de assuntos e tarefas pendentes que atualizava continuamente. Numa maneira peculiar, Sérgio dizia calmamente ao vendedor: "Anota aí". Daí seguia-se uma recomendação ou uma orientação, e depois: "Anotou? Conversamos novamente daqui a uma semana". Infalivelmente, dali a uma semana, Sérgio chamava o vendedor para cobrar-lhe o cumprimento de suas determinações. A experiência ensinara aos membros da equipe que o compromisso deveria ter sido cumprido ou, em caso contrário, uma justificativa muito convincente deveria estar pronta. A maior parte das determinações proferidas por Sérgio Telles dizia respeito aos índices de desempenho da equipe de vendedores – coisas como número diário de visitas, taxa de realização de metas de vendas e assim por diante. Sérgio costumava consultar um mapa onde esses índices eram registrados, usando um código pessoal para anotar suas avaliações. Um ponto na frente do nome de um vendedor significava que a situação estava sob controle; um ponto de interrogação era sinal de que o desempenho podia melhorar; e um "X" em vermelho significava a necessidade de convocar o vendedor a dar explicações sobre um desempenho aquém das expectativas.A equipe de Sérgio Telles havia desenvolvido ritos muito cordiais de convivência. Como eles próprios gostavam de dizer, eram "bons amigos que trabalhavam juntos". Freqüentavam as casas uns dos outros e, quando acontecia de se encontrarem na matriz, o que era comum, sempre marcavam uma cerveja depois do expediente. Essa situação perdurou até que Sérgio foi convidado a ocupar uma posição superior em outra área da empresa, e Humberto Gomes foi escolhido para ficar em seu lugar. Paralelamente, Humberto foi substituído em suas funções de vendedor por um dos colegas que trabalhava numa das zonas de varejo. Este colega, por sua vez, foi substituído por um dos vendedores do "banco de reservas", que vinha sendo treinado havia algum tempo. Todas essas decisões foram tomadas simultaneamente por Múcio Schaeffer, diretor comercial da Afrodite. Certo dia, Humberto foi chamado à presença de Múcio, que lhe comunicou a mudança: a partir do dia seguinte, Humberto passaria a ser supervisor de seus colegas. Naquela mesma noite, ainda não refeito do susto, Humberto Gomes comentou com sua esposa, em casa, que se sentia "na mesma situação do sujeito que foi jogado na água para salvar os outros, mas que também não sabe nadar". Num primeiro momento, Humberto acreditou que a melhor coisa a fazer fosse adotar um modelo. Descartando os livros de Administração que contam histórias mirabolantes sobre gerentes japoneses e norte-americanos, Humberto recorreu ao modelo mais próximo – Sérgio Telles – e decidiu que pautaria seu comportamento pelo do antigo chefe. Em poucos dias, porém, Humberto descobriu que do outro lado da mesa as coisas não eram tão fáceis. Sérgio simplesmente estabelecia metas e cobrava seu cumprimento, mas Humberto não parecia capaz de agir assim. Ele dava as ordens em reuniões individuais, porém quando chegava o momento da cobrança, esquecia-se do que havia pedido, não se sentia à vontade para exigir o cumprimento das determinações. Aconteceu até de perder as próprias anotações. A própria natureza das ordens emitidas por Humberto também começou a lhe criar problemas. Colocado em posição mais elevada na cadeia de comando, Humberto devia estabelecer para sua equipe metas específicas, decorrentes dos planos organizacionais. No entanto, ele sempre havia sido o homem que trabalhava para alcançar as quotas do volume de vendas, nunca aquele que registrava se outras pessoas haviam alcançado tais objetivos. 4 Os outros vendedores também estranharam a transformação sofrida pela equipe. Humberto era alvo das críticas de todos: "Quem esse cara pensa que é? Quando era vendedor como nós, nunca se preocupou muito com essas coisas. Como é que agora resolveu nos cobrar o que nunca fez?". Comentários desse tipo começaram a se tornar cada vez mais freqüentes entre sua equipe e antigos colegas. Nesse ponto, Humberto acreditou então que o melhor a fazer seria eliminar o relacionamento social do trabalho, e para isso passou a adotar um comportamento que seus subordinados classificaram de "seco e até mesmo rude". Se as vendas mantivessem o mesmo nível de desempenho anterior à sua promoção, as coisas não teriam chegado a um ponto tão ruim para Humberto. Para complicar sua situação, começou a haver um declínio significativo do volume vendido, que só não foi mais acentuado porque a alta administração fizera uso de seu poder de barganha para colocar pedidos junto às organizações que respondiam por 50% do faturamento nesse segmento do mercado da empresa. Não demorou muito para que Múcio Schaeffer estabelecesse uma relação entre Humberto Gomes e os problemas que haviam surgido. Uma relação de causa e efeito. "Eu me recuso a acreditar nessa história de que perdemos um ótimo vendedor para ganharmos um péssimo supervisor de vendas", disse Schaeffer, numa ocasião em que o problema foi discutido junto à alta administração da Afrodite: "Eu sou pago para resolver problemas, mas não sou obrigado a ter respostas para todas as perguntas. Não havia ninguém mais indicado para a função: um vendedor excelente, com espírito de equipe, conhecedor da empresa e do ramo para o qual vendia. Sinceramente, ainda não consigo acreditar que saiu tudo errado". MAXIMIANO, A. Introdução à Administração. 4 ed. São Paulo: Atlas, 1995. Ambev Imagine a seguinte cena: no meio do expediente, irrompe na sala de reuniões um grupo de mulheres, com corpos esculturais e seios fartos à mostra. Em seu bailado sensual, elas parecem flutuar entre as mesas, provocando homens e mulheres da empresa. Como grand finale, as dançarinas protagonizam um strip-tease das poucas peças restantes – a microssaia, a calcinha e as luvas. Os mais animados têm a chance de passar óleo no corpo das moças. Ao "funcionário do mês" cabe o privilégio de seguir com uma delas para um motel próximo, tudo por conta da casa. O roteiro descrito anteriormente, ao contrário de todas as evidências, não remete ao enredo de um apimentado filme proibido para menores. Na verdade, fazia parte da experiência do microempresário paranaense Elcio Milczwski, 34 anos, no período em que ele trabalhava como vendedor na filial da Ambev em Curitiba. Sentindo-se constrangido pela rotina desses eventos, Milczwski foi à Justiça, processando a companhia por assédio moral. No dia 6 de setembro de 2012, a empresa dona das marcas Skol, Brahma e Antarctica, maior grupo cervejeiro do país, com um faturamento de R$ 27 bilhões, foi condenada pelo Tribunal Superior do Trabalho a indenizá-lo em R$ 50 mil. "Foi uma época muito difícil para mim no campo profissional e pessoal", revelou Milczwski. "Agora, a justiça foi feita". O desabafo mostra o trauma que as "festas corporativas" da Ambev causaram nas vidas de Elcio Milczwski e de outros profissionais. Em 2006, Milczwski desligou-se da corporação e, a partir de 2010, passou a atuar como pequeno comerciante em São José dos Pinhais, na região metropolitana de Curitiba. A postura da Ambev é resultado da valorização de uma cultura empresarial que estimula a hipercompetitividade, exacerba a meritocracia e incentiva a busca desenfreada por bônus para quem atinge metas ambiciosas. Esse estilo de gestão, cujos principais mentores – o trio Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles – são considerados exemplos para os novos 5 empresários, muitas vezes é traduzido em exageros. O mais notório caso do gênero é o da gigante de energia americana Enron, que quebrou em 2001, em meio a acusações de fraudes contábeis e um enredo que misturava também sexo e luxúria – garotas de programas surgiam nuas sobre elefantes nas festas da diretoria da companhia. No Brasil, por meio de uma nota à imprensa, a direção da Ambev alegou que o episódio representou um fato isolado. "A companhia, que conta com mais de 32 mil funcionários no Brasil, não tolera práticas indevidas com seus funcionários. Casos antigos e pontuais não refletem o dia- a-dia da empresa”, dizia o texto. No entanto, a adoção de um estilo pouco usual de incentivos acabou fazendo com que a Ambev se transformasse em uma das líderes brasileiras em casos de assédio moral. Segundo Milczwski, as agruras vividas por ele e seus colegas se repetiram em vários momentos e em diversas filiais da cervejaria pelo país afora. Em 2004, um vendedor da Ambev no Rio Grande do Sul recebeu R$ 21,6 mil em indenização por ser forçado a passar em um "corredor polonês" enquanto era xingado por colegas de trabalho por não cumprir metas. Quem se recusava a entrar no corredor era obrigado a usar saia e desfilar em cima de uma mesa. Dois anos depois, a empresa foi condenada por assédio moral coletivo no valor de R$ 1 milhão no Rio Grande do Norte. Os funcionários que não batiam metas eram obrigados a permanecer de pé nas reuniões, a dançar diante dos colegas e a usar camisetas com dizeres ofensivos. No ano de 2007, o Ministério Público do Trabalho entrou com uma ação civil pública contra a Ambevao constatar maus tratos, agressões verbais e opressão de funcionários na fábrica da Paraíba. Em 2009, veio a público a denúncia de um ex-vendedor da empresa em Belo Horizonte, que era forçado a fazer flexões na sala de reunião, além de ter que usar perucas coloridas, batom, capacete com chifres de boi e a desfilar fantasiado pela empresa. Um ano depois, a empresa foi condenada a indenizar outro vendedor em R$ 16 mil, por obrigá-lo a cantar diariamente hinos de guerra aos berros e usando palavras de baixo calão. Em 2012, um vendedor da Ambev no Rio Grande do Sul foi contemplado com uma indenização no valor de R$ 100 mil por ser comandado a fazer flexões, passar por um "corredor polonês" e usar fraldão diante dos colegas. Na opinião do paranaense Elcio Milczwski, "os diretores da empresa sabiam exatamente o que acontecia. Além do estímulo sexual, os funcionários que não atingiam as metas eram submetidos a humilhações". Quem se recusava a passar óleo nas moças sofria gozação dos colegas, estimulados pelos chefes. Não bastasse isso, eram tachados de homossexuais. A vida era mais dura para quem tinha um desempenho de vendas abaixo dos padrões mínimos. "Um vendedor foi amarrado na cadeira e jogado no pátio da empresa", recorda Milczwski: "não satisfeitos, seus superiores despejaram farinha e refrigerante sobre ele, que foi deixado no local até conseguir se soltar". Para o advogado Marçal Lima, coordenador da área trabalhista do escritório Crivelli Advogados Associados, todos os exemplos que envolvem a Ambev são casos clássicos de assédio moral. "Em tais situações, as condutas fogem totalmente da razoabilidade das relações sociais", crê Lima. Elcio Milczwski alega ter tentado várias vezes sair da empresa. Envolvido em problemas pessoais – sua mulher havia sofrido dois abortos espontâneos, no período, e ele ainda teve o carro roubado –, não podia se dar ao luxo de largar o emprego. Pediu para ser demitido, para receber a indenização e o seguro-desemprego. Teve seus pedidos rechaçados. Sua última cartada, antes de, finalmente, 6 ser demitido, em 2006, foi propor mudanças nos planos de incentivos. "Cheguei a sugerir ao meu diretor que, em vez de gastar com prostitutas, a verba poderia ser convertida em prêmio, como fazem as demais empresas", lamenta Milczwski. CAETANO, R.; FERREIRA, R. Sexo, cerveja e bônus na Ambev. IstoÉ Dinheiro, ed. 780, 19 de setembro de 2012. Praiamar O Hotel Praiamar foi inaugurado em novembro de 1964 no município de Balneário Camboriú, no estado de Santa Catarina, iniciando suas atividades com cerca de trinta funcionários. Com o passar dos anos, tornou-se necessário ampliar a estrutura do hotel, que atualmente possui 126 apartamentos e suítes, piscinas externas para adultos e crianças, piscina interna climatizada, centro de fitness, salões de jogos e estacionamento. O hotel também oferece estrutura para eventos e convenções, com oito salões e serviços de alimentos e bebidas. Além disso, há um restaurante com capacidade para 170 pessoas e bar com atendimento até a meia-noite. A estrutura organizacional compreende os setores de hospedagem (recepção, mensageria, governança, manutenção, lavanderia, portaria e serviços gerais), comercial, alimentos e bebidas, eventos, restaurante e administrativo. O fundador do Praiamar, Marcelo Silva, administrou por quase 40 anos seu empreendimento com um estilo de gestão centralizador e burocrático. Em 2002, assumiu o cargo de gerente geral do Praiamar Roberto Silva, neto do fundador, que viria a falecer naquele mesmo ano. Em seguida, parte do empreendimento foi vendida para outros quatro sócios cotistas. Nos anos subseqüentes, Roberto preservou o estilo de administração centralizador implantado por seu avô, porém com mais cautela, já que a economia passara por grandes transformações no Brasil e no mundo, trazendo, junto com a globalização, uma concorrência acirrada e novos modelos de gestão. A diretoria do hotel sempre cobrou de Roberto Silva uma gestão focada em superar metas; entretanto, não havia consenso sobre investimentos em reformas na infraestrutura do hotel, em leitos mais aconchegantes e equipamentos mais modernos, além de mais atividades lúdicas para os hóspedes. No início dos anos 2000, nem sequer se pensava em qualidade de vida dos funcionários: o setor de gestão de pessoas era apenas um departamento de pessoal focado na burocracia e no cumprimento dos procedimentos de admissão, demissão e folha de pagamento. Em 2009, com a contratação de um profissional de gestão de pessoas, foram implantados novos projetos, planos e políticas de desenvolvimento de pessoas para melhorar o clima na empresa. Com a implementação dos projetos de cargos e salários e de carreira, Roberto Silva promoveu quatro pessoas para assumirem cargos de gerência, dando um pouco mais de autonomia para cada gerente de setor, os quais, porém, nunca deveriam tomar decisões sem seu consentimento. Nessa tentativa de descentralizar seu poder, Roberto afastou-se por um período do Praiamar, o que talvez tenha acarretado na decisão da diretoria em destituí-lo de sua posição na empresa. No mês de julho de 2010, Roberto encontrava-se imerso em um turbilhão de pensamentos após a reunião de diretoria em que fora anunciado que ele seria demitido de seu cargo. Aquela seria a primeira vez que a organização seria gerida por uma pessoa de fora de sua família, e Roberto teria que permanecer no cargo até que encontrassem alguém adequado para substituí-lo. Apesar de poucos saberem os detalhes da saída de Roberto, rumores se espalharam pelos corredores da empresa, gerando um clima de incerteza entre os funcionários. Roberto era tido como exigente e obcecado pelo cumprimento de normas e procedimentos, reforçando que cada funcionário deveria responsabilizar-se por seu trabalho e, caso precisasse de auxílio ou tivesse alguma sugestão para a melhoria dos processos do dia-a-dia, deveria consultar primeiro seu chefe 7 de setor. Roberto raramente circulava pelos setores do hotel e os funcionários tinham pouco contato com ele. A maior parte do tempo, ficava recluso em sua sala analisando relatórios, revendo normas e procedimentos internos, participando de reuniões com os coordenadores de setor para se inteirar dos acontecimentos, e realizava o planejamento estratégico com o gerente comercial. Suas habilidades gerenciais eram voltadas para a parte técnica, por meio de seus conhecimentos acerca de métodos e equipamentos para a realização das tarefas. Com um estilo de gestão vertical e uma liderança autocrática, Roberto Silva exercia um nível elevado de poder sobre todos. Os funcionários não tinham muitas oportunidades para apresentar sugestões, mesmo que elas fossem do interesse da equipe ou da organização, acarretando elevados níveis de insatisfação. Contudo, seu estilo era eficiente, já que, na hotelaria, a exigência por padrões de qualidade, procedimentos e rotinas tendem a ser evidente e bem descrita para todos, proporcionando um sentimento de segurança nas atribuições diárias. Regulamentos e normas eram seguidos à risca, com funcionários sempre de uniforme alinhado, postura séria, mulheres com pouca maquiagem, cabelo preso e homens com cabelos e barbas aparados, sapatos limpos e engraxados. Qualquer deslize das normas institucionalizadas era motivo para advertência. As cobranças de Roberto eram extremadas no que dizia respeito à atribuição de funções, o que exigia rigorosamente que os prazos e os procedimentos fossem cumpridos. Os funcionários e prestadores de serviços eram proibidos de sair com os demais para uma integração fora da empresa, nem ao menos em seus intervalos para alimentação e descanso. Roberto acreditava que as pessoas não deveriam se misturar, e exigia distância entre os diferentes níveis de hierarquia para não incentivar "fofocas" ou "panelinhas" entre setores. Ao longo do tempo, talatitude radical resultou numa falta de relacionamento interpessoal entre todos da organização, e cada setor cuidava de seu mundo particular, esquecendo do conjunto. Seus comunicados eram passados pelos gerentes, que os repassavam para os coordenadores de setor, e esses a seus subordinados. Para falar com Roberto era necessário agendar horário. Quando Roberto Silva perambulava pelos corredores do Hotel Praiamar, todos os funcionários ficavam receosos, pois geralmente ele fazia isso para exigir resultados ou verificar quais procedimentos poderiam ser aprimorados naquele setor, sempre se dirigindo aos funcionários com perguntas técnicas e voltadas apenas às suas funções, apontando falhas e revendo os processos. Se Roberto observava algo fora do lugar, ou alguma tarefa realizada fora dos procedimentos, procurava imediatamente o chefe do setor e solicitava que se encontrasse o responsável, para que a situação fosse adequada, e o funcionário punido pela falta. Assim, quando a notícia da saída de Roberto finalmente foi oficialmente comunicada a todo o pessoal, a preocupação dos funcionários voltou-se para a expectativa das grandes mudanças que poderiam surgir. Era uma ensolarada tarde de primavera quando Francisco Pereira chegou ao Praiamar para conhecer suas instalações e conversar com Roberto Silva a respeito dos processos administrativos. Ele já havia estado ali alguns meses antes para candidatar-se a uma vaga operacional, e agora chegava para assumir o cargo de gerente geral. A imagem que Francisco trazia da organização era de um negócio decadente em uma situação financeira delicada, mas, ainda assim, um empreendimento com potencial. 8 Roberto acompanhou o processo de adaptação de Francisco na empresa por um mês, a fim de que seu sucessor obtivesse um respaldo de informações para poder iniciar sua administração. No início de sua gestão, Francisco buscou consultar o chefe de cada setor para apoiar suas decisões e se aprofundar nos processos de cada área da empresa, diferentemente de Roberto, que geralmente passava a maior parte do tempo em sua sala, analisando relatórios e procurando meios de aprimorar os processos. Francisco Pereira vivia perambulando pelos setores, conversando com os funcionários, ouvindo suas reclamações, opiniões e palpites sobre o que poderia ser aprimorado. Esse seu jeito acessível, questionando os funcionários em como poderia ajudá-los, ou se tinham alguma sugestão, fazia os empregados se sentirem mais valorizados, como se realmente fizessem parte da empresa, já que o novo gestor lhes permitia participar das decisões. Aos poucos, com seu jeito atencioso, Francisco foi conquistando a confiança dos funcionários, e pouco a pouco ele foi descobrindo o modo adequado de se portar naquele contexto. Conforme suas próprias palavras: "Assim que entrei na empresa, me incluí na rotina e nos processos que a empresa já tinha – não podia simplesmente implantar meus próprios processos sem fazer com que o pessoal participasse da criação dos mesmos. Para obter o envolvimento da equipe é preciso fazer com que todos colaborem de uma forma ou de outra, as pessoas precisam se sentir parte do projeto. Acredito que, se eu chegasse na empresa com os procedimentos prontos, muitos iriam, na melhor das hipóteses, simplesmente segui-los sem pensar". Os funcionários do Praiamar se sentiam mais animados em trabalhar com um gerente que "chegava junto". As barreiras na comunicação com o gestor se dissolveram, e Francisco lhes incitava confiança e acessibilidade. Os procedimentos deixaram de seguir uma metodologia rígida e as regras se tornaram mais flexíveis. O novo gerente geral tinha um alto sentido de urgência e, apesar de todas as decisões terem que passar por ele primeiramente, isso ocorria mais rápido, já que se extinguiram a maioria dos processos formais de decisão. Para respaldar o direcionamento e as decisões diárias da organização, os gerentes de setor já não precisavam fazer as pilhas de relatórios que Roberto Silva tanto estimava. Apesar de ter pouca experiência como gerente geral de um hotel, Francisco Pereira conquistou a confiança da diretoria, que finalmente resolveu investir em melhorias na infraestrutura e dar carta branca para sua gestão. Com seu estilo de liderança democrática, Francisco é receptivo a novas idéias, procura considerar as opiniões de todas as partes interessadas, analisa as sugestões e críticas positivas e negativas antes de chegar a uma decisão final, contribuindo para um processo de implementação mais fluido e transparente, promovendo mais confiança, produtividade e satisfação no trabalho. SOUZA, J.; BALTAZAR, M.; LENZI, F. Sobre mudar e ser mudado: o impacto da substituição do gestor na organização. Revista Eletrônica de Administração e Turismo, v. 2, n. 1, p. 169- 184, jan.-jun. 2013. Proibida A loira e a morena da foto que aparece a seguir foram protagonistas de uma das mais bem- sucedidas campanhas de marketing do país. Em meados de 2011, as moças – conhecidas então como as "tchecas" – impulsionaram o lançamento da cerveja Proibida. Foi um fenômeno, daqueles típicos de um momento em que informações se espalham, para usar o jargão dos marqueteiros, de maneira "viral". 9 Depois de aparecer num vídeo dizendo que queriam conhecer o Carnaval e tomar caipirinha, as "tchecas" viraram atração do programa Pânico na TV. Ficaram mais de 80 minutos no ar – de shortinho e decotão. As duas acabaram como estrelas da revista Playboy. Após essa exposição toda, soube-se que as moças estavam lá para vender a nova cerveja lançada pela Companhia Brasileira de Bebidas Premium (CBBP). A Proibida caiu na boca do povo. Não atrapalhou nada o fato de as "tchecas" serem, na verdade, uma inglesa (Alicia, a morena) e uma eslovaca (a loira Michaela). Só se falava na tal Proibida. Mas o controverso marketing da Proibida chegou então a um limite: passados 18 meses do programa Pânico dedicado às "tchecas", a cervejaria havia conquistado apenas algo em torno de 0,05% de participação no mercado brasileiro. A situação da CBBP tornara-se mais do que desconfortável: a despeito do resultado de sua campanha de marketing, a empresa apresentava sérias dificuldades para fabricar, distribuir e vender sua cerveja. Feito todo o estardalhaço em torno das "tchecas", não havia cerveja para vender. Para começar, em função de sua fábrica do Ceará encontrar-se em obras, a CBBP levou três meses até lançar a Proibida. Assim, enquanto a marca estava na boca do povo, a empresa foi incapaz de engrenar. Nos meses seguintes ao lançamento, a CBBP apenas envasava a cerveja. A empresa comprava um concentrado de pequenas cervejarias, como a D’Ávila, do interior da Bahia, e depois adicionava água e gás carbônico. Se o resultado era bom ou ruim, ficava a gosto do freguês. Ademais, o processo era duas vezes mais caro do que fazer a cerveja do zero. Não bastasse a dificuldade de produzir, houve problemas para distribuir o pouco que saía da fábrica. Aqui, mais uma vez, não havia marketing que resolvesse. Sem estrutura própria de distribuição ou uma gama de produtos ampla o bastante para fechar acordos de exclusividade com grandes distribuidores, a Proibida só chegava a 20 cidades de cinco estados do Nordeste. Em 12 meses, faturou estimados 30 milhões de reais. Com investimentos de 100 milhões de reais, parte deles financiada pelo BNDES e pelo Banco do Nordeste, a CBBP havia recrutado executivos da Ambev, da Schincariol e da Coca-Cola, e tinha contratado 140 vendedores para atender aos mercados de Recife e Fortaleza. Então começaram os cortes de custos. Os vendedores e metade dos 180 funcionários da fábrica e do escritório foram demitidos. A produção foi reduzida à metade. Três das cinco diretorias foram extintas. O lançamento da cerveja no Rio de Janeiro e em São Paulo, que estava previsto para o início de 2012, também foi suspenso.10 "Não estávamos prontos para uma entrega à altura da repercussão que alcançamos", lamenta João Carlos Noronha, dono da CBBP. Herdeiro do grupo pernambucano João Santos, dono da Cimentos Nassau, Noronha decidiu abrir a cervejaria depois de se desentender com os tios sobre a sucessão da empresa. "A falta de experiência pesou", admite Noronha. Mesmo que a CBBP faça tudo certo daqui para a frente, tantos meses perdidos podem ser fatais. Seu único mercado, a região Nordeste, é a bola da vez no setor. Ao longo de 2012, Ambev e Schincariol ampliaram suas fábricas na região, e a Petrópolis, dona da marca Itaipava, anunciou a construção de duas fábricas por lá. Para complicar a situação, a Rede TV!, emissora que transmitia o Pânico na época das "tchecas", passou a cobrar na Justiça cerca de 30 milhões de reais em veiculação de publicidade que teria cedido à Proibida. Segundo executivos próximos, para sair do buraco, João Carlos Noronha abriu negociações com as maiores empresas do setor. Enquanto isso, as "tchecas" voltaram para a Europa, mas mantêm contrato com a CBBP. Noronha promete nova campanha com as moças. Mas, desta vez, é melhor que tenha cerveja para vender. GRANDO, J. A cerveja Proibida ficou só nas tchecas. Exame, ed. 1026, ano 46, n. 19, 17 de outubro de 2012. Natura Poucas empresas brasileiras têm uma imagem corporativa tão forte quanto a fabricante de cosméticos Natura. Em mais de quatro décadas de história, a empresa se dedicou a construir uma imagem de respeito ao meio ambiente, aos fornecedores e aos funcionários. Não obstante, em anos recentes a organização foi publicamente acusada de sonegação fiscal e biopirataria, tendo sido processada e punida pelas irregularidades. Luiz Seabra, que fundou a companhia numa pequena loja na rua Oscar Freire, na cidade de São Paulo, responde pela criação dessa imagem corporativa e pela idealização da cultura da empresa, tendo por fiéis escudeiros os sócios Pedro Passos e Guilherme Leal. Ao longo dos anos, os três controladores da Natura criaram uma rede de 1,5 milhão de vendedores – que fez da organização a líder na venda de cosméticos no país e a quinta maior companhia de vendas diretas do mundo, com faturamento de 8,5 bilhões de reais em 2012. Nos últimos anos, contudo, o modelo que deu tão certo por tanto tempo começou a apresentar suas primeiras rachaduras. A empresa passou a flertar, timidamente, com mudanças em sua estratégia. Assim, em meados de 2013, os controladores da Natura decidiram que a fórmula que trouxera a empresa até sua posição de liderança precisava mudar. Discretamente, começou então a maior transformação da história da Natura. A ação mais emblemática da nova fase foi a troca no comando da Natura, em abril de 2013. A função de presidente do conselho de administração, antes compartilhada por Seabra, Passos e Leal, trocou de mãos. Plínio Villares Musetti, já conselheiro da empresa, foi eleito para assumir o 11 posto. Musetti, que anteriormente presidiu a empresa de elevadores Atlas Schindler, recebeu a missão de, junto com o C.E.O. Alessandro Carlucci, tirar do papel um novo plano estratégico, batizado de Rede Natura. "O projeto tem por objetivo revolucionar nossa forma de vender. Queremos criar novos hábitos nos nossos consumidores", afirma Carlucci. O simbolismo da mudança está claro: embora tenham encampado o projeto, os fundadores decidiram que não são as melhores pessoas para executá-lo. O principal pilar dessa nova fase é a internet. Há cerca de uma década, a Natura oferece seus produtos pela rede, numa loja em parceria com o Submarino. Contudo, a iniciativa nunca foi prioridade para a companhia – os clientes não recebem na loja virtual o mesmo desconto oferecido pelos consultores (de até 30%). Com isso, as vendas online são irrisórias: nem sequer aparecem no balanço da empresa. A partir de 2013, então, a Natura decidiu transformar a internet em um canal de vendas relevante. A ideia foi concebida ao longo dos anos de 2011 e 2012, e tem uma estrutura peculiar para permitir que, ao mesmo tempo em que aproveita as vantagens de vender pela internet, a empresa não entre em choque com sua rede de vendedores. A solução é, no mínimo, curiosa. A Natura criará para cada vendedor um site com o nome dele – dentro da Rede Natura. No limite, haverá 1,5 milhão de endereços eletrônicos. Os pedidos e os pagamentos serão feitos no site pelos próprios clientes e os produtos chegarão diretamente a suas casas. O papel dos vendedores, portanto, vai mudar. E diminuir: "Queremos que os consultores se concentrem em vender, não em cobrar e fazer entregas, como acontece hoje", pondera Alessandro Carlucci. No modelo atual operado pela empresa, um produto pode demorar até um mês para ser entregue, já que cada consultor tem três semanas para preencher um caderno de encomendas e só então fazer o pedido à Natura. Na internet, o prazo máximo cairá para quatro ou cinco dias – nas capitais, mais da metade das entregas será feita em até 48 horas. A Natura não mexeria no coração de sua estratégia à toa. Por trás da criação da Rede Natura está a constatação de que, mantido o rumo atual, a companhia estaria em apuros em um horizonte não muito distante. Atualmente, a maioria do 1,5 milhão de vendedores da Natura não tem dedicação exclusiva ao negócio – uma situação que só piora com a queda do desemprego nos últimos anos. Além disso, o crescimento de outras empresas de vendas diretas, como a Jequiti e a americana Mary Kay, faz com que os mesmos vendedores se dividam entre a Natura e diversas outras marcas (em sete anos, a Jequiti já montou um exército de 190 mil consultores de vendas). Por isso, a rentabilidade média anual dos revendedores da Natura caiu 5% entre 2011 e 2013. Talvez mais grave seja a percepção de que, concentrada em apenas um canal de vendas, a Natura esteja crescendo menos do que pode. O setor de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos faturou 34 bilhões de reais em 2012, e é o que mais cresce no mundo. O Boticário, líder no varejo, dobrou de tamanho em quatro anos. A L’Occitane, uma das mais renomadas marcas internacionais, abriu 55 lojas no país entre 2010 e 2012 – e lançou em março de 2013 uma marca exclusiva de produtos brasileiros. 12 No primeiro trimestre de 2013, as vendas da Natura cresceram 2% na comparação com o mesmo período do ano anterior – a empresa vinha crescendo num ritmo de 10% ao ano desde 2008. Segundo dados da consultoria de mercado Euromonitor, a participação da Natura caiu um ponto percentual em 2012, para 13,4%. No início de 2013, a empresa ainda era líder, mas Unilever, P&G e O Boticário – que ocupavam, respectivamente, a segunda, a terceira e a quarta posições – haviam ganho mercado em relação ao ano anterior. "A concorrência está cada vez mais agressiva e a Natura está sendo atacada em várias frentes. O modelo da empresa, que mira apenas a venda direta, diminui a velocidade de resposta", opina Guilherme Assis, analista de cosméticos da corretora Brasil Plural. Além da internet, o C.E.O. Alessandro Carlucci estuda a inserção de produtos de outros fabricantes no catálogo da empresa – algo antes impensável: "Por que não aproveitar nossos canais de venda? Temos 100 milhões de clientes". O executivo afirma que itens relacionados à saúde e ao bem-estar devem fazer parte do novo portfólio (de tênis de corrida a roupas de ginástica). Produtos de cama, mesa e banho também devem aparecer nos catálogos – a concorrente Avon vende de tudo, de panelas a bijuterias. A abertura de até 30 lojas-conceito nas principais cidades do país para apresentar os lançamentos da marca também está em estudo, assim como a expansão internacional da empresa, um projeto iniciado em 2002, mas que nunca foi prioritário. José Vicente Marino, vice-presidente executivo da Natura, assegura que a empresa vai crescer fora do país por aquisições, a exemploda compra da rede de lojas australiana Emeis, dona da marca Aesop, por 71 milhões de dólares em dezembro de 2012. Segundo analistas, a Emeis servirá para a empresa entender melhor o varejo – e, caso tudo dê certo, trazer o modelo para o Brasil. Analistas estimam que a empresa separou outros 400 milhões de reais para aquisições. A Natura não confirma o número, mas afirma ter 1,5 bilhão de reais em caixa. Atacar em várias frentes ao mesmo tempo é, para a Natura, uma novidade e tanto. A empresa vinha sendo criticada pela lentidão na hora de se adaptar às mudanças do mercado. Nesse caso, a cultura organizacional jogou contra. "Não é fácil mudar o que deu certo por tanto tempo", reflete o analista Guilherme Assis. Em mudanças como aquela que começou em 2013 para a Natura, o maior risco é perder a fidelidade das consultoras de vendas e ainda não virar um competidor relevante em outros canais. "As novas gerações pedem outros formatos de venda, mais ágeis", defende Roberta Kuruzu, diretora da Associação Brasileira das Empresas de Vendas Diretas. Cada vez menos gente quer ligar para a tia ou a amiga de trabalho, pedir um produto e esperar semanas para usá-lo. Poucas empresas foram tão bem-sucedidas quanto a Natura em entender o consumidor brasileiro. No entanto, o país mudou. Para a Natura, chegou a hora de mudar também. LOUREIRO, M. Para a Natura, chegou a hora de mudar. Exame, ed. 1042, ano 47, n. 11, 29 de maio de 2013.
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