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<p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 1/16</p><p>Este texto foi publicado no Jus no endereço</p><p>https://jus.com.br/artigos/67473</p><p>Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br</p><p>A quantificação do dano moral à luz da sua função social</p><p>A quantificação do dano moral à luz da sua função social</p><p>Andressa Lustosa Teixeira de Moraes| Marina Felinto Siqueira| Amanda Mendes</p><p>Evangelista| Bárbara Maria Dantas Mendes Ribeiro</p><p>Publicado em 07/2018. Elaborado em 07/2018.</p><p>O artigo busca sintetizar a evolução do dano moral no direito pátrio, o</p><p>entendimento jurisprudencial e doutrinário acerca dos critérios</p><p>utilizados para sua quantificação, e como estes critérios podem</p><p>auxiliar na concretização da função social do instituto</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>O ser humano é, por natureza, um ser social. Apesar da individualidade que lhe é inerente,</p><p>é no convívio social que são supridas as carências mundanas, o que é vital para a espécie.</p><p>Nas palavras de Bernades Melo[1],</p><p>A ampliação gradativa dos círculos sociais em que o homem se vê envolvido no</p><p>desenrolar de sua existência faz crescer, proporcionalmente, o grau de influência</p><p>que a sociedade exerce em sua formação.</p><p>É neste convívio que surgem os conflitos de interesse, na medida em que a busca de</p><p>pretensões particulares por diversas vezes vai de encontro à harmonia necessária à</p><p>convivência coletiva. Nesse contexto surge a responsabilidade civil, com vistas a amparar</p><p>todo àquele que se acha na situação de vítima de um dano decorrente de atos praticados</p><p>por terceiros. Segundo Rui Stoco[2],</p><p>A noção da responsabilidade pode ser haurida da própria origem da palavra, que</p><p>vem do latim respondere, responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que</p><p>existe de responsabilizar alguém pelos seus atos danosos. Essa imposição</p><p>estabelecida pelo meio social regrado, através dos integrantes da sociedade</p><p>humana, de impor a todos o dever de responder por seus atos, traduz a própria</p><p>noção de justiça existente no grupo social estratificado. Revela-se, pois, como algo</p><p>inarredável da natureza humana.</p><p>A doutrina francesa foi uma das grandes responsáveis por delinear os contornos da</p><p>responsabilidade civil tal como a conhecemos hoje, sendo o Diploma Civil Francês a</p><p>primeira codificação a tratar propriamente sobre o tema, nos moldes tradicionalmente</p><p>estabelecidos pelo direito romano.</p><p>https://jus.com.br/</p><p>https://andressalust.jus.com.br/publicacoes</p><p>https://jus.com.br/1781028-marina-felinto-siqueira/publicacoes</p><p>https://amandame.jus.com.br/publicacoes</p><p>https://jus.com.br/1783096-barbara-maria-dantas-mendes-ribeiro/publicacoes</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 2/16</p><p>Ao longo dos anos a responsabilidade civil passou por grandes modificações no que</p><p>concerne aos seus fundamentos e pressupostos. Passou-se da estrita tipificação de</p><p>situações acobertadas pelo direito para estabelecer-se um princípio geral da</p><p>responsabilidade civil, capaz de abarcar a infinidade de situações e conflitos aos quais os</p><p>seres humanos se mostram diariamente expostos. Além disso, o entendimento clássico de</p><p>que apenas aqueles direitos e bens mensuráveis economicamente poderiam ser objeto da</p><p>tutela jurídica ressarcitória cedeu espaço à visão humanista, que elege o ser humano e sua</p><p>dignidade como cernes do nosso ordenamento jurídico. O patrimonialismo outrora vigente</p><p>mostrou-se insuficiente para atender aos anseios de segurança jurídica e justiça aos quais</p><p>a sociedade almejava, de modo que o antigo e consolidado dano material passou a dividir</p><p>espaço com o surgimento de novas formas de prejuízo.</p><p>Nesse cenário, a responsabilização civil passou a ter como alvo, além do típico dano</p><p>material, aferível economicamente, o dano moral, que, embora não mensurável em</p><p>pecúnia, tem existência concreta e bastante perceptível. Inúmeras foram as tentativas ao</p><p>longo dos anos no sentido de descaracterizar a existência de tal dano, questão que</p><p>encontra-se atualmente superada.</p><p>O avanço contínuo do pensamento e da tecnologia trouxeram consigo a inserção de novos</p><p>paradigmas, e a ampliação da abrangência dos interesses coletivos (a exemplo do direito</p><p>ao meio-ambiente saudável e equilibrado) alterou a face do instituto da responsabilidade</p><p>civil, assim como ocorre hoje no âmbito do direito de família, por exemplo, que é alvo de</p><p>profundas e significativas transformações decorrentes da volatilidade dos conceitos e</p><p>anseios sociais. A estabilidade parece uma meta distante de ser alcançada e que,</p><p>certamente, demandará um sem número de construções filosóficas daqueles que se</p><p>dedicam a desvendar os rumos dos modernos pensamentos concernentes à</p><p>responsabilidade civil.</p><p>BREVE EVOLUÇÃO DO DANO MORAL</p><p>A agressão a direitos de cunho não patrimonial, ao contrário do reconhecimento do dano</p><p>moral, sempre existiu. A doutrina clássica entendia inexistir equivalência possível entre o</p><p>sofrimento e o ressarcimento pecuniário. Não se podia, pois, quantificar o sofrimento, de</p><p>modo que chegava a ser absurda, se não imoral, a ideia de indenizar um ato ilícito causado</p><p>a um bem não aferível economicamente.</p><p>A possibilidade de reparação dos danos morais remonta ao direito romano, que a concebia</p><p>sob um viés distinto do que, em regra, buscamos alcançar hoje. Tal distinção, porém, não</p><p>lhe retira a influência na concepção do instituto tal como o conhecemos. Segundo Clayton</p><p>Reis,</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 3/16</p><p>(...) na realidade, os romanos não tinham uma exata e precisa noção a respeito</p><p>dos danos ocasionados à intimidade da pessoa, certamente porque confundia-se</p><p>com frequência pena e indenização. A simplicidade do pensamento jurídico da</p><p>época não conseguia estabelecer a correta distinção entre o caráter patrimonial e</p><p>não patrimonial do dano. A ideia arraigada no espírito das pessoas naquele</p><p>período histórico, destacava que as ofensas pessoais clamavam por vingança e os</p><p>ofensores deveriam ser alvo de castigo corporal.</p><p>Mesmo assim, a actio injuiarium aestimatoria tinha como pressuposto formal</p><p>assegurar uma reparação de natureza satisfeita, ou seja, a condenação do</p><p>lesionado ao pagamento de uma determinada importância a título de reparação a</p><p>uma ofensa que representava uma penalidade ao ofensor.[3]</p><p>As mais antigas previsões de dano moral identificadas pela doutrina remontam ainda aos</p><p>escritos do Código de Hamurabi (que autorizava uma reação na mesma medida agressão),</p><p>no qual imperava a agressão do tipo física, e do Código de Manu (que continha</p><p>dispositivos que determinavam, ainda que de maneira tímida e arcaica, reparação por</p><p>danos morais).</p><p>O pensamento de que o homem é um ser dotado de dignidade humana, inerente a todos os</p><p>seres, e não atribuível, passou a demandar uma proteção mais efetiva na modernidade,</p><p>sobretudo após as atrocidades cometidas durante a Segunda Guerra Mundial. O homem</p><p>deixou de ser visto apenas sob uma ótica unidimensional. Nas palavras de a Marcius</p><p>Geraldo Porto de Oliveira:[4]</p><p>Independentemente do caráter patrimonialista ou não dos danos morais, da</p><p>existência da perda de ordem econômica ou pecuniária, da diversidade de</p><p>linguagem utilizada pela doutrina, o fato é que a reparação dos danos morais se</p><p>afirma pela necessidade de preservar os direitos por uma melhor qualidade de</p><p>vida. Isso implica no reconhecimento de atributos que não possuem significação</p><p>econômica exterior, estabelecendo-se uma dimensão espiritual da pessoa humana</p><p>e consequente espiritualização do direito.</p><p>Em síntese, pode-se distinguir três fases pelas quais passara a evolução do dano moral no</p><p>direito brasileiro: a primeira, de completa negação da possibilidade de reparação</p><p>pecuniária à violação a direitos não</p><p>quantificáveis em pecúnia; a segunda, que trouxe o</p><p>reconhecimento do dano moral, porém de forma bastante restrita e indissociável do dano</p><p>material; e, por fim, a fase da reparabilidade ampla e irrestrita, que adveio com a</p><p>Constituição Federal de 1988 e o reconhecimento incontestável do dano moral no sistema</p><p>jurídico, a qual também elencou os direitos da personalidade como pilar fundamental em</p><p>nosso ordenamento, e, a tutela destes, demanda, indubitavelmente, o reconhecimento</p><p>daquele.</p><p>Passamos, deste modo, de um extremo que negava a existência do dano moral a um ponto</p><p>em que se viu claramente sua existência e a necessidade de sua reparação.</p><p>No âmbito jurisdicional, o Supremo Tribunal Federal até meados dos anos 60, não</p><p>reconhecia a existência do dano moral[5]. O leading case que sinalizou a mudança de rumo</p><p>aconteceu no STF, em um julgado de relatoria do Ministro Aliomar Baleeiro. Nele, o STF</p><p>deu provimento a um Recurso Extraordinário e reconheceu que o dano moral é, sim,</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 4/16</p><p>indenizável.[6] O caso concreto trata de uma ação proposta pelos pais, em razão do</p><p>falecimento de duas crianças vitimadas por um acidente cuja culpa foi atribuída a uma</p><p>empresa de ônibus.</p><p>Tal avanço, porém, limitou-se a determinar que a indenização fosse calculada com base</p><p>naquilo que os pais gastaram até ali com a criação e a educação dos filhos. Ou seja, o que</p><p>se estava indenizando não era a dor/sofrimento da perda dos filhos, ou dimensões</p><p>extrapatrimoniais outras, mas os gastos materiais para a criação deles até a data da morte.</p><p>Depois de algum tempo, veio a Súmula 491 do STF:</p><p>STF – 491: É indenizável o acidente que cause a morte de filho menor, ainda que</p><p>não exerça trabalho remunerado.</p><p>Com essa súmula, passou-se a incluir nas verbas indenizatórias, não apenas os gastos</p><p>passados, mas também os presumíveis ganhos futuros frustrados. Nota-se, ainda, a</p><p>prevalência da lógica econômica em detrimento da existencial.</p><p>O fato é que a mudança, de fato, adveio com a Constituição de 1988, que previu</p><p>explicitamente a indenizabilidade do dano moral no art. 5º, incisos V e X:</p><p>V - É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da</p><p>indenização por dano material, moral ou à imagem;</p><p>X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,</p><p>assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua</p><p>violação;</p><p>O CONCEITO DE DANO MORAL</p><p>A parte das inúmeras críticas doutrinarias à terminologia utilizada, o dano moral é</p><p>definido como o dano que lesiona exclusivamente os sentimentos pessoais da vítima.</p><p>Nesse sentido, ensina Carlos Roberto Gonçalves,</p><p>Dano moral é o que atinge o ofendido como pessoa, não lesando seu patrimônio.</p><p>É lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a</p><p>dignidade, intimidade, a imagem, o bom nome, etc., como se infere dos art. 1º,</p><p>III, e 5º, V e X, da Constituição Federal, e que acarreta ao lesado dor, sofrimento,</p><p>tristeza, vexame e humilhação.[7]</p><p>Na mesma linha de pensamento, Maria Helena Diniz estabelece o dano moral como, “a</p><p>lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo ato</p><p>lesivo”. [8]</p><p>Com efeito, segundo Aguiar Dias,</p><p>O dano moral é o efeito não patrimonial da lesão de direito e não a própria lesão,</p><p>abstratamente considerada. O conceito de dano é único, e corresponde a lesão de</p><p>direito. Os efeitos da injuria podem ser patrimoniais ou não, e acarretar, assim, a</p><p>divisão dos danos em patrimoniais e não patrimoniais. Os efeitos não</p><p>patrimoniais da injuria constituem os danos não patrimoniais.[9]</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 5/16</p><p>Pode-se verificar, em primeira análise, que o dano moral está vinculado à dor, angústia,</p><p>sofrimento, etc., mas não é mais possível restringir tal instituto a estes elementos, uma vez</p><p>que ele se estende a todos os bens e direitos personalíssimos:</p><p>Com esta perspectiva, os direitos da personalidade – ultrapassando a setorial</p><p>distinção emanada da histórica dicotomia direito público e privado – derivam da</p><p>própria dignidade reconhecida à pessoa humana para tutelar os seus valores mais</p><p>significativos do indivíduo seja perante outras pessoas, seja em relação ao Poder</p><p>Público. Com as cores constitucionais, os direitos da personalidade passam a</p><p>expressar o minimum necessário e imprescindível à vida com dignidade.[10]</p><p>DANO MORAL E DANO MATERIAL</p><p>É certo que a ofensa subjetiva se apresenta de forma apartada do direito material, o que</p><p>inicialmente causou uma grande inquietação junto aos operadores do direito, os quais se</p><p>questionavam acerca da possibilidade de cumulação de ambos os pedidos.</p><p>Desde a promulgação da Constituição de 1988 os direitos imateriais ganharam autonomia</p><p>em relação aos patrimoniais, retirando assim a relevância do argumento da existência de</p><p>bis in idem, que passou a ser uma mera ilusão sem nenhuma especulação jurídica. Assim,</p><p>a partir de um único ato, há a possibilidade de configurar um prejuízo a um direito</p><p>material como também ao direito subjetivo de um indivíduo.</p><p>É importante destacar que a distinção entre ambos não decorre da natureza do direito,</p><p>mas do efeito da lesão, do caráter de sua repercussão sobre o lesado. O dano moral é</p><p>compreendido em seu conteúdo, que é a dor, a emoção, a injúria física ou moral, ao</p><p>passo que o dano patrimonial refere-se a prejuízos eminentemente materiais.</p><p>Na distinção entre dano material e moral, percebe-se que em relação ao primeiro há uma</p><p>efetiva diminuição no patrimônio da vítima, e, comprovados os danos, há de ser ressarcida</p><p>a perda, recompondo-se o status quo patrimonial do ofendido. Já no que tange ao dano</p><p>moral, essencialmente extrapatrimonial, a questão do quantum indenizatório se mostra</p><p>bastante controversa, haja vista ser indeterminável pecuniariamente.</p><p>Deste modo, conclui-se que a principal característica distintiva entre o dano moral e o</p><p>material não é a natureza da lesão que ocasionou a ofensa, mas sim os efeitos dela. A</p><p>dificuldade que impera hoje acerca dos danos morais não está relacionada à sua</p><p>conceituação, nem mesmo à possibilidade de reparação. Outrossim, repousa sobre a</p><p>questão da fixação do quantum indenizatório, ou, mais adequadamente, da</p><p>compensação pecuniária.</p><p>A FUNÇÃO SOCIAL DO DANO MORAL</p><p>QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL</p><p>O desenvolvimento social é constante, e, à medida que avança, impõe ao judiciário novas</p><p>demandas, questões antes impensáveis, o que proporciona ao sistema um razoável grau de</p><p>instabilidade. Ao magistrado, por sua vez, não cabe escusar-se da pretensão jurisdicional</p><p>sob pena de violar o princípio do non liquet.</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 6/16</p><p>O principal obstáculo à aceitação do dano moral residiu, conforme já foi dito, exatamente</p><p>na dificuldade em estabelecer uma quantificação justa a uma ofensa que não pode ser</p><p>quantificada. Com o passar do tempo, e o avanço na visão do ser humano como sujeito de</p><p>direitos dotado de dignidade, passou-se a aceitar a ideia de que a compensação pecuniária</p><p>por ofensa a direitos de cunho extrapatrimonial seria uma solução adequada, pois a sua</p><p>ausência, além de injusta, incentivaria comportamentos contraditórios ao ordenamento</p><p>jurídico na medida em que perpetuaria uma absoluta impunidade aos autores de</p><p>tais ilícitos.</p><p>Com efeito, o ressarcimento não se traduz em restituição, pois impossível a restituição do</p><p>status quo da vítima, mas em lenitivo, compensação, em verdadeiro refrigério para a dor</p><p>da alma daquele que teve um direito da personalidade violado. Não há preço para o</p><p>sofrimento. Ele é incalculável.</p><p>Com efeito,</p><p>As</p><p>tristezas se compensam ou se neutralizam com as alegrias, porém esses fatores</p><p>de neutralização não são obtidos pela via direta do dinheiro, pois não se está</p><p>pagando a dor ou a tristeza, mas sim pela indireta, ensejando valores econômicos</p><p>que propiciassem ao lesado do dano não-patrimonial logo que lhe desse uma</p><p>sensação de bem estar ou contentamento.[11]</p><p>O dinheiro pago a título de danos morais não visa cessar a dor. Trata-se apenas de uma</p><p>fonte indireta de satisfação daquele que foi ofendido em sua dignidade.</p><p>Com a prestação pecuniária o que se visa não é diretamente extinguir a dor com a</p><p>aplicação de um preço ou antídoto; não é extraí-la pondo-lhe no lugar a moeda,</p><p>como ficou esclarecido. O que se faz é outra coisa, é procurar para o lesado um</p><p>conjunto de sensações agradáveis, motivo de satisfação e de emoções, segundo a</p><p>sua inclinação e o seu temperamento, de sorte a criar condições que, se não</p><p>chegam a suprimir o sentimento de pesar, de certo podem atenuá-lo, tornando-o</p><p>mais suportável e menos prolongado.[12]</p><p>No âmbito dos Tribunais, a dificuldade na quantificação também se mostra presente no</p><p>cotidiano dos magistrados. Ocupando-se da relatoria do Resp nº 8768-SP, o Ministro</p><p>Raphael de Barros Monteiro opinou no sentido de que:</p><p>Tema dos mais árduos é o da quantificação do dano moral. Hermenegildo de</p><p>Barros, invocado por Pontes de Miranda, deixara acentuado que 'embora o dano</p><p>moral seja um sentimento de pesar íntimo da pessoa ofendida, para o qual se não</p><p>encontra estimação perfeitamente adequada, não é isso razão para que se lhe</p><p>recuse em absoluto uma compensação qualquer. Essa será estabelecida, como e</p><p>quando possível, por meio de uma soma, que não importando uma exata</p><p>reparação, todavia representará a única salvação cabível nos limites das forças</p><p>humanas. O dinheiro não os extinguirá de todo: não os atenuará mesmo por sua</p><p>própria natureza; mas pelas vantagens que o seu valor permutativo poderá</p><p>proporcionar, compensando, indiretamente e parcialmente embora, o suplício</p><p>moral que os vitimados experimentam.[13]</p><p>A NATUREZA DA FUNÇÃO INDENIZATÓRIA DO DANO MORAL</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 7/16</p><p>Não é unânime na doutrina a caracterização da natureza jurídica do valor determinado a</p><p>título de indenização por danos morais, mas apesar da divergência, tem-se uma corrente</p><p>dominante no sentido de considerá-la como sendo de caráter misto, como de natureza</p><p>satisfativa à vítima e sancionatória ao ofensor.</p><p>Não obstante tangenciar no sentido de cumprir a natureza mista, há posicionamentos no</p><p>sentido de acatar apenas o aspecto satisfatório ou o exclusivamente punitivo.</p><p>O ASPECTO SANCIONADOR DO DANO MORAL</p><p>.Georges Ripert foi um dos simpatizantes mais ativos dessa linha de pensamento e para ele</p><p>não seria possível falar em reparação para agravo imaterial, mas sim em uma pena civil,</p><p>que serviria para penalizar a atitude ilícita pela qual optara o ofensor.</p><p>O importante não seria o valor pago para a vítima a título de indenização, pois almeja-se</p><p>com muito mais severidade o castigo para o sujeito ativo em razão da sua conduta.</p><p>Em seu artigo 5°, inciso XXXIX, a Constituição Federal, traz a máxima de que não há</p><p>crime sem lei anterior que o defina, tornando assim impossível a aplicação de uma punição</p><p>a alguém pela pratica de um ato não tipificado. Desta forma, torna-se inviável inserir no</p><p>ordenamento civilista tal vestimenta para a indenização por danos morais.</p><p>De acordo com o pensamento de Carlos Roberto Gonçalves,</p><p>Já se foi o tempo em que as sanções civis e penais se confundiam. A sanção penal</p><p>tem por fim a repressão do ato ilícito e não guarda relação com o valor do bem</p><p>lesado. Por aí se vê que o caráter sancionatório autônomo, nas condições</p><p>mencionadas, tem todas as características de sanção penal. [...] Não cabe ao juiz,</p><p>mas ao legislador, estabelecer os seus limites máximos e mínimos. Do contrário,</p><p>ficaria a critério de cada um fixar a pena que bem entendesse. Enquanto garantia</p><p>constitucional, o princípio da legalidade das penas não se aplica exclusivamente</p><p>ao direito penal.[14]</p><p>Essa teoria encontra falhas, principalmente por olvidar de um fator primordial para</p><p>caracterização do dano moral: o ofendido. Mostra-se, portanto, incompleta em sua</p><p>individualidade ao voltar sua dimensão tão somente a um dos pólos da relação jurídica</p><p>privada.</p><p>FUNÇÃO COMPENSATÓRIA DO DANO MORAL</p><p>Há ainda corrente doutrinária o sentido de que as indenizações relativas às agressões</p><p>morais devem-se ater apenas a compensar a vítima.</p><p>Os defensores dessa corrente, afirmam que seria impossível atribuir caráter sancionador</p><p>às indenizações de caráter imaterial, já que estas se tornariam penas civis.</p><p>Por ter um caráter extremamente subjetivo, seria de difícil configuração estipular um valor</p><p>que será meramente compensador. Assim, pela lesão moral ter caráter incurável, o valor</p><p>pago em dinheiro ao ofendido seria apenas para conceder-lhe alguns benefícios, que</p><p>indiretamente, poderiam amenizar o sofrimento.</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 8/16</p><p>Como o objetivo central dessa teoria é a satisfação da vítima, estaria cumprida a função do</p><p>instituto com asua mera aplicação. Ocorre que, com a condenação indenizatória, o ofensor</p><p>sofre, ainda que indiretamente, uma sanção ao desprender um valor pecuniário para o</p><p>ofendido. Nesta relação, a satisfação de um estaria diretamente ligada a diminuição, o</p><p>patrimonial do outro.</p><p>Nesse sentido, considerar somente a compensação torna o pensando incompleto,</p><p>atribuindo a necessidade de evoluir no sentido da aplicação do caráter sancionador ao</p><p>quantum indenizatório.</p><p>É no equilíbrio entre a função indenizatória e a função sancionadora do dano moral que se</p><p>busca estabelecer a sua função social. É exatamente na caracterização deste difícil aspecto</p><p>que reside sua contribuição para a paz e harmonia social, para fixar-se como meio apto ao</p><p>Estado, que tomou para si a função de pacificador social, de estabelecer o equilíbrio das</p><p>relações, a justiça e a supremacia do ordenamento jurídico.</p><p>A APURAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO</p><p>A apuração do quantum é dotada de uma complexidade muito maior do que aquela</p><p>relativa ao dano material, pois o interesse lesado não tem como ser medido</p><p>monetariamente.</p><p>Segundo Américo Luiz Martins da Silva[15] existem três maneiras de fixação da</p><p>indenização em razão dos danos morais. A primeira, chamada de reparação convencional,</p><p>parte da transação entre o ofensor e o ofendido, de modo que a fixação do quantum se faz</p><p>sem maiores colisões, pois parte diretamente da vontade dos interessados. A segunda é</p><p>determinada por indenizações legalmente estipuladas, chamadas de reparação legal, pois a</p><p>sua condição de vinculação a norma se faz de forma absoluta. Por fim, o terceiro tipo</p><p>refere-se à fixação do montante a partir da análise exclusiva do magistrado e que é</p><p>conhecido como reparação judicial.</p><p>Critério matemático</p><p>Para os danos materiais aplica-se esse critério, segundo o qual o julgado deve buscar o</p><p>montante devido a partir da quantificação do dano advindo da lesão, por ser possível de se</p><p>obter exatamente a quantia que represente o desfalque material experimentado pela</p><p>vítima.</p><p>No dano moral, sua utilização é mais restrita. É aplicado, a título de exemplo, quando se</p><p>depara com situações envolvendo títulos protestados indevidamente, em que o julgador</p><p>opta por tarifar o valor à semelhança do valor constante no documento em questão.</p><p>De acordo com o artigo 944 do Código Civil de 2002, porém, a indenização deve ser</p><p>estipulada de acordo com a extensão do dano e não com base, por exemplo, no valor do</p><p>título protestado. A estipulação desse parâmetro conduziria o Poder Judiciário a orientar-</p><p>se de forma contrária ao seu preceito fundamental, que é o de estabelecer equilíbrio</p><p>social.</p><p>Não é difícil, portanto, chegar à conclusão de que deve-se utilizar outro critério, que não</p><p>apenas o matemático, para enfrentar o problema da quantificação do dano moral.</p><p>4.5.2 O Tabelamento do Dano Moral</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 9/16</p><p>O Tabelamento é um caminho viável a ser trilhado para a solução da quantificação do dano</p><p>moral. Haveria, sob este prisma, uma relação de valores juntados a um determinado tipo</p><p>de comportamento, no qual este seria disponibilizado para a consulta pelo magistrado,</p><p>que, por sua vez, não necessitaria adentrar nos aspectos subjetivos do agressor.</p><p>O tabelamento, no entanto, retiraria do instituto sua principal característica, que é</p><p>subjetivismo, que reside exatamente em tratar as pessoas de forma peculiar, com a análise</p><p>do litígio de forma individual. Com o tabelamento do dano moral, o princípio mor da</p><p>dignidade da pessoa humana seria ofuscado em sua incidência. A manutenção de</p><p>comportamentos como este mostra um flagrante desvirtuamento de todo pensamento</p><p>filosófico instaurado a partir da Carta Magna de 1988. Haveria uma flagrante valorização</p><p>do patrimônio em detrimento à pessoa.</p><p>Nas palavras de André Gustavo Corrêa</p><p>“qualquer limitação infraconstitucional às indenizações por danos materiais seria</p><p>inconstitucional, uma vez que a consagração do direito a esse tipo de indenização</p><p>é estabelecido na Carta Magna.”.[16]</p><p>Carlos Roberto Gonçalves, por sua vez, critica esta modalidade de quantificação,</p><p>denominada por ele de tarifação, amparado no pensamento de que, a partir do</p><p>conhecimento prévio do valor pago, os agressores teriam plena condição de analisar o</p><p>montante indenizatório e compará-lo às possíveis vantagens decorrentes da prática do ato</p><p>danoso, concluindo, em alguns casos, que seria mais atraente adotar o comportamento</p><p>ilícito.</p><p>Apesar de muito criticada, o Superior Tribunal de Justiça tem grande aparato</p><p>jurisprudencial amparando a indenização do dano moral no arcabouço da tarifação.</p><p>Alguns defensores dessa tese, afirmam que o Egrégio Tribunal estaria apenas</p><p>estabelecendo valores máximos para o dano moral.</p><p>Cabe ao magistrado a cautela de limitar-se às entranhas da situação concreta, para a partir</p><p>de lá, retirar os seus fundamentos necessários para a estipulação da quantia indenizatória.</p><p>Ao legislador não é garantido o acesso às provas e demais questões subjetivas que</p><p>possibilitam a estipulação uma indenização ideal, de maneira que não lhe cabe atribuir de</p><p>forma prévia uma tabela de quantificação de condutas violadoras dos direitos da</p><p>personalidade. Ao contrário, pelo fato de estas se mostrarem infinitas, resta ao legislador</p><p>somente utilizar-se de cláusulas e conceitos abertos, bem como princípios gerais, cabendo</p><p>ao juiz a função de, diante da demanda que lhe é apresentada, quantificar o valor devido.</p><p>Conclui-se assim que, a análise do montante a ser fixado deve ser feito pelo magistrado,</p><p>observando as peculiaridades de cada caso, sendo a padronização inadequada para o</p><p>enfretamento de questões como esta.</p><p>O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E O DANO MORAL</p><p>Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, instalou-se o Superior Tribunal de</p><p>Justiça, sendo-lhe atribuído o papel de velar pela uniformidade e coesão do direito. Dentre</p><p>os diversos temas levados a este Tribunal, aquele atinente aos danos morais por diversas</p><p>vezes recebe destaque na mídia e no universo jurídico. Nem mesmo para os Ministros</p><p>desta Corte a abordagem referente aos agravos psicológicos faz-se simplória.</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 10/16</p><p>Entre as atribuições constitucionais do Superior Tribunal de Justiça, está a de julgar, em</p><p>grau recursal, as causas advindas dos Tribunais Regionais Federais ou Tribunais dos</p><p>Estados ou do Distrito Federal, com o intuito de uniformização da interpretação do direito</p><p>federal.</p><p>Ao apreciar o recurso especial, a corte de sobreposição não analisa matéria de fato, mas</p><p>somente de direito. O que significa dizer que não há espaço para o reexame de matéria</p><p>probatória, centralizando-se a avaliação judicial na interpretação de dispositivo de lei</p><p>federal.</p><p>Apesar de a revisão da indenização por danos morais estar condicionada à análise de</p><p>elementos fático-probatórios, o que, a princípio, impediria a sua realização em sede de</p><p>recurso especial, o Superior Tribunal de Justiça tomou para si o papel de Tribunal</p><p>moderador nas ações indenizatórias por danos morais, através de entendimento</p><p>consolidado no sentido que a revisão do valor da indenização somente é possível quando</p><p>exorbitante ou insignificante a importância arbitrada, em flagrante violação aos princípios</p><p>da razoabilidade e da proporcionalidade.</p><p>Os artigos do Código Civil Brasileiro que disciplinam o tema, tais como os artigos 186, 927,</p><p>944 e 884, dão essa possibilidade de apreciação da reparação por dano moral pelo STJ,</p><p>pois, ao estabelecerem o direito à reparação do dano sofrido, não o fazem com a finalidade</p><p>de enriquecer indevidamente a vítima, muito menos de ser insignificante ao ponto de</p><p>estimular a pratica do dano por seu causador. É com esse fundamento, que o Superior</p><p>Tribunal de Justiça interfere na quantificação do dano moral.</p><p>A possibilidade descrita acima é exposta em vários julgados, como por exemplo, no AgRg</p><p>no Ag 1135795 / RJ, 4ª turma, Rel. Ministro Raul Araújo, DJe de 29/09/10:</p><p>O entendimento deste Sodalício é pacífico no sentido de que o valor estabelecido</p><p>pelas instâncias ordinárias a título de indenização por danos morais pode ser</p><p>revisto tão somente nas hipóteses em que a condenação revelar-se irrisória ou</p><p>exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade.</p><p>CRITÉRIO DE QUANTIFICAÇÃO DO VALOR DO DANO MORAL</p><p>Para a Corte Superior, a indenização por dano moral deve respeitar alguns critérios, tais</p><p>como a extensão do dano, a situação econômica das partes, o grau culpa do ofensor, bem</p><p>como os princípios da razoabilidade e proporcionalidade:</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 11/16</p><p>PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.</p><p>CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. HERDEIROS. LEGITIMIDADE.</p><p>QUANTUM DA INDENIZAÇÃO FIXADO EM VALOR EXORBITANTE.</p><p>NECESSIDADE DA REDUÇÃO. RESPEITO AOS PARÂMETROS E</p><p>JURISPRUDÊNCIA DO STJ. PRECEDENTES.</p><p>1. Cingindo-se, a hipótese em análise, a dano à imagem da falecida, remanesce</p><p>aos herdeiros legitimidade para sua defesa, uma vez que se trata da reparação de</p><p>eventual sofrimento que eles próprios suportaram, em virtude dos fatos objeto da</p><p>lide.</p><p>2. O critério que vem sendo utilizado por essa Corte Superior na</p><p>fixação do valor da indenização por danos morais, considera as</p><p>condições pessoais e econômicas das partes, devendo o arbitramento</p><p>operar-se com moderação e razoabilidade, atento à realidade da vida</p><p>e às peculiaridades de cada caso, de forma a não haver o</p><p>enriquecimento indevido do ofendido, bem como que sirva para</p><p>desestimular o ofensor a repetir o ato ilícito. (AgRg no Ag 850273 / BA,</p><p>4ª turma, Rel. Ministro HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO, DJe</p><p>24/08/10)[17]</p><p>DIREITO EMPRESARIAL. DANO MORAL. Divulgação ao mercado, por pessoa</p><p>jurídica, de informações desabonadoras a respeito de sua concorrente.</p><p>Comprovados danos de imagem causados à empresa lesada. Dano moral</p><p>configurado. Fixação em patamar adequado pelo Tribunal a quo. Manutenção.</p><p>Para estabelecer a indenização por dano moral, deve o julgador</p><p>atender a certos critérios, tais como nível cultural do causador do</p><p>dano; condição sócio-econômica do ofensor e do ofendido intensidade</p><p>do dolo ou grau da culpa do autor da ofensa; efeitos do dano, inclusive</p><p>no que diz respeito às repercussões do fato. (grifa-se) (REsp 883630</p><p>/ RS,</p><p>3ª turma, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, DJe 18/02/09)[18]</p><p>Cabe, neste momento, estabelecer uma crítica à utilização arbitrária de um desses</p><p>critérios. De fato, o juiz não deverá, em princípio, indagar a respeito da situação financeira</p><p>do ofendido como elemento de maior ou menor impacto para o arbitramento de uma</p><p>reparação.</p><p>Ocorre que, em diversos casos, o princípio da vedação do enriquecimento sem causa é</p><p>usado para reduzir o valor da indenização devida a pessoas financeiramente mais</p><p>humildes, mesmo diante de graves lesões a direitos fundamentais. É importante destacar</p><p>que a riqueza ou a pobreza do lesado não alteram a sua dignidade. Qualquer distinção que</p><p>se faça quanto à capacidade econômica das vítimas poderia repercutir no campo dos lucros</p><p>cessantes, jamais no dano moral.</p><p>Noutro ponto, além dos critérios gerais supracitados, a Egrégia Corte tem seguido um</p><p>modelo bifásico no momento de efetuar a quantificação. Em uma primeira fase, estabelece</p><p>um valor básico de indenização, considerando o interesse jurídico lesado, com base em um</p><p>grupo de precedentes judiciais que apreciaram casos semelhantes. Esta fase visa,</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 12/16</p><p>sobretudo, primar pela segurança jurídica, evitando que situações semelhantes recebam</p><p>tratamento drasticamente distinto. O que se busca aqui é constatar a existência do dano</p><p>extrapatrimonial.</p><p>Na fase seguinte, o julgador deve atentar-se às peculiaridades do caso concreto para só</p><p>então fixar um valor definitivo. Aqui já não caberá considerar o fato lesivo, mas sua</p><p>extensão, seu impacto na pessoa da vítima. Se busca a individualização do dano moral.</p><p>Quanto ao tempo transcorrido entre o dano e a propositura da ação, entende-se que pode</p><p>influenciar no resultado da ação em se tratando de danos extrapatrimoniais. Já no que</p><p>concerne aos danos materiais, por serem concretos, e, desde que reclamados dentro do</p><p>lapso temporal estabelecido pela lei, não há qualquer influência.</p><p>CONCLUSÃO</p><p>Por todo o exposto, não há dúvidas sobre a existência e possibilidade da reparação do dano</p><p>moral, mas ainda é adversa a questão em torno da sua quantificação, já que se refere a</p><p>uma lesão a direitos personalíssimos, não quantificáveis concretamente, razão pela qual a</p><p>indenização a título de dano moral não tem a finalidade de restituir a situação anterior ao</p><p>dano, mas apenas compensar a dor sofrida pela vítima, constituindo sim, um lenitivo para</p><p>as angústias infringidas.</p><p>A doutrina tem buscado estabelecer métodos com a finalidade de se chegar a uma</p><p>indenização justa, assim orientando o magistrado na quantificação do dano moral. Dentre</p><p>esses métodos, destacam-se o tabelamento, através do qual já há uma prefixação de</p><p>valores em razão do tipo e gravidade do dano; os critérios matemáticos com suas fórmulas</p><p>exatas para resultar numa indenização objetiva; e o arbitramento judicial, pelo qual se</p><p>confia ao juiz, com a análise de cada caso concreto, a quantificação do dano moral.</p><p>O que se constata é que os órgãos julgadores se esforçam em demarcar sua atuação com a</p><p>prudência, o bom senso e a razoabilidade, em busca de segurança jurídica, sem deixar de</p><p>atentar para as peculiaridades inerentes às demandas que lhe são apresentadas, sob pena</p><p>de engessar um instituto que é, por si só, subjetivo.</p><p>A liberdade concedida aos juízes, porém, muitas vezes resulta em enormes discrepâncias</p><p>de valores, fazendo valer a máxima “cada juiz, uma sentença”. O magistrado, com a</p><p>autorização legal para julgar conforme suas próprias convicções, ainda que motivada, ao</p><p>trabalhar em torno de conceitos indeterminados e cláusulas gerais, resulta por diversas</p><p>vezes em contribuir com a imprevisibilidade do resultado do arbitramento da indenização</p><p>por dano moral, o que afeta a segurança jurídica, princípio orientador de todo o</p><p>ordenamento jurídico, mormente com o advento do novo Código de Processo Civil, que</p><p>privilegia sobremaneira o sistema de precedentes judiciais.</p><p>O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, busca estabelecer a função social do dano</p><p>moral na medida em que reaprecia os julgados que contrariam dispositivos legais, ora</p><p>servindo como meios de enriquecimento indevido da vítima (o que, como visto, não deve</p><p>ser utilizado como óbice a uma indenização justa aos mais humildes) ora não cumprindo a</p><p>função sancionadora da indenização.</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 13/16</p><p>A partir do presente estudo se pôde concluir que não obstante o incessante esforço no</p><p>sentido de encontrar na indenização pelo dano moral uma quantificação que represente</p><p>um meio de lhe atribuir uma função social, e não meramente simbólica, é inegável que a</p><p>busca da paz coletiva ultrapassa a ideia de imposição de uma pena civil.</p><p>Outrossim, no que tange ao aspecto compensatório da indenização, não se pode olvidar</p><p>que a infinidade de situações possíveis na sociedade nos traz casos em que a</p><p>reparação econômica pouco significaria para o ofendido, seja em razão de sua condição</p><p>econômica, seja em decorrência da gravidade extrema da violação de sua esfera individual.</p><p>O Direito deve permanentemente dar respostas satisfatórias, adequadas,</p><p>eficientes e justas aos novos problemas e desafios que a sociedade, no seu</p><p>permanente evoluir, constantemente apresenta. Em razão do crescimento da</p><p>população urbana e do aumento vertiginoso das atividades econômicas,</p><p>constantemente o homem, com seu agir, cria riscos para a natureza e para o seu</p><p>semelhante. Vive-se sob o signo da insegurança, numa verdadeira “sociedade de</p><p>risco”, como balizada pela sociologia francesa. Se o Direito, muitas vezes, sente-se</p><p>incapaz para evitar e neutralizar os riscos, se os danos são inevitáveis, frutos</p><p>inseparáveis da convivência social e do desenvolvimento tecnológico, ao menos o</p><p>Direito deve buscar formas de fornecer segurança jurídica no sentido de que todo</p><p>o dano injusto (entendendo-se por dano injusto todo aquele para o qual a vítima</p><p>não deu causa) deve ser, na maior medida possível, reparado.[19]</p><p>De fato, a função social vem agregar a situações do direito privado um caráter publicista,</p><p>pois não se pode conceber o homem como um ser isolado, a vida em comum lhe é</p><p>essencial.</p><p>Rudolf Ihering, nesse sentido, questiona a função meramente compensadora que é</p><p>comumente atribuída à reparação do dano moral:</p><p>(...) será que a mesma coisa não se aplica ao devedor que maliciosamente contesta</p><p>a existência do mútuo, ou ao vendedor ou ao locador que descumpre o contrato,</p><p>ao mandatário que abusa da confiança que nele depositei para locupretar-se à</p><p>minha custa? O sentimento de justiça ficará satisfeito se, depois de uma luta</p><p>prolongada, nada obtenho dessas pessoas senão aquilo que desde o início já me</p><p>pertencia? Abstraindo, porém, da ânsia, sem dúvida plenamente justificada, de</p><p>obter uma satisfação adicional pela ofensa ao direito, essa situação representa um</p><p>deslocamento sensível do equilíbrio entre as partes da relação jurídica. Para uma</p><p>delas o risco de um desfecho desfavorável do processo representa a perda daquilo</p><p>que lhe pertence, enquanto para outra apenas acarreta a restituição daquilo que</p><p>injustamente retém; para uma, a vantagem resultante da demanda bem sucedida</p><p>consistirá apenas na ausência de prejuízo, e para outra, num enriquecimento à</p><p>custa da parte adversa. Com isto não estaremos estimulando a perfídia?[20]</p><p>É evidente que o judiciário brasileiro ainda tem muitos desafios no que tange a estabelecer</p><p>uma medida exata à reparação do dano moral. Embora tal modalidade de dano reflita uma</p><p>lesão interior, ao subjetivismo e personalidade do indivíduo, não se pode deixar de</p><p>perceber que a reparação se volta não só a ele. Seu caráter social é gritante. A coletividade</p><p>se torna parte nesta relação na medida em que são essas as demandas que determinarão</p><p>os</p><p>rumos dos comportamentos humanos, inibirão a reiteração de condutas gravosas, farão</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 14/16</p><p>com que os ilícitos não compensem em vantagens aos ofensores. O respeito ao ser humano</p><p>como indivíduo e como parte da sociedade é o cerne do que se almeja ao buscar</p><p>a reparação por um dano moral. É este o fim último que se busca ao se pensar em paz e</p><p>equilíbrio social.</p><p>NOTAS</p><p>[1] MELLO, Marcos Bernardes. Teoria do Fato Jurídico: plano da existência. 12. ed. São</p><p>Paulo: Saraiva, 2003, p.3</p><p>[2] STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 7 ed.. São</p><p>Paulo Editora Revista dos Tribunais, 2007, p.114.</p><p>[3] REIS, Clayton. Avaliação de dano moral. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 26</p><p>[4] OLIVEIRA, Marcius Geraldo Porto de. Dano moral – Proteção jurídica da consciência.</p><p>3. ed. São Paulo: LED Editora de Direito, 2003, p. 39.</p><p>[5] STF, RE 11.786 “não é admissível que os sofrimentos morais deem lugar à reparação</p><p>pecuniária, se deles não decorre nenhum dano material”. Tal posição, já era criticada por</p><p>Pontes de Miranda em 1927 que dizia: “Que mal-entendida justiça é essa que dá valor ao</p><p>dano imaterial ligado ao material e não dá ao dano imaterial sozinho? ”</p><p>[6] STF, RE 85.127</p><p>[7] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.</p><p>p. 359.</p><p>[8] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro 7. Responsabilidade Civil. 22ª</p><p>ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 84.</p><p>[9] DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987,</p><p>v. 2, p.852.</p><p>[10] FARIAS, Cristiano Chaves de. Direito Civil. Teoria Geral. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen</p><p>Júris, 2005, p. 108.</p><p>[11] Este pensamento é de autoria de Orozimbo Nonato e foi lembrado por Maria Helena</p><p>Diniz. (DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: responsabilidade civil. 21.</p><p>ed. rev. atual. vol 7. São Paulo: Saraiva, 2007, p.95)</p><p>[12] REIS, Clayton. Avaliação do dano moral. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 134</p><p>[13] Ementa do Resp 8768/SP: DANO MORAL PURO. CARACTERIZAÇÃO.</p><p>SOBREVINDO, EM RAZÃO DE ATO ILICITO, PERTURBAÇÃO NAS RELAÇÕES</p><p>PSIQUICAS, NA TRANQUILIDADE, NOS ENTENDIMENTOS E NOS AFETOS DE UMA</p><p>PESSOA, CONFIGURA-SE O DANO MORAL, PASSIVEL DE INDENIZAÇÃO. RECURSO</p><p>ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. (STJ. T4- QUARTA TURMA. Resp 8768/SP –</p><p>RECURSO ESPECIAL 1991/0003774-5. REL. MIN. BARROS MONTEIRO. PUB.</p><p>06.04.1992).</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 15/16</p><p>[14] GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 9 ed. de acordo com o Novo</p><p>Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 591.</p><p>[15] SILVA, Américo Luiz Martins. O dano moral e sua reparação civil. 3. Ed. rev., atual. e</p><p>amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p.62.</p><p>[16] ANDRADE, André Gustavo Corrêa de. Dano moral e indenização punitiva: os punitive</p><p>damages na experiência do common law e na perspectiva do Direito brasileiro. Rio de</p><p>Janeiro: Forense, 2006, p.332.</p><p>[17] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em</p><p><http://www.stj.jus.br/SCON/pesquisar.jsp?</p><p>newsession=yes&tipo_visualizacao=RESUMO&b=ACOR&livre=AgRg%20no%20Ag%20850273>.</p><p>Acesso em 21/05/2013.</p><p>[18] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em</p><p><http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?</p><p>livre=REsp+883630&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=2>. Acesso em 21/05/2013.</p><p>[19] FACHINI NETO, Eugênio. A função social do direito privado. Revista Jurídica, São</p><p>Paulo, n. 349, nov. 2006, p. 90.</p><p>[20] IHERING, Rudolf von. A luta pelo direito. São Paulo: Martin Claret, 2002, p. 80</p><p>Autores</p><p>Andressa Lustosa Teixeira de Moraes</p><p>Marina Felinto Siqueira</p><p>Advogada, OAB/PI nº 13.551</p><p>Amanda Mendes Evangelista</p><p>Amanda Mendes Evangelista, advogada e pós-graduada em Direito</p><p>Constitucional (Anhanguera-UNIDERP).</p><p>Bárbara Maria Dantas Mendes Ribeiro</p><p>Advogada atuante</p><p>Informações sobre o texto</p><p>Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)</p><p>, Andressa Lustosa Teixeira de Moraes; SIQUEIRA, Marina Felinto et al. A quantificação</p><p>do dano moral à luz da sua função social. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862,</p><p>Teresina, ano 23, n. 5564, 25 set. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/67473.</p><p>https://andressalust.jus.com.br/publicacoes</p><p>https://jus.com.br/1781028-marina-felinto-siqueira/publicacoes</p><p>https://amandame.jus.com.br/publicacoes</p><p>https://jus.com.br/1783096-barbara-maria-dantas-mendes-ribeiro/publicacoes</p><p>https://andressalust.jus.com.br/publicacoes</p><p>https://jus.com.br/1781028-marina-felinto-siqueira/publicacoes</p><p>https://amandame.jus.com.br/publicacoes</p><p>https://jus.com.br/1783096-barbara-maria-dantas-mendes-ribeiro/publicacoes</p><p>https://jus.com.br/artigos/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social</p><p>05/09/2022 13:56 A quantificação do dano moral à luz da sua função social - Jus.com.br | Jus Navigandi</p><p>https://jus.com.br/imprimir/67473/a-quantificacao-do-dano-moral-a-luz-da-sua-funcao-social 16/16</p><p>Acesso em: 5 set. 2022.</p>