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1 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A CLÍNICA COM CRIANÇAS 
AULA 1 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Profª Marianne Bonilha 
 
 
 
 
 
2 
CONVERSA INICIAL 
Ao longo desta etapa, serão explorados temas como o surgimento da 
clínica psicanalítica com crianças, seu histórico, as mudanças conceituais da 
práxis psicanalítica com crianças desde o nascimento a partir dos principais 
autores, que deixaram as bases para o que atualmente existe no tratamento 
psicanalítico com crianças. Conheceremos nuances e diferenças entre autores 
que dedicaram sua pesquisa e prática clínica com crianças. 
É esperado que, ao final da etapa, você consiga: 
• Compreender a clínica com crianças. 
• Identificar os conceitos elaborados pelos principais psicanalistas, que 
influenciam a prática clínica até os dias atuais. 
• Conhecer o surgimento da psicanálise no Brasil. 
TEMA 1 – HISTÓRICO DA PSICANÁLISE COM CRIANÇAS 
A história da psicoterapia infantil se confunde com a história da psicanálise 
de crianças e, mais especificamente, com a história da própria psicanálise. A 
pesquisa freudiana acerca da sexualidade infantil como fator determinante das 
neuroses apresentou a aplicabilidade da análise com crianças. O caso do 
Pequeno Hans (1909) permitiu a Freud, por meio de desenhos e da transferência 
do pai de Hans, analisar o material inconsciente, o que se transformou nos 
primeiros alicerces da psicanálise com crianças. 
Nesse momento histórico, identificar três aspectos relevantes a se 
considerar pertencentes ao processo psicoterápico infantil: o vínculo parental, o 
grafismo e a escuta do profissional. Ainda que, no meio psicanalítico, trata-se de 
uma situação em que o próprio pai do paciente tenha manejado a análise do 
filho, há que se considerar que, sem a efetividade da escuta de Freud no manejo 
do caso, Max Graf (pai de Hans) não interviria. Com isso, em 1909, Freud 
inaugurou a possibilidade da clínica com crianças (Almeida; Freire; Próchno, 
2016). 
 
3 
 
1.1 O Início da psicanálise com crianças No Brasil 
A psicanálise infantil teve seu início no Brasil dentro campo da medicina, 
da psiquiatria e da pedagogia. Na década de 1920, as ideias e descobertas 
freudianas já estavam circulando nos meios culturais e científicos brasileiros da 
época. A partir de então, tanto no âmbito da saúde mental, na psiquiatria, como 
cultural, educacional, filosófico e nas artes, os conhecimentos psicanalíticos 
começaram a exercer sua influência (Abraão, 2009). 
Por meio de Sigmund Freud, Melanie Klein e Anna Freud, os 
conhecimentos acerca do desenvolvimento das crianças exerceram 
ascendência sobre os cuidados na saúde e na educação. A psicanálise de 
crianças contribuiu para a educação e na resolução de problemas escolares, 
bem como complemento no tratamento de crianças com problemas emocionais 
no meio psiquiátrico (Abraão, 2009). 
O movimento da Escola Nova (1930), que acontecia no campo da 
pedagogia, foi um meio propício para os novos ensinamentos psicanalíticos, 
coincidindo com a nova proposta educacional, que entendia a criança como um 
ser em desenvolvimento, com características e necessidades diferentes do 
adulto (Abraão, 2009). As dificuldades escolares enfrentadas pela criança 
ganharam uma nova lente de observação e manejo, contribuindo para a solução 
de dificuldades. 
Podemos considerar que o emprego da teoria psicanalítica na prática de 
assistência às crianças nas clínicas de orientação infantil teve um caráter muito 
mais profilático que terapêutico, ou seja, a utilização do referencial psicanalítico 
na avaliação da criança e na orientação de pais para compreender e resolver as 
manifestações sintomáticas surgidas na infância tinha por finalidade última 
promover a higiene mental – ou a saúde mental, para empregarmos uma 
terminologia mais atual –, o que, supostamente, garantiria o desenvolvimento de 
uma personalidade saudável, com menores possibilidades de apresentar 
distúrbios neuróticos na vida adulta (Abraão, 2009). 
Foi o psiquiatra Durval Marcondes (1899–1981) que, em 1939, publicou A 
criança-problema, que inaugurou, em 1938, influenciado pela psicanálise, a 
primeira clínica de orientação como assistência à criança, promovendo uma 
primeira modalidade de cuidado à saúde emocional das crianças no Brasil. Além 
da Seção de higiene mental escolar, de Durval Marcondes, em São Paulo, criou-
se, no Rio de Janeiro, no comando clínico de Arthur Ramos, a Seção de 
 
 
4 
ortofrenia. Assim como na Europa, próprio berço da psicanálise, aqui no Brasil, 
em um primeiro momento, a utilização da psicanálise de crianças voltou-se mais 
para contribuições na educação, adaptação e orientação aos pais. Muito bem 
apontado por Oliveira (2002), convém lembrar que, mesmo sendo inovadora, 
essa concepção, que visa tanto a "prevenção" quanto a "correção" dos "desvios 
de comportamento", se caracteriza por princípios de "adaptação" da "criança 
problema" ao meio social e à família, e se inscreve na continuidade do projeto 
higienista da época, enquanto expressão da ideologia totalitária de Getúlio 
Vargas, cujo objetivo era a formação de uma juventude sã, instruída e patriótica. 
No Brasil, o governo totalitário vigente se beneficiava com o que havia de 
mais moderno acerca do conhecimento sobre tratamento do psiquismo infantil 
por meio da psiquiatria e da pedagogia. As clínicas de orientação infantil desse 
período não praticavam uma abordagem terapêutica com a criança, mas uma 
intervenção no meio familiar e escolar, havendo tanto uma preocupação com o 
aspecto cognitivo quanto o emocional. 
O fruto dessas experiências acabou propiciando a superação do 
atendimento à criança baseado no diagnóstico e na orientação preventiva e 
tornou possível o surgimento da psicoterapia analítica de crianças. Com isso, 
nos anos de 1950, iniciou-se uma nova orientação clínica com a realização do 
tratamento psicanalítico com crianças. 
Dois fatos impulsionaram isso: a criação em São Paulo, do Curso de 
Especialização em Psicologia Clínica da Universidade de São Paulo (USP), em 
1954, e, no Rio de Janeiro, a criação das clínicas de orientação infantil, uma do 
Departamento Nacional de Saúde Mental (Dinsam), sob a responsabilidade da 
médica, psiquiatra e futura psicanalista Maria Manhães, e a outra do Instituto de 
Psiquiatria da então Universidade do Brasil, fundado em 1953 por Maurício de 
Medeiros (Oliveira, 2002). Nesse período, o pensamento kleiniano influenciou 
maciçamente a prática da psiquiatria, e, provavelmente, por esse motivo abriu-
se espaço para a psicoterapia realizada com a criança. 
Foi somente em 1962 que a psicologia como profissão foi regulamentada 
no Brasil. Perceba como a psicoterapia infantil acontecia antes e fora da 
psicologia como profissão, especialmente entre médicos, psicanalistas e 
pedagogos. A clínica com crianças e a psicoterapia infantil são práticas em várias 
áreas além da psicologia. Apenas quando a finalidade é realizar avaliação 
 
 
5 
psicológica formal da personalidade, com uso de testes psicológicos, é que 
passa a ser uma prática privativa de psicólogos. 
Em uma retrospectiva histórica, podemos identificar autores que deram 
ênfase para o atendimento psicanalítico de crianças e alguns deles serão 
apresentados a seguir: 
• Hermine von Hug-Hellmuth. 
• Anna Freud. 
• Melanie Klein. 
• Donald Winnicott. 
• Françoise Dolto. 
• Maud Mannoni. 
TEMA 2 – FINALIDADES EDUCATIVAS E ADAPTATIVAS 
A sistematização de uma clínica psicanalítica com crianças atendeu 
inicialmente, uma demanda de adaptação da criança à sociedade e ao contexto 
escolar. Nesse período, destacam-se Hermine von Hug-Hellmuth e Anna Freud. 
2.1 Hermine von Hug-Hellmuth 
Em sequência à experiência freudiana com o pequeno Hans, Hermine von 
Hug-Hellmuth (1871–1924), ainda que desconhecida, foi a pioneira da 
psicanálise infantil. Von Hug-Hellmuth filiou-se à Sociedade Psicanalíticade 
Viena em 1913 e publicou artigos no periódico Imago, fundado por Freud, 
voltados para a técnica de jogos e desenhos, Hermine acreditava que o analista 
não precisava interpretar aspectos inconscientes das crianças, bastando o ato 
de brincar sem que precisassem falar. 
Hermine divergia da ideia de um pai analisar o próprio filho. Para ela, uma 
criança jamais revelaria seus íntimos pensamentos aos próprios pais, já que 
dificilmente suportariam escutar em razão do narcisismo parental (Camarotti, 
2010). Esse posicionamento deu maior importância e seriedade ao tratamento 
psicoterapêutico de crianças. 
Hermine conciliava os objetivos psicanalíticos com os da escola e da 
sociedade, em uma proposta que se assemelhava à ideia de uma pedagogia 
curativa. Talvez seja pelo fato da trágica morte de Hermine von Hug-Hellmuth, 
em 1924, assassinada pelo sobrinho, que seu destaque na história da 
 
 
6 
psicanálise com crianças tenha sido eclipsado. E, após sua morte, duas outras 
correntes ganharam destaque na psicanálise de crianças: a de Anna Freud e a 
de Melanie Klein. 
2.2 Anna Freud 
Anna Freud (1895–1982), com uma perspectiva semelhante à de 
Hermine, valorizou aspectos educativos em sua clínica, sustentando a 
prevalência da adaptação do comportamento às pressões sociais 
(família/escola) em detrimento das questões inconscientes, caracterizando uma 
clínica de supressão de sintomas (Calvazara, 2013). 
Anna Freud era formada em pedagogia e a experiência de observação do 
desenvolvimento de crianças manteve prevalência em sua prática na análise de 
crianças. A compreensão de sintoma de Anna Freud perpassava um conflito 
entre o eu e o mundo exterior, manifestado em um comportamento inadequado. 
Para ela, o desaparecimento do sintoma possibilitaria o fim do conflito. Sua 
prática clínica buscava fortalecimento do ego, havendo uma ênfase nos aspectos 
conscientes dos comportamentos em detrimento da estrutura inconsciente 
(Calvazara, 2013). 
Para Anna Freud, a criança não possuía condições para uma análise 
como a de adultos por três aspectos: 
• não tinha consciência da doença, 
• não tinha confiança na análise e no analista; 
• a decisão de se analisar não era dela. 
A autora somente atendia crianças acima de 5 anos e defendia ainda que, 
ao contrário do tratamento analítico com adultos, em vez de ajudar a superar o 
recalque, o analista deveria controlar, além de decidir o que deveria ser rejeitado, 
domado ou satisfeito, exercendo, assim, uma ação educativa (Costa, 2010). 
Segundo Corso (1998), “Anna Freud como pedagoga que era, apostou na 
reestruturação de um sujeito ainda criança através de uma liberação de impulsos 
recalcados e a colocação destes sob a égide educativa do ideal da analista”. 
Anna utilizava o brincar como forma de atrair a criança para a análise e, muito 
mais do que com esse recurso, trabalhava principalmente com os sonhos e com 
os desenhos das crianças justamente por revelarem transposições diretas de 
desejo, dando pouca ênfase à atividade lúdica e sua compreensão. O brincar, 
 
 
7 
para Anna Freud, era expressivo, porém não representativo, não simbólico. 
Pode-se dizer que a condução da análise pretendia uma descarga libidinal para 
uma reeducação dos impulsos. 
Pode-se considerar que a obra de Anna Freud contribuiu para a psicologia 
do ego, particularmente com seus ensinamentos sobre o desenvolvimento 
infantil e os mecanismos de defesa do ego. 
TEMA 3 – CLÍNICA COM CRIANÇAS BEM PEQUENAS 
Diferentemente da perspectiva de Hermine e Anna Freud, Melanie Klein 
se interessou pela análise de crianças pequenas. Se Anna Freud estava 
envolvida com a pedagogia, atendia crianças a partir dos 5 anos e gostaria de 
saber a respeito do funcionamento do ego e seus mecanismos de defesa 
adaptativos, Klein se voltava para as crianças menores e pela manifestação do 
inconsciente. 
Winnicott também acompanhou o interesse de Klein pelas crianças 
menores de 5 anos. Pode-se dizer que são dois autores de muita relevância para 
a compreensão dos aspectos inconscientes das crianças pequenas e pelo 
funcionamento primitivo do psiquismo que se manifesta, ainda que 
pontualmente, ao longo de toda a vida das pessoas. 
3.1 Melanie Klein 
Com Melanie Klein (1882 –1960), a psicanálise com crianças abandonaria 
a via educativa e daria seguimento aos fundamentos freudianos acerca do sujeito 
do inconsciente e do método clínico. Enquanto que, para Hug-Helmuth e Anna 
Freud, o brincar era apenas um meio de conduzir a relação entre a criança e o 
analista, para Melanie Klein, o brincar seria, por excelência, a linguagem da 
criança. As construções kleinianas acerca do psiquismo dos bebês, relembrando 
particularmente quanto à posição esquizoparanoide e à posição depressiva, 
permitiram-lhe a percepção do sujeito em construção, o que implicou que ela 
desse lugar para o inconsciente, na sessão, com seus pequenos pacientes. 
Durante seus atendimentos, Klein deixava acontecer a livre expressão, 
sem pressões morais, recorrendo a interpretações do material inconsciente 
revelado pelo paciente durante o brincar (Almeida; Freire; Próchno, 1981). As 
interpretações dos comportamentos das crianças eram dadas diretamente para 
 
 
8 
elas. Klein empregava uma abordagem interpretativa nomeando as angústias 
dos pequenos pacientes, trazendo à consciência suas fantasias edípicas. 
Por meio das atividades escolhidas pelo paciente na sequência das 
sessões (de acordo com o tipo de brincadeira, se mais agressividade ou menos, 
se mais suja ou bagunçada), Klein percebia a diferença de comportamento da 
criança, sinalizando diminuição da ansiedade. Para a autora, a função do 
analista seria abrandar a severidade do supereu primitivo, que é extremamente 
cruel, e não influenciar o eu da criança a controlar os impulsos provenientes do 
desejo. 
Para Klein (1991), a participação dos pais se resumia a uma anamnese 
antes de iniciar o atendimento com a criança. A seu ver, era desnecessária as 
informações dos pais, pois estavam influenciadas pelos próprios conflitos (Nasio, 
1995; Costa, 2010). Melanie Klein transpôs a livre associação para o brincar, 
para as manifestações da criança, inaugurando, de fato, uma psicanálise com 
crianças (Klein, 1991). 
3.2 Donald Winnicott 
A compreensão do brincar ganha com Donald Winnicott (1896–1971) uma 
amplitude particular. Médico e psicanalista, Winnicott acreditava que o brincar 
era aspecto fundamental no trabalho analítico, imbuído da função de 
representação dos objetos e de si próprio. Para o autor, a atividade lúdica no 
setting analítico permitiria o exercício da espontaneidade e da criatividade. 
O brincar, na concepção de Winnicott, era universal na natureza humana 
e terapêutico por si só (Fulgencio, 2008). Ele propôs que o lugar do analista 
deveria ser similar ao de uma mãe quando exerce a função de holding, que 
corresponderia à sustentação psíquica, atento às necessidades do paciente. 
Quanto à técnica, Winnicott “preferia desenhar com a criança, fazendo-lhe 
perguntas e sugestões de modo a despertar o seu interesse em falar de coisas 
que, normalmente, não falaria com outras pessoas” (Costa, 2010). 
Assim como Melanie Klein, Winnicott debruçou-se sobre o uso da 
psicanálise com pacientes psicóticos e deu especial atenção à utilização do 
método com pacientes com tendência antissocial. Vale considerar que o 
funcionamento mental de crianças bem pequenas é muito regido pelo princípio 
do prazer, com pouca influência do superego ainda, por isso se compreende que 
estudar o psiquismo de bebês dá base para compreender a psicose no adulto. 
 
 
9 
Klein e Winnicott pertenciam ao grupo de psicanalistas com atuação na 
Inglaterra. Naquela época, já se destacava Jacques Lacan (1901–1981) na 
França. 
TEMA 4 – AUTORES LACANEANOS 
Ainda que Lacan não tenha se dedicado clinicamente ao atendimento de 
crianças, seu ensinoinfluenciou diretamente Françoise Dolto (1908–1988) e 
Maud Mannoni (1923–1988), duas psicanalistas de crianças que se destacaram 
no círculo psicanalítico francês. 
4.1 Françoise Dolto 
Françoise Dolto marcou profundamente a psicanálise com crianças. 
Contemporânea de Lacan, participava dos seminários deste e foi bastante 
influenciada por suas ideias. Inicialmente, Dolto, em sua prática pediátrica 
(medicina era sua formação acadêmica original), mantinha um olhar especial 
para o aspecto emocional acerca do adoecimento das crianças. Sua 
aproximação e entrada na psicanálise influenciaram cada a vez mais a leitura do 
corpo das crianças como um corpo erógeno, possibilitando a leitura de muitos 
sintomas físicos relacionados a aspectos inconscientes. A disseminação de suas 
ideias, amplamente divulgadas na França da época, contribuíram para a 
psicoterapia com crianças, já que punham em evidência os possíveis sintomas 
infantis. 
Dolto (Dolto; Nasio, 1991) deixou seus ensinamentos quanto à condução 
e manejo na análise de crianças. Sua postura quanto ao método fica claro: “Um 
psicoterapeuta deve se conduzir ao contrário de um professor ou de um mestre” 
e segue recomendando que “deve possibilitar a expressão e o alívio de angústias 
decorrentes de acontecimentos traumatizantes, permitindo-lhes reviverem-nos 
na situação paciente- psicoterapeuta” (Dolto; Nasio, 1991). 
A autora desenvolveu uma prática clínica com bebês/clínica precoce. O 
atendimento acontecia com a presença do pai ou da mãe e da criança pequena 
ou do bebê e se dava por meio da fala/linguagem dos pais. Na clínica com 
crianças, Dolto atendia os pais na presença da criança nas entrevistas iniciais e 
depois atendia apenas a criança, mas sempre convidando os pais, com certa 
frequência, para trazer colocações pertinentes que pudessem influenciar a 
 
 
10 
dinâmica familiar e, por consequência, influenciando no sintoma da criança. 
Diferentemente de Melanie Klein e de Winnicott, Dolto incluía a participação dos 
pais no tratamento das crianças. 
Dolto afirmava que uma das diferenças entre a psicanálise de adultos e a 
de crianças muito pequenas residia no fato de as crianças ainda não atingirem o 
Édipo, nem sequer atravessavam os componentes pulsionais orais e anais que 
o precederam. O trabalho consiste, nesse caso, em compreender como está a 
relação mãe-filho e pai-filho, e o que ocorre com a desenvoltura motora, a 
linguagem verbal, a identidade sexuada da criança, sua autonomia e seu desejo 
(Costa, 2010). 
Para ela, a transferência da família no trabalho era fundamental. Para 
Dolto (Dolto; Nasio, 1991), a construção da criança como sujeito ocorria por meio 
dos dizeres parentais, no sentido de que a linguagem preexistiria ao sujeito. A 
autora entendia que o sintoma da criança seria o sintoma da família e, por isso, 
era preciso dar lugar aos pais no processo terapêutico. 
4.2 Maud Mannoni 
Outra importante psicanalista, influenciada pelo pensamento de Lacan, foi 
Maud Mannoni. Sua formação como psicanalista de crianças se deveu a Dolto, 
e a elaboração teórica de sua experiência, ao ensino de Lacan. Para ela, o 
campo em que o analista operava seria o da linguagem (mesmo se a criança 
ainda não falasse). No setting analítico, o discurso que se processa engloba os 
pais, a criança e o analista, um discurso coletivo que se constitui em torno do 
sintoma apresentado pela criança (Mannoni, 1971). 
Mannoni se destacou por posicionamentos vanguardistas sobre a loucura, 
a antipsiquiatria e a psicanálise com crianças. Fundou a Escola de Bonneuil, 
centro de referência em atendimento e educação para crianças autistas. Para 
ela, assim como o paciente psicótico, a criança chegava ao analista pela queixa 
de um outro com relação ao sintoma dela. Para a autora, o analista, ao receber 
uma criança em tratamento, deveria fazer uma escuta atenta dos pais, 
principalmente das mães que estabelecem uma espécie de fusão fantasmática 
em relação ao filho doente. O sintoma da criança preencheria, no discurso 
familiar, “o vácuo que aí cria uma verdade que não é dita” (Mannoni, 1971). 
Para Mannoni (1971), não se tratava de fazer uma terapia familiar, mas 
entendia que, ao ouvir as angústias dos pais, devia-se atentar aos significantes 
 
 
11 
que constituíam o fantasma que atravessava a narrativa do sujeito, a história que 
o constituiu. A autora entendia que o analista de crianças precisava estar atento 
aos efeitos que o sintoma destas produzia nos pais, o lugar que a doença do 
filho ocupava na doença dos próprios pais, que estava relacionada à dinâmica 
edípica destes na história da criança. Ou seja, é com base na reconstrução da 
história dos sujeitos (filhos que agora se tornaram pais) em sua relação com a 
criança, que é possível reordenar as fantasias que estruturam os sintomas. 
Mannoni achava que o analista de crianças enfrentava constantemente 
uma situação transferencial que englobava os pais. O uso de brinquedos ocorria 
de modo diferente da perspectiva kleiniana. Os brinquedos não tinham 
significado preconcebido a cada material. O importante era o que a criança falava 
sobre o brinquedo, sustentando em sua clínica a prevalência do simbólico em 
detrimento do imaginário. 
TEMA 5 – SÓ HÁ PSICANÁLISE DO SUJEITO E NÃO DA CRIANÇA 
A influência da psicanálise lacaniana no atendimento de crianças ganha 
destaque com Rosine (1920 a 2007) e Robert Lefort, contemporâneos de Lacan. 
Os especialistas desenvolveram uma prática com crianças institucionalizadas, 
em situação de abandono familiar, bem como autistas. Foram responsáveis pelo 
tratamento de sujeitos cujo destino parecia inicialmente reduzido ao de serem 
observados, falados e conduzidos em suas vidas por algum outro (Scalzo; 
Lustoza, 2020). A prática tinha a perspectiva de um tratamento psicanalítico com 
crianças que tinham a vivência de apagamento enquanto sujeitos diante do 
Outro. 
A frase “a psicanálise é uma” é dos Lefort e essa tese do casal se refere 
à ideia de que todo sujeito tem direito de ser escutado, seja um bebê, uma 
criança, um adolescente ou um adulto, considerando as operações de causação 
do sujeito, que, fundamentadas nos registros real, simbólico e imaginário, dizem 
respeito a qualquer sujeito, ainda que em tempo de constituição. O argumento 
se refere à noção de que o que se escuta em psicanálise é o sujeito do 
inconsciente, deslocando-se de teorias desenvolvimentistas. 
Tal afirmação não destitui a existência de certas particularidades no 
tratamento de crianças. De fato, parece pouco provável que uma criança de tenra 
idade passe a sessão deitada no divã associando livremente. A aposta lefortiana 
no sujeito – aquele que é capaz de falar e testemunhar do lugar que ocupa no 
 
 
12 
Outro – indica o conceito de sujeito como operador na prática clínica, articulando-
se necessariamente à posição do analista e de seu desejo (Scalzo; Lustoza, 
2020). 
O ato do psicanalista na clínica com crianças pequenas pode se 
aproximar ao de um agenciamento da função materna, quando: opera 
supondo um sujeito pelo caminho de acolher a criança no discurso e 
no desejo, fazendo traduções simbólicas que antecipe a configuração 
de um “eu sou” na criança, engajando-a num saber a fim de permitir o 
desenvolvimento do seu funcionamento subjetivo, e por isso também, 
cognitivo, enlaçando-a no social. (Neves; Vorcaro, 2010) 
A experiência lefortiana, oriunda da prática psicanalítica com crianças 
pequenas institucionalizadas, com funcionamento psíquico-autístico, psicótico 
ou neurótico grave, em seus primeiros anos de vida, permitiu ampliar a práxis 
psicanalítica para além do paciente adulto em consultório. Por meio do caso 
Nádia, Rosine Lefort colocou à prova a psicanálise como possibilidade de 
intervenção com tais crianças. Nesse caso, a psicanalista experienciou o 
atendimento com uma menina de um ano e três meses, que se encontrava em 
umaposição de hospitalismo (Spitz). 
Nesse contexto, a nuance é de que a intervenção psicanalítica, como 
refere Neves e Vorcaro (2010) “permite a simbolização na construção de uma 
imagem corporal delimitada, de modo a oferecer sentido à condição do infans, 
incluindo a criança no campo social, considerando-a, portanto, um sujeito”. A 
atitude ativa e acolhedora de Rosine com a paciente, em que verbalmente 
antevia a existência subjetiva de Nádia, por meio de uma atitude verbal, em que 
reconhecia e articulava as manifestações corporais da paciente (Neves; Vorcaro, 
2010), permitiu a inserção desta no campo do desejo. 
Os ensinamentos do casal apontavam que, independentemente da 
estrutura clínica, psicótico ou não, o paciente será tomado como sujeito, inserido 
na cadeia significante, mesmo que pudesse ou não, ele mesmo, fazer discurso. 
É nesse sentido que não há especificidade na psicanálise de crianças. A 
estrutura, o significante e a relação com o Outro não concernem de maneira 
diferente à criança e ao adulto. Em função disso, para Rosine e Robert Lefort, 
não existe uma psicanálise para o adulto e uma psicanálise infantil, mas uma 
psicanálise também utilizada com crianças. 
 
13 
 
NA PRÁTICA 
Vamos pensar em um caso da paciente de nome fictício Alice, de 4 anos, 
que se encontra abrigada por perda da guarda dos pais (pai suspeito de abuso 
sexual e mãe internada por tentativa de suicídio). Paciente apresenta um 
comportamento contido, timidez e, frente ao convite de acompanhar a 
psicanalista até a sala de atendimento, a criança começa a chorar e a dizer que 
não gosta da psicanalista, recusando-se a acompanhá-la. Diante desse fato, a 
profissional pergunta à menina por que ela não gosta dela. 
A paciente continua a chorar e diz que não gosta dela. A psicanalista, 
diante da recusa da paciente, se senta próximo dela, na sala de espera, e 
pergunta se pode ali permanecer. A paciente, fazendo uma expressão chorosa 
e sentida, repete que não gosta da psicanalista, que ela (a psicanalista) também 
não gosta dela. 
Por mais duas vezes agendada a consulta, Alice repete o mesmo 
comportamento, acrescentando, a cada ida à consulta, falas sobre a mãe. 
Exemplo: que “ela (a mãe) não estava indo lá”, “que ela não lembrava o nome 
da mãe”, que ela “estava com saudade da mãe”. Em cada uma das falas da 
paciente, a psicanalista conversava com ela perguntando sobre onde a mãe 
estava, pesquisando o nome da mãe para relembrarem juntas, conversando 
sobre a saudade que Alice sentia da mãe. 
A psicanalista foi dando lugar para a dor e a tristeza da paciente, para a 
destituição subjetiva que ela estava enfrentando. Justamente por isso e, ao 
mesmo tempo, nomeando, dando lugar, dando sentido e possibilidade de 
representar o sofrimento que a paciente enfrentava. Assim sendo, podemos 
reconhecer a possibilidade de escuta do sujeito, como Rosine e Robert Lefort 
indicaram, independentemente da idade. 
FINALIZANDO 
Podemos compreender que a infância sempre ocupou lugar central no 
desenvolvimento da psicanálise, considerando que a estruturação psíquica 
circunscreve ponto fundamental de seus alicerces. Desenvolveu-se acerca do 
surgimento da psicanálise no Brasil e seu contexto histórico. 
 
 
14 
Nesta etapa, foram apresentados autores que são referência para a 
compreensão dos fundamentos teóricos dessa modalidade de tratamento: 
• Hermine Von Hug-Hellmuth. 
• Anna Freud. 
• Melanie Klein. 
• Donald Winnicott. 
• Françoise Dolto. 
• Maud Mannoni. 
Além disso, trouxemos as contribuições de Robert e Rosine Lefort, com o 
desenvolvimento da prática psicanalítica com crianças em instituições. 
 
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