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Edição 2024.1 Revisada Atualizada Ampliada Direito Processual Civil PROCESSO DE EXECUÇÃO e PROCEDIMENTOS ESPECIAIS CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 1 DIREITO PROCESSUAL CIVIL 3 APRESENTAÇÃO................................................................................................................................ 9 TUTELA PROVISÓRIA ...................................................................................................................... 10 1. TUTELAS PROVISÓRIAS NA DOUTRINA ............................................................................... 10 1.1. TUTELA ANTECIPADA (SATISFATIVA PROVISIONAL DE URGÊNCIA) ....................... 10 1.2. TUTELA CAUTELAR (CONSERVATIVA PROVISIONAL DE URGÊNCIA) ...................... 10 1.3. TUTELA DE EVIDÊNCIA (SATISFATIVA PROVISIONAL) ............................................... 10 2. TUTELAS PROVISÓRIAS E O CPC/15 .................................................................................... 10 3. PRINCIPAIS QUESTÕES .......................................................................................................... 11 3.1. FIM DAS CAUTELARES EM ESPÉCIE E DO LIVRO III DO CPC/73 ............................... 11 3.2. SUMARIEDADE DA COGNIÇÃO ....................................................................................... 12 3.3. URGÊNCIA OU PREVENTIVIDADE .................................................................................. 12 3.4. REVERSIBILIDADE ............................................................................................................ 13 3.5. INEXISTÊNCIA DE COISA JULGADA MATERIAL ............................................................ 13 3.6. FUNGIBILIDADE ................................................................................................................. 13 3.7. RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR DANO PROCESSUAL....................................... 14 3.8. RETIRADA DO EFEITO SUSPENSIVO DA APELAÇÃO .................................................. 14 3.9. RECURSO CABÍVEL DA DECISÃO SOBRE A TUTELA PROVISÓRIA .......................... 15 4. TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE.................................................................................. 15 4.1. PREVISÃO LEGAL E CONSIDERAÇÕES ......................................................................... 15 4.2. INICIAL SUMARIZADA ....................................................................................................... 16 4.3. DECISÃO E ADITAMENTO/EMENDA NOS MESMOS AUTOS ....................................... 16 4.4. ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE ...................................... 17 4.4.1. Funcionamento da técnica de estabilização no Brasil ................................................ 17 4.4.2. Extinção e honorários .................................................................................................. 17 4.4.3. Hipóteses de não cabimento da estabilização ............................................................ 18 4.4.4. Condições para não ocorrência da estabilização ....................................................... 18 4.4.5. Revisão, reforma ou invalidação da tutela antecedente estabilizada ......................... 19 4.4.6. Prazo para ação revisional .......................................................................................... 19 4.4.7. Coisa julgada e cabimento de ação rescisória ............................................................ 19 5. TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE ..................................................................................... 20 5.1. PREVISÃO LEGAL E CONSIDERAÇÕES ......................................................................... 20 5.2. INICIAL SUMARIZADA ....................................................................................................... 21 5.3. PROCEDIMENTO ............................................................................................................... 21 5.4. FORMULAÇÃO DO PEDIDO PRINCIPAL ......................................................................... 22 6. TUTELA DA EVIDÊNCIA ........................................................................................................... 23 6.1. PREVISÃO LEGAL E CONSIDERAÇÕES ......................................................................... 23 6.2. PETIÇÃO INICIAL ............................................................................................................... 24 6.3. HIPÓTESES DE CABIMENTO ........................................................................................... 24 6.4. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO LIMINAR ................................................................... 24 PROCEDIMENTOS ESPECIAIS ....................................................................................................... 25 1. ASPECTOS INTRODUTÓRIOS ................................................................................................. 25 2. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO ........................................................................ 26 2.1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 26 2.2. CONSIGNAÇÃO EXTRAJUDICIAL .................................................................................... 27 2.2.1. Requisitos da consignação extrajudicial ..................................................................... 27 CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 2 2.2.2. Procedimento da consignação extrajudicial ................................................................ 28 2.3. COMPETÊNCIA .................................................................................................................. 29 2.4. LEGITIMIDADE ................................................................................................................... 29 2.5. OBJETO DA DEMANDA CONSIGNATÓRIA ..................................................................... 29 2.6. PROCEDIMENTO ............................................................................................................... 31 2.7. COMPLEMENTAÇÃO DO DEPÓSITO .............................................................................. 33 2.8. CONSIGNAÇÃO EM PRESTAÇÕES SUCESSIVAS ........................................................ 34 2.9. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO FUNDADA NA DÚVIDA REFERENTE À TITULARIDADE DO CRÉDITO ....................................................................................................................................... 35 2.10. CONSIGNATÓRIA DE ALUGUÉIS E OUTROS ENCARGOS LOCATÍCIOS ................... 36 3. AÇÃO DE EXIGIR CONTAS ...................................................................................................... 39 3.1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 39 3.2. CONDIÇÕES DA AÇÃO ..................................................................................................... 41 3.3. NATUREZA DÚPLICE ........................................................................................................ 42 3.4. COMPETÊNCIA .................................................................................................................. 42 3.5. PROCEDIMENTO ............................................................................................................... 43 3.6. PROCEDIMENTO ............................................................................................................... 43 4. AÇÕES POSSESSÓRIAS.......................................................................................................... 48 4.1. PROTEÇÃO POSSESSÓRIA ............................................................................................. 48 4.2. FUNGIBILIDADE .................................................................................................................útil do processo. Parágrafo único. Caso entenda que o pedido a que se refere o caput tem natureza antecipada, o juiz observará o disposto no art. 303. a) Lide e seu fundamento, indicação do pedido principal. b) Exposição sumária do direito - probabilidade (fumus boni iuris). c) Risco ou perigo de dano ou ao resultado útil do processo: urgência (periculum in mora). d) Valor da causa do pedido principal - o recolhimento de custas ocorrerá aqui, conforme art. 308, parte final. 5.3. PROCEDIMENTO Regulado nos arts. 306 e 307 do CPC. Vejamos: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 22 Art. 306. O réu será citado para, no prazo de 5 (cinco) dias, contestar o pedido e indicar as provas que pretende produzir. Art. 307. Não sendo contestado o pedido, os fatos alegados pelo autor presumir-se-ão aceitos pelo réu como ocorridos, caso em que o juiz decidirá dentro de 5 (cinco) dias. Parágrafo único. Contestado o pedido no prazo legal, observar-se-á o procedimento comum. 5.4. FORMULAÇÃO DO PEDIDO PRINCIPAL No regime do CPC/73, deferida a cautelar a ação principal deveria ser proposta em 30 dias. Com o CPC/15, o pedido principal é feito na própria cautelar. Não há o ajuizamento de uma nova ação. Imagine, por exemplo, que o juiz conceda o arresto antecedente. A parte terá 30 dias para transformar, através de aditamento ou emenda, o pedido de arresto em execução. Assim, não há o ajuizamento de uma nova ação, mas sim a transformação da cautelar antecedente no próprio pedido principal. Art. 308. Efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de ser formulado pelo autor no prazo de 30 (trinta) dias, caso em que será apresentado nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar, não dependendo do adiantamento de novas custas processuais. Destaca-se que o prazo de trinta dias úteis é contado da data da efetivação da medida cautelar. Além disso, há exceções lógicas que impedem o curso do prazo de trinta dias, quais sejam: • Indeferimento da cautelar • Casos de cautelares conservativas de créditos ainda não vencidos (CPC, art. 786). Aqui, há um impedimento para o exercício da cautelar conservativa, portanto, o prazo de trinta dias só será contado ao fim do impedimento. Não havendo a aditamento, haverá a extinção sem análise do mérito e eventual cautelar concedida será cassada. Art. 309. Cessa a eficácia da tutela concedida em caráter antecedente, se: I - o autor não deduzir o pedido principal no prazo legal; II - não for efetivada dentro de 30 (trinta) dias; III - o juiz julgar improcedente o pedido principal formulado pelo autor ou extinguir o processo sem resolução de mérito. Parágrafo único. Se por qualquer motivo cessar a eficácia da tutela cautelar, é vedado à parte renovar o pedido, salvo sob novo fundamento. Por fim, não atendido o prazo legal de 30 dias para formulação do pedido principal em tutela cautelar requerida em caráter antecedente, a medida concedida perderá a sua eficácia e o procedimento de tutela antecedente será extinto sem exame do mérito. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 23 Deferido o pedido de concessão de tutela cautelar requerido em caráter antecedente, o autor deverá adotar as medidas necessárias para que a tutela seja efetivada dentro de 30 dias, sob pena de cessar a sua eficácia (art. 309, II, do CPC/2015). Após a sua efetivação integral, o autor tem a incumbência de formular o pedido principal no prazo de 30 dias, o que deverá ser feito nos mesmos autos e independentemente do adiantamento de novas custas processuais (art. 308 do CPC/2015). O prazo de 30 (trinta) estabelecido no art. 308 do CPC/2015, diferentemente do que ocorria no CPC/1973, não é mais destinado ao ajuizamento de uma nova ação para buscar a tutela definitiva, mas à formulação do pedido principal no processo já existente. Desse modo, a formulação do pedido principal é um ato processual, que produz efeitos no processo em curso. Consequentemente, esse prazo tem natureza processual, devendo ser contado em dias úteis (art. 219 do CPC/2015). Desatendido o prazo legal, a medida cautelar concedida perderá a sua eficácia (art. 309, I, do CPC/2015) e o procedimento de tutela cautelar antecedente será extinto sem exame do mérito. STJ. 3ª Turma. REsp 2.066.868-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/6/2023 (Info 780)1. 6. TUTELA DA EVIDÊNCIA 6.1. PREVISÃO LEGAL E CONSIDERAÇÕES Está disciplinada no art. 311 do CPC e nos procedimentos especiais (liminar de reintegração de posse, de busca e apreensão). Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando: I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte; II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante; III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa; IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente. 1 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Não atendido o prazo legal de 30 dias para formulação do pedido principal em tutela cautelar requerida em caráter antecedente, a medida concedida perderá a sua eficácia e o procedimento de tutela antecedente será extinto sem exame do mérito. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 02/04/2024 CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 24 Não há na tutela da evidência a necessidade de urgência, em virtude disso possui altíssima probabilidade do direito do autor, aliada à ausência de seriedade ou possibilidade de êxito da defesa. Trata-se de tutela satisfativa que dispensa a ocorrência do periculum in mora. 6.2. PETIÇÃO INICIAL A petição inicial deve ser completa, com a formulação do pedido principal. Por isso, afirma- se que tutela de evidência só pode ser requerida de forma incidental. Consequentemente, não há tutela de evidência antecedente. 6.3. HIPÓTESES DE CABIMENTO São quatro hipóteses, sem prejuízo das demais previstas em procedimentos especiais, quais sejam: • Abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório; Há autores que chamam de tutela de evidência sanção. • Alegações puderem ser comprovadas por documentos ou houver tese baseada em julgamento de casos repetitivos, bem como em súmula vinculante; • Ação de depósito – visa obrigar o depositário a entregar a coisa; • Inicial com prova documental suficiente dos fatos. Não cabe liminar. O juiz poderá julgar antecipadamente o mérito (art. 355, I) e, sem prejuízo, conceder na sentença a tutela da evidência, pois a apelação não terá efeito suspensivo (art. 1.012, § 1º, V). Há discussão acerca possibilidade de ampliação ou de interpretação extensiva dos incisos do art. 311 do CPC, autorizando a tutela da evidência, ao menos, nas hipóteses previstas no art. 927 do CPC (precedentes vinculantes). De acordo com inúmeras vozes da doutrina, caberia tutela da evidência em qualquer situação em que houvesse prova documental e precedente do art. 927 do CPC. Portanto, não precisaria ser apenas casos repetitivos ou súmula vinculante (CPC, art. 311, II). 6.4. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO LIMINAR Apenas nos casos dos incisos II e III do art. 303 do CPC/15 é possível que seja concedida de forma liminar. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 25 PROCEDIMENTOS ESPECIAIS 1.ASPECTOS INTRODUTÓRIOS Antes de iniciar o estudo dos procedimentos especiais, é preciso evidenciar quais são os procedimentos especiais a serem abordados. Procedimento especial, em síntese, é todo procedimento diferente do procedimento comum, disposto no Código de Processo Civil (CPC). Nesse sentido, é possível separar os procedimentos especiais previstos no CPC daqueles previstos na legislação extravagante. Salienta-se, a priori, que aqui serão abordados os procedimentos especiais elencados no CPC. Ainda inseridos no CPC, é possível dividir os procedimentos especiais em procedimentos especiais de jurisdição contenciosa e os procedimentos especiais de jurisdição voluntária. Novamente, ressalta-se que serão estudados somente os procedimentos especiais de jurisdição contenciosa, uma vez que são os mais relevantes tanto para a prática forense, quanto para a preparação em concursos. Em continuidade, também é importante destacar as principais diferenças referentes aos procedimentos especiais constantes no CPC de 1973 versus o atual CPC de 2015, especialmente aqueles que deixaram de existir e os que foram inseridos: CPC DE 1973 CPC DE 2015 Consignação em pagamento Consignação em pagamento Ação de depósito X Ação de anulação e substituição de títulos ao portador X Ação de prestação de conta Ação de exigir contas Ações possessórias Ações possessórias Ação de nunciação de obra nova X Ação de usucapião de terras particulares X Ação de divisão e demarcação de terras particulares Ação de divisão e demarcação de terras particulares Inventário e partilha Inventário e partilha Embargos de terceiro Embargos de terceiro Habilitação Habilitação Restauração de autos Restauração de autos Vendas a crédito com reserva de domínio X Ação monitória Ação monitória X Ação de dissolução parcial de sociedade X Oposição X Ações de família X Homologação de penhor legal X Regulação de avaria grossa No que se refere à exclusão da ação de depósito, salienta-se que havia nela a previsão da prisão civil do depositário infiel. Ocorre que a edição da Súmula Vinculante 25 pelo STF, a única CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 26 prisão civil aceitável no ordenamento jurídico brasileiro se tornou a prisão do devedor de alimentos, razão pela qual a ação de depósito deixou de existir. Súmula Vinculante 25: É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade de depósito. Outrossim, a também excluída ação de anulação e substituição de títulos ao portador se referia a um procedimento especial que tinha pouca utilização prática. A especialidade do referido procedimento era a de que havia necessidade da publicação de editais para dar oponibilidade a terceiros. No entanto, o legislador verificou que não seria necessário um procedimento especial complexo para tanto, bastando apenas a criação da possibilidade de publicação de editais no CPC: Art. 259. Serão publicados editais: II - na ação de recuperação ou substituição de título ao portador. Em continuidade, a ação de prestação de conta – que corresponde à ação de cobrança comum pelo procedimento comum – deixou de existir, restando somente a ação de exigir contas, que de fato exige a existência de um procedimento especial, conforme será visualizado posteriormente. A excluída ação de nunciação de obra nova, por sua vez, era uma espécie de ação possessória com hipóteses de cabimento bastante específicas. O que se buscava com o referido procedimento especial – suspender a execução de construções – atualmente é possível se de alcançar pelo procedimento comum. Por fim, a ação de usucapião de terras particulares continha especificidades concernentes à publicação de editais e citação pessoal dos confrontantes, disposições essas que, hodiernamente, estão previstas no art. 259, I, CPC e no art. 246, § 3º do CPC, respectivamente: Art. 259. Serão publicados editais: I - na ação de usucapião de imóvel; Art. 246. A citação será feita preferencialmente por meio eletrônico, no prazo de até 2 (dois) dias úteis, contado da decisão que a determinar, por meio dos endereços eletrônicos indicados pelo citando no banco de dados do Poder Judiciário, conforme regulamento do Conselho Nacional de Justiça. § 3º Na ação de usucapião de imóvel, os confinantes serão citados pessoalmente, exceto quando tiver por objeto unidade autônoma de prédio em condomínio, caso em que tal citação é dispensada. 2. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO 2.1. INTRODUÇÃO A consignação em pagamento é um fenômeno jurídico de Direito Material, regulamentado, inclusive, no Código Civil. Trata-se de uma forma atípica de extinção da obrigação, pois consiste em um direito do devedor de quitar sua obrigação, evitando, assim, as consequências prejudiciais da mora. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 27 Desse modo, a consignação ocorre quando o devedor deseja cumprir a obrigação mas encontra os seguintes empecilhos: 1) O pagamento não pode ser realizado em virtude da recusa do credor em recebê-lo ou em dar quitação. Ex.: o credor não quer entregar o recibo de pagamento ao devedor; 2) Quando existir um obstáculo fático ou jurídico alheio à vontade do dever que impossibilite o pagamento eficaz. Ex.: o devedor não sabe a quem pagar. 2.2. CONSIGNAÇÃO EXTRAJUDICIAL Está prevista no art. 539 do CPC: Art. 539. Nos casos previstos em lei, poderá o devedor ou terceiro requerer, com efeito de pagamento, a consignação da quantia ou da coisa devida. Trata-se de uma possibilidade aberta (opção/faculdade) ao devedor para que ele consiga resolver o seu problema sem necessitar do Poder Judiciário. A consignação extrajudicial é viável para qualquer tipo de consignação, inclusive a consignação de valores oriundos da relação locatícia (que segue o procedimento especial previsto na Lei de Locações). 2.2.1. Requisitos da consignação extrajudicial A consignação extrajudicial deve preencher os seguintes requisitos: 1) Consignação de dinheiro; Obs.: apesar de a consignação extrajudicial exigir a consignação de dinheiro, especialmente porque o devedor se valerá de instituição financeira, é importante ressaltar que existe a possibilidade de consignação em pagamento para entrega de coisa. 2) Existência no local do pagamento (sede da comarca) de estabelecimento bancário oficial ou particular, preferindo-se o primeiro quando existirem ambos; 3) Conhecimento do endereço do credor, em razão da necessidade de tal informação para que se realize a notificação; 4) Credor conhecido, certo, capaz e solvente, o que afasta a consignação nos casos de: a) Não se conhecer o credor (dúvida sobre a identidade física); b) Dúvida a respeito de quem é o credor (dúvida sobre a condição jurídica); c) Devedor incapaz, que não pode validamente receber ou dar quitação; CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 28 d) Credor insolvente ou falido, hipóteses nas quais o crédito deve ser destinado às respectivas massas; e) Existência de demanda judicial que tenha como objeto a prestação devida. 2.2.2. Procedimento da consignação extrajudicial Realizado o depósito perante a instituição financeira, o credor será cientificado pelo estabelecimento bancário por meio de carta com Aviso de Recebimento (AR) no prazo de 10 dias úteis. Obs.: o termo inicial de contagem do prazo de 10 dias é o retorno do AR, conforme disposto no art. 539, § 2º do CPC. Art. 539, § 1º Tratando-se de obrigação em dinheiro, poderá o valor ser depositado em estabelecimento bancário, oficial onde houver, situado no lugar do pagamento, cientificando-se o credor por carta com aviso de recebimento, assinado o prazo de 10 (dez) dias para a manifestação de recusa. § 2º Decorrido o prazo do § 1º, contado do retorno do aviso de recebimento, sem a manifestação de recusa, considerar-se-á o devedor liberado da obrigação, ficandoà disposição do credor a quantia depositada. A partir do momento que o credor receber o AR, ele poderá adotar 4 posturas distintas: 1) Comparecer à agência bancária e levantar o valor, ato que extingue a obrigação; 2) Comparecer à agência bancária e levantar o valor fazendo ressalvas quanto à sua exatidão, quando poderá cobrar por vias próprias a diferença, conforme definido pelo STJ: CONSIGNAÇÃO EXTRAJUDICIAL. CREDOR QUE LEVANTA A QUANTIA DEPOSITADA, OPONDO RESSALVAS QUANTO AO MONTANTE DO DÉBITO. INEXISTÊNCIA DEEXTINÇÃO DA DÍVIDA, PODENDO A DIFERENÇA RECLAMADA SER DISCUTIDA EMVIA PRÓPRIA. O levantamento da quantia depositada pelo credor, com ressalvas, não significa, por si só, extinção do total da dívida. É possível ao credor discutir, em via própria, a diferença por ele alegada. Recurso especial conhecido e provido. (STJ - REsp: 189019 SP 1998/0069229-0, Relator: Ministro BARROS MONTEIRO, Data de Julgamento: 06/05/2004, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJ 02/08/2004 p. 395). 3) Silenciar, entendendo-se que nesse caso houve aceitação tácita, de forma que a obrigação será reconhecida como extinta, ficando o valor depositado à espera do levantamento do credor; 4) Recusar o depósito mesmo sem qualquer motivação, hipótese em que o depositante poderá levantar o dinheiro ou utilizar o depósito já feito para ingressar com a ação consignatória no prazo de 30 dias, instruindo a petição inicial com a prova do depósito e da recusa, nos termos do § 3º do art. 539 do CPC: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 29 Art. 539, § 3º Ocorrendo a recusa, manifestada por escrito ao estabelecimento bancário, poderá ser proposta, dentro de 1 (um) mês, a ação de consignação, instruindo-se a inicial com a prova do depósito e da recusa. Ressalta-se o prazo de 30 dias serve tão somente para que o devedor não sofra os efeitos da mora. Assim, ultrapassado o referido prazo, o depósito extrajudicial perderá os seus efeitos, de modo que o autor deverá realizar um novo depósito, mas atualizado com correção monetária e juros moratórios desde o inadimplemento, em conformidade com o § 4º do art. 539 do CPC: Art. 539, § 4º Não proposta a ação no prazo do § 3º, ficará sem efeito o depósito, podendo levantá-lo o depositante. 2.3. COMPETÊNCIA A competência é o foro do lugar do pagamento, conforme definido no art. 540 do CPC: Art. 540. Requerer-se-á a consignação no lugar do pagamento, cessando para o devedor, à data do depósito, os juros e os riscos, salvo se a demanda for julgada improcedente. A depender da natureza da obrigação, a dívida pode ser de natureza quesível ou de natureza portável. No primeiro caso, o foro será o domicílio do autor-devedor. Já no segundo, será no foro de domicílio do réu-credor. É importante salientar que se trata de uma regra de competência relativa, eis que a competência pode ser alterada entre as partes mediante cláusula de eleição de foro. 2.4. LEGITIMIDADE O legitimado ativo natural da demanda consignatória é o devedor (que deseja cumprir a obrigação), podendo também ser os seus sucessores. Também podem ser legitimados ativos terceiros estranhos à relação jurídica estabelecida entre credor e devedor, sendo que: 1) No caso de terceiro juridicamente interessado ocorrerá sub-rogação, de modo que esse terceiro, extinta a obrigação por consignação, assume os direitos e ações do credor satisfeito frente ao devedor; 2) No caso de terceiro não interessado, não ocorre a sub-rogação, subentendendo-se que a consignação é mera liberalidade deste em favor do devedor. O legitimado passivo, por sua vez, é o credor. Havendo dúvida a respeito de quem seja o credor, caberá a formação de litisconsórcio passivo entre os possíveis credores. Ademais, caso o réu seja desconhecido, haverá citação por edital. 2.5. OBJETO DA DEMANDA CONSIGNATÓRIA CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 30 A demanda consignatória tem como objetivo permitir a extinção de uma obrigação sempre que o devedor não consegue realizar o pagamento, seja por resistência do credor em recebê-lo, seja em razão de obstáculo alheio à sua vontade. Assim, o objeto será ou o dinheiro, na hipótese de obrigação de pagar quantia certa, ou a coisa, em caso de obrigação de entregar coisa. O pedido do autor tem natureza meramente declaratória, apontando para a correção e suficiência do depósito realizado, sendo objeto de debate na demanda judicial justamente a correção de tal depósito. Em se tratando de obrigação de entregar coisa, o devedor não pode consignar o valor correspondente à coisa, uma vez que tal conduta modificaria a natureza da obrigação, consoante entendimento adotado pelo STJ: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 334 E 335, I DO NOVO CÓDIGO CIVIL; 535 E 890 DO CPC E DISSÍDIO PRETORIANO. PRETENSÃO DE DEPOSITAR DINHEIRO NO LUGAR DE COISA DEVIDA: SACAS DE SOJA. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. [...]. 3. Celebrado contrato entre as partes para a entrega de 372 sacas de soja de 60kg, a US $9,00 cada uma, sem estipulação de outra forma alternativa de cumprimento dessa obrigação, não é possível o uso da ação de consignação em pagamento para depósito em dinheiro daquilo que o devedor entende devido. 4. A consignação exige que o depósito judicial compreenda o mesmo objeto que seria preciso prestar, para que o pagamento possa extinguir a obrigação, pois "o credor não é obrigado a receber a prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa" (art. 313 do NCC) 5. Recurso especial não-provido. (STJ - REsp: 1194264 PR 2010/0086419-0, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 01/03/2011, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/03/2011). Assim sendo, somente a consignação da coisa devida é apta para liberar o credor da sua obrigação. Outrossim, na obrigação de pagar, apesar de parcela da doutrina entender que a certeza e liquidez da obrigação são imprescindíveis para o cabimento da ação consignatória, os Tribunais Superiores têm entendido que não é preciso ter valor líquido, sendo permitida, inclusive, a revisão incidental de cláusulas contratuais no âmbito da demanda de consignação em pagamento, de acordo com o julgado abaixo colacionado do STJ: Direito civil e processual civil. Contrato de financiamento imobiliário. Carteira hipotecária. Juros remuneratórios. Capitalização mensal de juros. Taxa referencial. Incidência. CDC. Incidência. Compensação. Prequestionamento. Ausência. Ação de consignação em pagamento. Revisão de cláusulas contratuais. Possibilidade. [...]. Na ação de consignação em pagamento, é possível ampla discussão sobre o débito e o seu valor, inclusive com a interpretação da validade e alcance das cláusulas contratuais. Precedentes. - Recurso especial a que se dá parcial provimento. (STJ - REsp: 436842 RS 2002/0058022-5, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 31 Julgamento: 08/03/2007, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 14/05/2007 p. 279). 2.6. PROCEDIMENTO 1) Petição inicial A peça exordial deve seguir os requisitos estabelecidos nos arts. 319 e 320 do CPC (juízo a que é dirigida, identificação, fatos e fundamentos, pedido, valor da causa, etc). Nos termos do art. 542 do CPC, deve haver pedido de depósito da quantia devida pelo autor no prazo de 5 dias: Art. 542. Na petição inicial, o autor requererá: I - o depósito da quantia ou da coisa devida, a ser efetivado no prazo de 5 (cinco) dias contados do deferimento, ressalvada a hipótese do art. 539, § 3º. Caberá ao juiz analisar a regularidade formal da petição inicial. Ultrapassada essa fase procedimental, procederá com a intimação do autor para depósito em 5 dias. Segundo posicionamento do STJ, trata-se de um prazo impróprio, isto é, que não gera preclusão temporal imediata, podendo oautor depositar após o referido prazo, mas desde que antes da extinção terminativa do processo: [...]. Na ação de consignação em pagamento, o depósito extemporâneo pelo devedor-consignante não é causa de extinção do processo sem julgamento do mérito, devendo ser aproveitado. Precedente. [...]. (STJ - REsp: 702739 PB 2004/0160923-1, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 19/09/2006, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 02/10/2006 p. 266). Assim, caso o autor não realize o depósito, o processo será extinto sem resolução do mérito. Por outro lado, havendo depósito, o processo seguirá para a citação do réu. 2) Citação do réu Há a citação do réu para levantar o depósito ou contestar, nos termos do inciso II do art. 542 do CPC, in verbis: Art. 542. Na petição inicial, o autor requererá: II - a citação do réu para levantar o depósito ou oferecer contestação. Obs.: ressalta-se que não há designação de audiência de conciliação ou mediação prevista no art. 334 do CPC. Realizada a citação do réu, este poderá, no prazo de 15 dias: a) Apresentar contestação, com fulcro no art. 544 do CPC, havendo, no entanto, limitação das matérias de mérito alegáveis, quais sejam: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 32 • Que não houve recusa ou mora em receber a quantia ou coisa devida; • Justeza na recusa. Ex.: o devedor queria cumprir a obrigação em local diverso do contratado; • Que o depósito não se efetuou no prazo ou lugar do pagamento; • Que o depósito não foi integral. No que tange à alegação de insuficiência de depósito, o réu deve indicar precisamente o valor que entende devido. Salienta-se que a parcela incontroversa da obrigação poderá ser levantada, havendo prazo de 10 dias para complementação, de acordo com o art. 545 do CPC: Art. 545. Alegada a insuficiência do depósito, é lícito ao autor completá-lo, em 10 (dez) dias, salvo se corresponder a prestação cujo inadimplemento acarrete a rescisão do contrato. Obs.: em que pese o art. 544 do CPC limite as possibilidades de matérias de mérito alegáveis, o réu ainda pode se valer das demais defesas processuais previstas no art. 337 do CPC, a exemplo da convenção de arbitragem. b) Apresentar reconvenção, ocasião no qual o procedimento especial se converterá em procedimento comum, conforme preleciona Humberto Theodoro Junior. c) Tornar-se revel. Ressalta-se que nem sempre haverá presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor em caso de revelia, conforme posicionamento do STJ: Processual civil. Recurso especial. Ação de consignação em pagamento. Revelia. Procedência do pedido. Relativização. Na ação de consignação em pagamento, quando decretada a revelia, não será compulsória a procedência do pedido se os elementos probatórios constantes nos autos conduzirem à conclusão diversa ou não forem suficientes para formar o convencimento do juiz Recurso especial não conhecido. (STJ - REsp: 769468 RJ 2005/0122042-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 29/11/2005, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 06/03/2006 p. 386). d) Requerer o levantamento da quantia depositada. Trata-se do reconhecimento jurídico do pedido. Nesse momento, apesar de realizar o levantamento do valor, o réu também pode apresentar contestação. Nesse caso, o objetivo é evitar o pagamento de verbas sucumbenciais, na tentativa de comprovar, por exemplo, a justeza na recusa. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 33 Após a citação, o processo seguirá o procedimento comum, de forma que nenhuma especialidade existe após o momento procedimental inicial, seguindo-se ao momento de defesa do réu o saneamento do processo, instrução probatória e decisão por meio de sentença, recorrível por apelação a ser recebida no duplo efeito. 3) Sentença Em regra, trata-se de sentença declaratória. No acolhimento do pedido do autor, haverá declaração e extinção da obrigação em razão da idoneidade e suficiência do depósito realizado. Já na rejeição do pedido, haverá a declaração de que o depósito realizado não é apto a extinguir a obrigação. Nesse sentido, a sentença, excepcionalmente, também terá natureza condenatória quando o réu alegar insuficiência do depósito e o autor não completá-lo em 10 dias, caso em que o juiz irá condená-lo a pagar a diferença apurada, de acordo com o § 2º do art. 545 do CPC: Art. 545, § 2º A sentença que concluir pela insuficiência do depósito determinará, sempre que possível, o montante devido e valerá como título executivo, facultado ao credor promover-lhe o cumprimento nos mesmos autos, após liquidação, se necessária. 2.7. COMPLEMENTAÇÃO DO DEPÓSITO Em caso de acolhimento da alegação de insuficiência de depósito pelo réu, haverá a improcedência do pedido do autor. No entanto, a fim de efetivar o princípio da economia processual, o juiz possibilitará ao autor o direito à complementação do depósito no prazo de 10 dias. De acordo com o art. 544, parágrafo único, do CPC, reitera-se que é necessário que o réu indique o valor que entende devido: Art. 544. Na contestação, o réu poderá alegar que: IV - o depósito não é integral. Parágrafo único. No caso do inciso IV, a alegação somente será admissível se o réu indicar o montante que entende devido. A necessidade de indicação do valor devido desempenha 2 funções: 1) Permitir ao autor analisar a conveniência de realizar o depósito complementar; 2) Permitir a condenação do autor no valor da diferença, na hipótese de não ser feito o complemento do depósito. Isto posto, constatada a possibilidade de o autor ser condenado a pagar a diferença apurada entre o valor do depósito e do valor devido, sem a necessidade de qualquer pedido do réu nesse sentido, demonstra-se claramente a natureza dúplice da ação de consignação em pagamento. Sobre o tema, importante verificar julgado do STJ que evidencia a natureza dúplice da ação consignatória: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 34 AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. CARÁTER DÚPLICE. A ação de consignação em pagamento, não obstante ajuizada no interesse do autor, aproveita imediatamente ao réu, que pode, desde logo, levantar a quantia depositada, ainda que insuficiente, servindo-lhe também de modo mediato porque a sentença proporcionará um título executivo para a cobrança do saldo remanescente (CPC, art. 899, §§ 1º e 2º). Recurso especial conhecido e provido. (STJ - REsp: 886823 DF 2006/0200626-7, Relator: Ministro ARI PARGENDLER, Data de Julgamento: 17/05/2007, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 25/06/2007 p. 236RSTJ vol. 209 p. 307). Destaca-se, por fim, o disposto no art. 545, § 1º, do CPC: Art. 545, § 1º No caso do caput, poderá o réu levantar, desde logo, a quantia ou a coisa depositada, com a consequente liberação parcial do autor, prosseguindo o processo quanto à parcela controvertida. Trata-se de medida de tutela antecipada em favor do réu, ocasião na qual há o levantamento imediato do valor consignado por ser incontroverso. 2.8. CONSIGNAÇÃO EM PRESTAÇÕES SUCESSIVAS Está prevista no art. 541 do CPC: Art. 541. Tratando-se de prestações sucessivas, consignada uma delas, pode o devedor continuar a depositar, no mesmo processo e sem mais formalidades, as que se forem vencendo, desde que o faça em até 5 (cinco) dias contados da data do respectivo vencimento. A referida previsão legal está fundada no princípio da economia processual, buscando evitar uma inadequada multiplicidade de demandas consignatórias (cada qual com uma prestação depositada) que, pela conexão, seriam de qualquer maneira reunidas para julgamento conjunto. Em síntese, pode-se elencar as seguintes especificidades da consignação em prestações sucessivas: 1) Prazo de 5 dias do vencimento da prestação; 2) Pedido implícito, isto é, não há necessidade de realizar um pedido expresso na petição inicial de realizaçãode consignações futuras; 3) Não há abertura de prazo de defesa a cada novo depósito realizado, mas o réu deve ser intimado, com o intuito de se garantir a ciência e o direito ao contraditório da parte adversa. Ressalta-se, todavia, que a não realização da consignação de prestação vincenda impede que o autor continue a se utilizar da demanda já interposta para a consignação de parcelas subsequentes, sendo indispensável nesse caso a propositura de uma nova demanda consignatória. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 35 No que se refere ao termo final da consignação incidental de prestações vincendas em demanda já existente, salienta-se que existe intenso debate jurisprudencial e doutrinário. Assim, é possível elencar as seguintes hipóteses do termo final: 1) Até a prolação da sentença, com aplicação analógica do art. 67, III, da Lei 8.245/1991: Art. 67. Na ação que objetivar o pagamento dos aluguéis e acessórios da locação mediante consignação, será observado o seguinte: III - o pedido envolverá a quitação das obrigações que vencerem durante a tramitação do feito e até ser prolatada a sentença de primeira instância, devendo o autor promover os depósitos nos respectivos vencimentos. Neste caso não se admite a realização de consignações incidentais após a sentença, mesmo que haja contra a sentença apelação pendente de julgamento. 2) Até o trânsito em julgado da sentença, conforme entendimento do STJ: Processo civil. Recurso especial. Ação de consignação em pagamento. Procedência do pedido reconhecida em sentença. Recurso de apelação recebido em duplo efeito. Continuidade de consignação em juízo das parcelas após a prolação da sentença. Possibilidade. [...]. A conferência das prestações consignadas após a publicação da sentença deverá ser realizada pelo Juízo de primeiro grau, após o trânsito em julgado da decisão. (STJ - REsp: 439489 SP 2002/0064674-0, Relator: Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Data de Julgamento: 10/12/2003, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJ 19/04/2004 p. 151). 3) Após a prolação da sentença, a depender do teor do ato decisório diante do pedido elaborado pelo autor. Trata-se de uma terceira corrente doutrinária defendida por Humberto Theodoro Junior. Assim, tem-se que: a) Limitando-se às prestações já consignadas, não se admitirá a continuação das consignações incidentais após a prolação da sentença; b) Constando da sentença expressamente a possibilidade de consignações supervenientes à sua prolação (eficácia condicional do julgado), os depósitos serão admitidos até o trânsito em julgado. 2.9. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO FUNDADA NA DÚVIDA REFERENTE À TITULARIDADE DO CRÉDITO Geralmente, existem as seguintes dúvidas que impedem a identificação do credor e, por consequência, ensejam a necessidade de ajuizar demanda consignatória em razão da existência de dúvida referente à titularidade do crédito: 1) Não saber a quem deve. Ex.: o devedor tinha conhecimento de quem era o credor, mas este faleceu e não se tem notícias de eventuais herdeiros ou inventário. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 36 Neste caso, a providência processual adequada em caso de réu desconhecido é a citação por edital, com fulcro no art. 256, I, do CPC: Art. 256. A citação por edital será feita: I - quando desconhecido ou incerto o citando. 2) Dúvida a respeito de qual dos pretendentes é realmente o credor. No caso, deve-se ajuizar ação de consignação em pagamento e inserir todos os possíveis credores no polo passivo da demanda judicial. Diante do litisconsórcio passivo necessário, há diferentes reações que podem ser adotadas pelos réus: 1) Nenhum dos réus comparece → A revelia de todos é declarada → Há procedência do pedido autoral → Procede-se com a arrecadação da quantia ou a coisa como bem de ausente. 2) Somente uma das partes comparece, alegando ser o credor → O juiz deve analisar os fundamentos da alegação e, convencendo-se, proferirá sentença de procedência do pedido do autor, determinando o levantamento do depósito em favor do réu que se manifestou → Caso o juiz não seja convencido, há arrecadação como bem de ausente. 3) Todos os réus comparecem no processo, afirmando a titularidade do crédito → Há extinção da obrigação e exclusão do autor do processo, permanecendo somente os réus para disputar a titularidade do crédito. Ressalta-se que neste caso, o valor dos encargos de sucumbência será retirado do depósito, considerando-se a procedência do pedido do autor. 4) Todos os réus comparecem ao processo e, além de afirmarem a titularidade do crédito, apresentam alguma outra matéria defensiva → Ação segue normalmente. 2.10. CONSIGNATÓRIA DE ALUGUÉIS E OUTROS ENCARGOS LOCATÍCIOS Possui previsão no art. 67 da Lei 8.245/2011: Art. 67. Na ação que objetivar o pagamento dos aluguéis e acessórios da locação mediante consignação, será observado o seguinte: I - a petição inicial, além dos requisitos exigidos pelo art. 282 do Código de Processo Civil, deverá especificar os aluguéis e acessórios da locação com indicação dos respectivos valores; II - determinada a citação do réu, o autor será intimado a, no prazo de vinte e quatro horas, efetuar o depósito judicial da importância indicada na petição inicial, sob pena de ser extinto o processo; III - o pedido envolverá a quitação das obrigações que vencerem durante a tramitação do feito e até ser prolatada a sentença de primeira instância, devendo o autor promover os depósitos nos respectivos vencimentos; CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 37 IV - não sendo oferecida a contestação, ou se o locador receber os valores depositados, o juiz acolherá o pedido, declarando quitadas as obrigações, condenando o réu ao pagamento das custas e honorários de vinte por cento do valor dos depósitos; V - a contestação do locador, além da defesa de direito que possa caber, ficará adstrita, quanto à matéria de fato, a: a) não ter havido recusa ou mora em receber a quantia devida; b) ter sido justa a recusa; c) não ter sido efetuado o depósito no prazo ou no lugar do pagamento; d} não ter sido o depósito integral; VI - além de contestar, o réu poderá, em reconvenção, pedir o despejo e a cobrança dos valores objeto da consignatória ou da diferença do depósito inicial, na hipótese de ter sido alegado não ser o mesmo integral; VII - o autor poderá complementar o depósito inicial, no prazo de cinco dias contados da ciência do oferecimento da resposta, com acréscimo de dez por cento sobre o valor da diferença. Se tal ocorrer, o juiz declarará quitadas as obrigações, elidindo a rescisão da locação, mas imporá ao autor- reconvindo a responsabilidade pelas custas e honorários advocatícios de vinte por cento sobre o valor dos depósitos; VIII - havendo, na reconvenção, cumulação dos pedidos de rescisão da locação e cobrança dos valores objeto da consignatória, a execução desta somente poderá ter início após obtida a desocupação do imóvel, caso ambos tenham sido acolhidos. Parágrafo único. O réu poderá levantar a qualquer momento as importâncias depositadas sobre as quais não penda controvérsia. Trata-se de um procedimento especial, com certas particularidades, mas mesmo não havendo na lei qualquer referência expressa nesse sentido, devem-se aplicar subsidiariamente a este as regras do procedimento da consignação em pagamento previsto no CPC. Inicialmente, frisa-se que a competência da ação consignatória de aluguéis e encargos da locação é no lugar da situação da coisa, desde que não exista cláusula de eleição de foro, conforme determina o art. 58, inciso II, da Lei 8.245/1991: Art. 58. Ressalvados os casos previstos no parágrafo único do art. 1º, nas ações de despejo, consignação em pagamento de aluguel e acessório da locação, revisionais de aluguel e renovatórias de locação, observar-se- á o seguinte: II - é competentepara conhecer e julgar tais ações o foro do lugar da situação do imóvel, salvo se outro houver sido eleito no contrato. Significa dizer que as partes poderão livremente acordar a respeito da comarca ou da seção judiciária competente para demanda e que, somente na ausência desse acordo expresso em cláusula escrita de eleição de foro, será competente o foro do local da coisa locada. A petição inicial deve seguir os parâmetros elencados no art. 319 do CPC. No entanto, ela possui alguns aspectos intrínsecos, quais sejam: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 38 1) A especificação dos alugueres e acessórios da locação com a indicação dos respectivos valores que o autor entender corretos, conforme determinado no inciso I do art. 67 da Lei 8.245/1991; 2) O valor da causa será igual a 12 meses de aluguel, sendo irrelevantes as prestações consignadas no início da demanda judicial, nos termos do art. 58, III, da Lei 8.245/1991: Art. 58, III - o valor da causa corresponderá a doze meses de aluguel, ou, na hipótese do inciso II do art. 47, a três salários vigentes por ocasião do ajuizamento. 3) O depósito deve ser realizado no prazo de 24 horas do deferimento da petição inicial. Em continuidade, a citação do réu se dá por meio de carta com Aviso de Recebimento (AR). Obs.: é possível a citação por telex ou fax (atualmente, e-mail, conforme entendimento do Daniel Assumpção) quando o réu for pessoa jurídica ou firma individual e tal forma de citação estiver expressamente prevista em contrato. Sendo o réu citado, evidencia-se que há, ainda, limitação de matérias defensivas a serem apresentadas em sede de contestação, elencadas no inciso V do art. 67 da 8.245/1991: 1) Não ter havido recusa ou mora em receber a quantia devida; 2) Ter sido justa a recusa; 3) Não ter sido efetuado o depósito no prazo ou no lugar do pagamento; 4) Não ter sido o depósito integral. Outrossim, ressalta-se que existe a possibilidade de o réu se utilizar da reconvenção para pedir o despejo e a cobrança de valores que tenham sido objeto da consignatória ou da diferença do depósito inicial (art. 67, VI, da Lei 8.245/1991). Por questão de economia processual, o legislador entendeu por bem criar uma limitação ao objeto da reconvenção, sendo inadmissível que tenha outras prestações que não sejam objeto da consignatória. Nesse sentido, indaga-se: é possível reconvir com fundamento que não seja a falta de pagamento? Ex.: despejo para uso próprio. O art. 343 do CPC prevê que: Art. 343. Na contestação, é lícito ao réu propor reconvenção para manifestar pretensão própria, conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa. Verificado o disposto no referido dispositivo normativo, salienta-se que para Daniel Assumpção não é possível, uma vez que o pedido de despejo para uso próprio em sede de reconvenção não geraria conexão com a ação principal da demanda consignatória cujo fundamento CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 39 é o pagamento do aluguel, devendo o art. 67, VI, da Lei 8.245/1991 ser utilizado em paralelo com o disposto no CPC, haja vista que há aplicação subsidiária do CPC à referida legislação extravagante. Por fim, destaca-se que sempre que a alegação defensiva do réu for a insuficiência do depósito inicial, o autor será intimado para que, querendo, complemente o depósito. O direito de complementação está previsto no art. 67, VII, da Lei 8.245/1991 e deve ocorrer conforme os seguintes parâmetros: 1) Prazo para complementação de 5 dias; 2) Ao valor da complementação será acrescido 10% sobre o valor da diferença; 3) A complementação acarreta o julgamento de procedência do pedido, mas o autor será condenado ao pagamento das verbas de sucumbência, sendo expressamente previsto que no tocante aos honorários advocatícios a condenação será de 20% sobre o valor dos depósitos. 3. AÇÃO DE EXIGIR CONTAS 3.1. INTRODUÇÃO Consoante Daniel Assumpção, sempre que a administração de bens, valores ou interesses de determinado sujeito seja confiada a outrem, haverá a necessidade de prestação de contas, ou seja, da relação pormenorizada das receitas e despesas no desenvolvimento da administração. A ação de exigir contas, portanto, se refere a uma relação jurídica de Direito Material complexa que gera sucessivas operações de crédito e débito. Ex.: investimentos, pagamento de impostos. Assim, é natural que nem sempre haja a necessidade de intervenção jurisdicional para que as contas sejam prestadas, mas sempre que existir um conflito entre os sujeitos que participam da relação jurídica de direito material, a demanda adequada para a solução do conflito por meio do acertamento econômico definitivo entre eles é a ação de prestação de contas. Em continuidade, é importante salientar que a prestação de contas não possui como objetivo final apenas o acertamento das receitas e despesas na administração de bens, valores ou interesses, considerando-se que a discussão das contas será realizada de forma incidental somente como meio para se definir a responsabilidade de pagar do devedor. Desse modo, a doutrina entende que a ação de exigir contas possui natureza condenatória, uma vez que os pedidos cumulados na petição inicial têm essa natureza: 1) Condenação do réu à apresentação/prestação das contas (obrigação de fazer); 2) Condenação do réu ao pagamento do saldo pendente/residual (obrigação de pagar). CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 40 Excepcionalmente pode haver somente pedido de condenação ao pagamento do saldo residual, quando o dever de prestar as contas for decorrência de expressa previsão legal, como ocorre, por exemplo, com o inventariante. Destaca-se, por fim, que as hipóteses de cabimento da ação de exigir contas lembradas pela doutrina são meramente exemplificativas, bastando que exista uma relação jurídica complexa que gere operações de crédito e débito para ser cabível a ação ora analisada. Obs.: não cabe prestação de contas e revisão contratual na ação exigir contas, segundo posicionamento do STJ: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. SEGUNDA FASE. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE. JUROS REMUNERATÓRIOS E CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO DOS ENCARGOS CONTRATUAIS, QUE DEVEM SER MANTIDOS NOS TERMOS EM QUE PRATICADOS NO CONTRATO BANCÁRIO SEM PREJUÍZO DA POSSIBILIDADE DE AJUIZAMENTO DE AÇÃO REVISIONAL. 1. Tese para os efeitos do art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973: Impossibilidade de revisão de cláusulas contratuais em ação de prestação de contas. 2. O titular da conta-corrente bancária tem interesse processual para propor ação de prestação de contas, a fim de exigir do banco que esclareça qual o destino do dinheiro que depositou, a natureza e o valor dos créditos e débitos efetivamente ocorridos em sua conta, apurando-se, ao final, o saldo credor ou devedor. Exegese da Súmula 259. 3. O rito especial da ação de prestação de contas não comporta a pretensão de alterar ou revisar cláusula contratual, em razão das limitações ao contraditório e à ampla defesa. 4. Essa impossibilidade de se proceder à revisão de cláusulas contratuais diz respeito a todo o procedimento da prestação de contas, ou seja, não pode o autor da ação deduzir pretensões revisionais na petição inicial (primeira fase), conforme a reiterada jurisprudência do STJ, tampouco é admissível tal formulação em impugnação às contas prestadas pelo réu (segunda fase). 5. O contrato de conta-corrente com abertura de limite de crédito automático (cheque especial) é negócio jurídico complexo. Se o cliente não utiliza o limite de crédito, não há dúvida de que o banco está empregando o dinheiro do correntista na compensação dos cheques, ordens de pagamento e transferências por ele autorizadas. Havendo utilização do limite do cheque especial, concretiza-se contratode empréstimo, cuja possibilidade era apenas prevista no contrato de abertura da conta. 6. A taxa de juros do empréstimo tomado ao banco não diz respeito à administração dos recursos depositados pelo autor da ação. Ela compreende a remuneração do capital emprestado e flutua, conforme as circunstâncias do mercado e as vicissitudes particulares, em cada momento, da instituição financeira e do cliente. A taxa de juros em tal tipo de empréstimo é informada por meios diversos, como extratos, internet e atendimento telefônico. 7. Não se sendo a ação de prestação de contas instrumento processual adequado à revisão de contrato de mútuo (REsp. 1.293.558/PR, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, relator Ministro Luís Felipe Salomão), da mesma forma não se presta esse rito especial para a revisão de taxas de juros e demais encargos de empréstimos obtidos por meio de abertura de limite de crédito em conta-corrente. 8. O contrato bancário que CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 41 deve nortear a prestação de contas e o respectivo julgamento - sem que caiba a sua revisão no rito especial - não é o simples formulário assinado no início do relacionamento, mas todo o conjunto de documentos e práticas que alicerçaram a relação das partes ao longo dos anos. Esse feixe de obrigações e direitos não cabe alterar no exame da ação de prestação de contas. [...]. (STJ - REsp: 1497831 PR 2014/0094926-2, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 14/09/2016, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 07/11/2016). Como o tema foi cobrado em concurso? (Docas-PB - Advogado - VUNESP - 2022): Mariana, médica, foi aprovada em processo seletivo para fazer sua especialização de seis meses na Turquia. Considerando que ficaria ausente do país neste período, decidiu nomear, pelo prazo de seis meses, sua prima, Marcela, como sua procuradora, com poderes gerais para representá-la nos atos da vida civil. Terminado o prazo, Mariana volta ao país e procura Marcela, que a informa que não foi necessário praticar nenhum ato em seu nome. Contudo, ao verificar sua conta corrente percebeu um saldo devedor no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) resultantes de uma movimentação realizada por Marcela. Questionada, Marcela vem se esquivando de qualquer resposta. Mariana procura um advogado que informa que neste caso, o mais correto seria propor uma ação de exigir contas. Correto. 3.2. CONDIÇÕES DA AÇÃO Qualquer um dos sujeitos que participe da relação de administração dos bens, valores ou interesses tem legitimidade para ajuizar ação de exigir contas. O legitimado ativo é o dono do patrimônio que teve seus bens, valores ou interesses administrados, ao passo que o legitimado passivo é aquele que administra o patrimônio. O autor da demanda de exigir as contas deverá demonstrar que houve recusa na prestação extrajudicial das contas ou em caso de divergência quanto ao valor apurado, sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito por carência de ação (ausência de interesse de agir). Quando a própria lei exige a prestação de contas em juízo, como ocorre, por exemplo, com o inventariante, tutor e curador, naturalmente o interesse de agir é presumido. Ressalta-se, todavia, que os sócios que não têm a administração de uma sociedade empresária têm legitimidade ativa para propor ação de prestação de contas contra o sócio gerent7, mas, uma vez tendo ocorrida a aprovação das contas pelo órgão interno apontado pelo estatuto ou contrato social, não se admitirá a demanda judicial. Exatamente o mesmo raciocínio aplica-se na relação entre cooperado e cooperativa, e ao condômino em condomínio de propriedade vertical, quando acertadamente aponta a falta de interesse de agir. Importante evidenciar, por fim, o disposto no Informativo 427 do STJ, no sentido de que o mandato é contrato personalíssimo por excelência, e sendo o dever de prestar contas uma das obrigações do mandatário perante o mandante, também ele tem natureza personalíssima, sendo parte legítima para figurar no polo passivo da demanda somente a pessoa a quem incumbia tal encargo por lei ou contrato: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 42 RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS - MORTE DO MANDATÁRIO - TRANSMISSÃO DA OBRIGAÇÃO AO ESPÓLIO - INVIABILIDADE - AÇÃO DE CUNHO PERSONALÍSSIMO - EXTINÇÃO DA AÇÃO SEM O JULGAMENTO DO MÉRITO - MANUTENÇÃO - NECESSIDADE - ARTS. 1323 E 1324 DO CC/1916 - AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO - INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N. 211 DA SÚMULA/STJ - RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. I - O mandato é contrato personalíssimo por excelência, tendo como uma das causas extintivas, nos termos do art. 682, II, do Código Civil de 2002, a morte do mandatário; II - Sendo o dever de prestar contas uma das obrigações do mandatário perante o mandante e tendo em vista a natureza personalíssima do contrato de mandato, por consectário lógico, a obrigação de prestar contas também tem natureza personalíssima; III - Desse modo, somente é legitimada passiva na ação de prestação de contas a pessoa a quem incumbia tal encargo, por lei ou contrato, sendo tal obrigação intransmissível ao espólio do mandatário, que constitui, na verdade, uma ficção jurídica; IV - Considerando-se, ainda, o fato de já ter sido homologada a partilha no inventário em favor dos herdeiros, impõe-se a manutenção da sentença que julgou extinto o feito sem resolução do mérito, por ilegitimidade passiva, ressalvada à recorrente a pretensão de direito material perante as vias ordinárias; V - As matérias relativas aos arts. 1323 e 1324 do Código Civil de 1916 não foram objeto de prequestionamento, incidindo, na espécie, o teor do Enunciado n. 211 da Súmula/STJ; V - Recurso especial improvido. (STJ - REsp: 1055819 SP 2007/0094448-5, Relator: Ministro MASSAMI UYEDA, Data de Julgamento: 16/03/2010, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/04/2010). 3.3. NATUREZA DÚPLICE A natureza dúplice, de acordo com Daniel Assumpção, é uma constante nos procedimentos especiais. Isto posto, a natureza dúplice da prestação de contas no tocante à pretensão condenatória a pagar o saldo devedor apurado pelas contas prestadas é inegável, sendo reconhecida pela unanimidade da doutrina. Significa dizer, portanto, que o bem da vida objeto da demanda – dinheiro resultante do saldo devedor – irá obrigatoriamente ficar com uma das partes. Uma vez apurada a existência de saldo devedor em favor do autor da ação, será o réu condenado a pagar. No entanto, verificado que o credor é o réu, o autor da demanda será condenado a pagar ao réu o saldo devedor. Segundo Daniel Assumpção, justamente em razão de sua natureza dúplice não cabe ao réu fazer qualquer pedido no sentido de condenar o autor ao pagamento do saldo devedor, sendo essa condenação consequência natural a ser gerada na hipótese de reconhecimento de crédito em favor do réu. O réu, portanto, somente se defende, e o juiz em sua sentença apenas enfrenta o pedido do autor: acolhido, condena o réu ao pagamento; rejeitado, condena o próprio autor. Assim, não há interesse no oferecimento de reconvenção porque a simples defesa do réu, uma vez acolhida, já é suficiente para lhe entregar o bem da vida em disputa. 3.4. COMPETÊNCIA CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 43 A competência é do foro do lugar do ato ou fato para a ação em que o réu for o administrador ou gestor dos negócios alheios, conforme previsão do art. 53, IV, alínea b, do CPC: Art. 53. É competente o foro: IV - do lugar do ato ou fato para a ação: b) em que for réu administrador ou gestor de negócios alheios. Trata-se de competência relativa, razão pela qual é admissível a sua prorrogação por conexão, ausência de exceção de incompetência e cláusula de eleição de foro. Há, contudo, exceção à regra da competência relativa no que tange à competência absoluta (funcional)do juízo que tiver nomeado o administrador – que atuará na função de auxiliar do juízo como inventariante, tutor, curador ou depositário – para julgar as ações de prestação de contas propostas contra ele. Salienta-se, em continuidade, haverá autuação em apenso aos autos do processo principal, conforme determina o art. 553 do CPC: Art. 553. As contas do inventariante, do tutor, do curador, do depositário e de qualquer outro administrador serão prestadas em apenso aos autos do processo em que tiver sido nomeado. 3.5. PROCEDIMENTO A ação de exigir contas é proposta pelo sujeito que alega ter seus bens, valores ou interesses administrados por outrem justamente contra o responsável por essa administração. Na petição inicial, que será elaborada de acordo com os arts. 319 e 320 do CPC, haverá cumulação sucessiva de pedidos pelo autor. Primeiro o autor pede que o réu seja condenado a prestar contas e, sucessivamente, pleiteia que o réu seja condenado a pagar o saldo devedor a ser apurado. Trata-se de 2 fases procedimentais sucessivas e eventuais porque se o primeiro pedido de prestação de contas for julgado improcedente, o segundo pedido de pagamento perderá o objeto. Cada fase será decidida por uma sentença, o que torna essa demanda de conhecimento singular, pois o mérito será necessariamente decidido em 2 momentos distintos. São 2 as sentenças, mas a petição inicial é uma só, daí a necessidade de se fazer a cumulação de pedidos já referida (cumulação sucessiva). Em continuidade, na inicial também deve haver uma especificação detalhada das razões do pedido e documentos comprobatórios (art. 550, § 1º, do CPC): Art. 550. Aquele que afirmar ser titular do direito de exigir contas requererá a citação do réu para que as preste ou ofereça contestação no prazo de 15 (quinze) dias. § 1º Na petição inicial, o autor especificará, detalhadamente, as razões pelas quais exige as contas, instruindo-a com documentos comprobatórios dessa necessidade, se existirem. 3.6. PROCEDIMENTO CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 44 Conforme apontado no art. 550 do CPC, ocorrerá a citação do réu para que este preste as contas ou ofereça contestação no prazo de 15 dias. Assim, no prazo de resposta de 15 dias, o réu poderá adotar uma série de reações: 1) Apresentar contestação no prazo de 15 dias; 2) Apresentar contas e não contestar, havendo, portanto, o reconhecimento jurídico do primeiro pedido condenatório do autor à prestação das contas. O art. 551 do CPC estabelece a forma adequada em que as contas devem ser apresentadas, com especificação de receitas, da aplicação das despesas e investimentos, in verbis: Art. 551. As contas do réu serão apresentadas na forma adequada, especificando-se as receitas, a aplicação das despesas e os investimentos, se houver. Com o reconhecimento jurídico do pedido, de acordo com Daniel Assumpção, é imprescindível que seja prolatada uma decisão, nos termos do art. 487, III, do CPC: Art. 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz: III - homologar: a) o reconhecimento da procedência do pedido formulado na ação ou na reconvenção. Ademais, em razão da não apresentação de contestação pelo réu, haverá aplicação do art. 550, § 4º do CPC: Art. 550, § 4º Se o réu não contestar o pedido, observar-se-á o disposto no art. 355. Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando: I - não houver necessidade de produção de outras provas; II - o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 e não houver requerimento de prova, na forma do art. 349. 3) Apresentar as contas e contestar; Apesar de não ser essa espécie de reação prevista expressamente no art. 550, caput, do CPC, não existe dúvida (segundo Marcato, Marinoni e Humberto Theodoro Junior) de que, havendo divergência não quanto ao dever de prestar contas, mas com relação ao seu conteúdo, é lícito ao réu apresentar as contas nos termos do art. 551 do CPC, com o que reconhece juridicamente seu dever em prestá-la, e apresentar contestação para impugnar eventual divergência referente ao conteúdo das contas. Ressalta-se, ainda, que o objetivo do réu ao contestar também é evitar o pagamento das verbas de sucumbência, uma vez que tal hipótese normalmente ocorre quando o réu contesta o interesse de agir do autor, eis que este nunca havia solicitado a prestação de contas extrajudicialmente e, portanto, jamais houve recusa em prestá-las. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 45 4) Contestar e não apresentar as contas; Caso não concorde com o alegado dever de prestar as contas suscitado pelo autor, caberá ao réu apresentar contestação alegando a inexistência desse dever e pedir a rejeição do pedido (art. 487, I, do CPC). Poderá também alegar todas as matérias defensivas processuais em preliminar de contestação, juntamente com a alegação de mérito de que não tem dever de prestar as contas ou isoladamente. 5) Não contestar e nem apresentar as contas, hipótese na qual será decretada a revelia e prosseguir-se-á com o julgamento antecipado do mérito, com fulcro no art. 355, inciso II, do CPC, caso o juiz presuma como verdadeiros os fatos referentes ao dever de prestar contas apresentados pelo autor. Tratando-se de presunção relativa, mesmo ocorrendo revelia é possível ao juiz determinar ao autor a especificação de provas tendentes a demonstrar a veracidade das alegações de fato constitutivas de seu direito. Além disso, sendo necessário, serão produzidas provas, inclusive a prova oral no âmbito de Audiência de Instrução e Julgamento (AIJ). Após o momento procedimental de reação do réu, o procedimento sofrerá variação conforme a espécie de reação adotada no caso concreto. Proferida a sentença, extinguindo o processo sem a resolução do mérito ou rejeitando o pedido do autor, caberá recurso de apelação, e sendo definitiva a decisão, naturalmente não haverá segunda fase procedimental. Na hipótese de acolhimento do pedido do autor, o juiz condenará o réu a prestar as contas no prazo de 15 dias, sob pena de não lhe ser lícito impugnar as que o autor apresentar, nos termos do art. 550, § 5°, do CPC: Art. 550, § 5º A decisão que julgar procedente o pedido condenará o réu a prestar as contas no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de não lhe ser lícito impugnar as que o autor apresentar. É importante verificar o que dispõe o Informativo 414 do STJ, que trata da desnecessidade de intimação pessoal do réu acerca da decisão condenatória/de procedência na ação de exigir contas, de modo que o réu será intimado por seu advogado da sentença: Processo Civil. Recurso Especial. Ação de prestação de contas. Sentença que julga procedente o pedido. Desnecessidade de nova intimação pessoal. A intimação da sentença que julga procedente o pedido de exigir contas, de que trata o art. 915, § 2º, do CPC, deve ser realizada ao advogado, de modo que é desnecessária a intimação pessoal da parte. Recurso especial a que se nega provimento. (STJ - REsp: 913411 SP 2006/0276836-2, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 03/11/2009, T3 - TERCEIRA TURMA, DJe 23/11/2009). Por fim, no que tange à natureza da decisão prevista no § 2º do art. 550 do CPC (que julga a primeira fase da ação de exigir contas), indaga-se: trata-se de decisão interlocutória ou sentença? CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 46 Há grande divergência doutrinária a respeito da natureza da decisão prevista no § 2º do art. 550 do CPC, havendo aqueles que defendem sua natureza de sentença, recorrível por apelação (Marcato, Didier), e outros que a entendem como decisão interlocutória de mérito, sendo, portanto, recorrível por agravo de instrumento e não por apelação (Marinoni, Humberto Theodoro Junior). Com o intuito de pacificar a divergência no âmbito jurisprudencial do STJ, desde 2019 o Tribunal Superior defendeque: [...]. Fixadas essas premissas e considerando que a ação de exigir contas poderá se desenvolver em duas fases procedimentais distintas, condicionando- se o ingresso à segunda fase ao teor do ato judicial que encerra a primeira fase; e que o conceito de sentença previsto no art. 203, § 1º, do CPC/15, aplica- se como regra ao procedimento comum e, aos procedimentos especiais, apenas na ausência de regra específica, o ato judicial que encerra a primeira fase da ação de exigir contas possuirá, a depender de seu conteúdo, diferentes naturezas jurídicas: se julgada procedente a primeira fase da ação de exigir contas, o ato judicial será decisão interlocutória com conteúdo de decisão parcial de mérito, impugnável por agravo de instrumento; se julgada improcedente a primeira fase da ação de exigir contas ou se extinto o processo sem a resolução de seu mérito, o ato judicial será sentença, impugnável por apelação. [...]. (STJ - REsp: 1746337 RS 2018/0137312-9, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 09/04/2019, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 12/04/2019 RSTJ vol. 254 p. 709). Portanto, se julgada procedente a primeira fase da ação de exigir contas, o ato judicial será decisão interlocutória com conteúdo de decisão parcial de mérito, impugnável por agravo de instrumento; se julgada improcedente a primeira fase da ação de exigir contas ou se extinto o processo sem a resolução de seu mérito, o ato judicial será sentença, impugnável por apelação. Corroborando com o entendimento já pacificado, em recente decisão de 2023, o STJ reiterou o posicionamento que já havia adotado anteriormente, salientando, inclusive, que incorre em erro grosseiro quando da interposição de um recurso ao invés de outro, não havendo que se falar em aplicação do princípio da fungibilidade recursal: [...]. 1- Ação ajuizada em 23/05/2021. Recurso especial interposto em 15/06/2022 e atribuído à Relatora em 14/03/2023. 2- Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se houve decisão surpresa a respeito do não conhecimento da apelação por não ser esse o recurso cabível; e (ii) se cabe agravo de instrumento ou apelação contra a decisão que julga a primeira fase da ação de exigir contas e se, na hipótese, aplica-se o princípio da fungibilidade recursal. [...]. 4- Na doutrina que se construiu após a entrada em vigor do CPC/15, há divergência a respeito da natureza do pronunciamento jurisdicional que julga a primeira fase da ação de exigir contas e do recurso cabível - se se trata de decisão interlocutória impugnável por agravo de instrumento ou se se trata de sentença impugnável por apelação. 5- Diante do dissenso doutrinário e também jurisprudencial, esta Corte firmou posição, por intermédio de ambas as Turmas de Direito Privado, no sentido de que: (i) se o julgamento na primeira fase da ação de exigir contas for de procedência do pedido, o pronunciamento jurisdicional terá CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 47 natureza de decisão parcial de mérito e será impugnável por agravo de instrumento com base no art. 1.015, II, do CPC/15; e (ii) se o julgamento da primeira fase da ação de exigir contas for de improcedência do pedido ou de extinção do processo sem resolução de mérito, o pronunciamento jurisdicional terá natureza de sentença e será impugnável por apelação. Precedentes. 6- Conquanto a divergência até então existente autorizasse a aplicação do princípio da fungibilidade recursal, verifica-se que, passados quase 04 anos do momento em que a jurisprudência desta Corte se formou, por intermédio de ambas as Turmas de Direito Privado, no mesmo sentido, e dado que o referido entendimento se mantém estável, íntegro e coerente, não há mais que se falar em aplicação do princípio da fungibilidade recursal na hipótese em exame. 7- Ainda que remanesça dissenso doutrinário, não é mais razoável invocar a existência de divergência nesta Corte, eis que a jurisprudência se firmou e se consolidou no mesmo sentido desde 10/06/2019, data em que publicado o acórdão do REsp 1.680.168/SP, julgado pela 4ª Turma no mesmo sentido de anterior precedente desta 3ª Turma (REsp 1.746.337/RS, com acórdão publicado no DJe 12/04/2019), tratando-se, pois, do marco temporal que separa a dúvida objetiva até então existente do erro grosseiro superveniente à pacificação. 8- Na hipótese, o ato judicial impugnado por apelação foi proferido em 12/11/2021, ou seja, mais de 02 anos após a consolidação da jurisprudência desta Corte no sentido de ser cabível o agravo de instrumento, razão pela qual é inaplicável o princípio da fungibilidade recursal sob a ótica da imprecisão ou falta de técnica do legislador. [...]. (REsp 2055241/SP, Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, Data do Julgamento: 13/06/2023, Data da Publicação: 16/06/2023). Em continuidade, com a sentença condenatória que resolve a primeira fase, dá-se início à segunda fase do procedimento, no qual se tem como objeto a determinação de eventual saldo a ser aferido nas contas apresentadas e julgadas. O desenvolvimento do procedimento dessa segunda fase procedimental dependerá da postura a ser adotada pelo réu condenado. Assim, tem-se que: 1) Caso o réu apresente as contas no prazo legal de 15 dias, terá o autor o prazo de 15 dias para se manifestar sobre elas. Sendo necessário, haverá produção de prova pericial, com fulcro no art. 550, § 6º do CPC: Art. 550, § 6º Se o réu apresentar as contas no prazo previsto no § 5º, seguir- se-á o procedimento do § 2º, caso contrário, o autor apresentá-las-á no prazo de 15 (quinze) dias, podendo o juiz determinar a realização de exame pericial, se necessário. 2) Não as apresentando no prazo legal, caberá ao autor fazê-lo no prazo de 15 dias, não podendo o réu impugnar as contas apresentadas pelo autor. Trata-se de medida de sanção processual ao réu que não cumpriu sua obrigação de apresentar as contas no prazo legal. Entretanto, ainda que exista previsão expressa dessa sanção processual, o próprio art. 550, § 6°, do CPC, prevê que o juiz, sempre que entender necessário, determinará a produção da prova CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 48 pericial, de forma que a sanção processual não impede que o juiz determine de ofício a produção de prova pericial contábil referente às contas apresentadas pelo autor. A referida medida também encontra respaldo na jurisprudência do STJ, no sentido de que o juiz pode determinar de ofício a produção de prova pericial contábil, eis que se trata de uma proteção ao réu que pode ser prejudicado quando da apresentação de contas incorretas e/ou inconsistentes pelo autor. Assim segue: AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. OMISSÃO. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. PRAZO. 48 HORAS. REAPRESENTAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRECLUSÃO. - Se não havia defeito a ser sanado, não incorre em ofensa ao art. 535 do CPC o acórdão que rejeita os embargos declaratórios. - Se o réu não presta contas no prazo de 48 horas (CPC, Art. 915, § 2º) as que o autor apresentar serão julgadas segundo o prudente arbítrio do juiz que poderá, se considerar necessário, determinar a realização de perícia contábil (CPC, Art. 915, § 3º, segunda parte). - Não há previsão de reabertura do prazo para reapresentação de contas se a própria lei prevê as consequências para o descumprimento do comando da sentença. (STJ - AgRg no Ag: 718903 RS 2005/0183154-9, Relator: Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, Data de Julgamento: 25/09/2007, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 15.10.2007 p. 257). 4. AÇÕES POSSESSÓRIAS 4.1. PROTEÇÃO POSSESSÓRIA A tutela da posse desenvolve-se por meio de 3 diferentes espécies de ações, chamadas de interditos possessórios: 1) Reintegração de posse: cabível diante de um esbulho, em caso de perda total do exercícioda posse. 2) Manutenção de posse: cabível quando ocorre a turbação, em caso de perda parcial da posse (limitações em seu pleno exercício). 3) Interdito proibitório: cabível em caso de ameaça de efetiva ofensa à posse. Trata-se de uma ação possessória inibitória, dada a sua natureza preventiva, que tenta evitar a realização do ato ilícito. Como o tema foi cobrado em concurso? (MP-PA - Promotor - CESPE - 2023): O procedimento de manutenção de posse é cabível na hipótese de turbação, em que há esbulho parcial, ou seja, perda de algum dos poderes fáticos sobre a coisa, mas não da totalidade da posse. Correto. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 49 Quando a demanda versar sobre o domínio da coisa, terá natureza petitória, não se aplicando a ela as regras previstas no procedimento especial das ações possessórias. Desse modo, a principal característica da ação possessória é a tutela de um possuidor contra um fato que ofenda a sua posse, de forma que são excluídas do âmbito das ações possessórias as demandas em que se alegue a existência de relação jurídica que dê ao autor direito à posse, tais como a imissão de posse e a ação de nunciação de obra nova. Ex.: João comprou um imóvel financiado pelo Sistema Financeiro da Habitação e parou de pagar, tornando-se inadimplente. O banco financiador alienou extrajudicialmente o imóvel para quitar o saldo devedor. Daniel comprou o imóvel do banco. A partir do momento que Daniel se tornou proprietário do imóvel, ele passou a ter direito à posse. Assim, se João não sair espontaneamente do imóvel, Daniel deverá ajuizar ação de imissão na posse (seguindo o procedimento comum), eis que ele nunca teve a posse do imóvel anteriormente. Outrossim, os embargos de terceiro tutelam a posse, mas, nesse caso, a ofensa deriva de ato judicial, o que é suficiente para a distinção entre essa ação e as ações possessórias. 4.2. FUNGIBILIDADE A fungibilidade entre as tutelas possessórias se encontra expressamente prevista no art. 554 do CPC: Art. 554. A propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela cujos pressupostos estejam provados. Isto posto, é lícito ao juiz conceder uma tutela possessória diversa daquela expressamente pedida pelo autor, não ocasionando a nulidade da sentença, pois não se trata de decisão ultra/extra petita. Existem 3 diferentes razões para que a fungibilidade tenha razão de existir: 1) A função das ações possessórias é sempre a mesma, qual seja, a tutela da posse, sendo eventual equívoco processual do autor irrelevante; 2) A situação possessória pode facilmente ser modificada na constância da demanda; 3) É inegável a dificuldade que se encontra em determinadas hipóteses para se definir com exatidão qual espécie de violação à posse está caracterizada no caso concreto. Como o tema foi cobrado em concurso? (TJ-SP - Juiz - VUNESP - 2023): A propositura de uma ação possessória em vez de outra não impede que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela cujos pressupostos estejam provados. A lei, assim, regula expressamente a fungibilidade das ações possessórias. Correto. 4.3. AÇÃO DÚPLICE CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 50 O art. 556 do CPC dispõe que: Art. 556. É lícito ao réu, na contestação, alegando que foi o ofendido em sua posse, demandar a proteção possessória e a indenização pelos prejuízos resultantes da turbação ou do esbulho cometido pelo autor. O referido dispositivo normativo prevê expressamente a admissibilidade do pedido de proteção possessória do réu na própria contestação, razão pela qual existe amplo posicionamento doutrinário, especialmente de Nery e Marcato, a defender a natureza dúplice das ações possessórias. Para Daniel Assumpção, todavia, o fato de réu ter que pedir a tutela possessória prevista no art. 556 demonstra que a natureza da ação não é dúplice. Para o doutrinador, sempre que inexistir predeterminação das legitimações, de forma que qualquer dos sujeitos envolvidos na relação jurídica material conflituosa possa ser o autor da demanda judicial, a ação será dúplice. A conclusão é que na ação dúplice não existe qualquer necessidade de o réu formular expressamente pedido contra o autor, já que pela própria natureza do direito material debatido, a improcedência do pedido levará o réu à obtenção do bem da vida discutido. Assim, Daniel Assumpção defende que nas ações dúplices, a defesa propriamente dita é que, se acolhida, entregará automaticamente o bem da vida ao réu, sem a necessidade de pedido expresso e sem a preocupação com eventual afronta ao princípio da inércia da jurisdição. Conclui- se que na ação dúplice, tal pedido, mais do que desnecessário, será incabível. Ressalta-se, contudo, que há precedente do STJ no sentido de que a ação possessória tem natureza dúplice, mas a mera improcedência não concede tutela ao réu, que depende de pedido expresso deste, in verbis: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ORDEM JUDICIAL DE IMISSÃO DO ARREMATANTE NA POSSE DO IMÓVEL ARREMATADO, EM EXECUÇÃO FISCAL. ÁREA OBJETO DE DISCUSSÃO EM AÇÃO POSSESSÓRIA JULGADA IMPROCEDENTE. INEXISTÊNCIA DE PEDIDO CONTRAPOSTO DO RÉU. POSSE DESTE NÃO CONVALIDADA. QUALIDADE DA POSSE. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. INCOMPATIBILIDADE COM A VIA MANDAMENTAL. LEGALIDADE DO ATO ATACADO. I - A ação possessória julgada improcedente não tem o condão de convalidar a posse do réu se este assim não requereu expressamente em sede de contestação. Caráter dúplice da ação possessória. Inteligência do artigo 922 do Código de Processo Civil. II - Legalidade do ato judicial que, em paralelo processo executivo fiscal, determina a imissão do arrematante no bem litigioso, sobretudo se o terceiro interessado, réu daquela ação possessória, intimado dos leilões designados, manifestou desinteresse sobre a questão. III - Inviável, em sede de mandado de segurança, dilação probatória para verificação da qualidade da posse alegada, não comprovada de plano. Nego provimento ao recurso. (STJ - RMS: 20626 PR 2005/0145847-0, Relator: Ministro PAULO FURTADO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/BA), Data de Julgamento: 15/10/2009, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: --> DJe 29/10/2009). CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 51 Obs.: deve-se adotar o posicionamento do STJ em provas objetivas, cabendo a discussão da natureza dúplice das ações possessórias apenas na fase discursiva e oral. 4.4. COMPETÊNCIA Em regra, é da Justiça Estadual a competência para o julgamento das ações possessórias. Excepcionalmente, a competência será da Justiça do Trabalho, em caso de reintegração de posse de imóvel concedido em comodato em razão de contrato de trabalho rescindido, e também da Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, CF/88: Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho. No tocante à competência territorial para as ações possessórias, a norma aplicável dependerá de ser o bem móvel ou imóvel. As ações possessórias sobre bem móvel seguem o foro comum, isto é, o domicílio do réu, com fulcro no art. 46 do CPC: Art. 46. A ação fundada em direito pessoal ou em direito real sobre bens móveis será proposta, em regra, no foro de domicílio do réu. Trata-se de regra de competência relativa, admitindo-se a sua prorrogação no caso concreto. Já as ações possessórias que versam sobre bem imóvel, aplica-se o art. 47, § 2º, do CPC, sendo competente o foro do local do imóvel: Art. 47. Para as ações fundadas em direito real sobre imóveis é competente49 4.3. AÇÃO DÚPLICE .................................................................................................................. 49 4.4. COMPETÊNCIA .................................................................................................................. 51 4.5. LEGITIMIDADE ................................................................................................................... 52 4.6. EXCEÇÃO DE DOMÍNIO .................................................................................................... 54 4.7. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS .............................................................................................. 56 4.8. PROCEDIMENTO ............................................................................................................... 56 4.8.1. Reintegração e manutenção de posse ........................................................................ 56 4.8.2. Interdito proibitório ....................................................................................................... 61 5. AÇÃO DE DEMARCAÇÃO E DIVISÃO DE TERRAS PARTICULARES .................................. 61 5.1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 61 5.2. PROCEDIMENTO DA AÇÃO DE DEMARCAÇÃO ............................................................ 62 5.3. PROCEDIMENTO DA AÇÃO DE DIVISÃO........................................................................ 65 6. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE ............................................................. 67 6.1. CABIMENTO ....................................................................................................................... 67 6.2. PRETENSÕES VEICULÁVEIS ........................................................................................... 70 6.3. LEGITIMIDADE ................................................................................................................... 70 6.4. PROCEDIMENTO ............................................................................................................... 71 7. AÇÃO DE INVENTÁRIO E PARTILHA ...................................................................................... 73 7.1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 73 7.2. CUMULAÇÃO DE INVENTÁRIOS ...................................................................................... 76 7.3. INVENTÁRIO NEGATIVO ................................................................................................... 76 7.4. COMPETÊNCIA E UNIVERSALIDADE DO FORO SUCESSÓRIO .................................. 77 7.5. QUETÕES DE “ALTA INDAGAÇÃO” ................................................................................. 78 7.6. ADMINISTRADOR PROVISÓRIO ...................................................................................... 79 7.7. INVENTARIANTE ................................................................................................................ 80 7.8. ARROLAMENTO SUMÁRIO............................................................................................... 83 7.9. ARROLAMENTO COMUM ................................................................................................. 86 CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 3 7.10. PROCEDIMENTO DO INVENTÁRIO ................................................................................. 88 7.11. PARTILHA ........................................................................................................................... 92 7.11.1. Desconstituição da sentença de partilha ..................................................................... 94 8. EMBARGOS DE TERCEIRO ..................................................................................................... 96 8.1. CONCEITO .......................................................................................................................... 96 8.2. LEGITIMAÇÃO .................................................................................................................... 97 8.2.1. Legitimidade ativa ........................................................................................................ 97 8.2.2. Legitimidade passiva ................................................................................................. 100 8.3. COMPETÊNCIA ................................................................................................................ 101 8.4. PRAZO .............................................................................................................................. 102 8.5. PROCEDIMENTO ............................................................................................................. 103 9. OPOSIÇÃO ............................................................................................................................... 105 9.1. CONCEITO ........................................................................................................................ 105 9.2. PROCEDIMENTO ............................................................................................................. 106 9.3. DEMANDA BIFRONTE ..................................................................................................... 108 10. HABILITAÇÃO ...................................................................................................................... 109 10.1. CABIMENTO ..................................................................................................................... 109 10.2. PROCEDIMENTO ............................................................................................................. 109 11. DAS AÇÕES DE FAMÍLIA .................................................................................................... 111 11.1. CABIMENTO ..................................................................................................................... 111 11.2. ASPECTOS PROCEDIMENTAIS ..................................................................................... 111 11.2.1. Incentivo às formas consensuais do conflito ............................................................. 111 11.2.2. Audiência de mediação e conciliação ....................................................................... 112 11.2.3. Ministério Público ....................................................................................................... 112 11.2.4. Depoimento pessoal do incapaz ............................................................................... 113 12. AÇÃO MONITÓRIA .............................................................................................................. 113 12.1. CONCEITO ........................................................................................................................ 113 12.2. ADMISSIBILIDADE ........................................................................................................... 114 12.3. FAZENDA PÚBLICA ......................................................................................................... 117 12.4. PROPOSITURA ................................................................................................................ 118 12.5. CITAÇÃO ........................................................................................................................... 119 12.6. REAÇÕES DO RÉU .......................................................................................................... 119 12.7. NATUREZA JURÍDICA DOS EMBARGOS AO MANDADO MONITÓRIO ...................... 120 12.8. PROCEDIMENTO DOS EMBARGOS .............................................................................. 121 13. HOMOLOGAÇÃO DO PENHOR LEGAL ............................................................................. 122 13.1. CONCEITOo foro de situação da coisa. § 2º A ação possessória imobiliária será proposta no foro de situação da coisa, cujo juízo tem competência absoluta. Conforme própria disposição normativa, a regra é de competência absoluta, não se admitindo que a demanda tenha andamento em outro foro. Excepciona-se à referida regra de competência absoluta a hipótese de recuperação judicial em trâmite, que exercerá vis actrativa, conforme posicionamento do STJ: PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO DE DIREITO E JUÍZO FEDERAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. NECESSIDADE DE SUSPENSÃO DAS AÇÕES E EXECUÇÕES. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PRECEDENTES DO STJ. 1. "A e. 2ª Seção desta a. Corte, ao sopesar a dificuldade ou mesmo total inviabilização da implementação do plano CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 52 de recuperação judicial, decorrente da continuidade das execuções individuais, concluiu que, aprovado e homologado o plano de recuperação judicial, os créditos deverão ser executados de acordo com as condições ali estipuladas." (CC 98.264/SP, Rel. Ministro Massami Uyeda) 2. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito da 4ª Vara Empresarial da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro/RJ. (STJ - CC: 106768 RJ 2009/0146476-0, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 23/09/2009, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: --> DJe 02/10/2009). Ante o exposto, havendo recuperação judicial em trâmite, eventual ação possessória que verse sobre bem da sociedade empresária em processo de soerguimento empresarial deve tramitar perante o juízo da recuperação judicial. Por fim, estando o imóvel situado em mais de um foro, qualquer um deles será competente para conhecer a demanda. Segundo o art. 60 do CPC, determinar-se-á nesse caso o foro competente por prevenção, o que significa dizer que, havendo mais de uma demanda possessória sobre o mesmo imóvel em foros diferentes, aplica-se o art. 59, do CPC, determinando-se a prevenção do juízo em que foi registrada ou distribuída a petição inicial. Art. 60. Se o imóvel se achar situado em mais de um Estado, comarca, seção ou subseção judiciária, a competência territorial do juízo prevento estender-se- á sobre a totalidade do imóvel. 4.5. LEGITIMIDADE O possuidor é parte legítima à propositura das ações possessórias, sendo que na hipótese de posse direta (locação, usufruto, comodato), a defesa da posse pode ser realizada em juízo tanto pelo possuidor direto como pelo indireto, que podem inclusive litigar em conjunto em litisconsórcio facultativo. Segundo o art. 1.197 do CC, na hipótese de posse direta (locação, comodato, usufruto), a legitimidade ativa é tanto do possuidor direto como do indireto: Art. 1.197. A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto. Existe, portanto, uma legitimidade concorrente disjuntiva, uma vez que a presença de qualquer um dos legitimados no polo ativo da demanda já é suficiente, de maneira que os dois também podem se unir para propor a demanda. No entanto, o simples detentor da coisa, que a ocupa por mera permissão ou tolerância do possuidor, não tem legitimidade para propor ação possessória, o mesmo ocorrendo com o sujeito que conserva a posse da coisa sob ordens ou instruções do possuidor. Ex.: caseiro. Há, contudo, precedentes do STJ no sentido de entender como legitimado ativo invasor de terra pública contra outros particulares (que invadiram posteriormente a mesma terra pública), CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 53 porque reconhece que, nesse caso, o animus domini é evidente, apesar de ser juridicamente infrutífero. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL. ÁREAS PÚBLICAS DISPUTADAS ENTRE PARTICULARES. POSSIBILIDADE DO SOCORRO ÀS DEMANDAS POSSESSÓRIAS. 1. A ocupação de área pública, sem autorização expressa e legítima do titular do domínio, não pode ser confundida com a mera detenção. 2. Aquele que invade terras e nela constrói sua moradia jamais exercerá a posse em nome alheio. Não há entre ele e o proprietário ou quem assim possa ser qualificado como o que ostenta jus possidendi uma relação de dependência ou subordinação. 3. Ainda que a posse não possa ser oposta ao ente público senhor da propriedade do bem, ela pode ser oposta contra outros particulares, tornando admissíveis as ações possessórias entre invasores. 4. Recurso especial não provido. (STJ - REsp: 1484304 DF 2014/0252641-1, Relator: Ministro MOURA RIBEIRO, Data de Julgamento: 10/03/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/03/2016). Isto posto, para o Tribunal Superior, o invasor de terra pública anterior tem direito a requerer a posse do invasor posterior. Além disso, o STJ também possui precedente que reconhece a possibilidade de cabimento de ação possessória entre particulares sobre bens públicos dominicais (de uso comum do povo): [...]. 6. O Código Civil de 2002 adotou o conceito de posse de Ihering, segundo o qual a posse e a detenção distinguem-se em razão da proteção jurídica conferida à primeira e expressamente excluída para a segunda. 7. Diferentemente do que ocorre com a situação de fato existente sobre bens públicos dominicais - sobre os quais o exercício de determinados poderes ocorre a pretexto de mera detenção -, é possível a posse de particulares sobre bens públicos de uso comum, a qual, inclusive, é exercida coletivamente, como composse. 8. Estando presentes a possibilidade de configuração de posse sobre bens públicos de uso comum e a possibilidade de as autoras serem titulares desse direito, deve ser reconhecido o preenchimento das condições da ação. 9. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido. (STJ - REsp: 1582176 MG 2012/0031046-3, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 20/09/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/09/2016 RJTJRS vol. 302 p. 157 RJTJRS vol. 303 p. 109 RT vol. 975 p. 541). Para melhor compreensão, imagina-se que um particular utiliza frequentemente um bem público dominical de uso comum (ex.: praça). Todos os dias o indivíduo comparece à praça. Certo dia, quando o particular chegou na praça, percebeu que ela havia sido invadida por um grupo, que se apossou da área. Segundo o STJ, esse particular (frequentador habitual da praça) tem legitimidade ativa para ingressar com ação de reintegração de posse em face dos invasores da praça. O polo passivo é o sujeito responsável pelo ato de moléstia/violação à posse. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 54 Ocorre que quando o ato de moléstia à posse é praticado por multidão de pessoas, a natural dificuldade e/ou impossibilidade de se individualizar todos os agressores à posse faz com que a demanda seja proposta contra réus incertos. Há, portanto, uma multidão de pessoas legitimadas a compor o polo passivo da demanda (litisconsórcio necessário), em que se sabe quem são os réus, mas não é possível indicá-los. Sobre o tema, importante visualizar o disposto no art. 554 do CPC: Art. 554, § 1º No caso de ação possessória em que figure no polo passivo grande número de pessoas, serão feitas a citação pessoal dos ocupantes que forem encontrados no local e a citação por edital dos demais, determinando-se, ainda, a intimação do Ministério Público e, se envolver pessoas em situação de hipossuficiência econômica, da Defensoria Pública. § 2º Para fim da citação pessoal prevista no § 1º, o oficial de justiça procurará os ocupantes no local por uma vez, citando-se por edital os que não forem encontrados. § 3º O juiz deverá determinar que se dê ampla publicidade da existência da ação prevista no § 1º e dos respectivos prazos processuais,podendo, para tanto, valer-se de anúncios em jornal ou rádio locais, da publicação de cartazes na região do conflito e de outros meios. Por fim, no que se refere aos cônjuges e companheiros, apesar de o art. 47 do CPC reconhecer a natureza de direito real do direito possessório, o art. 73, § 2º do CPC, tem tratamento expresso a respeito do litisconsórcio entre eles nas ações possessórias. De acordo com o referido dispositivo, o litisconsórcio somente necessário nas hipóteses de composse ou de ato praticado por ambos, in verbis: Art. 73. O cônjuge necessitará do consentimento do outro para propor ação que verse sobre direito real imobiliário, salvo quando casados sob o regime de separação absoluta de bens. § 2º Nas ações possessórias, a participação do cônjuge do autor ou do réu somente é indispensável nas hipóteses de composse ou de ato por ambos praticado. 4.6. EXCEÇÃO DE DOMÍNIO Segundo o art. 557, caput, do CPC, na pendência de ação possessória, é vedado, tanto ao autor como ao réu dessa demanda, propor ação petitória na qual se discute a propriedade do bem cuja posse já se discute na ação possessória, exceto se a pretensão for deduzida em face de terceira pessoa: Art. 557. Na pendência de ação possessória é vedado, tanto ao autor quanto ao réu, propor ação de reconhecimento do domínio, exceto se a pretensão for deduzida em face de terceira pessoa. Parágrafo único. Não obsta à manutenção ou à reintegração de posse a alegação de propriedade ou de outro direito sobre a coisa. Ex.: se João e Maria estão envolvidos em uma ação possessória, eles não podem (um contra o outro) propor uma ação reivindicatória sobre o mesmo bem enquanto durar a ação possessória. É possível, no entanto, que João discuta com José (terceiro). CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 55 Ressalta-se, nesse liame, que parte da doutrina defende que a referida disposição normativa não retira da parte o direito de ação, atuando a ação possessória como uma condição suspensiva do exercício desse direito. Sendo a posse um direito autônomo, distinto da propriedade, podendo ser inclusive oposto contra o próprio proprietário, a vedação legal imposta pelo art. 557 do CPC busca proteger o possuidor contra o proprietário que esbulha, turba ou ameaça molestar sua posse. No mesmo sentido é a previsão do art. 1210, § 2º, do Código Civil, que prevê não obstar a reintegração ou manutenção a alegação em sede de defesa do direito de propriedade: Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado. 2º Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa. Significa, portanto, que no âmbito das ações possessórias, o réu não poderá alegar em sua defesa a propriedade sobre o bem, porque se assim não fosse, todo proprietário poderia tomar para si a posse, ainda que de forma ilegítima, alegando em ação judicial ser o proprietário e por isso fazer jus à principal consequência jurídica desse direito, que é a posse. Ex.: locador que, sabendo que o locatário saiu para viajar no final de semana, retoma de forma ilegal a posse do imóvel. Ressalta-se, entretanto, que nas ações em que as partes disputam a posse com base na alegação de propriedade, ou seja, quando ambas as partes se valem do argumento de que são proprietárias para daí terem direito à posse, será não só permitida, mas como necessária, a discussão a respeito do direito de propriedade. Todavia, Daniel Assumpção alerta que é preciso ter cuidado na análise de tais ações, porque a jurisprudência dos Tribunais Superiores aponta para a sua natureza de ação possessória, abrindo-se uma exceção à proibição da “exceção de domínio” como matéria defensiva: Súmula 487 do STF: Será deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio, se com base neste for ela disputada. RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - ALEGAÇÃO DE DOMÍNIO - INOCORRÊNCIA DAS EXCEÇÕES ADMITIDAS - IMPOSSIBILIDADE - REEXAME DE PROVAS - INVIABILIDADE - SÚMULA 7/STJ. 1. A teor da jurisprudência desta Corte, em se tratando de ação possessória, descabe discussão sobre domínio, exceto se os litigantes disputam a posse alegando propriedade ou quando duvidosas ambas as posses suscitadas. Inocorre, no caso, ambas as hipóteses. Assim, incensurável o v. acórdão que julga carecedor de ação - por falta de adequação do pedido autoral à providência requerida - o proprietário que invoca a proteção possessória fundada em título dominial. 2. De outro lado, a pretensão do recorrente de reexame das provas, sob o argumento de não terem sido devidamente analisadas pelas instâncias ordinárias, encontra óbice na Súmula 7/STJ. 3. Recurso não conhecido. (STJ - REsp: 755861 SE 2005/0089953-0, Relator: Ministro JORGE SCARTEZZINI, Data de Julgamento: 16/08/2005, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: --> DJ 05/09/2005 p. 434). Salienta-se, contudo, que os doutrinadores Nery, Câmara e Humberto Theodoro Junior apontam para a natureza real de tais ações (ação petitória), nas quais a disputa da posse se dá CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 56 com base no domínio, sendo por essa razão cabível decidir em dar a posse à parte que demonstrar ser o proprietário. 4.7. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS Estabelece o art. 555 do CPC que: Art. 555. É lícito ao autor cumular ao pedido possessório o de: I - condenação em perdas e danos; II - indenização dos frutos. Parágrafo único. Pode o autor requerer, ainda, imposição de medida necessária e adequada para: I - evitar nova turbação ou esbulho; II - cumprir-se a tutela provisória ou final. O pedido de condenação por perdas e danos deve estar amparado em fundamentação suficiente que demonstre as razões pelas quais o autor entende devidas tais verbas. A indenização não é consequência natural do acolhimento do pedido de proteção possessória, de forma que se exige do autor a narração da causa de pedir própria do pedido de indenização. No inciso II está previsto entre os pedidos cumuláveis com o pedido possessório a indenização de frutos, hipótese aplicável para a situação de o bem gerar frutos que sejam apossados pelo agressor possessório. No que se refere às disposições do parágrafo único, tem-se que as medidas necessárias e adequadas que dependem de pedido do autor para serem concedidas são voltadas a evitar uma nova agressão possessória, porque para aquela versada na própria ação possessória tais medidas serão aplicadas de ofício pelo juiz para efetivar sua decisão, provisória ou definitiva. Assim, as medidas adequadas que dependem de pedido expresso do autor não têm como objetivo pressionar psicologicamente o réu a cumprir a obrigação reconhecida em sentença, mas sim convencê-lo a não praticar novos atos de agressão possessória. 4.8. PROCEDIMENTO 4.8.1. Reintegração e manutenção de posse O procedimento da reintegração e manutenção de posse está disposto nos arts. 560 a 566 do CPC, in verbis: Art. 560. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação e reintegrado em caso de esbulho. Art. 561. Incumbe ao autor provar: I - a sua posse; II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu; III - a data da turbação ou do esbulho; IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse, na ação de reintegração. Art. 562. Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu, a expedição do mandado liminar de manutenção ou de CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 57 reintegração, caso contrário, determinará que o autor justifique previamente o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada. Parágrafo único. Contra as pessoas jurídicas de direito público não será deferida a manutenção ou a reintegraçãoliminar sem prévia audiência dos respectivos representantes judiciais. Art. 563. Considerada suficiente a justificação, o juiz fará logo expedir mandado de manutenção ou de reintegração. Art. 564. Concedido ou não o mandado liminar de manutenção ou de reintegração, o autor promoverá, nos 5 (cinco) dias subsequentes, a citação do réu para, querendo, contestar a ação no prazo de 15 (quinze) dias. Parágrafo único. Quando for ordenada a justificação prévia, o prazo para contestar será contado da intimação da decisão que deferir ou não a medida liminar. Art. 565. No litígio coletivo pela posse de imóvel, quando o esbulho ou a turbação afirmado na petição inicial houver ocorrido há mais de ano e dia, o juiz, antes de apreciar o pedido de concessão da medida liminar, deverá designar audiência de mediação, a realizar-se em até 30 (trinta) dias, que observará o disposto nos §§ 2º e 4º. § 1º Concedida a liminar, se essa não for executada no prazo de 1 (um) ano, a contar da data de distribuição, caberá ao juiz designar audiência de mediação, nos termos dos §§ 2º a 4º deste artigo. § 2º O Ministério Público será intimado para comparecer à audiência, e a Defensoria Pública será intimada sempre que houver parte beneficiária de gratuidade da justiça. § 3º O juiz poderá comparecer à área objeto do litígio quando sua presença se fizer necessária à efetivação da tutela jurisdicional. § 4º Os órgãos responsáveis pela política agrária e pela política urbana da União, de Estado ou do Distrito Federal e de Município onde se situe a área objeto do litígio poderão ser intimados para a audiência, a fim de se manifestarem sobre seu interesse no processo e sobre a existência de possibilidade de solução para o conflito possessório. § 5º Aplica-se o disposto neste artigo ao litígio sobre propriedade de imóvel. Art. 566. Aplica-se, quanto ao mais, o procedimento comum. Trata-se de procedimento especial que somente ocorrerá quando se estiver diante da posse nova (agressão recente, cujo ato de violação à posse ocorreu a menos de ano e dia da propositura da ação) de bens imóveis. Assim, em se tratando de posse velha, seguirá o procedimento comum. Obs.: Daniel Assumpção afirma que é um falso procedimento especial, pois a partir da decisão liminar, o procedimento especial transforma-se no procedimento comum, conforme estabelecido pelo art. 566 do CPC. No que se refere à previsão de liminar, trata-se de uma tutela de evidência (provisória e satisfativa) e, nos termos do art. 561 do CPC, incumbe ao autor provar: 1) Sua posse; 2) A turbação ou esbulho praticado pelo réu; 3) A data do ato de agressão à posse; CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 58 4) Continuação da posse turbada ou perda da posse esbulhada. Além disso, a petição inicial deve estar devidamente instruída com prova (pré-constituída) documental ou documentada. Assim sendo, constata-se que a liminar será concedida sempre que 2 requisitos forem preenchidos no caso concreto, sendo dispensada no caso concreto a demonstração de periculum in mora: 1) Demonstração de que o ato de agressão à posse deu-se há menos de ano e dia; 2) Instrução da petição inicial que, em cognição sumária do juiz, permita a formação de convencimento de que há probabilidade de o autor ter direito à tutela jurisdicional. Ressalta-se que em caso de posse velha (que segue o procedimento comum), cabe tutela antecipada, de acordo com posicionamento do STJ: Ação de reintegração de posse. Tutela antecipada. 1. Embora possível, a tutela antecipada em ação de reintegração de posse deve ser indeferida quando as circunstâncias do caso concreto indicam que não estão preenchidos todos os requisitos do art. 273 do Código de Processo Civil, levando-se em consideração a situação do detentor da coisa. 2. Recurso especial não conhecido. (STJ - REsp: 555027 MG 2003/0094211-9, Relator: Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Data de Julgamento: 27/04/2004, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 07/06/2004 p. 223). Em continuidade, segundo o art. 562 do CPC, não estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz poderá designar audiência de justificação prévia, com a devida citação do réu para comparecer à referida audiência, in verbis: Art. 562. Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu, a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração, caso contrário, determinará que o autor justifique previamente o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada. É importante salientar que a designação da audiência de justificação prévia independe de pedido expresso do autor e ocorre com a objetivo de produção de provas, a fim de que o juiz, na situação de dúvida sobre a concessão da liminar, possa ouvir testemunhas do autor e afastar o estado de incerteza. Ressalta-se que o réu, por meio de advogado, pode participar ativamente na oitiva das testemunhas do autor (contraditar, fazer perguntas), mas não poderá arrolar/levar testemunhas, conforme posicionamento de Marcato e Marinoni. Realizada a audiência de justificação prévia, o juiz poderá ou não conceder a liminar requerida pelo autor. Havendo a concessão da liminar, o réu será intimado na própria audiência, ainda que não se encontre presente e nem se faça presente por advogado devidamente constituído. Como previsto no art. 564 do CPC, independentemente da concessão da liminar, o réu será intimado em audiência para se defender no prazo legal, desde que a decisão sobre a liminar seja CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 59 proferida na audiência. Pode o juiz chamar os autos a conclusão e proferir decisão em cartório, hipótese na qual o réu será devidamente intimado. Desse modo, considerando que o réu será intimado em audiência para se defender no prazo legal, infere-se que a ausência de intimação é causa de nulidade, não se considerando iniciado o prazo de resposta do réu, de acordo com posicionamento do STJ: AÇÃO REINTEGRATÓRIA DE POSSE. AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO. PRAZO PARA CONTESTAÇÃO. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 930, PARÁGRAFO ÚNICO DO CPC. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A ciência que se dá ao réu acerca da audiência de justificação, prevista no artigo 928, não corresponde a citação para os fins do artigo 213 do CPC, mas chamamento para acompanhar a assentada de justificação. 2. Realizada a audiência de justificação, concedida ou não a liminar, o autor promoverá a citação do réu para contestar, sendo que o prazo só terá início a partir da juntada aos autos do mandado de intimação da decisão que deferir ou não a liminar, nos termos do artigo 930, parágrafo único do CPC. Precedentes desta Corte. 2. Recurso especial provido para anular a sentença e o acórdão. (STJ - REsp: 890598 RJ 2006/0213883-1, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 23/11/2010, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/11/2010). Ante o exposto, segundo Daniel Assumpção, pode-se afirmar que a audiência de justificação funciona como termo inicial da contagem do prazo de 15 dias para apresentação de contestação pelo réu. Insta verificar, ainda, outra especialidade procedimental prevista no art. 562, parágrafo único do CPC. Trata-se da previsão protetiva à Fazenda Pública, que determina a impossibilidade de concessão da liminar antes da oitiva das pessoas jurídicas de direito público: Art. 562, Parágrafo único. Contra as pessoas jurídicas de direito público não será deferida a manutenção ou a reintegração liminar sem prévia audiência dos respectivos representantes judiciais. Há, portanto, uma vedação à concessão de liminar inaudita altera pars. Conforme mencionado, o réu não será intimado para comparecer a audiência de conciliação prevista no art. 334 do CPC. Há uma citação para que o réu apresente contestação no prazo de 15 dias: Art. 564. Concedido ou nãoo mandado liminar de manutenção ou de reintegração, o autor promoverá, nos 5 (cinco) dias subsequentes, a citação do réu para, querendo, contestar a ação no prazo de 15 (quinze) dias. Parágrafo único. Quando for ordenada a justificação prévia, o prazo para contestar será contado da intimação da decisão que deferir ou não a medida liminar. A partir da contestação, o procedimento será comum. Ressalta-se que para Daniel Assumpção, até mesmo a reconvenção é expressamente admitida, considerando que o art. 556 do CPC permite ao réu em sua própria contestação formular pedidos de proteção possessória e de indenização pelos prejuízos sofridos. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 60 Outrossim, no art. 559 do CPC é mantida a exigência de caução – real ou fidejussória – contida no revogado art. 925 do CPC/1973 caso o autor, provisoriamente reintegrado ou mantido na posse, careça de idoneidade financeira para responder às perdas e danos do réu caso a tutela provisória seja revogada e sua efetivação tenha gerado prejuízo ao réu. Todavia, a parte será liberada da prestação de caução se comprovar ser economicamente hipossuficiente. Por fim, é importante visualizar o que dispõe o CPC acerca da manutenção e da reintegração de posse no que tange ao litígio coletivo pela posse de imóvel, estando previsto no art. 565 do CPC: Art. 565. No litígio coletivo pela posse de imóvel, quando o esbulho ou a turbação afirmado na petição inicial houver ocorrido há mais de ano e dia, o juiz, antes de apreciar o pedido de concessão da medida liminar, deverá designar audiência de mediação, a realizar-se em até 30 (trinta) dias, que observará o disposto nos §§ 2º e 4º. § 1º Concedida a liminar, se essa não for executada no prazo de 1 (um) ano, a contar da data de distribuição, caberá ao juiz designar audiência de mediação, nos termos dos §§ 2º a 4º deste artigo. § 2º O Ministério Público será intimado para comparecer à audiência, e a Defensoria Pública será intimada sempre que houver parte beneficiária de gratuidade da justiça. § 3º O juiz poderá comparecer à área objeto do litígio quando sua presença se fizer necessária à efetivação da tutela jurisdicional. § 4º Os órgãos responsáveis pela política agrária e pela política urbana da União, de Estado ou do Distrito Federal e de Município onde se situe a área objeto do litígio poderão ser intimados para a audiência, a fim de se manifestarem sobre seu interesse no processo e sobre a existência de possibilidade de solução para o conflito possessório. § 5º Aplica-se o disposto neste artigo ao litígio sobre propriedade de imóvel. Daniel Assumpção defende que a liminar prevista no caput do art. 565 não é a liminar possessória, porque o esbulho ou turbação ocorrido há mais de ano e dia corresponde à posse velha. Trata-se, portanto, de tutela de urgência (e não de evidência, como no caso de posse nova), ocasião na qual o autor deverá comprovar a situação de periculum in mora. Se a liminar não for executada no prazo de 1 ano a contar da data de distribuição da demanda – independentemente do motivo (ex.: desídia do autor, imposição de dificuldades pelo réu) – o juiz designará audiência de mediação. Nesse caso, proceder-se-á com a intimação do Ministério Público para comparecer à audiência e, havendo parte beneficiária da gratuidade da justiça, da Defensoria Pública. Como o tema foi cobrado em concurso? (DPE-PA - Defensor - CESPE - 2022): De acordo com as regras procedimentais estabelecidas no Código de Processo Civil para as ações possessórias coletivas de força velha, será obrigatória a designação de audiência de mediação, no prazo indicado em lei, antes da apreciação de pedido de concessão de medida liminar. Correto. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 61 4.8.2. Interdito proibitório A ação de interdito proibitório possui natureza inibitória, uma vez que visa evitar que a ameaça de agressão à posse se concretize, isto é, objetiva-se evitar a prática do ato ilícito consubstanciado no esbulho ou na turbação possessória. Ressalta-se que há aplicação subsidiária dos regramentos procedimentais das ações de reintegração e manutenção de posse, com base no art. 568 do CPC: Art. 568. Aplica-se ao interdito proibitório o disposto na Seção II deste Capítulo. É natural que exista pedido de proteção liminar no interdito proibitório, considerando que a sua própria razão de ser é a existência de um perigo iminente de moléstia à posse. Caberá ao juiz concedê-lo – com ou sem justificação prévia, conforme o caso – desde que o autor consiga comprovar sumariamente a efetiva e real ameaça de que sua posse corre risco de ser esbulhada ou turbada. Isto posto, Daniel Assumpção afirma que a liminar em sede de interdito proibitório também se utiliza do art. 561 do CPC, tratando-se, pois, de uma tutela de evidência. No entanto, os requisitos para concessão da tutela devem ser adaptados (ex.: evidenciar a ameaça de agressão à posse, mediante a narrativa adequada), em que pese não seja preciso comprovar o periculum in mora. Evidencia-se, por fim, que o art. 567 do CPC traz uma previsão de multa cominatória ao réu no âmbito da ação de interdito proibitório: Art. 567. O possuidor direto ou indireto que tenha justo receio de ser molestado na posse poderá requerer ao juiz que o segure da turbação ou esbulho iminente, mediante mandado proibitório em que se comine ao réu determinada pena pecuniária caso transgrida o preceito. Trata-se de medida de execução indireta (astreintes). 5. AÇÃO DE DEMARCAÇÃO E DIVISÃO DE TERRAS PARTICULARES 5.1. INTRODUÇÃO É importante frisar, a priori, que a divisão e demarcação de terras públicas seguem o procedimento da ação discriminatória, prevista na Lei 6.383/1976. Ressalta-se que mesmo diante de um conflito tipicamente resolvido pela ação de divisão e da demarcação de terras particulares nem sempre será necessária a propositura de ação judicial. Nos termos do art. 571 do CPC, a demarcação e a divisão poderão ser realizadas por escritura pública, desde que maiores, capazes e concordes todos os interessados, observando-se, no que couber, os dispositivos procedimentais referentes à matéria previstos no diploma processual. Ex.: irmãos que são coproprietários de uma fazenda e desejam delimitar a área específica que cada um possui. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 62 Há, entretanto, tutelas jurisdicionais distintas para o procedimento de divisão e o procedimento de remarcação, segundo o art. 569 do CPC: 1) Cabe ação de demarcação ao proprietário para obrigar o confinante (proprietário da área vizinha) a estremar os respectivos prédios, fixando-se novos limites entre eles ou aviventado-se os já apagados. Ex.: existe dúvida a respeito dos limites entre uma área e outra; 2) Cabe a ação de divisão ao condômino para obrigar os demais consortes a partilhar o bem comum. Em ambos os casos se tem um processo de conhecimento com procedimento especial que veicula pretensão de direito real, e sendo o direito de dividir e demarcar potestativo, o que afasta a aplicação de prazos prescricionais para as demandas ora analisadas, e não havendo em lei prazo decadencial, a qualquer momento poderá a parte interessada ingressar com a ação de divisão e demarcação de terras. A ação de divisão e demarcação de terras tem natureza dúplice, porque, independentemente de pedido do réu nesse sentido, o resultado do processo lhe será favorável se suas alegações defensivas, contidas na contestação, forem acolhidas pelo juiz. É importante evidenciar, em continuidade, que a ação demarcatória não se confunde com a ação reivindicatória. Ao passo que na ação reivindicatória o autor tem certeza da extensão daquilo que se reivindica, na ação demarcatória a certeza da extensão somente é obtida por meio de sentença. No mesmo sentido, também se distinguem a ação possessóriae a ação demarcatória, eis que possuem natureza distintas. A ação possessória, como o próprio nome evidencia, discute a posse. A ação demarcatória, por outro lado, tutela a propriedade. O art. 570 do CPC dispõe sobre a eventualidade da cumulação dos 2 pedidos das ações, de demarcação e de divisão, pelo autor: Art. 570. É lícita a cumulação dessas ações, caso em que deverá processar-se primeiramente a demarcação total ou parcial da coisa comum, citando-se os confinantes e os condôminos. Conforme apontado no dispositivo acima, ocorre antes a demarcação e depois a divisão. Para Daniel Assumpção, trata-se, na realidade, de cumulação de procedimentos em caráter sucessivo em um mesmo processo, e não propriamente uma cumulação de pedidos. 5.2. PROCEDIMENTO DA AÇÃO DE DEMARCAÇÃO O procedimento da ação de demarcação está disposto nos arts. 574 a 587 do CPC. Segundo o art. 575 do CPC, qualquer condômino é parte legítima para promover a demarcação do imóvel comum, requerendo a intimação dos demais para, querendo, intervir no processo. Assim, pode-se afirmar que a legitimidade ativa é do proprietário da área que busca a demarcação. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 63 A competência absoluta é do foro do local do imóvel, nos termos do art. 47 do CPC: Art. 47. Para as ações fundadas em direito real sobre imóveis é competente o foro de situação da coisa. A petição inicial deve seguir os arts. 319 e 320 do CPC. O art. 574 do CPC prevê, ainda, os documentos indispensáveis à propositura da demanda – os títulos de propriedade – que demonstram a legitimidade ativa do autor (condição da ação): Art. 574. Na petição inicial, instruída com os títulos da propriedade, designar- se-á o imóvel pela situação e pela denominação, descrever-se-ão os limites por constituir, aviventar ou renovar e nomear-se-ão todos os confinantes da linha demarcanda. Conforme supramencionado, como causa de pedir, na elaboração da peça inicial, o autor deve: 1) Indicar a situação e denominação do imóvel; 2) Descrever os limites por construir, aviventar ou renovar; 3) Nomear todos os confinantes (réus) da linha demarcanda. O revogado art. 953 do CPC/1973 previa que os réus que fossem residentes na comarca na qual tramitava o processo seriam citados pessoalmente, ao passo que os réus residentes nas demais comarcas seriam citados por edital. Atualmente, a citação, de acordo com o art. 576 do CPC, ocorre preferencialmente pelos correios (mas pode ser por oficial de justiça, por exemplo) ou edital, no caso do art. 259, III, parágrafo único, do CPC. Assim segue: Art. 576. A citação dos réus será feita por correio, observado o disposto no art. 247. Parágrafo único. Será publicado edital, nos termos do inciso III do art. 259. O prazo comum de contestação é de 15 dias, não incidindo no caso o art. 229 do CPC (prazo em dobro, desde que atendidos os requisitos), de acordo com o art. 577 do mesmo dispositivo: Art. 577. Feitas as citações, terão os réus o prazo comum de 15 (quinze) dias para contestar. Obs.: não cabe alegação de incompetência relativa em sede de contestação em razão da natureza absoluta da competência de foro. No que se refere à reconvenção, Daniel Assumpção defende que para o pedido demarcatório não cabe reconvenção em razão da nítida e indiscutível natureza dúplice dessa ação, mas a reconvenção é admissível caso o réu pretenda cumular pedidos de proteção possessória e de indenização por perdas e danos, por uma questão de isonomia, uma vez que é possível ao autor promover tais pedidos. Entretanto, Marinoni e Marcato são contra, pois entendem pelo não cabimento da reconvenção. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 64 Após a contestação, o processo seguirá o procedimento comum, conforme preconizado pelo art. 578 do CPC: Art. 578. Após o prazo de resposta do réu, observar-se-á o procedimento comum. Em razão da necessidade de instrução probatória, antes da prolação da sentença, haverá nomeação pelo juiz de um ou mais peritos, a fim de realizar o traçado da linha demarcanda, ocasião na qual deverá(ão) apresentar(em) um laudo pericial, nos termos do art. 580 do CPC: Art. 580. Concluídos os estudos, os peritos apresentarão minucioso laudo sobre o traçado da linha demarcanda, considerando os títulos, os marcos, os rumos, a fama da vizinhança, as informações de antigos moradores do lugar e outros elementos que coligirem. Após essa fase probatória pericial, o juiz sentenciará a demanda, sendo que na sentença de procedência determinará o traçado da linha demarcanda, nos termos do art. 581 do CPC, além de condenar o réu ao pagamento dos honorários advocatícios e custas processuais, o que também fará na hipótese de sentença de improcedência. O parágrafo único do dispositivo legal prevê que a sentença proferida na ação demarcatória determinará a restituição da área invadida, se houver (e caso não tenha sido determinada através de liminar), declarando o domínio ou a posse do prejudicado, ou ambos. Havendo o trânsito em julgado da decisão, dá-se início à segunda fase do processo, por meio da qual será efetivado concretamente o direito reconhecido em sentença, prevendo os arts. 582 a 587 do CPC a forma dos atos a serem praticados pelo perito e juiz no caso concreto: Art. 582. Transitada em julgado a sentença, o perito efetuará a demarcação e colocará os marcos necessários. Parágrafo único. Todas as operações serão consignadas em planta e memorial descritivo com as referências convenientes para a identificação, em qualquer tempo, dos pontos assinalados, observada a legislação especial que dispõe sobre a identificação do imóvel rural. Art. 583. As plantas serão acompanhadas das cadernetas de operações de campo e do memorial descritivo, que conterá: I - o ponto de partida, os rumos seguidos e a aviventação dos antigos com os respectivos cálculos; II - os acidentes encontrados, as cercas, os valos, os marcos antigos, os córregos, os rios, as lagoas e outros; III - a indicação minuciosa dos novos marcos cravados, dos antigos aproveitados, das culturas existentes e da sua produção anual; IV - a composição geológica dos terrenos, bem como a qualidade e a extensão dos campos, das matas e das capoeiras; V - as vias de comunicação; VI - as distâncias a pontos de referência, tais como rodovias federais e estaduais, ferrovias, portos, aglomerações urbanas e polos comerciais; VII - a indicação de tudo o mais que for útil para o levantamento da linha ou para a identificação da linha já levantada. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 65 Art. 584. É obrigatória a colocação de marcos tanto na estação inicial, dita marco primordial, quanto nos vértices dos ângulos, salvo se algum desses últimos pontos for assinalado por acidentes naturais de difícil remoção ou destruição. Art. 585. A linha será percorrida pelos peritos, que examinarão os marcos e os rumos, consignando em relatório escrito a exatidão do memorial e da planta apresentados pelo agrimensor ou as divergências porventura encontradas. Art. 586. Juntado aos autos o relatório dos peritos, o juiz determinará que as partes se manifestem sobre ele no prazo comum de 15 (quinze) dias. Parágrafo único. Executadas as correções e as retificações que o juiz determinar, lavrar-se-á, em seguida, o auto de demarcação em que os limites demarcandos serão minuciosamente descritos de acordo com o memorial e a planta. Art. 587. Assinado o auto pelo juiz e pelos peritos, será proferida a sentença homologatória da demarcação. Após a realização dos trabalhos, o perito apresentará um lado, que será assinado pelo juiz, momento no qual este proferirá a sentença homologatória da demarcação. Há, portanto, 2 sentenças dividindo as especialidades procedimentais na ação de demarcação de terras particulares. Como o tema foi cobrado em concurso? (TJ-AP- Juiz - FGV - 2022): João, pretendendo aviventar a linha divisória entre o terreno de sua propriedade e o de seu confinante José, uma vez que esta foi apagada por causa de uma enchente, propôs ação de demarcação de terras, cujo procedimento é bifásico, com o objetivo de restaurar a linha original entre os imóveis. Caso o julgador entenda que assiste razão ao requerente, agirá corretamente se prolatar sentença de procedência, sujeita ao recurso de apelação. Após, com o trânsito em julgado, se inicia a segunda fase do procedimento, que 5.3. PROCEDIMENTO DA AÇÃO DE DIVISÃO A ação de divisão está prevista nos arts. 588 a 598 do CPC, havendo aplicação subsidiária dos arts. 575 a 587 do mesmo dispositivo normativo, conforme expressamente previsto no art. 598 do CPC. A legitimidade é do condômino, tanto no polo ativo quando no polo passivo. Assim como na ação de demarcação, a petição inicial deve seguir os parâmetros dos arts. 319 e 320 do CPC. Todavia, o art. 588, caput, do CPC prevê como documento indispensável à instrução da petição inicial os títulos de propriedade do autor, exigindo em seus incisos que a petição inicial contenha em sua causa de pedir: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 66 1) A indicação da origem da comunhão e a denominação, a situação, os limites e as características do imóvel cuja propriedade se pretende dividir; 2) O nome, o estado civil, a profissão e a residência de todos os condôminos, especificando-se os estabelecidos no imóvel com benfeitorias e culturas; Trata-se de repetição incompleta do art. 319, II, do CPC, que deve ser aplicado subsidiariamente, exigindo-se do autor a indicação do estado civil dos réus, porque, tratando-se de ação de direito real, o réu casado será demandado em litisconsórcio necessário com seu cônjuge. 3) As benfeitorias comuns. Em continuidade, de acordo com o art. 589 do CPC, a citação do réu deve seguir os parâmetros dispostos no art. 576 do CPC (preferencialmente pelos correios). Também há prazo comum de 15 dias para apresentação de defesa. A partir do referimento momento, o processo seguirá conforme o procedimento comum, nos termos do art. 578 do CPC. Sendo julgado procedente o processo, tem-se início à segunda fase do processo, que possui natureza executiva, consoante Daniel Assumpção – uma vez que ocorrem os atos de efetivação da decisão que determinou a divisão – estando o procedimento da segunda fase disposto nos arts. 590 a 597 do CPC. A doutrina majoritária, no entanto, defende que a segunda fase do processo de divisão segue o procedimento comum. Nesse sentido, a sentença de procedência, para essa parte da doutrina, tem natureza constitutiva. Nos termos do art. 590, caput, do CPC, o juiz nomeará um ou mais peritos para promover a medição do imóvel e as operações de divisão. O parágrafo único do dispositivo legal prevê que o perito deverá indicar as vias de comunicação existentes, as construções e as benfeitorias, com a indicação dos seus valores e dos respectivos proprietários e ocupantes, as águas principais que banham o imóvel e quaisquer outras informações que possam concorrer para facilitar a partilha. Obs.: o CPC de 1973 não trazia a previsão de perito, mas sim de arbitrador e agrimensor. Em seguida, os peritos proporão em laudo fundamentado a forma de divisão, atendendo às especificidades elencadas no art. 595 do CPC: Art. 595. Os peritos proporão, em laudo fundamentado, a forma da divisão, devendo consultar, quanto possível, a comodidade das partes, respeitar, para adjudicação a cada condômino, a preferência dos terrenos contíguos às suas residências e benfeitorias e evitar o retalhamento dos quinhões em glebas separadas. Após apresentação do laudo, haverá oitiva das partes no prazo de 15 dias sobre o cálculo e o plano de partilha, em conformidade com o art. 596, caput, do CPC. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 67 Obs.: no que se refere ao cálculo, este pode se fazer necessário em virtude de eventuais adequações a serem realizadas. Ex.: é possível que um condômino tenha que pagar a outro determinada quantia com o fim de fazer um balanceamento equalitário sobre a perspectiva econômica do bem dividido. Em sequência, o juiz deliberará sobre a partilha. Trata-se de uma decisão interlocutória de mérito (recorrível, portanto, por agravo de instrumento), conforme expresso no parágrafo único do art. 596 do CPC: Art. 596. Ouvidas as partes, no prazo comum de 15 (quinze) dias, sobre o cálculo e o plano da divisão, o juiz deliberará a partilha. Parágrafo único. Em cumprimento dessa decisão, o perito procederá à demarcação dos quinhões, observando, além do disposto nos arts. 584 e 585, as seguintes regras: Após a deliberação judicial, o perito procederá com a demarcação dos quinhões, observados os requisitos dos incisos do parágrafo único do art. 596 do CPC, quais sejam: 1) As benfeitorias comuns que não comportarem divisão cômoda serão adjudicadas a um dos condôminos mediante compensação; 2) Instituir-se-ão as servidões que forem indispensáveis em favor de uns quinhões sobre os outros, incluindo o respectivo valor no orçamento para que, não se tratando de servidões naturais, seja compensado o condômino aquinhoado com o prédio serviente; 3) As benfeitorias particulares dos condôminos que excederem à área a que têm direito serão adjudicadas ao quinhoeiro vizinho mediante reposição; 4) Se outra coisa não acordarem as partes, as compensações e as reposições serão feitas em dinheiro. Finalizada a demarcação, o perito organizará o memorial descritivo, nos termos do art. 597 do CPC: Art. 597. Terminados os trabalhos e desenhados na planta os quinhões e as servidões aparentes, o perito organizará o memorial descritivo. Por fim, com a assinatura do auto de divisão – que deve seguir os requisitos formais previstos no § 3° do art. 597 do CPC – pelo juiz e pelo perito, que será acompanhado de uma folha de pagamento para cada condômino, será proferida a sentença homologatória da divisão. 6. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE 6.1. CABIMENTO CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 68 De acordo com Daniel Assumpção, a dissolução parcial da sociedade é gerada por qualquer ocorrência que leve a uma extinção parcial do contrato de sociedade. Há, portanto, uma alteração da estrutura societária que decorre da “saída” de um sócio. Na dissolução parcial da sociedade haverá a ruptura de apenas uma parcela dos vínculos societários, de forma que resolvida a crise jurídica, a sociedade continua a existir. Diferentemente do que ocorre na dissolução total, na qual todos esses laços são rompidos e a sociedade é extinta. Nesse caso, o procedimento a ser observado será o comum. Frisa-se, a priori, que a extinção parcial do contrato de sociedade empresária pode ocorrer em razão das seguintes hipóteses: 1) Falecimento do sócio; 2) Exclusão do sócio; 3) Exercício do direito de retirada ou recesso do sócio. No que se refere à sociedade anônima de capital fechado, ressalta-se que quando demonstrado, por acionista ou acionistas que representem 5% ou mais do capital social, que a sociedade anônima não pode preencher o seu fim, é possível o ajuizamento de uma ação de dissolução parcial de sociedade, consoante o art. 206, II, b, da Lei das Sociedades Anônimas, bem como o art. 599, § 2º do CPC: Art. 599, § 2º A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter também por objeto a sociedade anônima de capital fechado quando demonstrado, por acionista ou acionistas que representem cinco por cento ou mais do capital social, que não pode preencher o seu fim. Ademais, o STJ já admitia a ação de dissolução parcial de sociedade nas sociedades anônimas familiares em que a pessoa do sócio é essencial, quando rompido o affectio societatis: [...]. III - É inquestionável que as sociedades anônimas são sociedades de capital(intuito pecuniae), próprio às grandes empresas, em que a pessoa dos sócios não têm papel preponderante. Contudo, a realidade da economia brasileira revela a existência, em sua grande maioria, de sociedades anônimas de médio e pequeno porte, em regra, de capital fechado, que concentram na pessoa de seus sócios um de seus elementos preponderantes, como sói acontecer com as sociedades ditas familiares, cujas ações circulam entre os seus membros, e que são, por isso, constituídas intuito personae. Nelas, o fator dominante em sua formação é a afinidade e identificação pessoal entre os acionistas, marcadas pela confiança mútua. Em tais circunstâncias, muitas vezes, o que se tem, na prática, é uma sociedade limitada travestida de sociedade anônima, sendo, por conseguinte, equivocado querer generalizar as sociedades anônimas em um único grupo, com características rígidas e bem definidas. Em casos que tais, porquanto reconhecida a existência da affectio societatis como fator preponderante na constituição da empresa, não pode tal circunstância ser desconsiderada por ocasião de sua dissolução. Do contrário, e de que é exemplo a hipótese em tela, a ruptura da affectio societatis representa verdadeiro impedimento a que a companhia continue a realizar o seu fim, com a obtenção de lucros e distribuição de dividendos, em consonância com o artigo 206, II, b, da Lei CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 69 nº 6.404/76, já que dificilmente pode prosperar uma sociedade em que a confiança, a harmonia, a fidelidade e o respeito mútuo entre os seus sócios tenham sido rompidos. A regra da dissolução total, nessas hipóteses, em nada aproveitaria aos valores sociais envolvidos, no que diz respeito à preservação de empregos, arrecadação de tributos e desenvolvimento econômico do país. À luz de tais razões, o rigorismo legislativo deve ceder lugar ao princípio da preservação da empresa, preocupação, inclusive, da nova Lei de Falências - Lei nº 11.101/05, que substituiu o Decreto-lei nº 7.661/45, então vigente, devendo-se permitir, pois, a dissolução parcial, com a retirada dos sócios dissidentes, após a apuração de seus haveres em função do valor real do ativo e passivo. A solução é a que melhor concilia o interesse individual dos acionistas retirantes com o princípio da preservação da sociedade e sua utilidade social, para evitar a descontinuidade da empresa, que poderá prosseguir com os sócios remanescentes. Embargos de divergência improvidos, após rejeitadas as preliminares. (STJ - EREsp: 111294 PR 2002/0100500-6, Relator: Ministro CASTRO FILHO, Data de Julgamento: 28/06/2006, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJ 10/09/2007 p. 183). EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE ANÔNIMA DE CARÁTER FAMILIAR E FECHADO. REQUISITO DA QUEBRA DA AFFECTIO SOCIETATIS AFIRMADO SUFICIENTE PELOS ACÓRDÃOS EXPOSTOS COMO PARADIGMAS. ACÓRDÃO EMBARGADO QUE JULGOU NO MESMO SENTIDO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 168/STJ. 1.- O Acórdão ora embargado, firmando, como único requisito à dissolução parcial da sociedade anônima familiar fechada a quebra da affectio societatis, julgou exatamente no mesmo sentido dos Acórdão invocados como paradigmas pretensamente divergentes, de modo que não cabem Embargos de Divergência, nos termos da Súmula 168/STJ. 2.- Subsistência da orientação constante do Acórdão embargado: "A 2ª Seção, quando do julgamento do EResp n. 111.294/PR (Rel. Min. Castro Filho, por maioria, DJU de 10.09.2007), adotou o entendimento de que é possível a dissolução de sociedade anônima familiar quando houver quebra da affectio societatis (EResp 419.174/SP, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO, DJ 04.08.2008)". 3.- Embargos de divergência não conhecidos. (STJ - EREsp: 1079763 SP 2009/0213367-7, Relator: Ministro SIDNEI BENETI, Data de Julgamento: 25/04/2012, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 06/09/2012). Não somente, o STJ também consolidou entendimento no sentido de que o simples rompimento da affectio societatis como causa de exclusão de sócio, por ser ato de extrema gravidade, exige não apenas sua alegação, mas a demonstração de uma justa causa, ou seja, de alguma violação grave dos deveres sociais imputável ao sócio que tenha acabado por gerar esse rompimento e, consequentemente, que justificasse a exclusão. Assim segue: CIVIL E COMERCIAL. RECURSO ESPECIAL. DISSOLUÇÃO PARCIAL DESOCIEDADE. EXCLUSÃO DE SÓCIO. QUEBRA DA AFFECTIO SOCIETATIS.INSUFICIÊNCIA. [...]. 5. Para exclusão judicial de sócio, não basta a alegação de quebrada affectio societatis, mas a demonstração de justa causa, ou seja, dos motivos que ocasionaram essa quebra. 6. Recurso especial a que se nega provimento. (STJ - REsp: 1129222 PR CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 70 2009/0051257-8, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 28/06/2011, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/08/2011). Salienta-se, por fim, que a ação de dissolução parcial de sociedade não é ação necessária, porque é possível que haja ruptura parcial dos vínculos societários sem que seja proposta a ação ora analisada. No caso de morte do sócio, há 3 situações previstas nos incisos do art. 1028 do Código Civil que dispensam a ação judicial: 1) Se o contrato dispor pela não liquidação da quota do sócio falecido; 2) Se os sócios remanescentes optarem pela dissolução total; 3) Se os sócios remanescentes celebrarem acordo com os herdeiros para a substituição do sócio falecido. Outrossim, tratando-se de direito patrimonial disponível, as partes podem celebrar convenção de arbitragem para que a lide na qual estão ou estarão envolvidas seja resolvida sem a intervenção jurisdicional. 6.2. PRETENSÕES VEICULÁVEIS De acordo com o art. 599, incisos I a III do CPC, há 2 pedidos formulados isoladamente ou em cumulação na ação de dissolução parcial de sociedade. São eles: 1) A resolução da sociedade empresária contratual ou simples em relação ao sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; 2) A apuração dos haveres do sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; 3) Somente a resolução ou a apuração de haveres. 6.3. LEGITIMIDADE A legitimidade ativa está prevista no art. 600 do CPC, que estabelece que a ação de dissolução parcial de sociedade pode ser proposta: 1) Em caso de falecimento do sócio: a) Pelo espólio do sócio falecido, quando a totalidade dos sucessores não ingressar na sociedade; b) Pelos sucessores, após concluída a partilha do sócio falecido; c) Pela sociedade, se os sócios sobreviventes não admitirem o ingresso do espólio ou dos sucessores do falecido na sociedade, quando esse direito decorrer do contrato social. Obs.: o cônjuge ou companheiro do sócio cujo casamento, união estável ou convivência terminou, poderá requerer a apuração de seus CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 71 haveres na sociedade, que serão pagos à conta da quota social titulada por este sócio. 2) Pelo sócio que exerceu o direito de retirada ou recesso, se não tiver sido providenciada, pelos demais sócios, a alteração contratual consensual formalizando o desligamento, depois de transcorridos 10 dias do exercício do direito; 3) Pela sociedade, nos casos em que a lei não autoriza a exclusão extrajudicial (arts. 1030, 1004 e 1085, todos do Código Civil); 4) Pelo sócio excluído, em ação voltada a apuração de haveres, até porque se o sócio excluído quiser discutir a legalidade de sua exclusão deverá fazê-lo por processo que seguirá o rito comum. No que se refere à legitimidade passiva, tem-se que os sócios e a sociedade serão citados para, no prazo de 15 dias, concordarem com o pedido ou apresentarem contestação, nos termos do art. 601, caput, do CPC. Ressalta-se que a sociedade não será citada se todos os seus sócios o forem, mas ficará sujeita aos efeitos da decisãoe à coisa julgada, consoante previsto no parágrafo único do art. 601 do CPC e com base no entendimento adotado pelo STJ: Art. 601. Os sócios e a sociedade serão citados para, no prazo de 15 (quinze) dias, concordar com o pedido ou apresentar contestação. Parágrafo único. A sociedade não será citada se todos os seus sócios o forem, mas ficará sujeita aos efeitos da decisão e à coisa julgada. PROCESSUAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. SÓCIO. SOCIEDADE - AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL. CITAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA. Acórdão que afirma serem inconfundíveis a pessoa do sócio e sociedade por ele integrada. Tal aresto não diverge de outro que, em ação de dissolução parcial de sociedade, dispensa a citação da pessoa jurídica, sob o fundamento de que todos seus sócios cotistas integraram o processo alcançou, na hipótese, o escopo visado pela citação da pessoa jurídica. (STJ - EREsp: 332650 RJ 2002/0119592-0, Relator: Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, Data de Julgamento: 07/05/2003, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: --> DJ 09/06/2003 p. 165). Como o tema foi cobrado em concurso? (TJ-SP - Juiz - VUNESP - 2021): Caio, Abel e Adão são os únicos sócios de uma sociedade anônima de capital fechado, detendo, respectivamente, 40%, 30% e 30% das ações. Por entender que a sociedade não pode mais preencher o seu fim, Caio propõe ação de dissolução parcial de sociedade cumulada com apuração de haveres em face de Abel e Adão, não incluindo a sociedade. A demanda é julgada procedente e apurados os haveres em R$ 1.000.000,00. Considerando essa situação, é correto afirmar que apesar de não incluída no polo passivo a sociedade sofre os efeitos da decisão e da autoridade da coisa julgada. Correto. 6.4. PROCEDIMENTO CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 72 Reitera-se que o pedido de dissolução parcial de sociedade vem geralmente cumulado com pedido de apuração de haveres, de forma que o referido procedimento especial terá 2 fases procedimentais consecutivas: dissolução e apuração de haveres. As especialidades procedimentais, no entanto, estão reservadas à segunda fase procedimental. Nos termos do art. 599, § 1°, do CPC, a petição inicial será necessariamente instruída com o contrato social consolidado. Por analogia, no caso de sociedade de capital aberto, deve ser instruída a petição inicial com cópia do estatuto social. Realizadas as citações nos termos do art. 601 do CPC, é possível que exista manifestação expressa e unânime pela concordância da dissolução, hipótese descrita pelo art. 603, caput, do CPC. Nesse caso, o juiz decretará a dissolução, passando-se imediatamente à fase de liquidação. É possível, ainda, que a ação de dissolução parcial de sociedade não tenha pedido de apuração de haveres, hipótese em que a decisão do juiz decretando a dissolução terá natureza de sentença de mérito. Isto posto, verifica-se que a primeira fase da ação de dissolução parcial de sociedade será resolvida por uma sentença, recorrível através do recurso de apelação, conforme posicionamento do STJ: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE. EXCLUSÃO DE SÓCIO. DECISÃO QUE HOMOLOGA TRANSAÇÃO. NATUREZA JURÍDICA DE SENTENÇA. RECURSO CABÍVEL. APELAÇÃO. ERRO GROSSEIRO. NÃO AUTORIZADA A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. 1. Ação ajuizada em 22/2/2012. Recurso especial interposto em 30/6/2020. Autos conclusos ao gabinete da Relatora em 28/7/2021. 2. O propósito recursal consiste em definir o recurso cabível contra decisão que, em ação de exclusão de sócio, homologa transação quanto à saída da sociedade e fixa critérios para apuração dos haveres. 3. Estando cumulados pedidos de dissolução parcial de sociedade e de apuração de haveres, a ação engloba duas fases distintas: na primeira, é apreciado se é o caso ou não de se decretar a dissolução; na segunda, são apurados os valores devidos ao sócio retirante ou excluído, de acordo com o procedimento de liquidação específica previsto nos artigos 604 a 609 do CPC/15. 4. A decisão que decreta a resolução do vínculo societário em relação a um sócio, como na espécie, encerrando a primeira fase da ação de dissolução parcial, possui natureza de sentença. Doutrina. 5. Hipótese concreta em que o juízo de origem julgou extinto o processo com resolução de mérito em virtude de as partes terem acordado acerca da retirada da recorrente da sociedade e da recíproca prestação de contas. 6. O pronunciamento judicial que homologa transação (art. 487, III, b do CPC/15), pondo fim à fase cognitiva do processo com resolução de mérito, possui natureza jurídica de sentença, conforme disposto expressamente no art. 203, § 1º, da lei adjetiva, desafiando, portanto, recurso de apelação. 7. A interposição de agravo de instrumento contra sentença que homologa transação e extingue o processo com julgamento de mérito consiste em erro grosseiro, não admitindo a aplicação do princípio da fungibilidade. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. (STJ - REsp: 1954643 SC 2021/0140048-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 15/02/2022, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/02/2022). CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 73 De acordo com o posicionamento do Tribunal Superior, não se aplica o princípio da fungibilidade recursal, eis que a interposição de agravo de instrumento ao invés do recurso de apelação configura erro grosseiro. Salienta-se, ademais, que há uma especialidade diferenciada prevista no § 1º do art. 603 do CPC, pois independentemente da espécie de decisão que dissolve a sociedade diante da expressa anuência dos réus, não haverá condenação em honorários advocatícios de nenhuma das partes e as custas serão rateadas segundo a participação das partes no capital social. Já na segunda fase do procedimento especial, na apuração de haveres, caberá ao juiz fixar a data da resolução da sociedade, que será determinada com base no art. 605 do CPC: 1) No caso de falecimento do sócio, a do óbito; 2) Na retirada imotivada, o 60º dia seguinte ao do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio retirante; 3) No recesso, o dia do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio dissidente; 4) Na retirada por justa causa de sociedade por prazo determinado e na exclusão judicial de sócio, a do trânsito em julgado da decisão que dissolver a sociedade; 5) Na exclusão extrajudicial, a data da assembleia ou da reunião de sócios que a tiver deliberado. Após a determinação da data da resolução, caberá ao juiz definir o critério de apuração dos haveres à vista do disposto no contrato social. Em caso de omissão do contrato social, ou se houver anulação do critério anteriormente estabelecido, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma, de acordo com o art. 606 do CPC. Para a apuração de haveres, o art. 604, III, do CPC prevê que cabe ao juiz a indicação de um perito que, segundo o parágrafo único do art. 606, será preferencialmente um especialista em avaliação de sociedades. Por fim, com fulcro no art. 604, § 1°, do CPC, o juiz determinará à sociedade ou aos sócios que nela permanecerem que depositem em juízo a parte incontroversa dos haveres devidos. Tal depósito poderá ser, desde logo, levantado pelo ex-sócio, pelo espólio ou pelos seus sucessores (§ 2°). E no caso de o contrato social estabelecer o pagamento dos haveres, será observado o que nele se dispôs no depósito judicial da parte incontroversa (§ 3°). 7. AÇÃO DE INVENTÁRIO E PARTILHA 7.1. INTRODUÇÃO CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 74 Segundo previsão do art. 1784 do Código Civil, com a morte da pessoa natural, seus bens transmitem-seaos sucessores legítimos e testamentários, por meio do fenômeno jurídico conhecido por “saisine”, que configura, em síntese, a transmissão dos bens com a morte da pessoa natural. Constituindo-se o patrimônio do de cujus uma universalidade jurídica de bens, será necessária a definição do que exatamente o compõe, além da individualização do que cabe a cada um dos sucessores na hipótese de existir mais de um sujeito nessa condição. Desse modo, pode-se traçar a seguinte classificação: 1) Inventário: busca-se identificar o patrimônio, com a indicação dos bens (móveis e imóveis), créditos, débitos e quaisquer outros direitos de natureza patrimonial que compõem o acervo hereditário. 2) Partilha: divide-se o acervo entre os sucessores, com o estabelecimento e a consequente adjudicação do quinhão hereditário a cada um deles. Com a Lei 11.441/2007, passou-se a prever a possibilidade de realização de inventário e partilha extrajudicialmente, realizado em cartório. Os requisitos do inventário e partilha extrajudicial estão previstos no art. 610 do CPC. São eles: 1) Todos os sucessores devem ser capazes; 2) Existência de acordo com a divisão dos bens; 3) Não existir testamento. Ressalta-se que a existência de um testamento não é fator impeditivo para o inventário e a partilha extrajudicial, desde que seja realizado o registro judicial do testamento ou se obtenha autorização do juízo competente, conforme posicionamento do STJ: RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSO CIVIL. SUCESSÕES. EXISTÊNCIA DE TESTAMENTO. INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL. POSSIBILIDADE, DESDE QUE OS INTERESSADOS SEJAM MAIORES, CAPAZES E CONCORDES, DEVIDAMENTE ACOMPANHADOS DE SEUS ADVOGADOS. ENTENDIMENTO DOS ENUNCIADOS 600 DA VII JORNADA DE DIREITO CIVIL DO CJF; 77 DA I JORNADA SOBRE PREVENÇÃO E SOLUÇÃO EXTRAJUDICIAL DE LITÍGIOS; 51 DA I JORNADA DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL DO CJF; E 16 DO IBDFAM. 1. Segundo o art. 610 do CPC/2015 (art. 982 do CPC/73), em havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial. Em exceção ao caput, o § 1º estabelece, sem restrição, que, se todos os interessados forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras. 2. O Código Civil, por sua vez, autoriza expressamente, independentemente da existência de testamento, que, "se os herdeiros forem capazes, poderão fazer partilha amigável, por escritura pública, termo nos autos do inventário, ou escrito particular, homologado pelo juiz" (art. 2.015). Por outro lado, determina que "será sempre judicial a partilha, se os herdeiros divergirem, assim como se algum deles for incapaz" (art. 2.016) - bastará, nesses casos, a homologação judicial posterior do acordado, nos termos do art. 659 do CPC. 3. Assim, de uma leitura sistemática do caput e do § 1º do art. 610 do CPC/2015, c/c os CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 75 arts. 2.015 e 2.016 do CC/2002, mostra-se possível o inventário extrajudicial, ainda que exista testamento, se os interessados forem capazes e concordes e estiverem assistidos por advogado, desde que o testamento tenha sido previamente registrado judicialmente ou haja a expressa autorização do juízo competente. 4. A mens legis que autorizou o inventário extrajudicial foi justamente a de desafogar o Judiciário, afastando a via judicial de processos nos quais não se necessita da chancela judicial, assegurando solução mais célere e efetiva em relação ao interesse das partes. Deveras, o processo deve ser um meio, e não um entrave, para a realização do direito. Se a via judicial é prescindível, não há razoabilidade em proibir, na ausência de conflito de interesses, que herdeiros, maiores e capazes, socorram-se da via administrativa para dar efetividade a um testamento já tido como válido pela Justiça. 5. Na hipótese, quanto à parte disponível da herança, verifica-se que todos os herdeiros são maiores, com interesses harmoniosos e concordes, devidamente representados por advogado. Ademais, não há maiores complexidades decorrentes do testamento. Tanto a Fazenda estadual como o Ministério Público atuante junto ao Tribunal local concordaram com a medida. Somado a isso, o testamento público, outorgado em 2/3/2010 e lavrado no 18º Ofício de Notas da Comarca da Capital, foi devidamente aberto, processado e concluído perante a 2ª Vara de Órfãos e Sucessões. 6. Recurso especial provido. (STJ - REsp: 1808767 RJ 2019/0114609-4, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 15/10/2019, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/12/2019). Frisa-se, por fim, que o procedimento extrajudicial cartorário de inventário e partilha deve seguir os arts. 11 a 32 da Resolução 35/07 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ainda que os requisitos previstos no art. 610 do CPC estejam presentes, Humberto Theodoro Junior, Marinoni e Tartuce defendem a facultatividade do procedimento de inventário e partilha extrajudicial. Nesse liame, não se trata de procedimento de observância obrigatória, de maneira que será cabível a ação judicial se essa for a vontade dos sucessores. Obs.: o juiz não pode extinguir a ação de inventário e partilha que preenche os requisitos para ser extrajudicial por falta de interesse de agir das partes, uma vez que o procedimento extrajudicial, conforme apontado, não é obrigatório. No âmbito do inventário extrajudicial, o formal de partilha será realizado por meio de escritura pública, que servirá como documento hábil para qualquer ato de registro (não somente para o registro imobiliário) e para levantamento de importância depositada em instituições financeiras, conforme preconizado pelo § 1º do art. 610 do CPC: Art. 610, § 1º Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 76 Na hipótese de não cabimento ou pela opção de seguir o processo judicial, tem-se o inventário judicial, que seguirá a forma ordinária ou será realizado por arrolamento, que poderá ser sumário (art. 659 do CPC) ou comum (art. 664 do CPC). Ressalta-se, por fim, que há 2 hipóteses de dispensa de inventário, bastando apenas o pedido de expedição de alvará judicial: 1) Percepção das vantagens econômicas deixadas pelo de cujus no FGTS e PIS-Pasep; 2) Levantamento pelos dependentes de restituição de imposto de renda, tributos, saldos bancários, cadernetas de poupança e fundos de investimento de valor não superior a 500 ORTN (Obrigação Reajustável do Tesouro Nacional). 7.2. CUMULAÇÃO DE INVENTÁRIOS De acordo com o art. 672 do CPC, é lícita a cumulação de inventários para a partilha de heranças de pessoas diversas quando houver: 1) Identidade de pessoas entre as quais devam ser repartidos os bens; 2) Heranças deixadas pelos 2 cônjuges ou companheiros; 3) Dependência de uma das partilhas em relação à outra. Ocorre, por exemplo, no caso em que o pai de 3 filhos morre e, logo em seguida, a mãe também falece. Trata-se de hipótese de cumulação de inventários. Obs.: com relação ao terceiro requisito, se a dependência for parcial, por haver outros bens, o juiz pode ordenar a tramitação separada, se melhor convier ao interesse das partes ou à celeridade processual. Desse modo, o juiz pode desconstituir a cumulação dos inventários. Como o tema foi cobrado em concurso? (TJ-PR - Juiz - FGV - 2021): Acerca do procedimento de inventário, é correto afirmar que é lícita a cumulação de inventários para a partilha de heranças de pessoas diversas, quando houver identidade de pessoas entre as quais devam ser repartidosos bens. Correto. 7.3. INVENTÁRIO NEGATIVO Há presunção de que quando o de cujus não deixa patrimônio, naturalmente nada haveria a inventariar e muito menos a partilhar. Seria possível supor que, diante dessa situação patrimonial do de cujus, o inventário e partilha se tornariam desnecessários. Ocorre, entretanto, que a ausência de inventário e partilha, mesmo nessas situações, gera algumas consequências jurídicas que podem ser evitadas com a realização do chamado “inventário negativo”, que é necessário mesmo diante da ausência de patrimônio nas seguintes hipóteses: 1) Art. 1523, I, do Código Civil: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 77 Art. 1.523. Não devem casar: I - o viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros. Isto posto, não pode casar o viúvo ou viúva que tiver filho do cônjuge falecido enquanto não fizer o inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros, mesmo diante da inexistência de patrimônio. Todavia, mesmo havendo casamento, o art. 1641, I, do Código Civil prevê que: Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento: I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento. Assim, se o inventário não for aberto e o ex-cônjuge se casar novamente, o casamento ocorrerá pelo regime obrigatório de separação de bens. Obs.: o inventário negativo também interessa aos herdeiros sempre que o de cujus não deixar bens, mas deixar dívidas, visto que os herdeiros só responderão por tais dívidas nos limites da herança. Quando se faz um inventário negativo, a decisão que o encerra configura uma decisão declaratória de ausência do patrimônio, cuja declaração tem eficácia inter partes. Nesse liame, quando um indivíduo morre, os seus herdeiros passam a ser os legitimados passivos para o cumprimento das obrigações do de cujus. No entanto, apenas o acervo hereditário deste que responde pelas suas dívidas, em razão do benefício do inventário, conforme prelecionam Câmara e Marcato. Em continuidade, evidencia-se que o inventário negativo pode ser feito extrajudicialmente (desde que preenchidos os requisitos do art. 610 do CPC) ou de maneira judicial. No âmbito do inventário judicial, o requerente que assume a condição de inventariante (dispensado o compromisso) pleiteia junto ao juízo competente para a ação de inventário e a partilha a tomada por termo de suas declarações, provando o óbito. Em seguida, procede-se com a intimação do Ministério Público e da Fazenda Pública. Havendo divergência, o juiz a resolverá; não havendo, o juiz extinguirá o processo com a declaração, por sentença, da inexistência de bens a partilhar. Salienta-se que há divergência doutrinária a respeito da natureza jurídica do processo de inventário negativo. Para Câmara, possui natureza contenciosa (havendo eventual conflito entre os herdeiros), ao passo que para Daniel Assumpção e Humberto Theodoro Junior, é de natureza voluntária. 7.4. COMPETÊNCIA E UNIVERSALIDADE DO FORO SUCESSÓRIO A Justiça brasileira é a única competente para julgar as ações de inventário e partilha de bens situados em território nacional, de acordo com o art. 23, inciso II, do CPC: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 78 Art. 23. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra: II - em matéria de sucessão hereditária, proceder à confirmação de testamento particular e ao inventário e à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional. Trata-se, portanto, de uma competência internacional exclusiva, pois somente pode ser decidida pela jurisdição nacional. Há, ainda, o foro especial previsto no art. 48 do CPC: Art. 48. O foro de domicílio do autor da herança, no Brasil, é o competente para o inventário, a partilha, a arrecadação, o cumprimento de disposições de última vontade, a impugnação ou anulação de partilha extrajudicial e para todas as ações em que o espólio for réu, ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro. Por fim, na hipótese de o de cujus não ter domicílio certo, a competência será do foro: 1) Da situação dos bens imóveis; 2) Havendo mais de um foro com bem imóvel, a competência será concorrente; 3) Não havendo bens imóveis, a situação de qualquer dos bens do espólio. 7.5. QUETÕES DE “ALTA INDAGAÇÃO” Havia o entendimento de que questões de “alta indagação” não poderiam ser apreciadas em sede de inventário e partilha, devendo ser resolvidas em ação própria, tais como: 1) Definição do acervo hereditário; 2) Identificação dos herdeiros do de cujus; 3) Divisão do acervo entre os herdeiros. Nesse sentido, editou-se o art. 612 do CPC, estabelecendo que questões de fato que dependem de prova não documental exigem um novo processo, não cabendo, portanto, ao juízo do inventário e partilha a decisão sobre questões fundadas em provas não documentais, in verbis: Art. 612. O juiz decidirá todas as questões de direito desde que os fatos relevantes estejam provados por documento, só remetendo para as vias ordinárias as questões que dependerem de outras provas. Ressalta-se, todavia, que a complexidade da questão jurídica é irrelevante, não sendo considerada para a configuração desse tipo de questão, devendo o juiz enfrentá-la e decidi-la por mais complexa que seja, de acordo com posicionamento do STJ: REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7. JUÍZO DO INVENTÁRIO. COMPETÊNCIA. - A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial. - Pretensão de herdeiros que dispensa alta indagação e novas provas deve ser deduzida perante o juízo do inventário. - Questões de CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 79 direito - mesmo complexas - resolvem-se no processo de inventário. O mesmo ocorre com as questões de fato documentadas nos autos. (STJ - AgRg no Ag: 855543 RS 2007/0001445-0, Relator: Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, Data de Julgamento: 21/06/2007, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 01.08.2007 p. 470). A complexidade, portanto, diz respeito à necessidade de produção de prova não documental num processo autônomo para a sua solução, como ocorre na alegação de vício em testamento, que só poderá ser reconhecido em processo constitutivo negativo que invalide o testamento ou em dissolução parcial de sociedade com apuração de haveres do de cujus. Infere-se, por fim, que a doutrina (Marinoni e Humberto Theodoro Junior) é pacífica no entendimento de que o pronunciamento judicial pelo qual o juiz do inventário se nega a decidir a questão, remetendo as partes às vias ordinárias, é uma decisão interlocutória, recorrível por agravo de instrumento. 7.6. ADMINISTRADOR PROVISÓRIO Sempre existirá certo período de tempo entre o falecimento, que representa a abertura da sucessão, e a prestação de compromisso do inventariante, sendo certo que durante esse lapso temporal a herança, que é transmitida imediatamente aos herdeiros com o falecimento, deverá ser administrada por alguém. Segundo o art. 613 do CPC, surge nessa situação a figura do “administrador provisório”, responsável pela administração da herança até que o espólio passe a ser representado pelo inventariante: Art. 613. Até que o inventariante preste o compromisso, continuará o espólio na posse do administrador provisório. Nesse liame, pode-se inferir que administrador provisório é o sujeito que já se encontra na administração dos bens por ocasião da abertura da sucessão, de forma que a sua designação independe de decisão judicial. Trata-se de uma condição factual, e não jurídica. O administrador provisório possui os seguintes encargos: 1) Administrar a herança; 2) Representar o espólio ativa e passivamente, dentro e fora do juízo; 3) Levar ao acervo os frutos........................................................................................................................ 122 13.2. HOMOLOGAÇÃO EXTRAJUDICIAL ................................................................................ 123 13.3. AUTOTUTELA ................................................................................................................... 123 13.4. PROCEDIMENTO ............................................................................................................. 123 14. REGULAÇÃO DE AVARIA GROSSA .................................................................................. 125 14.1. CABIMENTO ..................................................................................................................... 125 14.2. PROCEDIMENTO ............................................................................................................. 125 14.2.1. Declaração de abertura de avaria grossa ................................................................. 125 14.2.2. Oferecimento de garantias ........................................................................................ 126 14.2.3. Impugnação à declaração de abertura de avaria grossa .......................................... 126 14.2.4. Levantamento de valores para o pagamento das despesas da alienação .............. 126 14.2.5. Apresentação de documentos ................................................................................... 126 CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 4 14.2.6. Apresentação do regulamento de avaria grossa ...................................................... 126 14.2.7. Impugnação ............................................................................................................... 127 14.2.8. Sentença homologatória ............................................................................................ 127 15. AÇÃO DE RESTAURAÇÃO DE AUTOS ............................................................................. 127 15.1. CABIMENTO ..................................................................................................................... 127 15.2. LEGITIMIDADE ................................................................................................................. 128 15.3. COMPETÊNCIA ................................................................................................................ 129 15.4. PROCEDIMENTO ............................................................................................................. 129 TEORIA GERAL DA EXECUÇÃO ................................................................................................... 132 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS ................................................................................................... 132 2. FORMAS DE APRESENTAÇÃO DA TUTELA EXECUTIVA .................................................. 132 2.1. FASE PROCEDIMENTAL EXECUTIVA ........................................................................... 132 2.2. PROCESSO AUTÔNOMO DE EXECUÇÃO .................................................................... 133 3. FORMAS EXECUTIVAS .......................................................................................................... 134 3.1. EXECUÇÃO POR SUB-ROGAÇÃO (DIRETA) ................................................................ 134 3.2. EXECUÇÃO POR PRESSÃO PSICOLOGIA OU POR COERÇÃO (INDIRETA) ........... 134 3.2.1. Prisão civil .................................................................................................................. 135 3.2.2. Astreintes ................................................................................................................... 136 4. ESPÉCIES DE OBRIGAÇÃO EXEQUENDA ........................................................................... 140 4.1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS............................................................................................ 140 4.2. EXECUÇÃO DE PAGAR QUANTIA CERTA .................................................................... 140 4.3. EXECUÇÃO DE ENTREGAR COISA .............................................................................. 142 4.4. EXECUÇÃO DE FAZER/NÃO FAZER ............................................................................. 142 5. PRINCÍPIOS EXECUTIVOS .................................................................................................... 143 5.1. NULLA EXECUTIO SINE TITULO .................................................................................... 143 5.2. NULLA TITULUS SINE LEGES ........................................................................................ 143 5.3. PATRIMONIALIDADE ....................................................................................................... 143 5.3.1. Salário ........................................................................................................................ 145 5.3.2. Bem de família ........................................................................................................... 146 5.4. DESFECHO ÚNICO .......................................................................................................... 146 5.5. DISPONIBILIDADE DA EXECUÇÃO................................................................................ 147 5.6. MENOR ONEROSIDADE ................................................................................................. 148 5.7. LEALDADE E BOA-FÉ PROCESSUAL ............................................................................ 148 6. PARTES NO PROCESSO DE EXECUÇÃO ............................................................................ 149 6.1. ATIVA ................................................................................................................................ 149 6.2. PASSIVA ........................................................................................................................... 150 6.3. LITISCONSÓRCIO E CUMULAÇÃO DE DEMANDAS .................................................... 151 6.4. INTERVENÇÃO DE TERCEIROS .................................................................................... 151 7. COMPETÊNCIA NA EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL .......................................... 152 7.1. EXECUÇÃO CIVIL ............................................................................................................ 152 7.2. EXECUÇÃO FISCAL......................................................................................................... 153 7.3. CONEXÃO ......................................................................................................................... 153 8. REQUISITOS PARA REALIZAÇÃO DA EXECUÇÃO ............................................................. 154 8.1. INADIMPLEMENTO .......................................................................................................... 154 8.2. TÍTULO EXECUTIVO ........................................................................................................ 154 9. CARACTERES DO TÍTULO EXECUTIVO .............................................................................. 155 9.1. CERTEZA .......................................................................................................................... 155 9.2. LIQUIDEZ .......................................................................................................................... 156 CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 5 9.3. EXIGIBILIDADE................................................................................................................. 156 EXECUÇÃO TÍTULO EXTRAJUDICIAL ......................................................................................... 158 1. CONSIDERAÇÕES GERAIS ................................................................................................... 158 1.1. CRITÉRIO PARA ELEIÇÃO..............................................................................................que recebeu durante o período de administração; 4) Responder pelo dano que, por culpa ou dolo, der causa aos herdeiros; 5) Prestar contas de sua administração, que pode ser feita no próprio processo de inventário e partilha. Por outro lado, possui também direitos, como o de reembolso de todas as despesas necessárias e úteis à boa manutenção do acervo hereditário. Na hipótese de herança jacente, não existirá a figura do administrador provisório, aplicando- se o art. 739 do CPC, que prevê a indicação de um curador que terá o encargo de guardar, CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 80 conservar e administrar a herança até a sua entrega aos sucessores legalmente habilitados ou até a declaração de vacância da herança: Art. 739. A herança jacente ficará sob a guarda, a conservação e a administração de um curador até a respectiva entrega ao sucessor legalmente habilitado ou até a declaração de vacância. 7.7. INVENTARIANTE Trata-se de um auxiliar especial do juízo tem a principal função de administrar o acervo e representar o espólio. O inventariante exerce no processo um múnus público, de modo que se faz necessária a formalidade de prestação de compromisso, nos termos do art. 617, parágrafo único do CPC: Art. 617, Parágrafo único. O inventariante, intimado da nomeação, prestará, dentro de 5 (cinco) dias, o compromisso de bem e fielmente desempenhar a função. Em continuidade, destaca-se que há 2 espécies de inventariança: a legítima (regra) e a dativa. A inventariança legítima é aquela exercida pelo sujeito que tem alguma relação com o de cujus ou com o acervo hereditário. Nesse sentido, há diversos legitimados ativos, que devem seguir a ordem de preferência estabelecida no art. 617 do CPC: Art. 617. O juiz nomeará inventariante na seguinte ordem: I - o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que estivesse convivendo com o outro ao tempo da morte deste; II - o herdeiro que se achar na posse e na administração do espólio, se não houver cônjuge ou companheiro sobrevivente ou se estes não puderem ser nomeados; III - qualquer herdeiro, quando nenhum deles estiver na posse e na administração do espólio; IV - o herdeiro menor, por seu representante legal; V - o testamenteiro, se lhe tiver sido confiada a administração do espólio ou se toda a herança estiver distribuída em legados; VI - o cessionário do herdeiro ou do legatário; VII - o inventariante judicial, se houver; VIII - pessoa estranha idônea, quando não houver inventariante judicial. Como o tema foi cobrado em concurso? (MPE-SC - Promotor - CESPE - 2021): Herdeiro menor de idade pode ser nomeado inventariante, uma vez que é possível o suprimento da incapacidade. Correto. A inversão da ordem de preferência é medida excepcional, admitida somente em casos específicos, quando o juiz tiver fundadas razões para tanto, de acordo com posicionamento do STJ: Direito processual civil. Sucessões. Recurso especial. Nomeação de inventariante. Regra do art. 990 do CPC. Caráter não absoluto. Convicção do CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 81 Juízo formada a partir dos elementos fáticos do processo. Vedado o reexame na via especial. - A ordem de nomeação de inventariante, prevista no art. 990 do CPC, não apresenta caráter absoluto, podendo ser alterada em situação de fato excepcional, quando tiver o Juiz fundadas razões para tanto, forte na existência de patente litigiosidade entre as partes. Evita- se, dessa forma, tumultos processuais desnecessários. - Se o Tribunal de origem atesta a ocorrência de situação de fato excepcional consubstanciada na existência de animosidade entre as partes, admite-se o temperamento da ordem legal de nomeação de inventariança, conforme firme convicção do Juiz que repousa na ponderada análise dos elementos fáticos do processo. - Esquadrinhar o convencimento motivado do Juízo calcado em circunstâncias fáticas constantes dos autos é procedimento vedado na via especial. Recurso especial não conhecido. (STJ - REsp: 1055633 SP 2008/0099095-1, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 21/10/2008, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: 20090616 --> DJe 16/06/2009). Já a inventariança dativa é aquela em que ocorre a indicação de qualquer sujeito capaz e idôneo que seja estranho ao acervo hereditário. A inventariança dativa pode acontecer em 3 hipóteses: 1) Diante da inexistência dos legitimados previstos no art. 617 do CPC; 2) Quando um sujeito anterior do art. 617 do CPC for removido da inventariança (causas previstas no art. 622 do CPC); 3) Quando um sujeito do art. 617 do CPC não puder, por justa causa, assumir o encargo. Frisa-se que a diferença prática entre uma inventariança legítima e uma inventariança dativa é que com o inventariante dativo, os sucessores deverão ser intimados no processo no qual o espólio seja parte, com fulcro no art. 75, § 1º do CPC, in verbis: Art. 75, § 1º Quando o inventariante for dativo, os sucessores do falecido serão intimados no processo no qual o espólio seja parte. Nesse caso, os sucessores ingressam no processo como assistentes litisconsorciais do espólio. Os encargos do inventariante estão dispostos no rol exemplificativo do art. 618 do CPC. São eles: 1) Representar o espólio ativa e passivamente, em juízo ou fora dele, observando-se, quanto ao dativo, o disposto no art. 75, § 1º; 2) Administrar o espólio, velando-lhe os bens com a mesma diligência que teria se seus fossem; 3) Prestar as primeiras e as últimas declarações pessoalmente ou por procurador com poderes especiais; 4) Exibir em cartório, a qualquer tempo, para exame das partes, os documentos relativos ao espólio; 5) Juntar aos autos certidão do testamento, se houver; 6) Trazer à colação os bens recebidos pelo herdeiro ausente, renunciante ou excluído; CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 82 7) Prestar contas de sua gestão ao deixar o cargo ou sempre que o juiz lhe determinar; 8) Requerer a declaração de insolvência. Como o tema foi cobrado em concurso? (MPE-PR - Promotor - MPE-PR - 2021): Cabe ao inventariante administrar o espólio, velando-lhe os bens com a mesma diligência que teria se seus fossem. Correto. Ainda sobre os encargos do inventariante, é mister visualizar julgado do STJ no sentido de que na vigência do CPC/2015, remanesce o interesse de agir do inventariante na ação de prestação de contas, mantido o caráter dúplice da demanda: O inventariante não pode encerrar seu mister sem que antes apresente as contas de sua gestão. Essa prestação de contas é, portanto, uma atribuição imposta pela lei ao inventariante, razão pela qual possui interesse de agir para ajuizar a presente ação autônoma de prestação de contas. Vale ressaltar, inclusive, que esse interesse de agir é presumido. STJ. 4ª Turma. REsp 1707014/MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 02/03/2021 (Info 687). No que se refere às limitações do inventariante, pode-se destacar: 1) Atos de disposição de direito exigem manifestação de todos os herdeiros; 2) O inventariante depende do consentimento dos herdeiros para alienar bens, pagar dívidas e fazer as despesas necessárias com a conservação e o melhoramento dos bens do espólio. Obs.: salienta-se que o juiz pode autorizar a prática dos atos, se a resistência por parte dos herdeiros for injustificável. Outrossim, as causas de remoção do inventariante estão dispostas no art. 622 do CPC: Art. 622. O inventariante será removido de ofício ou a requerimento: I - se não prestar, no prazo legal, as primeiras ou as últimas declarações; II - se não der ao inventário andamento regular, se suscitar dúvidas infundadas ou se praticar atos meramente protelatórios; III - se, por culpa sua, bens do espólio se deteriorarem, forem dilapidados ou sofrerem dano; IV - se não defender o espólio nas ações em que for citado, se deixar de cobrardívidas ativas ou se não promover as medidas necessárias para evitar o perecimento de direitos; V - se não prestar contas ou se as que prestar não forem julgadas boas; VI - se sonegar, ocultar ou desviar bens do espólio. Obs.: trata-se de um rol meramente exemplificativo, uma vez que qualquer conduta desleal, ímproba ou viciada de qualquer forma pode ser causa de remoção do inventariante, de acordo com o entendimento do STJ: CIVIL E PROCESSUAL. INVENTARIANÇA. REMOÇÃO. NOMEAÇÃO DE INVENTARIANTE DATIVO. BELIGERÂNCIA ENTRE AS PARTES. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 83 POSSIBILIDADE DE INVIABILIZAÇÃO DO PROCESSO. SÚMULA N. 7-STJ. CONTROVÉRSIA AFETA EM PARTE À COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO INTERPOSTO. SÚMULA N. 126-STJ. I. A remoção do inventariante, substituindo-o por outro, dativo, pode ocorrer quando constatada a inviabilização do inventário pela animosidade manifestada pelas partes. II. "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial" - Súmula n. 7-STJ. III. Pretensão de reforma do julgado que ademais se sustenta na violação de dispositivos constitucionais sem que tenha sido interposto o recurso competente. IV. Recurso especial não conhecido. (STJ - REsp: 988527 RS 2007/0219976-1, Relator: Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, Data de Julgamento: 24/03/2009, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: 20090511 --> DJe 11/05/2009). É importante salientar que o procedimento para remoção do inventariante deve seguir as etapas abaixo elencadas: 1) Requerimento de qualquer interessado; 2) Processamento em autos apensos; 3) Intimação do inventariante com prazo de 15 dias para apresentação de defesa; 4) Decisão interlocutória recorrível por agravo de instrumento. Caso a remoção se dê em virtude de decisão do juiz, o STJ possui posicionamento no sentido de que há exigência do contraditório, razão pela qual o inventariante deve ser intimado a se manifestar: Remoção de inventariante. Ausência de cerceamento de defesa. 1. Não se configura o cerceamento de defesa no caso de remoção de inventariante quando está presente o contraditório, e pode o Juiz, constatado qualquer dos vícios do art. 995 do Código de Processo Civil, promover de ofício a remoção. 2. Recurso especial não conhecido. (STJ - REsp: 539898 MA 2003/0064408-8, Relator: Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Data de Julgamento: 29/03/2005, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: --> DJ 06/06/2005 p. 318, --> DJ 06/06/2005 p. 318). Com o inventariante removido, deve ocorrer a entrega imediata dos bens do espólio ao substituto. Caso não o faça, caberá busca e apreensão e imissão na posse, além da aplicação de multa a ser fixada pelo juiz em montante não superior a 3% do valor dos bens inventariados. Ademais, há também o cabimento de astreintes, com fulcro no art. 139, IV, do CPC: Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária. 7.8. ARROLAMENTO SUMÁRIO CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 84 O art. 659, caput, do CPC prevê o cabimento do arrolamento sumário quando todos os herdeiros forem capazes e existir acordo entre eles quanto à partilha, in verbis: Art. 659. A partilha amigável, celebrada entre partes capazes, nos termos da lei, será homologada de plano pelo juiz, com observância dos arts. 660 a 663. O § 1º do art. 659 prevê o mesmo procedimento para a hipótese de existir somente um herdeiro, caso em que os bens que compõem a herança serão a ele adjudicados. Assim, diante da ausência de conflitos de interesses em razão da convergência de vontades dos herdeiros ou no caso de herdeiro único, Greco e Marcato defendem que o arrolamento sumário constitui procedimento de natureza de jurisdição voluntária. De acordo com o art. 660 do CPC, no prazo de 2 meses, caberá ao herdeiro ou ao herdeiro único na petição inicial o(a): 1) Requerimento ao juiz da nomeação do inventariante que já vem indicado na própria petição inicial, não havendo necessidade de aplicação da ordem legal do art. 617 do CPC; 2) Declaração dos títulos dos herdeiros e os bens do espólio, nos termos do art. 630 do CPC; 3) Atribuição do valor dos bens para fins de partilha, com fulcro no art. 660, III, do CPC; 4) Havendo dívidas, caberá a indicação na petição inicial dos bens reservados ao seu pagamento. Obs.: a existência de credores do espólio não impede a homologação da partilha em razão da reserva no valor indicado na petição inicial. Assim, procede-se com a intimação do credor para se manifestar sobre os bens reservados. Havendo divergência/impugnação, o juiz deve decidir qual seria o valor correto (art. 663, parágrafo único, do CPC). Ressalta-se que no arrolamento sumário não se admite a apreciação de questões relativas ao lançamento, pagamento ou quitação de taxas judiciárias e de tributos incidentes sobre a transmissão da propriedade dos bens do espólio (art. 662 do CPC). A discussão a respeito dessas matérias se desenvolve em outro processo, administrativo ou judicial, que suspende o arrolamento sumário enquanto não for decidido. Nos termos do § 2º do art. 659 do CPC, o fisco será intimado para lançamento administrativo do imposto de transmissão e de outros tributos porventura incidentes, conforme dispuser a legislação tributária, somente depois de transitada em julgado a sentença de homologação de partilha ou de adjudicação e da lavratura do formal de partilha ou da elaboração de carta de adjudicação: Art. 659, § 2º Transitada em julgado a sentença de homologação de partilha ou de adjudicação, será lavrado o formal de partilha ou elaborada a carta de adjudicação e, em seguida, serão expedidos os alvarás referentes aos bens e às rendas por ele abrangidos, intimando-se o fisco para lançamento CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 85 administrativo do imposto de transmissão e de outros tributos porventura incidentes, conforme dispuser a legislação tributária, nos termos do § 2º do art. 662. No que se refere ao pagamento de tributos, o STJ fixou entendimento no sentido de que no arrolamento sumário, a homologação da partilha ou da adjudicação, bem como a expedição do formal de partilha e da carta de adjudicação, não se condicionam ao prévio recolhimento do imposto de transmissão causa mortis, devendo ser comprovado, todavia, o pagamento dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas, a teor dos arts. 659, § 2º, do CPC e 192 do Código Tributário Nacional: RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO DE QUAISQUER BENS E DIREITOS - ITCMD. ARROLAMENTO SUMÁRIO. ART. 659, CAPUT, E § 2º DO CPC/2015. HOMOLOGAÇÃO DA PARTILHA OU DA ADJUDICAÇÃO. EXPEDIÇÃO DOS TÍTULOS TRANSLATIVOS DE DOMÍNIO. RECOLHIMENTO PRÉVIO DA EXAÇÃO. DESNECESSIDADE. PAGAMENTO ANTECIPADO DOS TRIBUTOS RELATIVOS AOS BENS E ÀS RENDAS DO ESPÓLIO. OBRIGATORIEDADE. ART. 192 DO CTN. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Aplica-se, no caso, o Estatuto Processual Civil de 2015. II - O CPC/2015, ao disciplinar o arrolamento sumário, transferiu para a esfera administrativa as questões atinentes ao imposto de transmissão causa mortis, evidenciando que a opção legislativa atual prioriza a agilidade da partilha amigável, ao focar, teleologicamente, na simplificação e na flexibilização dos procedimentos envolvendo o tributo, alinhada com a celeridade e a efetividade, e em harmoniacom o princípio constitucional da razoável duração do processo. III - O art. 659, § 2º, do CPC/2015, com o escopo de resgatar a essência simplificada do arrolamento sumário, remeteu para fora da partilha amigável as questões relativas ao ITCMD, cometendo à esfera administrativa fiscal o lançamento e a cobrança do tributo IV - Tal proceder nada diz com a incidência do imposto, porquanto não se trata de isenção, mas apenas de postergar a apuração e o seu lançamento para depois do encerramento do processo judicial, acautelando-se, todavia, os interesses fazendários - e, por conseguinte, do crédito tributário -, considerando que o Fisco deverá ser devidamente intimado pelo juízo para tais providências, além de lhe assistir o direito de discordar dos valores atribuídos aos bens do espólio pelos herdeiros. V - Permanece válida, contudo, a obrigatoriedade de se comprovar o pagamento dos tributos que recaem especificamente sobre os bens e rendas do espólio como condição para homologar a partilha ou a adjudicação, conforme determina o art. 192 do CTN. VI - Acórdão submetido ao rito do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015, fixando-se, nos termos no art. 256-Q, do RISTJ, a seguinte tese repetitiva: No arrolamento sumário, a homologação da partilha ou da adjudicação, bem como a expedição do formal de partilha e da carta de adjudicação, não se condicionam ao prévio recolhimento do imposto de transmissão causa mortis, devendo ser comprovado, todavia, o pagamento dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas, a teor dos arts. 659, § 2º, do CPC/2015 e 192 do CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 86 CTN. VII - Recurso especial do Distrito Federal parcialmente provido. (STJ, REsp 1896526/DF, Ministra Regina Helena, DJe: 28/10/2022). 7.9. ARROLAMENTO COMUM De acordo com Daniel Assumpção, mesmo havendo divergência entre os herdeiros, o inventário poderá seguir a forma de arrolamento, mas nesse caso o processo será de jurisdição contenciosa e a simplicidade constante do arrolamento sumário não estará presente em sua inteireza. Os requisitos do arrolamento comum estão dispostos no art. 664 do CPC: Art. 664. Quando o valor dos bens do espólio for igual ou inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, o inventário processar-se-á na forma de arrolamento, cabendo ao inventariante nomeado, independentemente de assinatura de termo de compromisso, apresentar, com suas declarações, a atribuição de valor aos bens do espólio e o plano da partilha. Isto posto, constata-se que o procedimento do arrolamento comum será cabível somente quando: 1) Houver existência de divergência entre os herdeiros; 2) Os bens que compõem o espólio não tiverem valor superior a 1000 salários-mínimos; 3) É possível a presença de incapaz, desde que com a intimação do Ministério Público para participar do processo. Em continuidade, é importante destacar que o arrolamento comum segue as seguintes fases procedimentais: 1) Designação do inventariante com respeito à ordem legal do art. 617 do CPC. Neste caso, o inventariante será dispensado de prestar compromisso; 2) Apresentação das declarações pelo inventariante já com a atribuição do valor dos bens do espólio e o plano de partilha (art. 664, caput, do CPC); 3) Citação dos herdeiros; Neste momento, os herdeiros podem: a) Concordar com os termos sugeridos pelo inventariante, ocasião na qual o formal de partilha será imediatamente expedido, com aplicação do art. 662 do CPC; b) Apresentar impugnação. Havendo impugnação por qualquer uma das partes ou pelo Ministério Público (na hipótese de atuação como fiscal da lei), o juiz nomeará um avaliador que terá um prazo de 10 dias para oferecer laudo a respeito do valor dos bens que compõem o espólio, em consonância com o art. 664, § 1º, do CPC. Após a apresentação do laudo, o juiz designará uma audiência, na qual decidirá todas as questões atinentes à demanda, determinando a partilha e dando solução aos pedidos de pagamento da dívida do espólio (art. 664, § 2°, do CPC). CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 87 No que se refere aos tributos, no arrolamento comum o julgamento da partilha depende da prova de quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas, de acordo com o art. 664, § 5° do CPC: Art. 664, § 5º Provada a quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas, o juiz julgará a partilha. Ressalta-se que a homologação da partilha depende da apresentação de certidões ou informações negativas de dívida ativa perante a Fazenda Pública, de acordo com entendimento jurisprudencial do STJ: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. ARROLAMENTO. DISCUSSÃO SOBRE O PAGAMENTO DE IMPOSTOS. IMPOSSIBILIDADE. SUSPENSÃO. EXPEDIÇÃO DO FORMAL DE PARTILHA. QUITAÇÃO DOS TRIBUTOS. PRECEDENTES. 1. O prequestionamento dos dispositivos legais tidos como violados constitui requisito indispensável à admissibilidade do recurso especial. Incidência das Súmulas n. 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal. 2. O Superior Tribunal de Justiça, interpretando o art. 1.034 do CPC, firmou entendimento de que não é possível a discussão de questões relativas a lançamento, pagamento e quitação de tributos no âmbito do arrolamento sumário. 3. A teor do que dispõe o art. 1.031, § 2º, do CPC, somente após a juntada aos autos da prova do pagamento dos tributos é que o juiz homologará e expedirá o formal de partilha. 4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. (STJ - REsp: 434483 SP 2002/0055428-7, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 03/08/2006, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 18/08/2006 p. 362). Além disso, basta comprovar o pagamento dos tributos, de modo que discussões a respeito da correção do pagamento devem ocorrer por outra via, conforme posicionamento do referido Tribunal Superior: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ARROLAMENTO SUMÁRIO. IMPOSTO DE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS. HOMOLOGAÇÃO DE PARTILHA. ENTREGA DE DOCUMENTOS À RECEITA ESTADUAL. INEXIGIBILIDADE. 1. No processo de arrolamento sumário, processado com base nos arts. 1.031 e seguintes do CPC, cabível quando todos os herdeiros forem maiores e capazes e estiverem de acordo com a partilha, somente é possível examinar se o inventariante comprovou a quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas. 2. Para a homologação da partilha pelo juiz são dispensadas certas formalidades exigidas no inventário, entre elas a intervenção da Fazenda Pública para verificar a correção do pagamento dos tributos devidos pelo espólio. Assim, a discussão de supostas diferenças pagas a menor deverão ser resolvidas na esfera administrativa, a teor do disposto no art. 1.034 do CPC. 3. Feito o pagamento do imposto e juntado o comprovante aos autos, não pode o juiz condicionar a homologação da partilha em processo de arrolamento sumário à entrega de documentos à Receita estadual necessários ao cálculo do imposto. Ainda que o pagamento não esteja completo ou tenha o inventariante CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 88 calculado mal o imposto, essas questões não podem ser tratadas e discutidas em arrolamento sumário. 4. Recurso especial não provido. (STJ - REsp: 927530 SP 2007/0035257-7, Relator: Ministro CASTRO MEIRA, Data de Julgamento: 12/06/2007, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 28/06/2007 p. 897RT vol. 865 p. 170). 7.10. PROCEDIMENTO DO INVENTÁRIO Segundo o art. 611 do CPC, o processo de inventário e partilha deve ser aberto dentro do prazo de 2 meses a contar da abertura da sucessão, in verbis: Art. 611. O processo de inventário e de partilha deve ser instaurado dentro de 2 (dois) meses, a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) meses subsequentes, podendo o juiz prorrogar esses prazos, de ofício ou a requerimento de parte.Conforme apontado no dispositivo normativo acima, há um prazo de 12 meses subsequentes para encerramento do inventário. Trata-se de um prazo impróprio, de forma que o seu não cumprimento não gerará consequências processuais. Além disso, de acordo com o STF, não existe sanção prevista no dispositivo legal para o descumprimento do prazo de abertura do inventário, cabendo a cada Estado-membro da federação a previsão da multa: Súmula 542 do STF: Não é inconstitucional a multa instituída pelo Estado- membro, como sanção pelo retardamento do início ou da ultimação do inventário. Em continuidade, os arts. 615 e 616 do CPC regulamentam a legitimidade ativa para a propositura da ação de inventário: Art. 615. O requerimento de inventário e de partilha incumbe a quem estiver na posse e na administração do espólio, no prazo estabelecido no art. 611. Parágrafo único. O requerimento será instruído com a certidão de óbito do autor da herança. Apesar de ser em regra proposto pelo administrador provisório, trata-se de espécie de legitimidade concorrente e disjuntiva, eis que qualquer dos sujeitos indicados abaixo pode indistintamente dar início ao processo: Art. 616. Têm, contudo, legitimidade concorrente: I - o cônjuge ou companheiro supérstite; II - o herdeiro; III - o legatário; IV - o testamenteiro; V - o cessionário do herdeiro ou do legatário; VI - o credor do herdeiro, do legatário ou do autor da herança; VII - o Ministério Público, havendo herdeiros incapazes; VIII - a Fazenda Pública, quando tiver interesse; IX - o administrador judicial da falência do herdeiro, do legatário, do autor da herança ou do cônjuge ou companheiro supérstite. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 89 Obs.: o art. 989 do CPC/73 permitia ao juiz determinar, de ofício, o início do inventário, caso nenhuma das pessoas legitimada requeresse dentro do prazo legal. Atualmente, na vigência do CPC de 2015, não existe mais essa possibilidade, de modo que não há mais exceção ao princípio da inércia da jurisdição no âmbito da legitimidade ativa para propor abertura do inventário. A petição inicial deve seguir os requisitos do art. 319 do CPC. A certidão de óbito ou declaração judicial que a substitua é documento indispensável, nos termos do art. 615, parágrafo único, do CPC. Estando regular a petição inicial, o juiz nomeará o inventariante, que deverá prestar compromisso de bem e fielmente cumprir a inventariança por termo a ser lavrado nos autos. Da data em que prestar o compromisso, o inventariante tem prazo de 20 dias para apresentar as primeiras declarações, nos termos do art. 620, caput, do CPC. Segundo Marinoni, trata-se de um prazo dilatório, sendo possível apresentar pedido de prorrogação de prazo ou mesmo prorrogado de ofício pelo juízo. Após as primeiras declarações serão citados o cônjuge ou companheiro, os herdeiros, os legatários e, havendo o finado deixado testamento, do testamenteiro (previsto no art. 626 do CPC), que formarão um litisconsórcio necessário. Obs.: há uma legitimidade híbrida, porque tais pessoas têm tanto a legitimidade para propor a demanda quanto a legitimidade para ficar no polo passivo caso não tenham proposto. Importante salientar que não há existe mais a regra de citação por edital de pessoas domiciliadas em outra comarca (como estava previsto no art. 999, § 1º do CPC de 1973). Atualmente, o art. 626, § 1º do CPC prevê que: Art. 626. Feitas as primeiras declarações, o juiz mandará citar, para os termos do inventário e da partilha, o cônjuge, o companheiro, os herdeiros e os legatários e intimar a Fazenda Pública, o Ministério Público, se houver herdeiro incapaz ou ausente, e o testamenteiro, se houver testamento. § 1º O cônjuge ou o companheiro, os herdeiros e os legatários serão citados pelo correio, observado o disposto no art. 247, sendo, ainda, publicado edital, nos termos do inciso III do art. 259. As citações serão acompanhadas de cópia das primeiras declarações (§ 3º do art. 626 do CPC), incumbindo ao escrivão a remessa de cópias à Fazenda Pública, ao Ministério Público, ao testamenteiro, se houver, e aos advogados, se a parte já estiver representada nos autos (§ 4º do art. 626 do CPC). A Fazenda Pública e o Ministério Público, havendo herdeiro incapaz ou ausente, deverão ser intimados na pessoa de seu representante legal, e não citados como prevê o art. 626, caput, do CPC, bem como receberão cópias das primeiras declarações. Como o tema foi cobrado em concurso? CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 90 (MPE-PR - Promotor - MPE-PR - 2021): Havendo testamento do falecido, impõe-se a intervenção do Ministério Público nos autos de inventário. Errado, pois o Ministério Público atuará apenas nas hipóteses de haver herdeiro incapaz ou ausente. Após os atos de comunicação, procede-se com a abertura de prazo de 15 dias para manifestação dos réus sobre as primeiras declarações (art. 627 do CPC), incumbindo às partes: 1) A alegação de erros, omissões e sonegações de bens; Exemplo de erro seria a hipótese de inclusão de bens que não faziam mais parte do patrimônio do de cujus na ocasião de seu falecimento. Sonegação, por outro lado, ocorre quando um herdeiro maliciosamente oculta um bem do inventário, ato que naturalmente gera um prejuízo aos demais herdeiros. Nesse caso, procede-se com a determinação de retificação das declarações. 2) Reclamação contra a nomeação do inventariante; Nessa hipótese deve haver a nomeação de outro inventariante, respeitando-se a ordem legal. 3) Contestação da qualidade de quem foi incluído no título de herdeiro. Por fim, nesse caso, é necessária a resolução de controvérsia a respeito da qualidade de herdeiro, remetendo as partes às vias ordinárias se a questão exigir prova não documental, com o sobrestamento do inventário. Obs.: a decisão interlocutória que resolve qualquer controvérsia neste momento processual é recorrível por agravo de instrumento. Como o tema foi cobrado em concurso? (TJ-PR - Juiz - FGV - 2021): Podem as partes arguir qualquer matéria em sua manifestação sobre as primeiras declarações. Errado, as partes devem alegar as matérias elencadas no art. 627 do CPC. Segundo o art. 629 do CPC, no prazo de 15 dias após o decurso do prazo do art. 627, caput, do CPC, caberá à Fazenda Pública informar ao juízo o valor dos bens de raiz descritos nas primeiras declarações, o que fará tomando como base os dados que constam de seu cadastro imobiliário. A manifestação tem interesse nitidamente fundado no cálculo de impostos, e por tal razão a melhor doutrina entende pela sua natureza imprópria, de forma que mesmo não havendo manifestação nesse momento procedimental a Fazenda Pública poderá divergir posteriormente do valor indicado pelas partes ou obtido em avaliação. Superada a primeira fase procedimental, com a solução de qualquer oposição porventura oferecida, o juiz nomeará um perito para avaliar os bens do espólio, dando-se preferência ao avaliador judicial nas comarcas em que existir (art. 630 do CPC). O trabalho pericial tem como objetivo mensurar corretamente o valor da herança e dos quinhões cabíveis aos herdeiros, além do eventual cálculo de imposto causa mortis. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 91 A nomeação do perito é dispensada na hipótese de serem todos os herdeiros maiores e capazes e quando: 1) A Fazenda Pública concordar expressamente com os valores indicados nas primeiras declarações, nos termos do art. 633 do CPC, eis que não havendo controvérsia, não há necessidade de produção de prova; 2) Os sucessores concordarem com os valores indicados pela Fazenda Pública. Obs.: sendo a divergência parcial, a perícia terá como objeto somente a parcela controvertida, de acordo com o art. 634 do CPC. Realizada a avaliação, as partes serão intimadas para manifestação no prazo comum de 15 dias,sendo a previsão do art. 635, caput, do CPC, de que tal prazo corre em cartório por ser comum às partes aplicáveis somente aos processos que tramitam em autos físicos, em que é possível a carga dos autos. O § 1º do art. 635 do CPC prevê que versando a impugnação sobre o valor dado pelo perito, o juiz a decidirá de plano, à vista do que constar dos autos. O dispositivo legal sugere que versando a impugnação sobre outra matéria não caberá a decisão de plano, cabendo antes de sua prolação a oitiva das demais partes e do próprio perito para se manifestarem sobre a impugnação. Sendo a impugnação acolhida o juiz determinará, nos termos do § 2º do art. 635 do CPC, a retificação da avaliação. Art. 635. Entregue o laudo de avaliação, o juiz mandará que as partes se manifestem no prazo de 15 (quinze) dias, que correrá em cartório. § 1º Versando a impugnação sobre o valor dado pelo perito, o juiz a decidirá de plano, à vista do que constar dos autos. § 2º Julgando procedente a impugnação, o juiz determinará que o perito retifique a avaliação, observando os fundamentos da decisão. Aceito o laudo de avaliação ou resolvidas as impugnações, caberá ao inventariante prestar as últimas declarações, que poderão aditar, complementar ou emendar as primeiras declarações. Nas últimas declarações restará configurada definitivamente a herança a ser partilhada entre os herdeiros. Em sequência, as partes serão intimadas para manifestação em 15 dias (art. 637 do CPC), cabendo ao juiz a solução de plano de eventuais controvérsias, por meio de decisão interlocutória recorrível por agravo de instrumento. Após a oitiva das partes a respeito das últimas declarações, proceder-se-á ao cálculo do imposto de transmissão causa mortis com base no valor dos bens na data da avaliação. Realizado o cálculo, abrir-se-á um prazo de 5 dias sucessivo para as partes e depois para a Fazenda Pública. Destaca-se, por fim, que o art. 647, parágrafo único, do CPC, de acordo com Daniel Assumpção, inovou ao prever expressamente que o juiz poderá, em decisão fundamentada, deferir antecipadamente a qualquer dos herdeiros o exercício dos direitos de usar e fruir de determinado bem, com a condição de que, ao término do inventário, tal bem integre a cota desse herdeiro. E CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 92 ainda prevê que, desde o deferimento do exercício dos direitos de usar e fruir do bem, cabem ao herdeiro beneficiado todos os ônus e bônus decorrentes do exercício daqueles direitos. Não resta dúvida a respeito da natureza interlocutória, recorrível por agravo de instrumento (art. 1015, parágrafo único, do CPC), dessa decisão, mas sobram dúvidas a respeito de qual espécie de julgamento versa o dispositivo legal ora comentado. Não se trata de julgamento parcial de mérito porque o herdeiro recebe apenas o exercício dos direitos de usar e usufruir do bem, e não sua propriedade. Por outro lado, embora se assemelhe a tutela provisória (da evidência, porque a lei não prevê o periculum in mora como requisito para sua concessão), parte da certeza de que o bem integra a cota do herdeiro beneficiado pela concessão da tutela, o que contraria o juízo de mera probabilidade típico das tutelas provisórias. 7.11. PARTILHA Após o encerramento da fase procedimental correspondente ao inventário, em regra passa- se à fase que corresponde à partilha, com procedimento regulado nos arts. 647 a 658 do CPC. Excepcionalmente não haverá a fase de partilha, considerando-se a possibilidade de existir um único titular ao recebimento da herança, hipótese na qual os bens lhe serão imediatamente adjudicados ao final do inventário. É importante evidenciar que existem 3 espécies de partilha, conforme classificação do doutrinador Daniel Assumpção: 1) Amigável: ocorrerá sempre que existir acordo entre todos os sucessores, podendo ser realizada administrativamente ou por acordo extrajudicial levado à homologação judicial. 2) Judicial: resolve-se por sentença quando existe divergência entre os sucessores, cabendo analisar o seu procedimento. 3) Em vida: não pode prejudicar a legítima dos herdeiros necessários. Segundo previsão do art. 647, caput, do CPC, encerrada a fase de inventário, o juiz intimará as partes para que formulem pedido de quinhão no prazo comum de 15 dias. Nesse momento cabe às partes indicarem os bens que mais lhes interessam para fazerem parte de seu quinhão. Ex.: um herdeiro que já residia na fazenda deseja permanecer nela e, por isso, deseja o bem para si. Transcorrido esse prazo, com ou sem a manifestação das partes, proferirá o juiz a decisão de deliberação da partilha, resolvendo os pedidos das partes e designando os bens que devem constituir o quinhão de cada herdeiro e legatário, levando sempre em conta 3 regras/critérios objetivos para a partilha: 1) A maior igualdade possível, seja quanto ao valor, quanto à natureza e à qualidade dos bens, em regra já prevista no art. 2017 do Código Civil; 2) A prevenção de litígios futuros; 3) A maior comodidade dos coerdeiros, do cônjuge ou do companheiro, se for o caso, nos termos do art. 648, considerando-se o status quo ante. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 93 Caberá ao juiz nesse momento procedimental decidir sobre a necessidade de alienação de bens para pagamento de dívidas do espólio ou para a partilha do preço na hipótese de bens insuscetíveis de divisão cômoda e não comportáveis no quinhão do sucessor ou do cônjuge sobrevivente. Nesse caso, admite-se que um dos interessados adjudique o bem, repondo aos demais em dinheiro o valor que exceder sua cota, havendo licitação quando existir mais de um interessado na adjudicação. Com base na manifestação das partes e no projeto de partilha definido após o pronunciamento judicial, os autos serão encaminhados ao partidor do juízo (avaliador especializado em partilha) para organizar o esboço da partilha de acordo com a decisão de deliberação da partilha, observando nos pagamentos a seguinte ordem lógica (art. 651, do CPC): 1) Dívidas atendidas; 2) Meação do cônjuge; 3) Meação disponível; 4) Quinhões hereditários, a começar pelo coerdeiro mais velho. Aduz o art. 652 do CPC que as partes serão intimadas para se manifestarem sobre o esboço da partilha no prazo comum de 15 dias. Sem reclamações, a partilha será lançada nos autos. Havendo reclamações, o juiz as decidirá e lançará a partilha nos autos. Trata-se de decisão interlocutória recorrível por agravo de instrumento em ambos os casos. Da partilha constarão um auto de orçamento e uma folha de pagamento para cada parte, nos termos do art. 653 do CPC. Conforme previsão do art. 654 do CPC, sendo provada a inexistência de débitos tributários (juntada aos autos de certidão ou informação negativa da dívida para com a Fazenda Pública), em especial a prova de pagamento de imposto de transmissão a título de morte, o juiz julgará a partilha, em sentença de natureza constitutiva, uma vez que cria uma nova situação jurídica dos bens pertencentes à herança, fazendo cessar a indivisão patrimonial decorrente da morte do de cujus. A sentença é recorrível por apelação e após o trânsito em julgado os herdeiros receberão os bens e o formal de partilha, com fulcro no art. 655 do CPC: Art. 655. Transitada em julgado a sentença mencionada no art. 654 , receberá o herdeiro os bens que lhe tocarem e um formal de partilha, do qual constarão as seguintes peças: I - termo de inventariante e título de herdeiros; II - avaliação dos bens que constituíram o quinhão do herdeiro; III - pagamento do quinhão hereditário; IV - quitação dos impostos; V - sentença. Salienta-se que o formal de partilha é título suficiente para a transcrição no Registro Imobiliário, valendo também como título executivo judicial entre os herdeiros, sucessores e inventariante (art. 515, IV, do CPC) para exigir o cumprimento de obrigações de pagare entregar coisa. Na hipótese de bens de pequeno valor, considerados pelo parágrafo único do art. 655 do CPC como aqueles que não excederem a 5 vezes o salário-mínimo, não haverá expedição de formal de partilha, mas de mera certidão, que terá os mesmos efeitos materiais do formal. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 94 Com o trânsito em julgado da sentença da partilha o espólio será extinto, também sendo extinta a figura do inventariante, cabendo a cada herdeiro defender em juízo e fora dele apenas os bens pertencentes a seu quinhão. Mesmo depois de transitada em julgado a sentença da partilha, o art. 656 do CPC disciplina que é possível a sua emenda para corrigir erro de fato na descrição dos bens, desde que com isso concordem todos os herdeiros: Art. 656. A partilha, mesmo depois de transitada em julgado a sentença, pode ser emendada nos mesmos autos do inventário, convindo todas as partes, quando tenha havido erro de fato na descrição dos bens, podendo o juiz, de ofício ou a requerimento da parte, a qualquer tempo, corrigir-lhe as inexatidões materiais. Ressalta-se, entretanto, que consoante posicionamento do STJ, a emenda para corrigir erro de fato na descrição dos bens e inexatidões materiais da sentença da partilha não pode gerar alteração substancial de seu conteúdo, em respeito ao trânsito em julgado: INVENTÁRIO. PARTILHA. COLAÇÃO DE BEM DOADO A DETERMINADOS HERDEIROS PELO DE CUJUS. ASSERTIVA DE CONTRARIEDADE AO ART. 1.028 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. - Impertinência da invocação feita ao art. 1.028 do CPC no caso, visto não se cuidar de erro de fato na descrição do bem ou de inexatidão material. Inexistência, ademais, de concordância de todos os interessados. Recurso especial não conhecido. (STJ - REsp: 109188 SP 1996/0060994-2, Relator: Ministro BARROS MONTEIRO, Data de Julgamento: 21/03/2002, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: --> DJ 26/08/2002 p. 221 LEXSTJ vol. 157 p. 88). 7.11.1. Desconstituição da sentença de partilha Seguindo as previsões dos arts. 657 e 658 do CPC, a doutrina entende que a ação cabível para a desconstituição da sentença de partilha já transitada em julgado depende da espécie de partilha. Sendo assim, a desconstituição pode ocorrer de 2 formas: 1) Tendo sido partilha amigável, a sentença meramente homologatória do acordo de vontade das partes será desconstituída por meio de ação anulatória, nos termos do art. 657 do CPC: Art. 657. A partilha amigável, lavrada em instrumento público, reduzida a termo nos autos do inventário ou constante de escrito particular homologado pelo juiz, pode ser anulada por dolo, coação, erro essencial ou intervenção de incapaz, observado o disposto no § 4º do art. 966. Parágrafo único. O direito à anulação de partilha amigável extingue-se em 1 (um) ano, contado esse prazo: I - no caso de coação, do dia em que ela cessou; II - no caso de erro ou dolo, do dia em que se realizou o ato; III - quanto ao incapaz, do dia em que cessar a incapacidade. O prazo para o ingresso da ação anulatória é de 1 ano. Sendo o direito de anular a sentença um direito potestativo, é indiscutível a natureza decadencial desse prazo. Todos os sujeitos que CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 95 participaram do processo de inventário e partilha têm legitimidade para a ação anulatória, devendo formar um litisconsórcio passivo necessário entre todos os demais sujeitos que participaram de tal processo e foram contemplados pela partilha, sendo o cônjuge sobrevivente parte ilegítima para esse processo porque a meação não integra a herança propriamente dita. 2) Tendo sido a partilha judicial, a sentença que homologou a partilha será desconstituída após o trânsito em julgado por meio de ação rescisória, de acordo com o art. 658 do CPC: Art. 658. É rescindível a partilha julgada por sentença: I - nos casos mencionados no art. 657; II - se feita com preterição de formalidades legais; III - se preteriu herdeiro ou incluiu quem não o seja. Como o tema foi cobrado em concurso? (TJ-PR - Juiz - FGV - 2021): A partilha, depois de transitada em julgado a sentença, somente pode ser alterada por meio de sua rescisão. Errado, uma vez que a partilha pode ser emendada nos mesmos autos do inventário de acordo com o art. 656 do CPC. Um outro processo que pode vir a afetar a partilha realizada é a ação de petição de herança, proposta por herdeiro que não participou do processo. Ela acarreta a nulidade da partilha realizada, com a consequente desconstituição da sentença, mesmo que transitada em julgado. O herdeiro que não tenha participado do processo de inventário e partilha não está sujeito à coisa julgada, tendo prazo prescricional de 20 anos para ingressar com ação de petição de herança, que uma vez julgada procedente gerará uma retificação da partilha já realizada, segundo entendimento do STJ: Direito civil e processual civil. Recurso especial. Ação de investigação de paternidade c/c petição de herança e anulação de partilha. Decadência. Prescrição. Anulação da paternidade constante do registro civil. Decorrência lógica e jurídica da eventual procedência do pedido de reconhecimento da nova paternidade. Citação do pai registral. Litisconsórcio passivo necessário. - Não se extingue o direito ao reconhecimento do estado de filiação exercido com fundamento em falso registro. - Na petição de herança e anulação de partilha o prazo prescricional é de vinte anos, porque ainda na vigência do CC/16. - O cancelamento da paternidade constante do registro civil é decorrência lógica e jurídica da eventual procedência do pedido de reconhecimento da nova paternidade, o que torna dispensável o prévio ajuizamento de ação com tal finalidade. - Não se pode prescindir da citação daquele que figura como pai na certidão de nascimento do investigante para integrar a relação processual na condição de litisconsórcio passivo necessário. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. (STJ - REsp: 693230 MG 2004/0138750-1, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 11/04/2006, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: --> DJ 02/05/2006 p. 307 RNDJ vol. 79 p. 94). CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 96 Na hipótese de sobrepartilha, não haverá anulação da partilha já realizada, mas uma nova partilha, a ser realizada no mesmo processo da anterior. Segundo o art. 669 do CPC, ficam sujeitos à sobrepartilha: 1) Bens sonegados (escondidos); 2) Bens desconhecidos ao tempo da partilha; 3) Bens litigiosos ou de liquidação difícil ou morosa; 4) Bens situados em lugar remoto da sede do juízo onde se processa o inventário. Mesmo tendo sido a partilha concretizada judicialmente, é cabível a realização de sobrepartilha extrajudicialmente, desde que sejam respeitados os requisitos legais, nos termos do art. 610 do CPC. Havendo acordo entre todos os herdeiros a respeito da sobrepartilha, caberá ao juiz simplesmente homologar o acordo de vontades. Como o tema foi cobrado em concurso? (TJ-PR - Juiz - FGV - 2021): Caso seja necessária a sobrepartilha, esta seguirá procedimento especial simplificado. Errado, pois ela correrá nos autos do inventário do autor da herança. 8. EMBARGOS DE TERCEIRO 8.1. CONCEITO Os embargos de terceiro são ação de conhecimento de rito especial sumário, de que dispõe o terceiro ou a parte a ele equiparada, sempre que sofra uma constrição de um bem do qual tenha posse (como senhor ou possuidor) em razão de decisão judicial proferida num processo do qual não participe. O objetivo da ação de embargos de terceiro é desconstituir a constrição judicial com a consequente liberação do bem. Obs.: por constrição judicial entende-se o ato judicial por meio do qual o terceiro sofre alguma espécie de restrição de algum bem de seu patrimônio. A referida ação possui natureza preventiva e reconstitutiva, eis que podeser utilizada para evitar que a constrição ocorra, bem como desfazê-la caso já tenha sido realizada, conforme expressa previsão do art. 674, caput, do CPC: Art. 674. Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro. A responsabilidade patrimonial, como regra geral, recai sobre as partes que participam da relação jurídica processual, sendo apenas de forma excepcional permitido ao juiz que determine a CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 97 constrição patrimonial daquele que não participou do processo (art. 790 do CPC). Sempre que a regra geral for desrespeitada e não se verificar um dos casos de exceção, ou seja, não ser parte tampouco ter qualquer responsabilidade pelo cumprimento da obrigação, o terceiro poderá ingressar com a ação de embargos de terceiro com o exclusivo objetivo de afastar a constrição judicial. Como o tema foi cobrado em concurso? (TRF-3 - Juiz - TRF-3 - 2022): Os embargos de terceiro são modalidade de intervenção de terceiros coata, na qual o terceiro se vê obrigado a ingressar no processo por força de constrição realizada sobre o seu patrimônio. Errado. (DPE-SE - Defensor - CESPE - 2022): O embargo de terceiro é um instrumento processual que visa proteger a posse ou a propriedade de bens daquele que não sendo parte no processo sofre constrição ou ameaça de constrição judicial, seja em tutela cognitiva provisória, ou definitiva, seja na execução. Correto. 8.2. LEGITIMAÇÃO 8.2.1. Legitimidade ativa Aduz o art. 674, caput, do CPC que a legitimidade ativa dos embargos de terceiro é do terceiro – entendido como o sujeito que não faz parte da relação jurídica processual tampouco tem responsabilidade patrimonial – que sofra constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, in verbis: Art. 674, § 1º Os embargos podem ser de terceiro proprietário, inclusive fiduciário, ou possuidor. § 2º Considera-se terceiro, para ajuizamento dos embargos: I - o cônjuge ou companheiro, quando defende a posse de bens próprios ou de sua meação, ressalvado o disposto no art. 843; II - o adquirente de bens cuja constrição decorreu de decisão que declara a ineficácia da alienação realizada em fraude à execução; III - quem sofre constrição judicial de seus bens por força de desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente não fez parte; IV - o credor com garantia real para obstar expropriação judicial do objeto de direito real de garantia, caso não tenha sido intimado, nos termos legais dos atos expropriatórios respectivos. No que tange ao § 2º do art. 674, importante tecer as seguintes observações acerca de cada um dos incisos: 1) Inciso I: legitimidade ativa do cônjuge ou companheiro quando defende a posse de bens próprios ou de sua meação. Salienta-se que os embargos de terceiro nesse caso têm uma importante singularidade: não retiram a constrição judicial sobre o bem, que será normalmente alienado judicialmente, pois o que CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 98 se obtém pelos embargos de terceiro é somente metade do valor da avaliação do bem após sua alienação. Assim, se um bem for avaliado em R$ 500.000,00 e vendido por R$ 400.000,00, o cônjuge terá direito a R$ 250.000,00 (50% do valor da avaliação). Por outro lado, se for avaliado em R$ 500.000,00 e vendido por R$ 600.000,00, o cônjuge terá direito a R$ 300.00,00, uma vez que quando o valor da venda é superior ao valor da avaliação, deve-se repartir em porcentagens iguais de 50% do valor da venda, conforme apontado por Daniel Assumpção. Destaca-se que essa é a única hipótese de legitimidade ativa prevista pelo § 2º do art. 674 do CPC de sujeito que, apesar de ser parte – o cônjuge ou companheiro intimados da penhora do imóvel passam a ser litisconsortes passivos ulteriores do cônjuge ou companheiro devedor – tem legitimidade para ingressar com embargos de terceiro. Como o tema foi cobrado em concurso? (DPE-CE - Defensor - FCC - 2022): Maria, casada com Aguinaldo sob regime de comunhão parcial de bens, procurou atendimento na Defensoria Pública de Fortaleza. Aguinaldo é devedor de pensão alimentícia de filho que já tinha antes de se casar com Maria e está respondendo pela dívida alimentar em cumprimento definitivo de sentença, no qual foi penhorada a casa adquirida na constância da união com Maria. Eles estão separados de fato, de maneira que Maria está residindo com a sua genitora. Com o objetivo de garantir os direitos de Maria em relação ao imóvel, caberá embargos de terceiro para resguardar os direitos de sua meação. Correto. 2) Inciso II: adquirente de bens cuja constrição decorreu de decisão que declara a ineficácia da alienação realizada em fraude à execução. O § 4º do art. 792 do CPC prevê que, antes de ser declarada a fraude à execução, o juiz deverá intimar o terceiro adquirente, que, se quiser, poderá opor embargos de terceiro, no prazo de 15 dias. O referido inciso II do art. 674 apenas confirma a legitimidade nesse caso para viabilizar o cumprimento do art. 792, § 4º do CPC, mas não resta muita dúvida de que o adquirente de bem em fraude à execução é um terceiro, porque o juiz não o intimará para se manifestar no processo sobre o pedido de fraude à execução, o que o tornaria parte no processo, e sim para a oposição de embargos de terceiro com natureza preventiva. 3) Inciso III: sujeito que sofre constrição judicial de seus bens por força de desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente não fez parte. Nesse caso o sujeito será um terceiro tanto em relação ao processo em que se deu a constrição judicial quanto naquele em que houve a desconsideração da personalidade jurídica. Desse modo, se o sujeito não fez parte do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, não teve responsabilidade patrimonial secundária reconhecida, não pode ter bens de seu patrimônio constritos judicialmente. Como o tema foi cobrado em concurso? (MPE-RS - Promotor - MPE-RS - 2021): Considera-se terceiro, para ajuizamento dos embargos, quem sofre constrição judicial de seus bens por CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 99 força de desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente fez parte. Errado. 4) Inciso IV: credor com garantia real para obstar expropriação judicial do objeto de direito real de garantia, caso não tenha sido intimado, nos termos legais dos atos expropriatórios respectivos. Apesar de o bem gravado por garantia real ser penhorável, existem algumas condições específicas que visam proteger o credor hipotecário ou pignoratício, em razão de sua preferência sobre o credor quirografário. Segundo a previsão legal contida no art. 799, I, do CPC, o credor com garantia real deve ser intimado da penhora que incide sobre o bem objeto da hipoteca, penhor ou anticrese. Uma vez intimado da penhora, o credor – terceiro em relação à execução – pode evitar a expropriação do bem dado em “garantia real” por meio da interposição dos embargos de terceiro. Nos embargos do credor com garantia real existe uma limitação nas matérias defensivas, de acordo com o art. 680 do CPC. Assim, o embargado somente poderá alegar que: 1) O devedor comum é insolvente; Obs.: de acordo com Daniel Assumpção, o termo “insolvência”, utilizado no dispositivo legal, não se condiciona exclusivamente à sentença de falência ou de insolvência civil, bastando para tanto a comprovação de não existirem outros bens para satisfazer o direito do credor. 2) O título é nulo ou não obriga a terceiro; 3) Outra é a coisa dada em garantia. Infere-se que a melhor doutrina e jurisprudência entendem que a única forma de o credorhipotecário ou pignoratício impedir a execução alheia sobre sua garantia real é comprovar que existem outros bens que possam responder pela obrigação quirografária. Por fim, destaca-se que de acordo com entendimento do STJ, se há uma promessa de compra e venda de um imóvel e ocorre ato de constrição sobre o bem, o promitente comprador do imóvel, mesmo que o contrato não tenha sido registrado em cartório, tem legitimidade para embargar de terceiro. Nesse sentido: Súmula 84 do STJ: É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. OFENSA À SÚMULA. EMBARGOS DE TERCEIRO. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA NÃO REGISTRADO. POSSE INDIRETA. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 84/STJ. - Ofensa à Súmula de Tribunal não autoriza interposição de recurso especial arrimado na alínea a do permissivo constitucional. - Inúmeros precedentes afirmam ser possível o oferecimento de embargos de terceiro com base em posse indireta. O artigo 1.046 do Código de Processo Civil não exclui a possibilidade do credor de bem CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 100 dado em garantia, com posse indireta, pela tradição ficta, como convencionado no termo próprio, ajuizar embargos de terceiro. - Nessa linha de precedentes, é admissível, inclusive, a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse indireta advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro. Eventual má-fé, quando constatada, deverá ser adequadamente combatida pelo Poder Judiciário, o que não ocorre na hipótese sob exame. Recurso especial provido. (STJ - REsp: 908137 RS 2006/0263649-4, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 20/10/2009, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: --> DJe 17/11/2009 REPDJe 20/11/2009). Como o tema foi cobrado em concurso? (PGE-RS - Procurador - CESPE - 2023): No curso de ação de execução, o credor requereu a penhora de dois motores de retroescavadeiras que se encontravam no depósito da empresa executada, avaliados em R$ 350.000. O juízo da causa deferiu a penhora dos motores e determinou sua remoção bem como a entrega ao exequente, que ficaria como seu fiel depositário. Todavia, os referidos motores tinham sido adquiridos pelo poder público estadual (DER/ES), com o objetivo de recuperar duas máquinas de sua propriedade, que estavam danificadas. Nessa situação hipotética, o estado do Espírito Santo tem interesse jurídico e possui legitimidade ativa para propor ação de embargos de terceiro com o objetivo de liberar a constrição judicial recaída sobre os objetos penhorados. Correto. (MPE-SC - Promotor - CESPE - 2021): O adquirente de coisa litigiosa, ainda que ciente do fato, é parte legítima para opor embargos de terceiros, posto que essa via processual é adequada àquele que, não sendo parte no processo, tenha por propósito afastar a contrição judicial que recaia sobre o bem do qual seja titular. Errado. 8.2.2. Legitimidade passiva Dispõe o § 4º do art. 677 do CPC que: Art. 677, § 4º Será legitimado passivo o sujeito a quem o ato de constrição aproveita, assim como o será seu adversário no processo principal quando for sua a indicação do bem para a constrição judicial. A regra fundamental para a determinação da legitimação passiva é aquela que indica o polo ativo da demanda de onde surgiu a apreensão judicial, levando-se em consideração que a ordem do juiz para a constrição judicial ocorre ou deriva de uma satisfação do direito do autor/exequente (conhecimento e execução) ou de garantia dessa satisfação do requerente (cautelar). Verifica-se, entretanto, que em determinadas situações a apreensão judicial é resultado direto da indicação de bem feita pelo sujeito que compõe o polo passivo da demanda. É o caso, por exemplo, de uma execução na qual o executado oferece bem de terceiro à penhora, não podendo ser o exequente responsabilizado sozinho pela constrição advinda de tal pedido. Nesse caso, a legitimidade será tanto do executado (responsável pela individualização do bem) como do CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 101 exequente (responsável pelo pedido de constrição), formando-se no polo passivo dos embargos de terceiro um litisconsórcio necessário, de acordo com Marcato e Câmara. 8.3. COMPETÊNCIA A competência está expressa no art. 676 do CPC, in verbis: Art. 676. Os embargos serão distribuídos por dependência ao juízo que ordenou a constrição e autuados em apartado. Trata-se, portanto, de regra de competência absoluta (funcional) do juízo que realizou a constrição judicial. Obs.: estando em trâmite a demanda perante o segundo grau de jurisdição, a competência para interposição dos embargos de terceiro continua a ser do primeiro grau, conforme posicionamento de Araken de Assis, uma vez que não cabe criação de ação e competência originária do tribunal sem previsão legal, bem como porque os atos materiais de constrição judicial são realizados no primeiro grau. Tramitando a ação principal perante a Justiça Estadual e sendo interpostos os embargos de terceiro por qualquer dos entes federais previstos no art. 109, I, da CF/88, a competência para o julgamento dos embargos de terceiro passa a ser da Justiça Federal. O STJ possui entendimento no sentido de que a competência da ação principal continua a ser da Justiça Estadual, devendo tal demanda executiva ser suspensa até o julgamento dos embargos de terceiro como forma de evitar decisões contraditórias: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA COMUM ESTADUAL E JUSTIÇA FEDERAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO AJUIZADA PERANTE A JUSTIÇA ESTADUAL. EMBARGOS DE TERCEIRO OPOSTOS PELA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. INEXISTÊNCIA DE CONEXÃO. AÇÃO DE EXECUÇÃO SOBRESTADA NA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM. EMBARGOS DE TERCEIRO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. I. A reunião de processos por conexão, como forma excepcional de modificação de competência, só ocorre quando as causas supostamente conexas estejam submetidas a juízos, em tese, competentes para o julgamento das duas demandas. II. É competente a Justiça Federal para o julgamento dos embargos de terceiro opostos pela Caixa Econômica Federal, devendo ser sobrestada na Justiça Estadual, a ação de execução, até julgamento dos referidos embargos, pela Justiça Federal, para evitar prolação de decisões conflitantes. Conflito de competência conhecido declarando-se competente para o julgamento dos embargos de terceiro o Juízo Federal da 24ª Vara da Seção Judiciária do Estado de Minas Gerais, ora suscitante. (STJ - CC: 93969 MG 2008/0040722-0, Relator: Ministro SIDNEI BENETI, Data de Julgamento: 28/05/2008, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 05/06/2008). Em continuidade, importante visualizar o que dispõe o parágrafo único do art. 676 do CPC: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 102 Art. 676, Parágrafo único. Nos casos de ato de constrição realizado por carta, os embargos serão oferecidos no juízo deprecado, salvo se indicado pelo juízo deprecante o bem constrito ou se já devolvida a carta. Sendo expedida a carta precatória para a constrição de determinado bem, servindo o juízo deprecado apenas para efetivar tal apreensão, a competência para os embargos de terceiro será do juízo deprecante, responsável pela indicação do bem a ser constrito. Já no caso de uma constrição, em que o juízo deprecante apenas expede carta precatória para que sejam constritos tantos bens quantos necessários para a garantia do juízo (ex.: penhora), a escolha de quais bens servirão de objeto da constrição patrimonial deve ser feita pelo juízo deprecado, sendo esse competente para conhecer dos embargos de terceiro. 8.4. PRAZO O prazo para propositura dos embargos de terceiro está estabelecidono art. 675 do CPC: Art. 675. Os embargos podem ser opostos a qualquer tempo no processo de conhecimento enquanto não transitada em julgado a sentença e, no cumprimento de sentença ou no processo de execução, até 5 (cinco) dias depois da adjudicação, da alienação por iniciativa particular ou da arrematação, mas sempre antes da assinatura da respectiva carta. Trata-se, destarte, de um prazo decadencial. Segundo o referido dispositivo normativo, se a apreensão ocorrer no curso do processo de conhecimento (ou fase procedimental), o terceiro pode opor embargos enquanto não ocorrer o trânsito em julgado da sentença. Obs.: o terceiro não está vinculado à coisa julgada material de demanda da qual não participou (art. 506 do CPC), de forma que poderá depois do trânsito em julgado reivindicar o bem constrito pelas vias ordinárias, havendo restrição tão somente à utilização dos embargos de terceiro. O prazo é meramente preclusivo, não afetando o direito material do terceiro. Se a apreensão se verificar no trâmite do processo de execução, a oportunidade para a propositura da demanda se exaure no prazo de 5 dias depois da adjudicação, da alienação por iniciativa particular ou da arrematação, mas nunca após a assinatura da respectiva carta. Havendo alienação por iniciativa particular, o prazo também será de até 5 dias após a alienação judicial do bem. Como o tema foi cobrado em concurso? (MPE-RS - Promotor - MPE-RS - 2021): Os embargos de terceiro podem ser opostos a qualquer tempo no processo de conhecimento enquanto não transitada em julgado a sentença e, no cumprimento de sentença ou no processo de execução, até 10 (dez) dias depois da adjudicação, da alienação por iniciativa particular ou da arrematação, mas sempre antes da assinatura da respectiva carta. Errado. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 103 8.5. PROCEDIMENTO A petição inicial, a ser distribuída para o mesmo juízo no qual tramita a ação principal, deve seguir as regras gerais do art. 319 do CPC. O art. 677 do CPC estabelece também a necessidade de o embargante fazer prova sumária de sua posse ou de seu domínio e da qualidade de terceiro, oferecendo documentos e indicando o rol de testemunhas. Além disso, o § 1º do art. 677 ressalta que é facultada a prova da posse em audiência preliminar designada pelo juiz. Segundo Daniel Assumpção, trata-se da mesma audiência de justificação preliminar para a produção da prova da posse prevista nas ações possessórias. Salienta-se que há preclusão da produção de prova testemunhal caso o autor não apresente o rol de testemunhas na inicial, de acordo com o entendimento do STJ: PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. ROL DE TESTEMUNHAS. PRECLUSÃO. ART. 1.050 DO CPC. 1. De acordo com o art. 1.050 do Código de Processo Civil, na ação de embargos de terceiro, o rol de testemunhas deve ser entregue juntamente com a petição inicial, sob pena de preclusão. 2. Recurso especial provido. (STJ - REsp: 362504 RS 2001/0139726-6, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 04/04/2006, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: --> DJ 23/05/2006 p. 135). Recebida a petição inicial e estando suficientemente provada a posse do embargante, o juiz deferirá os embargos e ordenará liminarmente (tutela de urgência satisfativa) a suspensão das medidas constritivas sobre os bens litigiosos objeto dos embargos de terceiro preventivo ou expedição de mandado de manutenção ou restituição do bem objeto da apreensão judicial em favor do embargante se a constrição já tiver ocorrido, de acordo com o art. 678 do CPC: Art. 678. A decisão que reconhecer suficientemente provado o domínio ou a posse determinará a suspensão das medidas constritivas sobre os bens litigiosos objeto dos embargos, bem como a manutenção ou a reintegração provisória da posse, se o embargante a houver requerido. Em seguida, destaca-se que pode haver a necessidade de prestação de caução, nos termos do art. 678, parágrafo único, do CPC: Art. 678, Parágrafo único. O juiz poderá condicionar a ordem de manutenção ou de reintegração provisória de posse à prestação de caução pelo requerente, ressalvada a impossibilidade da parte economicamente hipossuficiente. Conforme apontado, procede-se com dispensa da prestação da caução quando a parte for economicamente hipossuficiente. No caso de o embargante não prestar a caução, que pode ser real ou fidejussória, o bem objeto dos embargos ficará sequestrado até o julgamento final da ação, figurando alguém (pode ser inclusive o embargante) como depositário fiel do bem, consoante entendimento do STJ: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 104 PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. DEFERIMENTO LIMINAR. ART. 1.051 DO CPC. CAUÇÃO. NÃO EXIGIDA OU NÃO PRESTADA. BEM RECEBIDO EM DEPÓSITO JUDICIAL. PRECEDENTE. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. - Se a caução prevista no art. 1.051 do CPC não é exigida ou não puder ser prestada pelo embargante, o objeto dos embargos de terceiro fica sequestrado e quem o recebe assume o cargo de depositário judicial do bem, nos termos do art. 148 do CPC. - Se aquele que recebe liminarmente o bem o objeto dos embargos de terceiro, sem prestar caução, nega a sua qualidade de depositário judicial, para esquivar-se da devolução do bem ou mesmo da sua prisão civil, quebra o dever de lealdade processual exigido pelo art. 14 do CPC, incorre em litigância de má-fé e, por isso, pode ser condenado de acordo com o disposto nos arts. 17 e 18, ambos do CPC. Recurso especial não conhecido. (STJ - REsp: 754895 MG 2005/0089032-3, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 25/09/2006, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 09/10/2006 p. 291). No que se refere à citação, tem-se que: Art. 677, § 3º A citação será pessoal, se o embargado não tiver procurador constituído nos autos da ação principal. Isto posto, constata-se que a citação do embargado deverá ser feita na pessoa de seu advogado, o que prestigia o princípio da economia processual, sendo solução também adotada em outras ações incidentais como a oposição e a reconvenção. Em continuidade, no que tange às respostas do réu, o art. 679 do CPC estabelece o seguinte: Art. 679. Os embargos poderão ser contestados no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual se seguirá o procedimento comum. Salienta-se que o embargado não pode alegar fraude contra credores em sede de defesa, eis que o meio processual adequado para se obter a anulação de ato jurídico por fraude a credores não é a resposta aos embargos de terceiro, mas a ação pauliana, conforme entendimento sumular do STJ: Súmula 195 do STJ: Em embargos de terceiro não se anula ato jurídico, por fraude contra credores. Outrossim, de acordo com Marinoni e Araken de Assis, bem como o posicionamento do STJ, não se admite cumulação de pedidos estranhos à natureza constitutivo-negativa dos embargos de terceiro (incluindo a reconvenção): RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS. CANCELAMENTO DA RESTRIÇÃO DO VEÍCULO DA AUTORA, ALÉM DA CONDENAÇÃO DA RÉ EM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE. COGNIÇÃO LIMITADA. FINALIDADE TÃO SOMENTE DE EVITAR OU AFASTAR A CONSTRIÇÃO JUDICIAL INJUSTA SOBRE BENS DE TERCEIROS. MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 105 RECURSO DESPROVIDO. 1. Os embargos de terceiro, a despeito de se tratar de ação de conhecimento, tem como única finalidade a de evitar ou afastar a constrição judicial sobre bens de titularidade daquele que não faz parte do processo correlato. 2. Dessa forma, considerando a cognição limitada dos embargos de terceiro, revela-se inadmissível a cumulação de pedidos estranhos à sua natureza constitutivo-negativa, como, por exemplo, o pleito de condenação a indenização por danos morais. 3. Recurso especial desprovido. (STJ - REsp: 1703707RS 2017/0264895-1, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 25/05/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/05/2021). Após a apresentação da contestação, o procedimento dos embargos de terceiro será o comum (art. 679 do CPC). 9. OPOSIÇÃO 9.1. CONCEITO Ressalta-se, a priori, que a ação de oposição, na vigência do CPC de 1973, tinha natureza de intervenção de terceiros. Atualmente, de acordo com Daniel Assumpção, configura-se oposição a ação por meio da qual um terceiro ingressa com processo pleiteando o direito ou coisa sobre que controvertem autor e réu. Significa dizer que por meio da oposição o autor busca obter para si o direito ou a coisa objeto de disputa entre as partes em processo já instaurado. O conceito está legalmente previsto no art. 682 do CPC: Art. 682. Quem pretender, no todo ou em parte, a coisa ou o direito sobre que controvertem autor e réu poderá, até ser proferida a sentença, oferecer oposição contra ambos. Como o tema foi cobrado em concurso? (TJ-MS - Juiz - FCC - 2020): A oposição é manifestada por aquele que, denunciado da lide ou chamado ao processo, impugna sua condição de responsável pela obrigação contratual ou extracontratual. Errado. Há possibilidade de apresentar oposição total ou parcial. Ex.: a ação principal discute a titularidade de 2 imóveis, mas o opoente apresenta oposição informando ser o proprietário de apenas um deles. Ressalta-se, por conseguinte, que a apresentação da ação de oposição está sujeita à preclusão temporal, podendo ser oferecida até ser proferida a sentença. Obs.: não se perde o direito de ação do opoente. Este apenas deverá se valer de ação pelo procedimento comum para questionar a titularidade do direito ou coisa. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 106 É importante frisar, por fim, que são inconfundíveis os embargos de terceiro e a oposição, considerando-se que na oposição o terceiro ingressa em demanda já formada entre autor e réu buscando obter para si o direito ou a coisa discutida, excluindo assim a pretensão de ambas as partes do processo principal. A característica marcante desse procedimento especial é a necessidade que o opoente tem de discutir o direito material objeto da ação principal, já que somente assim convencerá o juiz de suas razões. Na oposição, a opoente tem um necessário interesse na solução da demanda principal, visto que busca demonstrar que nenhum dos sujeitos (autor e réu) merece receber a tutela jurisdicional invocada. Já nos embargos de terceiro o embargante não tem nenhum interesse na solução final da ação principal, visto que para ele pouco importa quem é o titular do direito material debatido em tal ação. A vitória do autor ou do réu é simplesmente indiferente para o embargante, que não objetiva com os embargos de terceiro discutir o direito material que é objeto da ação principal, mas exclusivamente retirar a constrição judicial ilegal. Ex.: autor e réu discutem sobre uma dívida de 100 mil reais. O executado defende que não deve nada. O terceiro vai ajuizar embargos de terceiro apenas para informar que a penhora realizada recaiu sobre um bem dele que não responde pela dívida, requerendo apenas a liberação da constrição judicial realizada. Como o tema foi cobrado em concurso? (DPE-SP - Defensor - FCC - 2023): Em um determinado processo de conhecimento, Jonatas e Tibério disputam o domínio de um determinado bem móvel. Ocorre que Lúcia, que não faz parte da relação processual e não foi citada, ficou sabendo da existência da demanda e entende que na verdade o objeto litigioso é de sua propriedade, e não de qualquer das partes da demanda. O processo está em andamento e, até o presente momento, ainda não consta qualquer decisão judicial a respeito do bem litigioso. Nesse caso, Lúcia deverá se valer de embargos de terceiro porque este é o meio adequado para terceiro que pretenda, no todo ou em parte, a coisa ou o direito sobre que controvertem autor e réu. Errado, pois Lúcia deverá se valer da ação de oposição. (DPE-PI - Defensor - CESPE - 2022): Determinado indivíduo, hipossuficiente sob o ponto de vista econômico, compareceu à defensoria pública e demonstrou, por prova documental, em procedimento judicial de cumprimento de sentença movido em face de microempresa, ter sofrido constrição judicial de bem próprio. Demonstrou, ainda, que a constrição decorrera de medida de desconsideração de personalidade jurídica, de cujo incidente não participou. A medida processual a ser tomada para o desfazimento do ato de constrição judicial será o oferecimento de oposição. Errado, uma vez que o indivíduo deverá ajuizar embargos de terceiro. 9.2. PROCEDIMENTO Assim como nos demais procedimentos, a petição inicial deve seguir os parâmetros do art. 319 do CPC. A principal diferença é que ocorre a distribuição por dependência da ação de oposição CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 107 (competência funcional e, portanto, absoluta do juízo), nos termos do parágrafo único do art. 683 do CPC: Art. 683. O opoente deduzirá o pedido em observação aos requisitos exigidos para propositura da ação. Parágrafo único. Distribuída a oposição por dependência, serão os opostos citados, na pessoa de seus respectivos advogados, para contestar o pedido no prazo comum de 15 (quinze) dias. Nessa petição inicial já se encontrará formado um litisconsórcio no polo passivo entre autor e réu do processo já em trâmite em que se discute a coisa ou direito que é objeto da oposição. Trata-se de litisconsórcio: 1) Passivo: porque autor e réu da ação originária deverão, obrigatoriamente, ser réus na ação de oposição desde a propositura desta. 2) Inicial: pois no momento em que a oposição for proposta já deve estar formado. 3) Necessário: uma vez que está expressamente em lei a obrigatoriedade de sua formação. 4) Simples: de acordo com o art. 684 do CPC, se um dos réus reconhecer juridicamente o pedido, a oposição seguirá apenas contra o outro, de modo que o juiz não está obrigado a decidir da mesma forma para ambos os litisconsortes. Obs.: de acordo com Daniel Assumpção, configura-se litisconsórcio simples em razão da aplicação da regra da autonomia dos litisconsortes (art. 117 do CPC), que permite que o ato de disposição de direito praticado por um dos litisconsortes gere seus regulares efeitos mesmo sem a anuência e coparticipação dos demais litisconsortes, sendo tal regra aplicável exclusivamente ao litisconsórcio simples. Caso se tratasse de litisconsórcio unitário, o reconhecimento jurídico do pedido por somente um dos litisconsortes não geraria nenhum efeito no processo. Estando em ordem a petição inicial e não havendo nenhum vício, procede-se com a citação dos réus, na pessoa de seus advogados, para apresentar contestação em 15 dias, de acordo com o art. 683 do CPC: Art. 683. O opoente deduzirá o pedido em observação aos requisitos exigidos para propositura da ação. Parágrafo único. Distribuída a oposição por dependência, serão os opostos citados, na pessoa de seus respectivos advogados, para contestar o pedido no prazo comum de 15 (quinze) dias. Obs.: o réu sem advogado na ação principal será citado pessoalmente. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 108 Ainda que os opostos necessariamente tenham advogados diferentes – pois são adversários na demanda originária – não se aplicará a regra de contagem do prazo em dobro do art. 229 do CPC (mesmo que preenchidos os requisitos para tanto). A regra específica prevalece nesse caso sobre a regra geral. Nos termos do art. 685 do CPC, admitido o processamento, a oposição será apensada aos autos e tramitará simultaneamente à ação originária, sendo ambas julgadas pela mesma sentença. Segundo o parágrafo único do art. 685 do CPC, caso a oposição seja proposta após o início da audiência de instrução, o158 1.2. TÍTULOS ABERTOS E TÍTULOS FECHADOS ................................................................ 158 1.3. 7.1.3. ROL EXEMPLIFICATIVO ....................................................................................... 158 1.4. TÍTULOS EXTRAJUDICIAIS ILÍQUIDOS ......................................................................... 159 1.5. TÍTULO EXTRAJUDICIAL ESTRANGEIRO ..................................................................... 159 1.6. POSSIBILIDADE DE MANEJO DA AÇÃO DE CONHECIMENTO .................................. 159 1.7. CONTRA A FAZENDA PÚBLICA ..................................................................................... 159 2. TÍTULOS EM ESPÉCIE ........................................................................................................... 160 2.1. TÍTULOS DE CRÉDITO .................................................................................................... 161 2.1.1. Previsão legal ............................................................................................................. 161 2.1.2. Letra de câmbio ......................................................................................................... 161 2.1.3. Nota promissória ........................................................................................................ 161 2.1.4. Duplicata .................................................................................................................... 162 2.1.5. Debênture................................................................................................................... 162 2.1.6. Cheque ....................................................................................................................... 162 2.2. ESCRITURA PÚBLICA OU DOCUMENTO PÚBLICO ASSINADO PELO DEVEDOR .. 163 2.3. DOCUMENTO PARTICULAR ASSINADO POR DUAS TESTEMUNHAS ...................... 163 2.3.1. Eficácia executiva do contrato de abertura de crédito em conta corrente ............... 163 2.4. INSTRUMENTO DE TRANSAÇÃO REFERENDADO ..................................................... 164 2.5. CONTRATOS GARANTIDOS POR GARANTIA REAL OU PESSOAL ........................... 164 2.6. CONTRATO DE SEGURO DE VIDA EM CASO DE MORTE ......................................... 167 2.7. CRÉDITO DECORRENTE DE FORO E LAUDÊMIO ...................................................... 167 2.8. CRÉDITO DECORRENTE DE ALUGUEL DE IMÓVEL E ENCARGOS ......................... 167 2.9. CRÉDITO DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO APROVADO EM CONVENÇÃO OU ASSEMBLEIA ............................................................................................................................... 167 2.10. CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA ......................................................................................... 168 2.11. CERTIDÃO DE SERVENTIA NOTARIAL ......................................................................... 168 2.12. CRÉDITO DECORRENTE DE SEGURO-GARANTIA ..................................................... 168 3. RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL ................................................................................... 169 3.1. REGRAS GERAIS ............................................................................................................. 169 3.1.1. Responsabilidade é do devedor ................................................................................ 169 3.1.2. Responsabilidade é patrimonial................................................................................. 170 3.2. TODOS OS BENS DO DEVEDOR RESPONDEM À EXECUÇÃO? ............................... 170 3.3. BENS DE TERCEIROS PODEM RESPONDER À EXECUÇÃO? ................................... 171 4. REGIME JURÍDICO.................................................................................................................. 174 5. PROCEDIMENTO EXECUTIVO POR QUANTIA .................................................................... 175 5.1. PETIÇÃO INICIAL ............................................................................................................. 175 5.1.1. Requisitos................................................................................................................... 175 5.1.2. Causa de pedir ........................................................................................................... 175 5.1.3. Valor da causa ........................................................................................................... 176 5.2. ADMISSIBILIDADE ........................................................................................................... 176 5.3. CITAÇÃO ........................................................................................................................... 177 5.4. REAÇÕES DO EXECUTADO ........................................................................................... 178 5.4.1. Pagamento ................................................................................................................. 178 CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 6 5.4.2. Parcelamento ............................................................................................................. 178 5.4.3. Inércia ......................................................................................................................... 178 5.4.4. Defesas ...................................................................................................................... 179 5.5. PENHORA, DEPÓSITO E AVALIAÇÃO ........................................................................... 180 5.5.1. Bens não encontrados: .............................................................................................. 180 5.5.2. Bens encontrados ...................................................................................................... 180 5.6. FORMALIZAÇÃO E AVERBAÇÃO DA PENHORA.......................................................... 181 5.7. INTIMAÇÃO DA PENHORA ............................................................................................. 182 5.8. ATOS DE EXPROPRIAÇÃO............................................................................................. 182 5.9. SATISFAÇÃO DO CRÉDITO E CONCURSO .................................................................. 182 5.10. EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO............................................................................................. 183 CUMPRIMENTO DE SENTENÇA ................................................................................................... 184 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS ................................................................................................... 184 2. TIPOS DE SENTENÇA E EXEQUIBILIDADE ......................................................................... 184 2.1. DECLARATÓRIA .............................................................................................................. 184 2.2. CONSTITUTIVA/DESCONSTITUTIVA/CONSTITUTIVA NEGATIVA ............................. 184 2.3. CONDENATÓRIA ............................................................................................................. 184 3. REGIME JURÍDICO.................................................................................................................. 185 3.1. OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER ........................................................................ 185 3.2. OBRIGAÇÃO DE DAR/ENTREGAR................................................................................. 186 3.3. OBRIGAÇÃO DE PAGAR QUANTIA................................................................................ 186 4. EXECUÇÃO E AUTONOMIA ................................................................................................... 189 4.1. SENTENÇA PARAESTATAL/PARAJUDICIAL ................................................................ 189 4.2. SENTENÇA QUE RECONHECE OBRIGAÇÃO ALIMENTAR ........................................juiz suspenderá o curso do processo ao fim da produção das provas, salvo se concluir que a unidade da instrução atende melhor ao princípio da duração razoável do processo. Julgando-se a oposição e a ação originária numa mesma sentença, o juiz resolverá antes a oposição (art. 686 do CPC), em razão de evidente prejudicialidade em relação à ação originária: julgada procedente a oposição, a ação principal perde o objeto, porque, sendo o direito ou coisa do opoente, não tem sentido discutir se tal direito ou coisa é do autor ou do réu da ação originária. Por outro lado, sendo julgada improcedente a oposição, o juiz passa à análise da ação principal para decidir se a coisa ou direito é do autor ou do réu da ação originária. Sobre o tema, é importante destacar que o STJ possui julgado no sentido de que a oposição para substituir parte na demanda principal não é cabível, mas pode ser aproveitada por conexão, in verbis: [...]. 1. Controvérsia de fundo pertinente à titularidade do direito a indenização do seguro habitacional por vícios construtivos, na hipótese em que o imóvel foi cedido a terceiro, tendo havido ação indenizatória ajuizada pelo cedente, e oposição ajuizada pela cessionária. 2. Nos termos do art. 682 do CPC/2015, "quem pretender, no todo ou em parte, a coisa ou o direito sobre que controvertem autor e réu poderá, até ser proferida a sentença, oferecer oposição contra ambos". 3. Descabimento do procedimento da oposição na hipótese em que a opoente deduz pretensão não prejudicial à demanda principal, pretendendo, em verdade, suceder o opoente no polo ativo desta demanda. Doutrina e julgado desta Corte Superior. 4. Caso concreto em que a oposição não seria cabível, pois não se verifica a mencionada relação de prejudicialidade, tendo havido apenas sucessão no polo ativo da lide principal. 5. Possibilidade de aproveitamento da oposição como ação conexa à principal, aplicando-se ao caso o princípio da instrumentalidade das formas. Doutrina sobre o tema. [...]. (STJ - REsp: 1889164 SC 2018/0131291-2, Data de Julgamento: 21/06/2022, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/06/2022). Por fim, considerando que a oposição e o processo que tenha como objeto a mesma coisa ou direito pretendido pelo opoente serão necessariamente julgadas pela mesma sentença, não resta dúvida de que o recurso cabível será a apelação. 9.3. DEMANDA BIFRONTE Em caso de a ação de oposição transitar em julgado antes da ação principal, Daniel Assumpção defende que podem ocorrer 2 hipóteses: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 109 1) A improcedência não afetar ação principal; 2) A procedência gerar a perda superveniente de objeto da ação principal. Por outro lado, em caso de a ação principal transitar em julgado antes da oposição, o derrotado na ação principal será excluído da oposição, que continuará somente contra o outro oposto. 10. HABILITAÇÃO 10.1. CABIMENTO O objetivo da ação de habilitação é regularizar a sucessão processual quando ocorre a morte de qualquer das partes. Apesar da omissão legal, pode-se inferir que o processo de habilitação possui limitação às partes na demanda, e não às partes no processo, de forma que, ocorrendo o falecimento do assistente, do amicus curiae, ou do membro do Ministério Público que atue no processo, não será cabível o processo de habilitação. Desse modo, a sucessão processual decorrente de ato inter vivos não demanda um processo de habilitação, de acordo com o art. 109 do CPC: Art. 109. A alienação da coisa ou do direito litigioso por ato entre vivos, a título particular, não altera a legitimidade das partes. Outrossim, frisa-se que não cabe sucessão processual em caso de morte da parte titular de direito material intransmissível (que se extingue com o falecimento do titular). Ex.: em uma ação de divórcio, se um dos cônjuges falecer, o processo será extinto, pois não há motivos para que eventual filho se habilite no processo. Nesse caso, trata-se de hipótese de extinção terminativa do processo sem resolução do mérito, segundo o art. 485, IX, do CPC: Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: IX - em caso de morte da parte, a ação for considerada intransmissível por disposição legal. Infere-se, por conseguinte, que a ação de habilitação possui natureza contenciosa, considerando-se que a pretensão dos autores dessa demanda de alterar a relação jurídica processual é potencialmente conflituosa. A sentença tem natureza constitutiva porque cria uma nova situação jurídica decorrente da alteração da relação jurídica processual. Destaca-se, por fim, que a habilitação será processada nos autos do processo principal, em conformidade com o art. 689 do CPC. 10.2. PROCEDIMENTO CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 110 A habilitação pode ser requerida pela parte, em relação aos sucessores do falecido; e pelos sucessores do falecido, em relação à parte, consoante o art. 688 do CPC: Art. 688. A habilitação pode ser requerida: I - pela parte, em relação aos sucessores do falecido; II - pelos sucessores do falecido, em relação à parte. Trata-se, portanto, de procedimento especial de natureza dúplice, uma vez que quaisquer dos sujeitos descritos no dispositivo legal podem ser tanto autores como réus da demanda. Além disso, é importante salientar que não cabe instauração do processo de habilitação de ofício pelo juiz e, diante da inércia dos legitimados, deve-se extinguir sem resolução de mérito o processo que exige a sucessão processual, conforme posicionamento de Marcato e Câmara. Obs.: por outro lado, é cabível a notícia do óbito de ofício pelo juízo no processo, caso tenha conhecimento do falecimento da parte. A competência para o julgamento do processo de habilitação é do juízo do processo em que ocorrerá a sucessão processual, tratando-se de competência absoluta, de natureza funcional. Em continuidade, evidencia-se que a propositura da habilitação é causa de suspensão do processo, nos termos do art. 689 do CPC, que só retomará seu andamento após o trânsito em julgado da sentença que julga a habilitação (art. 692 do CPC). Conforme previsão do art. 690 do CPC, recebida a petição inicial, o juiz ordenará a citação dos réus para contestar a ação no prazo de 5 dias, sendo limitada a matéria de defesa do réu às questões processuais e à ausência de qualidade de sucessor do autor. A citação só será pessoal se não houver advogado constituído no processo principal. Não é cabível reconvenção diante da evidente natureza dúplice da ação. Não sendo o pedido do autor impugnado, o juiz sentenciará imediatamente a habilitação. Havendo impugnação e sendo a prova necessária ao julgamento exclusivamente documental, o julgamento também será imediato e nos próprios autos do processo principal. No entanto, sendo necessária prova não documental – o que demanda dilação probatória – o pedido será autuado em apenso, conforme disposto no art. 691 do CPC: Art. 691. O juiz decidirá o pedido de habilitação imediatamente, salvo se este for impugnado e houver necessidade de dilação probatória diversa da documental, caso em que determinará que o pedido seja autuado em apartado e disporá sobre a instrução. Na prática, o juiz determinará o desentranhamento da petição inicial e da impugnação, formando autos que serão autuados em apartado, nos quais será determinada a produção da prova não documental. Outrossim, o CPC não prevê o procedimento a partir do momento de resposta dos requeridos, dando a entender pela aplicação do procedimento comum, inclusive com cabimento de apelação contra a sentença a ser proferida. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 111 Obs.: nos Tribunais Superiores o procedimento da ação de habilitação é regulamentado pelos arts. 288 a 296 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e pelos arts. 283 a 287 do Regimento Interno do SuperiorTribunal de Justiça. Por fim, nos termos do art. 692 do CPC, a suspensão do processo dura até o trânsito em julgado da sentença de habilitação, quando ela será juntada aos autos respectivos. 11. DAS AÇÕES DE FAMÍLIA 11.1. CABIMENTO O CPC criou um capítulo para regulamentar o procedimento das chamadas “ações de família”, mais precisamente as ações que seguem o procedimento comum e, por previsão legal, têm dentro do procedimento comum a adoção de determinadas técnicas diferenciadas. São elas: 1) Divórcio; 2) Separação; 3) Reconhecimento e extinção de união estável; 4) Guarda; 5) Visitação; 6) Filiação. Ressalta-se que há aplicação subsidiária na ação de alimentos e na que versar sobre interesse de criança ou adolescente, que continuarão a observar o procedimento previsto em legislação específica – Lei 5.478/1968 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) – aplicando- se, no que couber, as disposições do capítulo “das ações de família”. 11.2. ASPECTOS PROCEDIMENTAIS 11.2.1. Incentivo às formas consensuais do conflito O CPC prestigia de forma significativa os meios de solução consensual dos conflitos, sendo nesse sentido o art. 694, caput, ao prever que nas ações de família todos os esforços serão empreendidos para a solução consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxílio de profissionais de outras áreas de conhecimento para a mediação e conciliação. A intenção do legislador é, portanto, a valorização da solução consensual do conflito. Nesse sentido, o parágrafo único do art. 694 do CPC prevê que, a requerimento das partes, o juiz pode determinar a suspensão do processo enquanto os litigantes se submetem a mediação extrajudicial ou atendimento multidisciplinar. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 112 Obs.: o CPC não prevê um prazo para a suspensão do processo, podendo tal suspensão perdurar por prazo indeterminado, ou seja, pelo tempo que for necessário às partes chegarem a uma solução consensual do conflito. 11.2.2. Audiência de mediação e conciliação A primeira importante especialidade procedimental das ações de família está prevista nos parágrafos do art. 695 do CPC, já que em seu caput há regra geral de citação do réu para comparecer à audiência de mediação e conciliação após o recebimento da petição inicial e a tomada de providências referentes à tutela provisória, se for o caso. No procedimento comum, a audiência de conciliação e mediação pode não ocorrer quando ambas as partes se opuserem à sua realização. Nas ações de família, entretanto, o silêncio do art. 695 do CPC, segundo Daniel Assumpção, permite a conclusão de que nessas ações a audiência é obrigatória, independentemente da vontade das partes. Em continuidade, o réu será citado mas não receberá cópia da petição inicial, sendo assegurado ao réu, entretanto, o direito de examinar seu conteúdo a qualquer tempo (art. 695, § 14). A partes devem estar acompanhadas de seus advogados ou defensores públicos na audiência (art. 695, § 4º). Assim, conforme defende Daniel Assumpção, se o advogado não comparecer à audiência, será designado um defensor para assistir a parte. Ao permitir que a audiência de mediação e conciliação seja dividida em tantas sessões quantas necessárias para viabilizar a solução consensual, sem prejuízo de providências jurisdicionais para evitar o perecimento do direito, o art. 696 do CPC reforça mais uma vez a valoração às formas consensuais de resolução de conflito, permitindo que ela seja buscada em mais de uma sessão de audiência. Obs.: não se aplica o limite temporal de 2 meses previsto no art. 334, § 2º, do CPC. Segundo o art. 697 do CPC, não realizado o acordo, passarão a incidir, a partir de então, as normas do procedimento comum, observado o art. 335. Resta evidente, portanto, que a especialidade procedimental se limita ao início do procedimento, mais precisamente a forma e as técnicas para a tentativa de obtenção da solução consensual do conflito em audiência. 11.2.3. Ministério Público A intervenção do Ministério Público nas ações de família, conforme previsão do art. 698 do CPC, limita a sua participação como fiscal da ordem jurídica a 3 situações distintas: Art. 698. Nas ações de família, o Ministério Público somente intervirá quando houver interesse de incapaz e deverá ser ouvido previamente à homologação de acordo. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 113 Parágrafo único. O Ministério Público intervirá, quando não for parte, nas ações de família em que figure como parte vítima de violência doméstica e familiar, nos termos da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha). Como o tema foi cobrado em concurso? (MPE-PE - Promotor - FCC - 2022): O Ministério Público sempre intervirá quando houver interesse de incapaz, sendo ele parte ou não no processo. Correto. (MPE-PE - Promotor - FCC - 2022): O Ministério Público, a despeito de não figurar incapaz em um dos polos da ação, intervirá se houver como parte vítima de violência doméstica e familiar. Correto. 11.2.4. Depoimento pessoal do incapaz O art. 699 do CPC prevê que, quando o processo envolver discussão sobre fato relacionado a abuso ou a alienação parental, o juiz, ao tomar o depoimento do incapaz, deverá estar acompanhado por especialista. A Recomendação 33/2010 do CNJ aconselha a realização de depoimento pessoal especial, que deverá ser realizado em ambiente separado da sala de audiências, com a participação de profissional especializado, devendo estar os participantes do ato capacitados para o emprego de técnica do depoimento pessoal, usando os princípios básicos da entrevista cognitiva, também chamada de depoimento sem danos. O objetivo é construir um ambiente acolhedor, de forma que o incapaz se sinta à vontade para narrar fatos relevantes de sua vida, ainda que somente indiretamente relacionados ao objeto da demanda. 12. AÇÃO MONITÓRIA 12.1. CONCEITO De acordo com Daniel Assumpção, a característica principal do procedimento monitório é a oportunidade concedida ao credor de, munido de uma prova literal representativa de seu crédito, abreviar o iter processual para a obtenção de um título executivo. Assim, aquele que possui uma prova documental de um crédito, sem eficácia executiva, pode ingressar com a demanda monitória e, se verificada a ausência de manifestação defensiva por parte do réu – embargos monitórios – obterá seu título executivo em menor tempo do que o exigido pelo processo de conhecimento. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 114 Trata-se, portanto, de uma espécie de tutela diferenciada, que por meio da adoção de técnica de cognição sumária (para a concessão do mandado monitório) e do contraditório diferido (permitindo a prolação de decisão antes da oitiva do réu), busca facilitar em termos procedimentais a obtenção de um título executivo quando o credor tiver prova suficiente para convencer o juiz, em cognição não exauriente, da provável existência de seu direito. Salienta-se que no Brasil foi adotada a ação monitória documental, cuja mera alegação exige ação de conhecimento, e não a ação monitória pura, adotada na Alemanha, em que a simples afirmação de ser credor já é suficiente para o juízo expedir o mandado monitório. É importante ressaltar, por fim, que a propositura de ação monitoria pelo credor é uma mera faculdade, porque ele pode livremente optar por cobrar sua dívida por meio de ação de conhecimento pelo rito comum. Todavia, optando pela ação monitoria, passa a ser aplicável a regra de que o procedimento especial tem aplicação cogente, de forma que o procedimento previsto nos arts. 700 a 702 do CPC será obrigatoriamente aplicado ao caso concreto. 12.2. ADMISSIBILIDADE Qualquer espécie de obrigação inadimplida pode ser objeto de ação monitória, consoante o art. 700, incisos I a III do CPC: Art. 700. A ação monitóriapode ser proposta por aquele que afirmar, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, ter direito de exigir do devedor capaz: I - o pagamento de quantia em dinheiro; II - a entrega de coisa fungível ou infungível ou de bem móvel ou imóvel; III - o adimplemento de obrigação de fazer ou de não fazer. § 1º A prova escrita pode consistir em prova oral documentada, produzida antecipadamente nos termos do art. 381. Como o tema foi cobrado em concurso? (DPE-RS - Defensor - CESPE - 2022): A vedação de decisões surpresas encontra exceções nos casos de exame de tutela provisória de urgência, em hipóteses de apreciação de tutela de evidência, bem como na análise, em sede de ação monitória, do pedido de expedição de mandado de pagamento, de entrega de coisa ou para a execução de obrigação de fazer ou não fazer. Correto. Conforme apontado no caput do dispositivo normativo acima, há necessidade de existência de uma prova escrita literal (pré-constituída, documental ou documentada) sem eficácia de título executivo. Obs.: é importante destacar que há possibilidade de se optar pela ação monitória mesmo havendo título executivo extrajudicial como prova literal do crédito, em conformidade com o disposto no art. 785 do CPC: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 115 Art. 785. A existência de título executivo extrajudicial não impede a parte de optar pelo processo de conhecimento, a fim de obter título executivo judicial. Ademais, imperioso evidenciar que a prova escrita do mencionado art. 700 NÃO é um “título monitório”, já que cabe sua valoração pelo juiz em cognição sumária para somente depois expedir o mandado monitório. Nesse sentido, de acordo com posicionamento do STJ, não existe um modelo predefinido de prova escrita, bastando que seja hábil a convencer o juiz da pertinência da dívida: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO MONITÓRIA. EMBARGOS MONITÓRIOS. PROVA ESCRITA SEM EFICÁCIA DE TÍTULO EXECUTIVO. DOCUMENTOS NÃO APTOS PARA A DEMONSTRAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE DÍVIDA. 1. A teor do disposto no artigo 1.102-A do Código de Processo Civil, a prova escrita apta a respaldar a demanda monitória deve apresentar elementos indiciários da materialização de uma dívida decorrente de uma obrigação de pagar ou de entregar coisa fungível ou bem móvel. 2. No caso dos autos, os bilhetes que instruíram a inicial não são aptos a demonstrar a presença da relação jurídica entre credor e devedor, o que afasta a existência da própria dívida, de modo que não se ajustam ao conceito de "prova escrita sem eficácia de título executivo" de que trata a legislação de regência. 3. Recurso especial provido. (STJ - REsp: 866205 RN 2006/0125982-3, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 25/03/2014, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/05/2014 RSTJ vol. 234 p. 289). Desse modo, no procedimento monitório caberá ao juiz a análise da prova juntada pelo autor, verificando-se inclusive, ainda que de forma sumária, a existência do direito alegado na petição inicial e corroborado com a prova que a instrui. No processo de execução, a simples presença do título executivo dispensa qualquer espécie de pesquisa do juiz a respeito da efetiva existência do direito exequendo. Essa abstração presente no título executivo NÃO existe na prova literal que legitima a tutela monitória. Além disso, existem os “ex-títulos executivos” que podem ser utilizados como prova para o ajuizamento da ação monitória, a exemplo do cheque prescrito (Súmula 299 do STJ); do contrato de abertura de crédito em conta-corrente acompanhado do demonstrativo do débito (Súmula 247 do STJ) e da nota fiscal acompanhada de prova de recebimento da mercadoria ou da prestação: Súmula 299 do STJ: É admissível a ação monitória fundada em cheque prescrito. Súmula 247 do STJ: O contrato de abertura de crédito em conta-corrente, acompanhado do demonstrativo de débito, constitui documento hábil para o ajuizamento da ação monitória. [...]. 4. A nota fiscal, acompanhada da prova do recebimento da mercadoria ou prestação do serviço, pode servir como lastro à ação monitória. Precedentes. 5. Somente se submetem ao controle do STJ os honorários advocatícios fixados por equidade quando irrisórios ou exorbitantes. 6. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ - AgRg no AREsp: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 116 432078 RS 2013/0379385-3, Relator: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 20/02/2014, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/03/2014). Segundo posicionamento de Nery e Talamini, algumas provas documentais não escritas – como gravações, filmagens, fotografias – apesar de não satisfazerem a exigência legal do art. 700 do CPC, ainda se mostram capazes de convencer sumariamente o juiz acerca da probabilidade de o direito de crédito alegado efetivamente existir. Como o tema foi cobrado em concurso? (TJ-MS - Juiz - FCC - 2020): A ação monitória será proposta por aquele que afirmar, com base em prova oral ou escrita sem exequibilidade, ter direito de exigir do devedor capaz o pagamento de valor em dinheiro ou a entrega de coisa fungível ou infungível, ou de bem móvel ou imóvel. Errado, pois a prova oral deve estar documentada, d Para Daniel Assumpção, qualquer espécie de prova, desde que esteja documentada, pode servir para a instrução da petição inicial, como ocorre com a prova testemunhal ou pericial produzida em outro processo e que pode servir como prova emprestada na demanda monitória a fim de se comprovar o direito de crédito do autor. Além da exigência de uma prova documentada por escrito, é posicionamento defendido por Dinamarco, Nery e Daniel Assumpção que a prova que instruirá a ação monitória não pode ser produzida unilateralmente pelo autor, exigindo-se alguma participação do réu na sua formação. Para o STJ, no entanto, é possível que seja produzida unilateralmente, sendo admitido, inclusive, e-mail como prova documental, desde que convença sumariamente o juiz das alegações do autor. Assim segue: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO MONITÓRIA. A DOCUMENTAÇÃONECESSÁRIA PARA A ADMISSIBILIDADE TEM QUE SER IDÔNEA. APTA ÀFORMAÇÃO DO JUÍZO DE PROBABILIDADE ACERCA DO DIREITO AFIRMADO, APARTIR DO PRUDENTE EXAME DO MAGISTRADO. 1. A prova hábil a instruir a ação monitória, a que alude o artigo 1.102-A do Código de Processo Civil não precisa, necessariamente, ter sido emitida pelo devedor ou nela constar sua assinatura ou de um representante. Basta que tenha forma escrita e seja suficiente para, efetivamente, influir na convicção do magistrado acerca do direito alegado. 2. Dessarte, para a admissibilidade da ação monitória, não é necessário que o autor instrua a ação com prova robusta, estreme de dúvida, podendo ser aparelhada por documento idôneo, ainda que emitido pelo próprio credor, contanto que, por meio do prudente exame do magistrado, exsurja o juízo de probabilidade acerca do direito afirmado pelo autor. 3. A Corte local, após minucioso exame da documentação que instrui a ação, apurou que os documentos são "mais que suficientes para atender aos requisitos da legislação processual para cobrança via ação monitória, pois servem como início de prova escrita" e que, "em cotejo com as duplicatas apresentadas, demonstram a liquidez e certeza da obrigação, independentemente do aceite", sendo correta "a conclusão do Juízo de 1º grau de que serviços foram prestados", só se concebe a revisão da CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 117 decisão recorrida por meio do reexame de provas, vedado em sede de recurso especial (Súmula 7/STJ). 4. Recurso especial não provido. (STJ - REsp: 925584 SE 2007/0015368-5, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 09/10/2012, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/11/2012). Como o tema foi cobrado em concurso?(DPE-PR - Defensor - Instituto AOCP - 2022): Conforme jurisprudência amplamente majoritária do Superior Tribunal de Justiça, a simples cópia do título executivo não é documento hábil a ensejar a propositura de ação monitória. Errado. Em continuidade, também se exige que a prova literal indique o valor líquido, eis que a iliquidez gerará o processamento pelo procedimento comum. Por fim, também é importante salientar que pela interpretação do caput do art. 700 do CPC, pode-se constatar que não cabe ação monitória contra devedor incapaz. 12.3. FAZENDA PÚBLICA A Fazenda Pública é legitimada para a propositura de ação monitória, ainda que em algumas hipóteses seja discutível o interesse por esta demanda considerando-se a possibilidade de a Fazenda Pública criar seus próprios títulos executivos (certidão da dívida ativa). Obs.: nem todo crédito em favor da Fazenda Pública dará ensejo à inscrição em dívida ativa, limitando-se tal circunstância aos créditos pecuniários de natureza fiscal. Dessa forma, haverá interesse da Fazenda Pública no oferecimento da monitória para a entrega de coisa móvel e os créditos pecuniários não fiscais. É tema controvertido em sede doutrinária a presença da Fazenda Pública no polo passivo da ação monitória. Apesar da divergência doutrinária, o § 6º do art. 700 do CPC estabelece que: Art. 700, § 6º É admissível ação monitória em face da Fazenda Pública. Como o tema foi cobrado em concurso? (TJ-DFT - Juiz - CESPE - 2023): Não é cabível ação monitória contra a fazenda pública, em virtude da simplicidade do seu procedimento. Errado. A principal discussão, todavia, se encontra na possibilidade de a Fazenda Pública – ocupando o polo passivo da demanda monitória – se manter omissa. Geralmente, quando o juiz expede o mandado monitório, é porque ele se convenceu sumariamente do direito de crédito do autor e da condição de devedor do réu. Nesse caso, se o réu for omisso, o mandado monitório, de pleno direito, constituirá um título executivo judicial. Por outro lado, não sendo inerte, o réu se defenderá com apresentação de embargos monitórios. Assim, segundo o art. 701, § 4º do CPC: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 118 Art. 701, § 4º Sendo a ré Fazenda Pública, não apresentados os embargos previstos no art. 702, aplicar-se-á o disposto no art. 496, observando-se, a seguir, no que couber, o Título II do Livro I da Parte Especial. Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença: I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público; II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal. Isto posto, sendo omissa a Fazenda Pública e por essa razão se constituindo o mandado monitório de pleno direito em título executivo judicial, será cabível o reexame necessário dessa decisão. 12.4. PROPOSITURA Assim como nos demais procedimentos especiais, a petição inicial deve seguir os arts. 319 e 320 do CPC. No entanto, além dos requisitos formais exigidos, o art. 700, § 2º, do CPC dispõe que também é dever do autor indicar: Art. 700, § 2º Na petição inicial, incumbe ao autor explicitar, conforme o caso: I - a importância devida, instruindo-a com memória de cálculo; II - o valor atual da coisa reclamada; III - o conteúdo patrimonial em discussão ou o proveito econômico perseguido. Ademais, segundo o § 3º do art. 700, o valor da causa deverá corresponder à importância prevista no § 2º, incisos I a III. No que se refere à causa de pedir, Fidelis dos Santos argumenta que diferente do que ocorre na ação de execução, não basta ao autor da monitória fazer uma simples remissão à prova literal que instrui a petição inicial, sendo exigido que descreva os fatos referentes ao surgimento da dívida e o fundamento jurídico. O STJ, entretanto, defende ser dispensável a alegação fática que fundamenta o direito alegado pelo autor com base no contraditório diferido, consoante os julgados abaixo colacionados: Súmula 531 do STJ: Em ação monitória fundada em cheque prescrito ajuizada contra o emitente, é dispensável a menção ao negócio jurídico subjacente à emissão da cártula. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. AÇÃO MONITÓRIA APARELHADA EM CHEQUE PRESCRITO. DISPENSA DA MENÇÃO À ORIGEM DA DÍVIDA. 1. Para fins do art. 543-C do CPC: Em ação monitória fundada em cheque prescrito, ajuizada em face do emitente, é dispensável menção ao negócio jurídico subjacente à emissão da cártula. 2. No caso concreto, recurso especial parcialmente provido. (STJ - REsp: 1094571 SP 2008/0215442-5, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 04/02/2013, CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 119 S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 14/02/2013 RSSTJ vol. 44 p. 475). Por conseguinte, é imperioso ressaltar que a petição inicial pode apresentar vícios procedimentais sanáveis, sendo nesse caso hipótese de emenda da petição inicial, nos termos do art. 321 do CPC. Além das hipóteses gerais que levariam a petição inicial de qualquer demanda a ser emendada, há previsão especificamente destinada à ação monitória no § 5º do art. 700 do CPC. Segundo o dispositivo, havendo dúvida quanto à idoneidade de prova documental apresentada pelo autor, o juiz intimá-lo-á para, querendo, emendar a petição inicial, adaptando-a ao procedimento comum. O juiz poderá indeferir a petição inicial, nos termos do art. 330 do CPC, ou quando não atender às exigências dos incisos do § 2º do art. 700 do CPC. O indeferimento se dá por meio de sentença recorrível por apelação. Não obstante, o art. 701, caput, do CPC prevê que, sendo evidente o direito do autor, caberá ao juiz o deferimento de plano de expedição do mandado monitório. Segundo Daniel Assumpção, na concessão do mandado monitório verifica-se uma cognição sumária acerca do direito material alegado, mas exauriente no tocante ao direito à tutela monitoria, consubstanciada na adequação da prova trazida na inicial à pretensão monitoria de obter a satisfação da obrigação e subsidiariamente a formação de título executivo. 12.5. CITAÇÃO Expedido o mandado monitório, o réu será citado para integrar o processo e tomar conhecimento da existência e teor da demanda contra ele proposta, bem como intimado para a interposição de embargos ao mandado monitório no prazo de 15 dias. Todas as formas de citação são admitidas, nos termos do art. 700, § 7º, do CPC, inclusive as formas de citação ficta (hora certa e edital). 12.6. REAÇÕES DO RÉU Após a citação, o réu poderá adotar no prazo de 15 dias o réu uma das 4 posturas abaixo: 1) Satisfazer a obrigação; 2) Não reagir; 3) Ingressar com embargos ao mandado monitório; 4) Aderir ao pagamento parcelado, com base nos seguintes termos: Art. 701, § 5º Aplica-se à ação monitória, no que couber, o art. 916. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 120 Art. 916. No prazo para embargos, reconhecendo o crédito do exequente e comprovando o depósito de trinta por cento do valor em execução, acrescido de custas e de honorários de advogado, o executado poderá requerer que lhe seja permitido pagar o restante em até 6 (seis) parcelas mensais, acrescidas de correção monetária e de juros de um por cento ao mês. Sendo cumprido o mandado no prazo legal, há 2 consequências: 1) O réu ficará isento do pagamento das custas processuais (art. 701, § 1º, do CPC). Trata-se de medida de execução indireta, indutiva, que exerce uma pressão psicológica para que o réu cumpra a sua obrigação de pagar a quantia cobrada ou entregar a coisa demandada. 2) O réu pagará 5% do valor da causa a título de honorários advocatícios (art. 701, caput, do CPC). Constata-se, portanto, que a previsãolegal dá um desconto de 50% do percentual mínimo legal de 10%. Como o tema foi cobrado em concurso? (TJ-SP - Juiz - VUNESP - 2023): Sendo evidente o direito do autor, o juiz deferirá a expedição de mandado de pagamento, de entrega de coisa ou para execução de obrigação de fazer ou não fazer, com prazo de 15 (quinze) dias para o cumprimento. Cumprindo o réu o mandado, ficará isento de custas e honorários advocatícios. Errado, eis que o pagamento de honorários advocatícios de 5% do valor atribuído à causa. Por fim, a omissão do réu em apresentar tempestivamente os embargos ao mandado monitório faz com que este se converta de pleno direito em título executivo judicial, segundo previsão do art. 701, § 2º, do CPC. A previsão legal determina que, independentemente de qualquer manifestação judicial que declare a formação do título executivo judicial, transcorrido o prazo de defesa do réu sem a interposição dos embargos ao mandado monitório, estará formado o título executivo judicial. 12.7. NATUREZA JURÍDICA DOS EMBARGOS AO MANDADO MONITÓRIO Para Daniel Assumpção, Dinamarco e Humberto Theodoro Junior, os embargos monitórios têm natureza de ação. Já para a parte minoritária da doutrina, eles têm natureza de contestação. Assim, insta evidenciar que aqueles que adotam o entendimento de que os embargos ao mandado monitório possuem natureza de contestação utilizam como fundamento a Súmula 292 do STJ, que prevê o seguinte: Súmula 292 do STJ: A reconvenção é cabível na ação monitória, após a conversão do procedimento em ordinário. Também encontram amparo no art. 702, § 6º do CPC, cuja redação dispõe que na ação monitória admite-se a reconvenção, sendo vedado o oferecimento de reconvenção à reconvenção. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 121 De acordo com Daniel Assumpção, é natural que para os defensores da referida tese o réu da ação monitória, ao embargar e transformar o procedimento em comum, poderá se valer da reconvenção, bem como de outras formas de resposta, tais como denunciação da lide e chamamento ao processo. Por outro lado, a parcela da doutrina que defende a natureza de ação dos embargos aponta para a impossibilidade de reconvenção, considerando-se que o réu da demanda monitória é o autor dos embargos, e autor não pode ingressar com reconvenção. Como o tema foi cobrado em concurso? (TJ-MS - Juiz - FGV - 2023): Ajuizada uma ação monitória objetivando o adimplemento de uma obrigação de fazer estabelecida em contrato firmado entre as partes, o réu se defendeu alegando exceção de contrato não cumprido e ofereceu reconvenção visando à condenação do autor ao pagamento da multa contratual. Diante dessa situação hipotética, é correto afirmar que a reconvenção deve ser julgada extinta, pois a ação monitória não admite o oferecimento de reconvenção. Errado, em razão do disposto no art. 702, § 6º do CPC. Ocorre que o STJ, seguindo o posicionamento doutrinário minoritário, possui julgados no sentido de que os embargos monitórios têm natureza de contestação, in verbis: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO MONITÓRIA. EMBARGOS MONITÓRIOS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. INEXISTÊNCIA. [...]. 5. Os embargos apresentados na ação monitória, pelo réu, não possuem natureza de ação - como ocorre em relação aos embargos do devedor na execução -, mas sim natureza de contestação, que admite ampla defesa do réu, sem restrições quanto à matéria. [...]. 9. Recurso especial conhecido e parcialmente provido." (REsp 1.713.099/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 9/4/2019, DJe 12/4/2019). 12.8. PROCEDIMENTO DOS EMBARGOS Tratando-se de ação incidental, os embargos ao mandado monitório exigem o oferecimento de uma petição inicial, nos termos dos arts. 319 e 320 do CPC, seguindo-se o procedimento comum, sendo, ainda, admissível a alegação de qualquer matéria de defesa (art. 702, § 1º do CPC). Os §§ 2º e 3º do art. 702 do CPC tratam da alegação de defesa de excesso na cobrança: o primeiro dispõe que, quando o réu alegar que o autor pleiteia quantia superior à devida, cumprir- lhe-á declarar de imediato o valor que entende correto, apresentando demonstrativo discriminado e atualizado da dívida, enquanto o segundo prevê que, não apontado o valor correto ou não apresentado o demonstrativo, os embargos serão liminarmente rejeitados, se esse for o seu único fundamento e, se houver outro fundamento, os embargos serão processados, mas o juiz deixará de examinar a alegação de excesso. Conforme expressa previsão do art. 702, caput, do CPC, os embargos independem de prévia segurança do juízo para que possam ser opostos. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 122 A interposição dos embargos ao mandado monitório suspende a eficácia do mandado inicial, nos termos do art. 702, § 4º do CPC e, havendo a interposição de embargos parciais, a parcela do mandado não impugnada converte-se de pleno direito em título executivo, nos termos do art. 702, § 7º do CPC. Além disso, a critério do juiz, os embargos serão autuados em apartado, se parciais, constituindo-se de pleno direito o título executivo judicial em relação à parcela incontroversa (§ 7º do art. 702 do CPC). Como o tema foi cobrado em concurso? (TJ-MS - Juiz - FGV - 2023): A critério do juiz, os embargos serão autuados em apartado, se parciais, constituindo-se de pleno direito o título executivo judicial em relação à parcela incontroversa. Correto. (DPE-SE - Defensor - CESPE - 2022): No embargo monitório em que se impugna parcialmente a pretensão monitória, a parte impugnada poderá ser autuada em apartado, e a parte não impugnada constitui título executivo judicial passível de execução nos próprios autos da ação monitória. Correto. O juiz poderá determinar a emenda da petição inicial na hipótese de vício sanável (art. 321 do CPC) ou ainda a indeferir de plano havendo vícios insanáveis, em decisão recorrível por apelação. Sendo regular a petição inicial, o juiz determinará a intimação do réu na pessoa de seu advogado, que poderá adotar as reações típicas do demandado. Por fim, é importante evidenciar que os embargos ao mandado monitório são decididos por sentença recorrível por apelação. 13. HOMOLOGAÇÃO DO PENHOR LEGAL 13.1. CONCEITO O penhor é instituto de direito material, previsto nos arts. 1431 e seguintes do Código Civil. De acordo com o art. 1434 do CC, o penhor é constituído pela transferência efetiva da posse que, em garantia do débito ao credor ou a quem o represente, faz o devedor, ou alguém por ele, de uma coisa móvel, suscetível de alienação. Nesse sentido, o art. 1467 do CC prevê as hipóteses de penhor legal, afirmando serem credores pignoratícios, independentemente de convenção: 1) Os hospedeiros, ou fornecedores de pousada ou alimento, sobre as bagagens, móveis, joias ou dinheiro que os seus consumidores ou fregueses tiverem consigo nas respectivas casas ou estabelecimentos, pelas despesas ou consumo que aí tiverem feito; 2) O dono do prédio rústico ou urbano, sobre os bens móveis que o rendeiro ou inquilino tiver guarnecendo o mesmo prédio, na hipótese de não pagamento dos aluguéis – bem como os encargos acessórios – ou rendas. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 123 Ressalta-se que somente bens móveis poderão ser objeto de penhor, desde que suscetíveis de alienação. Assim sendo, pode-se afirmar que não cabe penhor legal de bens impenhoráveis. 13.2. HOMOLOGAÇÃO EXTRAJUDICIAL Segundo o § 2º do art. 703 do CPC, o credor poderá, desde que preenchidos os requisitos para a propositura da ação judicial, optar pelo procedimento de homologação de penhor legal extrajudicial, a ser realizado perante o notário de sua escolha. Não há, portanto, regra de competência territorial. Recebido o requerimento, o notário promoverá a notificação extrajudicial (por meio de cartaAR) do devedor para, no prazo de 5 dias, pagar o débito ou impugnar sua cobrança, alegando por escrito uma das causas legais de defesa, hipótese em que o procedimento será encaminhado ao juízo competente para decisão. Obs.: o termo inicial do prazo de 5 dias é a data da assinatura do aviso de recebimento pelo devedor (art. 231, § 3º do CPC). Isto posto, pode-se constatar que se trata de um processo judicial que não se dá por iniciativa do interessado, mas sim do próprio notário, sem a existência de uma petição inicial. Outrossim, o § 3° do art. 703 do CPC trata da hipótese de ausência de defesa do devedor, o que também inclui a possibilidade de defesa intempestiva. Sendo omisso o devedor ou respondendo após o vencimento do prazo de 5 dias, o notário formalizará a homologação do penhor legal por escritura pública. 13.3. AUTOTUTELA Salienta-se, a priori, que a autotutela é a forma de solução de conflito realizada unilateralmente por uma das partes envolvidas no conflito de interesses pelo exercício da força, sendo de aceitação excepcional no sistema jurídico pátrio, conforme definição de Daniel Assumpção. O penhor legal pode funcionar como forma de autotutela por parte dos sujeitos descritos no art. 1467 do CC que, intitulando-se credores, poderão por “mão própria” reter bens móveis do pretenso devedor inadimplente, servindo o procedimento previsto nos arts. 703 a 703 do CPC para a regularização do penhor, nos termos do art. 1471 do CC. Tendo ocorrido a autotutela, o art. 1471 do CC exige do tomador do penhor, em ato contínuo, o pedido de homologação judicial, que é condição de existência e eficácia da proteção conferida pelo penhor legal. 13.4. PROCEDIMENTO Como todo processo, a homologação de penhor legal tem o seu início por meio da petição inicial apresentada pelo autor. No tocante aos documentos indispensáveis à propositura da CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 124 demanda, o art. 703, caput, do CPC prevê a necessidade de juntada do contrato de locação – basta a juntada de cópia – ou da conta pormenorizada das despesas, tabela de preços e a relação dos objetos retidos. Ressalta-se que a juntada de conta pormenorizada das despesas e tabelas de preços somente se aplica aos credores descritos no art. 1467, I, do CC, de forma que o locador e/ou arrendador estão dispensados dessa exigência, de acordo com posicionamento de Humberto Theodoro Junior. O réu será citado para pagar ou alegar defesa na audiência preliminar a ser designada, sendo esse o aspecto procedimental diferenciado que torna a homologação do penhor legal um procedimento especial, segundo entendimento de Daniel Assumpção. Sendo realizado o pagamento, haverá reconhecimento jurídico do pedido, que deve ser homologado pelo juiz. Por outro lado, tendo sido tomada a posse por ato unilateral do credor, os bens deverão ser devolvidos por este, que a partir do pagamento os manterá com posse injusta, podendo até se configurar a figura penal da apropriação indébita. Por conseguinte, destaca-se que há uma limitação das matérias alegáveis em sede de contestação, nos termos do art. 704 do CPC: 1) Nulidade do processo, compreendidas aqui as questões formais do procedimento; 2) Extinção da obrigação, que poderá ter ocorrido por qualquer forma prevista na lei material. Ex.: pagamento, remição, novação. É também admissível a alegação de prescrição; 3) Não estar a dívida compreendida em lei (não é hipótese de cabimento do penhor legal) ou não estarem os bens sujeitos a penhor legal (devem ser bens móveis alienáveis); 4) Alegação de haver sido oferecida caução idônea rejeitada pelo credor. Obs.: são alegáveis também as matérias de ordem pública, que o juiz pode conhecer de ofício, o que permite a defesa processual fundada em pressupostos processuais e/ou condições da ação. Após a contestação, a ação seguirá o procedimento comum, nos termos do art. 705 do CPC. Sendo acolhido o pedido do autor, em sentença de natureza constitutiva, consolidar-se-á a posse do autor sobre o objeto; sendo rejeitado o pedido, em sentença de natureza declaratória, o objeto será entregue ao réu, ressalvado ao autor o direito de cobrar a dívida pelo procedimento comum, salvo se acolhida a alegação de extinção da obrigação prevista no art. 704, II, do CPC. Por fim, salienta-se que existe divergência doutrinária no sentido de ser a sentença de procedência desse processo um título executivo, o que já admitiria o ingresso de cumprimento de sentença para o pagamento da quantia assegurada pelo penhor, conforme corrente defendida por Greco. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 125 No entanto, ainda que exista corrente doutrinária que defenda a possibilidade de execução dessa sentença, Daniel Assumpção segue o entendimento de que essa execução é inviável, cabendo ao autor ingressar com um processo judicial de conhecimento para a cobrança de seu crédito, eis que na homologação de penhor legal não se discute o valor da dívida. 14. REGULAÇÃO DE AVARIA GROSSA 14.1. CABIMENTO Trata-se de ação de procedimento especial mais utilizada no âmbito do Direito Marítimo. Importante visualizar, a priori, que existem 2 tipos de avaria: 1) Avaria grossa ou comum: é toda e qualquer despesa ou dano extraordinário decorrente de um ato intencional ou voluntário, sendo que a despesa visa a segurança do navio e de suas cargas, em uma situação de perigo real e iminente, com o intuito de evitar um mal maior à expedição marítima. Ex.: houve um acidente com o navio de carga e foi necessário se desfazer de metade dos containers que o navio transportava para que ele não afundasse. Nessa avaria as despesas são divididas proporcionalmente entre os proprietários das cargas embarcadas e navio. 2) Avaria simples ou particular: é aquela avaria ocorrida somente no navio ou na carga durante o tempo dos riscos. A avaria simples afeta somente o armador ou o dono da mercadoria avariada, sendo que os danos são suportados por uma só pessoa. 14.2. PROCEDIMENTO 14.2.1. Declaração de abertura de avaria grossa Apesar de o art. 708, caput do CPC prever que cabe ao regulador – expert na área – a declaração justificada de quais danos são passíveis de rateio na forma de avaria grossa, excluindo, portanto, as avarias simples, tradicionalmente no comércio marítimo essa declaração é feita pelo transportador, que em regra é o maior interessado na regulação das avarias grossas. Dessa forma, cabe ao regulador apenas confirmar essa declaração. Na sua ausência, o regulador deverá fazer a declaração. Seja confirmando a declaração apresentada pelo transportador ou a elaborando, o regulador se valerá em sua tarefa dos documentos fornecidos pelo transportador, sendo interessante que nesse momento inicial do procedimento seja dada oportunidade de manifestação às demais partes no processo, interessadas na regulação. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 126 14.2.2. Oferecimento de garantias Após confirmar ou elaborar as declarações, cabe ao regulador exigir das partes envolvidas a apresentação de garantias idôneas para que possam ser liberadas as cargas aos consignatários. Essa exigência de prestação de garantias é obrigatória, prestando-se a aumentar a probabilidade de ressarcimento dos valores sacrificados. A garantia pode ser real ou fidejussória, desde que seja idônea e suficiente. Nos termos do § 2º do art. 708 do CPC, se o consignatário não apresentar garantia idônea a critério do regulador, este fixará o valor da contribuição provisória com base nos fatos narrados e nos documentos que instruírem a petição inicial, que deverá ser caucionada sob a forma de depósito judicial ou de garantia bancária. Significa dizer que a não apresentação de garantia no prazo legal faz com que o consignatório perca o direito de escolher a forma de garantia, que passa a ser exigida nos exatos termos dalei. Caso nenhuma garantia seja prestada ou a prestada não seja aceita, o regulador requererá ao juiz a alienação judicial de sua carga, na forma dos arts. 879 a 903 do CPC. 14.2.3. Impugnação à declaração de abertura de avaria grossa Sendo apresentada a declaração pelo regulador, as partes serão intimadas no prazo a ser fixado pelo juiz, e na ausência de indicação no prazo geral de 5 dias, tendo assim o direito de se manifestar sobre ela. Caso haja discordância, esta deverá ser justificada e limitada à declaração de abertura da avaria grossa, até porque a regulação ainda não foi realizada 14.2.4. Levantamento de valores para o pagamento das despesas da alienação De acordo com o art. 708, § 4º, do CPC, é permitido o levantamento, por alvará, das quantias necessárias ao pagamento das despesas da alienação a serem arcadas pelo consignatário, mantendo-se o saldo remanescente em depósito judicial até o encerramento da regulação, ou seja, depois do trânsito em julgado da decisão. 14.2.5. Apresentação de documentos Apesar de o art. 709 do CPC sugerir que a intimação das partes para a apresentação dos documentos necessários à regulação da avaria grossa seja realizada após a apresentação da declaração inicial pelo regulador e a prolação de decisão judicial sobre eventuais impugnações, nada impede que as partes, no momento em que são citadas, já sejam intimadas para a apresentação dos documentos em juízo. O prazo é judicial, ou seja, deverá ser fixado pelo juiz no caso concreto, podendo o magistrado seguir a indicação de prazo do regulador ou fixar qualquer outro. 14.2.6. Apresentação do regulamento de avaria grossa A partir da data da juntada do último documento aos autos pela parte, de forma voluntária ou coercitiva, o regulador terá o prazo de 12 meses para apresentar o regulamento da avaria grossa CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 127 (havendo possibilidade de prorrogação), que deverá conter a massa ativa, a massa passiva e a taxa de contribuição. 14.2.7. Impugnação Apresentado em juízo o regulamento da avaria grossa, as partes terão, nos termos do § 1º do art. 710 do CPC, um prazo comum de 15 dias de vista dos autos, podendo esse prazo ser prorrogado pelo juiz, de ofício ou a requerimento, nos termos do art. 139, VI, do CPC. A impugnação trará todas as matérias de defesa alegáveis, desde a impugnação a respeito das avarias grossas indicadas pelo regulador, passando por críticas à formação da massa ativa e passiva, até a alegação de matérias processuais de ordem pública. 14.2.8. Sentença homologatória Caso o regulamento não seja impugnado, fazendo-se presumir que as partes concordam com o trabalho apresentado pelo regulador, o art. 710, § 1º, do CPC prevê a prolação de sentença homologatória. Segundo Daniel Assumpção, trata-se de sentença condenatória, já que nela haverá condenação ao pagamento do rateio e da taxa de contribuição. Art. 710, § 1º Oferecido o regulamento da avaria grossa, dele terão vista as partes pelo prazo comum de 15 (quinze) dias, e, não havendo impugnação, o regulamento será homologado por sentença. 15. AÇÃO DE RESTAURAÇÃO DE AUTOS 15.1. CABIMENTO Antes de adentrar no estudo da ação de restauração de autos, é importante distinguir os conceitos de processo e autos. Ao passo que o processo é um procedimento animado por uma relação jurídica em contraditório, os autos representam o conjunto de escritos que exteriorizam os atos processuais, documentando a existência física (ainda que virtual) do processo. Nesse sentido, a ação com procedimento regulado pelos arts. 712 a 718 do CPC tem como objetivo a restauração dos autos – físicos ou eletrônicos – que por algum motivo tenham desaparecido. Existem variados motivos de desaparecimento dos autos, desde fenômenos naturais que deteriorem os autos, tais como incêndios e alagamentos, traças e cupins, até os atos humanos, como a perda desmotivada dos autos em arquivos desorganizados, o desvio e/ou destruição dolosa etc. Nos processos eletrônicos, os autos podem estar sujeitos a falhas de cibersegurança, como a um ataque hacker, de modo que a restauração de autos eletrônicos também é uma realidade atual. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 128 Como o tema foi cobrado em concurso? (Prefeitura de Carmo do Paranaíba - MG - Advogado - Objetiva - 2022): O procedimento de restauração de autos não é cabível no caso de desaparecimento dos autos eletrônicos. Errado. O desaparecimento dos autos em decorrência de má-fé encarará sanções em todas as esferas possíveis: 1) Processualmente devem ser condenadas nas penas de litigância de má-fé (sanção processual aplicável às partes e aos seus patronos); 2) Civilmente serão responsabilizadas pelos danos causados; 3) Penalmente responderão pelo crime de supressão de documento público, conforme previsão do art. 305 do Código Penal; 4) Administrativamente serão sancionadas nesse âmbito (como ocorre com serventuários da justiça e/ou advogados). Ante o exposto, pode-se afirmar que o objetivo imediato do referido procedimento especial é a reconstrução dos escritos que exteriorizam os atos processuais e, como objetivo mediato, a continuação do processo. Obs.: de acordo com o art. 313, IV, do CPC, o desaparecimento dos autos é causa de força maior apta a implicar a suspensão do processo, que somente retomará seu regular andamento ao final do processo de restauração de autos. Ressalta-se, por fim, que a existência de autos suplementares (cópia integral dos autos principais) dispensa a ação de restauração por falta de interesse de agir, nos termos do art. 712, parágrafo único, do CPC. 15.2. LEGITIMIDADE Aduz o art. 712, caput, do CPC que: Art. 712. Verificado o desaparecimento dos autos, eletrônicos ou não, pode o juiz, de ofício, qualquer das partes ou o Ministério Público, se for o caso, promover-lhes a restauração. Isto posto, qualquer das partes poderá ingressar com ação de restauração de autos, naturalmente se referindo às partes do processo que era representado documentalmente pelos autos desaparecidos. Também o Ministério Público tem legitimidade ativa, por expressa previsão do dispositivo supramencionado. Excepcionalmente, até mesmo um terceiro terá legitimidade ativa, qual seja o terceiro juridicamente interessado. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 129 Para parcela majoritária da doutrina, o juiz não terá legitimidade para a instauração do processo de ofício (Humberto Theodoro Junior e Câmara), em razão do princípio da inércia da jurisdição. No entanto, segundo Daniel Assumpção, constatado o desaparecimento dos autos e não sendo proposta por qualquer dos interessados a sua restauração, não haverá alternativa ao juiz que não dar início de ofício a restauração dos autos, porque sem estes nem mesmo uma sentença terminativa poderá ser proferida, por ausência de suporte material para tanto. Para o doutrinador, há respaldo, inclusive, no princípio do impulso oficial. No polo passivo são legitimados todos os sujeitos que participam do processo como parte e que não estejam no polo ativo da ação de restauração de autos. Trata-se de litisconsórcio passivo necessário, considerando que a formação de novos autos e a consequente continuidade do processo obrigatoriamente atingirão a todos os seus sujeitos. 15.3. COMPETÊNCIA A ação de restauração de autos deve ser proposta no mesmo juízo em que tramita o processo cujos autos desapareceram. Obs.: trata-se de competência funcional de caráter absoluto. Em caso de desaparecimento dos autos no tribunal, o processo de restauração será distribuído, sempre que possível, ao relator do processo, nos termos do art. 717 do CPC: Art. 717. Se o desaparecimento dos autos tiver ocorrido no tribunal, o processo de restauração será distribuído, sempre que possível, ao relator do processo. § 1º A restauração far-se-á nojuízo de origem quanto aos atos nele realizados. § 2º Remetidos os autos ao tribunal, nele completar-se-á a restauração e proceder-se-á ao julgamento. Conforme apontado no dispositivo acima, estando o processo em grau recursal, a competência não será do juízo de primeiro grau, que ficará limitado a cumprir carta de ordem expedida pelo tribunal para praticar atos materiais que auxiliem na restauração, tais como a repetição de oitiva de testemunha, depoimento pessoal ou prova pericial. 15.4. PROCEDIMENTO A petição inicial deve seguir o art. 319 do CPC. De acordo com o art. 713 do CPC, na instrução da petição inicial o autor deve apresentar: 1) Certidões dos atos constantes do protocolo de audiências do cartório por onde haja corrido o processo; 2) Cópia das peças que tenha em seu poder; CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 130 3) Qualquer outro documento que facilite a restauração, o que pode significar praticamente a juntada de cópias “capa-a-capa” quando o advogado da parte mantém em seus arquivos ao cópias ao menos dos atos processuais principais. Em seguida, procede-se com a citação do réu, que terá um prazo de 5 dias para contestar o pedido, cabendo a ele exibir as cópias, contrafés e mais as reproduções dos atos e documentos que estiverem em seu poder, com fulcro no art. 714 do CPC. Cumpre salientar que a matéria alegável em sede de defesa se limita a questões processuais e aquelas atinentes à necessidade e adequação da restauração, sendo vedada a alegação de matérias que só interessam ao processo principal, de acordo com entendimento de Luiz Fux e Humberto Theodoro Junior. Se a parte concordar com a restauração, lavrar-se-á o respectivo auto que, assinado pelas partes e homologado pelo juiz, suprirá os autos desaparecidos (art. 714, §§ 1º e 2º do CPC). Havendo contestação ou se a concordância for parcial, deve-se seguir o procedimento comum. Na hipótese de restauração quando o desaparecimento dos autos ocorrer após a produção de prova no processo principal, o art. 715 do CPC estabelece que: Art. 715, § 1º Serão reinquiridas as mesmas testemunhas, que, em caso de impossibilidade, poderão ser substituídas de ofício ou a requerimento. § 2º Não havendo certidão ou cópia do laudo, far-se-á nova perícia, sempre que possível pelo mesmo perito. § 3º Não havendo certidão de documentos, esses serão reconstituídos mediante cópias ou, na falta dessas, pelos meios ordinários de prova. § 4º Os serventuários e os auxiliares da justiça não podem eximir-se de depor como testemunhas a respeito de atos que tenham praticado ou assistido. § 5º Se o juiz houver proferido sentença da qual ele próprio ou o escrivão possua cópia, esta será juntada aos autos e terá a mesma autoridade da original. No que se refere ao § 1º, haverá dispensa da reinquirição das testemunhas sempre que existir cópia da ata de audiência de instrução juntada aos autos do processo de restauração de autos. Além disso, com relação ao § 2º, há decisão do STJ no sentido de não aplicar o dispositivo legal na hipótese de existir cópia de sentença em ação de prestação de contas que reproduziu a essencialidade da prova técnica. Assim segue: [...]. III. Reproduzida a essencialidade da prova técnica na sentença que julgou procedente a ação de prestação de contas, é de ser abrandado o rigor do art. 1.066, § 2º, do CPC, por se revelar desnecessária, pela peculiaridade da espécie, a juntada de cópia do laudo pericial, consoante a conclusão do Tribunal estadual, soberano na apreciação da matéria de fato. IV. "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial." (Súmula n. 7/STJ) V. Recurso especial não conhecido. (STJ - REsp: 302527 RJ 2001/0010782-6, Relator: Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 131 Data de Julgamento: 12/12/2006, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJ 12/02/2007 p. 262). O processo de restauração de autos deve ser extinto por meio de sentença, e no caso de aparecimento superveniente dos autos originais, a extinção deverá ocorrer por meio de sentença terminativa fundada na perda superveniente do interesse de agir, cabendo o processo principal prosseguir nos autos originais, sendo os autos da restauração apensados, nos termos do art. 716, parágrafo único do CPC. A sentença de procedência, que em razão da singeleza procedimental não precisa seguir o formalismo do art. 489, § 1º do CPC (segundo entendimento do STJ), tem natureza constitutiva, criando uma nova situação jurídica decorrente da criação de novos autos e substituição por esses dos autos originais desaparecidos. RESTAURAÇÃO DE AUTOS. ART. 458, I E II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. FUNDAMENTO INATACADO. SÚMULA 283/STF. 1. Tratando-se de restauração de autos, considerou o acórdão recorrido que seria dispensável o rigorismo do art. 458 do Código de Processo Civil e, ainda, que a ausência das formalidades legais previstas em tal dispositivo não acarretara prejuízos ao autor, ora recorrente, fundamento que o especial não considerou. 2. Aplicação da Súmula 283/STF, do seguinte teor: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assente em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles." 3. Recurso especial não conhecido. (STJ - REsp: 322140 SC 2001/0051316-6, Relator: Ministro CASTRO MEIRA, Data de Julgamento: 08/11/2005, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 20/02/2006 p. 258). CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 132 TEORIA GERAL DA EXECUÇÃO 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS A tutela jurisdicional executiva visa resolver a crise de satisfação. Desta forma, qualquer atividade jurisdicional voltada a satisfação do direito é uma tutela executiva. Por muitos anos, a tutela executiva foi chamada de execução, mas, com o passar dos tempos, a legislação (especialmente o CPC/15) passou a utilizar outras terminologias: • Efetivação da tutela provisória (art. 297, parágrafo único do CPC), significa satisfazer o direito que foi reconhecido na tutela provisória. Por exemplo, se a tutela provisória foi concedida para uma busca e apreensão, a crise de satisfação é resolvida quando o bem efetivamente chega; • Cumprimento de sentença (Parte Especial, Livro I, Título II) – execução de título judicial. Obs.: Na prática forense, a linguagem execução/efetivação/cumprimento de sentença não possui grande relevância. Contudo, em provas discursivas e orais, utilize o termo legal. Assim, para se referir a uma execução da tutela provisória, utilize efetivação; para se referir a execução de título judicial, utilize cumprimento de sentença. 2. FORMAS DE APRESENTAÇÃO DA TUTELA EXECUTIVA A tutela executiva possui diferentes sistemas processuais, podendo ser um processo autônomo de execução ou uma fase procedimental executiva. 2.1. FASE PROCEDIMENTAL EXECUTIVA É consequência do processo sincrético, em que há apenas um processo que possui fase de conhecimento, sentença e cumprimento de sentença (fase executiva). Em suma, há apenas um processo com duas fases processuais sucessivas, a primeira de conhecimento e a segunda de execução. Fase de conhecimento Fase executiva S CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 133 É utilizado para os títulos executivos judiciais, não importando se decorrente de procedimento comum ou de procedimento especial. O rol de títulos executivos judiciais está previsto no art. 515 do CPC, dispondo ainda que se tratando de sentença penal condenatória transitada em julgado, sentença arbitral, homologação de sentença estrangeira e de decisão interlocutória estrangeira, após a concessão do exequatur à carta rogatória do STJ, será necessária a citação do executado. Trata-se de uma exceção, uma vez que na fase executivaprocedimental não há citação do executado, mas sim a sua intimação. Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos previstos neste Título: I - as decisões proferidas no processo civil que reconheçam a exigibilidade de obrigação de pagar quantia, de fazer, de não fazer ou de entregar coisa; II - a decisão homologatória de autocomposição judicial; III - a decisão homologatória de autocomposição extrajudicial de qualquer natureza; IV - o formal e a certidão de partilha, exclusivamente em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título singular ou universal; V - o crédito de auxiliar da justiça, quando as custas, emolumentos ou honorários tiverem sido aprovados por decisão judicial; VI - a sentença penal condenatória transitada em julgado; VII - a sentença arbitral; VIII - a sentença estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça; IX - a decisão interlocutória estrangeira, após a concessão do exequatur à carta rogatória pelo Superior Tribunal de Justiça; X - (VETADO). § 1º Nos casos dos incisos VI a IX, o devedor será citado no juízo cível para o cumprimento da sentença ou para a liquidação no prazo de 15 (quinze) dias. § 2º A autocomposição judicial pode envolver sujeito estranho ao processo e versar sobre relação jurídica que não tenha sido deduzida em juízo. Embora não esteja previsto, a citação nos títulos mencionados deve ser antecedida por uma petição inicial, ocorre que a petição inicial e a citação são atos processuais próprios do processo e não do cumprimento de sentença (inicia com requerimento e intimação). Em razão disso, o STJ entendeu que se trata de uma forma híbrida, isto porque a partir da citação do executado será adotado, até o final, o cumprimento de sentença. 2.2. PROCESSO AUTÔNOMO DE EXECUÇÃO Decorre da autonomia da ação, parte-se da premissa de que a tutela de conhecimento e a tutela executiva possuem diversidade de procedimentos e de objetivos, tendo em vista que as espécies de crises jurídicas resolvidas por cada tutela são diferentes. PROCESSO DE CONHECIMENTO PROCESSO DE EXECUÇÃO CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 134 Obs.: Nos títulos executivos extrajudiciais (formados fora da atividade jurisdicional) a tutela executiva representa a primeira oportunidade de participação do Poder Judiciário naquele conflito. Portanto, a execução dependerá sempre de um processo autônomo, não será uma mera fase procedimental. Vale salientar que a execução contra devedor insolvente, conforme prevê o art. 1.052 do CPC, deve ser regulada por lei própria. Enquanto, a lei não for editada, continuam-se aplicando as regras do CPC/73, que prevê um processo autônomo de execução, mesmo se tratando de um título executivo judicial. CPC - Art. 1.052. Até a edição de lei específica, as execuções contra devedor insolvente, em curso ou que venham a ser propostas, permanecem reguladas pelo Livro II, Título IV, da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 . 3. FORMAS EXECUTIVAS 3.1. EXECUÇÃO POR SUB-ROGAÇÃO (DIRETA) Na execução por sub-rogação, também chamada de direta, verifica-se o caráter substitutivo da jurisdição. Isto porque o Estado-juiz satisfaz o direito (cumprimento da obrigação) substituindo a vontade de resistência do executado. Logo, a satisfação do direito independe da colaboração do executado, a exemplo da busca e apreensão, penhora/expropriação. 3.2. EXECUÇÃO POR PRESSÃO PSICOLOGIA OU POR COERÇÃO (INDIRETA) Na execução indireta não existe o caráter substitutivo. O Estado-juiz pressiona psicologicamente o executado para que faça uma adequação entre a sua vontade e a satisfação do direito, cumprindo voluntariamente a obrigação. Obs.: Na execução indireta haverá um cumprimento voluntário da obrigação, mas não espontâneo, tendo em vista que decorre de pressão psicológica. Existem duas formas de execução indireta: a) Ameaça de piora na situação (por exemplo, astreintes); b) Oferta de uma melhora na situação (por exemplo, art. 827, §1º do CPC). Também chamada indevidamente de “sanção premial ou premiadora”. Art. 827. Ao despachar a inicial, o juiz fixará, de plano, os honorários advocatícios de dez por cento, a serem pagos pelo executado. § 1º No caso de integral pagamento no prazo de 3 (três) dias, o valor dos honorários advocatícios será reduzido pela metade. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 135 3.2.1. Prisão civil A prisão civil é a medida mais severa de execução indireta, ameaça à liberdade de locomoção do executado, cabível apenas na execução de alimentos genuínos (casamento, união estável e parentesco). Será cabível tanto nas execuções de títulos executivos judiciais (cumprimento de sentença) quanto extrajudiciais (processo autônomo de execução), nos termos do art. 528, §3º e 911, parágrafo único, ambos do CPC). Art. 528. No cumprimento de sentença que condene ao pagamento de prestação alimentícia ou de decisão interlocutória que fixe alimentos, o juiz, a requerimento do exequente, mandará intimar o executado pessoalmente para, em 3 (três) dias, pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo. § 3º Se o executado não pagar ou se a justificativa apresentada não for aceita, o juiz, além de mandar protestar o pronunciamento judicial na forma do § 1º, decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses. Art. 911. Na execução fundada em título executivo extrajudicial que contenha obrigação alimentar, o juiz mandará citar o executado para, em 3 (três) dias, efetuar o pagamento das parcelas anteriores ao início da execução e das que se vencerem no seu curso, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de fazê-lo. Parágrafo único. Aplicam-se, no que couber, os §§ 2º a 7º do art. 528 . Vale salientar que a prisão civil não se confunde com a prisão penal (sanção), por isso seu cabimento não depende do trânsito em julgado. Além disso, a prisão não exime o pagamento da dívida alimentar. CPC Art. 528, § 5º O cumprimento da pena não exime o executado do pagamento das prestações vencidas e vincendas. Para que ocorra a prisão civil, o credor deve fazer requerimento expresso. Trata-se de uma exceção aos poderes executivos do juiz que estão, em regra, dentro do impulso oficial. Art. 528, § 8º O exequente pode optar por promover o cumprimento da sentença ou decisão desde logo, nos termos do disposto neste Livro, Título II, Capítulo III, caso em que não será admissível a prisão do executado, e, recaindo a penhora em dinheiro, a concessão de efeito suspensivo à impugnação não obsta a que o exequente levante mensalmente a importância da prestação. A prisão civil é sempre determinada por meio de uma decisão interlocutória, isto porque o devedor de alimentos é preso durante o procedimento, é recorrível por agravo de instrumento. Contudo, como restringe a liberdade de locomoção a jurisprudência aceita a interposição de habeas corpus. A Lei de Alimentos (art. 19) prevê que a prisão civil terá o prazo máximo de 60 dias, havendo pagamento integral da dívida a prisão deixa de ser aplicada. O CPC, entretanto, prevê o prazo de CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 136 um a três meses. Diante da divergência, o STJ pacificou o entendimento de que deve prevalecer a regra do CPC. Art. 528, § 3º Se o executado não pagar ou se a justificativa apresentada não for aceita, o juiz, além de mandar protestar o pronunciamento judicial na forma do § 1º, decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses. Aplica-se o regime fechado, separado dos presos comuns (art. 528, §4º do CPC). Por conta da pandemia da COVID, a jurisprudência do STJ oscilou entre a determinação de cumprimento da prisão civil do devedor de alimentos em regime domiciliar, a suspensão momentânea do cumprimento da prisão em regimefechado e a possibilidade de escolha, pelo credor, da medida mais adequada à hipótese, se diferir o cumprimento ou cumprir em regime domiciliar. Atualmente, diante dos avanços da vacinação, não mais subsistem as razões de natureza humanitária e de saúde pública que justificaram a suspensão do cumprimento das prisões civis de devedores de alimentos em regime fechado. A prisão do devedor justifica-se somente em relação às três parcelas anteriores a ação e as vincendas. Não significa que o credor terá que esperar o atraso de 3 parcelas. Art. 528, § 7º O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende até as 3 (três) prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo. Por fim, é possível que uma mesma execução tenha prisões sucessivas. Obviamente, não serão pela mesma dívida. 3.2.2. Astreintes Trata-se de uma multa coercitiva que pode ser aplicada pelo juiz de ofício, podendo ser por dia, semanal, mensal e, até mesmo, fixa. Devendo ser concedido um prazo razoável para que a obrigação seja cumprida. Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito. Vale salientar que não há na lei um parâmetro para a fixação do valor da astreinte, deve-se analisar as circunstâncias do caso concreto, não podendo ser irrisório e nem exorbitante. O STJ entende que não existe correlação imediata entre o valor da obrigação e o da multa que pode, inclusive, ter um valor maior do que a obrigação principal. PROCESSUAL CIVIL. OBRIGAÇÃO DE ENTREGAR COISA CERTA. MEDICAMENTOS. ASTREINTES. FAZENDA PÚBLICA. MULTA DIÁRIA COMINATÓRIA. CABIMENTO. NATUREZA. PROVEITO EM FAVOR DO CREDOR. VALOR DA MULTA PODE ULTRAPASSAR O VALOR DA PRESTAÇÃO. NÃO PODE INVIABILIZAR A PRESTAÇÃO PRINCIPAL. NÃO CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 137 HÁ LIMITAÇÃO DE PERCENTUAL FIXADO PELO LEGISLADOR. 1. A obrigação de fazer permite ao juízo da execução, de ofício ou a requerimento da parte, a imposição de multa cominatória ao devedor, ainda que seja a Fazenda Pública, consoante entendimento consolidado neste Tribunal. Precedentes: AgRg no REsp 796255/RS, Rel. Min. Luiz Fux, Primeiro Turma, 13.11.2006; REsp 831784/RS, Rel. Min. Denise Arruda, Primeira Turma, 07.11.2006; AgRg no REsp 853990/RS, Rel. Ministro José Delgado, Primeira Turma, DJ 16.10.2006; REsp 851760 / RS, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, 11.09.2006. 2. A multa processual prevista no caput do artigo 14 do CPC difere da multa cominatória prevista no Art. 461, § 4º e 5º, vez que a primeira tem natureza punitiva, enquanto a segunda tem natureza coercitiva a fim de compelir o devedor a realizar a prestação determinada pela ordem judicial. 3. Os valores da multa cominatória não revertem para a Fazenda Pública, mas para o credor, que faz jus independente do recebimento das perdas e danos. Consequentemente, não se configura o instituto civil da confusão previsto no art. 381 do Código Civil, vez que não se confundem na mesma pessoa as qualidades de credor e devedor. 4. O legislador não estipulou percentuais ou patamares que vinculasse o juiz na fixação da multa diária cominatória. Ao revés, o § 6º, do art. 461, autoriza o julgador a elevar ou diminuir o valor da multa diária, em razão da peculiaridade do caso concreto, verificando que se tornou insuficiente ou excessiva, sempre com o objetivo de compelir o devedor a realizar a prestação devida. 5. O valor da multa cominatória pode ultrapassar o valor da obrigação a ser prestada, porque a sua natureza não é compensatória, porquanto visa persuadir o devedor a realizar a prestação devida. 6. Advirta-se, que a coerção exercida pela multa é tanto maior se não houver compromisso quantitativo com a obrigação principal, obtemperando-se os rigores com a percepção lógica de que o meio executivo deve conduzir ao cumprimento da obrigação e não inviabilizar pela bancarrota patrimonial do devedor. 7. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp n. 770.753/RS, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 27/2/2007, DJ de 15/3/2007, p. 267.) Importante consignar que as astreintes não estão limitadas a 40 salários-mínimos nos Juizados Especiais. FONAJE ENUNCIADO 144 (Substitui o Enunciado 132) – A multa cominatória não fica limitada ao valor de 40 salários-mínimos, embora deva ser razoavelmente fixada pelo Juiz, obedecendo ao valor da obrigação principal, mais perdas e danos, atendidas as condições econômicas do devedor. RECLAMAÇÃO. JUIZADOS ESPECIAIS. COMPETÊNCIA PARA EXECUTAR SEUS PRÓPRIOS JULGADOS. VALOR SUPERIOR A 40 SALÁRIOS- MÍNIMOS. ASTREINTES. DESCUMPRIMENTO DE LIMINAR. REDUÇÃO DO QUANTUM DA MULTA DIÁRIA. RECLAMAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. 1. Nos termos do artigo 3º, § 1º, I, da Lei n. 9099/2005, compete ao Juizado Especial a execução de seus julgados, inexistindo, no preceito legal, restrições ao valor executado, desde que, por ocasião da propositura da ação, tenha sido observado o valor de alçada (RMS 33.155/MA, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe 29/08/2011) . 2. O fato de o valor executado ter atingido patamar superior a 40 (quarenta) salários- mínimos, em razão de encargos inerentes à condenação, não descaracteriza CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 138 a competência do Juizado Especial para a execução de seus julgados. 3. A multa cominatória prevista no art. 461, §§ 4º e 5º, do Código de Processo Civil não se revela como mais um bem jurídico em si mesmo perseguido pelo autor, ao lado da tutela específica a que faz jus. Sua fixação em caso de descumprimento de determinada obrigação de fazer tem por objetivo servir como meio coativo para o cumprimento da obrigação. 4. Dessa forma, deve o juiz aplicar, no âmbito dos juizados especiais, na análise do caso concreto, os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, além de não se distanciar dos critérios da celeridade, simplicidade e equidade que norteiam os juizados especiais, mas não há limite ou teto para a cobrança do débito acrescido da multa e outros consectários. 5. No caso concreto buscou-se, na fase de cumprimento de sentença, o recebimento de valor a título de astreintes no montante de R$ 387.600,00 (o que corresponde, em valores atualizados até a presente data e com juros de mora a R$ 707.910,38), quando o valor da condenação principal - danos morais - ficou em R$3.500,00. 6. Sopesando o fato de o valor fixado a título de astreintes revelar-se, na hipótese, desarrazoado ao gerar o enriquecimento sem causa, com a gravidade da conduta da reclamante ao manter o nome da autor em cadastro restritivo por mais de dois anos, sem justificativa razoável, o valor da multa deve ser reduzido para R$ 30.000,00 (trinta mil reais). 7. Reclamação parcialmente procedente. (Rcl n. 7.861/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 11/9/2013, DJe de 6/3/2014.) É possível que o juiz de ofício altere o valor e a periodicidade da multa vincenda. Para o STJ, também é possível a diminuição do valor consolidado (inclusive de ofício) nos casos em que for exorbitante, a fim de evitar o enriquecimento sem causa e preservar a boa-fé processual (duty to mitigate the loss). Art. 537, § 1º O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que: I - se tornou insuficiente ou excessiva; II - o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento. O beneficiado pela multa é sempre a parte contrária. As astreintes também podem ser fixadas contra a Fazenda Pública. Obs.: O agente189 5. TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL .............................................................................................. 192 5.1. GENERALIDADES ............................................................................................................ 192 5.2. DECISÃO QUE RECONHECE OBRIGAÇÃO .................................................................. 193 5.3. SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE AUTOCOMPOSIÇÃO ........................................... 193 5.4. FORMAL OU CERTIDÃO DE PARTILHA ........................................................................ 193 5.5. CRÉDITO DO AUXILIAR DA JUSTIÇA HOMOLOGADO ................................................ 194 5.6. SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA TRANSITADA EM JULGADO .......................... 194 5.7. SENTENÇA ARBITRAL QUE RECONHEÇA OBRIGAÇÃO ........................................... 194 5.8. SENTENÇA/DECISÃO ESTRANGEIRA HOMOLOGADA............................................... 195 6. COMPETÊNCIA ....................................................................................................................... 196 6.1. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA ......................................................................................... 196 6.2. COMPETÊNCIA DO JUIZ DE PRIMEIRO GRAU ............................................................ 197 6.2.1. Legais ......................................................................................................................... 197 6.2.2. Voluntárias ................................................................................................................. 197 6.2.3. Jurisprudenciais ......................................................................................................... 198 6.3. COMPETÊNCIA POR DISTRIBUIÇÃO ............................................................................ 198 7. EXECUÇÃO PROVISÓRIA ...................................................................................................... 198 7.1. CONCEITO E FUNDAMENTOS ....................................................................................... 199 7.2. CABIMENTO ..................................................................................................................... 199 7.2.1. Título judicial sujeito a recurso sem efeito suspensivo ............................................. 199 7.2.2. Tutela provisória......................................................................................................... 199 7.3. REGIME JURÍDICO .......................................................................................................... 200 7.3.1. Responsabilidade objetiva ......................................................................................... 200 CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 7 7.3.2. Reestabelecimento das partes ao estado anterior .................................................... 200 7.3.3. Caução para levantamento de dinheiro e atos de alienação .................................... 201 7.3.4. Multa e honorários ..................................................................................................... 201 CUMPRIMENTO DE SENTENÇA DE PAGAR QUANTIA .............................................................. 202 1. REQUERIMENTO DO EXEQUENTE ...................................................................................... 202 2. CÁLCULO EXECUTIVO ........................................................................................................... 202 3. INTIMAÇÃO PARA O CUMPRIMENTO .................................................................................. 203 4. PRAZO PARA PAGAMENTO .................................................................................................. 204 5. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA ÀS AVESSAS.................................................................... 205 6. MULTA ...................................................................................................................................... 205 6.1. NATUREZA JURÍDICA ..................................................................................................... 205 6.2. PERCENTUAL FIXO ......................................................................................................... 206 6.3. INCIDÊNCIA ...................................................................................................................... 206 6.4. NÃO INCIDÊNCIA ............................................................................................................. 206 6.5. PAGAMENTO PARCIAL ................................................................................................... 206 6.6. PARCELAMENTO DO DÉBITO ....................................................................................... 207 6.7. DEPÓSITO PARA IMPUGNAR ........................................................................................ 207 7. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA ........................................................... 207 7.1. DEFESAS DO EXECUTADO............................................................................................ 209 7.2. NATUREZA JURÍDICA ..................................................................................................... 209 7.3. REQUISITOS .................................................................................................................... 209 7.4. 7.4. PRAZO E TERMO INICIAL ........................................................................................ 209 7.5. CABIMENTO ..................................................................................................................... 210 7.6. MATÉRIA ........................................................................................................................... 210 7.6.1. Excesso de execução ................................................................................................ 210 7.6.2. Inexigibilidade ............................................................................................................ 211 7.7. EFEITOS DO RECEBIMENTO DA IMPUGNAÇÃO ......................................................... 212 7.8. CONTRADITÓRIO ............................................................................................................ 212 7.9. SUCUMBÊNCIA ................................................................................................................ 212 7.10. ARGUIÇÃO DE FATOS SUPERVENIENTES .................................................................. 213 7.11. RECURSO ......................................................................................................................... 213 CUMPRIMENTO DE SENTENÇA DE FAZER, NÃO FAZER E DAR ............................................ 214 1. ASPECTOS COMUNS ............................................................................................................. 214 1.1. TUTELA REPARATÓRIA x TUTELA ESPECÍFICA ......................................................... 214 1.2. TUTELA ESPECÍFICA CONTRA O PODER PÚBLICO ................................................... 214 1.3. DEFESA DO DEVEDOR ................................................................................................... 214 1.4. REGIME JURÍDICO .......................................................................................................... 215 1.5. APLICAÇÃO A DEVERES NÃO OBRIGACIONAIS ......................................................... 215 2. CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES DE FAZER E NÃO FAZER .......................................... 215 2.1. TUTELA ESPECÍFICA x RESULTADO PRÁTICO EQUIVALENTE ................................ 216 2.1.1. Distinção ..................................................................................................................... 216 2.1.2. Obtenção do resultado prático equivalente ............................................................... 216 2.1.3. Não cabimento do resultadopúblico ser sancionado com a multa (STJ – RESp. 679.048/TJ). FGTS. CORREÇÃO MONETÁRIA DAS CONTAS VINCULADAS. ARTIGO 29- B DA LEI Nº 8.036/90. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO RECURSAL. SÚMULAS N.ºS 282 E 283 DO STF. ASTREINTES. OBRIGAÇÃO DE FAZER DE NATUREZA PERMANENTE; VALE DIZER, PASSÍVEL DE SER DESFEITA. INCIDÊNCIA DO MEIO DE COERÇÃO. 1. A interposição do recurso especial impõe que o dispositivo de Lei Federal tido por violado, como meio de se aferir a admissão da impugnação, tenha sido ventilado no acórdão recorrido, sob pena de padecer o recurso da imposição jurisprudencial do prequestionamento, requisito essencial à admissão do mesmo, o que atrai a incidência do CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 139 enunciado n.° 282 da Súmula do STF. 2. O manejo do recurso especial pela alínea "c" exige do recorrente a comprovação do dissídio jurisprudencial, cabendo ao mesmo colacionar precedentes jurisprudenciais favoráveis à tese defendida, comparando analiticamente os acórdãos confrontados, nos termos previstos no artigo 541, parágrafo único, do CPC. 3. In casu, o juízo a quo fixou prazo de 10 (dez) dias para cumprimento da obrigação de fazer pela CEF, qual seja, correção de contas vinculadas ao FGTS quanto aos planos Verão e Collor I, sob pena de multa diária a incidir sobre a pessoa do gerente. Trata-se de hipótese de incidente da execução quanto ao cumprimento do julgado, sendo certo que o juízo limitou-se a fixar as astreintes. 4. Tratando-se de figuras distintas, vale dizer: meio de coerção visando o cumprimento da obrigação (astreintes) e sanção de múltiplas consequências (art. 14, V, do CPC), impõe- se a exclusão do "gerente", posto não partícipe da relação processual que gerou a imposição da medida de apoio coercitiva, sob pena de grave violação do due process of law e do contraditório. 5. Destarte, o art. 14, parágrafo único, do CPC refere-se ao "responsável" pelo embaraço à execução do julgado, e este somente surge no processo satisfativo, por isso que quando da emissão do provimento autoexecutável e mandamental o juízo não podia, antecipadamente, presumir atentado à jurisdição. 6. A função das astreintes é vencer a obstinação do devedor ao cumprimento da obrigação, e incide a partir da ciência do obrigado e da sua recalcitrância. 7. A valoração do quantum das astreintes revela-se matéria cujo conhecimento é inviável por esta Corte Superior, porquanto inequívoca operação de cunho fático, vedada à cognição do E. STJ (Súmula n.º 07). 8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido, para excluir o gerente da condenação, mantida a CEF. (REsp n. 679.048/RJ, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 3/11/2005, DJ de 28/11/2005, p. 204.) Na vigência do CPC/73, havia o entendimento sumulado de que a cobrança da multa deveria ser feita por intimação pessoal. O CPC/15, em seu art. 513, caput e §2º, I, trouxe a possibilidade de a intimação ser feita na pessoa do advogado. O STJ foi chamado para se manifestar sobre o tema e manteve o entendimento sumulado. Logo, se houver astreintes a intimação deve ser feita pessoalmente. Súmula 410 - A prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer. Art. 513. O cumprimento da sentença será feito segundo as regras deste Título, observando-se, no que couber e conforme a natureza da obrigação, o disposto no Livro II da Parte Especial deste Código. § 2º O devedor será intimado para cumprir a sentença: I - pelo Diário da Justiça, na pessoa de seu advogado constituído nos autos; A executabilidade da multa é imediata, ficando o levantamento do seu valor condicionado ao trânsito em julgado. Art. 537, § 3º A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 140 Obs.: As normas que regulamentar a tutela coletiva (art. 12, §2º, LACP; art. 213, §3º, ECA; art. 83, §32º Estatuto da Pessoa Idosa) preveem que a execução das astreintes será após o trânsito em julgado. 4. ESPÉCIES DE OBRIGAÇÃO EXEQUENDA 4.1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS As espécies de obrigações exequendas (pagar, fazer, não fazer e entregar) relacionam-se com as formas procedimentais vistas acima (cumprimento de sentença, processo autônomo de execução, execução por sub-rogação e execução indireta). A definição da forma procedimental (processo autônomo ou fase procedimental) independe da espécie de obrigação, considera-se a natureza do título executivo (judicial ou extrajudicial). Por exemplo, tratando-se de título executivo judicial será executado por cumprimento de sentença (fase procedimental) pouco importando a espécie de obrigação; o mesmo entendimento aplica-se ao título executivo extrajudicial cuja execução será por processo autônomo. Em relação à execução por sub-rogação e à execução indireta, é importante analisarmos a espécie de obrigação exequenda. 4.2. EXECUÇÃO DE PAGAR QUANTIA CERTA A execução de pagar quantia certa pode ocorrer por sub-rogação (penhora/expropriação). Também é possível a execução indireta, a exemplo da prisão civil (execução de alimentos) e do processo de execução (art. 827, §1º, do CPC). Além disso, há duas previsões de execuções indiretas típicas: a) Protesto da sentença Gera uma ciência erga omnes da situação de devedor do executado. Conforme o art. 517 do CPC, é uma medida de execução indireta que só poder ser utilizada no cumprimento de sentença definitivo e após o decurso do prazo de 15 dias para o pagamento. Art. 517. A decisão judicial transitada em julgado poderá ser levada a protesto, nos termos da lei, depois de transcorrido o prazo para pagamento voluntário previsto no art. 523. O protesto só será levantado se houver o pagamento ou se o processo for extinto por alguma razão. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 141 Será cabível no cumprimento provisório da sentença de alimentos, mas se o devedor justificar o inadimplemento a sentença não será protestada. Art. 528. No cumprimento de sentença que condene ao pagamento de prestação alimentícia ou de decisão interlocutória que fixe alimentos, o juiz, a requerimento do exequente, mandará intimar o executado pessoalmente para, em 3 (três) dias, pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo. § 1º Caso o executado, no prazo referido no caput , não efetue o pagamento, não prove que o efetuou ou não apresente justificativa da impossibilidade de efetuá-lo, o juiz mandará protestar o pronunciamento judicial, aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 517 . b) Inclusão do nome do devedor em cadastros de inadimplentes Art. 782. Não dispondo a lei de modo diverso, o juiz determinará os atos executivos, e o oficial de justiça os cumprirá. § 3º A requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes. § 4º A inscrição será cancelada imediatamente se for efetuado o pagamento, se for garantida a execução ou se a execução for extinta por qualquer outro motivo. § 5º O disposto nos §§ 3º e 4º aplica-se à execução definitiva de título judicial. Assim como no protesto, visa dar ciência erga omnes da situação do devedor, dificultando o seu acesso ao crédito. Igualmente, depende do trânsito em julgado, salvo no caso de execução de alimentos. A anotação será baixada quando houver o pagamento, a extinção do processo ou a penhora (aqui se diferencia do protesto) que funciona como uma garantia do juízo. Em relação à multa pelo não pagamento em 15 dias (art. 523, §1º, do CPC), não há na doutrina consenso sobre ser uma espécie de execuçãoprático equivalente ...................................................... 216 2.2. PERDAS E DANOS .......................................................................................................... 216 2.2.1. Requerimento do credor ou última opção ................................................................. 216 2.2.2. Perdas e danos como última opção .......................................................................... 217 2.2.3. Procedimento de apuração ........................................................................................ 217 2.2.4. Sem prejuízo de multa ............................................................................................... 217 CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 8 2.3. MULTA/ASTREINTE ......................................................................................................... 217 2.3.1. Natureza jurídica ........................................................................................................ 217 2.3.2. Destinatário ................................................................................................................ 217 2.3.3. Momento da incidência .............................................................................................. 218 2.3.4. Intimação do devedor para cumprimento .................................................................. 218 2.3.5. Momento para execução ........................................................................................... 218 2.3.6. Inaplicabilidade .......................................................................................................... 218 2.3.7. Reforma da decisão cuja cumprimento a multa pretendia tutelar ............................ 218 2.3.8. 2.3.8. Hipótese de não cabimento ............................................................................. 219 2.3.9. 2.3.9. Valor da multa .................................................................................................. 219 2.3.10. 2.3.10. Possibilidade de adequação superior da multa ............................................ 219 2.3.11. 2.3.11. Periodicidade ................................................................................................. 219 2.3.12. 2.3.12. Cumulação com outras multas ...................................................................... 219 2.4. 2.4. MEDIDAS DE APOIO ................................................................................................ 219 2.4.1. 2.4.1. Rol exemplificativo ........................................................................................... 220 2.4.2. Natureza das medidas ............................................................................................... 220 2.4.3. Cumulação com as astreintes ................................................................................... 220 2.5. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ E DESOBEDIÊNCIA ................................................................. 220 3. CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE ENTREGA ................................................................ 220 3.1. REGIME GERAL ............................................................................................................... 220 3.2. APLICAÇÃO A OBRIGAÇÕES DE ENTREGAS NÃO OBRIGACIONAIS ...................... 220 3.3. FIXAÇÃO DE PRAZO RAZOÁVEL PARA CUMPRIMENTO ........................................... 221 3.4. 3.4. COISA INCERTA ....................................................................................................... 221 3.5. INEXISTÊNCIA DE RESULTADO PRÁTICO EQUIVALENTE ........................................ 221 3.6. INDENIZAÇÃO E RETENÇÃO DE BENFEITORIAS ....................................................... 221 CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 9 APRESENTAÇÃO Inicialmente, gostaríamos de agradecer a confiança em nosso material. Esperamos que seja útil na sua preparação, em todas as fases. A grande maioria dos concurseiros possui o hábito de trocar o material de estudo constantemente, principalmente, em razão da variedade de materiais disponíveis, cada dia surge algo novo. Porém, o ideal é você utilizar sempre a mesma fonte, fazendo a complementação necessária, pois quanto mais contato temos com nosso material de estudos, mais familiarizados ficamos, o que se torna primordial na hora da prova. O Caderno Sistematizado de Direito Processual Civil – Parte 3 aborda os temas Execução, Tutela Provisória e Procedimentos Especiais, mesclamos as aulas dos Professores Daniel Assumpção, Fredie Didier e Fernando Gajardoni. Com o intuito de deixar o material mais completo, utilizados as seguintes fontes complementares: a) Manual de Direito Processual Civil, 2023 (Daniel Assumpção); b) Curso de Direito Civil, Volume 5, 2022 (Fredie Didier). Na parte jurisprudencial, utilizamos os informativos do site Dizer o Direito (www.dizerodireito.com.br), os livros: Principais Julgados STF e STJ Comentados, Vade Mecum de Jurisprudência Dizer o Direito, Súmulas do STF e STJ anotadas por assunto (Dizer o Direito). Destacamos que é importante você se manter atualizado com os informativos, reserve um dia da semana para ler no site do Dizer o Direito. Como você pode perceber, reunimos em um único material diversas fontes (aulas + doutrina + informativos + lei seca + questões) tudo para otimizar o seu tempo e garantir que você faça uma boa prova. Por fim, como forma de complementar o seu estudo, não esqueça de fazer questões. É muito importante!! As bancas costumam repetir certos temas. Vamos juntos!! Bons estudos!! Equipe Cadernos Sistematizados. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 10 TUTELA PROVISÓRIA 1. TUTELAS PROVISÓRIAS NA DOUTRINA A tutela provisória é aquela que não se estabiliza pela coisa julgada, ou seja, pode ser mudada. 1.1. TUTELA ANTECIPADA (SATISFATIVA PROVISIONAL DE URGÊNCIA) É uma tutela provisória, na medida em que pode ser mudada/ reformada/ mantida/ cassada. Caracteriza-se por seu caráter satisfativo somado a possibilidade de, caso não seja concedida, causar um risco ou um dano irreparável a parte. Por isso, o bem da vida (a proteção) é entregue ao autor no início da demanda. Ex.: concessão de remédios. 1.2. TUTELA CAUTELAR (CONSERVATIVA PROVISIONAL DE URGÊNCIA) É uma tutela provisória também fundada na urgência. Possui caráter conservativo, uma vez que não satisfaz o direito da parte, apenas conserva- o para que, oportunamente, o direito seja satisfeito. Ex.: arresto, separação de corpos. 1.3. TUTELA DE EVIDÊNCIA (SATISFATIVA PROVISIONAL) Também é uma tutela provisória, assemelha-se à tutela antecipada, pois é satisfativa, mas não possui o requisito de urgência. Assim, pode-se afirmar que é uma espécie de tutela antecipada sem urgência. São casos em que o direito do autor é tão evidente que, mesmo sem urgência, concede-se de forma antecipada. Ex.: busca e apreensão de bens alienados fiduciariamente. 2. TUTELAS PROVISÓRIAS E O CPC/15 Ao disciplinar a temática, o CPC abarca as três espécies de tutelas vistas acima. Ressalta-se que a tutela provisória estará presente tanto no processo de conhecimento quanto na execução, por isso está alocada na parte geral. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 11 Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência. Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental. Art. 295. A tutela provisória requerida em caráter incidental independe do pagamento de custas. Art. 296. A tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada. Parágrafo único. Salvo decisão judicial em contrário, a tutela provisória conservará a eficácia durante o período de suspensão do processo.Art. 297. O juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória. Parágrafo único. A efetivação da tutela provisória observará as normas referentes ao cumprimento provisório da sentença, no que couber. Art. 298. Na decisão que conceder, negar, modificar ou revogar a tutela provisória, o juiz motivará seu convencimento de modo claro e preciso. Art. 299. A tutela provisória será requerida ao juízo da causa e, quando antecedente, ao juízo competente para conhecer do pedido principal. Parágrafo único. Ressalvada disposição especial, na ação de competência originária de tribunal e nos recursos a tutela provisória será requerida ao órgão jurisdicional competente para apreciar o mérito. 3. PRINCIPAIS QUESTÕES 3.1. FIM DAS CAUTELARES EM ESPÉCIE E DO LIVRO III DO CPC/73 No CPC/73 havia dois grandes grupos de tutelas cautelares: • Cautelares típicas – previstas no CPC, que trazia seus requisitos • Cautelares atípicas – não possuíam previsão legal, mas podiam ser concedidas com base no poder geral de cautela do juiz. Perceba que era desnecessária a tipificação das cautelares diante do poder geral de cautela do juiz. Por isso, o CPC/15 acabou com as cautelares em espécie, abarcando-as no Poder Geral de Cautela (301 CPC). Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 12 Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito. Doutrina minoritária sustenta que duas cautelares típicas continuam existindo, são elas: o atentado e a produção antecipada de provas. Contudo, a maioria da doutrina entende que não há mais, uma vez que o atentado virou ato atentatório contra à dignidade da justiça e a antecipação de provas virou meio de prova, perdendo ambos a sua natureza cautelar. 3.2. SUMARIEDADE DA COGNIÇÃO As três espécies de tutela provisória, por conta da provisoriedade, trabalham com um juízo de cognição sumária (vertical). Ou seja, não é possível afirmar que o autor possui razão, mas seja pela urgência ou pela evidência, opta-se por proteger provisoriamente determinado bem. Acerca dos graus de probabilidade das tutelas provisórias, há na doutrina três correntes: 1ª C – Não existe grau de probabilidade. Sendo provável, o juiz irá conceder a cautelar, a antecipada ou a de evidência. Sendo improvável, nenhuma tutela provisória é concedida. 2ª C – Há grau de probabilidade entre a tutela de evidência e a tutela de urgência (cautelar ou antecipada). O grau de probabilidade na tutela de evidência é maior, pois é tutelada uma situação que não necessita de urgência, sendo quase um juízo de certeza. Ademais, entre a cautelar e a antecipada não há diferença de grau de probabilidade, ambas são baseadas na urgência. É a posição que prevalece na doutrina, com base no art. 300 do CPC que trata das duas tutelas de urgência (cautelar e antecipada) no mesmo dispositivo. 3ª C – Há diferença de grau de probabilidade entre a tutela de evidência (altíssima probabilidade), a tutela antecipada (alta probabilidade) e a tutela cautelar (probabilidade). 3.3. URGÊNCIA OU PREVENTIVIDADE Como visto, a urgência (periculum in mora) e a preventividade são características das tutelas antecipadas e cautelares (tutelas de urgência), não estando presentes na tutela de evidência. A seguir elaboramos um quadro com a diferença na urgência da tutela antecipada e tutela cautelar. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 13 Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. § 1 o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la. § 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia. § 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão. 3.4. REVERSIBILIDADE As três espécies de tutelas provisórias são precárias e mutáveis, por isso podem ser revertidas, revogadas. Ressalta-se que em determinadas situações, pelo menos do ponto de vista fático, são irreversíveis, o que não impede que sejam concedidas. Como exemplo, tutela antecipada para concessão de medicamento, será dado para o autor. Caso depois fique provado que não possuía o direito, a reversibilidade pode ser em pecúnia, ou seja, ele irá pagar o valor do medicamento. 3.5. INEXISTÊNCIA DE COISA JULGADA MATERIAL As tutelas provisórias, em regra, não formam coisa julgada material, possuem cognição sumária (juízo de probabilidade), em que há celeridade e baixa segurança. Contudo, na cautelar a decisão que reconhecer a ocorrência de decadência ou de prescrição, por questão de economia processual, fará coisa julgada. Art. 310. O indeferimento da tutela cautelar não obsta a que a parte formule o pedido principal, nem influi no julgamento desse, salvo se o motivo do indeferimento for o reconhecimento de decadência ou de prescrição. 3.6. FUNGIBILIDADE CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 14 Apesar do art. 305 do CPC afirmar que a tutela cautelar pode ser transformada em tutela antecipada, quando o juiz assim entender, é pacífico na jurisprudência que a tutela antecipada também pode ser convertida em tutela cautelar, já que ambas tutelam a urgência. Art. 305. A petição inicial da ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter antecedente indicará a lide e seu fundamento, a exposição sumária do direito que se objetiva assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Destaca-se que na tutela de evidência, conforme entendimento dominante, não há como aplicar a fungibilidade, já que há ausência de urgência. 3.7. RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR DANO PROCESSUAL Embora esteja previsto no Capítulo da Tutela Provisória de Urgência, o art. 302 do CPC, que trata da responsabilidade objetiva por dano processual, é aplicado à tutela de evidência. Art. 302. Independentemente da reparação por dano processual, a parte responde pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa, se: I - a sentença lhe for desfavorável; II - obtida liminarmente a tutela em caráter antecedente, não fornecer os meios necessários para a citação do requerido no prazo de 5 (cinco) dias; III - ocorrer a cessação da eficácia da medida em qualquer hipótese legal; IV - o juiz acolher a alegação de decadência ou prescrição da pretensão do autor. Parágrafo único. A indenização será liquidada nos autos em que a medida tiver sido concedida, sempre que possível. Salienta-se que a responsabilidade objetiva será apurada nos próprios autos ou em liquidação de sentença. 3.8. RETIRADA DO EFEITO SUSPENSIVO DA APELAÇÃO O art. 1.012, §1º, V do CPC prevê que a decisão do juiz que confirma, revoga ou concede a tutela provisória na sentença suprime o efeito suspensivo da apelação. Desta forma, o indivíduo que possui uma tutela provisória de qualquer natureza (antecipada, cautelar, de evidência) e ganha a ação poderá fazer cumprimento provisório da sentença (art. 520). Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo. § 1º Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que: V - confirma, concede ou revoga tutela provisória; Art. 520. O cumprimento provisório dasentença impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo será realizado da mesma forma que o cumprimento definitivo, sujeitando-se ao seguinte regime: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 15 3.9. RECURSO CABÍVEL DA DECISÃO SOBRE A TUTELA PROVISÓRIA Da decisão de primeiro grau, nos termos do art. 1.015, I do CPC, caberá agravo de instrumento. Da decisão do relator (art. 932), caberá agravo interno, conforme disposto no art. 1.021 do CPC. Da decisão de primeiro grau, concedida em sentença, caberá apelação, nos termos do art. 1.012, V do CPC. 4. TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE 4.1. PREVISÃO LEGAL E CONSIDERAÇÕES Está disciplinada nos arts. 303 e 304 (estabilização) do CPC/15: Art. 303. Nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo. § 1º Concedida a tutela antecipada a que se refere o caput deste artigo: I - o autor deverá aditar a petição inicial, com a complementação de sua argumentação, a juntada de novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final, em 15 (quinze) dias ou em outro prazo maior que o juiz fixar; II - o réu será citado e intimado para a audiência de conciliação ou de mediação na forma do art. 334 ; III - não havendo autocomposição, o prazo para contestação será contado na forma do art. 335 . § 2º Não realizado o aditamento a que se refere o inciso I do § 1º deste artigo, o processo será extinto sem resolução do mérito. § 3º O aditamento a que se refere o inciso I do § 1º deste artigo dar-se-á nos mesmos autos, sem incidência de novas custas processuais. § 4º Na petição inicial a que se refere o caput deste artigo, o autor terá de indicar o valor da causa, que deve levar em consideração o pedido de tutela final. § 5º O autor indicará na petição inicial, ainda, que pretende valer-se do benefício previsto no caput deste artigo. § 6º Caso entenda que não há elementos para a concessão de tutela antecipada, o órgão jurisdicional determinará a emenda da petição inicial em até 5 (cinco) dias, sob pena de ser indeferida e de o processo ser extinto sem resolução de mérito. Art. 304. A tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303 , torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso. § 1º No caso previsto no caput , o processo será extinto. CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 16 § 2º Qualquer das partes poderá demandar a outra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada nos termos do caput . § 3º A tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito proferida na ação de que trata o § 2º. § 4º Qualquer das partes poderá requerer o desarquivamento dos autos em que foi concedida a medida, para instruir a petição inicial da ação a que se refere o § 2º, prevento o juízo em que a tutela antecipada foi concedida. § 5º O direito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada, previsto no § 2º deste artigo, extingue-se após 2 (dois) anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo, nos termos do § 1º. § 6º A decisão que concede a tutela não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma das partes, nos termos do § 2º deste artigo. Como já mencionado, a tutela antecipada pode ser concedida antes do início do processo (antecedente), bem como no curso da ação principal. O pedido antecedente de tutela antecipada poderá ser feito com base em: • Urgência extrema; • Estratégia processual. 4.2. INICIAL SUMARIZADA A inicial da tutela antecipada antecedente possui seis requisitos. Vejamos: a) Deixar claro, na petição inicial, que se trata de tutela antecipada antecedente; b) Deixar claro qual é o pedido final; c) Expor a lide principal; d) Deixar claro o direito que se busca realizar (fumus bonis iuris); e) Demostrar o perigo de dano (periculum in mora); f) Dar a causa o valor do pedido principal, a fim de não recolher custas novamente. 4.3. DECISÃO E ADITAMENTO/EMENDA NOS MESMOS AUTOS Após o recebimento, o juiz irá decidir pelo: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 17 • Deferimento da TA (§ 1º): competirá ao autor, no prazo de 15 dias, promover o aditamento da inicial, a fim de transformá-la em pedido principal. • Indeferimento da TA (§ 6º): o autor deverá emendar, no prazo de 5 dias, a fim de transformá-la em uma ação principal. Caso não seja aditada/emendada, haverá a extinção do processo sem análise de mérito. 4.4. ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE 4.4.1. Funcionamento da técnica de estabilização no Brasil A técnica da estabilização foi inspirada no direito francês. Imagine, por exemplo, que o indivíduo ajuíze uma ação pedindo apenas a tutela antecipada. Há o deferimento pelo juiz. Perceba que há a satisfação para o autor. Caso réu se conforme com a concessão, haverá a estabilização. Assim, havendo concordância (ainda que tácita) tanto do autor quanto do réu, não faz sentindo que o processo prossiga. Em regra, ao conceder a tutela antecipada, caso as partes não se manifestem, haverá a estabilização. Não será necessária a confirmação por meio de sentença definitiva. O art. 304 do CPC afirma que a tutela antecipada tornar-se-á estável caso não seja interposto recurso. Contudo, nada impede que seja apresentado um pedido, através de ação revisional, a fim de desfazer a tutela antecipada. Art. 304. A tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303 , torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso. § 1º No caso previsto no caput , o processo será extinto. § 2º Qualquer das partes poderá demandar a outra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada nos termos do caput . § 3º A tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito proferida na ação de que trata o § 2º. § 4º Qualquer das partes poderá requerer o desarquivamento dos autos em que foi concedida a medida, para instruir a petição inicial da ação a que se refere o § 2º, prevento o juízo em que a tutela antecipada foi concedida. § 5º O direito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada, previsto no § 2º deste artigo, extingue-se após 2 (dois) anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo, nos termos do § 1º. § 6º A decisão que concede a tutela não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma das partes, nos termos do § 2º deste artigo. 4.4.2. Extinção e honorários CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 18 Nos termos do art. 304, § 1º do CPC, uma vez estabilizada a tutela antecipada, o juiz extinguirá o processo. Observe: Art. 304, § 1º: No caso previsto no caput, o processo será extinto. Contudo, não há menção se a extinção ocorrerá com a resolução de mérito ou sem a sua análise. Há três posições sobre a natureza jurídica da decisão do art. 304, § 1º, vejamos: 1ª C – Trata-se de hipótese de extinção sem mérito não prevista no art. 485 do CPC. O juiz não avança na análise das questões do processo, já que houve estabilização da tutela antecipada. É a que prevalece. 2ª C – é hipótese de extinção com mérito, nos termos do art. 487 do CPC. O processo seria resolvido com mérito, ainda que analisado provisoriamente (cognição sumária), porque é inegável que o juiz enfrenta a questão. 3ª C - Trata-se de uma nova categoria de sentença, no que se refereao conteúdo. Destaca-se que o advogado do autor, diante da estabilização da tutela antecipada antecedente, tem direito de receber honorários. Deve-se aplicar o art. 701, do CPC, por analogia. Art. 701. Sendo evidente o direito do autor, o juiz deferirá a expedição de mandado de pagamento, de entrega de coisa ou para execução de obrigação de fazer ou de não fazer, concedendo ao réu prazo de 15 (quinze) dias para o cumprimento e o pagamento de honorários advocatícios de cinco por cento do valor atribuído à causa. 4.4.3. Hipóteses de não cabimento da estabilização A estabilização cabe apenas para a tutela antecipada antecedente. Desta forma, não existe estabilização de tutela antecipada incidental. Além disso, a tutela cautelar antecedente não pode ser estabilizada, pois não há previsão legal, uma vez que o art. 304 do CPC não consta na parte geral das tutelas de urgência (cautelar e antecipada). Ademais, a tutela cautelar não é satisfativa, o que inviabiliza a estabilização. Igualmente, não existe estabilização da tutela de evidência, pois, o art. 304 do CPC faz referência expressa apenas à tutela antecipada, ao mencionar o art. 303. Por fim, não há impedimento para que se estabilize uma tutela antecipada contra o Poder Público. 4.4.4. Condições para não ocorrência da estabilização De acordo com o art. 304, do CPC, apenas quando houver recurso não ocorreria a estabilização. A dificuldade que surgiu na doutrina é sobre sentindo da expressão “recurso”, há dois posicionamentos: CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 19 1ª corrente: Apenas a interposição de agravo de instrumento contra a decisão antecipatória dos efeitos da tutela requerida em caráter antecedente é que se revela capaz de impedir a estabilização, nos termos do disposto no art. 304 do Código de Processo Civil. STJ. 1ª Turma. REsp 1797365-RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, Rel. Acd. Min. Regina Helena Costa, julgado em 03/10/2019 (Info 658). 2ª corrente: A tutela antecipada antecedente (art. 303 do CPC) somente se torna estável se não houver nenhum tipo de impugnação formulada pela parte contrária, de forma que a mera contestação tem força de impedir a estabilização. Apesar de o caput do art. 304 do CPC/2015 falar em “recurso”, a leitura que deve ser feita do dispositivo legal, tomando como base uma interpretação sistemática e teleológica do instituto, é que a estabilização somente ocorrerá se não houver qualquer tipo de impugnação pela parte contrária. O caput do art. 304 do CPC disse menos do que pretendia dizer, razão pela qual a interpretação extensiva mostra-se mais adequada ao instituto, notadamente em virtude da finalidade buscada com a estabilização da tutela antecipada. STJ. 3ª Turma. REsp 1760966-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 04/12/2018 (Info 639). 4.4.5. Revisão, reforma ou invalidação da tutela antecedente estabilizada De acordo com o disposto nos §2º a 4º do art. 304 do CPC, uma vez estabilizada a tutela antecipada antecedente, não há impedimento para que as partes requeiram a revisão, a reforma ou a invalidação da decisão. rt. 304, § 2º Qualquer das partes poderá demandar a outra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada nos termos do caput . § 3º A tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito proferida na ação de que trata o § 2º. § 4º Qualquer das partes poderá requerer o desarquivamento dos autos em que foi concedida a medida, para instruir a petição inicial da ação a que se refere o § 2º, prevento o juízo em que a tutela antecipada foi concedida. Salienta-se que o pedido é feito em autos apartados, bem como que a competência será do juízo em que houve a estabilização. 4.4.6. Prazo para ação revisional Nos termos do art. 304, §5º, o prazo para reforma, revisão ou invalidação é de 02 anos (decadencial), contado da intimação da sentença. Há autores que entendem que não há existência de prazo para revisão. Partem da ideia de que a cognição exauriente é uma garantia constitucional. Como a tutela antecipada foi estabilizada em uma decisão provisória, a qualquer tempo pode ser revista. 4.4.7. Coisa julgada e cabimento de ação rescisória CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 20 Após o prazo de dois anos para reforma, invalidação ou revisão, há a formação de coisa julgada? 1ªC (Marinoni): Não faz e, portanto, não cabe rescisória. Sempre cabe revisional, em qualquer prazo. 2ªC (ENFAM): Não faz e não cabe rescisória, cabe ação revisional no prazo de 02 anos – enunciado 27 da ENFAM. 3ªC (Gajardoni): Faz coisa julgada, findo o prazo de 02 anos da revisional (casos do art. 966). 5. TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE 5.1. PREVISÃO LEGAL E CONSIDERAÇÕES O CPC/15 nos arts. 305 a 310 disciplina as tutelas cautelares. Art. 305. A petição inicial da ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter antecedente indicará a lide e seu fundamento, a exposição sumária do direito que se objetiva assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Parágrafo único. Caso entenda que o pedido a que se refere o caput tem natureza antecipada, o juiz observará o disposto no art. 303 . Art. 306. O réu será citado para, no prazo de 5 (cinco) dias, contestar o pedido e indicar as provas que pretende produzir. Art. 307. Não sendo contestado o pedido, os fatos alegados pelo autor presumir-se-ão aceitos pelo réu como ocorridos, caso em que o juiz decidirá dentro de 5 (cinco) dias. Parágrafo único. Contestado o pedido no prazo legal, observar-se-á o procedimento comum. Art. 308. Efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de ser formulado pelo autor no prazo de 30 (trinta) dias, caso em que será apresentado nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar, não dependendo do adiantamento de novas custas processuais. § 1º O pedido principal pode ser formulado conjuntamente com o pedido de tutela cautelar. § 2º A causa de pedir poderá ser aditada no momento de formulação do pedido principal. § 3º Apresentado o pedido principal, as partes serão intimadas para a audiência de conciliação ou de mediação, na forma do art. 334 , por seus advogados ou pessoalmente, sem necessidade de nova citação do réu. § 4º Não havendo autocomposição, o prazo para contestação será contado na forma do art. 335 . CS - PROCESSO CIVIL 3: 2024.1 21 Art. 309. Cessa a eficácia da tutela concedida em caráter antecedente, se: I - o autor não deduzir o pedido principal no prazo legal; II - não for efetivada dentro de 30 (trinta) dias; III - o juiz julgar improcedente o pedido principal formulado pelo autor ou extinguir o processo sem resolução de mérito. Parágrafo único. Se por qualquer motivo cessar a eficácia da tutela cautelar, é vedado à parte renovar o pedido, salvo sob novo fundamento. Art. 310. O indeferimento da tutela cautelar não obsta a que a parte formule o pedido principal, nem influi no julgamento desse, salvo se o motivo do indeferimento for o reconhecimento de decadência ou de prescrição. Inicialmente, salienta-se que a tutela cautelar possui natureza conservativa. Ou seja, visa conservar o resultado útil do processo que está por vir. Como exemplos, pode-se citar: • Separação de corpos (vida), • Arresto (bens) • Exclusão do nome do devedor do rol dos maus pagadores (anulação do título). Ademais, o CPC somente disciplina a tutela cautelar antecedente, pois a incidental usa a própria estrutura do pedido principal formulado. 5.2. INICIAL SUMARIZADA Nos termos do art. 305 do CPC, são quatro requisitos. Observe: Art. 305. A petição inicial da ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter antecedente indicará a lide e seu fundamento, a exposição sumária do direito que se objetiva assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resultado