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A RELAÇÃO ENTRE PERÍCIA CRIMINAL E INVESTIGAÇÃO CRIMINAL. Patrick Edemildes de Souza[footnoteRef:1] [1: Bacharel em Direito. Universidade Estácio de Sá de Santa Catarina. E-mail: patrickrsc@gmail.com ] Noemi Back Poffo2 Resumo Este trabalho discute sobre a atual estrutura policial adotada no Brasil e a necessidade de reformulação desse sistema. A estrutura policial no Brasil foi dividida na Constituição Federal de modo que as atividades de ostensão e investigação ficam divididas entre duas instituições impossibilitando o acompanhamento da resolutividade de um crime do início ao fim. Frente à essa problemática e às altas taxas de criminalidade no país a expressão “ciclo completo de polícia” tem sido uma discussão recorrente nos debates sobre segurança pública. Há várias maneiras de implementar o ciclo completo de polícia no Brasil, no entanto não há uma estrutura ideal a ser seguida, tendo em vista que um novo modelo teria que se adequar à realidade e as demandas do país. Palavras-chave: segurança pública, criminalidade, ciclo completo, polícia. INTRODUÇÃO 2 PERÍCIA CRIMINAL NO BRASIL A perícia criminal é uma atividade típica de Estado, de caráter técnico científico, prevista no Código de Processo Penal que visa analisar vestígios para elucidação dos mais variados crimes. No Brasil a perícia criminal surgiu a partir da medicina legal, assim como na maioria dos países. No entanto devido as intensas relações entre as pessoas, bem como a complexidade dos crimes, houve a necessidade de outros profissionais de diferentes áreas do conhecimento científico passarem a produzir provas para colaborar na elucidação dos crimes. Em nosso ordenamento jurídico no artigo 158 do Código de Processo Penal (CPP) diz que: "Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado", portanto, toda infração que deixar vestígios terá a necessidade do exame pericial elaborado pelo perito oficial. Conforme preceitua Fernando Capez, “o termo "perícia", de origem latim "peritia" (habilidade especial), é um meio de prova que consiste em exame elaborado por pessoa que detém conhecimentos técnicos específicos acerca dos fatos necessários ao deslinde da causa”. A pessoa que detém de conhecimentos técnicos específicos é chamada de perito oficial, o qual é responsável pela produção da prova material, consubstanciada em laudo pericial, após a devida identificação, coleta, processamento e correta interpretação dos vestígios dentro dos limites estabelecidos pela ciência. Esta responsabilidade está descrita nos artigos 159 e 160 do CPP, que dizem: “O exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito oficial, portador de diploma de curso superior.” e "Os peritos elaborarão o laudo pericial, onde descreverão minuciosamente o que examinarem, e responderão aos quesitos formulados." Os peritos criminais desenvolvem suas atividades motivados por requisições provenientes de autoridades competentes de interesse de procedimentos pré processuais como os inquéritos policiais e processuais (processos judiciais) de natureza criminal. No entanto o perito criminal tem autonomia garantida pela lei 12030/2009, não havendo subordinação funcional ou técnica para com autoridade requisitante. Em vários estados da federação, os órgãos onde estão lotados os Peritos Criminais, não fazem mais parte da estrutura da polícia civil, resultando na autonomia administrativa, técnica e funcional. Os estados ainda vinculados são Acre (Departamento de Polícia Técnica e Científica), Amazonas (Departamento de Polícia Técnico Científica), Distrito Federal (Departamento de Polícia Técnica), Espírito Santo (Superintendência de Polícia Técnico-Científica), Maranhão (Superintendência de Polícia Técnico Científica), Minas Geral (Superintendência de Polícia Técnico Científica), Pernambuco (Gerência Geral da Polícia Científica), Piauí (Departamento de Polícia Técnico-Científica), Rio de Janeiro (Departamento Geral de Polícia Técnico-Científica), Rondônia (Polícia Técnico-Científica). 3 INVESTIGAÇÃO CRIMINAL NO BRASIL A Constituição Federal do Brasil de 1988 em seu artigo 5º no inciso XXXV diz que “ a lei não excluirá da apreciação do judiciário lesão ou ameaça a direito” (BRASIL,1988). Desta forma é obrigatório o Estado apreciar infrações à lei, tornando-o um ente soberano, titular do poder e direito de punir, quando alguém transgrede uma norma penal, desde que se respeite a garantia do devido processo legal, estampada em nossa Constituição, buscando para tanto elementos que comprovem que houve infração e quem infringiu a norma. (TOURINHO FILHO, 2011). Desta forma, uma vez cometido o crime, desrespeitando nosso ordenamento jurídico, cabe ao Estado esclarecer todas as suas circunstâncias e seus desdobramentos, tal procedimento de elucidação dos fatos é chamado de Investigação Criminal (OLIVEIRA, 2011). Após a notícia do crime, as polícias judiciárias - polícias federal e civil - passam a realizar investigações para apurar o fato e encontrar o possível autor do delito (TOURINHO FILHO, 2011). A investigação criminal tem natureza administrativa e é realizada antes da ação penal, sendo esta uma fase pré-processual servindo para formar o convencimento do responsável pela acusação penal, devendo o juiz permanecer alheio, não apreciando nenhuma prova, somente intervindo para frear ameaças ou lesões a direitos e garantias individuais, a efetividade da jurisdição e garantir os ditames constitucionais e legais (OLIVEIRA, 2011). Apesar de uma investigação criminal poder ser conduzida de diversas maneiras, é através do inquérito policial o procedimento mais comum adotado (BONFIM, 2010). O inquérito policial é um procedimento administrativo persecutório, informativo, prévio e preparatório da ação penal. O objetivo do inquérito policial é reunir todos os elementos necessários para alcançar os indícios e materialidade da autoria de um crime para futuramente fornecer um conjunto de informações para o início da ação penal. No Brasil as policias judiciárias são responsáveis pela elaboração do inquérito policial através da autoridade policial, conforme os artigos 4° e 12° do Código de Processo Penal que diz respectivamente: Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. (Redação dada pela Lei nº 9.043, de 9.5.1995) Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função. Art. 12. O inquérito policial acompanhará a denúncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou outra. O inquérito policial tem como principal objetivo a formação da opinião dos representantes do Ministério Público, mas também a colheita de provas urgentes, que podem ser perdidas após o crime, como é o caso de crimes que deixam vestígios e precisam necessariamente de perícia. Este procedimento também pode contribuir para a decretação de medidas cautelares no andamento da persecução penal, onde o magistrado pode usá-lo como base para explanar decisões ainda antes de iniciado o processo, como no caso das prisões cautelares ou na determinação de interceptação telefônica. Apesar de todo um arcabouço normativo que regem os ditames de uma investigação criminal no Brasil, um estudo realizado pela Instituto Sou da Paz publicou um levantamento em outubro de 2017 com uma amostra representativa de inquéritos de homicídios dolosos, no qual 34% geraram uma denúncia penal e apenas 5% chegaram a ser julgados. As baixas taxas de esclarecimento dos homicídios são atribuídas à preponderância de investimentos públicos em policiamento ostensivo em detrimento ao policiamento investigativo e técnico científicos. Em grande parte, as investigações de homicídios acabam baseando-se prioritariamente em indícios testemunhais e têm caráter cartorial, isso porque a perícia tende a fundamentarsomente a produção da prova técnica, a materialidade delitiva, mas não apontar a autoria do crime. Diante dessas deficiências somadas é o que caracteriza um dos fatores para impunidade no Brasil. 4 A RELAÇÃO ENTRE PERÍCIA E INVESTIGAÇÃO CRIMINAL NO BRASIL O procedimento criminal brasileiro é dividido em duas etapas, o inquérito policial e a ação penal. Na primeira fase são realizados procedimentos que visam obter elementos probatórios que demonstram a cometimento de uma infração penal e sua autoria. De outra forma o inquérito policial inquisitivo e provisório, caracteriza pelo aspecto informativo para instauração da ação penal. As provas realizadas pela perícia técnica são aceitas na fase processual, que são referentes aos exames relacionados ao delito e dificilmente podem ter seus resultados modificados ou alterados (Capez, 2003). Os dados demonstram que no Brasil quando a perícia técnica atua de uma maneira mais integrada com a investigação criminal, ou pelo menos o conhecimento criminalístico é adequadamente aplicado ao processo investigativo, é alcançado melhores resultados. Desta forma, havendo uma integração e complementariedade entre o trabalho de investigação e a perícia criminal, as investigações teriam seus valores bastante robustecido na justiça e, portanto, melhoraria a efetividade das investigações criminais, reduzindo a impunidade e ainda possibilitando a redução do tempo dos procedimentos com um melhor aproveitamento de recursos (Oliveira, 2013). Os trabalhos realizados pelas equipes de perícia são essenciais para o sucesso das investigações. O laudo pericial possui a capacidade de elucidar o que ocorreu na cena do crime, demonstrando o comportamento da vítima e as atitudes do autor. Neste sentido, dentro da investigação criminal ou processo judicial, a perícia possui uma importância muito relevante na formação do juízo pelo magistrado, não podendo nem mesmo ser dispensada pela confissão do suspeito, conforme aduz nosso CPP. A perícia no local de crime é uma diligência processual penal chamada de laudo do local, deve haver uma preservação rigorosa, a fim de resguardar todas as evidências, evitando ao máximo produzir alterações por outras pessoas que não estejam diretamente ligadas a investigação e a perícia. Cabe ressaltar que todas as provas obtidas devem ser de modo licito, de modo para que não sejam invalidadas. O perito Décio de Moura Mallmith diz que: A presença dos peritos no local do delito, todavia, não substituí as ações da autoridade policial, a qual caberá, além dos procedimentos para isolar a cena do crime e impedir o acesso de qualquer elemento alheio à equipe da perícia, ações que possibilitem a segurança dos peritos e sua equipe, viabilizando deste modo, a conclusão do trabalho pericial. Os trabalhos periciais no local de uma ocorrência findam quando o perito esgotar todas as possibilidades de exames e se der por satisfeito com os mesmos, momento em que ele autorizará à Autoridade Policial a remover a interdição do sítio do delito. A Autoridade Policial, entretanto, poderá optar por manter o local isolado, quando a interdição se mostrar imprescindível para os trabalhos preliminares de investigação. O sucesso da investigação criminal vai depender de quão eficiente será a união dos resultados da investigação com as análises da perícia. A investigação tem que buscar esclarecer os fatos investigando as pessoas e coisas, acontece que, só as pessoas cometem crimes, entretanto sempre se utilizando, alterando, eliminando e interferindo nas coisas (VILLANOVA, 1977). Portando, cabe à investigação empírica investigar as pessoas, enquanto à perícia criminal a investigação das coisas relacionadas ao crime e o sucesso da investigação só poderá ser plenamente alcançado quando as duas se complementarem harmonicamente. 5 IMPLICAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE PERÍCIA E INVESTIGAÇÃO CRIMINAL NA RESOLUTIVIDADE DOS CRIMES NO BRASIL https://jus.com.br/artigos/55855/a-investigacao-criminal-e-a-importancia-da-pericia-para-o-inquerito-policial-e-a-persecucao-penal A introdução de procedimentos técnico-científicos na investigação criminal é relativamente recente. Até meados do Século XIX somente a Medicina emprestava seus conhecimentos científicos à investigação de alguns crimes, especificamente aqueles praticados contra as pessoas. Em algumas civilizações antigas, já era comum a exigência de que um médico atestasse a causa da morte, nos crimes de homicídio, para possibilitar o processo e a condenação do assassino. A partir disso, a prática evoluiu para os crimes de lesões corporais, havendo a necessidade de que o médico fizesse exames para a constatação da extensão das lesões bem como do instrumento possivelmente causador das mesmas. No Brasil, como na grande maioria dos países, a perícia criminal surgiu a partir da Medicina Legal, que historicamente vem sendo utilizada de forma a subsidiar a investigação e o processo criminal, principalmente em decorrência da primazia que é dada aos delitos contra a pessoa. Com o aumento da complexidade das relações humanas e a evolução do conhecimento científico, as necessidades da produção da prova tornaram-se mais complexas, exigindo que outros profissionais, especialistas em outros ramos do conhecimento científico, passassem a também colaborar com o magistrado, assessorando-o naquelas áreas que envolvem conhecimentos técnicos específicos. 2.1Organização das polícias na Constituição Federal de 1988 A Segurança Pública encontra-se disciplinada no Título V, Capítulo III da Constituição da República Federativa do Brasil. Em seu artigo 144, o legislador define todas as atribuições e órgãos responsáveis por esse sistema, sendo estes divididos em: (I) Polícia federal; (II) Polícia rodoviária federal; (III) Polícia ferroviária federal; (IV) Polícias civis; (V) Polícias militares e corpos de bombeiros militares (BRASIL, 1988). Primeiramente, cabe destacar a diferença entre polícia administrativa e a polícia de segurança, sendo a primeira constituindo-se de limitações oriundas dos bens jurídicos individuais em detrimento ao interesse público, enquanto a segunda possui relação com a preservação dos bens jurídicos (SILVA ; GURGEL, 2016). Pode-se elencar ainda, a divisão entre polícia ostensiva e polícia judiciária, sendo a primeira composta pelas Polícias Militares estaduais e Polícias Rodoviárias Federais, responsáveis por prevenir os crimes e por atuar com a utilização de fardamento e viaturas caracterizadas. Já a polícia judiciária é responsável pelas investigações, apurando as infrações penais que porventura não tenham sido evitadas, neste contexto entra a atuação das Polícias Civis estaduais e a Polícia Federal (SILVA ; GURGEL, 2016). A organização estrutural atual do sistema policial compromete o desempenho das funções, tendo em vista que as polícias acabam não trabalhando de forma conjunta, pois atuam em etapas diferentes de um mesmo crime. Essa segmentação das atividades tem gerado discussões acerca das atribuições de cada uma, por não haver uma intervenção de maneira completa nos delitos, resultando na ineficiência da prevenção e resolutividade (FILHO; RIBEIRO, 2016). 2.2Criminalidade e Resolutividade de Crimes no Brasil As taxas de criminalidade no Brasil têm aumentado cada vez mais, superando problemas como a inflação, o desemprego, as taxas de juros e entre outros. É importante salientar que esse acontecimento sempre foi um dos principais reveses do país, porém ultimamente essa preocupação tem sido maior, pois a criminalidade vem, quase sempre, acompanhada de muita violência, fazendo com que o sentimento de insegurança se apodere por toda a sociedade brasileira (FERNANDES et al., 2017). Segundo os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2017 houveram 63.880 mortes violentas intencionais (que incluem homicídio doloso, latrocínio, vitimização policial, letalidade policial e lesão corporal seguida de morte), atingindo uma taxa de 30,9 mortes para cada 100 mil habitantes no país, sendoo estado do Rio Grande no Norte apresentando a maior taxa (68/100 mil) e São Paulo (10,7/100 mil) a menor dentre todas as unidades federativas do país (FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA, 2018). Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o avanço da mortalidade por homicídios no país gera uma redução na expectativa de vida na população, tendo em vista que grande parte das vítimas se caracteriza por serem adultos jovens do sexo masculino (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2014). Além disso, a alta criminalidade demanda gastos públicos devido ao atendimento das vítimas, manutenção do sistema penitenciário e do sistema judicial. No ano de 2017, as despesas públicas em decorrência da segurança pública corresponderam a 84.7 bilhões, sendo 9.7 bilhões provenientes da União, 69.8 bilhões provenientes dos Estados e 5.1 bilhões do Municípios (FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA, 2018). As discussões acerca dos motivos da criminalidade no Brasil são diversas. Nesta perspectiva, incluem-se pouco investimento em educação e saúde, políticas públicas de segurança pouco efetivas, impunidade, número insuficiente de presídios, prisões que estimulam a prática de outros delitos e baixa eficácia na resolução dos crimes (BECKER; KASSOUF, 2017). O processamento e investigação de homicídios pelas instituições que compõem a segurança pública no Brasil são ineficazes e ineficientes. De acordo com um levantamento realizado em 2012 pelo Conselho Nacional do Ministério Público, de 43.123 inquéritos monitorados pela equipe e finalizados entre março de 2010 e abril de 2012, 78% foram arquivados pela impossibilidade de identificação dos autores (CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO, 2012). As baixas taxas de resolutividade dos crimes de homicídio são atribuídas à predominância de investimentos públicos ao policiamento ostensivo em detrimento ao investigativo, fazendo com que as polícias que realizam o trabalho de investigação tenham recurso, estrutura e servidores insuficientes para desempenhar a função(CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO, 2012).Em 2014, a Polícia Civil do país possuía um efetivo total de 117.642 membros, comparado à Polícia Militar, que possuía um quantitativo de 425.248, representando esta última 66,2% do efetivo de segurança pública do país(FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA, 2015). O crescimento desordenado da criminalidade no país aliada à baixa resolutividade desses crimes tem gerado um colapso na segurança pública no Brasil (FILHO; RIBEIRO, 2016). 2.3Ciclo Completo de Polícia no Brasil A proposta descrita no artigo 144 da Constituição Federal de 1988 tem apresentado algumas disfunções relacionadas a estrutura organizacional, devido à falta de solução de continuidade no processo de atuação funcional junto à sociedade. Essa disfunção tem gerado a demanda por serviços mais ágeis, dinâmicos e com melhor qualidade que o atual modelo (BRASIL, 1988). Diante do grande problema enfrentado no Brasil no tocante a segurança pública, aliado a baixa resolutividade dos crimes, surge a reflexão sobre qual o melhor caminho para reformar as estruturas policiais do Brasil(FILHO; RIBEIRO, 2016). Para essa reflexão pode-se afirmar que o ciclo completo de polícia por si só não resolveria todos os problemas enfrentados na polícia brasileira, mas de certa forma, há um grande desejo de reforma do arcabouço institucional a partir desse modelo, tendo em vista que este padrão advém do sucesso de outros países como Estados Unidos, Canadá, França e Chile, cuja polícia é dividida somente em áreas territoriais, não existindo divisão funcional da polícia (FILHO; RIBEIRO, 2016). Em âmbito nacional, é possível verificar que a Polícia Federal já atua de modo a abranger o ciclo completo, pois suas funções abrangem ações de polícia judiciaria da União, funções de patrulhamento de fronteiras, polícia marítima e aérea (BRASIL, 1988). Se tratando do âmbito estadual, enquanto a polícia militar age de maneira ostensiva e preventiva, coibindo a ocorrência do crime, a polícia civil atua de forma investigativa, agindo após a ocorrência do delito. Essa forma estrutural não gera uma interligação entre as duas instituições e o resultado é uma sociedade com duas policias “pela metade”(BRASIL, 1988). 2.3.1 Formas de implementação de ciclo completo de polícia no âmbito estadual A literatura acerca da temática de ciclo completo de polícia traz diferentes maneiras de organização desse modelo. Segundo Sapori (2016 p. 53), três opções de implantação de ciclo completo seriam possíveis no âmbito estadual, que passam a ser expostas a seguir (SAPORI, 2016). 2.3.1.1 Unificação das Polícias Uma proposta de implantação de ciclo completo seria a junção das Policias Civis e Militares em cada unidade da Federação, criando assim uma única polícia estadual. Cada polícia estadual estaria incumbida de realizar as funções de policiamento ostensivo, preservação da ordem pública e de polícia judiciária, exercendo dessa forma o ciclo completo. Para que isto ocorra, seria necessário a determinação de um tempo específico para que cada unidade da federação pudesse se adequar ao novo modelo constitucional (SAPORI, 2016). O caminho mais fácil para essa criação, seria a junção de recursos humanos, materiais e logística das duas instituições, onde todo esse aparato passaria a compor uma nova polícia, que necessariamente receberia um nome alternativo (SAPORI, 2016). Com efeito, não é um processo simples, tal unificação afeta diretamente interesses de autoridades da área e vaidades institucionais. A cultura interna de cada corporação, representa uma grande dificuldade a ser alcançada para conseguir essa unificação (SAPORI, 2016). 2.3.1.2 Ciclo completo por tipo de crime Outra opção para implementação do ciclo completo seria a divisão policial por tipo penal, de modo que cada instituição ficaria responsável por parte dos crimes e contravenções estabelecidas no código penal, concedendo atribuições ostensivas e investigativas, tanto as policias militares, quanto as polícias civis, atuando ambas na mesma cidade (SAPORI, 2016). A literatura defende a ideia de que a Polícia Militar ficaria com os crimes de menor potencial ofensivo, cujo a pena máxima não ultrapasse dois anos e a Polícia Civil com os crimes mais violentos como os homicídios e latrocínios. No entanto, o grande problema dessa organização seria o prestigiamento de uma instituição em relação a outra, tendo em vista que determinados crimes se tornam mais relevantes do que outros, gerando, portanto, fortes oposições das autoridades polícias hierarquicamente superiores (SAPORI, 2016). Embora haja críticas a esse modelo organizacional, atualmente é possível verificar uma aproximação às práticas dessa estrutura através dos termos circunstanciados lavrados pelas Polícias Militares em alguns estados da federação (SAPORI, 2016). 2.3.1.3 Polícias Militares e Policias Civis de Ciclo Completo Uma terceira opção para implantação do ciclo completo seria o estabelecimento de funções tanto ostensivas quanto investigativas dentro de cada instituição policial, isto é, ambas as polícias, militares e civis, passariam a ter o seguimento fardado responsável pelo patrulhamento quanto o segmento investigativo, responsável pela condução dos inquéritos (SAPORI, 2016). A principal crítica a esse sistema seria à distribuição das policias entre as cidades, já que não seria conveniente as duas polícias continuarem atuando em um mesmo espaço. Isto porque não haveria uma complementariedade de trabalho entre elas. O fato de ambas as polícias realizarem tanto os trabalhos ostensivos e de investigação na mesma cidade, causaria ainda mais conflito do que o sistema atual (SAPORI, 2016). 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente trabalho trouxe uma abordagem acerca do estudo de reformulação da estrutura policial no país, tendo como proposta a implementação do ciclo completo de polícia e suas diferente formas. É importante destacar que a implementação do ciclo completo de polícia não irá resolver todosos problemas do sistema do sistema de segurança pública e justiça criminal brasileiro. E por isso, não deve ser pensada unicamente como a solução milagrosa para os graves casos de criminalidade ocorridos no país. A curto prazo a instalação de nova estrutura pode alavancar mudanças na resolutividade e prevenção dos crimes. No entanto, políticas públicas mais eficientes no país são necessárias. A segurança pública não deve ser pensada isoladamente, mas sim de maneira coletiva e interministerial, em conjunto com outros setores, como educação, saúde e desenvolvimento social. REFERÊNCIAS TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal v. 1. 33. ed. , rev.atual. São Paulo: Saraiva, 2011. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal. OLIVEIRA, João Luiz Moreira de, PERÍCIA E INVESTIGAÇÃO CRIMINAL UMA PROPOSTA DE MELHORIA DO MODELO ORGANIZACIONAL VISANDO A OTIMIZAÇÃO DE RESULTADOS. Pesquisado no dia 20/10/2016 às 15:27 em http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/11868/PER%C3%8DCIA%20E%20INVESTIGA%C3%87%C3%83O%20CRIMINAL.pdf?sequence=1 FERNANDES, Érika Tamires Ferreira, Importância da perícia no local do crime na investigação criminal. Pesquisado no dia 20/10/2016 às 15:40 em http://erikatamires.jusbrasil.com.br/artigos/153307203/importancia-da-pericia-no-local-do-crime-na-investigacao-criminal