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CBI of Miami 1 CBI of Miami 2 DIREITOS AUTORAIS Esse material está protegido por leis de direitos autorais. Todos os direitos sobre o mesmo estão reservados. Você não tem permissão para vender, distribuir gratuitamente, ou copiar e reproduzir integral ou parcialmente esse conteúdo em sites, blogs, jornais ou quaisquer veículos de distribuição e mídia. Qualquer tipo de violação dos direitos autorais estará sujeito a ações legais. CBI of Miami 3 Atenção e Linguagem: Definições e Instrumentos de Avaliação Patrícia Botelho da Silva Em contato com o ambiente, estamos a todo momento recebendo informações e estímulos de diferentes naturezas, tanto internos como nossos pensamentos quanto externos advindos do ambiente. O papel do nosso sistema nervoso é selecionar qual destas informações devem ser processadas de maneira eficiente. Sendo assim, a atenção é conjunto de funções cognitivas que possibilita selecionar estímulos do ambiente ou informações do mundo interno para processá-los e lidar de maneira mais adaptativa. A partir disso, a atenção permite a percepção de detalhes, processamento sensorial e motor mais veloz e armazenamento de informações na memória de maneira mais eficaz (Carreiro et al. 2015). Diante disso, a atenção apresenta caráter seletivo e limitado, sendo necessário mudar o foco atencional de um estímulo para outro para garantir maior eficiência ao processo, sendo que outros estímulos não selecionados são processados de maneira secundária. A partir disso, a atenção bem como outras habilidades cognitivas realiza ajustes dinâmicos e flexíveis das percepções de acordo com nossa experiencia, volição, expectativas e os objetivos relacionados às tarefas. Pensando nisso, a atenção não pode ser compreendida como um conceito único, e sim dependente de múltiplos fatores que auxiliam na compreensão dos processos perceptivos e organiza a entrada da informação em nossa consciência (Carreiro et al. 2015; Menezes et al. 2012; Miotto & Campanholo, 2019). Para a realização destes processos complexos, a atenção está relacionada com outras habilidades cognitivas como funções executivas e memória, sendo descrita como um pré-requisito para o funcionamento intelectual (Miotto & Campanholo, 2019). A partir disso, torna-se necessário diversos processos básicos, sendo eles: a seleção sensorial o que permite focalizar e alterar a seleção automática; seleção de respostas relacionadas a iniciação e inibição e controle; e capacidade atencional (alerta) e desempenho sustentado (vigilância) (Menezes et al. 2012). Quanto a sua classificação, podemos classificá-la de acordo com sua origem em processos automáticos e voluntários. A orientação voluntária está CBI of Miami 4 relacionada com a capacidade de direcionar a atenção levando em consideração se o indivíduo seleciona a fonte externa pela qual quer direcionar seus recursos de processamento (também chamada de endógena ou top- down). Já a orientação automática está relacionada com o direcionamento da atenção após evento inesperado do ambiente que atrai sua atenção de maneira não voluntária (chamada de exógena ou bottom-up) (Carreiro et al. 2015; Menezes et al. 2012). Outra classificação está relacionada com o tipo de resposta ao estímulo, sendo separada em atenção seletiva, alternada, dividida e sustentada. A atenção sustentada é a capacidade em detectar, responder aos estímulos e manter a resposta estável por um período determinado durante a realização da tarefa. A atenção seletiva está relacionada com a capacidade de se manter atento e direcionar a atenção a um estímulo, em detrimento a outros, ou seja, focar sua atenção em um estímulo. Já a atenção dividida envolve a capacidade de dividir o foco de atenção entre dois estímulos ou tarefas, sendo necessário que um dos processos seja automático ou a natureza sensorial deve ser distinta entre as duas atividades. Por fim, a atenção alternada é a capacidade em modificar o foco da atenção de um componente para outro e atender a dois ou mais estímulos ao mesmo tempo de maneira alternada sem interrupção (Miotto & Campanholo, 2019). Também podemos destacar a atenção concentrada que está relacionada com a capacidade de selecionar apenas uma informação diante de estímulos distratores em um período pré- determinado (Miotto & Campanholo, 2019). Com isso, dificuldades no direcionamento ou manutenção da atenção podem interferir na percepção de estímulos relevantes do ambiente e como iremos responder adequadamente a eles. Sendo assim, prejuízos podem interferir no aprendizado e com isso avaliações destes processos tornam-se relevantes e importantes ao longo do desenvolvimento (Menezes et al. 2012). A partir disso, a tabela a seguir apresenta os instrumentos disponíveis para avaliação no contexto brasileiro e a respectiva idade para uso e subcomponente para avaliação. Visto que a atenção envolve múltiplos processos e mecanismos distintos, é importante selecionar adequadamente os instrumentos a serem utilizados durante o processo avaliativo. CBI of Miami 5 Nome do instrumento Habilidade avaliada Idade para aplicação Teste Stroop – diferentes versões e cartões para amostra brasileira Atenção seletiva e inibição de respostas 12 a 14 anos Versão Victoria original – 7 a 10 anos e 7 a 14 anos Stroop Dia-Noite – 4 a 6 anos e 5 a 18 anos Versão Victoria modificada – 18 a mais de 70 anos e 60 a 85 anos Golden Stroop – 19 a 75 anos Teste de atenção por cancelamento Atenção seletiva e alternada 3 a 14 anos de idade Adultos: 20 a 32 anos Teste de Trilhas coloridas Atenção sustentada e dividida. 18 a 86 anos Teste de atenção concentrada AC Atenção concentrada 18 a 64 anos Teste de atenção concentrada AC – 15 Atenção concentrada por período mais longo de tempo 16 a 60 anos Teste de atenção concentrada TEACO-FF Atenção concentrada 18 a 76 anos Teste de Atenção dividida (TEADI) e teste de atenção alternada (TEALT) Atenção dividida e alternada TEADI – 18 a 73 anos TEALT – 18 a 76 anos Bateria Psicológica de Avaliação da Atenção Atenção concentrada, dividida e alternada 6 a 82 anos Teste de atenção visual – 4 (TAVIS – 4) Atenção visual seletiva, alternada e sustentada 6 a 17 anos Atenção On-line Concentrada, alternada 18 a 70 anos CBI of Miami 6 e dividida Fonte: adaptada de Miotto, et al 2018; Miotto et al. 2019 E a Habilidade de Linguagem, como Defini-la? Avaliar habilidades linguísticas torna-se relevante dentro da investigação da cognição, pois se trata de uma habilidade essencial para o processamento cognitivo geral. A linguagem é formada por um sistema que faz uso de símbolos, sons e gestos com o objetivo de promover comunicação e interação com o ambiente e construção de conceitos. Podemos classificá-la em suas modalidades oral, escrita ou de sinais (Myers, 2015). A partir disso, vale ressaltar que linguagem é diferente de fala. A linguagem é uma só apresentando modalidades especificas (oral, escrita e de sinais) (Mousinho et al., 2018). A linguagem oral se desenvolve a partir da interação entre o aparato biológico preservado e um ambiente estimulador e promotor de possibilidades de desenvolvimento (Mousinho et al., 2018). Diante disso, para que ocorra o domínio da linguagem devem ser desenvolvidos 6 seis componentesbásicos: a fonologia (conjunto de regras para o uso dos fonemas); a morfologia (regras de combinação dos fonemas em unidades de significados, morfemas); a sintaxe (regras para combinação dos morfemas); a semântica (significado da linguagem); a pragmática (regras para uso da linguagem em contexto social); e a prosódia (melodia da fala) (Miotto et al. 2018). Mas para que a habilidade de combinar palavras possa se desenvolver, primeiro é necessário armazenar as representações das palavras e seus conceitos, sendo estas representações relacionadas a cada componente. Por exemplo, para a palavra CACHORRO, preciso armazenar as características fonológicas (os sons que formam a palavra), o significado dela (semântica), como usá-la em uma frase (sintaxe), como a palavra é escrita (ortografia) entre outras. Diante disso, todas as representações das palavras são armazenadas no que é chamado de léxico mental. O léxico mental é, portanto, um repositório mental de informações sobre palavras. Assim, o processamento lexical (acesso CBI of Miami 7 a todas as representações) permite a todos compreender e produzir palavras (Gazzaniga et al., 2006). Por outro lado, a linguagem escrita necessita de ensino formal e sistemático das regras linguísticas e a percepção de que fala pode ser representada por símbolos gráficos (Mousinho et al., 2018). Desta forma, a linguagem escrita, diferente da linguagem oral, precisa ser ensinada para que os circuitos neurais possam ser construídos e especializados para processar seus estímulos, ou seja, é necessário que ocorra mudanças neurais (Scliar- Cabral, 2010). No entanto, a linguagem oral pode ser compreendida como a base para o desenvolvimento da linguagem escrita (Mousinho et al., 2018). Diante disso, habilidades preditoras relacionados a linguagem oral possibilitam a construção e desenvolvimento de processos cognitivos e neurais que auxiliam no desenvolvimento da linguagem escrita. Dentre as habilidades preditoras para o desenvolvimento da alfabetização, destacam-se a nomeação automática rápida, a consciência fonológica, a memória fonológica, vocabulário entre outras (National Early Literacy Panel [Nelp], 2009). A nomeação automática rápida é a habilidade em integrar estímulos visuais com suas representações verbais de maneira rápida e acurada. Essa habilidade envolve a integração de habilidades como percepção, movimentos oculares, atenção, funções executivas, habilidades motoras, fonológicas e verbais. É uma das principais preditoras para o desenvolvimento da linguagem escrita em conjunto com a consciência fonológica que é a habilidade em identificar, manipular e integrar sons para formar palavras (Silva et al. 2018). Para avaliação da nomeação automática rápida, atualmente só existe o teste TENA – teste de nomeação automática (Silva et al. 2018) que pode ser utilizado com crianças de 3 a 9 anos de idade. Já para a avaliação da habilidade de consciência fonológica, existem diversos testes normatizados para a população brasileira, bem como para as outras habilidades de linguagem. Assim, a seguir será apresentada uma lista com os principais testes para avaliação da linguagem oral (Miotto et al. 2018): CBI of Miami 8 • Bateria Montreal de avaliação da comunicação (MAC) – Versão abreviada: busca avaliar processos comunicativos (pragmático, prosódico, léxico- semântico e discursivo); idade de aplicação 19 a 75 anos. • Bateria Montreal-Toulousse de avaliação da linguagem: avalia as habilidades de compreensão e emissão oral e escrita de palavras, frases, sentenças e discurso principalmente em pacientes com lesões cerebrais; idade de aplicação 19 a 75 anos. • Token test reduzido: avalia a compreensão auditiva de ordens; idade de aplicação: estudos com dados para crianças 7 a 10 anos e outro para maiores de 60 anos. • Teste de nomeação de Boston: avalia o resgate lexical e vocabulário; idade de acordo com estudos brasileiros: 6 a 93 anos, 28 a 70 anos, 6 a 77 anos e 60 a 93 anos. • Teste infantil de nomeação: avalia linguagem expressiva e acesso ao léxico; idade: 3 a 14 anos. • Teste de vocabulário por figuras USP: avalia o vocabulário auditivo- receptivo; idade: 7 a 10 anos. • Prova de Consciência fonológica por produção oral: avalia a habilidade de consciência fonológica utilizando estímulos auditivos e respostas verbais; idade: 6 a 14 anos. • Prova de consciência fonológica por escolhas de figuras: avalia a habilidade de consciência fonológica por respostas não verbais; idade: 6 a 10 anos. • Teste de discriminação fonológica: avalia a discriminação de palavras fonologicamente semelhantes; idade: 3 a 6 anos. • Teste de Repetição de palavras e pseudopalavras: avaliar a memória fonológica; idade: 3 a 14 anos. • Prova de consciência sintática: avalia a habilidade de consciência sintática; idade: 3 a 14 anos. As habilidades de linguagem escrita podem ser avaliadas por meio dos seguintes testes: Teste de competência de leitura de palavras e pseudopalavras (6 a 15 anos de idade); Teste contrativo de compreensão auditiva e de leitura (6 a 11 anos); Protocolo de avaliação da compreensão de leitura (3º ao 5º ano do ensino fundamental); Prova de avaliação dos processos CBI of Miami 9 de leitura (PROLEC – 2º ao 5º ano do ensino fundamental; coleção ANELE para leitura e escrita (6 a 12 anos e adultos para a prova de escrita); Prova de escrita sob ditado (6 a 11 anos) (Miotto et al. 2018). Portanto, as habilidades de linguagem oral devem ser avaliadas no processo de investigação neuropsicológica como uma forma de investigar possíveis dificuldades que podem interferir em habilidades de linguagem escrita e desempenho acadêmico. CBI of Miami 10 Referências Bibliográficas BEAR, M. F., CONNORS, B. W., & Paradiso, M. A. (2008). Neurociências: Desvendando o sistema nervoso (3aed). Artmed. CARREIRO, L. R. R.; CANTIERE, C. N.; ARAÚJO, M. V.; SEABRA, A. G. & TEIXEIRA, M. C. T.V. (2015) Atenção como habilidade necessária para o aprendizado em contexto escolar. In: GAZZANIGA, Michael S.; IVRY, Richard B.; MANGUN, G. R. (2006) Neurociência cognitiva: a biologia da mente. 2. ed. Porto Alegre: Artmed. MYERS, David. (2015) Psicologia. 9ª ed. Rio de janeiro: LTC. MENEZES, A.; GODOY, S.; TEIXEIRA, M. C. T. V.; CARREIRO, L. R. R. & SEABRA, A. G. (2012) Definições teóricas acerca das funções executivas e da atenção. In: Seabra, A. G. & Dias, N. M. Avaliação Neuropsicológica Cognitiva: Atenção e funções executivas. V. 1. São Paulo: Memnon. MIOTTO, E. C & CAMPANHOLO, K. R. (2019) Atenção. In: Miotto, E. C; CAMPANHOLO, K. R.; SERRAO, V. T.; TREVISAN, B. T. Manual de avaliação neuropsicológica: a prática da testagem cognitiva. Vol. 2. São Paulo: Memnon. MIOTTO, E. C; CAMPANHOLO, K. R.; SERRAO, V. T.; TREVISAN, B. T. (2019) Manual de avaliação neuropsicológica: a prática da testagem cognitiva. Vol. 2. São Paulo: Memnon. MIOTTO, E. C; CAMPANHOLO, K. R.; SERRAO, V. T.; TREVISAN, B. T. (2018) Manual de avaliação neuropsicológica: a prática da testagem cognitiva. Vol.1. São Paulo: Memnon. MOUSINHO, R.; SCHIMD, E.; MESQUITA, F., & SANTOS, G. (2018). Brincando com a linguagem: Da língua oral à lingua escrita. Instituto ABCD. NATIONAL EARLY LITERACY PANEL (NELP). (2009) Developing early literacy: report of the national early literacy panel. A scientific synthesis of early literacy development and implications for intervention. Washington, DC: National Institute for Literacy. SCLIAR-CABRAL, L. (2010). Evidênciasa favor da reciclagem neuronal para a alfabetização. Letras de Hoje, 45(3), 43–47 SILVA, P. B. da, Mecca, T., & MACEDO, E. C. de. (2018). TENA Teste de nomeação automática (1st ed.). Hogrefe CETEPP.