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PPSSIICCOOLLOOGGIIAA OORRGGAANNIIZZAACCIIOONNAALL 55ºº PPEERR.. –– 22001133..22 | Psic. Tiago Rafael Reckziegel Rodrigues 08/17302 1 ESTUDO DE CASO MINHA MESA SUMIU ... e sumiram também as divisórias, o cartão de ponto e até o chefe. É assim o escritório não territorial do grupo Semco. Fonte: Revista Você S.A., Março, 2001, p. 58-63, por Juliana de Mari. O espaço, decorado com tons claros, abriga geladeira, máquina de capuccino e alguns apetrechos de cozinha. Ali, à vontade em mesinhas de bar, vários grupos conversam animadamente. Parece o local apropriado para a pausa do cafezinho. Também é - mas definitivamente não é essa sua principal utilização. Se o visitante olhar atentamente, logo descobre tomadas para conexão de telefone e computador espalhadas por todos os lados. Percebe também que, entre um gole e outro, as pessoas falam de negócios, traçam estratégias, organizam agenda. Essa pseudocopa da entrada é apenas um entre os vários ambientes que compõem o escritório não territorial do grupo Semco, de São Paulo. Há também uma aconchegante sala de estar e um tranquilo jardim-de-inverno. Sem falar das estações coletivas, onde trabalham até quatro pessoas de uma vez só - o único canto do andar térreo que guarda uma leve, muito leve, semelhança com um escritório convencional. Tamanha inovação saiu da cabeça do empresário paulista Ricardo Semler, presidente do grupo Semco, reconhecido dentro e fora do país por suas ideias arrojadas. O sistema não territorial começou a ser implantado no fim do ano passado e já conseguiu a adesão de 60 funcionários, mais da metade dos que podem participar nessa fase inicial de (des)instalação do escritório. Participa quem quer, quem está disposto a abrir mão de um espaço fixo de trabalho. Sim, funcionário que entra no esquema perde mesa, secretária, armários, telefone fixo. Ganha, porém, liberdade para escolher quando, onde, como e com quem quer dividir sua rotina. Pode decidir por qualquer um dos ambientes disponíveis no prédio-sede. Pode, também, trabalhar num dos escritórios-pulmão que o grupo está espalhando pela cidade. Atualmente, há dois em funcionamento na região da Avenida Paulista. Até 2002, serão quatro. E há ainda a tentadora opção de dar conta do recado em casa mesmo. MAS O CHEFE NÃO FICA NO PÉ? No sistema não territorial, nem se quiser um chefe da Semco vai conseguir vigiar os passos de sua equipe. Primeiro porque a empresa já adota há 15 anos o horário flexível e não há mais uma carga de trabalho semanal preestabelecida. Segundo, porque, para escolher seu território diário de trabalho, o funcionário não precisa dar satisfação para ninguém. Basta fazer uma reserva no site da empresa na Internet (se ele não preferir passar o dia resolvendo seus assuntos na copa mesmo!). O site mostra um mapa das estações coletivas instaladas no térreo e no primeiro andar e as posições que estarão livres para o dia seguinte. A reserva também pode ser feita no próprio escritório, num terminal de intranet instalado na recepção. A única regra é: não é permitido ocupar por dois dias consecutivos o mesmo lugar. Nada impede, no entanto, que dois colegas sentem lado a lado por dias seguidos. “É o fim da hierarquia física e do controle”, afirma Ricardo Semler. “Nesse desenho, as pessoas trabalham de acordo com suas necessidades, seu ritmo, seu compromisso com os resultados.” Essa chacoalhada no esquema de trabalho parte da premissa de que, quanto menos controladas, mais responsáveis as pessoas se tornam. E, se precisar localizar alguém, o chefe tem três opções: ou manda um e-mail, ou tenta no celular da pessoa, ou levanta da cadeira e sai à procura do “sumido” num dos três pavimentos do prédio. E PARA ONDE VAI A PAPELADA? Os funcionários da Semco que optaram pelo sistema não territorial tiveram de vencer na marra a batalha contra a papelada. “É uma briga feia”, diz Edi Lima, assistente de Semler. “Imaginem: eu passei 18 anos sentada no mesmo lugar, só acumulando coisas.” Edi levou semanas para colocar ordem na própria bagunça. Assim como ela, como mudam de mesa diariamente, os outros funcionários são obrigados a guardar apenas o necessário. É pouca coisa mesmo. Tem de caber numa pasta preta tipo follow-up e num arquivo sob rodas que acompanha os donos em suas andanças pelo escritório. Quando não estão sendo usados, voltam para o armário coletivo, uma espécie de estacionamento das pastas e arquivos. Nas mesas de trabalho coletivas, o espaço particular é mínimo. Suficiente apenas para um telefone e um notebook. Mas tem sempre quem dê um jeitinho de personalizar o local. A consultora de recursos humanos Flordelice Bassanello exibe, orgulhosa, fotografias dos filhos. Arrumar os porta-retratos é um ritual que ela repete todo santo dia numa mesa diferente. O SISTEMA NOVO VALE PARA TODO MUNDO? Do diretor ao trainee, todos, sem exceção podem migrar para o novo sistema - desde que a unidade à qual estejam vinculados tenha verba disponível para a compra de notebooks e celulares. Ricardo Semler acredita que a tendência de mudança é irreversível. Explica ele: “No máximo 10% das posições da empresa não se prestam a essa mobilidade. São aquelas funções ligadas à fábrica, ou PPSSIICCOOLLOOGGIIAA OORRGGAANNIIZZAACCIIOONNAALL 55ºº PPEERR.. –– 22001133..22 | Psic. Tiago Rafael Reckziegel Rodrigues 08/17302 2 extremamente burocráticas. A questão hoje é que 80% das pessoas ainda acreditam que fazem parte desses 10 %.” O primeiro escalão da Semco foi sutilmente intimado por Semler a tomar parte na mudança. Hoje, 11 dos 13 diretores não têm mais mesa fixa. Rogério Ottolia, diretor da unidade de processos, é um entusiasta da idéia. Ele, que está há 14 anos no grupo, acredita que o sistema não territorial alavanca a delegação e potencializa as horas de trabalho no escritório. “No esquema convencional, sempre há dispersão”, diz. “Há mais momentos em que você pode resolver as coisas sozinho do que aqueles em que precisa interagir com o grupo.” O raciocínio é o seguinte: se o funcionário só precisa ir ao escritório se quiser (ou quando a equipe precisar), é de esperar que, quando aparecer, aproveite e valorize ao máximo aquele momento. A ordem na Semco é focar em resultados. Assim, a hierarquia naturalmente perde o sentido, porque cada um toma para si o sucesso do negócio. Claro que isso só acontece porque lá o jogo é limpo. Todos conhecem os números (inclusive as cifras relativas à remuneração de todos os escalões), os objetivos e os planos da empresa, além de terem participação nos lucros. Até os trabalhadores do chão de fábrica participaram anos atrás de um curso para aprenderem a ler as informações contidas no balanço anual. O AMBIENTE NÃO FICA FRIO E AS AMIZADES COMPROMETIDAS? Até o que pode parecer um ponto negativo do sistema, na prática, se transforma em vantagem para todo mundo. No antigo modelo de gestão da empresa, dificilmente um corretor de imóveis, por exemplo, teria contato no dia-a-dia com alguém do departamento de pessoal. Nas mesas do sistema não territorial, o contato acontece a todo instante. Diretores de uma área sentam-se ao lado de estagiários de outra. Gente recém-contratada divide o mesmo espaço com quem está prestes a completar 20 ou mais anos de casa. Ao longo do mesmo dia, um profissional pode ter ao seu lado três, seis, nove ou seja lá quantos colegas diferentes dos mais variados setores. “As pessoas têm a chance de saber mais sobre o trabalho dos companheiros e até de oferecer ajuda”, diz Clovis Bojikia, diretor de RH do grupo, e braço direito de Semler nas inovações. “Não há rotina. Todo dia é estimulante.” Nesse ambiente de alta mobilidade, acontecem coisas curiosas. Marcello Valente, recém- contratado para a unidade de processos, estava acostumado a trabalhar numa sala só dele. Tinha um telefone próprio, realizava inúmeros negócios com clientes estrangeiros. Os clientes, ele trouxe para a Semco, mas ainda não descobriucomo se comportar num lugar onde todo-mundo-ouve-o-que-todo- mundo-diz-o-tempointeiro. Houve uma situação em que precisou ligar para a Itália. A conversa esquentou e o tom de voz dele foi aumentando. “Ele falava e gesticulava ao mesmo tempo, como faria um italiano típico. Todo o andar térreo parou para acompanhar a negociação”, conta Rogério Ottalia, o chefe do moço. “Eu não tive nem tempo de ficar envergonhado, porque o pessoal já foi dando risada, inclusive meu chefe”, conta Valente. E QUEM RESISTE À NOVIDADE, TEM VEZ? Marcello Valente não teve opção. Foi contratado e já caiu no esquema não territorial. Mas tem gente entre os veteranos da empresa que pensou em se arriscar na migração e voltou atrás. Marina Cury, gerente de negócios corporativos, é uma delas. Ela desistiu da idéia por causa do volume de papéis que consulta diariamente. “Além disso, tenho uma equipe que realmente precisa estar junta, num esquema fixo, para funcionar”, argumenta. Para Ricardo Semler, discursos como esse são esperados, mas têm eco cada vez mais fraco. “Não podemos subestimar as pessoas. É preciso deixar claro o que se espera delas e acreditar que cada um saiba de suas responsabilidades. Se existe e-mail e celular, por que não tirar proveito disso?”, questiona. “A maioria já usa a parafernália para adiantar o trabalho no fim de semana. O que estou sugerindo agora é que usem o meio da semana para ir ao Cinema.” ABAIXO AS REGRAS O escritório não-territorial da Semco é o ponto alto de um sistema que põe as relações de trabalho em xeque, mas que tem sido levado à prática por Ricardo Semler com coerência. Herdeiro dos negócios do pai, ao longo de 20 anos ele deu vez e voz aos funcionários, que agora opinam até na escolha dos chefes . Autor do best-seller internacional Virando a própria mesa, ele acredita que os negócios só cresceram porque houve espaço para as pessoas aproveitarem as oportunidades. Hoje, o grupo é formado por oito empresas (a maioria, do setor de serviços) e, no ano passado, faturou 160 milhões de dólares. Semler tem uma vaga idéia do que fazem os 13 executivos principais do grupo. Há 12 anos não interfere em nenhuma decisão, nem assina cheque em nome da empresa. Tem escritório em casa e, se for o caso, dá palpites por e-mail. Recebe 150 por dia, 80% dos quais deleta sem ler. “Eu provoco as pessoas a se tornarem auto-suficientes.”
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