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Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa Mestrado Integrado em Medicina 2009/2010 Tronco Comum V Mestrado Integrado em Medicina Oncobiologia 3º Ano Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 2 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 3 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano Índice Índice ...................................................................................................................... 3 Noções Gerais sobre Neoplasias ............................................................................... 7 Definições ..................................................................................................................... 7 Nomenclatura ............................................................................................................... 7 Biologia do Crescimento Tumoral .............................................................................. 10 Epidemiologia ............................................................................................................. 16 Bases Moleculares do Cancro ..................................................................................... 20 Agentes Carcinogénicos e a sua Interação com as Células ........................................ 34 Antigénios Tumorais ............................................................................................... 35 Mecanismos Efectores Anti-Tumorais.................................................................... 35 Efeitos do Tumor no Hospedeiro ........................................................................... 36 Classificação dos Tumores ...................................................................................... 38 Biologia e Genética das Células .............................................................................. 40 Mendel Estabeleceu as Regras Básicas da Genética .................................................. 40 Teoria da Evolução de Darwin na prespectiva Mendeliana ....................................... 40 Interligação entre Genes e Cromossomas .................................................................. 42 Alteração dos Cromossomas na maior parte dos Cancros ......................................... 42 Genótipo manifesta o Fenótipo através das Proteínas .............................................. 42 Controlo da Expressão Genética pelos Factores de Transcrição ................................ 43 A Natureza do Cancro ............................................................................................ 45 Os Tumores provêm de Tecidos Normais ................................................................... 45 Os Tumores têm origem em diversas Células Diferenciadas ...................................... 45 Outras Categorias de Tumores ................................................................................... 46 Desenvolvimento dos Tumores é Progressivo ............................................................ 47 Os Tumores são Monoclonais ..................................................................................... 48 Frequência do Cancro nas Diferentes Populações ...................................................... 50 Estilo de Vida e Aumento do Risco de Cancro ............................................................ 50 Agentes Químicos como Carcinogéneos ..................................................................... 51 Agentes Químicos e Físicos como Mutagénicos ......................................................... 51 Alguns Mutagénicos associados a Cancros Humanos ................................................ 52 Vírus Oncogénicos.................................................................................................. 54 Peyton Rous e o Vírus do Sarcoma das Galinhas ........................................................ 54 O RSV Transforma as Células em Cultura ................................................................... 55 A presença de RSV é necessária para a manter a Transformação ............................. 56 Vírus de DNA também podem ser Oncogénicos ......................................................... 57 Vírus Oncogénicos induzem alterações no Fenótipo .................................................. 57 Integração do Genoma de Oncovírus no DNA Celular ................................................ 57 O Genoma dos Retrovírus é Integrado nos Cromossomas das Células Infectadas .... 58 Gene src: Células Infectas por RSV e Células Não-Infectadas ..................................... 59 Utilização pelo RSV do Gene Celular Capturado para Transformar as Células .......... 59 Proto-Oncogenes no Genoma dos Vertebrados ......................................................... 60 Retrovírus de Transformação Lenta ........................................................................... 61 Retrovírus que Transportam Naturalmente Oncogenes ............................................ 62 Etapas da Génese Tumoral ..................................................................................... 63 Tempo de Desenvolvimento de um Tumor ................................................................. 63 Histopatologia: Evidência da Formação Faseada dos Tumores ................................. 64 Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 4 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano Mecanismo de Progressão Tumoral: Acumulação de Alterações Genéticas ............. 65 Polipose Familiar: Modelo de Progressão Tumoral .................................................... 66 Desenvolvimento Tumoral e Modelo de Darwin ........................................................ 67 Células Estaminais Tumorais ...................................................................................... 67 As Células Normais são Resistentes à Transformação por um Único Oncogene ....... 68 Transformação: colaboração entre dois ou mais genes ............................................. 69 Modelo Animal: Oncogenes e Transformação Progressiva ........................................ 70 Resistência à Imortalização e Transformação das Células Humanas ........................ 70 Contribuição dos Agentes Não-Mutagénicos ............................................................. 71 Promotores: Tóxicos e Agentes Mutagénicos ............................................................ 72 Inflamação Crónica como Promotor Tumoral ............................................................ 72 Promoção Tumoral como Determinante da Taxa de Progressão .............................. 73 Interacções Heterotípicas e Biologia da Angiogénese .............................................. 74 Células Interdependentes: Tecidos Normais e neoplásicas ........................................ 74 Tumores vs. Tecido Cicatricional ................................................................................ 75 Contributo do Estroma para a Génese Tumoral ......................................................... 77 Macrófagos: Activação do Estroma Associado ao Tumor .......................................... 77 Acesso à Circulação: Células Endoteliais e Vasos ....................................................... 78 Variação Angiogénica e Expansão Tumoral ............................................................... 79 Variação Angiogénica: um processo complexo .......................................................... 80 Supressão da Angiogénesepor Inibidores Fisiológicos .............................................. 80 Terapêuticas Anti-Angionése: uma promessa futura ................................................. 81 Oncogenes Celulares .............................................................................................. 83 Oncogenes Celulares e Oncogenes dos Retrovírus ..................................................... 83 Activação de Proto-Oncogenes .................................................................................. 83 Variações no Mecanismo: 3 vias para o gene myc ..................................................... 84 Outras Alterações na Activação de Oncogenes .......................................................... 85 Factores de Crescimento, Receptores e Cancro ........................................................ 87 Receptor do EGF como uma Tirosina Quinase ........................................................... 87 Oncoproteínas: Receptores de Factores de Crescimento Alterados ........................... 88 Factores de Crescimento como Oncogenes ................................................................ 89 Transfosforilação: modo de acção dos Receptores Tirosina Quinase ........................ 89 Proteína Ras ............................................................................................................... 90 Circuitos de Sinalização Citoplasmática .................................................................. 92 Via de Sinalização: da superfície celular para o núcleo .............................................. 92 Proteína Ras: interveniente numa complexa cascata sinalização .............................. 93 Via de Sinalização Ras: Cascata de Quinases ............................................................. 94 Vias de Sinalização da Ras: Lípidos inositol e Quinase Akt/PKB ................................. 95 Genes Supressores de Tumores ............................................................................... 98 Células Tumorais: capacidade de eliminar genes supressores de tumores ................ 98 Perda de Heterozigotia do gene Rb ............................................................................ 99 Utilização do Fenómeno de Perda de Heterozigotia .................................................. 99 Cancros Familiares: mutações nos genes supressores de tumores .......................... 100 Metilação de Promotores: inactivação de genes supressores de tumores .............. 101 pRb e o Controlo do Ciclo Celular .......................................................................... 103 Influência dos Sinais Externos na Entrada no Ciclo Celular ...................................... 103 Ciclinas e Quinases Dependentes das Ciclinas .......................................................... 104 Regulação Inibitória dos Comlexos Ciclina-CDKs ...................................................... 106 Mecanismo de Acção do pRb.................................................................................... 107 Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 5 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano Alterações do pRb nos Tumores Humanos ............................................................... 108 p53 e Apoptose .................................................................................................... 110 Papel dos Papovavírus na Descoberta do p53.......................................................... 110 O p53 como Gene Supressor de Tumores ................................................................. 110 A Versão Mutada do p53 interfere com o p53 Normal ............................................ 111 P53: um tempo de vida curto ................................................................................... 111 Vários Sinais Induzem o p53 ..................................................................................... 112 Estabilização do p53: Lesão do DNA e Desregulação dos Sinais de Crescimento .... 113 Inactivação do p53: Vantagem na Progressão Tumoral .......................................... 114 Mutações na Via do p53 e Predisposição para Tumores .......................................... 114 Apoptose ................................................................................................................... 115 Causas de Apoptose ............................................................................................. 115 Características Bioquímicas da Apoptose ............................................................ 116 Mecanismos de Apoptose .................................................................................... 116 Exemplos de Apoptose ......................................................................................... 119 Evasão à Apoptose pelas Células Tumorais .............................................................. 120 Imortalização Celular e Génese Tumoral ............................................................... 122 Registo do Número de Gerações nas Células Normais ............................................. 122 Imortalização: um requisito para a génese tumoral ................................................ 122 Papel da Telomerase na Proliferação de Células Tumorais ...................................... 123 Manutenção dos Telómeros sem a Telomerase ....................................................... 123 Manutenção da Integridade Genómica e o Desenvolvimento de Cancro ................ 124 Organização dos Tecidos: minimizar acumulação progressiva de mutações .......... 124 Células Estaminais: principal alvo da mutagénese................................................... 124 Mecanismos para Minimizar a Acumulação de Mutações em Células Estaminais .. 125 Erros originados durante a Replicação ..................................................................... 125 Lesão induzido por Processos Bioquímicos Endógenos ............................................ 126 Enzimas Reparadoras: ligação ao DNA lesado por mutagénicos ............................. 127 Defeitos Inerentes ao Mecanismo de Reparação ..................................................... 128 Invasão e Metastização ....................................................................................... 130 Fases Biológicas na Formação de Metástases ......................................................... 130 Colonização: uma etapa complexa e desafiante ...................................................... 131 Capacidade de Invasão: transição epitélio-mesenquima ......................................... 132 Indução da Transição Epitélio-Mesenquima ............................................................ 132 Invasividade: Papel das Proteases Extracelulares .................................................... 134 GTPase ras-like: adesão, morfologia e motilidade cellular ...................................... 135 Utilização dos Linfáticos como Via de Disseminação ............................................... 136 Factores que Influenciam a Localização das Metástases ......................................... 137 Metástases Ósseas: papel dos Osteoclastos e dos Osteoblastos ............................. 137 Terapêutica Racional do Cancro ........................................................................... 140 Eficiência do Desenvolvimento e Utilização das Terapêuticas ................................. 140 Diversas Respostas perante uma Terapêutica de Sucesso ....................................... 141 Proteínas como Alvo Terapêutico ............................................................................. 142 Propriedades Bioquímicas ........................................................................................ 142 Desenvolvimento de Novos Fármacos ...................................................................... 142 Desenvolvimentode Resistência à Terapêutica ....................................................... 144 Avaliação do Tumor: Marcadores Biológicos, Histológicos e Imagiológicos ............ 144 Gleevec ou Imatinib .................................................................................................. 145 Inibidores do Proteossoma ....................................................................................... 147 Trastuzumab ............................................................................................................. 148 Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 6 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano MicroRNAs ................................................................................................................ 149 Futuro: Inibidores da PARP ....................................................................................... 150 Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 7 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano Noções Gerais sobre Neoplasias No ano 2000, havia 10 milhões de novos casos de cancro e de 6 milhões de mortes por cancro no mundo. No entanto, segundo a American Cancer Society, estima-se que o cancro causou cerca de 556.000 mortes em 2003, correspondendo a 1500 mortes por cancro por dia, representando cerca de 23% de todas as mortes no EUA. No entanto existem descobertas promissoras, que nos permite que uma maior percentagem de cancros seja curada ou detida nos dias de hoje. Definições Neoplasia significa literalmente o processo de "novo crescimento", e um novo crescimento é chamado de uma neoplasia. O termo tumor foi originalmente aplicado ao inchaço causado pela inflamação. As neoplasias também podem induzir inchaços, mas esse fenómeno está habitualmente associado a processos arrastados. A Oncologia1 é o estudo dos tumores ou neoplasias. Cancro é o termo comum para todos os tumores malignos. Embora as antigas origens deste termo sejam um pouco incertas, provavelmente deriva do latim para o caranguejo, o cancro, presumivelmente porque um cancro "adere a qualquer parte que se aproveita sob uma forma obstinada como o caranguejo." O oncologista britânico Willis definiu neoplasia da seguinte forma: "Uma neoplasia é uma massa anormal de tecido, o crescimento do que excede e é descoordenada com a dos tecidos normais e persiste na mesma maneira excessiva após a cessação do estímulo que evocou a mudança. " Sabemos que a persistência de tumores, mesmo após a retirada do estímulo desencadeante, resulta de alterações genéticas hereditárias que são passadas para a descendência das células tumorais. Estas alterações genéticas permitem a proliferação excessiva e não regulamentada, que se torna autónoma, embora geralmente os tumores continuem a depender do hospedeiro para sua nutrição e suprimento sanguíneo. Como vamos discutir mais tarde, toda a população de células dentro de um tumor se origina a partir de uma única célula que tenha sofrido uma alteração genética e, portanto, os tumores são constituídos por células clonais. Nomenclatura Todos os tumores, benignos e malignos, tem dois componentes básicos: - Proliferam as células neoplásicas, que constituem o seu parênquima; - Proliferação do estroma de suporte constituído por tecido conjuntivo e vasos sanguíneos. Embora as células parenquimatosas representem a proliferação de vanguarda, ou seja, da neoplasia propriamente dita, indo por isso determinar o seu comportamento e consequências patológicas, o crescimento e evolução das neoplasias encontra-se dependente do seu estroma. A proliferação do estroma e consequente suprimento sanguíneo adequado é necessário, bem como o tecido conjuntivo fornece a estrutura para a proliferação do parênquima. Além disso, existe toda uma comunicação entre as células tumorais e do estroma que parece influenciar directamente o crescimento de tumores. Em alguns tumores, o estroma 1 Oncologia – do grego oncos que significa tumor. Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 8 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano de suporte é escasso e, portanto, a neoplasia apresenta uma superfície lisa e de consistência normal. Por vezes, as células parenquimatosas estimulam a formação de uma abundante matriz de colagénio, referido como desmoplasia. Alguns tumores, por exemplo, alguns cancros da mama são de consistência pétrea e contornos irregulares. A nomenclatura dos tumores é feita com base no seu componente parenquimatoso. Tumores Benignos Em geral, tumores benignos são designados pelo sufixo -oma anexando-o ao nome da célula de origem. Tumores de células mesenquimais geralmente seguem esta regra. Por exemplo, um tumor benigno decorrente de células fibroblásticas é denominado fibroma, um tumor cartilagínio é um condroma, e um diagnóstico de tumor de osteoblastos é um osteoma. Em contrapartida, a nomenclatura dos tumores epiteliais benignos é mais complexa, sendo as classificações diversas, algumas com base nas células de origem, outras na arquitectura microscópica, e outros ainda nos seus padrões macroscópicos. Adenoma é o termo aplicado a uma neoplasia epitelial benigna que apresenta padrões glandulares, bem como para tumores derivados de glândulas, mas não necessariamente reproduzindo um padrão glandular. Neoplasias epiteliais benignas que originem projecções da superfície epitelial, quer sejam visíveis macroscópicamente, quer microscópicamente, são referidos como papilomas. Aqueles que fazem grandes massas quísticas, como no ovário, são referidos como cistadenomas. Alguns tumores produzem padrões papilares que surgem em espaços quísticos e são designados de cistadenomas papilíferos. Quando uma neoplasia, benigna ou maligna, produz macroscopicamente uma projeção acima da superfície mucosa, por exemplo, para o lúmen gástrico ou cólico, é denominado um pólipo. O termo pólipo preferencialmente é restrito a tumores benignos. Tumores Malignos A nomenclatura dos tumores malignos basicamente segue o mesmo esquema utilizado para neoplasias benignas, com algumas adições. Tumores malignos que surgem no tecido mesenquimatoso são normalmente denominados sarcomas, porque apresentam pouco estroma de tecido conjuntivo e por isso são carnosos. Neoplasias malignas com origem nas células epiteliais, provenientes de qualquer uma das três camadas germinativas, são designados carcinomas. Os carcinomas podem ser ainda mais qualificado: - crescimento com padrão glandular é designado um adenocarcinoma; - produtor de células com aparência escamosa, em qualquer epitélio do corpo é denominado carcinoma pavimento-celular. É prática comum especificar, quando possível, o órgão de origem. Não raro, porém, um cancro composto por células indiferenciadas do tecido de origem desconhecida, deve ser designado simplesmente como um tumor maligno pouco diferenciados ou indiferenciados. Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 9 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano Frequentemente, a diferenciação divergente de uma única linhagem celular parenquimatosas num tecido origina os chamados tumores mistos. O melhor exemplo disto é o tumor misto de origem na glândula salivar. Estes tumores epiteliais contêm componentes dispersos num estroma mixóide que, às vezes, contém ilhas de cartilagem ou mesmo osso. Todos estes elementos, acredita-se, surgem a partir de células epiteliais e mioepiteliais com origem na glândula salivar, assim, a designação destas neoplasias é mais frequentemente adenoma pleomórfico. Teratomas, em contrapartida,são compostos de uma variedade de tipos de células parenquimatosas representativas de mais do que uma camada germinativa, normalmente todas as três. Estes tumores surgem a partir de células totipotentes e, portanto, são Tecido de Origem Benigno Maligno Tumores com Origem num Único Tecido Origem Mesenquimatosa Tecidos Conjuntivos Fibroma Fibrosarcoma Lipoma Liposarcoma Condroma Condrosarcoma Osteoma Osteosarcoma Endotelial Vasos Sanguíneos Hemangioma Angiosarcoma Vasos Linfáticos Limfangioma Limfangiosarcoma Sinovial Sarcoma Sinovial Mesotélio Mesotelioma Meninges Meningioma Meningioma Invasivo Células Sanguíneas Células Hematopoiéticas Leucemias Tecido Linfóide Limfomas Músculo Liso Leiomioma Leiomiosarcoma Estriado Rabdomioma Rabdomiosarcoma Epitélios Estratificado Escamoso Papiloma Pavimentoso Carcinoma Pavimentoso ou Epidermóide Células Basais Carcinoma Baso Celular Glândulas ou Ductos Adenoma Adenocarcinoma Papiloma Carcinomas Papilar Cistadenoma Cistadenocarcinoma Vias Respiratorias Adenoma Brônquico Carcinoma Broncogénico Epitélio Renal Adenoma Tubular Renal Carcinoma Renal Fígado Adenoma Hepático Carcinoma Hepatocelular Epitélio das Vias Urinárias Papilloma de Transição Carcinoma de Transcição Epitélio Placentário Mola Hidatiforme Coriocarcinoma Epitélio Testicular Seminoma Carcinoma Embironário Melanócitos Nevus Melanoma Maligno Tumores Mistos com origem Num Folheto Germinativo Glândulas Salivares Adenoma Pleomórfico Tumor Maligno Misto com Origem nas Glândulas Salivares Renal Tumor de Wilms Tumores Mistos com origem em Diversos Folhetos Germinativos Células Totipotentes Quisto Dermóide ou Teratoma Maduro Teratoma Imaturo, Teratocarcinoma Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 10 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano encontradas principalmente nas gónadas; podem ainda surgir, apesar de raramente, em células primitivas sequestradas noutros locais. Estas células totipotentes diferenciam-se ao longo de diversas linhas germinais, produzindo tecidos que podem ser identificados, por exemplo, como pele, músculo, gordura, epitélio intestinal, e mesmo estruturas dentárias. Um padrão é particularmente comum visto no Teratoma Quístico do Ovário, que se diferencia principalmente de modo a originar um tumor quístico revestido por pele repleta de cabelo, glândulas sebáceas e estruturas dentárias. Durante gerações, carcinomas de melanócitos foram chamados melanomas, embora a designação correcta seja melanocarcinomas; do mesmo modo, carcinomas de origem testicular são teimosamente designados seminomas, e hepatocarcinomas são frequentemente denominados de hepatomas. A nomenclatura dos tumores é importante porque denominações específicas têm implicações clínicas específicas, mesmo entre os tumores resultantes do mesmo tecido. Biologia do Crescimento Tumoral A história natural da maioria dos tumores malignos podem ser divididos em quatro fases: - Alteração maligna na célula alvo, referida como transformação; - Crescimento das células transformadas; - Invasão local; - Metástases distantes. Na grande maioria dos casos, um tumor benigno pode ser distinguido de um tumor maligno com grande confiança em função da morfologia, por vezes, no entanto, uma neoplasia desafia a categorização. Algumas características anatómicas podem sugerir inocência, enquanto outros apontam em direcção potencial cancerígeno. Em última análise, o diagnóstico morfológico não pode predizer o comportamento biológico ou curso clínico de uma neoplasia com certeza absoluta. No entanto, não é a regra, em geral, existem critérios morfológicos pelos quais os tumores benignos e malignos podem ser diferenciados, bem como o comportamento dos tumores pode ser previsto. Diferenciação e Anaplasia Diferenciação refere-se às células neoplásicas que se assemelham a células normais, tanto morfologicamente, como funcionalmente; a ausência de diferenciação é denominada anaplasia. Tumores bem diferenciados são compostos por células semelhantes a células normais maduras do tecido de origem da neoplasia. Os tumores pouco diferenciados têm células primitivas de aspecto indiferenciadas, constituindo células não diferenciadas. Na maior parte dos casos os tumores benignos são bem diferenciados; num tumor benigno do músculo liso – leiomioma - tão estreitamente semelhante à célula normal que pode ser impossível reconhecê-lo como um tumor por exame microscópico das células individuais. Só a massa dessas células num nódulo divulga a natureza da lesão neoplásica. As neoplasias malignas, em contraste, vão desde padrões bem diferenciados para indiferenciados. A falta de diferenciação, ou anaplasia, é considerada um marco de transformação maligna. Anaplasia implica uma reversão de um elevado nível de diferenciação Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 11 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano para um nível inferior. Na realidade, as neoplasias não sofrem este processo de regressão, surgem geralmente a partir de células estaminais que estão presentes nos tecidos especializados. A falta de diferenciação, ou anaplasia, é marcado por uma série de alterações morfológicas: - Pleomorfismo, tanto as células como os núcleos caracteristicamente exibem variação no tamanho e forma; - Morfologia Nuclear Anormal, caracteristicamente os núcleos contêm uma abundância de DNA e são extremamente corados de forma escura - hipercromáticos. Os núcleos são desproporcionalmente grande para a célula, e a relação núcleo-citoplasma pode chegar a 1:1 em vez do normal 1:4 ou 1:6. A forma nuclear é muito variável, apresentando-se a cromatina muitas vezes agregada e distribuída ao longo da membrana nuclear. Grandes nucléolos estão geralmente presentes nesses núcleos; - Mitoses, em comparação com tumores benignos e algumas neoplasias malignas bem diferenciadas, os tumores indiferenciados geralmente possuem um grande número de mitoses, reflectindo a maior actividade proliferativa das células parenquimatosas. A presença de mitoses, no entanto, não indica necessariamente que um tumor é maligno ou de que o tecido seja neoplásico. Uma característica morfológica das mitoses na neoplasia maligna é o carácter atípico, bizarro, originam uma célula tripolar, quadripolar, ou multipolar; - Perda da Polaridade, para além das anormalidades citológicas, a orientação das células anaplásicas encontra-se nitidamente pertuRbada; - Outras mudanças, outra característica é a formação de de células gigantes, algumas possuem apenas um único núcleo polimórfico enorme e outras com dois ou mais núcleos. Estas células gigantes não devem ser confundidas com as células inflamatórias de langhans ou células gigantes de corpo estranho, que são derivadas de macrófagos e contêm muitos núcleos pequenos de aparência normal. No cancro de células gigantes, os núcleos são hipercromáticos e grandes em relação à célula. O crescente número de células tumorais exige um suprimento sanguíneo, muitas vezes o estroma vascular é escasso e, em muitos tumores anaplásicos, grandes áreas centrais sofrem necrose isquémica. A displasia é encontrada principalmente em epitélios, e é caracterizada por um conjunto de mudanças que incluem uma perda de uniformidade das células individuais, bem como uma perda na sua arquitectura espacial. As células displásicas também apresentam um considerável pleomorfismo e muitas vezes contêm núcleos hipercromáticos que são anormalmente grandes para o tamanho da célula. O número de mitoses é mais abundante do que o habitual, emboraquase sempre obedeçam a padrões normais. A arquitectura do tecido pode ser desordenado, no entanto estas alterações estão confinadas a uma camada no interior do epitélio. Quando as mudanças displásicas se tornam mais evidentes e envolvem toda a espessura do epitélio, mas a lesão permanece confinado ao tecido normal, é considerado um estádio pré-cancerigeno e é referido como carcinoma in situ. Uma vez que a células tumorais avancem além dos limites normais, o tumor é dito como invasivo. Estas alterações são frequentes em fumadores de longa data e no Esófago de Barrett, caracterizando-se por uma displasia epitelial, acompanhada de metaplasia, que antecede frequentemente o aparecimento de cancro. No entanto, a displasia não tem de obrigatoriamente progredir para cancro. Alterações ligeiras a moderadas que não impliquem mudanças de toda a espessura do epitélio podem ser reversíveis, e com a remoção do estímulo desencadeador, o epitélio pode voltar ao normal. Nos casos em que os tumores se encontram bem diferenciados geralmente originam os productos normais das células que lhes deram origem; como exemplo temos um tumor nas células de um glândula endócrina, indo originar um aumento dos níveis da hormona, podendo Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 12 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano desta forma ser monitorizado o desenvolver do tumor. Em alguns casos, novas funções podem emergir. Alguns tumores podem produzir proteínas fetais, que não normalmente produzidas por células do adulto. Existem ainda casos em que tumores de origem não endócrina produzem hormonas, sendo que esta produção tomada a designação de ectópica. Taxas de Crescimento Uma questão fundamental em biologia tumoral é a compreensão dos factores que influenciam as taxas de crescimento de tumores e o papel destes factores nos resultados clínicos e respostas terapêuticas Quanto tempo leva para produzir uma massa tumoral que origine manifestações clínicas? Este cálculo é simples sendo que a célula original tem aproximadamente 10 μm de diâmetro, a população deve ser duplicada pelo menos 30 vezes para produzir cerca 109 células (pesando aproximadamente 1 g), que é a menor massa clinicamente detectável. Em contraste, ao fim de 10 ciclos estas células originam um tumor contendo 1012 células (pesando aproximadamente 1 kg), que é normalmente o máximo de tamanho compatível com a vida. Estas estimativas são mínimas, com base no pressuposto de que todos os descendentes da célula transformada manter a capacidade de se dividir e que não há perda de células durante este processo. A taxa de crescimento de um tumor é determinada por três factores principais: - o tempo de duplicação das células tumorais; - a fracção de células tumorais que estão no pool replicativa; - a taxa na qual as células são perdidas e aprisionadas no processo de crescimento. Porque o controlo do ciclo celular se encontra ausente nestas células, as células tumorais podem entrar mais facilmente no ciclo e sem as habituais restrições. A divisão nas células tumorais não implica que o ciclo celular seja completado mais rapidamente, ou seja o ciclo celular não ocorre mais rapidamente do que as células normais. Na realidade, o tempo do total do ciclo celular é para muitos tumores igual ou maior do que a de células normais correspondentes. A proporção de células do tumor no seio da população que estão na pool proliferativa é referida como a fracção de crescimento. Estudos clínicos e experimentais sugerem que, durante o início a grande maioria das células se transformaram na pool proliferativa. Com o avançar do crescimento tumoral, as células deixam a pool proliferativa em números cada vez maiores devido à ausência de adesão, à falta de nutrientes, ou apoptose, através da diferenciação e pela reversão para G0. A maioria das células no centro do cancro permanece nas fases G0 ou G1. Assim, até ao momento um tumor é clinicamente detectável, a maioria das células não estão na pool replicativa. Mesmo em alguns tumores de rápido crescimento, a fracção de crescimento é de apenas cerca de 20% ou menos. Vários ensinamentos conceptuais e práticos importantes podem ser retirados a partir de estudos da cinética das células tumorais: - Tumores de crescimento rápido podem ter uma alta rotatividade de células, o que implica que ambas as taxas de proliferação e apoptose são elevadas. Obviamente, para que o tumor cresça, a taxa de proliferação deverá ultrapassar a da apoptose; - A fracção de crescimento das células tumorais tem um profundo efeito sobre a sua susceptibilidade à quimioterapia. Porque a maioria dos agentes anticancerígenos agem em células que estão no ciclo, não é difícil imaginar que um tumor que contém 5% de todas as Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 13 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano células na pool replicativa terá um crescimento lento, mas será relativamente refractário ao tratamento com drogas que actuam durante a divisão celular. Uma estratégia utilizada no tratamento de tumores com uma baixa fracção de crescimento consiste em alterar os estado G0 das células; o que pode ser conseguido por destruição do tumor com cirurgia ou radioterapia. As células sobreviventes tendem a entrar no ciclo celular e, portanto, tornam-se sensíveis à quimioterapia. Em geral, a taxa de crescimento de tumores correlaciona-se com seu nível de diferenciação e, portanto, os tumores mais malignos crescem mais rapidamente do que as lesões benignas. Existem, no entanto, muitas excepções há esta banalização. A taxa de crescimento das lesões benigna, bem como dos tumores malignos pode não ser constante ao longo do tempo. Factores como a estimulação hormonal, a adequação do suprimento sanguíneo, e influências desconhecidas podem afectar seu crescimento. Por exemplo, o crescimento de miomas uterinos pode mudar ao longo do tempo devido a variações hormonais. Durante a gravidez, leiomiomas frequentemente entram em crescimento. Essas mudanças reflectem a resposta das células tumorais para níveis circulantes de hormonas esteróides, especialmente os estrogénios. Células Estaminais e Linhagens Celulares Cancerígenas Um tumor clinicamente detectável contém uma população heterogénea de células, que teve origem no crescimento clonal da descendência de uma única célula. No entanto, tem sido difícil identificar as células estaminais cancerígenas, isto é, as células dentro de um tumor que tem a capacidade de iniciar e sustentar o tumor. Estas conclusões têm implicações importantes para o tratamento do cancro que visem a eliminação da proliferação de células. Aparentemente, as células estaminais do cancro, similares aos seus homólogos normais, têm uma baixa taxa de replicação. Se este for o caso, as terapias para o cancro que podem eficientemente matar as células com elevadas taxas de divisão, vão permitir que as células estaminais permaneçam, deixando no local células capazes de gerar o tumor. Nestas circunstâncias, certos tumores podem facilmente re-surgir após tratamento. Invasão Local Quase todos os tumores benignos crescem como massas expansivas que permanecem localizadas no seu local de origem e não têm a capacidade de infiltração, invasão, ou metastatizam para locais distantes. Porque ao crescerem e expandirem-se lentamente, levam a que se desenvolvam uma faixa de tecido compacto, às vezes denominado de cápsula fibrosa, que os separa do tecido hospedeiro. Esta cápsula é derivada em grande parte do estroma do tecido nativo, como resultado da atrofia das células parenquimatosas sob a pressão de expansão do tumor. Esse encapsulamento não impede o crescimento tumoral, mas mantém o tumor benigno como uma discreta,facilmente palpável, e facilmente deslocável massa que pode ser cirurgicamente removido. Embora um plano bem definido de clivagem exista mais em torno de tumores benignos, em alguns, é inexistente. Assim, os hemangiomas são muitas vezes não encapsulados e pode parecer que penetram os tecidos adjacentes ao seu local de origem. O crescimento dos cancros é acompanhado pela progressiva infiltração, invasão e destruição do tecido circundante. Em geral, os tumores malignos são mal delimitados, e um plano de clivagem bem definido está ausente. A maioria dos tumores malignos é invasivo e pode, obviamente, penetrar através da parede do cólon ou de útero, por exemplo. Este tumores não reconhecem as fronteiras Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 14 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano anatómica normal. Esta capacidade invasiva torna a sua ressecção cirúrgica difícil, e mesmo se o tumor aparenta estar bem circunscrito, é necessário eliminar uma considerável margem de tecido aparentemente normal adjacente ao tumor infiltrativo. Próximo ao desenvolvimento de metástases, a invasividade é o mais fiável característica que diferencia as lesões malignas de benignas. Temos observado anteriormente que alguns cancros parecem evoluir a partir de uma pré-fase referida como carcinoma in situ. Isto frequentemente ocorre em tumores de pele, mama, e alguns outros sitios, sendo melhor ilustrado pelo carcinoma do colo uterino. Os tumores epiteliais in situ exibem as características citológicas de malignidade, sem invasão da membrana basal. Estas lesões podem ser consideradas um passo inicial de um tumor invasivo, que com o tempo, vai penetrar além da membrana basal e invadir o estroma subepitelial. Metástases Metástases são implantes tumorais descontínuos com o tumor primário. As metástases marcam inequivocamente as neoplasias como malignas, porque as neoplasias benignas não metastizam. A capacidade de invasão dos tumores permite que estes penetrem nos vasos sanguíneos e linfáticos e se disseminem por todo o organismo. Com poucas excepções, todos os cancros podem metastizam. As principais excepções são a maioria das neoplasias malignas de células gliais no sistema nervoso central – gliomas-, e carcinomas basocelulares da pele. Ambos são formas de neoplasia localmente invasiva, mas raramente metastizam à distância. É então evidente que as propriedades de invasão e metástase são independentes, no entanto ao nível molecular, invasão e metástases representam um continuo de alterações. Em geral, os tumores mais agressivos e mais rápido crescimento, têm uma maior probabilidade de virem a metastizar ou de já possuírem metástases. Aproximadamente 30% dos pacientes recém-diagnosticados com tumores sólidos (excluindo cancros da pele que não sejam melanomas) apresentam-se já com metástases. A propagação metastática reduz fortemente a possibilidade de cura, portanto, nenhuma conquista consegue conferir maior benefício aos pacientes do que métodos para bloquear a propagação às distância. Vias de Disseminação A disseminação dos tumores pode ocorrer através de uma das três vias: - Invasão directa de cavidades ou superfícies corporais; - Disseminação linfática; - Disseminação hematogénica. Embora o transplante directo de células tumorais, como, por exemplo, em instrumentos cirúrgicos, possa teoricamente ocorrer, é raro e não vamos por isso discutir este processo artificial. Invasão Directa de Cavidades ou Superfícies Corporais Na maioria das vezes está em causa a cavidade peritoneal, mas é possível em qualquer outra cavidade - pleural, pericárdica, subaracnóidea, etc. Esta característica é particularmente comum nos carcinomas originados nos ovários, originando uma superfície peritoneal revestida com uma espessa camada de tecido tumoral. Surpreendentemente, as células tumorais podem permanecer confinadas à superfície do revestimento das vísceras abdominais sem penetrar na nos órgãos em questão. Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 15 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano Disseminação Linfática Esta é a via mais comum para a disseminação inicial de carcinomas, mas os sarcomas também podem utilizar esta via. Os tumores não contêm linfáticos funcionais, mas os vasos linfáticos localizados nas margens do tumor são, aparentemente, suficientes para que a disseminação linfática se dê. A ênfase dada à disseminação linfática para carcinomas e disseminação hematogénica de sarcomas é enganosa, porque, em última instância, existem numerosas interligações entre os sistemas vasculares e linfático. O padrão de envolvimento ganglionar segue as linhas naturais de drenagem linfática. É devido a este facto que carcinomas da mama normalmente surgem na parte superior dos quadrantes exteriores, sendo geralmente os gânglios axilares os primeiros a serem afectados. Tumores do quadrante interno disseminam através de gânglios linfáticos para o interior do peito, ao longo da cadeia da artéria mamária interna. Posteriormente, os gânglios infraclavicular e supraclavicular podem estar envolvidos. No entanto, o cancro da mama é hoje considerado uma doença sistémica, mesmo no momento da detecção, sendo tratamento dirigido a ambos os locais de possível disseminação o e à erradicação das micrometástases sistémicas ocultas. Os carcinomas de pulmão decorrentes das vias respiratórias principais metastizam primeiro para os gânglios traqueo-brônquicos, peri-hilares e mediastínicos. No cancro da mama, a determinação do envolvimento dos gânglios linfáticos axilares é muito importante para avaliar a futura evolução da doença e para a selecção das estratégias terapêuticas adequadas. Normalmente, a disseminação linfática dos tumores da mama é avaliada pela realização de uma linfadenectomia axilar; uma vez que este procedimento está associado a grande morbilidade cirúrgica, a técnica de biópsia do gânglio sentinela é frequentemente utilizada. O gânglio sentinela é definido como o primeiro gânglio de um conjunto de gânglios que drena aquela região que recebe o fluxo do tumor primário. Este procedimento pode ser feito pela injecção de corantes ou rádio-marcadores, mas a combinação dessas técnicas proporciona a melhores resultados. Esta técnica também tem sido utilizada para detectar a propagação de melanomas, tumores do cólon e outros tumores. Em muitos casos, os gânglios regionais servem como obstáculos a uma maior disseminação eficaz do tumor, pelo menos por um tempo. As células podem ser retidas dentro do gânglio, podem vir a ser destruídas por uma resposta imunitário específica originando alterações na morfologia do gânglio. Assim, o aumento dos gânglios pode ser causado quer pela difusão e crescimento das células cancerosas ou pela reacção hiperplásica. Portanto, o aumento ganglionar na proximidade de um tumor não significa necessariamente disseminação da lesão primária. Disseminação Hematogénica Disseminação hematogénica é típica de sarcomas, mas também é vista em carcinomas. As artérias, com as suas paredes mais espessas, são mais dificilmente penetradas do que as veias. A disseminação arterial pode ocorrer, no entanto, é mais comum as células tumorais Fig. 1 - Fígado com metástases Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 16 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano passarem pelos capilares pulmonares, ou através shunts arteriovenosos pulmonares, ou no caso de metástases pulmonares que podem dar origem a êmbolos tumorais. Compreensivelmente, o fígado e os pulmões são os orgãos mais frequentemente envolvidos secundariamente na disseminação hematogénica. Toda a drenagem da área portal flui parao fígado, e todas as áreas drenadas pelas veias cava fluem para os pulmões. Tumores na proximidade da coluna vertebral, muitas vezes embolizam através do plexo paravertebral, sendo por isso frequentes as metástases vertebrais de carcinomas da tiróide e da próstata. Determinados tumores têm uma propensão para a invasão das veias, nomeadamente os carcinoma de células renais que frequentemente invadem os ramos da veia renal e, em seguida, progridem até à veia cava inferior, atingindo por vezes o lado direito do coração. Epidemiologia Porque o cancro é uma alteração do crescimento celular e do seu comportamento, a sua causa final tem de ser definida no nível celular e subcelular. Estudo dos padrões de cancro em populações podem contribuir substancialmente para o conhecimento sobre as origens do cancro. Por exemplo, o conceito de que produtos químicos podem causar cancro surgiu da das observações de Sir Percival Pott, que relacionou o aumento da incidência de cancro escrotal nos limpa chaminés com a exposição crónica à fuligem. Assim, os principais insights sobre a causa do câncer podem ser obtidos por estudos epidemiológicos que relacionam nomeadamente influências ambientais, hereditárias, e culturais com a ocorrência de neoplasias malignas. Além disso, certas doenças associadas com um risco aumentado de desenvolver cancro podem fornecer informações sobre a patogénese da doença maligna. Incidência do Cancro Os tumores mais comuns nos homens são próstata, pulmão e cancro colorretal. Nas mulheres, os cancros da mama, pulmão e cólon e recto são os mais frequentes. Os cancros do pulmão, mama feminina, próstata e cólon/recto constituem mais de 50% dos cancros diagnosticados e mortes por cancro nos E.U.A. Ao longo dos últimos 50 a nos, a taxa global de idade-ajustada de mortes por cancro em homens aumentou significativamente, enquanto que diminuiu ligeiramente em mulheres. O aumento nos homens pode ser largamente atribuído ao cancro do pulmão. A melhoria nas mulheres é principalmente imputável a uma diminuição significativa na mortalidade por cancro do útero, estômago, fígado, e muito em especial, ao carcinoma do colo do útero, uma das formas mais comuns de neoplasia maligna em mulheres. Preocupante é o aumento alarmante de mortes de carcinoma do pulmão, em ambos os sexos. Nas mulheres, os Fig. 2 - Incidência dos Cancros por Local e Sexo Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 17 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano carcinomas da mama ocorrem cerca de 2,5 vezes mais frequentemente do que os do pulmão. Devido à grande diferença nas taxas de cura destes dois cancros, o de pulmão tornou-se a principal causa de morte por cancro em mulheres. O declínio no número de mortes causadas por cancro uterino, incluindo o cervical, está provavelmente relacionado com diagnóstico precoce e maior cura possível graças ao Esfregaço Papanicolaou. Factores Ambientais e Geográficos Notáveis diferenças podem ser encontradas na incidência e mortalidade de formas específicas de cancro ao redor do mundo. Por exemplo, a taxa de mortalidade por carcinoma gástrico tanto nos homens como nas mulheres é de sete a oito vezes mais elevada no Japão do que nos Estados Unidos. Em contraste, a taxa de mortalidade de carcinoma do pulmão é um pouco mais de duas vezes maior nos Estados Unidos do que no Japão, e é ainda mais elevada na Bélgica do que nos Estados Unidos. Mortes por cancro da pele, principalmente causadas por melanomas, são seis vezes mais frequentes na Nova Zelândia do que na Islândia, o que se deve provavelmente a diferenças na exposição solar. Estima-se que o sobrepeso e a obesidade possam representar aproximadamente 14% das mortes por cancro em homens e 20% em mulheres. O abuso de álcool isoladamente aumenta o risco de carcinomas da orofaringe (excluindo os lábios), laringe e esófago, e, através da cirrose alcoólica, o carcinoma do fígado. Fumar, sobretudo cigarros, tem sido implicado no cancro da boca, faringe, laringe, esófago, pâncreas e bexiga, mas mais importante ainda, é responsável por cerca de 90% das mortes por cancro do pulmão. O tabagismo tem sido designado como o mais importante factor ambiental que contribui para a morte prematura nos Estados Unidos. O risco de cancro do colo do útero está associado à idade da primeira relação sexual e do número de parceiros sexuais. Estas associações apontam para um possível papel causal para transmissão de infecções virais ao nível cervical. Idade A idade tem uma influência importante sobre a probabilidade de se ter cancro. A maioria dos carcinomas ocorrem nos últimos anos de vida (≥ 55 anos). O cancro é a principal causa de morte entre mulheres com idade entre 40 a 79 e entre os homens com idade entre 60 e 79. Cada faixa etária tem sua própria predilecção para certas formas de cancro. Aqui, o notável aumento da mortalidade por cancro no grupo etário de 60 a 79 anos devem ser anotadas. O declínio das mortes no grupo etário > 80 reflecte o menor número de indivíduos que atingem essa idade. Esta tendência é esperada mudar na próxima década, com o número de indivíduos com essa idade na população a aumentar. Também a se notar é que as crianças com menos de 15 anos não são poupados. O cancro representa pouco mais de 10% das mortes neste grupo nos Estados Unidos, sendo que a leucemia aguda e as neoplasias do sistema nervoso central, são responsáveis por cerca de 60% dessas mortes. As neoplasias mais comuns na infância incluem neuroblastoma, Tumor Wilms, retinoblastoma, leucemia aguda, e rabdomiosarcomas. Predisposição Genética Evidências actuais indicam que, para um grande número de tipos de cancro, incluindo as formas mais comuns, existem não só influências ambientais, mas também predisposições hereditárias. Por exemplo, o cancro do pulmão é, na maioria dos casos claramente relacionado com tabagismo, mas a mortalidade por cancro do pulmão tem mostrado ser quatro vezes Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 18 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano maior entre os familiares não-fumadores de pacientes com cancro de pulmão do que entre os pacientes não-fumadores parentes de individuo sem cancro. Apesar da baixa frequência, o reconhecimento de predisposição hereditária para o cancro teve um grande impacto na compreensão da patogénese do mesmo. Além disso, os genes que são associados causalmente com cancros que têm uma forte componente hereditária geralmente são também envolvidos nas formas mais comuns, mas esporádicas, do mesmo tumor. Síndromes Hereditárias Autossómicas Dominantes de Cancro A mutação é herdada geralmente ocorrendo uma mutação pontual num único alelo de um gene supressor tumoral. O defeito no segundo alelo ocorre em células somáticas, geralmente como uma consequência da supressão ou recombinação num cromossoma. Na infância o retinoblastoma é o exemplo mais marcante nesta categoria, aproximadamente 40% dos retinoblastomas são herdados. Os portadores de uma mutação do gene supressor tumoral Rb têm um risco aumentado em 10000 vezes de desenvolver retinoblastoma, geralmente bilateral. Existe ainda um forte aumento do risco de desenvolvimento de um segundo cancro, especialmente o sarcoma osteogénico. A polipose adenomatosa familiar é outro distúrbio hereditário extraordinariamente marcado por um elevado risco de cancro. Os indivíduos que herdam a mutação autossómica dominante da polipose adenomatosa coli (APC) no gene supressor tumoral têm ao nascimento ou pouco depois inúmeros adenomas polipóides no cólon e, em praticamente 100% dos casos estão destinados a desenvolver um carcinoma do cólon por volta dos 50 anos de idade.Outros cancros autossómicos dominantes incluem o Síndrome Li-Fraumeni, resultante de mutações na linha germinal do gene p53, a Neoplasia Endócrina Múltipla Tipo 1 e 2 (MEN- 1 e MEN-2), e Cancro Hereditário Não-poliposo (HNPCC), uma condição causada pela inactivação de um gene reparador (MSH2 e MLH1). Como em outras condições autossómica dominante, tanto a penetrância incompleta como a expressividade variável podem ocorrer. Síndromes de Defeitos na Reparação do DNA Existe um grupo de condições predisponentes ao cancro que é colectivamente caracterizada por defeitos na reparação do DNA e consequente instabilidade do mesmo. Estas condições geralmente têm um padrão autossómico recessivo. Incluídos neste grupo estão o Xeroderma Pigmentoso, Telangectasia-Atáxica e o Síndrome de Bloom, todos eles condições raras e caracterizados por instabilidade genética resultante de defeitos nos genes de reparação do DNA. Neste grupo podemos incluir a HNPCC, no entanto este é autossómico dominante, sendo o cancro mais comum nestas síndromes, aumentando a susceptibilidade para o cancro no cólon e também em alguns outros órgãos tais como o intestino delgado, endométrio e ovário. Cancros Familiares Além da susceptibilidade nos síndromes hereditários de cancro, o cancro pode ocorrer com maior frequência em certas famílias sem um padrão bem definido de transmissão. Praticamente todos os tipos comuns de cancro que ocorrem esporadicamente também foram relatados em formas familiares. Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 19 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano As características que caracterizam estas formas de cancro incluem a idade de início precoce, tumores que surgem em dois ou mais parentes próximos do caso índice e, por vezes, tumores múltiplos ou bilaterais. O padrão de transmissão familiar do cancro não é claro. Em geral, os irmãos têm um risco relativo entre dois e três (duas a três vezes maior do que indivíduos independentes). É provável que a susceptibilidade ao cancro familiar possa depender de vários alelos de baixa penetrância, cada um contribuindo com apenas um pequeno aumento no risco de desenvolvimento tumoral. Foi estimado que 10% a 20% dos pacientes com cancro da mama ou do ovário tem um parente de primeiro ou segundo grau com um desses tumores. Embora dois genes de susceptibilidade ao cancro da mama, denominados BRCA1 e BRCA2, tenham sido identificados, as mutações nestes genes ocorre em não mais de 3% dos cancros da mama. Assim, mutações no gene BRCA1 e BRCA2 podem não contribuir para a grande proporção de cancros da mama familiares. Alterações em outros genes, provavelmente de baixa penetrância, parece ser necessária para o desenvolvimento desses tumores. Condições de Predisposição Não-Hereditária Há uma associação bem definida entre certas formas de hiperplasia endometrial e carcinoma endometrial e entre displasia cervical e carcinoma cervical. A mucosa brônquica metaplásia e displásica dos fumadores habituais são considerados antecedentes do carcinoma broncogénico. Cerca de 80% dos hepatocarcinomas surgem em fígados cirróticos, os quais são caracterizados por uma regeneração parenquimatosa activa. Inflamação Crónica e o Cancro Esta condição é exemplificada pelo aumento do risco de cancro em pacientes afectados por uma variedade de doenças inflamatórias crónicas do tracto gastro-intestinal. Os mecanismos precisos que ligam a inflamação e o desenvolver de cancro não foram ainda estabelecidos. As reacções crónicas podem levar à produção de citocinas que estimulam o crescimento das células transformadas. Em alguns casos, a inflamação crónica pode aumentar o pool células estaminais nos sujeitos, estando estas mais sujeitas à incidência de mutagénicos. Curiosamente, a inflamação crónica pode também directamente promover instabilidade genómica nas células através da produção de espécies reactivas de oxigénio (ROS), o que predispõe à transformação maligna. Seja qual for o mecanismo preciso, essa ligação pode ter implicações práticas. Por exemplo, a expressão da enzima Ciclooxigenase-2 (COX-2), que converte ácido araquidónico em prostaglandinas, é induzida por estímulos inflamatórios e encontra-se aumentada em tumores do cólon e de outros. O desenvolvimento de inibidores de COX-2 para tratamento do cancro é uma área de investigação activa e promissora. Condições Pré-Cancerígenas Esta designação é um pouco correcta, porque na grande maioria destas lesões não se desenvolve uma neoplasia maligna. No entanto, o termo persiste porque chama a atenção para o risco aumentado. Algumas formas de neoplasia benigna também constituem condições pré-cancerígenas. Apesar de alguns riscos poderem ser inerente, uma grande experiência acumulada indica que a maioria das neoplasias benignas não se tornam malignas. A generalização é impossível, porque cada tipo de tumor benigno está associado a um determinado nível de risco variando de quase nunca a frequente. Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 20 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano Bases Moleculares do Cancro Esta é uma área onde as descobertas continuam a multiplicar-se, dia a dia que passa, o que torna difícil seleccionar quais os conhecimentos mais importantes e relevantes. A lesão não letal está na base da carcinogénese, as quais podem ser adquiridas através da acção de agentes ambientais, tais como produtos químicos, radiações ou vírus, ou por outro lado, poderão ser herdadas. O termo "ambiental", utilizado neste contexto, envolve qualquer defeito adquirido causado por agentes exógenos ou endógenos derivados de produtos do metabolismo celular. No entanto nem todas as mutações são induzidas por factores ambientais, algumas podem ser espontâneas e estocásticas. Um tumor é formado pela expansão clonal de uma única célula precursora que tenha onde tenha ocorrido o dano genético, ou seja, os tumores são monoclonais. As principais classes de genes que são alvo de mutação no cancro são: - Proto-oncogenes – Promotores do Crescimento Celular; - Genes Supressores de Tumores; - Genes Reguladores da Apoptose; - Genes Envolvidos na Reparação do DNA. Os alelos mutantes de proto-oncogenes são considerados dominantes porque só por si podem transformar uma célula normal em tumoral. Em contraste, os genes supressores de tumores são considerados recessivos, pois é preciso que ambos os alelos estejam mutados para que haja transformação fenotípica, no entanto nesta classe existem excepções. No caso dos genes que regulam a apoptose podemos encontrar ambas as condições. No caso dos genes envolvidos na reparação do DNA estes podem ter uma acção directa alterando a proliferação celular, ou indirectamente condicionar a capacidade dos organismos para inibir o crescimento ou regular a apoptose, por lesão nestas classes de genes. Alelos mutantes de proto-oncogenes são consideradas dominantes porque transformar células apesar da presença de uma contrapartida normal. Em contraste, ambos alelos normais dos genes supressores tumorais devem ser danificado para que ocorra a transformação, para esta família de genes é por vezes referido como oncogenes recessivos. No entanto, existem excepções a esta regra, e alguns genes supressores tumorais supressores Fig. 3 - Bases Moleculares do Cancro Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 21 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano perder sua actividade quando um único alelo é perdido ou inactivado. Esta perda de função de um gene recessivo de danos causados por um único alelo é chamado haploinsuficiencia. Os genes que regulam apoptose podemser dominante, tal como são os proto-oncogenes, ou podem comportar-se como genes supressores tumorais. Nestes casos uma mutação num gene reparador pode predispor a mutação no genoma e consequente transformação neoplásica – fenótipo mutador. Com algumas excepções, ambos os alelos do gene reparador devem estar alterados para que haja esta condição. A carcinogénese é um processo, tanto a nível fenotípico como genético com múltiplos patamares. Uma neoplasia maligna fenotípicamente tem vários atributos, tais como o crescimento excessivo, invasividade local, bem como a capacidade de formar metástases distantes. Estas características são adquiridas de forma faseada, num fenómeno denominado progressão tumoral. Ao nível molecular, a progressão deve-se ao acumular de lesões no genoma, o que, em alguns casos, é favorecido por defeito na reparação do DNA. Alterações Essenciais para a Transformação Maligna Cada um dos genes envolvidos no cancro tem uma função específica, a desregulação dos quais contribui para a origem ou progressão da doença maligna. É tradicional para descrever os genes que causam neoplasias, com base na sua presumível função: - Auto-suficiência nos Sinais de Crescimento, os tumores têm a capacidade de proliferar sem estímulos externos, geralmente como consequência da activação de um oncogene; - Insensibilidade aos Sinais Inibitórios do Crescimento, os tumores podem não responder às moléculas que inibem a proliferação de células normais, como TGF-β, e inibidores directos da ciclina dependente de quinases; - Evasão da Apoptose, os tumores podem ser resistentes à morte celular programada, como consequência da inactivação do gene p53 ou outras alterações; - Defeitos na Reparação do DNA, os tumores podem falhar na reparação das lesões no DNA resultante de agentes cancerígenos ou de uma proliferação celular desregulada; - Potencial Replicativo Ilimitado, as células tumorais têm uma capacidade proliferativa ilimitada proliferativa, associada à manutenção do comprimento do telómero e função da telomerase; - Angiogénese Mantida, os tumores não são capazes de crescer sem formação de um suprimento vascular, o qual é induzido por vários factores, sendo o mais importante o Factor de Crescimento Endotelial Vascular – VEGF; - Capacidade de Invadir e Metastizar, as metástases tumorais são a causa da grande maioria das mortes por cancro e dependem de processos que são intrínsecos à célula ou são iniciados por sinais a partir do tecido ambiente. Ciclo Celular Nomal As células que não se encontram em divisão estão na fase G0 do ciclo celular e precisam ser recrutados para a fase G1 e para além dela, a fim de se dar a replicação. A evolução ordenada das células através das várias fases do ciclo celular é orquestrada por ciclinas e CDKs – Quinases Dependentes de Ciclinas -, e pelos seus inibidores. As CDKs conduzem o ciclo celular por fosforilação das proteínas-alvo críticas que são exigidas para a progressão das células para a próxima fase do ciclo celular. As CDKs são expressas constitutivamente durante o ciclo celular, mas numa forma inactiva. Estas são activadas por fosforilação após vinculação à família de proteínas designadas ciclinas. Em contraste com as CDKs, as ciclinas são sintetizadas durante fases específicas do ciclo celular, e sua função é activar as CDKs. Após a conclusão desta tarefa, os níveis de ciclina sofre um declínio rápido. Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 22 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano Mais de 15 ciclinas foram identificadas, no entanto as Ciclinas D, E, A, B são as que aparecem sequencialmente durante o ciclo celular e se ligam a uma ou mais CDKs. Ciclina D e Fosforilação do RB A Ciclina D é a primeira ciclina a aumentar no ciclo celular, aparece em meados de G1, mas já não é detectável na fase S. Durante a fase G1 do ciclo celular, a ciclina D liga-se a e activa a CDK4, formando o complexo Ciclina D-CDK4. Este complexo tem um papel fundamental no ciclo celular por fosforilar a Proteína do Retinoblastoma. A fosforilação do Rb é um botão liga-desliga para o ciclo celular. No seu estado hipofosforilado, o Rb impede que as células se repliquem por inactivar o complexo com o Factor de Tanscrição E2F. A fosforilação do RB dissocia o complexo e retira a inibição sobre a actividade do E2F. Assim a fosforilação do RB elimina a principal barreira à progressão do ciclo celular e promove a replicação celular. Para que este controlo seja possível o Rb recruta descetilase de histonas, uma enzima que provoca a compactação da cromatina e a inibição da transcrição. Quando este mecanismo é inibido pela fosforilação do Rb são transcritos genes referentes a proteínas fundamentais para a transição para a fase S, nomeadamente: Ciclina E, DNA Polimerases, Timidina Cinase, Dihidrofolato Redutase, entre outros. Durante a fase M, os grupos de fosfatos são removidos do Rb pelas fosfatases celulares, e desta forma regressa ao estado hipofosforulado do Rb. Progressão do Ciclo Celular no Ponto de Restrição G1/S A progressão entre a fase G1 para S envolve a formação de um complexo activo entre a Ciclina E e CDK2. O E2F activo aumenta a transcrição de Ciclina E e das polimerases necessárias para a replicação do DNA, estimulando, assim, síntese do DNA. Fig. 4 - Ciclo Celular Normal Fig. 5 - Presença das Ciclinas/CDKs durante o Ciclo Celular Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 23 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano A próxima decisão no ciclo celular é o ponto de transição G2/M. Esta transição é iniciada pelo E2F e mediado pela transcrição da Ciclina A, que vai formar o complexo Ciclina A- CDK2 , este por sua vez regula os eventos no profase mitótica. O principal mediador que assegura a propulsão do ciclo celular além da profase é o complexo Ciclina B-CDK1, que é activado por uma proteína fosfatase - CDC25 - e que começa a acumular-se no núcleo, no início profase. A activação do complexo Ciclina B- CDK1 provoca a ruptura do invólucro nuclear e inicia a mitose. Complexos de CDKs com as Ciclinas A e B regulam alguns dos eventos críticos na transição G2/M, tais como a diminuição da estabilidade dos microtúbulos, a separação dos centrossomas, e a condensação dos cromossomas. Sair da mitose requer a inactivação do complexo Ciclina B-CDK1. A actividade dos complexos Ciclina-CDK, é estreitamente regulada por inibidores, denominados Inibidores das CDK. Existem duas classes principais de inibidores das CDK: a família Cip/Kip e a INK4/ARF. A família Cip/Kip tem três componentes - p21, p27 e p57 - que ligam-se e inactivam os complexos formados entre ciclinas e CDKs. Activação transcricional do p21 está sob o controle de p53, um gene supressor tumoral que está mutado numa grande proporção dos cancros humanos. O principal papel do p53 no ciclo celular é o de vigiar, desencadeando checkpoint que abrandam ou param a progressão do ciclo celular em células lesadas, chegando mesmo a causar a apoptose em lesões irreversíveis. A família INK4a/ARF codifica duas proteínas, p16INK4a e p14ARF, que bloqueiam o ciclo celular e agem como supressores de tumores. O p16INK4a concorre com ciclina D para ligação a CDK4 e inibe a capacidade do complexo Ciclina D-CDK4 complexo para fosforilar RB, provocando assim a detenção do ciclo celular em G1. O gene do INK4a codifica um segundo produto, o p14ARF, que actua sobre o p53. Checkpoints do Ciclo Celular O ciclo celular tem os seus próprios controlos internos, denominados checkpoints. Existem dois checkpoints principais, um na transição G1/S e outro em G2/M. A fase S é o ponto de não retorno no ciclo celular, e antesde uma célula fazer o compromisso final para se replicar, o checkpoint G1/S faz o controlo das lesões no DNA. Se as lesões estiverem presentes, a maquinaria e os mecanismos de reparação do postos em movimento. O atraso na progressão do ciclo celular, prevê o tempo necessário para o reparo do DNA, se o dano não é reparado, a via apoptótica é activada. Fig. 6 - Esquema do papel das Ciclinas e CDKS na transição G1/S Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 24 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano Assim, o checkpoint G1/S impede a replicação de células que têm defeitos no DNA, o que seria perpetuado como mutações cromossómicas ou interrupções na génese da célula. O checkpoint G2/M controla a replicação do DNA e verifica se a célula pode iniciar com segurança a mitose e a separação das cromátides irmãs. Esta verificação é particularmente importante nas células expostas à radiação ionizante. Os defeitos neste checkpoint podem dar origem a anomalias cromossómicas. Para funcionar correctamente, os checkpoints do ciclo celular exigem sensores de lesão no DNA, transdutores de sinal, e efectores moleculares. Os sensores e transdutores de lesões do DNA parecem ser semelhantes para o G1/S e G2/M. A detenção do ciclo celular em G2/M envolve tanto mecanismos dependentes do p53 como independente. Sinais de Crescimento Auto-Suficientes: Oncogenes Os genes que promovem o crescimento celular em células neoplásicas autónomas denominados oncogenes, e os seus homólogos celulares normais são designados proto- oncogenes. Os proto-oncogenes são os reguladores fisiológicos da proliferação e diferenciação celular. Os oncogenes são caracterizados pela capacidade de promover o crescimento celular na ausência de sinais mitogénicos normal. A sua produção nas células transformadas torna-se constitutiva, ou seja, não dependente de factores de crescimento ou outros sinais externos. Sob condições fisiológicas, a proliferação celular pode ser facilmente resumida através das seguintes etapas: - A ligação de um factor de crescimento ao seu receptor específico geralmente localizados sobre a membrana celular; Fig. 7 - Principais Genes Associados ao Cancro Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 25 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano - A activação transitória e limitada do receptor do factor de crescimento que, por sua vez, activa várias proteínas transductores de sinal; - Transmissão do sinal através do citosol para o núcleo através de segundos mensageiros ou pela activação directa de moléculas que activam a transcrição; - Indução e activação de factores nucleares que regulamentam o início da transcrição do DNA; - A entrada e a progressão da célula no ciclo celular, resultando na divisão celular. Proto-oncogenes, Oncogenes, e Oncoproteínas Uma das primeiras sequências oncogénica no cancro foi detectado numa forma mutante do proto-oncogene RAS. Um grande número de proto-oncogenes foram identificados durante os últimos 20 anos, a maioria dos quais não têm uma contrapartida viral. Os proto-oncogenes podem ter múltiplas funções, no entanto todos participam em funções celulares relacionadas com o crescimento e proliferação. As proteínas codificadas por proto-oncogenes podem funcionar como factores de crescimento ligantes ou receptores, transdutores de sinal ou factores de transcrição. As oncoproteínas codificadas por oncogenes geralmente servem funções similares à dos seus homólogos normais, no entanto, porque são constitutivamente expressa, as oncoproteínas dotam a célula com capacidade de crescimento auto-suficiente. Para resumir, os proto-oncogenes podem ser convertido em oncogenes celulares - c- oncs - que estão envolvidos no desenvolvimento tumoral. Factores de Crescimento Muitas células neoplásicas podem desenvolver crescimento auto-suficiente, adquirindo a capacidade de sintetizar os mesmos factores de crescimento aos quais são responsivas. O proto-oncogene sis, que codifica a cadeia de β do PDGF, encontra-se sobreexpressa em muitos tumores, especialmente nos astrocitomas e osteosarcomas de baixo grau. Além disso, parece que os mesmos tumores também expressam receptores para PDGF e são, portanto, responsivas à estimulação autócrina. Embora autócrino este loop é considerado como um elemento importante na patogénese de vários tumores, na maioria dos casos, o gene do factor de crescimento em si não se encontra alterado ou mutado. Mais frequentemente, os produtos de outros oncogenes como o ras causam sobreexpressão dos genes do factor de crescimento, forçando assim as células a secretar grandes quantidades de factores de crescimento como, por exemplo, TGF-α. Este factor está relacionado com o crescimento do Factor de Crescimento Epidérmico - EGF - e induz a proliferação pela sua ligação ao receptor EGF. O TGF-α é frequentemente detectado em carcinomas, como os astrocitomas que expressam elevados níveis de receptores EGF. Apesar de esta condição ser encontrada num grande número de tumores, o aumento da produção do factor de crescimento, por si só não é suficiente para a transformação neoplásica. A proliferação celular de forma aumentada, com toda a probabilidade, contribui para o fenótipo maligno, aumentando o risco de mutações espontâneas ou induzidas na população celular. Receptores para Factores de Crescimento Vários oncogenes que codificam receptores do factor de crescimento foram encontrados. Para entender como estas mutações afectam a função desses receptores, convém recordar que vários receptores de factores de crescimento são proteínas Faculdade de Medicina de Lisboa Tronco Comum V - Oncobiologia Página 26 de 150 Mestrado Integrado em Medicina – 3º Ano transmembranar com um domínio externo ligando-obrigatório e um domínio citoplasmático tirosina quinase. Nas formas normais desses receptores, a quinase é transitoriamente activada pela ligação específica dos factores de crescimento, seguindo-se rapidamente uma dimerização do receptor e fosforilação de vários substratos que são parte da cascata de sinalização. A oncogénese associada a estas alterações envolve a constitutiva dimerização e activação sem carácter vinculativo para o factor de crescimento. Assim, os receptores mutantes emitem sinais mitogénicos de forma contínua para a célula. Estas alterações podem ser originadas por alterações na estrutura do receptor, o que conduz a uma activação sem estímulo precedente, no entanto é muito mais comum a superexpressão das formas normais destes receptores. Em formas esporádicas de carcinomas papilares da tireóide, o c-MET encontra superexpessado em quase todos os casos. Nesses tumores, o aumento da expressão do c-MET não é causado por uma mutação genética, mas como consequência de uma maior transcrição do gene. Proteínas Transdutoras de Sinal A maioria destas proteínas estão estrategicamente localizadas no folheto interno da membrana plasmática, onde recebem sinais provenientes do exterior da célula e transmitem- nos ao núcleo da célula. O melhor e mais bem estudado exemplo de uma oncoproteínas transductora de sinal é a RAS pertencente à família das Proteínas Acopladas ao GTP. Oncoproteína RAS Estas proteínas foram descobertos como sendo produtos de oncogenes virais. Vários estudos indicam que as RAS desempenham um papel importante na mitogénese induzida por factores de crescimento. As RAS activadas actuam sobre o precursor da MAP Cinase, recrutando a proteína citosólica RAF-1. As MAP Cinases activadas são alvo dos factores de transcrição nucleares e, assim, promovem a mitogénese. Além das RAS, outros membros da Cascata de Sinalização RAS (RAS/RAF/MERK/ERK) também poderão
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