Prévia do material em texto
UNIGRANRIO – Afya Débora Janaína Medicina
IESC VI
R E S U M O P A L E S T R A S
Medicina
UNIGRANRIO|Afya | @debora j ana ia
UNIGRANRIO – Afya Débora Janaína Medicina
Sumário
Semana 02: Sistemas de Classificação e Registro na APS – Data: 27/01/2027 ........................................... 1
Semana 03: Diagnóstico e Manejo da Obesidade na APS – Data: 03/02/2025 .......................................... 5
Semana 04: Diagnóstico e Manejo da Diabetes Melito na APS – Data 10/02/2025 ................................. 14
SEmana 05: Diagnóstico e Manejo da Hipertensão Arterial na APS – DATA: 17/02/2025 ........................ 30
Semana 06: Diagnóstico e manejo da Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) na APS – Data:
24/02/2025 ............................................................................................................................................ 43
Semana 07: Manejo da Dispepsia e Refluxo na APS – Data: 10/03/2025 ................................................ 55
Semana 08: Atenção à saude do homem – Data: 17/03/2025 ................................................................. 70
Semana 09: População Privada de Liberdade – Data: 31/03/2025 .......................................................... 76
Semana 11: Manejo das Anemias na APS – Data: 07/04/2025 ................................................................ 83
Semana 13: Políticas Públicas de Saúde Voltadas Para População Negra– Data: 21/04/2025 ................. 91
Semana 14: Manejo das Tonturas e Vertigens na APS – Data: 28/04/2025 ............................................ 94
Semana 15: Manejo das Diarreias e Constipação na APS – Data: .......................................................... 104
Semana 16: Diagnóstico e Acompanhamento das Principais Parasitoses Intestinais na APS – Data: ..... 118
Semana 17: Abordagem das Infecções das Vias Aéreas Superiores, Resfriado Comum e Gripe na APS –
Data: .................................................................................................................................................... 124
Semana 18: Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PNAISM) – Data: 21/04/2025 . 125
Semana 19: Diagnóstico e Acompanhamento do Corrimento Vaginal/Uretral – Data: .......................... 133
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
1
SEMANA 02: SISTEMAS DE
CLASSIFICAÇÃO E REGISTRO
NA APS – DATA: 27/01/2027
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
• Sistemas de classificação na atenção primária à
saúde – Prontuário eletrônico do SUS
(PEC)/SOAP/CIAP-2;
• Registro de saúde orientado por problemas.
Objetivos Específicos
• Entender o SOAP;
• Rever os sistemas de informação em saúde (E-SUS,
prontuário eletrônico);
• Aplicar os sistemas de classificação na APS.
Anamnese SOAP
A primeira parte de uma consulta sempre será uma entrevista
clínica, com roteiros e formatos diferentes, de acordo com a
profissão ou especialidade médica. Essa entrevista deve ser
transcrita de acordo com a subjetividade do paciente.
O método SOAP é uma técnica estruturada e amplamente
utilizada por profissionais de saúde para registrar
informações clínicas de um paciente, com o objetivo de
facilitar o diagnóstico, o acompanhamento e o tratamento.
SOAP é um acrônimo, e cada uma dessas etapas tem um
papel específico no processo de anamnese e na
documentação do estado clínico do paciente.
S – Subjetivo
Refere-se a informações fornecidas pelo paciente ou seus
familiares, que são subjetivas e não verificáveis de forma
objetiva. Inclui a queixa principal (QP), história da doença
atual (HDA), sintomas, duração dos sintomas, fatores que
agravam ou aliviam os sintomas, entre outros. Podemos
anotar além das queixas, os sentimentos.
Cabe aos profissionais, conduzir essa entrevista com
perguntas (quanto mais abertas, melhor), para entender
as necessidades do paciente e para iniciar o raciocínio
clínico.
Para facilitar a escrita, podemos dividir o subjetivo em 3
partes:
• Entrevista clínica: nessa parte podemos utilizar
roteiros específicos de cada especialidade ou
profissão. E, incluir dados de antecedentes
pessoais, antecedentes familiares, hábitos de
vida etc. O importante é que devemos utilizar a
terceira pessoa do singular (ex. paciente refere
que...) para a descrição, pois sempre devemos
colocar o que foi narrado sob o ponto de vista do
paciente.
• Motivos da consulta: essa parte pode ser
registrada em um espaço em separado (ou
destacado na própria anamnese). Colocamos
todos os motivos que levaram a pessoa à
consulta.
Essa organização serve de guia para consulta.
Lembrando-se sempre que no subjetivo tudo que importa
é o ponto de vista do paciente e não o nosso, e pode ser
muito interessante priorizar os motivos da consulta,
principalmente quando são muitos, de acordo com o que
o paciente achar importante.
Quando o paciente vem pela primeira vez em consulta
conosco, com um determinado motivo de consulta, só que
quando interrogado relata outras questões como
tabagismo, nesse caso, esses problemas entram como
motivos da consulta, e devem ser descritos, também,
como antecedentes pessoais na história, sendo que esse
registro deve ficar na folha de rosto. A partir da segunda
consulta, caso o paciente já tenha o tabagismo listado na
folha de rosto dos seus problemas ativos, o tabagismo só
entra novamente como motivo da consulta caso o paciente
venha especificamente para tratar dessa questão
novamente, ou esse assunto seja gerado pelo profissional.
O – Objetivo
Inclui dados observáveis, mensuráveis e verificáveis, como
sinais vitais, exames físicos, resultados de exames
laboratoriais ou de imagem. São informações que o
médico coleta durante o exame físico e os testes
realizados.
Não cabe nesse momento interpretações, e nada pode ser
interferido pelo que o paciente narrou. O objetivo serve
apenas para apoiar o raciocínio clínico, a partir dos
motivos de consulta do paciente, e possíveis suspeitas
diagnósticas. Mesmo que não tenham sido trazidos como
motivo de consulta. Por exemplo, realizar a palpação da
tireoide, mesmo se o paciente não tiver queixas.
O objetivo é dividido em apenas duas partes:
• Exame físico: onde descrevemos todo exame
realizado, incluindo sinais vitais e dados
antropométricos. Mesmo os sinais do exame
físico que possam dar margem a interpretação,
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
2
como a intensidade de uma bulha cardíaca.
Devemos utilizar cruzes para tentar deixar o mais
objetivo possível.
• Resultado de exames complementares: todos
os resultados de exames trazidos pelo paciente
devem ser anotados, mesmo aqueles que não
tenham sido solicitados por nós, porém que
possam auxiliar no raciocínio clínico.
A – Avaliação
É o momento da concretização das hipóteses e dos
diagnósticos. O médico faz uma interpretação clínica das
informações coletadas nas fases subjetiva e objetiva,
formulando um diagnóstico ou uma lista de possíveis
diagnósticos diferenciais. A avaliação também pode incluir
a evolução do quadro ou o prognóstico.
Caso não haja elementos para elaborar um diagnóstico
preciso durante a consulta, aqui podem ser reproduzidos
novamente os sinais/sintomas mais pertinentes para
nossa linha de raciocínio clínico. Enfim, o problema pode
ser tanto um sinal, sintoma ainda sem diagnóstico,
síndromes etc., quanto um diagnóstico definido. No
primeiro caso, necessariamente deveremos colocar uma
ou mais hipóteses diagnósticas correspondentes.
Importante salientar, que nessa parte do registro não
iremos listar todos os problemas do paciente, pois esses
outros problemas não relacionadosdo terceiro fármaco dependerá
das características clínicas ou da situação
socioeconômica de cada paciente.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
29
Quando Referenciar
Sempre que o médico de família tiver alguma dúvida em
relação à indicação de insulina ou não se sentir seguro para
instituir essa terapia, é prudente referenciar o paciente para o
endocrinologista de referência.
Todos os pacientes se beneficiam da orientação de um
nutricionista, bem como das orientações para o autocuidado
e para a autoaplicação de insulina realizada pelos
profissionais de enfermagem.
O exame de fundo de olho sob midríase realizado por
oftalmologista deve ser feito no diagnóstico e repetido
anualmente.
Quando há deformidade dos pés e/ou hiperceratose plantar,
história de ulceração dos pés, doença vascular ou neuropatia
significativa, o referenciamento deve ser feito para os
respectivos serviços de referência, sendo que a claudicação
limitante e a dor em repouso configuram urgências que
precisam ser avaliadas dentro de 48 horas pelo cirurgião
vascular.
Deve-se referenciar para o nefrologista os pacientes com TFG
de risco ou doenças já estabelecidas. Não há uma causa
definida para o seu desenvolvimento, mas diversas
características estão associadas a ela, bem como às doenças
cardiovasculares propriamente ditas, como, por exemplo, o
sedentarismo, a história familiar, a obesidade, o tabagismo,
as condições socioeconômicas desfavoráveis.
Agravantes:
• Dislipidemia;
• Obesidade abdominal;
• Intolerância a glicose;
• Diabetes melitos.
Associações Frequentes
A HAS isolada, ou relacionada a outros fatores de risco,
associa-se a um risco aumentado de doenças
cardiovasculares, sobretudo as doenças cerebrovasculares e
as doenças isquêmicas cardíacas.
• Morte súbita;
• Acidente vascular encefálico;
• Infarto agudo do miocárdio;
• Insuficiência cardíaca;
• Doença arterial periférica;
• Doença renal crônica;
• Cardiomegalia.
Causas da Hipertensão Arterial
• Genética;
• Idade: com o envelhecimento, a PAS torna-se um
problema mais significante, resultante do
enrijecimento progressivo e da perda de
complacência das grandes artérias.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
32
• Sexo: faixas mais jovens é mais elevada entre
homens, mas a elevação pressórica por década se
apresenta maior nas mulheres.
• Etnia;
• Sobrepeso/obesidade;
• Ingestão de sódio: a literatura científica mostra que
a ingestão de sódio está associada a DCV e AVE,
quando a ingestão média é superior a 2 g de sódio,
o equivalente a 5 g de sal de cozinha.
• Sedentarismo;
• Álcool;
• Fatores socioeconômicos;
• Medicações: inibidores da monoaminaoxidase e os
simpatomiméticos, como descongestionantes nasais
(fenilefrina), antidepressivos tricíclicos (imipramina e
outros), hormônios tireoidianos, contraceptivos
orais, anti-inflamatórios não esteroides,
carbexonolona e liquorice, glicocorticoides,
ciclosporina, eritropoietina.
• Drogas ilícitas: cocaína, cannabis sativa, anfetamina
e 3,4-metilenodioximetanfetamina (MDMA).
Diagnóstico
Diante de um caso suspeito de hipertensão, a primeira
abordagem deve ser a de tranquilizar a pessoa, estabelecer
uma comunicação efetiva sobre o problema, esclarecer
dúvidas, desmedicalizar e planejar a realização das medidas
de PA, para minimizar possíveis vieses desta etapa. Tendo em
vista que o rótulo de hipertensão costuma ser considerado
permanente, é fundamental realizar uma avaliação integral,
estabelecer o vínculo e permitir a longitudinalidade e o
watchful waiting (observação vigilante). Nesta etapa, é comum
que muitos casos sejam falso-positivos, constituindo-se uma
ótima oportunidade para a prevenção quaternária.
Durante o processo longitudinal de tomada de medidas de PA,
podem-se obter as análises laboratoriais pertinentes, como
glicemia e creatinina, e eletrocardiograma (ECG) (é comum
que pseudocrises hipertensivas apresentem palpitações – ou
“batedeira no peito” – como sintomas relatados). Porém,
deve-se tomar cuidado com a realização de outros exames
sem que haja uma motivação consistente para isso, de forma
que ecocardiograma, Holter, radiografia torácica são
exames que poderão ser considerados se houver indicação
específica e quando o diagnóstico de HAS já estiver
consistentemente estabelecido, uma vez que fazem parte da
avaliação das complicações (lesão de órgãos-alvo) e não são
critérios diagnósticos.
Anamnese
A avaliação subjetiva deve ser bastante valorizada. Obter
informações sobre o momento de vida, as condições
socioeconômicas e os relacionamentos pessoais podem
auxiliar na identificação de fatores estressores
frequentemente confundidos com “pressão alta”. As
informações sobre estilo de vida, hábitos de atividade física,
hábitos alimentares, uso de cafeína, álcool, tabaco e outras
drogas, história familiar de doenças cardiovasculares em
familiares de primeiro grau (pai/mãe e irmãos antes dos
55/65) também são importantes, bem como a avaliação de
história pessoal de doenças cardiovasculares manifestas
prévias (infarto, angina, acidente vascular cerebral [AVC]) e
outros problemas de saúde previamente diagnosticados. O
diagnóstico deverá ocorrer após pelo menos três medidas em
dias e horários diferentes, com a média da PA ³ 140/90
mmHg, a partir de avaliação médica.
Exame Físico
O controle da PA deve ser idealmente verificado a partir de
registros domiciliares, e o apoio da equipe de enfermagem
pode ser necessário. Estratégias como o uso de diários de
pressão domiciliares são válidas, ainda mais em um contexto
com dificuldade de acesso à MAPA.
De acordo com o protocolo do National Institute for Health and
Care Excellence (NICE), 14 medidas domiciliares realizadas
duas vezes ao dia, no mesmo horário, por 7 dias consecutivos
se aproximam da MAPA.
O mesmo procedimento deveria ser realizado para o
diagnóstico ambulatorial com medidas feitas na unidade de
saúde, sempre com duas medidas consecutivas, com intervalo
de pelo menos 1 minuto entre elas, com a pessoa sentada.
O esfigmomanômetro padrão-ouro é o de mercúrio, que tem
sua comercialização cada vez mais restrita. Os aneroides
devem ser calibrados pelo menos uma vez ao ano, e alguns
estudos atestam a acurácia dos digitais de braço que também
devem ser calibrados periodicamente.
A PA é parâmetro fundamental na avaliação do indivíduo
atendido devido a uma emergência, mas este não é o caso da
consulta de seguimento do hipertenso, que inclui as seguintes
ações:
• Estabelecer o índice de massa corporal (IMC) e a
circunferência abdominal para o cálculo do risco
cardiovascular.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
33
• Deverá ser realizada a medida da frequência cardíaca
(FC) e a ausculta cardíaca.
• Realizar exame físico geral, pois alguns estigmas
podem indicar causas secundárias de HAS, como
hipertireoidismo e síndrome de Cushing.
• Realizar exame cardiovascular, para auxiliar na
suspeita de lesão de órgãos-alvo, como nas doenças
ateroscleróticas, no aneurisma de aorta abdominal e
na insuficiência cardíaca. Entretanto, deve-se tomar
cuidado, pois o valor diagnóstico de alguns achados
de exame físico em pacientes assintomáticos é
geralmente muito baixo e inespecífico. O exame de
fundo de olho é importante também nesta etapa.
Rastreamento:
Deve ser realizado em todos os usuários com mais de 18
anos, independente do motivo da consulta.
• PA £ 120/80 mmHg: bianual;
• PA > 120/80 ede Reynolds: é uma ferramenta que considera
fatores adicionais, especialmente útil para mulheres.
Além dos fatores tradicionais, inclui:
• Níveis de Proteína C-Reativa (PCR);
• História familiar de doenças cardiovasculares
precoces.
Assim como o escore ASCVD, o escore de Reynolds pode ser
calculado por meio de uma calculadora online que leva em
conta os fatores mencionados.
Exames Complementares
Após a definição do diagnóstico de hipertensão, os seguintes
exames devem ser incluídos na avaliação inicial:
• Glicemia de jejum – Anual;
• Colesterol total e frações – Anual ou 3 meses após
iniciar estatinas;
• Triglicérides
• Creatinina sérica – Anual ou após 2 semanas do
início/aumento da dose de captopril/Losartana;
• Sedimento urinário;
• Microalbuminúria;
• Potássio;
• ECG em repouso.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
34
Frequência de acompanhamento e exames
A frequência de acompanhamento da pessoa hipertensa
sugerida pelo Caderno de Atenção Básica é baseada no risco
cardiovascular de base:
• Baixo risco cardiovascular ( 20% em 10 anos): consulta a cada 4
meses.
A frequência de exames sugerida pelo Ministério da Saúde é
anual, porém não há uma base forte de evidência para estas
recomendações.
Tratamento
A ESF tem papel fundamental no diagnóstico e sucesso do
tratamento. É necessário educação para o autocuidado,
dúvidas sobre condição clínica, a modificação do estilo de vida
(MEV), aspectos psicossociais e elaborar junto com o usuário
o seu plano.
A promoção à saúde é o caminho que tem mostrado melhores
resultados, por meio da redução de sódio nos alimentos
industrializados, de políticas públicas para desmotivação do
tabagismo e do uso abusivo de álcool, da promoção à prática
de atividades físicas por meio de medidas de mobilidade
urbana, e de oferta de locais para isso, entre muitas outras
ações. Tais medidas precisam atingir a maior parte da
população com políticas públicas de qualidade e de longa
duração.
As orientações dietéticas nas consultas médicas ocupam
bastante tempo e não parecem muito eficazes quando não
surgirem por interesse da pessoa. A “perseguição ao saleiro”
desvia o foco das maiores fontes de sódio presentes na
alimentação humana: os produtos industrializados.
Em nível individual, a abordagem da HAS deve respeitar a
avaliação global do risco cardiovascular. Embora o risco
cardiovascular possa identificar indivíduos de maior risco, seu
resultado não deve ser usado como regra de decisão para a
prescrição de tratamentos. Identificando-se o perfil de uma
pessoa, pode-se priorizar a abordagem de acordo com o
componente do risco mais representativo.
A pessoa hipertensa não deve ser estimulada a pensar que
sua condição é permanente e incurável, uma vez que isso
poderá desestimular sua adesão ao plano terapêutico. As
dificuldades de adesão devem ser encaradas como problemas
a serem compreendidos na perspectiva do médico e da
pessoa, e não como “rebeldia do paciente”.
Tratamento Não Farmacológico
Englobam uma série de mudanças de estilo de vida, como
aumento da atividade física, perda de peso, dieta mais
saudável (com restrição de sódio, sobretudo de alimentos
industrializados), cessação do tabagismo, redução de uso
excessivo de álcool. Tais medidas em geral são difíceis de
implementar individualmente, pois dependem não apenas da
força de vontade das pessoas, mas também do contexto
socioeconômico e cultural em que vivem. Assim, um erro
comum é culpar os pacientes por seus hábitos de vida não
saudáveis e prescrever de forma autoritária e persecutória
modificações de estilo de vida que muitas vezes são
inatingíveis.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
35
Tratamento Farmacológico
Deve-se lembrar de que o tratamento medicamentoso de HAS
no estágio 1 – PAS entre 140-160 mmHg e PAD entre 80-90
mmHg – não oferece benefícios de mortalidade sobre o
placebo. Além disso, metas menores do que 140x90 mmHg
não trazem benefício, pelo menos para pessoas sem outras
comorbidades. Ou seja, para pacientes com hipertensão
estágio 1, o tratamento medicamentoso pode não ser
necessário se não houver risco claro de complicações, já que
ele não traz benefícios evidentes em relação à redução da
mortalidade. Ainda, metas de pressão abaixo de 140/90
mmHg podem não ser mais benéficas para pacientes sem
outras doenças associadas (comorbidades), e o objetivo deve
ser controlar a pressão de maneira equilibrada, sem tentar
forçar uma redução excessiva.
A tomada de decisão para iniciar o tratamento farmacológico
da HAS e a escolha dos medicamentos devem levar em conta
as comorbidades da pessoa, o perfil de efeitos colaterais e o
seu benefício na prevenção de desfechos adversos, como
infartos e derrames.
As medicações de primeira escolha para o tratamento da HAS
são diuréticos tiazídicos, inibidores da enzima conversora da
angiotensina (IECA), bloqueadores dos canais de cálcio (BCC)
e antagonistas dos receptores da angiotensina II (ARB II).
Medicamentos mais utilizados e disponíveis no SUS
Medicações anti-hipertensivas disponíveis na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename)
Classe – Mecanismo de Ação Fármaco Concentração Dose
mínima
Dose
máxima
Tomadas
ao dia
Diuréticos tiazídicos: agem na porção
inicial do túbulo contorcido distal.
consiste na redução do volume
extracelular pela interação com um
cotransportador de NaCl (SLC12A3)
sensível a tiazidas expresso no túbulo
contorcido distal do rim, intensificando a
excreção urinária de Na+ e resultando em
diminuição do débito cardíaco.
Hidroclorotiazida 12,5 mg e 25 mg 12,5-25 mg 50 mg 1
Agentes poupadores de potássio:
atuam por meio de inibição reversível do
canal epitelial de Na+ (CENa) na
membrana do túbulo distal,
Espironolactona 25 mg e 100 mg 25 mg 100 mg 1-2
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
36
transportador responsável pela
reabsorção de Na+ em troca de K+.
Betabloqueadores seletivos: tem como
principal alvo os receptores beta-
adrenérgicos:
• Beta-1(β1): predominam no
coração, sua ativação aumenta
a FC (cronotropismo +), a força
de contração do coração
(inotropismo +) e a condução
do impulso elétrico
(dromotropismo +).
Os betabloqueadores seletivos
bloqueiam os receptores beta-1 no
coração, resultando na redução da
frequência cardíaca, da força de
contração e da velocidade de condução
do impulso elétrico, o que diminui a carga
de trabalho do coração, a pressão
arterial e a demanda de oxigênio. Esses
efeitos tornam os betabloqueadores
seletivos eficazes no tratamento da
hipertensão, insuficiência cardíaca,
arritmias e angina, ao aliviar o esforço
cardíaco e melhorar a perfusão
sanguínea.
Atenolol
50 mg e 100 mg 25 mg 100 mg 1-2
1-2
Succinato de
metoprolol
25, 50 e 100 mg 25-100 mg 200 mg 1-2
Tartarato de
metoprolol
100 mg 25-100 mg 200 mg 1-2
Agentes alfa e betabloqueadores:
possui um mecanismo de ação
combinado, atuando tanto
nos receptores alfa quanto
nos receptores beta do sistema nervoso
simpático. São não seletivos e agem
bloqueando tanto os receptores beta-
1 no coração, reduzindo a frequência
cardíaca, a força de contração e a
condução do impulso elétrico, quanto os
receptores beta-2, o que pode afetar a
broncodilatação e a vasodilatação,
embora de forma menos pronunciada.
Além disso, ele bloqueia os receptores
alfa-1 nos vasos sanguíneos,
promovendo vasodilatação e ajudando a
reduzir a resistência vascular periférica, o
que diminui a pressão arterial. Esses
efeitos combinados tornam essa classe
eficaz no tratamento de condições como
HAS, IC e angina.
Carvedilol 3,125, 6,25, 12,5
e 25 mg
12,5 mg 50 mg 1-2
Betabloqueadores não seletivos:
bloqueiam tanto os receptores
adrenérgicos beta-1, encontrados
principalmenteno miocárdio, quanto os
beta-2, encontrados no músculo liso, nos
Propanolol 10 e 40 mg 40 mg 240 mg 2-3
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
37
pulmões, nos vasos sanguíneos e em
outros órgãos.
• Beta-1(β1): predominam no
coração, sua ativação aumenta
a FC (cronotropismo +), a força
de contração do coração
(inotropismo +) e a condução
do impulso elétrico
(dromotropismo +).
• Beta-2 (β2): Localizam-se
principalmente nos pulmões e
nos vasos sanguíneos, onde sua
ativação provoca
broncodilatação e
vasodilatação.
Antiadrenérgicos de ação central: atua
no sistema nervoso central para reduzir a
atividade do sistema nervoso simpático.
Ele é convertido em α-
metilnoradrenalina, que ativa
os receptores alfa-2 adrenérgicos,
inibindo a liberação de noradrenalina e
diminuindo a atividade simpática,
resultando em vasodilatação e redução
da pressão arterial, sendo eficaz no
tratamento da hipertensão,
particularmente em gestantes.
Metildopa 250 mg 500 mg 1.500 mg 2-3
Bloqueadores seletivos de canal de
cálcio – diidropiridínicos: atuam
bloqueando os canais de cálcio tipo L nas
células musculares lisas dos vasos
sanguíneos, o que reduz a entrada de
cálcio nas células e promove
a vasodilatação. Isso leva à redução da
resistência vascular periférica,
diminuindo a pressão arterial e aliviando
a angina. Esses medicamentos têm um
efeito predominante nos vasos
sanguíneos, com impacto mínimo
na frequência cardíaca e contratilidade
cardíaca.
Anlodipino 5 e 10 mg 5 mg 10 mg 1
Nifedipino 10 mg 20-40 mg 60 mg 3
Bloqueadores seletivos de canal de
cálcio – não diidropiridínicos:
bloqueiam os canais de cálcio tipo L no
coração, com maior afinidade para os
canais do nódulo sinoatrial e nódulo
atrioventricular, resultando em redução
da frequência cardíaca (efeito
cronotrópico negativo), diminuição da
contratilidade cardíaca (efeito inotrópico
negativo) e redução da condução
elétrica (efeito dromotrópico negativo),
Verapamil 80 e 120 mg 80-120 mg
480 mg 2-3
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
38
sendo úteis no tratamento
de taquicardias e arritmias. Além disso,
causam vasodilatação nos vasos
sanguíneos, ajudando a reduzir
a pressão arterial, sendo eficazes no
tratamento de hipertensão e angina.
Agentes que atuam no músculo liso
arteriolar: age diretamente no músculo
liso das arteríolas,
promovendo vasodilatação ao bloquear
canais de cálcio ou inibir a liberação de
cálcio, o que reduz a resistência vascular
periférica e diminui a pressão arterial.
Esse efeito é útil no tratamento
da hipertensão e alivia a carga sobre
o coração. A vasodilatação pode
desencadear uma resposta
compensatória do corpo, ativando o
sistema renina-angiotensina-aldosterona
(SRAA), o que pode levar à retenção de
sódio e água, sendo necessário o uso
de diuréticos ou betabloqueadores para
evitar aumento de volume sanguíneo.
Além disso, a hidralazina pode diminuir
o retorno venoso ao coração, reduzindo
a pressão venosa central e auxiliando no
tratamento da insuficiência cardíaca.
Hidralazina 25 e 50 mg 25 mg 200 mg 2
IECA (Inibidores da enzima conversora
da angiotensina): têm como ação
principal a inibição da enzima conversora
de angiotensina I, responsável a um só
tempo pela transformação de
angiotensina I em angiotensina II
(vasoconstritora) e pela redução da
degradação da bradicinina
(vasodilatadora). Os IECAs diminuem os
níveis de angiotensina II e aumentam os
níveis de bradicinina. Portanto, ocorre a
vasodilatação de arteríolas e veias.
Reduzindo os níveis de angiotensina II
circulante, os IECAs também diminuem a
secreção de aldosterona, resultando em
menor retenção de sódio e água. Os
efeitos desses fármacos ainda atuam
diminuindo pré-carga e pós-carga
cardíaca, reduzindo, dessa forma, o
trabalho cardíaco.
Captopril 25 mg 25 mg 200 mg 2
Enalapril 5, 10 e 20 mg 5 mg 40 mg 1-2
ARB (Antagonista dos receptores da
angiotensina II): antagonizam a ação da
angiotensina II pelo bloqueio específico
dos receptores AT1, responsáveis pelas
ações próprias da angiotensina II
(vasoconstrição, estímulo da proliferação
Losartana 50 mg 25 mg 100 mg 1
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
39
celular e da liberação de aldosterona). Ao
antagonizar os efeitos da angiontensina
II, esses agentes não peptídicos relaxam
o músculo liso, provocam vasodilatação,
aumentam a excreção renal de sal,
reduzem o volume plasmático e diminuem
a hipertrofia celular. Seus efeitos
farmacológicos são simulares aos do
IECAs por produzirem dilatação arteriolar
e venosa e bloqueio da secreção de
aldosterona, reduzindo, assim, a pressão
arterial e diminuindo a retenção de sal e
água.
Fonte: Adaptada de Brasil.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
40
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
41
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
42
Combinações
Preferenciais
Diuréticos tiazídicos +
ARB
Diuréticos tiazídicos +
BCC
Diuréticos tiazídicos
+IECA
ARB + BCC
BCC + IECA
Combinação Não
Recomendada
IECA + ARB
OBS1.: apesar de amplamente usados, estudos com
betabloqueadores mostraram piores desfechos em
comparação com outras classes e benefício muito discreto em
relação ao uso de placebo. Apesar disso, outras revisões
mostram que os betabloqueadores podem ter efeito mais
importante em pessoas jovens, podendo ser considerados
opção terapêutica nestes pacientes.
OBS2.: é necessário ter um julgamento clínico no momento de
escolha do anti-hipertensivo. Por exemplo: uma pessoa
hipertensa com crises frequentes de enxaqueca pode
beneficiar-se do betabloqueador, já que, além do controle da
pressão, pode oferecer profilaxia para as crises de enxaqueca.
Em pessoas com diabetes melito (DM) ou doença renal
crônica (DRC), os IECAs e os ARBs são a preferência devido
ao seu efeito nefroprotetor. Em indivíduos de raça negra,
dá-se preferência a diuréticos tiazídicos ou a BCC.
Urgência Hipertensiva
Quando encontramos um paciente assintomático, porém com
pressão “muito alta”, ³ 180x110 mmHg é uma condição
comumente chamada de urgência hipertensiva, sendo em
geral sugerido o uso de alguma medicação para baixar
rapidamente a pressão desta pessoa. Por mais que tal valor
possa causar espanto, alguns estudos mostram que essa
situação é comum em pacientes ambulatoriais e que na
ausência de sinais objetivos de lesão de órgão-alvo, a pessoa
pode ser manejada na APS com segurança.
Quando a pessoa estiver na UBS com PA elevada, sem
sintomas específicos de lesão de órgão-alvo, a proposta é:
• Tranquilizar a pessoa e a equipe de atendimento.
• Verificar o motivo de medida de pressão: algum
sintoma específico? Rotina? Mediu em outro local e
se assustou?
• Tratar causas de elevação de PA, como dor e
ansiedade, as quais são denominadas pseudocrise
hipertensiva.
• Checar adesão do paciente ao esquema de
medicação anti-hipertensiva, se já for hipertenso
crônico diagnosticado.
• Solicitar medidas de pressão realizadas em outros
cenários (p. ex., medidas domiciliares) para melhor
avaliar o controle de PA e ajustar a medicação
posteriormente, ou excepcionalmente já ajustar as
medicações de uso contínuo.
• Realizar registro adequado e relatório médico do
atendimento para seguimento com o médico de
referência do paciente.
Quando Referenciar
Hipertensão de difícil controle: com, no mínimo, três
medicações de classes diferentes em doses adequadas e após
avaliar adesão.
Hipertensão secundária: dependendo da condição do serviço
e da segurança clínica, o médico de família e comunidade pode
iniciar a investigação na APS e referenciar em um segundo
momento.
Emergências hipertensivas: aqui, ressalta-se que o grupo
emergências hipertensivas reúne diferentes diagnósticos.
Nesses diagnósticos, o papel do médico de família e
comunidade é reconhecer a emergência, prestar os cuidados
iniciais e referenciar a pessoa ao serviçode emergência. São
exemplos de emergências hipertensivas: infarto agudo do
miocárdio e síndromes coronarianas agudas, AVC isquêmico
ou hemorrágico, dissecção de aorta, edema agudo de pulmão,
encefalopatia hipertensiva e eclâmpsia.
Bibliografia
GUSSO, Gustavo; LOPES, José M C.; DIAS, Lêda C. Tratado de
medicina de família e comunidade - 2 volumes: princípios,
formação e prática. 2. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2019. E-
book. p.1392. ISBN 9788582715369.
BRASIL. Sociedade Brasileira de Cardiologia. Diretriz Brasileira
de Hipertensão Arterial 2020. Arquivos Brasileiros de
Cardiologia, v. 115, n. 3, p. 1-87, 2020.
Slides do Professor Paulo
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
43
SEMANA 06: DIAGNÓSTICO E
MANEJO DA DOENÇA
PULMONAR OBSTRUTIVA
CRÔNICA (DPOC) NA APS –
DATA: 24/02/2025
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
• Compreender o diagnóstico e manejo da doença
pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) na APS.
Objetivos Específicos
• Conhecer os fatores de risco, prevalência e impactos
da DPOC;
• Compreender a história natural da DPOC;
• Abordar diagnóstico, exames, diagnóstico diferencial;
• Conhecer as abordagens terapêuticas da DPOC no
âmbito da Atenção Básica;
• Reconhecer o manejo das exarcebações,
comorbidades associadas, bem como
encaminhamento ao especialista.
DPOC
A DPOC é o termo usado para descrever uma obstrução das
vias aéreas devido à bronquite crônica ou ao enfisema
pulmonar. Essas duas moléstias estão presentes no mesmo
paciente, podendo predominar os sintomas de uma ou outra.
O grau de obstrução das vias aéreas e a quantidade de tecido
danificado determinam a severidade da doença.
A DPOC é uma doença muito prevalente, subdiagnosticada,
subtratada e pouco percebida. É uma doença multissistêmica
e tratável. O tratamento é efetivo para as manifestações
respiratórias da DPOC.
A definição atual da GOLD 2017 foi simplificada, passou a
incluir especificamente sintomas persistentes e declara que
“[...] a DPOC é uma doença comum, passível de prevenção e
tratamento, caracterizada por sintomas respiratórios e
limitação ao fluxo aéreo persistentes, decorrentes de
anormalidades das vias aéreas e/ou alveolares, em geral
causada por exposição significativa a partículas ou gases
nocivos [...]”. A definição anterior enfatizava o componente
extrapulmonar (inflamação sistêmica) da DPOC, que se tem
mostrado importante do ponto de vista clínico, pois contribui
para a gênese das comorbidades e confere aos portadores de
DPOC um maior risco de morbimortalidade por outras causas.
A DPOC deve ser suspeitada em qualquer indivíduo de 40 anos
ou mais com sintomas de tosse, expectoração, ou falta de ar,
e história de exposição a fatores de risco, particularmente o
tabagismo. A tosse é o sintoma mais frequente, e a dispneia
é o mais importante. A espirometria tem importância tanto
para confirmar a impressão diagnóstica como para avaliar a
gravidade e auxiliar nos diagnósticos diferenciais. Embora a
espirometria isoladamente não seja suficiente para o
diagnóstico (o rastreamento de DPOC com espirometria não
está indicado), sua não utilização resulta em sub e
sobrediagnóstico. Também há evidências de que a instituição
de avaliação espirométrica pós-broncodilatador em pessoas
com suspeita de doenças pulmonares obstrutivas melhora a
diferenciação diagnóstica entre asma e DPOC.
Epidemiologia
A DPOC é uma doença respiratória comum que causa
incapacidade substancial, redução da qualidade de vida e
risco aumentado de morte prematura. Há um conjunto
considerável de evidências mostrando que o tabagismo é o
principal fator de risco para essa doença, sendo responsável
por mais de 90% dos casos.
A DPOC, agrupada com a asma, representa a 4ª maior causa
de morte nos EUA, com 90.000 mortes anuais. 80% dos
doentes por DPOC tiveram exposição significativa à fumaça do
cigarro.
Hoje, existem 16 milhões de pacientes que sofrem de DPOC
nos EUA. Somando os casos subdiagnosticados estima-se que
chegue a 30 milhões. Em 2023, os custos hospitalares foram
de US$ 14,7 mi.
Fatores de Risco
Incluem uma combinação de exposição ambiental, fatores
genéticos e condições clínicas que favorecem o
desenvolvimento e a progressão da doença. Os principais
fatores de risco são:
• Tabagismo: exposição crônica à fumaça do cigarro
danifica as vias aéreas e o parênquima pulmonar,
levando à inflamação, destruição das paredes
alveolares e obstrução do fluxo aéreo.
• Exposição a poluentes ambientais: a poluição do ar,
tanto ambiental quanto ocupacional, pode contribuir
significativamente para o desenvolvimento da DPOC,
especialmente em pessoas que vivem em ambientes
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
44
com altos níveis de poluentes, como as grandes
cidades ou regiões com forte presença de poluentes
industriais. A exposição a fumaças e
gases provenientes de queimadas, biomassa (como
madeira, carvão ou esterco usado para cozinhar)
e vapores industriais também está associada ao
aumento do risco de DPOC.
• Fatores genéticos: a deficiência de alfa-1
antitripsina, uma condição genética rara, que leva a
uma deficiência da proteína alfa-1 antitripsina, é um
fator de risco importante, especialmente para o
enfisema pulmonar em jovens, sem uma história
significativa de tabagismo. A alfa-1 antitripsina
protege os pulmões contra a ação destrutiva
das proteases.
• Idade avançada: é um fator de risco para a DPOC,
pois a capacidade pulmonar diminui naturalmente
com o envelhecimento, o que torna os pulmões mais
vulneráveis a danos causados por exposições
crônicas a irritantes ambientais.
• Histórico de exposição a infecções respiratórias:
infecções respiratórias graves durante a infância,
como pneumonias e bronquiolite, podem afetar o
desenvolvimento pulmonar e aumentar o risco de
DPOC mais tarde na vida.
• Fatores ocupacionais: a exposição no local de
trabalho a substâncias irritantes como poeira
(de carvão, sílica e asbesto) ou vapores químicos
também está associada ao risco de desenvolver
DPOC, especialmente em profissões como
mineração, construção e agricultura.
• Fatores socioeconômicos: têm maior risco devido a
fatores como acesso limitado a cuidados de
saúde, exposição ambiental mais intensa (por
exemplo, viver em áreas com poluição elevada)
e maiores taxas de tabagismo.
• Comorbidades: pacientes com asma crônica podem
ter um risco aumentado de desenvolver DPOC,
especialmente se tiverem histórico de asma não
controlada e tabagismo concomitante.
Outras doenças respiratórias crônicas também
podem predispor ao desenvolvimento da DPOC.
Patogênese da DPOC
A DPOC é uma condição progressiva caracterizada pela
limitação crônica do fluxo aéreo, que não é totalmente
reversível. A patogênese da DPOC envolve uma combinação
de inflamação crônica das vias aéreas, destruição do
parênquima pulmonar e alterações nas pequenas vias aéreas,
muitas vezes resultando em obstrução das vias respiratórias.
A patogênese da DPOC é complexa e envolve os seguintes
mecanismos:
1. Inflamação crônica das vias aéreas: é um dos
principais fatores que contribuem para a obstrução
do fluxo aéreo. Fatores como
o tabagismo ou exposição a poluentes
ambientais ativam células inflamatórias,
como neutrófilos, macrófagos e linfócitos T, que
liberam mediadores inflamatórios,
como citocinas e proteases, que causam danos às
vias aéreas e ao tecido pulmonar.
2. Destruição do parênquima pulmonar (enfisema):
leva ao enfisema, que é caracterizado pela dilatação
anormal dos alvéolos e destruição das paredes
alveolares. Isso resulta na perda da área de troca
gasosa e na diminuição da elasticidade pulmonar, o
que agrava a obstrução das vias aéreas e piora a
ventilação.
3. Alterações nas pequenas vias aéreas: o processo
inflamatório também afeta as pequenas vias
aéreas (bronquíolos), levando a um estreitamento
das vias respiratórias e à formação
de cicatrizes e fibrose. Essas alterações aumentama
resistência ao fluxo aéreo, agravando a limitação do
fluxo respiratório.
4. Exposição de fatores ambientais: o tabagismo é o
principal fator de risco para a DPOC, mas outros
fatores, como exposição a poluentes
ambientais e substâncias irritantes, também
desempenham papel importante na indução e
progressão da doença.
5. Disfunção das células do sistema imune: a ativação
crônica do sistema imunológico na DPOC resulta em
uma resposta inflamatória desregulada, com
ativação excessiva de macrófagos e neutrófilos, que
produzem proteases e radicais livres, resultando na
destruição do tecido pulmonar e na obstrução das
vias aéreas.
Essa combinação de inflamação crônica, dano ao
parênquima e alterações estruturais contribui para o
agravamento da limitação do fluxo aéreo e a progressão da
DPOC, levando a sintomas como dispneia, tosse
crônica e produção excessiva de muco. A progressão da
doença é frequentemente associada à diminuição da função
pulmonar e ao aumento do risco de exacerbações e
complicações respiratórias.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
45
Na DPOC, os mecanismos patológicos não ocorrem de
maneira isolada, mas sim de forma inter-relacionada, embora
a expressão clínica e a gravidade da doença possam variar
entre os pacientes. Em geral, os principais mecanismos que
contribuem para a patogênese da DPOC — como
a inflamação crônica das vias aéreas, a destruição do
parênquima pulmonar (enfisema) e as alterações nas
pequenas vias aéreas — estão frequentemente presentes,
mas em diferentes graus de severidade, dependendo da
exposição a fatores ambientais (principalmente o tabagismo)
e da resposta imunológica individual.
Enfisema: aumento anormal dos espaços aéreos distais ao
bronquíolo terminal. Destruição das paredes alveolares à
mecanismo da protease-antiprotease (elastase - a1-AT)
Bronquite crônica: hipersecreção de muco nas grandes vias
aéreas, associada com hipertrofia das glândulas submucosas
na traqueia e nos brônquios. Aumento acentuado das células
caliciformes das pequenas vias aéreas, resultando na
produção excessiva de muco.
Diagnóstico
• História de tabagismo de mais de 70 maços/ano
apresenta uma razão de verossimilhança positiva
(RVP), ou likelihood ratio positivo (LR+), de 8,0 para
DPOC. Ausência de tabagismo apresenta uma razão
de verossimilhança negativa (RVN) de 0,16.
• Produção diária de catarro de mais de um quarto de
xícara tem um RVP de 4,0;
• História de chiado tem um RVP de 3,8;
• História de dispneia tem um RVP de 2,2; e
• Tosse, de 1,8.
A combinação de achados é mais útil para fechar o diagnóstico
do que para excluí-lo. Assim, um indivíduo com qualquer
combinação de dois dos seguintes achados tabagismo > 70
maços/ano, história de DPOC ou diminuição dos sons
respiratórios à ausculta, tem um RVP de 34 para DPOC,
fechando o diagnóstico.
Somente três elementos da anamnese e do exame físico se
associaram ao diagnóstico de DPOC na análise multivariada:
história prévia de DPOC (RVP ajustada de 4,4), presença de
sibilos (RVP ajustada de 2,9) e tempo expiratório forçado
acima de 9 segundos (RVP ajustada de 4,6). A RVP (ou LR+)
combinada desses três fatores foi de 59 (fechando o
diagnóstico de DPOC), e a RVN (ou LR-) foi de 0,3.
Muitas vezes, a dispneia e a intolerância aos esforços são
atribuídas à falta de preparo físico, ao processo de
envelhecimento e ao tabagismo, e a tosse crônica (ou pigarro)
é considerada uma resposta normal ao tabagismo, o que faz
muitas pessoas com tais sintomas não procurarem a APS por
acreditarem tratar-se de uma consequência normal da idade
e do estilo de vida. Assim, deve-se ter uma postura de busca
ativa de casos, quando se depara com indivíduos tabagistas.
Existe uma discussão considerável sobre quais os melhores
critérios diagnósticos para DPOC. Embora a espirometria seja
a principal ferramenta diagnóstica, não há consenso sobre
qual é o melhor parâmetro espirométrico.
O parâmetro mais utilizado, preconizado pela GOLD e pela
American Thoracic Society (ATS), para diagnosticar obstrução
ao fluxo aéreo, é a relação VEF 1 /CVFsão o chiado, a tosse e a produção de catarro. Tosse é o
sintoma mais frequente, precedendo ou aparecendo
simultaneamente à dispneia na maioria dos casos (75%). É
diária ou intermitente e, geralmente, produtiva. A dispneia é
o sintoma mais importante, associando-se a incapacidade
física, a piora da qualidade de vida e o pior prognóstico. É
insidiosa no início e progressiva. O chiado está
frequentemente presente, tendo sido relatado em 83% dos
casos em algumas séries.
O exame físico deve procurar por sinais de hiperinsuflação
pulmonar (tórax em barril, hipersonoridade à percussão
do tórax, ausência de ictus, bulhas abafadas, excursão
diafragmática reduzida), os quais estão geralmente
presentes na doença avançada, além de sinais de obstrução
ao fluxo aéreo (sibilos, expiração prolongada) e presença
de secreção nas vias aéreas (roncos).
A oximetria de pulso, por ser de baixo custo, deve ser
incluída no exame físico da pessoa com DPOC. É importante
também medir o peso e a altura (IMC), bem como avaliar
sinais de desnutrição e consumo muscular, que comumente
acompanham os casos de DPOC graves.
Avaliação de sinais de comorbidades associadas e de
diagnósticos diferenciais deve fazer parte do exame físico. Do
ponto de vista da avaliação formal dos valores diagnósticos
de itens do exame físico, apenas quatro deles têm valor
diagnóstico independente para DPOC: a presença de
sibilos à ausculta pulmonar, o tempo expiratório forçado
aumentado (> 9 segundos), a descida da laringe
(distância entre o topo da cartilagem tireóidea e fúrcula
esternal ≤ 4 cm) e a expiração prolongada.
Sinal de Hoover: refere-se à incursão paradoxal do
gradeado costal inferior durante a inspiração e pode ajudar
no prognóstico. Esse sinal pode estar presente em até 76%
dos pacientes com DPOC grave e ser um marcador clínico útil
de obstrução severa de vias aéreas para auxiliar em
situações de triagem e manejo na emergência, além de um
bom preditor de desfechos clínicos.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
48
Há ainda o uso de musculatura acessória e o pulso paradoxal,
que podem ser úteis em situações de exacerbação aguda.
Exames Complementares
O principal exame complementar para o diagnóstico da DPOC
e sua classificação de gravidade é a espirometria. Exames de
imagem, como radiografia torácica ou tomografia de tórax,
são usados para avaliar diagnósticos diferenciais e
comorbidades.
Radiografia Torácica
Achados:
• Hiperinsuflação pulmonar:
• Hemidiafragmas achatados (retificados);
• Coração pequeno;
• Alterações bolhosas;
• “Traqueia em bainha de sabre” → estreitamento
coronal acentuado da tranqueia intratorácica (visão
frontal); alargamento sagital concomitante (visão
lateral);
No Perfil:
• “Tórax em barril” → diâmetro ântero-posterior
alargado.
Mulher, 66 anos, aposentada, fumante inveterada. Falta
de ar ao esforço.
Achados: os pulmões estão marcadamente
hiperinsuflados. Achatamento do diafragma. Alteração
bolhosa no lobo superior esquerdo. O coração tem uma
aparência alongada.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
49
Outros Exames
• Hemograma deve ser realizado para afastar anemia
e policitemia.
• Eletrocardiograma e o ecocardiograma: podem
ser realizados em pessoas com sinais sugestivos de
IC/ cor pulmonale ou que apresentem sinais ou
sintomas de outras DCVs.
• Oximetria de pulso de repouso e aos esforços
deve ser realizada para avaliar hipoxemia e
necessidade de oxigênio domiciliar.
• Gasometria arterial (GA) para confirmação do
quadro de hipoxemia e necessidade de oxigênio
domiciliar.
• Dosagem de alfa-1-antitripsina.
• Outras avaliações: sintomas psiquiátricos; estado
nutricional; risco cardiovascular
Tratamento
A abordagem de pessoas com DPOC na APS deve incluir pelo
menos quatro componentes: avaliação e monitoramento da
doença, redução de fatores de risco, manejo do indivíduo
com DPOC estável e manejo das exacerbações agudas.
Os objetivos do acompanhamento e tratamento de pessoas
com DPOC na APS são:
• Aliviar os sintomas.
• Prevenir a progressão da doença.
• Melhorar a capacidade física (tolerância aos
exercícios).
• Melhorar o estado geral de saúde e bem-estar.
• Prevenir e tratar complicações.
• Prevenir e tratar exacerbações agudas.
• Reduzir a mortalidade.
• Referenciar ao especialista quando necessário
(função de filtro). Realizar a prevenção quaternária
(não referenciar ao especialista quando não
necessário, não expor a pessoa a intervenções
diagnósticas e terapêuticas desnecessárias e
prevenir e minimizar os efeitos colaterais do
tratamento).
Tratamento Não Farmacológico
• Cessação do tabagismo;
• Reabilitação pulmonar e fisioterapia respiratória;
• Tratamento cirúrgico.
Tratamento Medicamentoso
Atualmente a classificação ABCD é utilizada para classificar o
grupo de risco e perfil sintomático para determinar o
tratamento inicial da DPOC. A conduta terapêutica
subsequente é realizada conforme avaliação da intensidade
dos sintomas e do perfil de risco de exacerbações. Veja a
classificação de risco da DPOC:
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
50
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
51
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
52
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
53
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
54
Notas de aula do Professor Paulo:
• Anticolinérgicos: de preferência não absorvíveis
administrados com inalador com dosímetro. O
principal é o ipratrópio, que não apresenta os efeitos
colaterais da atropina. É usado 3 a 4x/dia e
apresenta absorção sistêmica mínima.
• b-Adrenérgicos: de preferência os b2 agonistas
altamente específicos por possuírem efeitos
cardíacos mínimos, como o salbutamol.
OBS.: Recentemente há disponível uma associação
medicamentosa em um único inalador com dosímetro dessas
duas drogas.
• Corticoides: são usados esteroides sistêmicos como
a prednisona 20 a 30 mg ao dia para prova
terapêutica, o tratamento é continuado com 10 a 20
mg ao dia. O mais novo esteroide não absorvível
inalável é a fluticasona.
• Metilxantinas: a teofilina é um broncodilatador fraco
com estreita margem entre faixa terapêutica e tóxica
que vem sendo abandonado com o surgimento dos
b agonistas de ação prolongada, como o salmeterol.
• Expectorantes e supressores da tosse para alívio dos
sintomas.
• Uso de antibióticos precocemente quando surgem
exarcebações que parecem ser infecciosas com
agravamento da dispneia e do escarro: azitromicina
250 mg 2x/dia no primeiro dia e uma vez ao dia por
mais 5 dias. Os antibióticos (p. ex., amoxicilina)
estarão indicados se houver o aumento da
quantidade de catarro e a modificação do aspecto do
catarro para purulento como parte da definição de
exacerbação aguda.
• Cirurgias: ressecções focais do tecido pulmonar ou
transplante de pulmão.
Intervenções específicas
Uso de mucolíticos: estudos sugerem que a N-acetilcisteína e
a carbacisteína reduzem o número de exacerbações agudas.
Oxigenoterapia domiciliar: deve ser usada em pacientes
propensos a desenvolver hipertensão pulmonar e insuficiência
pulmonar direita, cor pumonale. Muitas vezes o O2 é
administrado somente durante o sono para manter a
saturação > 90%.
Indicações:
• Pressão parcial arterial de oxigênio (PaO2) ≤ 55
mmHg ou SatO2 ≤ 88% em repouso.
• PaO2 entre 56 e 59 mmHg ou SatO2 ≤ 89% com
evidências de cor pulmonale ou policitemia.
Flebotomias (sangria): é um procedimento médico que
envolve a remoção de sangue de um paciente. A policitemia é
uma condição em que há um aumento anormal no número de
glóbulos vermelhos no sangue. Ela pode ocorrer como uma
resposta do corpo à hipóxia crônica (baixa oxigenação do
sangue), que é comum em pacientes com DPOC. Quando o
organismo detecta baixos níveis de oxigênio, ele tenta
compensar essa falta produzindo mais glóbulosvermelhos,
um processo mediado pela eritropoetina, que é um hormônio
produzido pelos rins.
Indicações:
• Cor pulmonale descompensado com hematócrito (Ht)
> 55%.
Vacinação:
Indicações:
• Anti-influenza – anualmente, no outono; está
associada à redução de mortalidade.
• Antipneumocócica – uma dose após os 65 anos;
alguns autores preconizam que seja repetida a cada
5 anos, porém sua eficácia não é tão bem
documentada quanto a da vacina anti-influenza.
• Anti- Haemophilus influenzae – não há indicação.
Reabilitação pulmonar: é um programa multiprofissional que
engloba:
• Diagnóstico preciso e avaliação de comorbidades.
• Tratamento farmacológico, nutricional e fisioterápico.
• Recondicionamento físico.
• Fisioterapia respiratória pode ser necessária em
situações selecionadas.
Apoio psicossocial:
• Educação, para otimizar a autonomia e o
desempenho físico e social.
• Abordagem das exacerbações agudas.
Quando Referenciar
Existem situações que justificam uma avaliação do
pneumologista. Entre essas situações, destacam-se:
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
55
• Incerteza diagnóstica.
• DPOC em pessoas com menos de 40 anos.
• DPOC em pessoas que possuem um parente de
primeiro grau com história de deficiência de α1-
antitripsina.
• DPOC grave.
• Exacerbações frequentes.
• Hemoptise.
• Dificuldade em controlar os sintomas.
• Necessidade de oxigenoterapia domiciliar.
• Necessidade de reabilitação pulmonar.
• Necessidade de cirurgia.
Prognóstico
• O melhor prognóstico é na forma de bronquite
crônica que na forma enfisematosa.
• Muitas mortes por DPOC são causadas por
complicações respiratórias decorrentes de outras
infecções que teriam uma mortalidade menor se não
estivessem acompanhadas de DPOC.
Bibliografia
GUSSO, Gustavo; LOPES, José M C.; DIAS, Lêda C. Tratado de
medicina de família e comunidade - 2 volumes: princípios,
formação e prática. 2. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2019. E-
book. p.1278. ISBN 9788582715369.
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria Conjunta
SAES/SCTIE/MS nº 19, de 16 de novembro de 2021. Doença
Pulmonar Obstrutiva Crônica. Brasília, 2021. Disponível
em: https://www.gov.br/saude/pt-br. Acesso em: 1 mar. 2025.
Slides Professor Paulo
Slides Professor Thiago
SEMANA 07: MANEJO DA
DISPEPSIA E REFLUXO NA
APS – DATA: 10/03/2025
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
• Compreender o manejo da dispepsia e do refluxo na
atenção primária.
Objetivos Específicos
• Características da dispepsia e seus tipos;
• Compreender a avaliação clínica e o manejo da
dispepsia;
• Conhecer os exames complementares, tratamentos e
prognóstico para dispepsia.
Características da Dispepsia
A dispepsia é conhecida popularmente como “má digestão”.
É caracterizada pela presença recorrente ou persistente de
dor ou desconforto epigástrico não relacionado ao uso de
AINES e acompanhando, ou não, de sensação de saciedade
precoce, náuseas, vômitos, pirose, regurgitação e excessiva
eructação.
Dispepsia foi originalmente definida como qualquer sintoma
referente ao trato digestivo superior e pode ser descrita como
dor abdominal vaga, queimação epigástrica, má digestão,
indigestão, falta de apetite, eructações e “gastrite” (que no
seu uso popular não apresenta correlação com o achado
anatomopatológico denominado gastrite; isto é, inflamação da
mucosa gástrica observada à microscopia). Esses sintomas –
sejam de início recente ou recorrentes ao longo de muitos
anos – indicam maior probabilidade de disfunções do trato
digestivo alto sem, necessariamente, associação com lesões
anatomopatológicas.
Dor epigástrica e demais sintomas dispépticos estão
comumente associados a disfunções no esôfago, no estômago
e/ou no duodeno; entretanto, também podem ser originados
pelo acometimento de outros órgãos.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
56
Epigastralgia: dor ou desconforto localizado na região
epigástrica. A dor pode ser de natureza difusa ou localizada e
pode ser descrita como uma sensação de queimação, cólica
ou dor surda. Às vezes, a dor pode ser exacerbada por
refeições ou alterações na alimentação.
Pirose: sensação de queimação ou ardor no esôfago ou
estômago, frequentemente associada ao refluxo de ácido
gástrico para o esôfago. É comumente conhecida como azia.
A sensação de queimação geralmente ocorre na região
retroesternal (por trás do esterno), podendo se irradiar para
o pescoço e até a garganta. O sintoma costuma ser mais
evidente após as refeições ou quando a pessoa se deita,
sendo frequentemente aliviado por antiácidos ou alterações
na posição corporal.
Tipos de Dispepsia
A dispepsia pode ser classificada em dismotilidade, úlcera ou
refluxo. Entretanto, não há correlação da sintomatologia com
o diagnóstico etiológico, sendo desnecessária a utilização
desses critérios na prática clínica da APS (GUSSO et al., 2019).
Tipos de dispepsia
Dismotilidade • Vômitos 1x/mês ou mais;
• Distensão abdominal;
• Dor agravada por alimentação;
• Dor aliviada por eructações;
• Anorexia.
Úlcera • Dor aliviada por alimentação;
• Dor aliviada por antiácidos;
• Doe antes da alimentação;
• Dor noturna que faz despertar.
Refluxo • Pirose 1x/semana ou mais;
• Regurgitação ácida 1x/semana
ou mais.
Dispepsia não Investigada
A maioria dos indivíduos não consulta o médico somente pelos
sintomas da dispepsia. Além do desejo de abordar o sintoma,
as principais razões que podem levar os indivíduos a consultar
são:
• Desejo de descartar doenças graves;
• História familiar de câncer gástrico;
• Crise situacional recente (evento estressante ou risco
à vida nos últimos 6 meses);
• Encorajamento por familiares;
• Ansiedade.
• Presença de infecção por Helicobacter pylori (HP) e
o baixo nível socioeconômico.
Manejo de dispepsia não investigada. HP, Helicobacter pylori; IBP,
inibidor da bomba de prótons.
É preciso, após caracterizar a dispepsia, explorar o entorno
da queixa. Existem outros sintomas associados? Quais são os
medos do paciente a respeito dos sintomas? Há evidência de
estresse emocional? Quais são as expectativas do paciente a
respeito da abordagem médica?
Por meio dessa exploração atenta e indutiva do entorno, é
possível ter mais segurança sobre o caminho a seguir. Pode
ficar claro que, apesar de ter sido a queixa de apresentação
na consulta, a dispepsia não é o sintoma que mais incomoda
o paciente ou que ela faz parte de um quadro clínico mais
amplo (p. ex., evento estressante agudo ou transtorno de
ansiedade), ou até mesmo que o paciente não deseja
tratamento, apenas quer certificar-se de que não tem nada
grave.
O tratamento dos sintomas dispépticos ainda se apresenta
como um desafio, pois muitos pacientes persistem
sintomáticos mesmo após diversos tratamentos e
intervenções, o que enfatiza a importância da relação médico-
paciente e de decisões compartilhadas no manejo dessa
queixa. Por um lado, as intervenções com maior nível de
evidência ainda resultam em falha terapêutica em mais da
metade dos pacientes, associado a risco de efeitos adversos,
indução de resistência a antibióticos e custo financeiro
elevado.
Nesse contexto, o médico da APS deve identificar indivíduos
que podem se beneficiar de medidas gerais não
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
57
farmacológicas e/ou supressão ácida apenas, separando
aqueles com sinais de alerta que precisam de exames
complementares (bioquímica, endoscopia digestiva alta [EDA]
ou radiografia contrastada de esôfago, estômago e duodeno
se a endoscopia estiver indisponível) e/ou encaminhando-os
para especialistas (gastrenterologista ou cirurgião geral) com
a maior brevidade possível.
Os sinais de alerta para indicação de EDA em pacientes
com dispepsia são (DUCAN, 2022):
• Disfagia;
• Hematêmese (considerar encaminhamento para
emergência);
• Perda de peso involuntária;
• Persistência de sintomas após tratamento;
• Anemiaou queda no nível de hemoglobina.
OBS.: Perda de peso involuntária e persistência de
sintomas após tratamento são sinais de alerta em
pacientes com idade ³ 60 anos.
Para exercer com excelência essa função primordial – além de
competência ao exame clínico com técnica acurada de coleta
da história do paciente e adequado exame físico –, deve-se
ter um adequado conhecimento sobre os recursos de saúde
disponíveis na localidade e na região, as características
culturais e epidemiológicas da comunidade e, também, o
acompanhamento longitudinal das famílias.
Uma diretriz recente do American College of Gastroenterology
enfatiza que o risco de neoplasia gastrintestinal em pessoas
com idade 65 anos, tabagistas, história de úlcera prévia, uso
de AINEs combinados) que entrarão em tratamentos com uso
prolongado desses medicamentos podem se beneficiar de
pesquisa de HP e sua erradicação, caso positiva. A
erradicação do HP isoladamente não previne o sangramento
da ulceração e, portanto, o uso concomitante de IBP é
mandatório. Também é sugerido uso de IBP preventivo em
indivíduos com alto risco para úlcera em localidades onde a
pesquisa de HP não está disponível.
Vale lembrar que a prevalência de parasitoses intestinais no
Brasil ainda é elevada, podendo a dispepsia ser um sintoma
de infestação parasitária, principalmente, na estrongiloidíase
e na giardíase. Por esse motivo, recomenda-se considerar o
uso de antiparasitários em pacientes com dispepsia com ou
sem exame parasitológico de fezes positivo.
Dispepsia Funcional
A dispepsia funcional é definida pelo Consenso de Roma IV
como a combinação de um ou mais dos seguintes sintomas,
causando interferência diária na vida do paciente, na
ausência de qualquer doença orgânica, sistêmica ou
metabólica identificável:
• Estufamento pós-prandial;
• Saciedade precoce;
• Dor epigástrica e/ou queimação epigástrica (que
devem estar presentes pelo menos 3x/semana nos
últimos 3 meses, com início dos sintomas a mais de
6 meses);
A dispepsia pode ser divindade em:
• Síndrome de dor epigástrica: tem predomínio de
dor.
• Síndrome do estresse pós-prandial: tem
predomínio de saciedade precoce e estufamento
abdominal.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
59
No entanto, não há recomendação de usar o tipo de sintoma
para guiar a terapêutica inicial. As evidências disponíveis até
o momento não esclarecem sobreos benefícios de medidas
não farmacológicas como dietas específicas e/ou psicoterapia
na dispepsia funcional.
Tratamento da Dispepsia Funcional
OBS.: vários fármacos, como IBPs (omeprazol), bloqueadores H2
(cimetidina e ranitidina), pró-cinéticos (domperidona) e antiácidos,
foram testados no tratamento da dispepsia funcional com resultados
variáveis. Os antiácidos não são eficazes. Os IBPs mostraram-se
efetivos no manejo.
Pró-cinéticos: entre os pró-cinéticos mais disponíveis em
nosso meio, a domperidona apresenta um perfil favorável de
segurança, enquanto a metoclopramida em uso crônico pode
causar síndromes extrapiramidais, sobretudo em idosos, e seu
uso é desaconselhado para um período > 3 meses.
Considerando a natureza crônica dos sintomas da dispepsia
funcional e o benefício da supressão ácida, mesmo com IBPs,
é preciso levar em conta os custos e os possíveis efeitos
adversos em longo prazo. A erradicação do HP apresenta
benefícios no manejo clínico.
Estão sendo utilizados antidepressivos tricíclicos na
dispepsia funcional, nos pacientes que não apresentaram
melhora sintomática com IBP (p. ex., amitriptilina 25 mg/dia,
VO). Os inibidores seletivos da recaptação da serotonina
(ISRSs) não mostraram melhora dos sintomas nos estudos
realizados até o momento. Ao propor essa terapia com
antidepressivos, deve-se levar em consideração a história
prévia do paciente e outras comorbidades, bem como
enfatizar a contribuição dos antidepressivos para reforço na
tolerância aos sintomas.
Terapias alternativas: terapias alternativas com produtos
naturais (p. ex., alcachofra, pó de banana, menta, açafrão-da-
terra [Curcuma longa]) podem oferecer melhora sintomática
na dispepsia funcional, apesar do grau de evidência ser fraco
para embasar as condutas.
Acupuntura: é uma terapia alternativa milenar que contribuiu
para a melhora de sintomas de saciedade precoce e plenitude
pós-prandial quando comparado com pró-cinéticos ou
placebo, em revisão sistemática. No entanto, o grau de
evidência é considerado baixo pela heterogeneidade e baixa
qualidade dos estudos incluídos.
Dispepsia refratária: deve-se considerar uma avaliação com
gastrenterologista e/ou psiquiatra, destacando a coexistência
de altas taxas de depressão e patologias psiquiátricas neste
último grupo.
O tratamento da dispepsia funcional pode ser frustrante para
médicos e pacientes porque poucas opções terapêuticas
demonstraram efetividade. Em geral, pacientes precisam do
suporte contínuo de seus médicos assistentes, salientando-se
o fato de que se trata de doença crônica e recorrente. A
critério clínico, pode-se optar por testar diferentes
modalidades de tratamento e/ou terapias alternativas com
potencial alívio significativo, mas ainda sem evidências
científicas sólidas ou com mecanismo biológico comprovado.
Dispepsia Secundária
Pode ser causada por múltiplas doenças como as neoplasias,
as úlceras pépticas e o uso de medicamentos (p. ex.,
metformina, metronidazol). A doença ulcerosa na mucosa
gástrica ou duodenal apresentou enorme impacto na
morbidade e mortalidade nas últimas décadas do século XX,
quando tendências epidemiológicas começaram a apontar
para quedas na sua incidência.
O sintoma dominante na úlcera péptica é a dor epigástrica,
que pode ser acompanhada por outros sintomas dispépticos,
como estufamento, saciedade precoce e náusea.
Em pacientes com úlceras duodenais, a dor epigástrica
geralmente ocorre durante o jejum e/ou até mesmo à noite, e
costuma ser aliviada pela ingestão de alimentos ou antiácidos.
Cerca de um terço desses pacientes também apresenta
pirose, na sua grande maioria sem esofagite erosiva. Úlceras
crônicas, entretanto, podem ser assintomáticas.
Em particular, a ausência de sintomas também é vista em
úlceras induzidas por AINEs, que podem apresentar-se,
primariamente, por sangramento ou perfuração gastrintestinal
alta. Úlceras HP-negativas costumam ser causadas por uso
voluntário e casual de AINEs pelos pacientes.
A complicação mais grave das úlceras pépticas é o
sangramento, com maior risco em indivíduos com idade > 60
anos. Perfuração é bem menos frequente que hemorragia.
Penetração de órgãos retroperitoneais é rara e caracterizada
por dor abdominal e lombar intensa constante.
As úlceras pépticas podem recorrer após a cura inicial,
sobremaneira se houver persistência de infecção por HP, visto
que o HP é a principal causa na maioria das úlceras.
Além da terapia, deve-se recomendar a cessação do
tabagismo, quando presente. Se o paciente estiver usando
ácido acetilsalicílico, considerar suspendê-lo ou trocá-lo para
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
60
clopidogrel, quando a indicação for para uso de
antiplaquetários, e/ou adicionar um IBP enquanto o uso de
ácido acetilsalicílico/AINE for necessário.
Diagnóstico da Úlcera Péptica
A úlcera péptica é diagnosticada à endoscopia quando há
penetração da mucosa ≥ 5 mm em profundidade,
recoberta com fibrina, enquanto a penetração mais
superficial,à consulta atual
devem constar da folha de rosto. Ou seja, problemas
crônicos entram na lista de problemas no prontuário,
apenas quando relatados pela primeira vez pelo paciente
ou quando trazidos novamente em consulta, ou ainda,
quando o profissional entender que deve abordar aquele
problema na consulta.
Problema é tudo aquilo que interfira na qualidade de vida
do paciente, ou represente um risco futuro para sua
saúde, ou ainda, que necessite de um manejo clínico
posterior e que esteja no seu mais alto grau de resolução
possível no momento.
Todo motivo de consulta deve ter um problema
correspondente, mesmo que esse motivo ainda não tenha
um diagnóstico, ou o motivo em si já seja um problema.
Dessa forma, as demandas e preocupações do paciente
não deixarão de ser valorizadas por nós. Cabe aqui
diminuir o preconceito do que é realmente importante,
pois se é importante para o paciente, deve ser valorizado
por nós.
Hipóteses diagnósticas têm um único propósito de nos
auxiliar no manejo clínico posterior. Ajudando, assim, a
lembrar das condutas e raciocínios que tivemos no dia
para aquela consulta. Caso não haja problemas definidos,
o campo de hipóteses ficará em branco. Sendo assim, não
é necessário interrogar nenhum problema, pois tudo o que
entendermos que mereça um ponto de interrogação deve
ser colocado nessa lista, pois é uma hipótese. Essa
hipótese deve estar correspondida ao problema, que no
caso deve estar em um grau de resolução menor que o
problema final (diagnóstico).
P – Plano
O plano de ação inclui as estratégias terapêuticas que
serão seguidas. Isso pode incluir prescrições de
medicamentos, pedidos de exames complementares,
recomendações de tratamento, planos de
acompanhamento, encaminhamentos para especialistas,
entre outros. Ou seja, um plano de ação para o paciente.
Na proposta terapêutica, podemos pensar na autonomia e
no poder de decisão que o paciente terá nesse momento.
Importante não confundi a autonomia do paciente com o
que é importante e necessário ser feito. É muito
importante tentar equilibrar ao máximo o necessário e o
possível. Por exemplo, se em nossa avaliação
consideramos um medicamento x como sendo mais
benéfico para o paciente, mas ao informarmos o preço
médio desse medicamento, o paciente relatar que fica
inviável dele comprar devemos tentar oferecer uma
alternativa terapêutica. O mesmo serve para posologia,
mudança de hábitos etc.
Outra coisa crucial no plano terapêutico é que para cada
problema da lista devemos realizar uma proposta
terapêutica, mesmo que seja uma escuta. E, logicamente,
isso deve constar no registro na parte das orientações.
O plano deve constar, necessariamente, em seis partes:
1. Solicitação de exames: devemos registrar todos
os pedidos de exames, de preferência
relacionando o problema de saúde listado na
avaliação.
2. Encaminhamentos: relacionar todos os
encaminhamentos realizados, seja para colegas
de outras especialidades, ou outros profissionais
de saúde. Nos encaminhamentos, podemos
incluir também os retornos para nós mesmos.
3. Atestados: quando fornecemos atestados,
devemos registrar no prontuário, mesmo que
seja uma declaração de comparecimento.
4. Orientações: todas as orientações que foram
oferecidas para o paciente são registradas nessa
parte. Inclusive dados relacionados à escuta
terapêutica.
5. Medicamentos: aqui anotamos apenas as
medicações prescritas ou modificadas na
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
3
consulta. As medicações que são de uso contínuo
estarão na folha de rosto.
6. Observações: usamos essa parte para registrar
tudo aquilo que for pertinente do plano
terapêutico, indiretamente relacionada às partes
anteriores e sejam percepções subjetivas do
médico referente à conduta. Essa parte é muito
semelhante às impressões gerais do subjetivo.
O método SOAP é amplamente adotado por sua simplicidade
e eficácia na organização da anamnese e na documentação
do atendimento. Estudos demonstram que uma abordagem
sistemática como o SOAP ajuda a melhorar a clareza, a
precisão e a continuidade dos cuidados, permitindo que
múltiplos profissionais de saúde acompanhem a evolução do
paciente de maneira coesa. Além disso, a estrutura
proporciona um caminho lógico para o processo de tomada
de decisão clínica, com base em dados subjetivos e objetivos.
Essa abordagem também facilita o registro de informações
de maneira padronizada, o que contribui para a segurança
do paciente e o uso eficiente dos recursos médicos.
Associando uso da folha de rosto e o método SOAP,
conseguimos sistematizar o registro das consultas de uma
forma que perdemos muito menos tempo no ato de registrar,
sobrando mais tempo para dar atenção, conseguindo sermos
mais efetivos nos registros.
Registro de Saúde Orientado por Problemas (ReSOAP)
Os registros ajudam a garantir a continuidade e a
longitudinalidade do cuidado, auxiliam na comunicação e
tomada de decisão em equipe e permitem um arquivo de
dados-base das pessoas e famílias em seguimento,
fornecendo eventualmente também dados para investigação
científica ou prova para diligências legais.
O Registro Médico Orientado por Problemas (RMOP) tem sido
empregado em diversos sistemas de Atenção Primária à
Saúde (APS) em todo o mundo, e seu uso tem-se ampliado
cada vez mais como base inclusive na informatização dos
registros médicos.
Diante da multiprofissionalidade que caracteriza as equipes
de APS no Brasil, pode-se denominá-lo de Registro de Saúde
Orientado por Problemas (ReSOAP), e propor que todas as
categorias profissionais se apropriem e incorporem em sua
prática esse formato de registro.
O aprendizado e a utilização do ReSOAP é um dos caminhos
na busca de ser um bom profissional para o trabalho em
equipe na APS. O registro em prontuário é critério de
avaliação da qualidade de um serviço de saúde. Mais do que
mera sistematização, o ReSOAP é ferramenta de raciocínio
clínico.
O ReSOAP tem os seguintes componentes básicos:
• Base de dados da pessoa: será constituída
fundamentalmente pelas informações e dados
obtidos na história clínica e de vida, no exame físico
e nos resultados de exames complementares,
registrados geralmente na primeira, ou nas
primeiras consultas, ou "caso novo" daquela
pessoa. São parte da base de dados os
antecedentes pessoais e familiares, o problema de
saúde atual e as informações de saúde prévias
daquela pessoa (trazidas por ela mesma ou enviada
por outros serviços). O tipo, o formato, o grau de
profundidade e a quantidade de dados e
informações, que constituirão a base de dados da
pessoa, serão definidos pela própria equipe da ESF,
que poderá elaborar um formulário-padrão para a
obtenção dessas informações.
• Lista de problemas (folha de rosto): constitui a
primeira parte ou "folha de rosto" de um prontuário,
devendo vir logo após a identificação da pessoa. A
lista é elaborada a partir da base de dados da
pessoa e das notas de evolução subsequentes,
sendo, portanto, dinâmica. É um resumo útil dos
problemas de saúde da pessoa, os quais devem ser
enumerados pela ordem de aparecimento ao longo
do tempo (com a data de início e da anotação, ao
lado do problema), o que permite identificá-los sem
a necessidade de ler cada folha de evolução.
• Notas de evolução clínica (notas SOAP):
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
4
• Folha de Acompanhamento (Fichas de resumo e
fluxograma): são formulários separados da lista de
problemas e das notas clínicas, nos quais se pode
registrar a evolução dos resultados dos exames
físicos e complementares, dos dados de
crescimento e desenvolvimento, hábitos de vida,
exames preventivos, medicações prescritas, entre
diversas outras possibilidades. Essas fichas
geralmente ficam localizadas na primeira ou última
parte dos prontuários, permitindo a visualização
rápida da evolução dos dados, sem a necessidade
de se revisar todo o prontuário.probabilidade da
origem benigna dos sintomas e sua recorrência, além de
facilitar a corresponsabilização na mudança de hábitos
acertada no plano terapêutico.
Exame Físico
Geralmente, o exame físico é normal ou com uma dor discreta
na região epigástrica. A presença de massa abdominal pode
ser indicativa de malignidade e deve ser investigada.
Exames Complementares
Endoscopia digestiva alta (EDA)
A EDA é o padrão-ouro para o diagnóstico de lesões
estruturais e consequentemente de causas específicas da
dispepsia. A EDA está indicada na abordagem inicial apenas
naqueles que apresentarem sinais de alerta para a exclusão
de doença orgânica grave. Sugere-se solicitar o exame para
indivíduos maiores de 55 anos, quando os sintomas
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
61
dispépticos persistem, independente de tratamento
adequado inicial.
Para aqueles que já realizaram EDA em algum momento e
retornaram com os sintomas dispépticos, deve-se introduzir
terapêutica de acordo com o diagnóstico anterior. A repetição
do exame está indicada somente naqueles que apresentarem
sinais de alerta não presentes no momento da intervenção
anterior. Vale ressaltar que o tratamento prévio com IBPs não
prejudica ou retarda o diagnóstico de malignidade.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
62
Teste respiratório com 13C ureia
Apresenta sensibilidade de 88 a 95% e especificidade de 95
a 100%, sendo incomuns resultados falso-positivos.
Exame sorológico
A sorologia detecta anticorpos IgG específicos para H. pylori.
É um exame mais sensível (90-100%) e de menor custo, mas
permanecerá positivo mesmo após a erradicação da bactéria.
Tratamento da Dispepsia
A estratégia inicial na dispepsia não investigada é o
tratamento empírico com IBPs, que apresentou melhor
resposta e custo-efetividade quando comparado aos
antagonistas H2 e antiácidos. “Testar e tratar” a infecção por
H. pylori é mais efetivo do que a realização de EDA e reduz
riscos e custos. É a estratégia recomendada pelo National
Institute for Health and Clinical Excellence (NICE) após falha
terapêutica do IBP na dispepsia não investigada. Há
evidências de que a erradicação da bactéria aumenta a taxa
de melhora dos sintomas e/ou diminui a sua recorrência nas
principais causas de dispepsia.
Dada a alta prevalência da infecção no Brasil, com uma
probabilidade pré-teste elevada, uma segunda alternativa
seria tratar empiricamente para a erradicação de H. pylori
após falha terapêutica do IBP.
OBS.: o esquema mais recomendado para erradicação do H. pylori é
amoxicilina, 1 g, e claritromicina, 500 mg, por 7 dias, em duas tomadas
diárias, associadas ao IBP em dose plena. A efetividade é estimada em
80 a 85%. O esquema prolongado, de 14 dias, independentemente de
incrementar 10% no sucesso de erradicação da bactéria, traria
benefício absoluto modesto e não é custo-efetivo.
Atividades Preventivas e de Educação
Apesar de não ser clara a associação entre tabagismo,
sobrepeso, dieta inadequada e ingestão de álcool e café com
dispepsia, sugere-se recomendar modificações nos hábitos de
vida, seja porque haverá ganho individual com as medidas,
seja porque essas oferecem benefícios para a saúde em geral.
Aqueles que sofrem por tempo prolongado com sintomas
dispépticos devem ser encorajados a reduzir o uso das
medicações prescritas: inicialmente, usando a menor dose
efetiva, passando ao uso livre conforme a demanda, até o
retorno ao autocuidado, com uso somente de antiácidos como
sintomáticos.
Em pessoas com lesão renal crônica, a exposição prolongada
a altas doses de sais de alumínio ou magnésio pode causar
encefalopatia, demência, anemia microcítica e piora da
osteomalácia induzida por diálise. Apesar de serem
considerados efeitos colaterais raros, é recomendado evitar o
uso de antiácidos naqueles com função renal comprometida.
Quando Referenciar
Aqueles com achados suspeitos de malignidade à endoscopia
deverão ser referenciados ao especialista. Se a EDA não
estiver disponível na APS, serão referenciadas também as
pessoas com dispepsia que têm indicação para o exame.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
63
Doença do Refluxo Gastresofágico (DRGE)
O refluxo de conteúdo gastroduodenal para o esôfago ocorre
de modo fisiológico em pequeno volume, principalmente após
as refeições. Quando o refluxo passa a causar sintomas
frequentes (como pirose e/ou regurgitação) e/ou
complicações (como esofagite erosiva, estenose péptica ou
esôfago de Barrett), torna-se uma doença.
A ineficácia do mecanismo de barreira na junção
esofagogástrica é o principal fator patogênico do RGE. As
teorias dominantes para explicá-la são:
• Relaxamento transitório do EEI sem anormalidade
anatômica concomitante.
• Alteração anatômica da junção esofagogástrica,
provavelmente associada à hérnia hiatal.
• Hipotonia do EEI, sem alteração anatômica
associada.
A definição consensual de DRGE propõe que seja classificada
em síndromes esofágicas e/ou extraesofágicas:
As complicações mais frequentemente relacionadas ao RGE
são as esofagites leves, moderadas e graves, que variam suas
classificações endoscópicas entre dois parâmetros
internacionais:
• Savary-Miller:
1. Grau 1 – Lesões leves (pequenas erosões
superficiais, sem ulceração significativa).
2. Grau 2 – Lesões moderadas (erosões mais
profundas, ulcerações superficiais).
3. Grau 3 – Lesões moderadas a graves (úlceras
mais profundas e numerosas).
4. Grau 4 – Lesões graves (úlceras profundas,
grandes áreas de erosão).
5. Grau 5 – Lesões extremamente graves
(necrose, perfuração, risco de sangramento
grave).
• Escala de Los Angeles:
1. Grau A – Lesões leves, pequenas áreas de
erosão.
2. Grau B – Lesões moderadas, afetando até 1/3
da circunferência.
3. Grau C – Lesões graves, afetando mais de 1/3
da circunferência.
4. Grau D – Lesões muito graves, afetando mais de
2/3 da circunferência.
5. Grau E – Lesões extremas, com erosões
extensas e difusas.
Manifestações Clínicas da DRGE
Na APS, a adequada caracterização dos sintomas
apresentados pelos pacientes é importante para diferenciar
DRGE de dispepsia, pois seus tratamentos podem apresentar
significativas diferenças. Pirose e regurgitação são
consideradas sintomas típicos da DRGE.
Pirose: é mais comum e definida como uma sensação de
queimação retroesternal que irradia desde o epigástrio até a
base do pescoço, podendo ocorrer espontaneamente ou após
as refeições (sobretudo as refeições volumosas e/ou ricas em
gorduras) e/ou após o decúbito, sendo reduzida pela ingestão
de água, leite ou antiácidos líquidos.
Regurgitação: é definida pela sensação de retorno de
conteúdo gástrico até a boca ou hipofaringe, sem a percepção
de queimação da pirose.
A presença de pirose é um bom marcador de refluxo
gastresofágico e apresenta boa correlação com a presença de
refluxo patológico demonstrada à pHmetria de 24 horas. O
sintoma pirose tem alta sensibilidade (70%) para o
diagnóstico correto de DRGE, e, quando associada à
regurgitação, a sensibilidade pode atingir 80%.
Na prática clínica, é comum que os pacientes considerem
outros sintomas como estufamento, queimação epigástrica
ou, ainda, desconforto na boca do estômago como
sinônimos de refluxo, mas na verdade estes são indicativos
de dispepsia.
Pirose e/ou regurgitação, quando acometem indivíduos jovens
que não apresentam sinais ou sintomas de alerta
(emagrecimento, disfagia, odinofagia, anemia, hematêmese,
melena), podem ser tratadas na primeira consulta sem uma
investigação complementar inicial. A melhora sintomática
ocorre em 70 a 80% dos pacientes jovens com o tratamento
inicial por 4 semanas.
Na ausência de melhora dos sintomas, deve-se considerar
uma investigação complementar para avaliar eventuais
complicações da DRGE, pirose funcional, esôfago
hipersensível, esofagite eosinofílica ou acalásia.
Débora Janaína UNIGRANRIO- Afya Medicina
64
A dor torácica, semelhante à dor por isquemia miocárdica,
pode ser uma manifestação da DRGE, associada a espasmo
esofágico difuso ou esôfago hipercontrátil (esôfago em
quebra-nozes) ou acalásia. Quando a dor torácica é
recorrente, associada a pirose/regurgitação e melhora após a
ingestão de água, a origem esofágica é mais provável,
diminuindo a probabilidade de origem miocárdica. A dor
torácica de origem esofágica pode ser indistinguível da dor
cardíaca, e a origem cardíaca deve ser sempre descartada
inicialmente.
Quando os sintomas atípicos (tosse crônica, rouquidão e
asma) são dominantes, mas associados à pirose frequente, a
probabilidade de DRGE é alta e um teste terapêutico com IBP
é recomendado durante 8 semanas. É importante salientar
que a pirose rapidamente melhora com o tratamento, mas
tosse, rouquidão ou asma respondem de maneira lenta e, às
vezes, melhoram somente após 3 a 6 meses de tratamento.
As manifestações atípicas em geral se apresentam como:
• Esofagianas: dor torácica sem evidência de
enfermidade coronariana (dor torácica não
cardíaca).
• Pulmonares: asma, tosse crônica, hemoptise,
bronquite, bronquiectasia e pneumonias de
repetição.
• Otorrinolaringológicas: rouquidão, pigarro
(clareamento da garganta), laringite posterior
crônica, sinusite crônica, otalgia.
• Orais: desgaste do esmalte dentário, halitose e aftas.
Os critérios de seleção para a investigação de RGE em
pacientes com tosse crônica incluem ausência de tabagismo e
de irritantes ambientais, exclusão de asma, secreção pós-
nasal e radiografias torácicas e de seios da face dentro da
normalidade.
Os pacientes com manifestações otorrinolaringológicas
procuram inicialmente especialista nesta área, o qual realiza
laringoscopia, podendo demonstrar presença de lesões –
edema, eritema, nódulos em prega vocal e granulomas –, as
quais não são específicas da DRGE.
Diagnóstico da DRGE
Na investigação de dor torácica recorrente com suspeita de
origem esofágica, um teste terapêutico com IBPs em dose
matinal e antes do jantar por 4 semanas tem sensibilidade
e especificidade aceitáveis para diagnóstico de DRGE. Em caso
de persistência de dor torácica, a EDA deve ser obtida e,
quando não demonstrar sinais (erosões, úlceras) de DRGE,
pode ser seguida por manometria esofágica e pHmetria de
24 horas, para excluir, respectivamente, doenças motoras do
esôfago ou DRGE. Por outro lado, na ausência de
pirose/regurgitação, é recomendável a investigação
complementar para confirmar DRGE e/ou descartar outras
doenças. É consenso que a maioria dos pacientes com
pirose/regurgitação que procuram os sistemas de saúde não
precisa de investigação complementar. Quando necessária,
em geral para sintomas atípicos, a investigação c
omplementar deve basear-se em critérios definidos.
Exames Complementares
A investigação complementar deve ser solicitada nas
seguintes condições:
• Ausência de resposta ao tratamento.
• Manifestações de alarme: disfagia, odinofagia,
anemia, hemorragia digestiva e emagrecimento,
história familiar de câncer, náuseas e vômitos, dor
torácica, além de sintomas de grande intensidade
e/ou de ocorrência noturna.
• Sintomas crônicos (lembrar-se da possibilidade de
EB).
• Necessidade de tratamento continuado.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
65
Endoscopia Digestiva Alta (EDA)
Identifica lesões em somente 30 a 40% dos pacientes com
DRGE e, portanto, tem baixa sensibilidade diagnóstica, não
confirmando a DRGE na maioria dos pacientes examinados.
Entretanto, sua capacidade de estimar o risco de
complicações em longo prazo é útil e, quando não revela
lesões atribuíveis ao refluxo, orienta o médico a evitar novas
endoscopias.
Não há uma boa correlação entre gravidade dos achados
endoscópicos e a intensidade dos sintomas, podendo ser
encontradas lesões acentuadas em indivíduos
oligossintomáticos e ausência de lesões em indivíduos muito
sintomáticos.
Os achados endoscópicos diagnósticos de DRGE são
esofagite erosiva graus C e D de Los Angeles, estenose
péptica e esôfago de Barrett. Os achados de esofagite grau
A e B devem ser analisados com reserva, pois indivíduos
assintomáticos podem apresentar esses achados e não
necessitam de tratamento específico.
Biópsias devem ser obtidas na presença de lesões
ulceradas/estenosantes ou na suspeita de esôfago de Barrett
e/ou neoplasia. Entretanto, quando a mucosa tem aspecto
normal à endoscopia, a coleta de biópsias tem valor limitado
pela sua sensibilidade diagnóstica baixa a moderada em
comparação com a pHmetria esofágica.
Entretanto, é recomendável a obtenção de biópsias quando,
além de sintomas típicos, houver também disfagia ou
impactação, pela probabilidade de esofagite eosinofílica.
Após o diagnóstico e a avaliação endoscópica inicial, não é
necessária a reavaliação endoscópica na maioria dos
pacientes depois do tratamento, exceto em caso de:
• Esofagite acentuada (graus C e D da classificação
de Los Angeles), pelo risco de o esôfago de Barret
estar oculto pelas erosões agudas da mucosa;
• Esôfago de Barret confirmado por biópsias;
• Estenose péptica;
• Úlcera esofágica;
• Quando houver piora clínica, especialmente quando
o paciente também apresenta sintomas ou sinais de
alerta (disfagia, odinofagia, emagrecimento,
anemia, melena, hematêmese).
A EDA é essencial no estadiamento da DRGE para identificar
risco de complicações futuras.
Exames Radiológicos
Estudo radiológico do esôfago contrastado com deglutição
de bário é importante na presença de disfagia e/ou dor
torácica associadas à pirose, pois permite a detecção de
alterações anatômicas observadas nas dismotilidades (p.
ex., acalásia, espasmo esofágico difuso) e nas estenoses
pépticas e neoplásicas.
pHmetria de 24 Horas
• Detecta a presença e quantifica o refluxo ácido.
• Estabelece a correlação entre episódios de refluxo e
sintomas (tosse, dor).
• Utiliza um cateter nasal com sensores para detectar
variações de pH no esôfago distal, registrando o
tempo em que o pH se mantém abaixo de 4.
• Alta sensibilidade e especificidade (>70%).
• Importante em casos com sintomas atípicos e
endoscopia normal.
• Deve ser feita 7 dias após a suspensão de IBPs ou
bloqueadores H2 em pacientes sem DRGE
comprovada.
• Pode ser realizada durante o uso de antirrefluxos em
pacientes com DRGE e sem resposta ao tratamento.
• Pacientes com complicações graves devem ser
acompanhados com pHmetria e encaminhados a
serviços especializados para monitoramento
endoscópico e controle do tratamento antirrefluxo.
Manometria Esofágica
• Avalia a força e coordenação da contração esofágica
e a competência do esfincter esofágico inferior.
• Imprescindível antes da pHmetria para
posicionamento correto do sensor.
• Não diagnostica DRGE, mas ajuda a investigar
sintomas como disfagia e dor torácica.
• Pode revelar doenças motoras do esôfago (espasmo
esofágico difuso, esôfago em quebra-nozes).
• Essencial para excluir acalásia, que pode mimetizar
sintomas de DRGE.
• Deve ser realizada antes de cirurgia antirrefluxo.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
66
Tratamento da DRGE
Medidas Comportamentais
Entre as medidas com benefício mais bem estabelecido estão
a perda de peso, a interrupção do tabagismo não seguida de
ganho de peso e, nos indivíduos com sintomas noturnos, a
elevação da cabeceira da cama, além de evitar refeições por
2 horas antes se deitar.
O sobrepeso corporal e a obesidade são fatores de risco não
só para os sintomas ou lesões do refluxo, mas também para
o adenocarcinoma do esôfago. O controle da DRGE passa pelo
adequado controle do sobrepeso e da obesidade, em especial
pelas suas características epidêmicas no mundo ocidental.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
67
Tratamento Farmacológico da DRGEDébora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
68
IBPs: não há evidência de superioridade farmacológica entre
os diferentes IBPs. Recomenda-se o uso do omeprazol
genérico.
• Administração: IBPs devem ser tomados 30 minutos
antes do desjejum para melhor eficácia. Se
necessário à noite, deve ser administrado 30 minutos
antes do jantar.
• Troca de IBP: se a dose máxima de omeprazol falhar
no controle da DRGE, pode-se tentar outros IBPs,
mas esses têm custos elevados, afetando a adesão
do paciente.
• Endoscopia normal e sintomas persistentes: se os
sintomas não melhoram com IBP em dose dupla e a
endoscopia for normal, deve-se considerar pirose
funcional ou esôfago hipersensível, com avaliação de
pHmetria sem uso de IBP.
• Casos graves de DRGE (graus C ou D, úlcera
esofágica, estenose, esôfago de Barrett) necessitam
de tratamento crônico com IBP em dose dupla ou
cirurgia antirrefluxo.
O uso prolongado de IBPs é benéfico em condições como
esôfago de Barrett, DRGE com recidivas frequentes e alto risco
de úlcera péptica, mas há muitas indicações inadequadas,
representando 20 a 50% dos casos. O uso crônico pode levar
a efeitos adversos, como hipergastrinemia, que causa
sintomas dispépticos após a interrupção abrupta. Embora
estudos retrospectivos sugiram associações com
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
69
complicações como osteoporose e AVC, os estudos
prospectivos não confirmam causalidade. Complicações
comprovadas incluem hipomagnesemia, má-absorção de
vitaminas e pólipos gástricos. Estudos apontam um risco
aumentado de câncer gástrico com o uso de IBPs, mas com
vieses questionáveis. O uso de IBPs durante a gestação é
considerado seguro, e sua interação com clopidogrel não
aumenta o risco cardiovascular, podendo ser usado
conjuntamente.
Pró-cinéticos: podem ser eficazes em pacientes com DRGE e
sintomas dispépticos como plenitude pós-prandial.
DRGE Refratária ao Tratamento
Indivíduos com DRGE são considerados refratários ao
tratamento quando a DRGE não responde a IBP em dose
dupla. Nessa situação, é importante averiguar o uso correto
dos IBPs, especialmente a sua ingestão ao menos 30 minutos
antes das refeições e a adesão. Quando há refratariedade
ao tratamento, é recomendável fazer uma revisão com um
especialista para confirmar o diagnóstico e considerar
tratamentos alternativos como o uso de baclofeno, que
inibe o relaxamento transitório do esfincter esofágico inferior,
ou a abordagem cirúrgica.
Cirurgia Antirrefluxo
A cirurgia antirrefluxo, quando realizada por cirurgiões
experientes, apresenta bons resultados a longo prazo,
semelhantes ao tratamento clínico, mas com índices de
sucesso inferiores quando realizada por profissionais menos
experientes. A fundoplicatura de Nissen por videolaparoscopia
é a técnica mais comum, com internação curta e risco de
disfagia transitória. Em longo prazo, muitos pacientes
necessitam de IBPs novamente. A cirurgia é indicada
principalmente para pacientes mais jovens com uso contínuo
de IBPs ou aqueles com persistência de regurgitação. A
resposta positiva a IBPs e a presença de defeitos anatômicos,
como hérnia hiatal ou hipotonia do esfíncter esofágico inferior,
são preditores de sucesso. A manometria pré-operatória e a
escolha de cirurgião experiente são fundamentais para o
sucesso do procedimento, conforme consenso do ICARUS
2019.
Quando Referenciar
Sugere-se que, nos casos de EDA com diagnóstico de
esofagite cujas classificações endoscópicas sejam graus 2,
3, 4 e 5 de Savary-Miller ou graus B, C e D de Los Angeles,
o médico de família coordene o cuidado da pessoa, por meio
da referência e da contrarreferência ao especialista focal
(gastrenterologista), pela necessidade de exames mais
complexos que possam ser racional e adequadamente
solicitados e, também, pelos riscos potenciais inerentes às
principais complicações do RGE.
Prognóstico e Complicações Possíveis
São complicações da DRGE:
• Esôfago de Barret (EB): é uma condição
caracterizada pela substituição do epitélio
estratificado escamoso por epitélio colunar com
células intestinalizadas, devido à exposição crônica
da mucosa esofágica ao refluxo gástrico. Afeta
predominantemente homens, brancos, com mais de
40 anos. O principal risco associado ao EB é o
desenvolvimento de adenocarcinoma esofágico,
com uma incidência de 30 a 125 vezes maior que na
população geral, variando de 0,2 a 2,1% ao ano em
indivíduos sem displasia. Não há tratamento eficaz
para reverter a metaplasia, sendo os tratamentos
focados no controle do refluxo. O acompanhamento
endoscópico é fundamental, com a frequência
variando conforme o grau de displasia: a cada 3
anos para pacientes sem displasia, anualmente
para displasia de baixo grau, e a cada 3 meses ou
intervenção cirúrgica em casos de displasia de alto
grau, dependendo da extensão da lesão.
• Estenose de esôfago distal: é, fundamentalmente,
uma complicação de resolução cirúrgica.
Recomenda-se que a pessoa seja submetida a uma
avaliação prévia do refluxo. A conduta cirúrgica
apropriada depende da extensão e da localização da
estenose, bem como da avaliação prévia da função
motora do corpo do órgão, realizada por meio da
esofagomanometria.
• Úlcera e sangramento esofágicos: sangramento
esofágico no RGE costuma ser lento e insidioso e,
muitas vezes, é o responsável por quadros de
anemia crônica. O tratamento clínico é a melhor
opção terapêutica.
Bibliografia
GUSSO, Gustavo; LOPES, José M C.; DIAS, Lêda C. Tratado de
medicina de família e comunidade - 2 volumes: princípios,
formação e prática. 2. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2019. E-
book. p.1450. ISBN 9788582715369. Disponível em:
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9788
582715369/. Acesso em: 22 mar. 2025.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
70
DUNCAN, Bruce B.; SCHMIDT, Maria I.; GIUGLIANI, Elsa R J.; et
al. Medicina ambulatorial: condutas de atenção primária
baseadas em evidências. 5. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2022.
E-book. p.740. ISBN 9786558820437. Disponível em:
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9786
558820437/. Acesso em: 22 mar. 2025.
SEMANA 08: ATENÇÃO À
SAUDE DO HOMEM – DATA:
17/03/2025
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
• Conhecer os principais aspectos de atenção à saúde
do homem (acessibilidade e integralidade do
cuidado);
Objetivos Específicos
• Discutir a PNAISH – Política Nacional de Atenção
integral à saúde do Homem (acessibilidade e
integralidade do cuidado);
• Conhecer o perfil de morbimortalidade relacionado à
saúde do homem;
• Conhecer as estratégias de atuação para efetivação
da PNAISH na APS.
Princípios e diretrizes da PNAISH e sua aplicabilidade na
Atenção Primária à Saúde (APS) para o cuidado integral
dos homens
A Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem
(PNAISH), criada em 2009, foi estabelecida pelo Ministério da
Saúde (MS) com o objetivo de garantir um cuidado integral à
saúde masculina (população alvo homens entre 20 e 59
anos), visando a melhoria das condições de saúde dessa
população, com foco nas questões de gênero e nas
especificidades biológicas e sociais dos homens. A Portaria
GM/MS nº 3.562/2021 veio para operacionalizar de forma
mais eficaz a atenção integral aos homens, considerando as
especificidades do sexo masculino em relação à saúde física,
mental e social. Os principais princípios que norteiam a
PNAISH, conforme a portaria, são:
• Integralidade e Equidade: as ações de saúde devem
ser articuladas de maneira que cubram todas as
necessidades de saúde dos homens, sem distinção
de classe social, etnia ou região. A portaria reforça a
necessidade de inclusão dos homens nas estratégias
de saúde pública, com foco na equidade no acesso a
serviços de saúde.
• Promoção da Saúde e Prevenção de Doenças: a
PNAISH, em consonância com a portaria de 2021,
prioriza a promoção de saúde e a prevenção de
doenças, especialmente as mais prevalentesentre os
homens, como câncer de próstata, doenças
cardiovasculares, diabetes e transtornos mentais. A
portaria destaca a necessidade de campanhas de
conscientização e a oferta de exames preventivos
nas unidades de saúde, além de programas voltados
à redução de comportamentos de risco, como
tabagismo e alcoolismo.
• Atenção à Saúde Sexual e Reprodutiva Masculina:
um dos pontos de destaque da portaria é a
ampliação das ações voltadas para a saúde sexual e
reprodutiva masculina. A política deve ser integrada
à saúde sexual, com ações que envolvem educação
sexual, rastreamento de doenças sexualmente
transmissíveis (DSTs) e o cuidado preventivo do
câncer de próstata e testículos.
• Promoção de Saúde Mental: a portaria também
reconhece a importância da saúde mental masculina,
especialmente considerando os altos índices de
depressão, suicídio e alcoolismo entre os homens. A
promoção de saúde mental deve ser integrada ao
cuidado integral, com ênfase na redução do estigma
em torno da busca por ajuda psicológica.
• Fortalecimento da Atenção Primária à Saúde
(APS): a Estratégia Nacional de Saúde do Homem,
estabelecida pela portaria, destaca a importância de
fortalecer a APS para alcançar os homens em todos
os níveis de cuidado. A promoção da saúde do
homem deve ser realizada principalmente nas
unidades de saúde da família, com base em
abordagens de proximidade e na construção de
vínculos de confiança.
Eixos Principais da PNAISH
Entre os principais objetivos da PNAISH, destaca-se a
necessidade de reconhecer os diversos contextos
socioculturais e político-econômicos para a compreensão da
realidade singular da saúde masculina. Isso significa que as
políticas de saúde precisam ser sensíveis a fatores como
classe social, etnia, gênero, território e outros aspectos, de
modo que o cuidado seja personalizado e leve em conta as
condições reais de vida e saúde dos homens. Esses contextos
também influenciam a forma como os homens percebem sua
saúde e sua disposição para buscar cuidados médicos.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
71
Para operacionalizar essa tarefa complexa de promover a
saúde do homem de maneira eficaz, a PNAISH está
estruturada em cinco eixos principais, que abrangem
diferentes aspectos da vida e da saúde masculina:
1. Acesso e Acolhimento
Este eixo trata da acessibilidade aos serviços de saúde e da
necessidade de acolhimento adequado aos homens nas
unidades de saúde. Um dos maiores desafios enfrentados
pelas políticas de saúde do homem é o fato de muitos homens
não procurarem os serviços de saúde de forma preventiva,
muitas vezes por questões culturais relacionadas à
masculinidade, como a ideia de que “homem não deve se
queixar” ou “homem não precisa de cuidados médicos”.
Portanto, esse eixo busca garantir que os homens
tenham facilidade de acesso aos serviços de saúde e que se
sintam acolhidos por profissionais capacitados para lidar com
as especificidades dessa população. É essencial que as
unidades de saúde estejam preparadas para reduzir o
estigma e oferecer um ambiente acolhedor.
2. Saúde Sexual e Reprodutiva
A saúde sexual e reprodutiva masculina muitas vezes é
negligenciada em comparação com a saúde das mulheres,
mas é um aspecto crucial da saúde do homem. Esse eixo
busca integrar ações para informar os homens sobre saúde
sexual, como prevenção de doenças sexualmente
transmissíveis (DSTs), planejamento familiar, saúde prostática
e cuidados com a fertilidade. Além disso, esse eixo também
está ligado à educação sobre práticas sexuais seguras e à
promoção de uma visão mais responsável sobre o exercício
da sexualidade. Assim, a PNAISH busca garantir que os
homens tenham informação e acesso a serviços de saúde
sexual e reprodutiva que atendam suas necessidades e
promovam o bem-estar físico e psicológico.
3. Paternidade e Cuidado
O eixo de paternidade e cuidado aborda a participação do
homem no cuidado dos filhos, tanto no aspecto físico quanto
emocional. Tradicionalmente, a sociedade coloca a mulher
como principal responsável pela criação dos filhos, o que pode
afastar os homens de suas responsabilidades parentais. Esse
eixo busca reverter essa concepção, incentivando os homens
a se envolverem de maneira mais ativa no cuidado com os
filhos e no processo de educação parental. Além disso,
a paternidade responsável inclui também o cuidado com a
saúde do homem, principalmente no contexto de doenças que
possam afetar a sua capacidade de cuidar dos filhos, como
problemas de saúde mental, doenças crônicas e doenças
sexualmente transmissíveis.
4. Doenças Prevalentes na População Masculina
A PNAISH enfatiza a necessidade de identificar e abordar
as doenças mais prevalentes entre os homens, incluindo
doenças cardiovasculares, câncer de próstata, doenças
respiratórias crônicas, entre outras. Este eixo busca qualificar
a atenção à saúde para essas condições, por meio
da prevenção, diagnóstico precoce e tratamento. A promoção
da saúde também entra aqui, com o incentivo à adoção
de hábitos saudáveis (como alimentação adequada, prática
de atividades físicas, controle do consumo de álcool e tabaco)
para prevenir doenças crônicas e melhorar a qualidade de vida
dos homens.
5. Prevenção de Violências e de Acidentes
A violência (em todas as suas formas) e os acidentes são
duas das principais causas de morte e morbidade entre os
homens. Esse eixo tem como objetivo promover ações que
busquem reduzir a violência, seja ela doméstica, no trânsito
ou no contexto de violência urbana, além de prevenir
acidentes, especialmente aqueles relacionados a
comportamentos de risco, como o abuso de álcool e a falta de
proteção no trânsito. Esse eixo também envolve a promoção
de políticas públicas que possam garantir a segurança e o
bem-estar dos homens, além de sensibilizar para a prevenção
de comportamentos violentos que também afetam a saúde
mental dos homens.
Uma crítica à política é que, ao centrar esforços nos agravos
repartidos entre cinco áreas temáticas e suas respectivas
especialidades médicas (psiquiatria, cardiologia,
pneumologia, urologia e gastrenterologia), ela põe em risco
toda a discussão sobre a complexidade do problema e se
torna parcial, ao desconsiderar a importância inegável dos
fatores socioculturais relacionados à morbimortalidade por
causas externas.
Perfil de Morbimortalidade Relacionado à Saúde do
Homem
Os homens construíram sua masculinidade apoiada na crença
da invulnerabilidade, o que repercute no seu envolvimento
com práticas de risco à saúde tanto no trabalho como no lazer.
Em compensação, buscam legitimar seu poder e até sua
superioridade perante outros homens e outras mulheres. Esse
modelo de masculinidade foi denominado masculinidade
hegemônica e se expressa por seu comportamento e sua
atitude diante do risco e por uma sexualidade instintiva,
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
72
incontrolável, que vem sendo criticado em sua aplicabilidade
e ressonância nos dias atuais.
Segundo dados de 2015, do banco de dados do Sistema
Único de Saúde (DATASUS) os homens brasileiros morrem em
média cerca de 7 anos mais cedo do que as mulheres. As
políticas de saúde brasileiras historicamente privilegiaram
mulheres e crianças, e os homens são frequentemente vistos
como meros facilitadores ou dificultadores da saúde sexual e
reprodutiva feminina. É histórico o desconhecimento sobre as
peculiaridades de ser homem na sociedade.
Boa parte de sua mortalidade é por causas evitáveis, muito
relacionadas a comportamentos adotados por
corresponderem a um estereótipo tradicional de
masculinidade. Também, a inclusão dos homens nos serviços
de saúde tem ocorrido de uma forma medicalizada e
potencialmente iatrogênica, focada no tratamento da
disfunção erétil e no rastreamento do câncer de próstata.
Além da perspectiva de gênero, é importante considerar
outras categorias de análise e determinantes sociais da
saúde, como raça/cor,renda e estágios do ciclo de vida
individual e familiar no entendimento de sua condição de
saúde e relação com os serviços e na busca por uma atenção
à saúde inclusiva, empática e resolutiva.
O perfil de morbimortalidade dos homens no Brasil revela um
conjunto de doenças e condições que impactam diretamente
a vida dessa população e indicam áreas prioritárias para a
intervenção da PNAISH e da Estratégia Nacional de Saúde do
Homem. A morbimortalidade masculina está fortemente
associada a fatores comportamentais, biológicos e sociais, e
os principais problemas incluem:
• Doenças Cardiovasculares: as doenças do coração
são a principal causa de morte entre os homens,
especialmente no Brasil, com destaque para o infarto
do miocárdio e o acidente vascular cerebral (AVC).
Fatores como sedentarismo, alimentação
inadequada, e consumo excessivo de álcool e tabaco
são determinantes para a alta incidência dessas
doenças.
• Neoplasias (tumores): o câncer é uma das
principais causas de morbidade e mortalidade entre
os homens, especialmente o câncer de próstata,
que apresenta altas taxas de incidência e
mortalidade. Outros tipos de câncer prevalentes
entre os homens incluem câncer de pulmão, fígado
e esôfago. A implementação de programas de
rastreamento e diagnóstico precoce é essencial para
a redução da mortalidade.
• Doenças do Aparelho Respiratório e Tabagismo: o
tabagismo é um dos principais fatores de risco para
doenças respiratórias crônicas, como a Doença
Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC). A prevalência
de tabagismo entre os homens é significativa no
Brasil, especialmente em regiões mais vulneráveis.
• Suicídios e Problemas de Saúde Mental: a taxa de
suicídios é mais alta entre os homens, com destaque
para os homens jovens. Além disso, transtornos de
saúde mental, como depressão e ansiedade, afetam
uma grande parcela dessa população, muitas vezes
de forma não tratada devido ao estigma relacionado
ao cuidado psicológico.
• Causas Externas (violência e Acidentes): as taxas
de mortalidade por acidentes de trânsito, homicídios
e outros tipos de violência também são
significativamente mais altas entre os homens. Isso é
em grande parte relacionado a comportamentos de
risco, como o consumo excessivo de álcool e a
exposição a situações de violência urbana.
Perfil de Morbidade Masculina (GUSSO et al., 2019)
Causa % Descrição
Causas Externas
(Acidentes)
16 A maioria relacionada a
quedas e acidentes de
trânsito, com maior
prevalência entre homens de
20 a 29 anos.
Patologias do
Aparelho
Circulatório
- Acidentes Coronarianos: 40%
das internações dentro das
patologias circulatórias.
Hipertensão Arterial
Sistêmica (HAS): 19% das
internações.
Tumores - Aumento no número de
internações por tumores entre
2000 e 2007, indicando um
aumento no diagnóstico de
câncer, embora a causa ainda
não seja totalmente
esclarecida.
Problemas
Respiratórios
- Redução relativa de
internações por doenças do
aparelho respiratório entre
2000 e 2007.
Tabagismo 19,2 Percentual de homens maiores
de 18 anos que utilizam
produtos derivados do tabaco.
Abuso de Álcool 21,6 Percentual de homens que
fazem uso abusivo de álcool,
maior do que o de mulheres.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
73
Saúde Mental - 1,5 milhão de homens
apresentam problemas
relacionados à saúde mental
(entre os 11 milhões de
homens com necessidades
especiais).
População
Carcerária
- Quase 600 mil homens,
correspondendo a 94% da
população carcerária brasileira.
As causas externas, como acidentes, agressões e suicídios,
são a principal causa de morte entre homens jovens, sendo
superadas pelas doenças do aparelho circulatório e tumores
a partir dos 50 anos, devido ao efeito cumulativo dos hábitos
de vida. Aproximadamente 25% das mortes entre homens de
20 a 59 anos são por doenças circulatórias, indicando a
ineficácia das estratégias de prevenção secundária no Brasil.
As neoplasias, especialmente o câncer de pulmão, próstata e
estômago, também são responsáveis por grande parte das
mortes, assim como as doenças hepáticas, frequentemente
associadas ao abuso de álcool. Fatores como o tabagismo e
o abuso de álcool, que estão intimamente ligados a uma
masculinidade hegemônica, contribuem para o alto índice de
doenças vasculares, respiratórias e neoplásicas, refletindo um
comportamento culturalmente arraigado em que os homens
lidam com o sofrimento psíquico sem buscar cuidados.
A análise desses dados deve considerar as lentes de gênero,
pois os padrões sociais masculinos têm grande impacto nas
mortes e agravos evitáveis, ressaltando a importância de
estratégias de saúde que levem em conta essas
especificidades.
Impacto da PNAISH no Cuidado à Saúde do Homem
Com base na portaria, a implementação de ações de
rastreamento de câncer de próstata, diabetes e hipertensão
se intensificou nas unidades de saúde, sendo um avanço
importante para a prevenção precoce dessas condições.
Embora a adesão ainda seja um desafio, a ampliação da
educação em saúde e as campanhas de conscientização têm
mostrado resultados positivos.
A portaria também propõe uma abordagem mais sensível à
saúde mental, com a incorporação de estratégias para o
manejo de transtornos psicológicos, como a depressão, que
afeta uma parcela significativa da população masculina. A
inclusão da saúde mental nas estratégias de saúde do
homem, prevista na portaria, visa reduzir os índices de suicídio
e promover uma abordagem mais holística no cuidado.
As ações educativas promovidas pela Estratégia Nacional de
Saúde do Homem têm contribuído para uma mudança de
paradigma em relação à saúde masculina, especialmente nas
faixas etárias mais jovens, ao promover a conscientização
sobre saúde sexual, prevenção de cânceres e saúde mental.
Desafios na Implementação da PNAISH e da Portaria
GM/MS nº 3.562/2021
Apesar dos avanços, as normas culturais e sociais de
masculinidade continuam a ser uma barreira significativa para
a adesão dos homens aos cuidados médicos. A ideia de que
os homens devem ser autossuficientes e resistentes a mostrar
fraqueza ainda influencia a busca por serviços de saúde,
especialmente nas questões preventivas.
Ainda, a implementação eficaz da PNAISH e da Estratégia
Nacional de Saúde do Homem depende da formação contínua
dos profissionais de saúde para lidar com as especificidades
do atendimento ao homem. A capacitação em gênero e saúde
mental é crucial para que os profissionais possam oferecer um
cuidado sensível e acolhedor.
A falta de infraestrutura adequada em muitas unidades de
saúde, especialmente em áreas periféricas ou rurais, ainda
representa um desafio para a efetividade das políticas de
saúde do homem. A ampliação do acesso a serviços de saúde
de qualidade continua sendo um obstáculo que precisa ser
enfrentado, principalmente por meio da ampliação de recursos
para a APS.
Papel do profissional de saúde
O papel do profissional de saúde na abordagem aos homens
deve ser de questionamento e reflexão sobre os estereótipos
de masculinidade, sem reforçá-los, mas problematizando suas
circunstâncias de vida, hábitos e estágios nos ciclos
individuais e familiares. Os médicos devem ajudar os homens
a perceberem e lidarem com sua vulnerabilidade,
considerando que muitos não reconhecem os riscos que
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
74
enfrentam, como acidentes e violências, muitas vezes
associados a comportamentos impulsivos e irresponsáveis. A
prática profissional deve romper com modelos binários de
gênero, superando a vitimização das mulheres e a
culpabilização dos homens, reconhecendo que as relações de
gênero são de poder e que os homens também podem ser
tanto responsáveis quanto vítimas de suas ações, impactando
direta ou indiretamente seus amigos e familiares.
Acesso e uso dos serviços de Atenção Primária à Saúde
(APS)
O acesso dos homens aos serviços de APS envolve a
percepçãode necessidade de cuidado, a conversão dessa
percepção em demanda e o efetivo comparecimento ao
serviço. Esse processo é frequentemente dificultado por
profissionais sobrecarregados com diversas demandas e
metas de produção. As principais barreiras de acesso podem
ser divididas em socioculturais e institucionais, sendo que
essas dimensões se interrelacionam e influenciam
mutuamente, o que torna o acesso mais complexo para os
homens, como evidenciado em estudos de diversos autores.
Barreiras socioculturais
As barreiras socioculturais ao acesso dos homens aos
serviços de saúde estão intimamente ligadas a estereótipos
de masculinidade, como o conceito do homem invulnerável.
Esse estereótipo leva muitos homens a evitarem procurar
ajuda médica, associando a busca por cuidados à fraqueza,
um traço tradicionalmente atribuído às mulheres. Além disso,
muitos homens, ao longo de suas vidas, se envolvem em
comportamentos de risco, como abuso de álcool e drogas,
que são vistos como parte de uma "masculinidade
hegemônica". Esse comportamento é influenciado pelo
ambiente social, cultural e pelas expectativas sobre o papel do
homem na sociedade, como provedor e menos suscetível a
questões de saúde.
Esses padrões de masculinidade também se refletem nas
atitudes e práticas dos profissionais de saúde, que
frequentemente adotam uma lógica biomédica estreita, focada
na detecção de doenças e não na promoção da saúde. Isso
contribui para a falta de acolhimento dos homens,
especialmente em unidades de saúde que, muitas vezes, são
percebidas como espaços femininos, o que dificulta o
engajamento dos homens. Além disso, a cultura de não
permitir que os homens exerçam papéis de cuidado, como
cuidar de filhos ou cônjuges, fortalece a ideia de que a saúde
e o cuidado são responsabilidades femininas, levando os
homens a se distanciar ainda mais dos serviços de saúde.
Barreiras institucionais – Comunicação
As barreiras institucionais ao acesso dos homens aos serviços
de saúde estão relacionadas à abordagem inadequada que
frequentemente é aplicada a eles, com foco excessivo em
programas pré-definidos, como os voltados para a próstata,
hipertensão e diabetes. Esse modelo, muitas vezes autoritário
ou culpabilizador, não considera as especificidades do homem
e pode aliená-lo dos cuidados de saúde. A resistência à saúde
também é agravada pela forma como os homens são tratados,
sem a devida personalização, o que torna a abordagem
ineficaz e distante das necessidades reais dessa população.
Além disso, os serviços de saúde não conseguem se
comunicar adequadamente com os homens, uma vez que
muitas unidades são feminilizadas, com decoração e
campanhas direcionadas predominantemente ao público
feminino, infantil ou idoso. Esse ambiente pode fazer com que
os homens se sintam deslocados ou desconfortáveis ao
procurar atendimento. No consultório, a abordagem clínica
muitas vezes não leva em conta as formas próprias dos
homens de expressarem seus problemas, como questões de
sexualidade, o que pode resultar em diagnósticos ou
tratamentos desnecessários. Para melhorar essa situação, é
essencial que os profissionais adotem uma comunicação mais
empática e sensível, levando em conta as demandas ocultas
dos homens, como disfunções sexuais, que muitas vezes são
mascaradas por queixas gerais ou busca por exames de
rotina.
Possíveis inadequações dos serviços de saúde
Horário de funcionamento
Embora o horário de funcionamento das unidades de saúde
seja frequentemente citado como uma barreira ao acesso dos
homens, especialmente por colidir com o horário de trabalho,
esse argumento perde força diante da presença das mulheres
trabalhadoras, que conseguem comparecer mais
frequentemente. As mulheres, em geral, priorizam mais a
saúde, enfrentam maior culpabilização por faltas e têm mais
facilidade para negociar saídas do trabalho por questões de
saúde. Para melhorar o acesso dos homens aos serviços, é
fundamental que a equipe de saúde reflita se realmente está
oferecendo ajuda adequada ou se está simplesmente
tentando adaptar os homens a uma rotina rígida, sem
considerar suas necessidades e possibilidades. Experiências
de atendimentos noturnos, por exemplo, têm mostrado ser
uma solução eficaz para melhorar o acesso à população.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
75
Dificuldades de acesso
Os homens enfrentam dificuldades de acesso aos serviços de
saúde devido à falta de uma abordagem específica para suas
necessidades, o que resulta em um ciclo de invisibilidade. Eles
frequentemente não são reconhecidos como sujeitos do
cuidado, e os profissionais de saúde, sem treinamento
adequado, não sabem como abordá-los. Isso leva os homens
a perceberem o serviço como um "não lugar" e a evitarem
consultas. Além disso, homens de identidades sexuais e de
gênero diversas, como os homossexuais, bissexuais e
transexuais, podem evitar os serviços por medo de
preconceito.
Profissionais mulheres, médica mulher realizando exame
físico de partes íntimas
A predominância de mulheres entre os profissionais da APS
pode ser uma barreira para os homens, especialmente
quando se trata de exames íntimos e discussões sobre saúde.
Muitos profissionais tentam negar as questões de gênero, mas
é importante reconhecer essas diferenças e oferecer opções
de atendimento que gerem confiança, como permitir a escolha
do médico de acordo com o gênero. A qualidade da relação
terapêutica e a capacitação dos profissionais são essenciais
para que os homens se sintam à vontade e legitimem o serviço
para trazer suas demandas mais íntimas.
Estratégias para a Efetivação da PNAISH e da Portaria
GM/MS nº 3.562/2021
Uma das estratégias chave para a efetivação da PNAISH é o
fortalecimento da APS, com a criação de unidades de saúde
mais acessíveis, próximas das comunidades e mais
preparadas para atender às necessidades específicas dos
homens. A implementação de práticas educativas nas UBS é
essencial para aumentar a adesão à saúde preventiva.
O desenvolvimento de campanhas de conscientização, como
o Novembro Azul, e a promoção de práticas de saúde
masculinas através de mídias tradicionais e digitais, são
fundamentais para quebrar o estigma e incentivar os homens
a procurarem os serviços de saúde.
Integrar serviços de apoio psicológico nas unidades de saúde
e criar campanhas que desmistifiquem a busca por cuidados
de saúde mental é uma estratégia fundamental para reduzir
os índices de suicídio e transtornos emocionais.
A aproximação com os homens no contexto da saúde exige
mudanças significativas nos serviços, tanto nas atitudes dos
profissionais quanto nas ações realizadas. Experiências bem-
sucedidas incluem atividades dentro e fora dos centros de
saúde, como a promoção de grupos de homens e a
participação em eventos comunitários, como festas e
atividades esportivas. Além disso, intervenções sobre a
violência de gênero, desconstruindo padrões de
masculinidade, também têm mostrado resultados positivos,
como grupos reflexivos que contribuem para a
conscientização sobre a violência como parte do repertório
masculino na resolução de conflitos.
Experiências inovadoras também são observadas em
municípios brasileiros, como Campinas-SP, que desenvolvem
ações específicas para homens, como "dias temáticos" e a
inclusão de pais no pré-natal. Internacionalmente, programas
no Canadá focam na paternidade e na saúde, enquanto no
Reino Unido a falta de acesso adequado à saúde entre
homens em situação de privação socioeconômica permanece
um desafio. Em geral, aumentar o acesso aos serviços de
saúde e facilitar a demanda espontânea pode contribuir para
a presença dos homens nos serviços, favorecendo ações
preventivas e de promoção da saúde.
Novembro Azul
O câncer de próstata é a neoplasia mais comum entre os
homens, mas o rastreamento para sua detecção tem gerado
controvérsias, principalmente devido ao seu impacto limitado
na redução da mortalidadee aos efeitos colaterais
indesejáveis, como disfunção erétil e incontinência urinária.
Campanhas como o “Novembro Azul” buscam popularizar o
rastreamento, mas muitos profissionais de saúde questionam
sua eficácia. Em resposta, o Departamento de APS de Curitiba
sugeriu aproveitar a oportunidade da campanha para realizar
rastreamentos de outras condições, como etilismo, tabagismo
e diabetes, que realmente podem beneficiar a saúde da
população masculina.
É fundamental que os gestores e profissionais de saúde
reconheçam as especificidades das demandas dos homens e
adotem abordagens mais adequadas, superando estereótipos
e utilizando estratégias de saúde que atendam as
necessidades reais dessa população. Isso inclui considerar as
diferenças de classe, raça e identidade de gênero, bem como
articular ações de prevenção e tratamento que reduzam as
causas evitáveis de morbimortalidade. Assim, o sistema de
saúde pode se tornar mais eficiente e inclusivo, garantindo
cuidados mais direcionados e eficazes para os homens.
Bibliografia
GUSSO, Gustavo; LOPES, José M C.; DIAS, Lêda C. Tratado de
medicina de família e comunidade - 2 volumes: princípios,
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
76
formação e prática. 2. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2019. E-
book. p.751.
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 3.562, de 15
de dezembro de 2021. Institui a Política Nacional de Atenção
Integral à Saúde do Homem (PNAISH) no âmbito do Sistema
Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União, Brasília, DF, 15
dez. 2021.
SEMANA 09: POPULAÇÃO
PRIVADA DE LIBERDADE –
DATA: 31/03/2025
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
• Conhecer a atenção à saúde da População Privada
de Liberdade.
Objetivos Específicos
• Conhecer os objetivos da Política Nacional de
Atenção integral à Saúde das Pessoas Privadas de
Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP).
• Conhecer à atenção a saúde da população privada
de liberdade.
• Abordar os princípios da atenção Básica na
população prisional.
• Conhecer as Equipes de Atenção Primária Prisional
(eAPP)
População Prisional
Como em qualquer população definida, existem
especificidades com as quais o médico de família deve estar
familiarizado: tuberculose, autolesão, uso de psicotrópicos,
simulação, comportamentos disruptivos, tabagismo e
questões judiciais.
De acordo com os dados mais recentes disponíveis, referentes
ao final de 2023, a população prisional brasileira era estimada
em aproximadamente 820 mil pessoas. Esse número inclui
indivíduos em regime fechado, semiaberto e aberto, além de
presos provisórios.
Perfil da população prisional (dados de 2023)
• Sexo: cerca de 95% são homens.
• Faixa etária: a maioria tem entre 18 e 34 anos.
• Escolaridade: predominância de pessoas com ensino
fundamental incompleto.
• Cor/raça: a maior parte se autodeclara como preta
ou parda.
• Regime de prisão: a maioria está em regime fechado.
• Presos provisórios: uma parcela significativa ainda
não foi julgada.
A maioria está cumprindo pena principalmente por roubo,
tráfico de drogas, furtos e homicídios. Essa população,
oriunda na maioria das vezes de comunidades desfavorecidas,
já apresenta condições de saúde precárias antes mesmo do
encarceramento. Condições de higiene inadequadas, celas
mal ventiladas e superpopulosas contribuem para o
agravamento da sua condição de saúde.
Princípios da atenção primária na população prisional
Acesso
A comunicação e o contato entre detentos e equipe de saúde
nem sempre são facilitados. Compromissos judiciais, visitas de
familiares e advogados, horários de refeições, transferências
de celas, banhos de sol e outros procedimentos de segurança
podem tornar o detento temporariamente inacessível.
Dependendo do nível de segurança da unidade prisional,
existem diferentes possibilidades de como o detento pode
solicitar atendimento ou medicamentos.
Unidades de baixo nível de segurança: os detentos podem ir
espontaneamente para a unidade de saúde. O acesso pode
funcionar no estilo porta-aberta ou Walk-in, sem
agendamentos prévios. De acordo com o volume, uma triagem
deve ser estabelecida, geralmente por profissional da
enfermagem. Comumente, os detentos solicitam atendimento
a outro detento, que repassa os pedidos aos agentes de
segurança ou diretamente a estes. Depois, os pedidos são
encaminhados à equipe de saúde.
• Uma questão inicial é tentar ao máximo que a
solicitação seja feita diretamente ao profissional de
saúde, sem intermediários. Assim, evitam-se
potenciais retaliações ou barganhas referentes ao
acesso à saúde.
Métodos de acesso à saúde na prisão: vantagens e
desvantagens
Lista com nomes
Vantagens:
• Enfatiza encontros frente a frente para queixas de
saúde;
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
77
• Não depende da capacidade de escrita do paciente,
exceto para escrever o próprio nome;
• Elimina a necessidade de triagem para avaliação
inicial;
• As consultas podem ser documentadas
cronologicamente em folhas de evolução.
Desvantagens:
• Encontros frente a frente não são necessários do
ponto de vista clínico para cada problema de saúde;
• Aumento do volume de movimentações de
prisioneiros e, consequentemente, do tempo gasto
para que cada um seja avaliado frente a frente;
• O prontuário deve estar prontamente disponível para
cada encontro;
• Pode não ser possível abordar completamente o
problema, porque a informação precisa ser checada
ou acompanhada;
• A menos que se organizem oportunidades de
cancelamento do pedido, o número de ausências
pode ser um problema;
• Precisa ser organizado de forma que seja compatível
com as outras atividades da instituição.
Por escrito
Vantagens:
• Problemas não clínicos podem ser resolvidos sem a
necessidade de consulta presencial;
• A documentação começa com o pedido;
• Referências/encaminhamentos podem ser feitos
diretamente para o serviço correto, se necessário;
• Ações que vão abordar o problema mais diretamente
podem ser agendadas (renovação de prescrições,
educação em saúde, agendamento para exames
etc.);
• O prontuário e outras informações podem ser
revisados, permitindo uma melhor abordagem da
queixa;
• Reduz o volume de movimento para e da unidade de
saúde.
Desvantagens:
• Problemas de saúde que deveriam ser resolvidos de
modo presencial podem ser abordados
inapropriadamente;
• O volume de papel a ser arquivado no prontuário
aumenta, uma vez que cada pedido escrito gera um
novo pedaço de papel;
• Uma baixa capacidade de escrita pode atrapalhar
uma resposta adequada da equipe de saúde;
• As solicitações devem ser colocadas em uma caixa e
a confidencialidade deve ser protegida;
• As solicitações devem ser coletadas diariamente;
• Maiores chances de erro ou omissão de informação
importante no pedido;
• Prisioneiros solicitarão atendimento pela mesma
queixa diversas vezes, a menos que haja uma
resposta rápida e satisfatória ao paciente;
• Membros da equipe de saúde podem ser muito
rígidos e insistir que um pedido escrito seja
produzido quando o paciente deveria ser visto de
qualquer maneira, mesmo que não tenha feito
nenhum pedido.
Walk-in
Vantagens:
• Fácil para os pacientes usarem;
• Enfatiza encontros frente a frente para queixas de
saúde;
• Não depende da capacidade de escrita do paciente;
• Elimina a necessidade de triagem para avaliação
inicial;
• As consultas podem ser documentadas
cronologicamente em folhas de evolução.
Desvantagens:
• É necessário encontrar o prontuário no momento em
que o paciente solicita atendimento;
• Não há priorização de necessidades e uso dos
recursos;
• Encontros frente a frente não são necessários do
ponto de vista clínico para cada problema de saúde;
• Doentes podem não conseguir chegar à unidade de
saúde;
• Pode não ser possível abordar completamente o
problema, porque a informação precisa ser checada
ou acompanhada;
• Pode ser difícilgarantir acesso levando em conta
agendamentos e controle do movimento;
• Precisa ser organizado de forma que seja compatível
com as outras atividades da instituição.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
78
Telefone
Vantagens:
• Aproxima-se do modelo da solicitação de consulta da
comunidade em geral;
• Facilita o diálogo entre o profissional de saúde e o
paciente para abordar a queixa;
• Não depende da capacidade de escrita do paciente;
• As ligações podem ser documentadas
cronologicamente em folhas de evolução;
• Reduz o volume de movimento para e da unidade de
saúde.
Desvantagens:
• A quantidade de aparelhos telefônicos e a
capacidade da central telefônica podem não ser
suficientes para lidar com o volume de chamadas;
• Muitas tentativas até ter sua ligação atendida podem
ser uma barreira de acesso;
• Difícil utilização para pacientes com dificuldades de
comunicação;
• O prontuário deve ser resgatado no momento em
que o atendimento é solicitado;
• Problemas de saúde que deveriam ser resolvidos de
forma presencial podem ser abordados
inapropriadamente;
• Pode não ser possível abordar completamente o
problema, porque a informação precisa ser checada
ou acompanhada;
• Interrompe outras tarefas dos profissionais de
saúde, a menos que sejam previstos horários
específicos para as chamadas ou instalado um
serviço de mensagens.
Consulta agendada
Vantagens:
• Aproxima-se do modelo da solicitação de consulta da
comunidade em geral;
• Elimina a triagem e o encaminhamento ao
profissional de saúde;
• O prontuário pode ser analisado antes da consulta;
• Não depende da capacidade de escrita do paciente;
• As consultas podem ser documentadas
cronologicamente em folhas de evolução;
• O movimento para e da unidade de saúde é
agendado.
Desvantagens:
• Não há priorização de necessidades e uso dos
recursos;
• Encontros frente a frente não são necessários do
ponto de vista clínico para cada problema de saúde;
• Pode não ser possível abordar completamente o
problema, porque a informação precisa ser checada
ou acompanhada;
• Pode haver mais solicitações do que vagas e o
acesso pode ser negado;
• A menos que se organizem oportunidades de
cancelamento do pedido, o número de ausências
pode ser um problema.
Integralidade
Os serviços de atenção à saúde prisional devem garantir a
integralidade, com uma carteira de serviços pelo menos
semelhante à dos serviços de medicina de família e
comunidade. Alguns cuidados adicionais são ainda
necessários, como a questão de detentos que precisam de
cuidadores.
Devido à dificuldade de acesso a serviços externos, é
necessário ampliar o cuidado clínico dentro dos presídios, por
meio da presença de profissionais e equipamentos ou
parcerias para acompanhamento remoto com serviços
especializados.
Quanto aos medicamentos, podem ocorrer obstáculos pelo
pessoal de segurança em relação a quais medicamentos
podem ficar com o paciente. É importante que o médico de
família negocie, dentro do possível, a favor da melhor solução
clínica.
Dependendo do porte da penitenciária, o médico de família
também tem o dever de advogar condições adequadas de
internação em hospitais gerais e terciários. Enfermarias
adaptadas garantem tanto uma acomodação adequada ao
detento quanto a segurança geral ao hospital, como, por
exemplo, em relação a fugas ou resgates.
Coordenação do cuidado
O confinamento facilita a coordenação do cuidado entre os
diferentes níveis de atenção à saúde. O médico de família
pode acompanhar o detento às consultas, discutindo o caso
com especialistas.
A presença do médico ajuda a contextualizar o tratamento ao
ambiente prisional (ex: quimioterapia, pós-operatório). Em
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
79
internações, inclusive emergenciais, o médico deve ser
informado para acompanhar o cuidado.
Em alguns casos, é possível acesso remoto a especialistas,
sem deslocamento do detento (ex: HIV, hepatite C,
tuberculose, diabetes tipo 1).
A contrarreferência é garantida, com retorno de documentos
e orientações à equipe prisional. O médico da unidade avalia
a viabilidade do plano, assegura o fornecimento de
medicamentos e exames, e garante os retornos de
acompanhamento.
Longitudinalidade
A população prisional brasileira é transitória. Os presos podem
ficar de poucos dias até muitos anos. É alta a reincidência,
sendo bastante comuns idas e vindas entre diferentes
unidades prisionais e a comunidade.
O eventual retorno à comunidade costuma ser um momento
crítico na continuidade do tratamento de doenças crônicas e
em recaídas em dependentes químicos. São necessárias
ações de coordenação com a rede de saúde na comunidade
e preparação por parte da equipe de saúde da unidade
prisional.
Atenção a saúde da população privada de liberdade
A atenção a saúde da população privada de liberdade deve
ser compreendida a partir de uma perspectiva integral,
considerando as especificidades do ambiente prisional e os
princípios da APS.
Para conhecer e atuar na atenção à saúde da população
privada de liberdade, se faz necessário:
• Compreender o contexto prisional: é fundamental que
os profissionais de saúde entendam as
particularidades do ambiente carcerário, incluindo
aspectos estruturais, organizacionais e sociais que
influenciam na saúde dos indivíduos privados de
liberdade.
• Promoção da equidade: deve-se reconhecer as
desigualdades existentes e trabalhar para garantir
que essa população tenha acesso a cuidados de
saúde equivalentes aos disponíveis para população
em liberdade, respeitando os princípios do SUS.
• Integração com a rede de saúde: deve-se
estabelecer vínculos entre os serviços de saúde
dentro dos presídios e a rede externa, facilitando a
continuidade do cuidado e o acesso a serviços
especializados quando necessários.
• Abordagem centrada na pessoa: mesmo em um
ambiente institucionalizado, é essencial manter uma
prática clínica que valorize a individualidade, a escuta
ativa e o respeito às necessidades e preferências dos
pacientes.
• Educação em saúde e prevenção: implementar ações
educativas que promovam a saúde e previnam
doenças, considerando as condições específicas do
ambiente prisional e as características da população
atendida.
• Trabalho em equipe multiprofissional: a atuação
conjunta de diferentes profissionais de saúde é
crucial para oferecer um cuidado abrangente e
eficaz, abordando as múltiplas dimensões da saúde
dos indivíduos privados de liberdade.
Avaliação clínica na admissão ao presídio
A população prisional necessita de identificação de diversas
condições de saúde no momento da entrada no sistema
prisional, mas nem sempre há implementação sistemática de
uma avaliação inicial. Isso não é importante apenas para as
próprias pessoas detidas e os trabalhadores do sistema
prisional, mas também para as comunidades para onde
eventualmente retornarão.
Idealmente, deve haver uma unidade de porta de entrada
centralizada para cada sistema prisional. Uma vez que o
detido deixa a área de triagem inicial, é bastante difícil o
seguimento clínico. Um encontro único é mais eficiente do que
repetidas visitas para novas avaliações e entrega de
resultados, porque a movimentação de pessoas no ambiente
prisional demanda bastante tempo.
Condições com prioridade imediata
Deve haver avaliação rápida para:
• Diabetes com uso de insulina;
• Síndrome de abstinência de álcool e outras drogas;
• Doenças respiratórias transmissíveis.
Especificidades da população feminina
• Deve-se oferecer teste de gravidez a todas as
mulheres com menos de 55 anos na admissão.
• Início precoce do pré-natal e atenção a questões
como uso de substâncias.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
80
Doenças infecciosas prioritárias
HIV, hepatites B e C, sífilis e tuberculose são mais prevalentes
e de alto risco de transmissão. O rastreamento universalideal,
mas pode ser difícil logisticamente.
• Testes rápidos: rápidos e com pouco risco, mas
limitados em massa.
• Coleta de sangue venoso: abrange mais doenças,
mas exige maior estrutura.
Problemas específicos
Tuberculose
A tuberculose tem especial importância na prática diária do
médico de família atuando no sistema prisional.
O rastreamento por radiografia de tórax é a melhor opção
para rastreamento universal pela acurácia. Já o rastreamento
por sintomáticos respiratórios (tosse > 3 semanas) tem baixa
sensibilidade.
Novas tecnologias como interferon-gama (IGRA) e o teste
molecular GeneXpert estão sendo testadas. O teste
tuberculínico (derivado de proteína purificada [PPD]) não é
útil como modelo de rastreamento no contexto prisional,
devido à alta prevalência de infecção tuberculosa, exceto em
coinfecção com HIV.
Em cenários de alta prevalência, radiografia na admissão tem
mais impacto se for combinada com rastreamento anual em
massa. A transmissão interna é mais relevante do que a vinda
de novos casos da comunidade.
Quanto à investigação de contatos, as frequentes mudanças
de celas tornam esse procedimento inerentemente falho, mas
deve ser realizado pelo menos naqueles que compartilham a
cela no momento do diagnóstico. A segregação de casos
diagnosticados, exceto os multirresistentes, é controversa.
A estratégia de tratamento diretamente observada é difícil de
ser implementada integralmente. Para além do manejo clínico
e ações de rastreamento, deve haver preocupação com as
questões arquiteturais. São necessários esforços no sentido
de se advogar melhorias estruturais que interfiram na
transmissão da tuberculose – ventilação, incidência solar,
superlotação – e, também, de capacidade diagnóstica da
unidade de saúde – laboratório para análise de escarro e sala
de radiografia.
Medicações psicotrópicas
A demanda por benzodiazepínicos, assim como na
comunidade, é bastante alta. Queixas de quadros de insônia
primária são bastante frequentes, o que poderia trazer o
impulso de tratamento farmacológico. O fato é que as
condições do cárcere não favorecem a higiene do sono, mas,
ainda assim, o uso de benzodiazepínicos e hipnóticos é
bastante desencorajado, devido ao potencial de abuso, em
uma população já com alta prevalência de transtornos de uso
de substâncias. Extrapolando em todos os medicamentos
psicotrópicos, a indicação sempre deve ser bastante
criteriosa, devido aos riscos de intoxicação, ao uso
indiscriminado, à simulação e ao comércio de medicamentos.
Simulação
É comum a simulação de sintomas mentais e neurológicos,
especialmente alucinações e crises convulsivas. O intuito
geralmente é obter medicação com potencial real ou esperado
de abuso e/ou de efeito hipnótico, para uso próprio ou
comércio entre os demais detentos. Em relação a simulações
de condições clínicas gerais, deve-se tomar o cuidado de
tomar como verdadeiras as queixas da pessoa, sob o risco de
negligenciar condições clínicas potencialmente graves. Não
são comuns simulações de doenças orgânicas.
Estratégias comuns para detecção de doença mental
simulada:
• Sintomas raros: simuladores muitas vezes não
sabem quais sintomas são infrequentes entre
pessoas com doenças genuínas. A estratégia deve
ser usada quando a pessoa reporta sintomas muito
infrequentes. Por exemplo: “remoção do
pensamento” – na qual um interno relata que suas
ideias estão sendo rotineiramente roubadas por uma
força externa.
• Sintomas improváveis: em torno de 1/3 dos
simuladores exageram dramaticamente o quadro e
apresentam sintomas improváveis, com qualidades
bizarras ou fantasiosas. Por exemplo: um réu afirma
que satã está flutuando sobre a cabeça do juiz e
movendo os lábios como se estivesse proferindo as
mesmas palavras da sentença. A diferença para os
sintomas raros é o fato de se tratar frequentemente
de algo absurdo.
• Combinação de sintomas: muitos simuladores não
pensam quais sintomas comuns normalmente não
ocorrem juntos. Por exemplo: delírios de grandeza e
sintomas purgativos são uma combinação
improvável. Trata-se de uma estratégia sofisticada,
porque simuladores desconhecem quais
combinações de sintomas são pouco usuais.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
81
• Gravidade dos sintomas: pessoas com doenças
genuínas experimentam sintomas em uma escala
contínua, de leves a moderados, ou mesmo graves.
Simuladores de doenças mentais comumente
apresentam sintomas graves ou mesmo extremos.
Entretanto, alguns doentes legítimos utilizam essa
estratégia, conhecida como “dourar a pílula”, para
tentar garantir que recebam tratamento. Prisioneiros
podem supor, correta ou incorretamente, que
apenas as doenças mais graves receberão
tratamento.
• Publicidade indiscriminada dos sintomas: durante
entrevistas clínicas, quando formuladas questões
abertas a respeito de psicopatologias, alguns
simuladores apresentam queixas de qualquer
categoria sindrômica. Como existem comorbidades, a
descrição de muitos sintomas disseminados não é
por si só indicativa de simulação, indicando mais
comumente uma tentativa de garantia de tratamento.
• Sintomas reportados versus sintomas diretamente
observados: simuladores podem apresentar grande
discrepância entre o que eles reportam e o que se
apresenta à observação direta. O reportado tende a
ser mais patológico do que o diretamente observado.
Essa estratégia é mais utilizada em locais em que o
doente está em observação direta frequente, como
um hospital ou uma prisão. Um lembrete de cautela:
algumas pessoas com doenças mentais têm pouca
ou nenhuma compreensão sobre seus diagnósticos.
Comportamentos disruptivos
Um fenômeno particular do confinamento são os
comportamentos disruptivos – notadamente autolesão –, mas
também quebrar canos das celas, sujar-se de fezes ou causar
incêndios. O comportamento de autolesão mais comum é
cortar a própria pele, geralmente utilizando lâminas de
barbear. Entretanto, morder-se, engolir objetos e incendiar-se
também são comportamentos observados. Em geral, não
costumam ter intenção suicida, aparentam ser um fenômeno
ligado ao cárcere, pois os pacientes não relatam tais tipos de
comportamento na comunidade. É interessante notar que tais
ações estão muito mais ligadas a uma tentativa de comunicar
dificuldades de convívio do que a expressão de doença mental
grave.
Tabagismo
O tabagismo é um importante problema na área da saúde
prisional, não apenas pelos seus efeitos adversos nos
fumantes ativos, mas também nos passivos. As prisões fazem
parte dos últimos locais fechados onde fumar ainda é
permitido no mundo ocidental. O tabagismo segue tolerado
pelas autoridades de segurança.
O fumo passivo representa sérios riscos para a saúde dos que
não fumam. Não há limiar mínimo de exposição livre de riscos;
medidas como separar fumantes de não fumantes e de
ventilação são insuficientes ou impraticáveis na maioria das
situações. O problema é particularmente agravado em
prisões, em razão da alta prevalência de tabagismo, da
superlotação e da má ventilação.
Questões legais
O médico de família trabalhando no sistema prisional pode ter
de se manifestar e até provocar o sistema judiciário por
questões de saúde que podem interferir na capacidade de
cumprimento da pena pela pessoa.
Em casos de doença mental grave que se manifesta após o
cumprimento da pena, dependendo da capacidade instalada
de cuidados em saúde mental, ele pode acionar o instituto da
superveniência de doença mental. Assim, o juiz da vara de
execuções penais transforma a pena restritiva de liberdade em
medida de segurança. Na medida de segurança, o detento é
transferido para alas psiquiátricas penais especiais. Em
cenários de doenças graves, o médico da unidade pode
provocar ou ser provocado a opinar sobre a capacidade da
unidade de prover os cuidados de saúde necessários e,
também, acerca do prognóstico. Dois institutos jurídicos são
possíveis: o indultohumanitário, no qual a pena é extinta, e a
prisão domiciliar por motivo de doença.
A vara de execução penal pode solicitar perícia específica para
os institutos de medicina legal, mas, muitas vezes, são as
informações do médico assistente que mais pesam na
decisão. Assim, é grande a responsabilidade do médico de
família, tanto em relação ao detento acometido de doença
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
82
quanto em relação à comunidade do qual tal pessoa foi
reclusa em razão de comportamento criminoso.
Equipes de Atenção Primária Prisional (eAPP)
As eAPP são responsáveis por prestar cuidados de saúde
dentro das unidades prisionais, com base nos princípios da
APS e da PNAISP.
Composição das eAPP
Profissionais mínimos obrigatórios:
• 1 médico
• 1 enfermeiro
• 1 dentista
• 1 técnico ou auxiliar de enfermagem
• 1 auxiliar ou técnico de saúde bucal
Outros profissionais podem ser incluídos, conforme a
necessidade e a complexidade local:
• Psicólogos, assistentes sociais, farmacêuticos, entre
outros.
Principais Atribuições
• Realizar ações de promoção, prevenção, diagnóstico,
tratamento e reabilitação.
• Elaborar e executar planos de cuidado individual e
coletivo.
• Fazer o acompanhamento de doenças crônicas e
condições agudas.
• Monitorar e promover vacinação, testagem de
doenças infecciosas, saúde bucal e saúde mental.
• Atuar de forma interdisciplinar e em parceria com
outros níveis de atenção (secundário e terciário).
Abrangência e carga assistencial
• Cada eAPP deve atuar em uma unidade prisional que
abrigue entre 500 à 1.200 pessoas privadas de
liberdade.
• Quando a população for maior, devem ser
implantadas mais equipes para garantir o cuidado
adequado.
Integração com o SUS
• As eAPP devem estar integradas à RAS do SUS.
• Devem garantir acesso a especialidades por meio de
encaminhamentos e contrarreferência.
• Atuam em parceria com vigilância em saúde,
incluindo vigilância epidemiológica e sanitária.
Gestão e financiamento
• A gestão é municipal, com apoio técnico e financeiro
dos governos estadual e federal.
• O custeio das eAPP é feito por meio do Bloco de
Financiamento da Atenção Primária à Saúde, com
repasses federais específicos.
Objetivos da PNAISP
Garantir o acesso à atenção integral à saúde
Proporcionar cuidado contínuo e de qualidade às pessoas
privadas de liberdade, com ações de promoção, prevenção,
tratamento e reabilitação.
Inserção das pessoas privadas de liberdade na rede SUS
Integrar as unidades prisionais à Rede de Atenção à Saúde
(RAS), promovendo a articulação entre os serviços prisionais
e o SUS local.
Reduzir as desigualdades de acesso
Combater a exclusão social e a vulnerabilidade dessa
população, ampliando o acesso aos serviços de saúde com
equidade.
Fortalecer a vigilância em saúde no sistema prisional
Monitorar, prevenir e controlar doenças transmissíveis e
condições que afetam a saúde dessa população, como
tuberculose, HIV/AIDS e doenças mentais.
Capacitar profissionais e equipes de saúde
Promover a formação continuada dos profissionais que atuam
nas equipes de saúde prisional, para que ofereçam cuidado
humanizado e qualificado
Respeitar os direitos humanos
Promover ações de saúde que respeitem a dignidade, os
direitos e a cidadania das pessoas privadas de liberdade.
Objetivo Geral (Art. 5º)
Garantir o acesso das pessoas privadas de liberdade no
sistema prisional ao cuidado integral no Sistema Único de
Saúde (SUS).
Objetivos Específicos (Art. 6º)
I. Promover o acesso das pessoas privadas de
liberdade à Rede de Atenção à Saúde, visando
ao cuidado integral.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
83
II. Garantir a autonomia dos profissionais de
saúde para a realização do cuidado integral das
pessoas privadas de liberdade.
III. Qualificar e humanizar a atenção à saúde no
sistema prisional por meio de ações conjuntas
das áreas da saúde e da justiça.
IV. Promover as relações intersetoriais com as
políticas de direitos humanos, afirmativas e
sociais básicas, bem como com as da Justiça
Criminal.
V. Fomentar e fortalecer a participação e o controle
social.
Público-alvo (Art. 7º)
A PNAISP destina-se às pessoas que se encontram sob
custódia do Estado inseridas no sistema prisional ou em
cumprimento de medida de segurança.
§ 1º: As pessoas custodiadas nos regimes semiaberto e
aberto serão preferencialmente assistidas nos serviços da
rede de atenção à saúde.
§ 2º: As pessoas submetidas à medida de segurança, na
modalidade tratamento ambulatorial, serão assistidas nos
serviços da rede de atenção à saúde.
Referências Bibliográficas
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Sistema de Justiça
Penal: Indicadores e estatísticas da população prisional no
Brasil. Brasília: CNJ, 2023.
BRASIL. Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Departamento Penitenciário Nacional. INFOPEN –
Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias:
Atualização 2023. Brasília: MJSP/DEPEN, 2023
BRASIL. Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de
Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional. Brasília:
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, 2014.
GUSSO, Gustavo; LOPES, José M C.; DIAS, Lêda C. Tratado de
medicina de família e comunidade - 2 volumes: princípios,
formação e prática. 2. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2019. E-
book. p.513. ISBN 9788582715369.
SEMANA 11: MANEJO DAS
ANEMIAS NA APS – DATA:
07/04/2025
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
• Compreender o manejo das anemias na atenção
primária.
Objetivos Específicos
• Compreender a definição e diagnóstico das anemias;
• Abordar a avaliação clínica da anemia no adulto
(anamnese, exames físicos e complementares);
• Discutir o manejo clínico e tratamento dos tipos mais
comuns de anemia na APS (anemia microcítica,
normocíticas e macrocíticas).
Definição e diagnóstico das anemias
A principal causa de anemia no mundo é a deficiência de ferro.
As mulheres desenvolvem mais anemia do que os homens
devido às perdas fisiológicas da menstruação. A anemia não
é uma doença ou um diagnóstico final, e sim uma síndrome de
sintomas e sinais. Deve-se sempre investigar a causa da
anemia.
Exames que fazem parte da investigação inicial da anemia
ferropriva: hemograma, reticulócitos, lâmina de sangue
periférico.
O exame laboratorial que reflete a adequada reserva de ferro
é a Ferritina.
Diante de anemia ferropriva, dentro de três meses pode
observar a normalização da hemoglobina após a reposição de
ferro.
A Fenitoína pode implicar na deficiência de ácido fólico.
Definição
A anemia é definida pela OMS quando a Hb é inferior a:
• 13 g/dL em homens;
• 12 g/dL em mulheres; e
• 11 g/dL para crianças e gestantes.
Sendo esses índices definidos ao nível do mar. O valor da Hb
também está sujeito a variações estatísticas de acordo com a
faixa etária, o sexo e o estudo retrospectivo de seus exames.
Curiosidade: o diagnóstico de anemia é realizado com base
em valores ao nível do mar, devido a altitude influenciar a
concentração de hemoglobina no sangue. Em regiões mais
altas, a menor disponibilidade de oxigênio leva o organismo a
produzir mais hemoglobina como compensação. Assim, usar
valores de referência ao nível do mar permite uma
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
84
padronização global, e ajustes podem ser feitos conforme a
altitude da localidade onde os exames são realizados.
Com base no tamanho celular, as anemias têm sua
classificação mais usada:
• Microcíticas (VCM 100 fL) megaloblásticas: devido
à deficiência de vitamina B12 ou de ácido fólico e
relacionadas com fármacos (zidovudina,
metotrexato, ácido valproico, entre outros).
• Macrocíticas não megaloblásticas: alcoolismo,
hepatopatia, hipotireoidismo e síndromes
mielodisplásicas.
• Normocíticas (VCM entreSe bem utilizado, é um método eficiente para a recuperação
rápida das informações clínicas de uma pessoa, garantindo
continuidade articulada de cuidados em equipe dentro da
APS. É importante termos consciência de, ao utilizá-lo,
registrarmos as informações como se não fossem para nós
mesmos, mas sim de maneira compreensível para todos os
membros da equipe, e, de maneira ideal, para a própria
pessoa que está sendo cuidada.
Problema Clínico
Segundo definição de WEED (1966, apud CANTALE,
2003): "Um Problema Clínico é tudo aquilo que requeira um
diagnóstico e manejo posterior, ou aquilo que interfira com a
qualidade de vida, de acordo com a percepção da própria
pessoa";
Cada "problema" ainda pode ser classificado por diferentes
critérios: tempo de ocorrência ("novo" ou "conhecido"),
duração ("agudo" ou "crônico"), situação ("ativo" ou
"resolvido") etc. (CANTALE, 2003).
Algumas condições não se configuram, ou ainda não se
configuraram como "problemas", e não deveriam aparecer
oficialmente na "lista de problemas", a qual deve ter o máximo
de precisão possível (CANTALE, 2003). Alguns exemplos:
• Termos vagos ou pouco objetivos: hemopatia,
processo respiratório; ou
• Condições ainda sob suspeita ou "a esclarecer":
hipotireoidismo em investigação, por exemplo.
Dentro dessas duas perspectivas, muitos problemas de
saúde são, de fato, diagnósticos classificáveis por sistemas
de informação oficiais (como o CID 10, por exemplo), mas em
APS, muitos "problemas" são constituídos por outras
condições, tais como sintomas, queixas ou incapacidades
(WONCA, 2009). Assim, são várias as situações que podem
ser enquadradas como "problemas clínicos". No Quadro 1
estão listadas categorias de potenciais problemas que
poderiam compor uma "lista de problemas" dentro de um
RCOP:
Cada "problema" ainda pode ser classificado por diferentes
critérios: tempo de ocorrência ("novo" ou "conhecido"),
duração ("agudo" ou "crônico"), situação ("ativo" ou
"resolvido") etc.
Prontuário Eletrônico do SUS (PEC)
É uma ferramenta digital que armazena e organiza as
informações de saúde dos pacientes de forma segura e
acessível. Ele tem como objetivo melhorar a qualidade do
atendimento, garantindo que todos os profissionais da saúde
envolvidos no cuidado do paciente tenham acesso rápido e
atualizado aos dados, o que facilita a tomada de decisões.
Objetivos Principais do PEC
• Facilitar o acompanhamento e o histórico de saúde
do paciente.
• Aumentar a segurança e a eficiência no processo de
atendimento.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
5
• Melhorar a integração entre os diversos níveis de
atenção (primária, secundária, terciária).
CIAP-2 (Classificação Internacional de Atenção Primária)
É uma ferramenta desenvolvida para categorizar as
condições de saúde e os serviços oferecidos na atenção
primária à saúde. Ele é utilizado para registrar
os diagnósticos e as ações realizadas no atendimento do
paciente. O CIAP-2 é uma ferramenta fundamental para
entender as necessidades de saúde da população e, por
meio da classificação, gerar informações úteis para a gestão
e planejamento do SUS.
Objetivos do CIAP-2
• Padronizar o registro de diagnósticos e
procedimentos na APS.
• Facilitar a coleta de dados para a gestão da saúde,
permitindo um melhor planejamento e avaliação dos
serviços.
• Integrar a classificação de doenças e problemas de
saúde com as ações de cuidado, como consultas,
tratamentos e exames.
Bibliografia
BRASIL. Ministério da Saúde. Grupo Hospitalar
Conceição. Manual de assistência domiciliar na Atenção
Primária à Saúde. Porto Alegre: Ministério da Saúde, 2003.
CANTALE, C. R. História Clínica Orientada a Problemas. S.l. :
University of Southern California, 2003, p. 7.
RAMOS, V. A Consulta em 7 Passos. Lisboa: VFBM
Comunicação Ltda., 2008, p. 126.
SEMANA 03: DIAGNÓSTICO
E MANEJO DA OBESIDADE
NA APS – DATA: 03/02/2025
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
• Compreender o diagnóstico e manejo da obesidade
na atenção primária;
• Conhecer as calculadoras de risco cardiovascular;
• Novos critérios diagnósticos para obesidade;
• Novo guideline do AACE para hipercolesterolemia.
Objetivos Específicos
• Compreender o conceito, classificação, diagnóstico,
abordagem e recomendações acerca da obesidade
e do sobrepeso na APS.
Obesidade na APS
As doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) podem ser
caracterizadas por:
• Doenças com história natural prolongada;
• Interação de fatores etiológicos desconhecidos;
• Ausência de participação ou participação polêmica
de microrganismos entre os determinantes;
• Longo curso assintomático;
• Curso clínico em geral lento, prolongado e
permanente.
A obesidade é o acúmulo excessivo de gordura corporal
causada pelo balanço energético positivo, isto é, a ingestão
calórica excede o gasto calórico. Isso acarreta repercussões
à saúde, com perda importante na qualidade de vida do
indivíduo, bem como no aumento de comorbidades.
O local onde a gordura se acumula tem repercussões em
suas complicações, sendo que a obesidade abdominal é mais
associada ao diabetes e à doença vascular. As causas da
obesidade incluem influências genéticas, ambientais e
sociais.
Epidemiologia
A obesidade é a doença nutricional mais frequente. Sua
prevalência aumenta com a idade e é mais comum no sexo
feminino, em pessoas de baixa renda, com grau de instrução
correspondente ao ensino médio, ou inferior, e em negros. A
Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) mostrou um aumento
gradual no peso da população brasileira nos últimos 10 anos.
Para os homens, a prevalência de excesso de peso aumentou
de 42,4% em 2002-2003 para 57,3% em 2013, e a
obesidade, de 9,3% para 17,5%. No caso das mulheres,
esse aumento foi mais acentuado, passando de 42,1% em
2002-2003 para 59,8% em 2013, ao passo que a obesidade
passou de 14,0% para 25,2%. A ocorrência de obesidade
classe III é maior em indivíduos de baixa renda e em
mulheres, com média nacional de 0,95% em mulheres e
0,32% em homens. Nas crianças brasileiras entre 5 e 9 anos,
o sobrepeso e a obesidade ocorrem em 34,8 e 16,6% entre
meninos, e em 32 e 11,8% entre meninas, e esse percentual
vem aumentando.
A OMS aponta a obesidade como um dos maiores problemas
de saúde publica no mundo. A projeção é que, em 2025,
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
6
cerca de 2,3 bilhões de adultos estejam com sobrepeso e
mais de 700 milhões obesos.
No Brasil, cerca de 32% dos adultos têm algum grau de
excesso de peso. Destes, 6,8 milhões de indivíduos (8%)
apresentam obesidade, com predomínio entre as mulheres
(70%). A distribuição do excesso de peso nas regiões do
Brasil:
• Sul e Sudeste: 36%
• Norte: 34%
• Centro-Oeste: 31%
• Nordeste: 24%
Estima-se que, atualmente, 52,5% dos brasileiros estão
acima do peso e 17,9% está obesa.
Fatores de Risco
A obesidade é fator de risco para doenças crônicas, como
hipertensão, diabetes, doenças cardiovasculares e câncer.
Sendo as DCNT correspondentes a 72% dos óbitos no país.
Fatores genéticos/hereditários e fatores adquiridos podem
estar associados a origem dessa doença.
Fatores Genéticos/Hereditários
Há perfis metabólicos desiguais para os mesmos estímulos,
isto é, existe um componente genético que faz com que
algumas pessoas tenham mais tendência para engordar que
outras. A presença de genes envolvidos no aumento de peso
aumenta a susceptibilidade ao risco para desenvolver a
obesidade.
Se um progenitor for obeso, tem 40% de probabilidade de
ter filhos obesos (ou pelo menos com tendência para isso).
Fatores Adquiridos
• Migração para áreas urbanas;
• Maus hábitos alimentares;
• Sedentarismo;
• Tabaco;
• Álcool em excesso;
• Grau de informação dos pais;
• Gravidez;
• Menopausa.
Tipos de Obesidade
Obesidade androide, abdominal ou visceral
Quando o tecido adiposo se acumula na metade superior do
corpo, sobretudo no abdome. É típico80-100 fL): ferropriva,
anemia de doença crônica e de causas hemolíticas e
não hemolíticas.
Algoritmo para investigação e classificação morfológica das anemias segundo o volume corpuscular médio
Avaliação clínica da anemia no adulto
A anemia ocasiona vários sintomas e sinais de acordo com a
sua classificação e sistema comprometido. Pode, inclusive,
provocar morbidade significativa se não for tratada. As
pessoas muitas vezes estão assintomáticas, ou com uma
clínica vaga de sintomas mínimos, sobretudo quando a
instalação é de forma insidiosa e provocada por qualquer
causa de sangramento prolongado.
Anamnese
Podem-se encontrar indivíduos com níveis de Hb baixos sem
que haja qualquer manifestação clínica, o que decorre do
mecanismo adaptativo e compensatório, porém as
extremidades etárias são as mais sensíveis aos efeitos.
Na anamnese da pessoa com anemia ferropriva, deve-se
investigar sinais e sintomas, tais como:
• Palidez;
• Visão de moscas volantes;
• Zumbidos;
• Dores de cabeça;
• Anorexia;
• Perda do paladar;
• Dor na língua;
• Perda de pelos ou cabelos;
• Diminuição do rendimento intelectual;
• Sonolência;
• Fraqueza;
• Cansaço;
• Letargia;
• Estado anímico (irritabilidade, tristeza, apatia);
• Dispneia progressiva aos exercícios físicos;
• Palpitações;
• Angina;
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
85
• Síncope;
• Dor nas pernas;
• Perda da libido;
• Hemorragias;
• Hábito de doações repetidas de sangue;
• Parasitoses intestinais;
• Uso crônico de anti-inflamatórios, corticoides, ácido
acetilsalicílico, anticoagulantes e inibidores de bomba
de prótons (IBPs).
• Se a anemia for acentuada, evolui com distúrbios
alimentares (pica), pelo desejo incontrolável da
ingesta de alimentos crus como macarrão e arroz, ou
substâncias específicas não nutritivas, tais como
terra ou gelo.
Crianças: o picacismo é capaz de ocorrer naquelas que
ingerem lascas de tinta contendo chumbo, correlacionando-se
a deficiência de ferro ao saturnismo.
Mulheres: a anemia ferropriva é capaz de desenvolver-se em
consequência do aumento das necessidades da gestação
(principalmente nas gemelares) e do aleitamento materno.
Naquelas em idade fértil, pode ocorrer devido ao fluxo
fisiológico menstrual excessivo, com a visualização de
coágulos, ou pelo uso do dispositivo intrauterino de cobre
(DIU). Na pós-menopausa, o sangramento uterino duradouro
pode se relacionar ao câncer de endométrio.
Cirurgia bariátrica: pessoas submetidas a este tipo de
procedimento comumente apresentam deficiência de ferro
após o procedimento.
Vômitos com características de borra de café, hematêmese,
melena e sangramento através do reto são invariavelmente
relacionados a hemorragia digestiva alta (HDA) e baixa (HDB),
respectivamente.
Indivíduos com doença celíaca, doença de Crohn, espru
tropical, ressecção e tuberculose intestinal apresentam má
absorção duodenojejunal ao ferro.
Consumo abusivo de álcool: tem relação com o
desenvolvimento de gastrite, de úlcera gástrica e de varizes
esofágicas com a perda de sangue.
Câncer de cólon direito: em homens acima de 50 anos é uma
condição vista no achado de anemia por sangramento retal
misturado com as fezes.
Hérnia de hiato e a gastrite colonizada pelo Helicobacter
pylori também se associam à deficiência de ferro.
Idosos: a tolerância progressiva do quadro anêmico se dá com
a instalação de claudicação intermitente, angina e insuficiência
cardíaca (IC) excluindo-se outras causas. Nessa faixa etária,
as pessoas anêmicas com queixa de disfagia para sólidos, na
presença de esofagite, correm o risco de apresentar síndrome
de Plummer-Vinson. Trata-se de uma complicação rara, com
potencial de desenvolvimento de carcinoma epidermoide da
faringe e do esôfago.
Anemia de doença crônica: em uma variedade de doenças
inflamatórias crônicas, como as colagenoses, as infecções
crônicas ou as doenças neoplásicas, seus sintomas gerais têm
intensidade leve a moderada, como taquicardia, cansaço,
palpitações, taquipneia ou até mesmo inexistem. É a causa
mais comum de doentes hospitalizados.
Sintomas da deficiência de vitamina B12 ou de ácido fólico que
devem ser pesquisados: estão ligados à má absorção dos
alimentos ricos nessas substâncias, como a carne, o leite, os
ovos, os queijos e os vegetais folhosos verde-escuros,
respectivamente. Dieta vegetariana rigorosa, por exemplo,
implica na diminuição de vitamina B12, e o alcoolismo
aumenta o risco de deficiência de ácido fólico.
• Uso crônico de metformina, biguanidas, omeprazol,
colchicina e neomicina associam-se ao déficit de
vitamina B12.
• Já os anticonvulsivantes (fenitoína, fenobarbital,
primidona), metotrexato, trimetoprima,
contraceptivos orais e diuréticos poupadores de
potássio levam a deficiência de ácido fólico.
• A carência de vitamina B12 pode provocar insônia,
problemas neurológicos de parestesia associada à
neuropatia periférica, propriocepção diminuída,
déficit de memória e transtornos psiquiátricos,
incluindo irritabilidade, depressão, demência e,
raramente, psicoses.
Anemia perniciosa: é causa frequente de déficit de vitamina
B12, com predominância no sexo feminino e mediana de idade
de 60 anos devido a uma gastrite crônica atrófica autoimune.
Pode combinar-se a outras doenças autoimunes, tais como
vitiligo, hipoparatireoidismo, tireoidite de Hashimoto e doença
de Addison. Os achados da deficiência de ácido fólico são os
mesmos da vitamina B12, porém não há sintomas
neurológicos.
Exame Físico
Na avaliação geral da pessoa, além de aferir os sinais vitais,
observar o aparente estado de saúde física, mental,
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
86
nutricional e de hidratação, para poder marcar a falta do
desenvolvimento estatural e muscular, comuns nas anemias.
Linfonodos
Os aumentos devem ser examinados relacionando seus
achados à suspeição de doenças hematológicas.
Regiões a examinar:
• Cervical (anterior e posterior);
• Submandibular e submentoniana;
• Supraclavicular e infraclavicular;
• Axilar;
• Inguinal;
• Epitroclear.
Características a descrever:
• Localização;
• Número;
• Tamanho: em centímetros;
• Consistência: mole, firme ou endurecido;
• Mobilidade: móvel ou aderido a planos profundos;
• Sensibilidade: doloroso ou indolor à palpação;
• Supuração/presença de calor ou rubor: sinais
flogísticos locais.
Cabeça
o aparecimento da “face do roedor”, em virtude de alterações
no desenvolvimento dos ossos e no tamanho e
desalinhamento dos dentes incisivos, é característico da
talassemia.
No crânio, bossas com proeminência dos ossos frontal e
parietal com o maxilar aumentado indicam β-talassemia.
Olhos
Na região ocular, o descoramento da mucosa é observado na
anemia grave, e a esclera poderá estar ictérica. No fundo de
olho as alterações são de rara importância diagnóstica, e a
retinopatia grave é denominada manchas de Roth. Papiledema
relacionado apenas à anemia pode ocorrer e regride com a
sua correção.
Boca
Na cavidade oral, a língua despapilada, lisa (mais visível nos
cantos), edemaciada, encarnada (com aspecto de carne
bovina) é denominada glossite atrófica. É dolorosa e provoca
odor ruim. Nos lábios, aparecem sinais de maceração, além
de fissuras no ângulo da boca, denominadas estomatite ou
queilite angular.
Pele, anexos e mucosas
Com uma luz adequada, de preferência natural, inspeciona-se
idealmente toda a pele e as mucosas. A incidência de palidez
é melhor observada no descoramento da palma das mãos,
mucosas da boca, conjuntiva, lábios e leito ungueal, muito
embora tenha baixa sensibilidade.
Palma da mão: torna-se pálida, mas as linhas palmares
mantêm a coloração até que a Hb caia abaixo de 7 g/dL.
Pele: icterícia leve, tipo amarelo-limão, é comum na anemia
megaloblástica, assim como nas anemias hemolíticas e
eventualmente na anemia perniciosa. As máculas acrômicas
circunscritas, caracterizadas pelaalteração da cor da pele no
vitiligo, poderão ser observadas nos portadores de anemia
perniciosa. As lesões vásculo-sanguíneas e pigmentadas, as
petéquias e equimoses aparecem em consequência da anemia
aplástica, da coagulopatia e das leucemias consequentes da
plaquetopenia.
Cabelos: a ueda de cabelos pode ocorrer na anemia
ferropriva; no entanto, o aparecimento precoce de cabelos
grisalhos e finos sugere anemia perniciosa.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
87
Unhas: a a cor rosada do enchimento capilar é pálida. A
coiloníquia, unhas adelgaçadas de lâminas côncavas com
extremidades elevadas semelhantes a uma colher, denota o
sinal clássico e tardio presente na anemia megaloblástica,
perniciosa e na ferropriva de longa data.
Pernas e mãos: as úlceras localizadas nas extremidades das
pernas, em torno dos maléolos (que se apresentam com má
cicatrização e cronicidade), são típicas de indivíduos com
anemia falciforme. Dactilite, (também conhecida como
síndrome mão-pé) é uma manifestação inicial da anemia
falciforme.
Cardiovascular e Pulmonar
Os achados são proporcionais ao tempo de evolução da
anemia. Nos casos agudos, manifestações importantes
surgem com taquicardia reflexa e hipotensão postural com
lipotímia, acometendo com maior frequência os idosos. As
pessoas referem dispneia, taquicardia e hipotensão postural.
A fluidez do sangue periférico em geral resulta no
aparecimento de sopro cardíaco sistólico ejetivo no foco
pulmonar e no ápice, sendo observado tanto em repouso
como após os exercícios.
Gastrintestinal
No abdome, a úlcera péptica é por vezes assintomática ou
associada com dor à palpação, à defesa e à rigidez da sua
parede. Na palpação de massas, investigar a possibilidade de
tumor. A circunferência volumosa ascítica é oriunda, entre
outras causas, da cirrose decorrente do uso de álcool,
direcionando o raciocínio para anemia por doença hepática.
Cálculos biliares são encontrados na hemólise crônica de
adultos, embora já tenham sido relatados em crianças. Hepato
ou esplenomegalia sugerem uma provável hipertensão porta
por anemia hemolítica. Considerar a realização do toque retal
para descartar carcinoma colorretal e perda de sangue devido
às hemorroidas. Na anemia falciforme, o hipoesplenismo ou
até a autoesplenectomia ocorrem pelos sucessivos infartos
característicos dessa forma hereditária de anemia.
Genital
O exame das mamas, genitais feminino e masculino não
poderão ser negligenciados, buscando-se alterações que
justifiquem tanto a anemia como as neoplasias silentes. O
priapismo surge como uma das complicações da anemia
falciforme.
OBS.: priapismo é uma ereção peniana persistente e dolorosa
que ocorre sem estímulo sexual e dura mais de 4 horas.
Neurológico
Na anemia por deficiência de vitamina B12, é importante
verificar o tônus, a força muscular, a sensibilidade, a
coordenação e os reflexos. Déficits da sensibilidade vibratória
e da propriocepção são manifestações precoces de disfunção
do sistema nervoso central (SNC). A falta de coordenação
muscular durante os movimentos voluntários, sinal de
Babinski e espasticidade são sinais tardios. As pernas e os
pés são afetados mais frequentemente do que os membros
superiores.
Exames Complementares
Apenas o hemograma é suficiente para a abordagem inicial
das anemias que deve ter em conjunto a contagem de
reticulócitos e o esfregaço de sangue periférico.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
88
Após a caracterização da anemia, é feita sua classificação de
acordo com o tamanho celular com base no algoritmo de
investigação:
O diagnóstico diferencial das anemias microcíticas facilita a
abordagem:
Manejo clínico e tratamento dos tipos mais comuns de
anemia na APS (anemia microcítica, normocíticas e
macrocíticas)
Tratamento da anemia ferropriva
Dieta
Reforçar uma dieta adequada, com a ingesta de carnes
vermelhas e frutas ricas em vitamina C, que aumentam a
absorção de ferro.
Alimentos que inibem a absorção de ferro:
• Fibras em excesso, como farelo de trigo;
• Fitatos: presentes em grãos integrais, leguminosas e
sementes.
• Polifenóis: encontrados em café, chá preto, chá
verde, vinho tinto e cacau.
• Cálcio: leite, queijos e derivados.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
89
Medicamentos que inibem a absorção de ferro: anti-
inflamatórios, corticoides, ácido acetilsalicílico,
anticoagulantes e inibidores de bomba de prótons (IBPs).
Aleitamento materno: no RN normal, deve ser encorajado e
priorizado pelo menos até o 6o mês, obedecendo à
suplementação de ferro entre 6 e 18 meses, de acordo com
o preconizado pelo Ministério da Saúde (MS).
Tratamento Farmacológico
• Crianças a termo, com peso de nascimento ≥
2.500g: iniciar suplementação com 1 mg/kg/dia de
ferro elementar, a partir dos 6 meses até os 24
meses de idade.
• Crianças pré-termo ou com baixo peso (Ocorre pelo aumento de reticulócitos, em 4 a 7 dias, com pico
no 10o dia. Com uma adequada reposição, um aumento de
pelo menos 2 g/dL na Hb deve ocorrer em 2 a 3 semanas de
tratamento, mas o VCM continuará baixo por 2 a 3 meses. Em
2 meses, a Hb e o Ht voltam ao normal.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
90
Após a correção da anemia ferropriva, a suplementação é
mantida, em crianças, por 3 a 4 meses (ou por mais 2 meses,
quando houver a normalização da hemoglobina);
Para adultos, a recomendação é tratar por 4 a 6 meses. Se a
Hb não atingir o nível desejado, considerar investigação.
Ferritina: para restaurar os estoques de ferro, são necessários
de 2 a 6 meses, ou até obter-se valor de ferritina de pelo
menos 15 ng/mL para crianças e 30 ng/mL para adultos.
Alguns autores sugerem que a reposição ideal corresponda a
níveis de ferritina da ordem de 50 ng/mL, sendo importante a
correlação ou não com processos inflamatórios.
Tratamento da deficiência de vitamina B12
Os estoques têm longa duração, mas, se a perda diária
ocorrer entre 3 a 5 mg sem qualquer absorção, a deficiência
pode levar mais de 3 anos. É confirmada com níveis abaixo de
200 pg/mL.
O tratamento está indicado nas pessoas com absorção enteral
diminuída, doença hereditária ou naquelas com anemia
perniciosa comprovada. Embora existam evidências de que a
reposição oral traga bons resultados, o tratamento tradicional
é por via parenteral, existindo vários esquemas posológicos
eficazes, que variam de acordo com a apresentação clínica.
Dieta
As principais fontes de vitamina B12 são as carnes, os ovos e
o leite (a dieta deve ser reforçada para todos os indivíduos).
Tratamento Farmacológico
Crianças:
• A dose típica é de 50 a 100 µg de vitamina B12
intramuscular, 1 vez por semana, até que a
deficiência seja corrigida. Se for necessário
tratamento por toda a vida, aplicar 1 vez por mês.
Adultos:
• A dose é de 1.000 µg/dia de vitamina B12 IM, por 7
dias, seguidos de 1.000 µg por semana, por 3
semanas, e, após, 1.000 µg/mês indefinidamente, se
a condição clínica não puder ser corrigida.
A injeção de vitamina B12 é dolorosa e deve ser aplicada na
região glútea, via IM, ou subcutânea (SC), e nunca por via
intravenosa (IV).
Resposta ao tratamento
• O aumento dos reticulócitos ocorre em 5 a 7 dias, e
em 2 meses se observa uma melhora do quadro
hematológico.
• A degeneração neurológica é reversível se tratada
com pouco tempo de evolução, idealmente em menos
de 6 meses.
• A correção da deficiência pode causar hipocalemia
aguda, ou seja, o monitoramento da queda de
potássio é obrigatório, e a suplementação deve ser
instituída, quando necessária. Algumas pessoas
podem desenvolver hipocalemia durante a semana
inicial do tratamento, uma vez que há uma absorção
marcada de potássio durante a produção de células
sanguíneas novas, mas é improvável que seja
clinicamente significativa.
Tratamento da deficiência de ácido fólico
Os estoques têm duração de 4 a 5 meses. A deficiência é
confirmada com níveis abaixo de 5 ng/mL.
Na suspeita de deficiência combinada de ácido fólico e
vitamina B12, deve-se sempre suplementar as duas vitaminas,
pois a administração apenas de ácido fólico na presença de
deficiência de vitamina B12 levará à piora progressiva do
quadro neurológico.
Há evidências de que o uso de ácido fólico no período pré-
concepcional e durante o primeiro trimestre da gravidez pode
prevenir os defeitos do tubo neural do feto.
Dieta
As principais fontes de ácido fólico são os vegetais folhosos
verdes escuros, frutas cítricas, cereais, grãos, nozes e carnes.
Tratamento Farmacológico
O tratamento tanto para crianças como adultos se faz com 5
mg, 1 vez ao dia, por 1 a 4 meses, ou até a normalização dos
níveis terapêuticos.
Efeitos adversos, como discreto rubor, rash cutâneo,
distensão abdominal, entre outros, podem ocorrer.
Resposta ao tratamento
O aumento dos reticulócitos ocorre em 5 a 7 dias, e a melhora
hematológica, em 2 meses.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
91
Tratamento da anemia de doença crônica
O tratamento é direcionado para a causa de base, como nas
doenças inflamatórias, nas neoplasias e nas infecções
crônicas. Na doença renal, porém, deve-se considerar o uso
da eritropoetina como otimização da resposta hematológica.
Quando Referenciar
Os pacientes poderão ser referenciados ao hematologista se
houver uma hemoglobinopatia identificada, se a suspeita
diagnóstica não for confirmada ou não responder à terapia
oral proposta. A coordenação desse cuidado, além de ampliar
a capacidade de resolubilidade da APS, agrega conhecimento
ao profissional que discute e referencia o caso.
Bibliografia
GUSSO, Gustavo; LOPES, José M C.; DIAS, Lêda C. Tratado de
medicina de família e comunidade - 2 volumes: princípios,
formação e prática. 2. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2019. E-
book. p.891. ISBN 9788582715369.
SEMANA 13: POLÍTICAS
PÚBLICAS DE SAÚDE
VOLTADAS PARA
POPULAÇÃO NEGRA– DATA:
21/04/2025
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
• Relações étnico-raciais de forma a conhecer as
Políticas Públicas de saúde voltadas para população
negra.
Objetivos Específicos
• Conhecer as políticas públicas de saúde voltadas
para a população negra;
• Conhecer as doenças genéticas mais comuns na
população negra;
• Discutir sobre os determinantes sociais de saúde da
população negra;
• Conhecer as diretrizes e objetivos da Política
Nacional de Saúde Integral da População Negra.
Políticas Públicas Voltadas para a População Negra
Em consonância com o ParticipaSUS, o Ministério da Saúde
instituiu, 2009, a Política Nacional de Saúde Integral da
População Negra. Essa Política tem como marca: o
reconhecimento do racismo, das desigualdades étnico-raciais
e do racismo institucional como determinantes sociais das
condições de saúde, com vistas à promoção da equidade em
saúde. Seu objetivo é promover a saúde integral da população
negra, priorizando a redução das desigualdades étnico-
raciais, o combate ao racismo e à discriminação nas
instituições e nos serviços do SUS.
Além da criação da própria PNSIPN, é possível identificar
outros avanços nas ações voltadas à saúde da população
negra, com destaque para:
a) Plano Juventude Viva – Prevê ações de
prevenção para reduzir a vulnerabilidade de
jovens negros a situações de violência física
e simbólica.
b) Portaria nº 1.391, de 16 de agosto de
2005, que institui, no âmbito do SUS, as
diretrizes para a Política Nacional de
Atenção Integral às Pessoas com Doença
Falciforme e outras Hemoglobinopatias.
c) Incorporação do transplante de medula
para tratamento da doença falciforme no
âmbito do SUS (Portaria SCTIE n° 30, de 30
de junho de 2015).
d) Curso de ensino a distância sobre saúde da
população negra promovido pelo MS e
Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS),
lançada em 27 de outubro de 2014).
e) Comitê Técnico de Saúde da População
Negra – Instituído no âmbito do Ministério
da Saúde, é um espaço consultivo de
participação e controle social, com
representantes da gestão, pesquisadores e
movimentos negros.
f) Publicação da Portaria nº 344, de 1º de
fevereiro de 2017, que padroniza e torna
obrigatória a coleta e o preenchimento do
quesito raça/cor do paciente em todos os
sistemas de informação do SUS, conforme a
classificação do IBGE, que define cinco
categorias autodeclaradas: branca, preta,
amarela, parda e indígena.
g) Publicação, em 30 de março de 2017, do III
Plano Operativo da Política Nacional de
Saúde Integral da População Negra
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
92
(Resolução nº 16, de 30 de março de
2017). O III Plano Operativo foi pactuado e
aprovado na Comissão Intergestores
Tripartite (CIT) – foro permanente de
negociação e articulação das esferas de
gestão do Sistema Único de Saúde (SUS).
Com vigência para o triênio 2017/2019, o
III Plano Operativoestabelece ações de
implementação da referida política para as
gestões federal, estadual e municipal do
SUS.
h) Publicação da Portaria nº 142, de 21 de
julho de 2017, que institui o Grupo de
Trabalho de Políticas Públicas da Igualdade
Racial e dá outras providências. Conforme o
art. 1°, fica instituído o Grupo de Trabalho
de Políticas Públicas da Igualdade Racial
com a finalidade de explanar aos órgãos e
às entidades governamentais e não
governamentais dos estados e municípios
as ações de promoção da igualdade racial
das políticas públicas federais, assim como
de propor metas e prioridades aplicáveis à
realidade local.
Doenças Genéticas mais Comuns na População Negra
Anemia Falciforme
Doença hereditária, decorrente de uma mutação genética
ocorrida há milhares de anos, no continente africano. A
doença, que chegou ao Brasil pelo tráfico de escravos, é
causada por um gene recessivo, que pode ser encontrado em
frequências que variam de 2% a 6% na população brasileira
em geral, e de 6% a 10% na população negra.
Diabetes Mellitus (tipo II)
Esse tipo de diabetes se desenvolve na fase adulta e evolui
causando danos em todo o organismo. É a quarta causa de
morte e a principal causa de cegueira adquirida no Brasil. Essa
doença atinge com mais frequência os homens negros (9% a
mais que os homens brancos) e as mulheres negras (em torno
de 50% a mais do que as mulheres brancas).
Hipertensão Arterial
A doença, que atinge 10% a 20% dos adultos, é a causa
direta ou indireta de 12% a 14% de todos os óbitos no Brasil.
Em geral, a hipertensão é mais alta entre os homens e tende
ser mais complicada em negros, de ambos os sexos.
Deficiência de Glicose-6-Fosfato Desidrogenase
Afeta mais de 200 milhões de pessoas no mundo. Apresenta
frequência relativamente alta em negros americanos (13%) e
populações do Mediterrâneo, como na Itália e no Oriente
Médio (5% a 40%). A falta dessa enzima resulta na destruição
dos glóbulos vermelhos, levando à anemia hemolítica e, por
ser um distúrbio genético ligado ao cromossomo X, é mais
frequente nos meninos.
Determinantes Sociais de Saúde da População Negra
Discutir os determinantes sociais de saúde da população
negra é essencial para compreender as desigualdades em
saúde no Brasil. Esses determinantes são fatores sociais,
econômicos, culturais, ambientais e políticos que influenciam
o estado de saúde das pessoas e grupos sociais — e afetam
de forma desproporcional a população negra, contribuindo
para iniquidades históricas e estruturais.
Principais determinantes sociais que afetam a saúde da
população negra
Racismo estrutural e institucional
O racismo está na base da exclusão social da população
negra. No contexto da saúde, ele se manifesta no acesso
desigual a serviços, menor qualidade de atendimento, e
invisibilização das especificidades étnico-raciais nos dados e
nas políticas públicas.
Pobreza e desigualdade socioeconômica
A população negra é maioria entre os que vivem em situação
de pobreza ou vulnerabilidade social. Isso impacta
diretamente o acesso a saneamento básico, moradia
adequada, alimentação saudável, educação e trabalho digno.
Baixa escolaridade e barreiras de acesso à informação
Menor escolaridade contribui para a desinformação sobre
direitos em saúde, reduz a autonomia no cuidado e afeta o
acesso a melhores empregos e renda.
Precarização do trabalho
Muitos trabalhadores negros estão em empregos informais e
de maior risco, sem proteção social, aumentando a exposição
a doenças ocupacionais e acidentes.
Violência e segurança pública
A juventude negra é a mais afetada por mortes violentas e
pela ação seletiva do Estado, o que representa um grave
problema de saúde pública.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
93
Acesso desigual aos serviços de saúde
A distância geográfica, o preconceito racial e a falta de
formação dos profissionais de saúde em diversidade étnico-
racial dificultam o acesso a um cuidado adequado e
humanizado.
A Política Nacional de Saúde Integral da População Negra
(PNSIPN) reconhece esses determinantes e orienta a
construção de estratégias no SUS para:
• Reduzir iniquidades raciais em saúde.
• Promover equidade no acesso e no cuidado.
• Enfrentar o racismo institucional.
• Valorizar práticas de saúde da cultura afro-brasileira.
Diretrizes e Objetivos da Política Nacional de Saúde
Integral da População Negra
Diretrizes Gerais
I. Inclusão dos temas Racismo e Saúde da
População Negra nos processos de formação e
educação permanente dos trabalhadores da
saúde e no exercício do controle social na saúde;
II. Ampliação e fortalecimento da participação do
Movimento Social Negro nas instâncias de
controle social das políticas de saúde, em
consonância com os princípios da gestão
participativa do SUS, adotados no Pacto pela
Saúde;
III. Incentivo à produção do conhecimento científico
e tecnológico em saúde da população negra;
IV. Promoção do reconhecimento dos saberes e
práticas populares de saúde, incluindo aqueles
preservados pelas religiões de matrizes
africanas;
V. Implementação do processo de monitoramento
e avaliação das ações pertinentes ao combate
ao racismo e à redução das desigualdades
étnico-raciais no campo da saúde nas distintas
esferas de governo; e
VI. Desenvolvimento de processos de informação,
comunicação e educação, que desconstruam
estigmas e preconceitos, fortaleçam uma
identidade negra positiva e contribuam para a
redução das vulnerabilidades.
Objetivo Geral
Promover a saúde integral da população negra, priorizando a
redução das desigualdades étnico-raciais, o combate ao
racismo e discriminação nas instituições e serviços do SUS.
Objetivos Específicos
I. Garantir e ampliar o acesso da população negra
residente em áreas urbanas, em particular nas
regiões periféricas dos grandes centros, às
ações e aos serviços de saúde;
II. Garantir e ampliar o acesso da população negra
do campo e da floresta, em particular as
populações quilombolas, às ações e aos serviços
de saúde;
III. Incluir o tema Combate às Discriminações de
Gênero e Orientação Sexual, com destaque para
as interseções com a saúde da população negra,
nos processos de formação e educação
permanente dos trabalhadores da saúde e no
exercício do controle social;
IV. Identificar, combater e prevenir situações de
abuso, exploração e violência, incluindo assédio
moral, no ambiente de trabalho;
V. Aprimorar a qualidade dos sistemas de
informação em saúde, por meio da inclusão do
quesito cor em todos os instrumentos de coleta
de dados adotados pelos serviços públicos, os
conveniados ou contratados com o SUS;
VI. Melhorar a qualidade dos sistemas de
informação do SUS no que tange à coleta,
processamento e análise dos dados
desagregados por raça, cor e etnia;
VII. Identificar as necessidades de saúde da
população negra do campo e da floresta e das
áreas urbanas e utilizá-las como critério de
planejamento e definição de prioridades;
VIII. Definir e pactuar, junto às três esferas de
governo, indicadores e metas para a promoção
da equidade étnico-racial na saúde;
IX. Monitorar e avaliar os indicadores e as metas
pactuados para a promoção da saúde da
população negra visando reduzir as iniquidades
macrorregionais, regionais, estaduais e
municipais;
X. Incluir as demandas específicas da população
negra nos processos de regulação do sistema
de saúde suplementar;
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
94
XI. Monitorar e avaliar as mudanças na cultura
institucional, visando à garantia dos princípios
antirracistas e não discriminatório; e
XII. Fomentar a realização de estudos e pesquisas
sobre racismo e saúde da população negra.
Bibliografia
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica
e Participativa. Departamento de Apoio à Gestão Participativa
e ao Controle Social. Política Nacional de Saúde Integral da
População Negra: umapolítica para o SUS / Ministério da
Saúde, Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa,
Departamento de Apoio à Gestão Participativa e ao Controle
Social. – 3. ed. – Brasília: Editora do Ministério da Saúde,
2017. Disponível em:
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_naciona
l_saude_populacao_negra_3d.pdf. Acesso em: 14 mai.
2025
SEMANA 14: MANEJO DAS
TONTURAS E VERTIGENS NA
APS – DATA: 28/04/2025
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
• Compreender o manejo das tonturas e vertigens na
atenção primária.
Objetivos Específicos
• Caracterizar vertigem e sua abordagem diagnóstica
(história clínica, exame físico e exames
complementares);
• Conhecer as principais causas de vertigem;
• Conhecer os tratamentos, farmacológico e não
farmacológico, para as vertigens;
• Compreender pré-síncope e síncope e suas principais
causas.
• Identificar outros tipos de tonturas.
Tontura e Vertigem
Avaliar a causa da tontura pode ser algo desafiador para o
médico de família e comunidade porque podem ser muitas as
suas possíveis causas, desde neurite vestibular à estenose de
valva aórtica. Tontura é um sintoma comum e inespecífico que
congrega quatro padrões sindrômicos distintos:
Vertigem
Sensação de movimento ilusório. O paciente pode descrever a
sensação de que as coisas ao seu redor estão se movendo ou
que seu corpo está se movendo, quando na verdade está
parado.
Pré-síncope
Sensação de desfalecimento. Pacientes descrevem como
sensação de desmaio iminente.
Desequilíbrio
Sensação de que o controle sobre seus movimentos e
equilíbrio está prejudicado. No desequilíbrio, não há sensação
de movimento ilusório (vertigem) ou sensação de
desfalecimento (pré-síncope).
Hiperventilação
Apresenta a descrição mais vaga entre todos os padrões e,
em geral, é descrita como a sensação de “cabeça vazia”, ou
sensação de estar desconectado do ambiente.
Como a descrição do sintoma geralmente é muito vaga, a
investigação do problema inicia-se no seu reconhecimento,
muitas vezes relatado pela pessoa como “tontura”, “tonteira”,
“zonzeira”, “sensação de que vou cair”, ou até mesmo “um
mal-estar”.
O padrão sindrômico vertigem é o que está relacionado mais
diretamente à queixa “tontura”, contudo, alguns pacientes
podem, ainda assim, referir o que estão sentindo, seja
sensação de desfalecimento ou de desequilíbrio, como
tontura.
Durante a anamnese, é necessário que se encontrem
informações relevantes, como fatores desencadeantes, tempo
de duração e de evolução, e sintomas associados, a fim de
definir melhor o padrão sindrômico e as possíveis causas do
problema.
Vertigem
A grande maioria dos casos é de etiologia benigna e
autolimitada, não necessitando de grandes investigações.
Vestibulopatias de origem central são muito menos comuns
do que as periféricas e geralmente se apresentam com outros
sintomas neurológicos associados. Além disso, apresentam
sintomas com uma duração maior durante a crise.
Há um consenso entre os estudos de que as três causas mais
comuns de vertigem são a VPPB (42%), a neurite vestibular
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
95
(40%) e a doença de Ménière (10%), que, juntas, são
responsáveis por mais de 90% das causas de vertigem.
Principais Vestibulopatias de Origem Periférica
Vertigem Paroxística Posicional Benigna (VPPB)
A apresentação clínica da VPPB é a de crises de vertigem com
duração menor do que um minuto e desencadeadas por
movimentos da cabeça, como deitar-se e levantar-se da cama
e inclinar a cabeça para trás ou para frente. Trata-se de um
quadro autolimitado, que pode durar de algumas semanas até
alguns meses.
Fisiopatologia da VPPB
Envolve a formação de pequenos cristais de carbonato de
cálcio (otólitos) na endolinfa dentro do utrículo, que migram
para os canais semicirculares e estimulam mecanicamente os
receptores das células ciliares. As informações equivocadas
transmitidas a partir dessas células, quando processadas no
SNC e integradas aos demais estímulos do corpo, geram a
sensação de vertigem, de nistagmo e de náuseas percebidos
pela pessoa.
Manifestações Clínicas
Inicialmente, os sintomas são mais fortes, levando o paciente
a sentir náuseas, vômitos e a evitar movimentos que
desencadeiem sintomas. O nistagmo na VPPB é
caracteristicamente posicional, com latência de alguns
segundos, duração breve (geralmente menos de 30
segundos) e apresenta fadiga com a repetição do movimento.
Ele é direcional e estereotipado, variando conforme o canal
semicircular afetado:
• No comprometimento do canal posterior (o mais
comum), o nistagmo é torsional e vertical para cima
(upbeat), batendo em direção à orelha inferior;
• No canal horizontal, é horizontal puro, podendo ser
geotrópico ou ageotrópico; e
• No canal anterior, é torsional com componente
vertical para baixo (downbeat).
A presença dessas características ajuda a diferenciar a VPPB
de causas centrais de vertigem.
Neurite Vestibular
Fisiopatologia da Neurite
Não se sabe qual é a causa da neurite vestibular, mas
fisiopatologicamente se trata de uma inflamação do nervo
vestibular que não apresenta perda auditiva. Casos em que
tanto o nervo vestibular quanto o labirinto estejam
comprometidos podem cursar com comprometimento da
audição e zumbidos, sendo definidos como labirintite.
Algumas teorias falam em possível reativação do vírus herpes
simples tipo 1 (HSV-1), de infecções virais, da oclusão
vascular ou de mecanismos autoimunes.
Manifestações Clínicas
Trata-se de um quadro de vertigem espontânea e prolongada,
podendo durar algumas semanas, na qual as crises são
intensas e duradouras, diferente dos poucos segundos
observados na VPPB.
As crises de vertigem e seus sintomas associados costumam
ser mais pronunciados na primeira semana da doença,
ocorrendo resolução completa do quadro dentro do prazo de
6 semanas.
Deve-se suspeitar de neurite vestibular em pacientes que
apresentem vertigem associada a desequilíbrio com tendência
de queda sempre para o mesmo lado (lado acometido),
nistagmo horizonto-torsional espontâneo e sem
comprometimento auditivo.
Geralmente, são casos em que o paciente se encontrará
doente, com muitos sintomas autonômicos associados, como
náuseas, vômitos, mal-estar e sudorese.
Síndrome de Ménière
É uma condição rara com crises espontâneas e recorrentes de
vertigem e perda auditiva (em geral, frequências baixas),
sensação de plenitude na orelha acometida e zumbido,
sintomas que não necessariamente estão presentes ao
mesmo tempo no paciente.
Fisiopatologia da S. de Ménière
Tanto as causas quanto a fisiopatologia da doença são
incertas, o que dificulta o tratamento. Algumas literaturas
afirmam que pode ser causada por uma hidroplasia
endolinfática idiopática. A hidropsia endolinfática existe
quando ocorre um aumento da pressão hidrostática da
endolinfa, levando a uma estimulação anômala dos receptores
vestibulares. Como o sistema vestibular se comunica com a
cóclea, ocorre tanto um aumento da pressão hidrostática no
aparelho vestibular quanto no referido órgão, desencadeando
uma vertigem associada a sintomas auditivos.
Apesar de ser uma condição rara e por se tratar de uma
vertigem recorrente, estima-se que uma equipe de saúde da
família com 4.000 pacientes possa ter entre quatro e oito
pacientes com esta doença.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
96
Manifestações Clínicas
As crises costumam ser fortes e com duração de 20 minutos.
Em longo prazo, os pacientes costumam ter alívio das crises
agudas de vertigem, persistindo com a perda auditiva e com
uma sensação vaga de desequilíbrio.
Para obter o diagnóstico, é necessário que o paciente
apresente crises de vertigem com duração ao redor de 20
minutos, perda auditiva de baixa frequência, flutuação dos
sintomas de aura (plenitude, perda auditiva, zumbido) e
exclusão das principais causas de vertigem (VPPB e neurite
vestibular). Contudo,por ser uma doença incomum e com
quadro bastante indefinido, a avaliação do
otorrinolaringologista pode ser útil para elucidar sua causa.
Cinetose
É uma vertigem benigna, com história bem delimitada pela
exposição ao fator desencadeante, que é a hiperestimulação
do sistema vestibular, ocasionada, em geral, por
movimentação em viagens de carro, avião ou barco. É um
problema comumente autodiagnosticado pelo paciente e que
deve ser reconhecido pelo médico de família, para,
primeiramente, excluir outras possíveis causas do problema e
orientar o paciente quanto aos cuidados em situações futuras.
Principais Vestibulopatias Centrais
Enxaqueca – Migrânea Vestibular
Uma porção considerável de pacientes com migrânea e aura
(~30%) experimentam sintomas de vertigem durante as
crises. Tais sintomas podem tanto aparecer na fase da aura
quanto persistir durante a fase da cefaleia,
concomitantemente. As crises de vertigem variam de minutos
a horas e, em geral, se associam a outros sintomas
prodrômicos (foto e fonofobia). Quando o problema se
encontra ainda na fase diagnóstica, deve-se afastar a
possibilidade de vertigens com duração prolongada, como
neurite vestibular ou síndrome de Ménière.
Insuficiência Vertebrobasilar
Condição que leva a um quadro de vertigem de padrão central
e é uma das causas mais lembradas por médicos como causa
de vertigem. Contudo, é um problema raro e relacionado de
forma direta à doença aterosclerótica. Costuma ser mais
comum em homens idosos, porém a sua prevalência estimada
é de 1 caso para cada 100.000 habitantes.
A apresentação clínica mais comum dos pacientes com
insuficiência vertebrobasilar é diminuição do nível de
consciência, hemiparesia ou quadriplegia assimétrica e
sintomas pseudobulbares, como disartria, disfagia e disfonia.
Vertigem estará presente apenas nos casos em que a oclusão
aconteça no segmento proximal da artéria. Pacientes com
insuficiência vertebrobasilar levantarão a suspeita de acidente
vascular cerebral (AVC) ou ataque isquêmico transitório (AIT)
e, com vertigem ou não, deverão ser prontamente
reconhecidos e referenciados ao serviço de referência, a fim
de se tentar trombólise para desobstruir a artéria
comprometida.
Pré-síncope
Síncope é definida como a perda abrupta, completa e
temporária da consciência, associada à impossibilidade de
manter o tônus postural (queda), com remissão rápida e
espontânea. Não deve ter sintomas clínicos associados com
outras causas de perda da consciência, como convulsão e
trauma craniencefálico (TCE).
Pré-síncope, também chamada lipotímia, refere-se aos
sintomas que precedem a síncope, como sensação de cabeça
vazia, desequilíbrio e alterações visuais (visão tunelizada,
visão escurecendo) e variáveis graus de alteração de
consciência, porém sem a sua completa perda. Síncopes,
assim como tonturas no geral, são problemas que geram
preocupação quanto a causas graves e a risco de morte.
Síncope vasovagal
É a mais comum de todas e geralmente relacionada, mesmo
pelo paciente, a fatores estressores desencadeantes, como
calor excessivo, dor e momentos de ansiedade (p. ex., ao
realizar um procedimento médico). Em casos em que a
história não esteja tão clara, pode ser o principal diagnóstico
de exclusão, após investigadas outras causas de síncope.
Hipotensão ortostática
É também uma causa comum e está relacionada à queda
brusca da pressão arterial (PA) ao levantar da posição deitada
ou sentada e pode ser causada por uma combinação de
fatores, como idade avançada, calor excessivo, desidratação,
neuropatia autonômica, períodos prolongados deitado e
medicamentos diversos.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
97
Síndrome da Hiperventilação
Uma causa comum de tontura e que comumente é classificada
dentro das pré-síncopes é a síndrome da hiperventilação (light
headedness).
A base fisiológica está na alcalose metabólica causada pela
hipocapnia (pCO2 – 25 mmHg) decorrente da hiperventilação.
Isso leva a uma vasoconstrição das arteríolas e,
consequentemente, a um hipofluxo cerebral.
A descrição que os pacientes fazem destes quadros é
bastante vaga, como “sensação de cabeça vazia”, “como se
meu corpo não estive ali”. Geralmente, a sensação dura
alguns minutos e é acompanhada por sintomas físicos, como
amortecimentos em face e extremidades, dor no peito,
incômodo na barriga.
As pré-síncopes são causas comuns de tontura, sendo, com
frequência, subdiagnosticadas ou tratadas de forma
estigmatizada. Em geral, situações de sofrimento psíquico e
transtornos mentais podem originar hiperventilação, e seu
diagnóstico não é a solução do problema, mas sim a
necessidade de se investigar mais profundamente o que está
acontecendo com o paciente. Nesse momento, retomar
perguntas abertas, explorar ideias e preocupações do
paciente e aspectos psicológicos, familiares e ocupacionais é
o caminho para melhor avaliá-lo.
Desequilíbrio
Se caracteriza por sensação de instabilidade postural, em que
não há sintomatologia de vertigem ou de pré-síncope. É
importante salientar que muitos pacientes com desequilíbrio
podem queixar-se de tontura ao seu médico, porém muitos
não referem tontura alguma, acreditando que sua dificuldade
de caminhar é decorrente da idade.
O equilíbrio depende da ação integrada de um conjunto de
órgãos e sistemas, em que estão incluídos o sistema
vestibular, a musculatura esquelética, a propriocepção, a
audição e a visão. Portanto, a origem do problema pode estar
ligada à disfunção de algum desses elementos ou do SNC
(tronco cerebral e cerebelo), que recebe e integra os dados
enviados por esses órgãos. Assim, é evidente a existência de
uma relação direta entre as causas mais comuns de
desequilíbrio e problemas associados com o envelhecimento.
Além dos prejuízos e limitações que a perda do equilíbrio traz
para a pessoa, desencadeando uma série de mudanças
indesejadas em sua vida, o médico de família e comunidade
deve estar atento a um problema de grande importância do
ponto de vista da saúde pública, por sua magnitude e
transcendência: o risco de quedas em idosos.
Em 75% dos casos, a causa da tontura por desequilíbrio é
multifatorial, havendo comprometimento de uma ou mais das
estruturas envolvidas na fisiologia e/ou anatomia do equilíbrio.
Entre as causas comuns, podem-se citar: fraqueza da
musculatura de MMII ou da musculatura postural, baixa
acuidade visual e/ou auditiva, mau condicionamento físico, uso
de determinadas medicações (sobretudo se mais de quatro
classes), doenças da coluna cervical, neuropatia periférica e
disfunção vestibular.
Para os pacientes com tontura do padrão de desequilíbrio, um
acrônimo simples de ser lembrado – I HATE FALLING – é
proposto por Barros para orientar a investigação clínica, a fim
de que ela seja focada nos fatores mais comumente
relacionados ao risco de quedas que são possíveis de serem
modificados.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
98
Diagnóstico
Anamnese
É essencial detalhar junto ao paciente qual é o sintoma e os
seus fatores desencadeantes, sempre guiando sua anamnese
em direção às hipóteses mais prováveis:
• Tempo de duração do sintoma.
• Fatores desencadeantes ou situação em que o
sintoma ocorre (movimentação da cabeça, viagem de
carro, situação de estresse intenso).
• Sintomas associados (náuseas, vômitos, perda
auditiva, dificuldade de andar, déficits neurológicos).
• Perda da consciência.
• Uso de medicações para a tontura, ou que possam
ser causa da queixa (hipoglicemiantes em excesso,
ou anti-hipertensivos).
• Quedas.
• Fatores de risco para DCV.
• Fatores de risco para queda.
• Explorar acerca da experiência de doença trazida
pela pessoa em relação à tontura, quais as suas
preocupações e medos e como isso impacta sua
funcionalidade.
O desequilíbrio em geral tem causas multifatoriais para
organizar a investigação clínica tais causas são divididas em:
Fatores intrínsecosHistória prévia de quedas, idade, sexo feminino, uso de
medicamentos psicoativos, antiarrítmicos e hipotensores,
condições clínicas que comprometam a marcha e o equilíbrio,
sedentarismo, medo de cair, déficit cognitivo, nutricional,
visual e funcional.
Fatores extrínsecos
Qualquer fator relacionado ao ambiente ao redor pode ser
considerado como fator extrínseco. Precariedade de calçadas
e vias públicas são fatores predisponentes a quedas que
estão além do alcance do clínico. Contudo, dentro do domicílio,
pode haver superfícies escorregadias, escadas sem apoio e
obstáculos que ponham o paciente em risco de queda, bem
como calçados e roupas inadequados.
Fatores comportamentais
Pessoas muito inativas e pessoas muito ativas apresentam um
risco maior de queda, devido a maior fragilidade, no primeiro
caso, e à maior exposição a situações que podem culminar em
queda, no segundo.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
99
Exame Físico
Deve-se fazer um exame neurológico sumário, buscando
déficits focais que indiquem vestibulopatia central.
Nistagmo
O nistagmo pode ajudar a compreender qual canal
semicircular está acometido.
• Nistagmos torsionais que apontam para cima são os
mais comuns (85%), pois estão relacionados ao
canal semicircular posterior, sendo aqueles no
sentido horário provocados pelo canal esquerdo, e
os anti-horários, pelo canal direito à localização.
• Nistagmos horizontais e torsionais que apontam para
baixo são incomuns e correspondem ao
acometimento dos nistagmos com o canal
semicircular anterior e semicircular horizontal,
respectivamente.
Teste de impulsão da cabeça
Apresenta sensibilidade de 86% e especificidade de 100%
para neurite vestibular.
Nesse teste, o paciente deve ser posicionado sentado de
frente para o examinador, que deve segurar a cabeça do
paciente com ambas as mãos e movê-la lateralmente para
ambos os lados em um ângulo de 35 a 45o, pedindo para que
o paciente fixe o olhar entre os olhos do examinador. Após
sentir que a sua cabeça está relaxada, o examinador
impulsiona a sua cabeça para um dos lados, sendo que o
resultado esperado é que o olhar do paciente não se desvie
do ponto fixo. Caso o olhar do paciente seja desviado para o
lado que a cabeça foi impulsionada, este será o lado
acometido e o teste será considerado positivo para lesão do
nervo vestibular, confirmando o quadro de neurite vestibular.
HINTS
Acrônimo que designa três manobras de exame físico:
Head Impulse Test (HIT) – Teste de impulsão cefálica
Como é feito: o examinador move rapidamente a cabeça do
paciente para um lado enquanto o paciente fixa o olhar em um
alvo.
• Resultado normal (olhos mantêm o foco) = reflexo
vestíbulo-ocular (VOR) preservado → indica origem
central.
• Resultado anormal (olhos “escapam” e fazem
sacada corretiva) = VOR prejudicado →
sugere lesão periférica (ex: neurite vestibular).
Nystagmus – Nistagmo espontâneo
• Nistagmo unidirecional (bate sempre para o mesmo
lado, independentemente da posição do olhar): típico
de lesão periférica.
• Nistagmo bidirecional ou vertical puro (bate para
lados diferentes dependendo da direção do olhar ou
é vertical): sugere origem central, como AVC de
tronco.
Test of Skew – Teste de desvio vertical ocular (skew
deviation)
Como é feito: o examinador alterna a cobertura de um olho de
cada vez (teste do cover-uncover).
• Resultado positivo: desvio vertical súbito de um dos
olhos quando destampado → sugere lesão
central (tronco encefálico ou cerebelo).
• Resultado negativo: sem desalinhamento vertical
significativo → compatível com causa periférica.
Interpretação do HINTS
Teste Lesão Periférica Lesão Central
(AVC)
Head Impulse Anormal (sacada
presente)
Normal
Nystagmus Unidirecional
horizontal
Bidirecional ou
vertical
Test of Skew Negativo Positivo (desvio
vertical)
Essas três manobras simples podem ser usadas para
diferenciar uma vertigem periférica, em geral neurite
vestibular, de uma causa central em pessoa com vertigem.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
100
Para pacientes com alto risco para AVC essas manobras têm
sensibilidade de 100% e especificidade de 96%, sendo uma
manobra mais sensível do que a ressonância magnética (RM)
precoce nesses casos. Por isso, um desses exames alterados
deve levar o médico a referenciar a pessoa ao pronto-socorro,
ao passo que uma manobra HINTS totalmente normal
tranquiliza o médico.
Dix-Hallpike
Tem sido empregada como exame definitivo para a VPPB,
porém, apenas 75% dos pacientes com VPPB terão o exame
resultando positivo. Dessa forma, a maioria dos casos de
VPPB pode ser facilmente diagnosticada a partir da
anamnese, sem necessidade de confirmação por meio da
manobra de Dix-Hallpike.
Para aqueles casos de vertigem que não preencham os dois
critérios anteriores, deve-se então proceder à manobra de
Dix-Hallpike.
Passos necessários para a sua correta realização:
1. Pedir autorização à pessoa para realizá-la.
2. Explicar à pessoa sobre como a manobra é feita,
sendo que ela poderá causar os mesmos sintomas
de vertigem no paciente (ele não pode ser pego de
surpresa pela tontura).
3. Posicionar a pessoa sentada na maca, de forma que,
ao deitá-la, sua cabeça fique pendente para o lado
de fora da maca.
4. Posicionar-se atrás do paciente e lateralizar a cabeça
dele a 45º para a direita e estendendo-a a 20º para
trás.
5. Após posicionar corretamente a cabeça, peça para
que o paciente se deite na maca. Sustente sua
cabeça para que o paciente não se machuque.
6. Mantenha-o na posição de decúbito dorsal com a
cabeça lateralizada a 45º e estendida a 20º durante
um minuto.
7. A manobra será positiva caso os sintomas referidos
pelo paciente sejam desencadeados durante o
exame.
8. Caso o paciente não tenha apresentado nenhum
sintoma, após um minuto, volte o paciente à posição
inicial do exame, lateralize sua cabeça para o lado
oposto e repita a manobra.
9. Caso a manobra seja positiva, você terá encontrado
o lado acometido.
Tome cuidado com pacientes idosos com limitação da coluna
cervical. Com esses pacientes, pode ser útil a presença de um
auxiliar no consultório durante a manobra, para garantir mais
conforto ao paciente e mais precisão à manobra. Não há
necessidade que o paciente apresente nistagmo para que a
manobra seja positiva, apenas o desencadeamento dos
sintomas é o suficiente para tornar o teste positivo.
Avaliação de quedas e desequilíbrio
A melhor forma de estimar o risco de quedas em idosos é
a Avaliação Multifatorial, já que testes simples como o Get Up-
and-Go, embora fáceis de aplicar, têm baixa capacidade
discriminativa como rastreamento isolado, sendo mais úteis
em idosos com alterações de marcha e equilíbrio.
Pré-síncope
Se a pessoa apresentar tontura de pré-síncope, deve-se focar
o exame no sistema cardiovascular, procurando dados que
indiquem doença mais grave, como valvopatias e insuficiência
cardíaca (IC) descompensada. Também é necessário aferir a
PA e a frequência cardíaca (FC).
Hipotensão postural
Na suspeita clínica deve-se fazer a prova da hipotensão
postural. Para esse exame, deve-se colocar o paciente em
decúbito dorsal por pelo menos 5 minutos, e aferir sua PA.
Depois, o paciente deve ficar em pé por três minutos, e sua
PA deve novamente ser aferida. Caso aconteça:
1. queda da PAS > 20 mmHg;
2. queda da PAD > 10 mmHg; ou
3. PASA audiometria pode ser útil em pacientes com queixa de perda
auditiva.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
101
Fluxograma de paciente com tontura
VPPB, vertigem paroxística posicional benigna; DCV, doença cardiovascular; PA, pressão arterial; TCE, traumatismo craniencefálico.
Fonte: Adaptada de Post e Dickerson.
Tratamento
Tratamento não farmacológico
Tratamento da VPPB - Manobra de Epley
Esta manobra de reposição canalicular, tem por objetivo
mover os otólitos circulantes nos canais semicirculares em
direção ao utrículo, cessando, assim, com os sintomas e
resolvendo o problema. A manobra deve ser feita no momento
do diagnóstico e não é difícil de ser realizada.
Caso a manobra seja bem-sucedida, os sintomas não
reaparecerão mais e a pessoa estará livre da vertigem. Não
há necessidade de recomendar ao paciente que evite
movimentos bruscos com a cabeça durante os primeiros dias
ou que retorne para reavaliar e repetir a manobra para
garantir a sua efetividade.
Modo de realização da manobra de Epley:
1. Pedir autorização ao paciente para realizá-la.
2. Explicar ao paciente sobre como a manobra será
realizada, orientando que ela poderá causar os
mesmos sintomas de vertigem no paciente (ele não
pode ser pego de surpresa pela tontura).
3. Posicionar o paciente sentado na maca, de forma
que, ao deitá-lo, sua cabeça fique pendente para o
lado de fora da maca.
4. Posicionar-se atrás do paciente e lateralizar a cabeça
dele a 45º para o lado acometido e estendê-la a 20º
para trás.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
102
5. Após posicionada corretamente a cabeça, peça para
que o paciente se deite na maca. Sustente sua
cabeça para que o paciente não se machuque.
6. Mantenha-o na posição de decúbito dorsal com a
cabeça lateralizada a 45º e estendida a 20º durante
1 minuto.
7. Gire a cabeça do paciente para o lado oposto,
mantendo-a lateralizada a 45o por 1 minuto.
8. Continue o giro da cabeça para o mesmo sentido do
passo anterior, agora girando todo o corpo do
paciente, que deverá terminar a manobra em
decúbito lateral, com a cabeça ainda lateralizada a
45o e fletida a 20o. O paciente estará nesta fase com
a face voltada para o chão.
9. Durante a manobra, é comum que o paciente se sinta
tonto. Diga que será passageiro, orientando para
que, caso aconteça, ele mantenha os olhos fechados,
a fim de aliviar o mal-estar.
10. Volte o paciente à posição inicial.
Algumas recomendações costumam ser dadas aos pacientes,
como evitar estender a cabeça (olhar para cima) durante 3
dias, ou realizar movimentos bruscos, mas essas medidas
carecem de evidências. Alguns profissionais utilizam também
a manobra de Semont, por considerá-la uma alternativa mais
simples do que a manobra de Epley e com eficácia
semelhante.
Reabilitação vestibular
A reabilitação vestibular, envolvendo exercícios em grupo com
dificuldade gradualmente aumentada na forma de desafios de
equilíbrio e de coordenação motora, tem sido eficaz nos casos
de neurite vestibular. Apesar de estudos não diferenciarem os
pacientes clinicamente – pacientes com VPPB, doença de
Ménière e neurite vestibular avaliados em conjunto –, há alívio
da sensação de tontura nesses pacientes.
Orientações
Cinetose
Podem ser orientadas medidas adaptativas, como a
diminuição do estímulo visual por meio da fixação da visão em
um ponto imóvel ou fechando os olhos, diminuindo, com isso,
a quantidade de informações conflitantes no SNC.
Doença de Ménière
Apesar de não haver evidências de que dieta hipossódica seja
benéfica é comum que esta prescrição seja feita, assim como
os diuréticos, que também apresentam seus efeitos colaterais
inerentes.
Síndrome de hiperventilação
O diagnóstico traz a necessidade de se investigar mais
profundamente o que está acontecendo com o paciente.
Nesse momento, retomar perguntas abertas, explorar ideias e
preocupações do paciente e aspectos psicológicos, familiares
e ocupacionais será o melhor caminho para avaliá-lo.
Medidas preventivas para minimizar quedas em idosos
A prática de exercícios físicos com abordagem de múltiplos
componentes (coordenação, flexibilidade, equilíbrio, força, Tai
Chi Chuan, entre outros) reduz de forma significativa a taxa de
quedas, o seu risco e as fraturas decorrentes de quedas em
idosos não hospitalizados, seja quando realizados em grupo
ou em planos de exercício domiciliar.
Também há fortes evidências de que intervenções para
segurança do paciente no domicílio são efetivas para a
redução da ocorrência de quedas e do seu risco, sendo essas
intervenções aparentemente mais efetivas quando feitas com
a participação de um terapeuta ocupacional.
É importante notar que tais mudanças na conformação e na
mobília do domicílio devem ser estimuladas não apenas para
minimizar o risco de acidentes, mas também para melhor
adaptação do idoso à sua casa, como, por exemplo, instalação
de corrimão e barras de apoio, fixação de tapetes no chão ou
sua retirada, uso de cadeiras ou bancos dentro do chuveiro.
Intervenções multifatoriais e suspensão gradual de
medicações psicotrópicas se mostraram efetivas para redução
da ocorrência de quedas. A polifarmácia é um capítulo
importante no tratamento do paciente idoso.
Tratamento Farmacológico
Em momentos de crise, podem ser usados medicamentos
sedativos, com o intuito de aliviar os sintomas, porém alguns
cuidados devem ser tomados. Medicamentos para supressão
dos vômitos e antivertiginosos, como benzodiazepínicos,
anticolinérgicos (escopolamina) e anti-histamínicos
(cinarizina, flunarizina, dimenidrinato e prometazina), não
devem ser dados por um período maior do que 3 dias, para
evitar prejuízos à compensação central, importante para a
resolução do quadro.
Dos medicamentos para alívio dos sintomas, a ondansetrona,
apesar de mais cara, mostrou-se superior à metoclopramida
quanto ao tempo de recuperação do paciente e quanto à
duração do tempo de internação.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
103
Cinetose
O dimenidrinato é uma opção segura e eficaz, inclusive para
crianças, bem como a clorfeniramina.
Doença de Ménière
A betaistina, na dose de 16 mg, em três doses diárias,
consegue reduzir a frequência e a severidade das crises de
alguns pacientes, sendo usada como profilaxia.
Migrânea vestibular
O tratamento procura seguir as recomendações para o
tratamento das migrâneas com aura clássica. Evitar o uso
excessivo de antivertiginosos parece ser a melhor conduta.
Uso crônico de antivertiginosos
O uso crônico de antivertiginosos em pacientes com tontura é
problemático por dois motivos principais: primeiro, esses
medicamentos suprimem os estímulos vestibulares e
dificultam a neuroadaptação natural, prolongando os
sintomas e levando à dependência; segundo, estão
associados a efeitos adversos graves a longo prazo, como
o parkinsonismo induzido por medicamentos, especialmente
com o uso prolongado de fármacos como flunarizina e
cinarizina. Por isso, seu uso deve ser restrito a curto prazo
(até 3 dias), especialmente em casos como neurite vestibular,
e evitado em tonturas crônicas, sendo essencial investigar
adequadamente a causa, muitas vezes relacionada à VPPB ou
desequilíbrio.
Erros mais frequentes
• Iniciar a avaliação da queixa de tontura perguntando
se é do tipo que “roda”.
• Pensar que tonturas estão sempre relacionadas a
problemas graves no SNC.
• Pensar que é necessário solicitar exames de imagem
e laboratoriais em todos os casos de tontura.
• Prescrever antivertiginosos por mais do que três dias
para tonturas.
• Não realizar a manobra de Epley como tratamento
para a VPPB.
Dicas
• Procure delimitar a tontura entre os três grandes
grupos – vertigem, síncope e desequilíbrio.
• Considere síndrome de hiperventilação como um
diagnóstico a ser levado em conta durante a
investigação, mas sempre como diagnóstico de
exclusão.
• Lembre-se da prevalência:VPPB, síncope vasovagal
e desequilíbrio são os principais responsáveis pelas
tonturas.
• Fique tranquilo com as possibilidades de doenças
graves: causas cardiológicas ou neurológicas graves
necessariamente virão com um quadro clínico
característico, apontando para a causa.
• Na síncope, sempre faça uma avaliação clínica
rigorosa do aparelho cardiovascular, com anamnese
e exame físico.
• Muito cuidado com os antivertiginosos! Sempre
reavalie os pacientes que fazem uso crônico de
medicamentos que podem induzir parkinsonismo.
• Lembre-se de que o desequilíbrio não possui um
medicamento que o trate, e o paciente com
desequilíbrio tem risco de quedas.
Quando Referenciar
Em geral, pacientes com tontura e perda auditiva devem ser
referenciados ao otorrinolaringologista para avaliação e iniciar
tratamento para doença de Ménière, por ser a doença mais
incomum, com quadro, às vezes, sem uma definição clara.
Na suspeita de causa central de tontura, como AVC, deve-se
referenciar o paciente ao serviço de emergência.
Equipe multiprofissional
Devido à natureza multifatorial do desequilíbrio, é essencial
uma rede de cuidado multiprofissional e familiar, que permita
uma avaliação ampla do paciente e de seu ambiente. O médico
de família tem papel central ao identificar o risco de queda e
iniciar a investigação, já que não há tratamento
medicamentoso para o desequilíbrio. Profissionais
como fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, educadores
físicos, equipe de enfermagem, e, em casos associados
à ansiedade e hiperventilação, psicólogos ou psiquiatras, são
fundamentais para um plano terapêutico eficaz.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
104
Bibliografia
GUSSO, Gustavo; LOPES, José M C.; DIAS, Lêda C. Tratado de
medicina de família e comunidade - 2 volumes: princípios,
formação e prática. 2. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2019. E-
book. p.1926. ISBN 9788582715369. Disponível em:
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9788
582715369/. Acesso em: 18 mai. 2025.
SEMANA 15: MANEJO DAS
DIARREIAS E CONSTIPAÇÃO
NA APS – DATA:
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
• Compreender o manejo das diarreias e constipação
na atenção primária.
Diarreia Aguda e Crônica
Ao abordar uma pessoa com diarreia, deve-se sempre avaliar
o seu grau de desidratação (lembrar-se dos sinais de alerta
para desidratação). Em um episódio de diarreia aguda sem
complicações, os exames complementares geralmente não
são necessários.
No tratamento da desidratação, deve-se sempre iniciar, o mais
rápido possível, o plano de hidratação mais adequado para o
grau de desidratação e orientar a pessoa a continuar com a
alimentação habitual.
A maioria dos episódios de diarreia aguda é autolimitada e,
por isso, não exige de antibioticoterapia. Porém, em certas
circunstâncias, o seu uso é necessário: diarreia com sangue
e/ou muco, quadro de septicemia, suspeita de infecção por
Vib rio cholerae, com desidratação grave associada, e quadro
de giardíase ou amebíase confirmado por exame laboratorial.
Na diarreia crônica, avaliam-se os sintomas que diferenciam
síndromes funcionais de doenças orgânicas (descartando
sinais de alerta vermelho para doenças orgânicas) e
categoriza-se o quadro de diarreia, quanto às características
das fezes, em aquosa, gordurosa ou inflamatória.
A frequência da evacuação normal varia de três vezes por
semana a três vezes por dia. Assim, um aumento de volume
das fezes acompanhado por diminuição da sua consistência e
maior número de evacuações configura um quadro de
diarreia.
A diarreia é uma doença frequente na atenção primária à
saúde (APS) e está entre as principais causas de mortalidade
infantil nos países em desenvolvimento. Estudos mostram a
ocorrência de, em média, dois a três episódios de diarreia por
criança, por ano, em áreas desenvolvidas, e até ou mais
episódios nos países em desenvolvimento.
Também são apontadas como consequências diretas da
diarreia infantil nesses países a desnutrição, o retardo do
crescimento e o prejuízo do desenvolvimento cognitivo. Tanto
a incidência como o risco de mortalidade por patologia
diarreica são maiores entre as crianças menores de 1 ano, e,
depois disso, os números diminuem.
No Brasil, é importante destacar o papel dos agentes
comunitários de saúde (ACS) para a conscientização da
população sobre a importância dos cuidados com a criança
desidratada.
Ao abordar um indivíduo com suspeita de diarreia, é
necessário, em primeiro lugar, classificar o quadro que ele
apresenta:
Tipos de Diarreia
Diarreia Aquosa
Diarreia Osmótica
Ocorre quando substâncias osmoticamente ativas
permanecem no lúmen intestinal, puxando água para dentro
do intestino por osmose. Comum em má digestão (ex.:
intolerância à lactose) ou má absorção de nutrientes (ex.:
doença celíaca). A diarreia cessa com o jejum.
Exemplo: ingestão de sorbitol ou manitol em excesso.
Diarreia Secretória
Caracteriza-se pela secreção ativa de água e eletrólitos pela
mucosa intestinal, independentemente da ingestão de
alimentos. Não melhora com o jejum. Geralmente causada por
toxinas bacterianas (como a do Vibrio cholerae), hormônios
tumorais ou doenças intestinais.
Exemplo: cólera ou diarreia associada a VIPoma (tumor
secretor de peptídeo vasoativo intestinal).
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
105
Diarreia Gordurosa (Esteatorreia)
É causada por má digestão ou má absorção de gorduras,
resultando em fezes volumosas, brilhantes, flutuantes e de
odor fétido. Ocorre em doenças pancreáticas, biliares ou
intestinais.
Exemplo: insuficiência pancreática crônica, doença celíaca ou
síndrome do intestino curto.
Diarreia Inflamatória
Decorre de inflamação da mucosa intestinal, com exsudação
de muco, sangue e pus, além de prejuízo na absorção. É
frequente em doenças inflamatórias intestinais (DII) ou
infecções invasivas (ex.: Shigella, E. coli entero-invasiva).
Exemplo: retocolite ulcerativa ou infecção por Salmonella.
Tipo de
Diarreia
Mecanismo Fisiopatológico Principais Causas Características Clínicas
Resposta
ao Jejum
Osmótica
Presença de substâncias
osmoticamente ativas no lúmen
intestinal, que atraem água.
Intolerância à lactose, uso de
laxantes osmóticos, má
absorção de carboidratos.
Fezes aquosas, melhora com
jejum, pH fecal ácido, aumento do
gap osmótico fecal.
Melhora com
jejum
Secretória
Secreção ativa de íons e água
pela mucosa intestinal, inibindo
a absorção.
Cólera, toxinas bacterianas,
tumores secretores (VIPoma),
doenças endócrinas.
Diarreia aquosa em grande
volume, persistente mesmo em
jejum, desidratação rápida.
Não melhora
com jejum
Gordurosa
(Esteatorreia)
Má digestão ou má absorção de
gorduras, resultando em
excesso de lipídios nas fezes.
Doença celíaca, insuficiência
pancreática, doença hepato-
biliar, síndrome do intestino
curto.
Fezes volumosas, brilhantes,
flutuantes, fétidas; perda de peso
frequente.
Parcial ou
variável
Inflamatória
Inflamação da mucosa intestinal
com exsudato de muco, pus ou
sangue e lesão epitelial.
Doença de Crohn, retocolite
ulcerativa, infecções invasivas
(Shigella, E. coli EIEC).
Fezes com muco, sangue, pus;
dor abdominal, febre, urgência
evacuatória.
Não melhora
com jejum
Sintomas versus provável etiologia da diarreia aguda
Nos quadros de diarreia aguda, as infecções virais,
principalmente por rotavírus, são responsáveis por 75 a 90%
dos casos. As infecções bacterianas são a causa de 10 a 20%
dos casos, com destaque para as infecções secundárias à
Escherichia coli (diarreia do viajante). Por sua vez, as
infecções parasitárias causam menos de 5% dos quadros
diarreicos.
É importante que o médico de família esteja atento, a fim de
fazer o diagnóstico diferencial de doenças que podem ter
episódios de diarreia aguda como seus sintomas. Por
exemplo, infecções gastrintestinais (doença inflamatória
intestinal [DII], intussuscepção,enterocolite
pseudomembranosa, apendicite, alergia alimentar, deficiência
de lactase) ou outras doenças (sepse bacteriana, otite média,
pneumonia, meningite, infecção do trato urinário).
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
106
Características clínicas da infecção devida a determinados
patógenos específicos que produzem diarreia
Classificação da diarreia crônica e causas
Mg²⁺: íon magnésio
PO₄³⁻: íon fosfato
SO₄²⁻: íon sulfato
Diagnóstico das Diarreias
Anamnese
História na diarreia aguda
A avaliação inicial da diarreia aguda deve priorizar sinais de
gravidade e sintomas de desidratação.
A observação dos pais quanto à ingestão de líquidos, diurese,
diarreia e êmese é útil na identificação de desidratação
clinicamente relevante.
A investigação etiológica orienta o tratamento e inclui:
• Início, frequência e volume das evacuações;
• Características das fezes (presença de bile, sangue
ou muco);
• Presença de vômitos e febre;
• História médica, uso de medicamentos,
imunossupressão e comorbidades;
• Fatores epidemiológicos (viagens recentes, surtos
etc.).
História na diarreia crônica
Ao se avaliar uma pessoa com história de diarreia por mais de
30 dias, deve-se, inicialmente, explorar alguns pontos
fundamentais:
A partir desses dados, pode-se diferenciar sintomas
sugestivos de uma síndrome orgânica daqueles de uma
síndrome funcional:
A ausência dos alertas vermelhos associada à presença de
dor abdominal aliviada com a defecação, ao aumento da
frequência de evacuações e à diminuição da consistência das
fezes no início da dor, à passagem de muco pelo reto, ao
tenesmo e ao relato de distensão abdominal, bem como um
exame físico sem alterações sugerem a presença de uma
síndrome funcional No entanto, esse quadro clínico não exclui
a presença de uma possível doença orgânica.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
107
Alertas vermelhos de doença orgânica, que indicam a
necessidade de uma avaliação mais detalhada e imediata, com
provável referenciamento a um especialista focal:
diarreias factícias, causadas pela ingestão de laxantes omitida
pelo paciente, devem ser consideradas em todos aqueles com
história de diarreia crônica associada à de transtornos
alimentares, à de ganhos secundários ou à de má digestão.
• Diarreias factícias: causadas pela ingestão de
laxantes omitida pelo paciente, devem ser
consideradas em todos aqueles com história de
diarreia crônica associada à de transtornos
alimentares, à de ganhos secundários ou à de má
digestão.
A caracterização das fezes é fundamental para a diferenciação
do tipo de diarreia crônica:
• Nas formas inflamatórias e secretórias, observa-se a
presença de fezes pastosas associadas a muco ou
sangue.
• Na disabsortiva, há esteatorreia e passagem de fezes
claras, fétidas e volumosas pela ampola retal.
Exame Físico
Diarreia Aguda
O aspecto mais importante a ser avaliado na diarreia aguda é
o nível de hidratação dos indivíduos. Os principais sinais de
desidratação que devem ser identificados são o
prolongamento do tempo de reperfusão capilar e a alteração
do padrão respiratório. Esses sinais, no entanto, quando
examinados isoladamente, não oferecem uma boa acurácia
para o diagnóstico, ao contrário do que ocorre quando
avaliados em associação ou quando presentes em escalas de
classificação de desidratação. Vale ressaltar que uma meta-
nálise de 13 estudos mostrou que os três melhores sinais de
exame para determinar a desidratação das crianças são
padrão respiratório anormal, turgência cutânea e tempo
prolongado de recarga capilar.
Classificação da gravidade da desidratação segundo
parâmetros clínicos proposta pelo Centers for Disease Control
and Prevention (cdc):
Escala da OMS (2005), fundamentada em parâmetros clínicos
rapidamente acessíveis:
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
108
Alertas vermelhos de desidratação: sinais ou sintomas que
indicam risco aumentado de progressão para quadro de
choque:
• Deve-se, ainda, aferir a temperatura corporal, com o
intuito de investigar a presença de febre associada,
e mensurar o peso, sobretudo na avaliação de
crianças. Isso é necessário porque a comparação
entre as medidas obtidas antes e depois da
reidratação é um método-padrão para o diagnóstico
da desidratação nessa população.
• Além disso, deve-se avaliar pulso, frequência
cardíaca, frequência respiratória e pressão arterial.
• No exame abdominal, deve-se focar em alterações
dos ruídos hidroaéreos, presença de distensão,
presença de massa ou de dor à palpação, bem como
defesa e sinal de descompressão súbita.
Diarreia Crônica
O exame físico na avaliação da diarreia crônica é, na maioria
das vezes, inespecífico ou inalterado. Pode, em alguns casos,
sugerir importantes pistas para o diagnóstico etiológico,
como:
• Presença de úlceras orais;
• Sinais de aterosclerose grave;
• Linfadenomegalia;
• Sinais de disautonomia e rash cutâneo;
• Rubor ou hiperpigmentação da pele.
O exame físico deve incluir o peso, a altura e o perímetro
cefálico em um padrão gráfico de crescimento.
Os sinais de deficiências nutricionais devem ser investigados,
como a dermatite perianal, na deficiência de zinco, e alguma
deformidade nas pernas, na deficiência de vitamina D.
O abdome pode apresentar distensão nas síndromes de má
absorção ou excesso de crescimento bacteriano no intestino,
ou pode ser muito sensível em um estado inflamatório.
O exame do reto também é importante e pode revelar doença
perianal na DII, por exemplo, ou perda de tecido subcutâneo
da região na doença celíaca e em outros estados de
desnutrição.
Exames complementares
Diarreia Aguda
Na maioria das vezes, não é necessária a realização de
exames complementares, devido os episódios serem curtos e
autolimitados.
A identificação de germes patógenos, bactérias, vírus ou
parasitas na amostra fecal de uma criança com diarreia não
indica, em todos os casos, que isso seja a causa da doença.
Coprocultura: deve ser solicitada apenas em casos graves,
inflamatórios e com presença de sangue, e em casos de
diarreia persistente ou em vigência de um surto. Na suspeita
clínica e/ou epidemiológica de um surto/epidemia de cólera,
talvez seja necessária a identificação de V. cholera e.
Exame parasitológico de fezes (EPF): é raramente
recomendado, sendo restrito a situações de persistência dos
sintomas por mais de 2 semanas.
Eletrólitos: podem ser úteis na avaliação da desidratação
grave, para apoiar o médico na suplementação de eletrólitos
(especialmente potássio e bicarbonato de sódio).
Diarreia Crônica
Na maioria das vezes, as informações fornecidas pela
anamnese e pelo exame físico são insuficientes na
investigação etiológica, sendo necessário a realização de
alguns exames preliminares:
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
109
Sobretudo com o intuito de categorizar a diarreia em aquosa,
gordurosa ou inflamatória.
O valor dos exames de imagem para os casos de diarreia
crônica é limitado:
• Radiografias abdominais: podem apresentar
constipação ou dilatação do intestino delgado.
• Tomografia computadorizada ou a ressonância
magnética: podem ser úteis na DII, pois podem
mostrar engrossamento do intestino.
• Teste respiratório com hidrogênio expirado: pode
evidenciar a má absorção de carboidratos.
• Endoscopia: pode ser útil para revelar acúmulo de
vilosidades duodenais e linfócitos intraepiteliais na
doença celíaca ou na DII.
Tratamento
O tratamento da diarreia deve ter quatro importantes
objetivos:
• Prevenir a desidratação.
• Tratar a desidratação, quando presente.
• Prevenir/tratar a desnutrição.
• Diminuir a duração e a gravidade do quadro atual de
diarreia, bem como prevenir futuros episódios.
Esses objetivos podem ser alcançados por meio do uso
adequado da terapia de reidratação oral, da manutenção de
uma alimentaçãodo homem obeso.
Obesidade do tipo ginóide
Quando a gordura se distribui, principalmente, na metade
inferior do corpo, particularmente na região glútea e coxas. É
típica da mulher obesa.
IMC – índice de Massa Corporal
O IMC é recomendado como uma estimativa prática de
sobrepeso em adultos, mas necessita ser interpretado com
cautela porque não é uma medida direta da adiposidade. Em
adultos com grande massa muscular, o IMC superestima a
adiposidade. Não se recomenda como rotina o uso da
bioimpedância para medida da adiposidade geral.
O acúmulo de gordura pode ser mensurado por meio do
índice de massa corporal (IMC), calculado pela divisão do
peso em quilogramas pelo quadrado da altura em metros. O
IMC correlaciona-se com os fatores de risco à saúde e é
utilizado para classificar o grau de obesidade:
𝐼𝑀𝐶 =
𝑃𝑒𝑠𝑜
𝐴𝑙𝑡𝑢𝑟𝑎!
Classificação do índice de massa corporal e do risco de
comorbidades em adultos:
Em crianças e adolescentes, o limite de normalidade é
estabelecido por curvas de percentil do IMC, nas quais o
sobrepeso corresponde ao IMC entre 85 e 95% para faixa
etária e sexo, e a obesidade corresponde ao valor acima de
95%.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
7
A avaliação da gordura abdominal – medida da circunferência
– deve ser usada em adultos com IMC menor do que 35
kg/m2. Na criança, essa medida não é recomendada como
rotina, mas pode ser usada como uma avaliação adicional de
risco.
Complicações
A adiposidade está relacionada a outras doenças por vários
mecanismos: o tecido adiposo em excesso se acompanha de
aumento de macrófagos e outras células imunes que
secretam mediadores inflamatórios que contribuem para o
desenvolvimento de resistência à insulina; a adiposidade
generalizada nos tecidos leva a problemas mecânicos
(compressão renal, refluxo gastresofágico [RGE], sobrecarga
das articulações, entre outros) e metabólicos, como, por
exemplo, lipotoxicidade dos ácidos graxos livres, levando à
esteatose e à cirrose.
A obesidade também provoca alterações socioeconômicas e
psicossociais:
• Discriminação educativa, laboral e social;
• Isolamento social;
• Depressão e perda de autoestima.
Diagnóstico da Obesidade
Anamnese
Na avaliação inicial, deve ser investigada a história do
excesso de peso:
• Idade de início;
• Maior e menor pesos alcançados;
• História familiar de obesidade;
• Tentativas anteriores de emagrecimento;
• Sucessos obtidos;
• Fatores precipitantes das recaídas.
Estilo de vida: é necessário investigar sobre o
comportamento alimentar e padrão de atividade física
pessoal e familiar, suas expectativas relacionadas ao peso
desejado, isto é, quanto a pessoa espera pesar ao final do
tratamento, a velocidade de perda esperada e as
consequências da perda de peso dos pontos de vista
psíquico e físico. Esses dados permitem avaliar as possíveis
causas da obesidade, assim como suas repercussões
psicológicas.
Consequências físicas: são avaliadas pela presença de
comorbidades, como DM2, hipertensão, DCV, osteoartrite,
dislipidemia, apneia do sono e outros problemas clínicos.
Raramente, a obesidade pode estar associada a causas
secundárias.
Deve-se buscar sintomas de:
• Doenças endócrinas: sintomas de hipotireoidismo,
síndrome de Cushing, acromegalia.
• Uso de medicamentos associados ao ganho de
peso: antidiabéticos (insulina, sulfonilureias,
tiazolidinedionas), hormônios esteroides,
antipsicóticos, estabilizadores do humor (lítio),
antidepressivos (tricíclicos, paroxetina, mirtazapina,
inibidores da monoaminoxidase), anticonvulsivantes
(valproato, gabapentina, carbamazepina), beta-
bloqueadores.
• Transtornos psiquiátricos: depressão, estresse
pós-traumático, ansiedade, transtorno do humor
bipolar, uso de drogas, transtorno do Binge e
bulimia são comumente associados à obesidade, e
seu manejo deve ser providenciado.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
8
Exame Físico
Além das medidas antropométricas do paciente e do cálculo
do IMC, deve-se, no exame físico, buscar sinais de doenças
associadas à obesidade secundária: pele seca, fria e
descamativa, cabelos finos e secos, voz rouca, madarose,
edema duro, presença de bócio (hipotireoidismo), obesidade
centrípeta e com giba, presença de acantose nigricante,
estrias purpúricas (síndrome de Cushing), aspecto facial
característico de acromegalia com prognatismo e feições
rudes, mãos grandes e com aumento dos tecidos moles.
Exames Complementares
Em geral, é suficiente a medida de perfil lipídico, glicemia e
pressão arterial (PA). Quando existe suspeita de doenças
causando a obesidade, deve-se proceder à investigação
apropriada.
Tratamento
O tratamento da obesidade é complexo e multidisciplinar. As
mudanças comportamentais necessárias à perda de peso só
serão possíveis em pessoas motivadas. Assim, é sempre
necessário avaliar se a pessoa deseja perder peso e oferecer
informações e apoio, respeitando sua autonomia.
O nível de intervenção proposto inicialmente deve basear-se:
Classificação do IMC:
• Sobrepeso: ≥ 25-29,9 Kg/m2 – risco aumentado;
• Obesidade Grau I: ≥ 30-34,9 Kg/m2 – risco
moderado;
• Obesidade Grau II: ≥ 35-39,9 Kg/m2 – risco
intenso;
• Obesidade Grau III: ≥ 40 Kg/m2 – risco muito
intenso.
Circunferência Abdominal:
• Normal: homens atéadequada e, em alguns casos, do uso
criterioso de medicação sintomática.
Passo 1: Definir o grau de desidratação para se escolher
o plano de tratamento mais adequado.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
110
Passo 2: Definir o plano de tratamento para cada situação
clínica
Passo 3: Iniciar, imediatamente, o manejo da pessoa com
queixa de diarreia de acordo com o plano definido no
passo 2.
Abordagem Medicamentosa
Em certas circunstâncias, o uso de antibioticoterapia é
necessário. Segundo a OMS, o tratamento com antibióticos só
está indicado nos seguintes casos:
• Diarreia com sangue e/ou muco, sendo a Shig ella e
a Salmonella os principais agentes etiológicos
responsáveis pelo quadro.
• Septicemia.
• Suspeita de infecção por V. cholerae com
desidratação grave associada.
• Quadro de giardíase ou amebíase com diagnóstico
confirmado por exame laboratorial.
Prescrição de antibioticoterapia de acordo com o quadro
clínico apresentado:
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
111
É importante destacar, no entanto, que, assim como em
qualquer outro tratamento, a pessoa deve ser reavaliada pelo
médico até 48 horas após o início da antibioticoterapia.3 Isso
deve ser feito com o intuito de investigar uma possível falha
terapêutica e com a necessidade de se ampliar o espectro do
fármaco, ou até mesmo reconsiderar outras hipóteses
diagnósticas.
• O uso de medicações antidiarreicas (“constipantes”),
sabe-se que isso é contraindicado.
• Fármacos antieméticos: especificamente a
metoclopramida, não há evidências de suporte
adequado com o seu uso em crianças que
apresentam vômitos. Dessa forma, orienta-se que ela
deve ser evitada, uma vez que a sedação pode
prejudicar a adesão ao tratamento com SRO.
• Suplementação de zinco: o impacto do uso tanto na
redução da gravidade do episódio diarreico quanto
na redução de episódios subsequentes de diarreia
em crianças menores de 5 anos, tem sido
demonstrado nos últimos anos. É importante
destacar que a maioria dos estudos que sustentam
essa prática foi realizada em regiões pobres e com
crianças em maior risco de desenvolver episódio
diarreico mais grave. A dose recomendada é:
o 20 mg de zinco por dia, durante 10 dias,
para todas as crianças com diarreia.
o Os lactentes de 2 meses ou menores
deveriam receber 10 mg por dia durante 10
dias.
• Probióticos: probióticos são microrganismos vivos
que, quando administrados em quantidades
apropriadas, conferem benefício à saúde do
hospedeiro. Alguns probióticos, como Lactobacillus
reuteri ATCC 55730 , L. rhamnosus GG, L. casei DN-
114 001 e Saccharomyces cer evisiae (boulardii) são
úteis para reduzir a gravidade e a duração da
diarreia aguda infecciosa infantil, abreviando em,
aproximadamente, 1 dia a duração da doença.
Tratamento da Diarreia Crônica
Deve ser realizado de acordo com a sua possível causa. Assim,
diante de um diagnóstico, cabe ao médico de família procurar
pelas melhores evidências relativas ao tema e avaliar a
conduta mais adequada de acordo com a realidade em que
trabalha. Além disso, são fundamentais as medidas de
reidratação, de combate à desnutrição e de reposição das
vitaminas e dos sais minerais, para melhora dos sintomas, ou
pelo menos para o suporte ao paciente enquanto se realizam
as intervenções diagnósticas e terapêuticas necessárias.
Vigilância Epidemiológica
A diarreia aguda não consiste em doença de notificação
compulsória nacional, em vigência de diagnóstico de casos
isolados, ao contrário do que ocorre em suspeita de surtos.
Portanto, na suspeita de um surto de doença diarreica
transmitida por alimento, com a ocorrência de, no mínimo, dois
casos de diarreia aguda semelhantes após a ingesta do
mesmo alimento ou de água de mesma origem, é importante
lembrar-se sempre de realizar a notificação.
Quando Referenciar
• Pessoa que apresente desidratação grave.
• Pessoa com diarreia crônica que necessite de
avaliação do especialista focal para o
estabelecimento do diagnóstico e/ou continuidade
do tratamento.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
112
Papel da Equipe Multiprofissional no Manejo da Diarreia
• Enfermeiro: avalia inicialmente o paciente com
diarreia na APS, iniciando rapidamente a reposição
hidroeletrolítica com SRO. Pode conduzir casos leves
e auxiliar nos moderados a graves.
• ACS: atua na prevenção, com orientações sobre
higiene e água segura, além de fazer vigilância ativa
e encaminhamento precoce em casos de
desidratação.
• Nutricionista: avalia e orienta pacientes com diarreia
crônica, ajudando no controle da desidratação,
desnutrição e ajustando dietas em casos de
intolerâncias alimentares.
Árvore de Decisão
Bibliografia
GUSSO, Gustavo; LOPES, José M C.; DIAS, Lêda C. Tratado de
medicina de família e comunidade - 2 volumes: princípios,
formação e prática. 2. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2019. E-
book. p.1473. ISBN 9788582715369. Disponível em:
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9788
582715369/. Acesso em: 06 jun. 2025.
Constipação
A constipação, primária ou funcional, é a queixa mais comum
em ambulatórios de atenção primária à saúde (APS) e está
relacionada com a dieta e o estilo de vida, como o baixo
consumo de fibras e o sedentarismo, além de distúrbios de
motilidade idiopáticos do cólon.
É importante tentar estabelecer o que realmente a pessoa
considera como constipação e quais são as suas expectativas
de um hábito intestinal normal. Sintomas de longa data, com
melhoras e pioras ao longo do tempo, tendem a ser
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
113
relacionados à constipação funcional, ao passo que causas
orgânicas se apresentam de forma mais aguda.
A história psicossocial e familiar deve ser abordada – sintomas
depressivos, de ansiedade, transtornos alimentares,
somatizações, traumas na infância e abuso físico e sexual
podem estar associados à constipação.
Não há evidências suficientes que permitam indicar o uso
rotineiro de exames de sangue, radiológicos ou endoscópicos
na avaliação de pessoas com constipação. Os exames
complementares devem ser realizados para avaliação de uma
possível causa secundária apenas quando a anamnese e o
exame físico levantarem alguma suspeita específica.
Estudos recentes, utilizando como desfecho a constipação
segundo os critérios de ROMA III, têm se aproximado de uma
prevalência média de 25,2 e 26,9%. É um problema mais
comum em mulheres (37,2%, contra 10,2% nos homens), em
pessoas não brancas, com mais de 65 anos, que possuem
baixa renda, com baixo nível socioeducacional e em pessoas
que não praticam atividades físicas.
Algumas pessoas se consideram constipadas pela
consistência mais endurecida das fezes, e outras referem
menor frequência ou maior dificuldade para evacuar.
Fundamentando-se nas queixas dos pacientes, a constipação
pode ser referida como fezes endurecidas, esforço excessivo
no ato evacuatório, evacuações infrequentes, sensação de
evacuação incompleta e até mesmo demora excessiva no
banheiro.
Classificação e Diagnóstico Diferencial
Constipação Primária
Também chamada de funcional, é a causa mais comum de
consulta em ambulatórios de APS. Suas principais causas são
dietéticas e de estilo de vida, como o baixo consumo de fibras
e o sedentarismo, além de distúrbios de motilidade idiopáticos
do cólon. A definição para constipação funcional, que é
recomendada na maioria dos consensos e diretrizes, foi
estabelecida pelo Consenso de Roma III, a qual pode ser
utilizada tanto para fins diagnósticos como de pesquisa.
A constipação funcional pode ser dividida em três grupos
fisiopatológicos que frequentemente se encontram
sobrepostos, os quais são de difícil distinção na avaliação
clínica.
• O primeiro grupo caracteriza-se por trânsito
intestinal normal, porém apresentando dificuldades
para o ato evacuatório.
• O segundo grupo apresentatrânsito intestinal lento.
• O terceiro grupo caracteriza-se por disfunção do
assoalho pélvico, ocorrendo incoordenação da
musculatura pélvica e esfincteriana, bloqueio
anorretal e necessidade de esforço evacuatório.
Critérios de Roma III para diagnóstico de Constipação
Funcional
1. Dois ou mais dos seguintes achados:
• Esforço presente em pelo menos 25% das
evacuações.
• Fezes endurecidas ou fragmentadas em pelo menos
25% das evacuações.
• Sensação de esvaziamento incompleto em pelo
menos 25% das evacuações.
• Sensação de obstrução ou bloqueio anorretal em
pelo menos 25% das evacuações.
• Manobras manuais para facilitar pelo menos 25%
das evacuações (p. ex., manobras digitais para
evacuar, apoio pélvico ou vaginal).
• Menos de três evacuações espontâneas por semana.
2. Fezes amolecidas são raras na ausência de uso de
laxativos.
3. Critérios para SII não estão presentes.
Os sintomas devem estar presentes nos últimos 3 meses e
devem ter se iniciado há pelo menos 6 meses.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
114
Constipação Secundária
Quando é associada a alguma condição patológica ou ao uso
de medicamentos.
Causas Comuns em Constipação Secundária
Diagnóstico
Anamnese
História clínica: é importante tentar estabelecer o que
realmente a pessoa considera como constipação e quais são
as suas expectativas de um hábito intestinal normal. Em
estudos, apenas 50% das pessoas que referiram constipação
preenchiam os critérios de ROMA III.
Técnica de medicina centrada na pessoa: permite a exploração
da sua experiência com o problema, além do seu contexto
pessoal, familiar e comunitário, sendo fundamental para
esclarecer as situações em que há constante dificuldade com
a defecação e/ou redução da qualidade de vida. Esse pode
ser um critério mais inclusivo e que permite identificar melhor
as pessoas que necessitam de avaliação e tratamento.
Sintomas de longa data, com melhoras e pioras ao longo do
tempo, tendem a ser relacionados à constipação funcional, e
causas orgânicas apresentam-se de forma mais aguda.
Uma escuta qualificada exige a determinação não somente da
frequência e da consistência fecais, mas também de
dificuldades enfrentadas (dor, sangramento, tamanho das
fezes).
A anamnese deve ser direcionada para a detecção de causas
secundárias e dos alertas vermelhos.
A presença dos alertas vermelhos não é indicativa absoluta de
referenciamento e depende da disponibilidade de exames na
APS. No entanto, indica uma condição de maior probabilidade
para doença orgânica e, em geral, necessita de investigação
do trato digestivo baixo.
Hábitos de vida e dietéticos: pessoas que ingerem mais de 15
g de fibras insolúveis por dia têm o dobro do número de
movimentos intestinais semanais do que aquelas que ingerem
fibras de forma irregular. A inatividade física, seja por
sedentarismo ou por doenças, também tem um papel
importante na redução dos movimentos intestinais.
Uso de medicamentos: a correta avaliação do uso de
medicamentos não pode ser esquecida, pois a motilidade
colônica pode ser reduzida com o uso continuado de laxantes,
enemas e outros medicamentos que não são essenciais.
Sensação de esvaziamento retal incompleto, associada com
uso de força excessiva para extrusão das fezes e manobras
manuais frequentes para desimpactação direcionam para
alterações obstrutivas/mecânicas anorretais, que incluem
doença de Hirschprung, estreitamento anal, câncer, prolapso
retal, retoceles ou disfunções do assoalho pélvico.
História psicossocial e familiar: intomas depressivos, de
ansiedade, transtornos alimentares, somatizações, traumas
na infância e abuso físico e sexual podem estar associados à
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
115
constipação. Esses achados, em geral, apontam para a
constipação funcional.
Doença de Hirschsprung (DH): pessoas ue tenham
constipação de início na infância, com sintomas bastante
expressivos, envolvendo uso de enemas para desobstrução e
frequência de evacuação muito baixa (podendo ficar até mais
de 2 semanas sem movimento intestinal) são suspeitas de
aganglionose colônica congênita ou DH.
Doença de Chagas (DC): em áreas endêmicas para DC, deve-
se levar em consideração a ocorrência de megacolo adquirido
em pessoas com constipação de difícil tratamento.
Exame Físico
Deve ser direcionado pelos achados da anmnese e com o
objetivo de detectar causas secundárias e alertas vermelhos.
O exame abdominal comumente revela dor (fraca e sem dor à
descompressão) e distensão abdominal, mesmo nas
constipações funcionais crônicas. Massas intestinais são de
difícil palpação, porém, quando encontradas, devem ser
investigadas. Fecalomas localizados em regiões mais altas do
intestino também podem ser palpados e são representados
por massas endurecidas, móveis, em topografia intestinal e
indolores.
O peso e o estado nutricional devem ser observados para
registrar emagrecimento e desnutrição. A palidez mucosa é
um sinal indireto de anemia e deve sempre ser investigada.
O exame anorretal é realizado com o paciente em decúbito
lateral esquerdo e pode trazer importantes informações:
• A inspeção em repouso e dinâmica (com manobra de
Valsalva) identifica fissuras agudas e crônicas,
escoriações, hemorroidas externas ou prolapsos
retais, que podem ser causadas pela constipação ou
podem produzir dor que leve à constipação crônica.
• Podem-se identificar causas infecciosas, como
herpes genital ou abscessos perianais, além de
fístulas.
• Durante o exame, ao solicitar que a pessoa realize a
contração anal (como se fosse defecar), a
observação de assimetria na abertura do ânus ou a
sua abertura excessiva denotam distúrbio
neurológico que altera a função esfincteriana.
• O toque retal pode revelar massas, úlceras ou
fecalomas; em homens, o exame também pode
revelar aumento do tamanho da próstata.
A retocele é verificada em exame ginecológico, pela
proeminência da parede posterior da vagina ao solicitar que a
paciente realize contração pélvica.
Exames Complementares
Os exames complementares devem ser realizados para
avaliação de uma possível causa secundária apenas quando a
anamnese e o exame físico levantarem alguma suspeita
específica.
Colonoscopia: a realização da colonoscopia de rotina em
pessoas constipadas não diagnostica doenças orgânicas mais
frequentemente do que na população assintomática. A
presença dos alertas vermelhos indica necessidade de
investigar o TGI, devido a um aumento na probabilidade de
haver uma doença orgânica associada, sobretudo neoplasias.
Nesses casos, é recomendada a realização de colonoscopia
ou retossigmoidoscopia flexível, sendo a colonoscopia um
exame mais sensível, especialmente para detecção de câncer
colorretal e lesões que provoquem estreitamento do cólon
Diabetes e hipotireoidismo: a probabilidade pré-teste de
hipotireoidismo ou diabetes não é maior em pessoas
constipadas do que em assintomáticos, não justificando,
somente pela constipação, a realização de testes para
rastreamento dessas patologias na avaliação inicial.
Pesquisa de sangue oculto nas fezes: é importante lembrar-
se de que, após a idade de 50 anos, há recomendação para
realização de rastreamento universal para câncer colorretal.
Pode-se indicar a pesquisa de sangue oculto nas fezes para
os indivíduos constipados com mais de 50 anos, para
pesquisa de sinal de alerta e rastreamento de neoplasia
colorretal. Esse exame é, em geral, mais disponível e de fácil
realização quando comparado com colonoscopia ou
retossigmoidoscopia.
Alguns exames podem identificar causas secundárias de
constipação e são indicados nos casos em que a anamnese e
o exame físico forem sugestivos de alguma etiologia
específica:
• Hemograma completo: anemia, que pode sugerir
neoplasias;
• Glicose em jejum: diabetes;
• Pesquisa de sangue oculto nas fezes: sangramento
oculto, neoplasias;
• Hormônio estimulante da tireoide(TSH):
hipotireoidismo.
• Potássio sérico: hipocalemia;
• Cálcio sérico: hipercalcemia;
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
116
• Exame comum de urina e creatinina sérica: doença
renal.
• Enema opaco: é o exame de preferência quando
houver suspeita de estreitamento colônico (por
aderências, doença inflamatória intestinal ou
diverticulose) ou suspeita de megacólon congênito
ou adquirido.
Exames bastante específicos que são utilizados para avaliação
do trânsito colônico e do funcionamento da musculatura do
assoalho pélvico: trânsito colônico, teste da expulsão de
balão, manometria anorretal, ressonância magnética pélvica
dinâmica e defecografia. Provável que a utilização deles deva
ser avaliada e indicada em conjunto com o gastrenterologista,
o proctologista ou por meio de consultorias, podendo ter
utilidade nos casos refratários e mais graves. São testes com
pouca disponibilidade, mesmo em redes de atenção terciária.
Tratamento
Não Medicamentoso
Orientações
O tratamento da constipação funcional crônica envolve
inicialmente educação para a saúde e mudanças de estilo de
vida. Assegurar ao paciente a ausência de doença grave é um
importante passo inicial, dado que muitas pessoas relacionam
a constipação ao medo de câncer intestinal.
A pessoa deve ser esclarecida sobre a variação da frequência
de movimentos intestinais que são esperados e que não há
necessidade de evacuações diárias para a manutenção da
saúde.
A necessidade de evacuar não deve ser ignorada e pode-se
estimular a regularização do hábito intestinal encorajando a
pessoa a permanecer sentada no vaso sanitário por alguns
minutos diariamente, sobretudo após refeições e pela manhã,
aproveitando o reflexo gastrocólico.
Dieta e Atividade Física
As principais orientações no início do tratamento da
constipação funcional crônica referem-se ao aumento da
ingestão de fibras e líquidos, além de manutenção de atividade
física regular.
Recomenda-se uma quantidade de 25 a 35 g de fibras diárias.
As fibras provenientes de alimentos podem ser
complementadas por farelos (cereais) integrais, adicionando,
por exemplo, duas a seis colheres de sopa de farelo de trigo,
aveia ou linhaça a cada refeição, seguidos por um ou dois
copos de água ou outro líquido. O aumento do consumo de
líquidos deve sempre ser estimulado para melhor
funcionamento da técnica.
• É importante também explicar ao indivíduo que o
aumento do consumo de fibras e líquidos produz
efeitos em 7 a 10 dias.
• O aumento do consumo de fibras pode associar-se à
dor abdominal, distensão e flatulência, devendo-se
aumentar a dose diária gradualmente, para atenuar
os efeitos colaterais.
Técnicas de biofeedback
Consistem em treinamento para aprimorar o relaxamento da
musculatura pélvica, associada a esforço evacuatório, para
melhor atingir a defecação. Essa técnica encontra evidências
de benefício em casos refratários e, principalmente, nas
pessoas com disfunção do assoalho pélvico. Esses últimos são
mais propensos a responder ao biofeedback do que a laxantes
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
117
e dieta. É uma técnica ainda pouco disponível, que requer
treinamento de equipe e instrumental para sua realização,
além de carecer de normatização.
Medicamentoso
Nos casos que não responderem adequadamente às medidas
anteriores, pode-se prescrever o uso de agentes laxativos.
Encontram-se melhores evidências de que a lactulose, o
polietilenoglicol e o psyllium podem aumentar a frequência ou
reduzir a consistência das fezes, sendo mais eficazes do que
placebo.
Os agentes laxativos podem ser utilizados de forma
intermitente, por períodos de alguns dias intercalados com
intervalos sem medicamentos, ou de forma crônica. O uso de
laxativos deve levar em consideração o custo e a efetividade
individual.
Parece adequado utilizar laxantes de forma escalonada, e sem
sobreposição:
• Primeiramente, agentes formadores de bolo fecal, os
quais são seguros e de baixo custo, em conjunto com
o aumento de fibras, de líquidos e a realização de
exercícios físicos. Lembrar-se de que os formadores
de bolo demoram 7 a 10 dias para produzirem
efeitos.
• Posteriormente, pode ser utilizado um laxante
osmótico, se necessário. Os laxantes osmóticos têm
um tempo de início de ação de 24 a 48 horas.
• Em seguida, prescrever os laxantes estimulantes e
emolientes, que devem ser usados apenas na
ausência de resposta aos agentes anteriores. Os
laxantes emolientes (óleo mineral, docusato)
necessitam de atenção em pessoas com disfagia,
pelo elevado risco de aspiração. Além disso, em
prazo mais prolongado, podem prejudicar a
absorção de vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K).
• Laxativos procinéticos: a prucaloprida é um agonista
serotoninérgico enterocinético que age aumentando
os movimentos intestinais em pacientes com
constipação severa. A lubiprostona é um estimulador
seletivo dos canais de cloro tipo 2, localizados na
membrana apical do epitélio gastrintestinal. Como
resultado, há um aumento na secreção de líquido
intestinal rico em cloro, o que estimula os
movimentos intestinais e facilita a passagem de fezes
amolecidas (hidratadas) através do intestino. Ambos
são recomendados em constipação severa e não
responsiva aos demais laxantes, devendo-se usá-los
como tratamento de exceção. São, ainda, de custo
mais elevado e menos disponíveis.
Enemas (glicerinados ou de água morna)
Em pessoas com constipação de difícil tratamento, como
idosos que têm pouca mobilidade ou doenças neurológicas,
mudanças dietéticas e laxantes podem não ter efeito. Nesses
casos, se a evacuação não ocorre a cada 3 dias e houver
sintomas de desconforto, ou, ainda, quando houver fecaloma,
podem ser utilizados enemas (glicerinados ou de água morna)
por alguns dias consecutivos (sugere-se não exceder 3 dias)
e fragmentação digital do fecaloma, para promover a
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
118
desimpactação fecal, e, após uma adequada limpeza do trato
digestório, manter uso de laxantes diariamente para
manutenção e facilitação da evacuação.
Nesses casos, a preferência é pelos laxantes com melhor
evidência de benefício, como os osmóticos (polietilenoglicol e
lactulose), seguidos dos laxantes estimulantes. Em pacientes
acamados ou demenciados, pode ser necessária a
manutenção de enemas, uma ou duas vezes na semana, para
evitar recorrência na impactação, além do uso de supositórios
de glicerina associados aos laxantes, uma vez que estes
também auxiliam na liquefação das fezes.
Quando Referenciar
O encaminhamento deve considerar a presença de patologias
associadas, resposta ao tratamento e os recursos
disponíveis.
Constipação funcional crônica refratária pode exigir avaliação
por equipe multiprofissional (gastroenterologista,
proctologista, nutricionista, psicólogo).
Exames especializados (ex.: trânsito colônico, manometria
anorretal, defecografia) ajudam a indicar tratamentos
como biofeedback, toxina botulínica ou cirurgia.
Doenças anorretais dolorosas (fissuras, prolapsos,
hemorroidas, abscessos) devem ser avaliadas por
proctologista se refratárias.
Retocele só deve ser encaminhada se o esvaziamento for
incompleto, mesmo com manobras manuais.
Alterações estruturais (estreitamento colônico,
megacolo/retreto, doença de Hirschsprung) requerem
avaliação cirúrgica.
Sinais de alerta (ex.: suspeita de neoplasia)
demandam encaminhamento urgente.
Pessoas acamadas ou com demência, sem resposta a
laxantes/enemas, podem precisar de desimpactação
hospitalar.
Quadros de abdome agudo ou oclusão intestinal deve ter
referenciamento cirúrgico imediato.
Papel da Equipe Multiprofissional
Enfermeiro:
• Importante na escuta e triagem de casos que exigem
atenção médica.
• Atua no seguimento de pacientes com medidas não
farmacológicas.
• Auxilia na detecção de casos refratários.
• Essencial em pacientes acamados, orientando
famíliassobre cuidados
como enemas e supositóriosdomiciliares.
Nutricionista:
• Indicado para orientar ajustes dietéticos, como o
aumento de fibras, líquidos e uso de coquetéis
laxativos naturais.
Psicólogo:
• Contribui nos casos com aspectos
emocionais relevantes ou resistência ao tratamento,
comuns na constipação crônica.
Árvore da Decisão
Bibliografia
GUSSO, Gustavo; LOPES, José M C.; DIAS, Lêda C. Tratado de
medicina de família e comunidade - 2 volumes: princípios,
formação e prática. 2. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2019. E-
book. p.1481. ISBN 9788582715369. Disponível em:
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9788
582715369/. Acesso em: 06 jun. 2025.
SEMANA 16: DIAGNÓSTICO E
ACOMPANHAMENTO DAS
PRINCIPAIS PARASITOSES
INTESTINAIS NA APS – DATA:
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
119
• Compreender o diagnóstico e acompanhamento das
principais parasitoses intestinais na APS.
Parasitoses Intestinais
As parasitoses intestinais são doenças cujos agentes
etiológicos são helmintos ou protozoários que, em pelo menos
um dos períodos do ciclo evolutivo, se localizam no aparelho
digestório do homem. A via oral-fecal é a principal fonte de
infecção, bem como água ou alimentos contaminados.
As parasitoses intestinais são um problema de saúde pública
mundial. Elas pertencem ao grupo de doenças infecciosas
negligenciadas (DINs), em especial as helmintíases
transmitidas pelo solo (HTSs).
Saneamento básico e medidas individuais e coletivas de
higiene são de extrema importância para se evitar a
transmissão de parasitas.
Em condições de grande vulnerabilidade, o tratamento
periódico das parasitoses intestinais diminui a sua
prevalência, principalmente se associado a medidas de
saneamento básico e higiene.
Em condições de higiene e saneamento básico adequados, a
suspeita diagnóstica deve basear-se na anamnese, no exame
físico e, se necessário, em exames complementares. Não é
necessário o tratamento periódico para parasitoses intestinais
nesses casos.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) incluiu as HTSs
(Ascaris, Trichuris e Ancylostoma) entre as DINs, bem como
no plano mundial de desparasitação (deworming), para
reduzir a prevalência entre crianças em idade escolar nas
áreas de alto risco. No Brasil, a quimioterapia preventiva
visando ao controle da HTS foi regulamentada em um plano
nacional para o controle de DINs.
Os parasitas que mais comumente causam parasitoses
intestinais são Giardia lamblia (giardíase), Ascaris
lumbricoides, Trichuris trichiura (helmintíases) e Ancylostoma
duodenale. Menos prevalentes são as parasitoses causadas
por Strongyloides stercoralis (helmintíase) e Enterobius
vermicularis (enterobíase ou oxiuríase).
Quanto à amebíase, em algumas das referências pesquisadas,
esse parasita aparece com baixa prevalência. Em outras,
evidencia-se como uma das enteroparasitoses mais
prevalentes, junto com Giardia, Ascaris e Trichuris.
Os agentes causadores de teníase (Taenia solium e Taeni a
saginata), apesar da baixa prevalência quando comparados
aos parasitas supracitados, são importantes devido às graves
complicações do complexo teníase/cisticercose, devendo ser
lembrados em momentos de diagnósticos diferenciais,
principalmente em regiões com precárias condições de
saneamento. A localização mais frequente da cisticercose é o
sistema nervoso central (SNC), sendo responsável por muitas
formas de epilepsia.
O Schistosoma mansoni, causador de esquistossomose,
apesar da baixa prevalência e de ser endêmico em regiões
restritas do Brasil tem sua relevância clínica pelo número
expressivo de formas graves e óbitos.
Entamoeba coli e Endolimax nana são parasitas encontrados
com frequência nos exames coproparasitológicos; porém,
normalmente não têm ação patogênica.
Quando Pensar
Sempre se deve pensar em parasitoses intestinais em locais
onde há condições de higiene precárias. Os principais
condicionantes das enteroparasitoses são as circunstâncias
de higiene e o saneamento básico, bem como o nível
socioeconômico e a escolaridade da população analisada. As
maiores prevalências ocorrem em situações de condições
mais precárias, o mesmo ocorrendo para o poliparasitismo.
As crianças (2-6 anos) que frequentam creches apresentam
maior prevalência de parasitoses quando comparadas às
crianças que não frequentam essas instituições. Tais
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
120
diferenças mantêm-se tanto para helmintos como para
protozoários.
Nos casos de enterobíase, as maiores prevalências estão
associadas ao baixo nível de escolaridade materna, a
habitações em áreas rurais e às precárias condições de
higiene, principalmente após a defecação.
Sintomas
Sintomas podem ou não estar presentes, variando de
ausência a estado subagudo ou crônico. Os sintomas, muitas
vezes, são vagos e inespecíficos, o que dificulta o diagnóstico
clínico, salvo exceções de prurido anal em casos de
enterobíase (oxiuríase) e quando há eliminações de vermes
na ascaridíase.
Os sintomas podem manifestar-se por:
• Diarreia: aquosa, mucoide, aguda, persistente,
intermitente;
• Dor abdominal: desconforto vago a cólicas;
• Dispepsia;
• Anorexia;
• Astenia;
• Emagrecimento; e
• Distensão abdominal.
Em crianças com enteroparasitas, observaram-se:
• Sintomas intestinais: diarreia, vômito, epigastralgia,
perda de apetite, flatulência;
• Sintomas cutâneos: prurido;
• Sintomas respiratórios: tosse, dor de garganta,
secreção nasal.
Associação significativa:
• Ascaridíase → epigastralgia;
• Giardíase → dor abdominal, diarreia e flatulência.
Entamoeba histolytica não apresentou associação com
sintomas.
Morbidades associadas: déficit pôndero-estatural e anemia
ferropriva.
Principais Parasitoses
Ascaridíase e Tricuríase
Transmissão
Sua transmissão pode ocorrer através de alimentos vegetais
mal lavados (hortaliças), terra contaminada e água não
tratada (ausência de rede de distribuição e de coleta), entre
outros fatores em que ocorra exposição ao meio ambiente
contaminado.
O parasita adulto habita o trato gastrintestinal (TGI), produz
ovos, que são eliminados através das fezes para o meio
ambiente, onde requerem período de maturação para se
tornem infectantes.
Complicações da Ascaridíase
Obstrução intestinal, perfuração intestinal, volvo, colecistite,
pancreatite, abscesso hepático, manifestações pulmonares
(broncospasmo, hemoptise, pneumonite – síndrome de
Löefler –, eosinofilia importante).
Complicações da Tricuríase
Anemia severa, em grandes infestações, e o decorrente atraso
no desenvolvimento de crianças, em condições crônicas.
Giardíase
Transmissão
A transmissão ocorre pelo contato entre humanos (oral-fecal),
mesmo em ambientes saneados, também podendo ocorrer
por água contaminada, visto que a eliminação do parasita
infectante ocorre desde o momento de eliminação das fezes.
Complicações
Síndrome de má absorção.
Enterobíase
Transmissão
A transmissão se dá pelo contato interpessoal. As fêmeas
adultas depositam ovos na região perianal, causando como
sintomatologia o prurido. Os ovos podem ser transmitidos
diretamente para os contatos da pessoa infectada,
indiretamente através de poeiras, alimentos ou roupas
contaminados, e, também, pode haver a retroinfestação, com
a migração das larvas para as regiões superiores do intestino.
Complicações
Vulvovaginites, salpingites, infecções devido às escoriações
provocadas pela coçadura, granulomas pélvicos.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
121
Estrongiloidíase e Ancilostomíase
Transmissão
São transmitidas pela penetração da larva filarioide através da
pele, chegando aos pulmões e, destes, ao TGI, onde se
desenvolve o indivíduo adulto. As formas adultas liberam
larvas não infectantes que, no meio externo, podem tornar-se
infectantes ou indivíduos adultos de vida livre, com capacidadede acasalamento, mantendo o ciclo de infestação. Animais
domésticos (gatos e cachorros), além do homem, podem ser
reservatórios deste parasita.
Complicações da Estrongiloidíase
Síndrome de má absorção, síndrome de Löefler. Em
imunocomprometidos, em uso de corticoides ou com
desnutrição grave: edema pulmonar, superinfecção, infecção
oportunística. Formas sistêmicas: sepse.
Complicações da Ancilostomíase
Anemia, hipoproteinemia (insuficiência cardíaca, anasarca),
hemoptise, pneumonite (quando larvas migram para os
pulmões).
Amebíase
Transmissão
A transmissão ocorre pela ingesta de água e/ou alimentos
contaminados por dejetos contendo cistos do protozoário.
Complicações
Granulomas (amebomas) no intestino grosso, abscesso
hepático, abscesso cerebral, abscesso pulmonar, colite
fulminante, empiema, pericardite.
Teníase
Transmissão
A teníase ocorre por ingesta de carne crua ou mal passada de
animais com cisticercose, seja ela por cisticerco de T. saginata
(carne de vaca) ou cisticerco de T. solium (carne de porco).
Fatores econômicos, culturais (hábitos alimentares) e
religiosos tendem a expor certos grupos de indivíduos em
maior ou menor grau, como o uso de carne crua.
A cisticercose humana ocorre quando o homem se torna
hospedeiro intermediário após a ingesta de ovos de T. solium.
Após 1 a 3 dias da ingestão de ovos, ocorre liberação dos
embriões no duodeno e jejuno. As larvas alcançam a
circulação sanguínea e se fixam em diversos tecidos.
A teníase é um fator importante para o aparecimento da
cisticercose humana, havendo inter-relação estreita entre
teníase e cisticercose. O homem adquire cisticercose pela
ingestão de ovos de T. solium por meio de alimentos
contaminados, uso de água de irrigação e em área de criação
de porcos.
Outra fonte importante de contaminação são os
manipuladores de alimentos, e o próprio portador de teníase,
em razão de maus hábitos de higiene, também pode auto
contaminar-se.
Complicações da Teníase/cisticercose
Quando há ingesta, pelo homem, de ovos da tênia adulta, os
embriões podem migrar para o SNC, causando a
neurocisticercose, sendo considerada a mais grave das
infecções parasitárias do sistema nervoso humano, podendo
causar convulsões, hipertensão intracraniana, cefaleia e
meningite.
A cisticercose pode localizar-se também no globo ocular,
causando cegueira, e no tecido muscular, causando cãibras.
A neurocisticercose é considerada a causa isolada mais
comum de epilepsia.
Esquistossomose
Transmissão
É adquirida pelo contato pele e mucosas em consequência do
contato humano com águas de lagoas contendo formas
infectantes do S. mansoni (larvas cercárias). Quando a larva
cercária penetra na pele ou mucosa do homem, atinge a
circulação sanguínea e se instala preferencialmente no fígado
até atingir a fase adulta do verme, deslocando-se para os
vasos mesentéricos no intestino grosso e delgado, iniciando a
postura de ovos pelas fezes, que são eliminados em lagoas.
Os ovos na água se transformam em miracídios que, em
contato com o caramujo Biomphalaria, fazem ciclo
intermediário no intestino do animal, transformando-se em
larvas cercárias que penetram no ser humano, e o ciclo se
reinicia. A transmissão da doença depende da presença do
homem infectado, excretando ovos do helminto pelas fezes, e
dos caramujos Biomphalaria que vivem em água-doce, que
atuam como hospedeiros intermediários, liberando larvas
infectantes (cercárias) do verme nas coleções hídricas
utilizadas pelos seres humanos.
Complicações
A partir da penetração das larvas cercárias na pele ou nas
mucosas e todo o ciclo realizado na circulação sanguínea,
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
122
fígado, intestino, a doença apresenta a forma aguda, e a
crônica, a partir de 120 dias do início do ciclo. A forma aguda
se caracteriza por diarreias sanguinolentas, e a fase crônica
pode apresentar a forma hepatoesplênica, que pode causar
cirrose, aumento do fígado e baço; em situações
descompensadas, ascite. Pode causar também hipertensão
porta, com o aparecimento de varizes esofágicas que podem
provocar hemorragia digestiva alta, além de anemia.
Diagnóstico Diferencial
• O diagnóstico diferencial deve considerar critérios
clínicos e epidemiológicos.
• Parasitoses podem se confundir com infecções
por vírus e bactérias, sobretudo devido à diarreia
aguda e sintomas gastrointestinais semelhantes.
• A etiologia varia conforme território, saneamento
básico e meios de transmissão (água, alimentos,
animais, contato interpessoal).
• Estudo em hospital universitário de São Paulo
revelou:
o Bactérias como principais agentes
(especialmente E. coli e Clostridium);
o Vírus (com destaque para rotavírus) em
segundo lugar, isoladamente ou associados
às bactérias;
o Parasitas, em menor proporção.
• A avaliação clínica deve incluir exame físico
detalhado e análise do estado de hidratação,
especialmente em crianças e idosos.
• A maioria das diarreias virais e bacterianas
é autolimitada e tratável com hidratação
oral e orientação alimentar.
• Casos graves exigem hidratação venosa e, quando
necessário, antibióticos, principalmente nas
infecções bacterianas.
Principais agentes etiológicos e formas de transmissão
para diagnóstico diferencial em diarreias agudas
Prevenção
Um plano de tratamento periódico, somado às medidas de
higiene e saneamento básico nas populações vulneráveis, em
longo prazo, é importante para a diminuição da prevalência
das parasitoses intestinais nestas comunidades. O mesmo não
se aplica aos casos de baixa vulnerabilidade, que devem ser
avaliados conforme anamnese, exame físico e exames
complementares, quando indicados.
Prevenção Primária
Envolve medidas de saneamento básico, armazenamento e
coleta de lixo adequada, higiene pessoal, de animais
domésticos e de alimentos, além de medidas de educação
para a saúde.
Prevenção secundária e terciária
Inclui programa de desparasitação periódica para populações
vulneráveis, tendo em vista a alta prevalência de
enteroparasitoses nestas populações. Os dois tipos de
prevenção se somam, pois nas populações vulneráveis são
mais custo-efetivos; além disso, tratar o grupo periodicamente
traz mais benefícios do que riscos para os indivíduos não
contaminados, sem a necessidade de diagnóstico laboratorial
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
123
para tratar somente os casos. Além disso, os indivíduos com
desnutrição e déficit no desenvolvimento se beneficiarão com
o tratamento, caso estejam com enteroparasitose.
Quimioterapia preventiva
Indicada para as HTSs. A OMS defende uma estratégia de
controle global contra helmintíases mais prevalentes,
enfatizando a quimioterapia preventiva voltada para
comunidades de alto risco, em combinação com educação em
saúde e melhoria de saneamento sempre que os recursos
permitirem.
A OMS/OPAS, com apoio do CDC, recomenda desparasitação
periódica (deworming) em crianças em idade escolar,
especialmente na América Latina e Caribe.
Objetivo: reduzir a prevalência de helmintíases transmitidas
pelo solo (HTSs) de >50% para 50% → tratar todas as crianças duas
vezes ao ano.
• Prevalência entre 20% e 50% → tratar uma vez ao
ano.
Medicamentos em dose única:
• Mebendazol 500 mg: todas as idades.
• Albendazol 200 mg: crianças de 12 a 23 meses.
• Albendazol 400 mg: crianças com mais de 23 meses.
Prevenção Quaternária
Deve-se evitar uso excessivo e desnecessário de
medicamento em populações que não pertençam àquelas
cujos condicionantes para as enteroparasitoses se façam
presentes, bem como evitar realização excessiva de exames
para diagnóstico e confirmação de tratamento nas populações
vulneráveis, cujas prevalências dasenteroparasitoses são
altas.
Tratamento
A infecção por enteroparasitas é mais comum em crianças que
frequentam creches e vivem em áreas com saneamento
básico precário.
A abordagem deve incluir:
• Educação em saúde, com foco em hábitos de higiene.
• Tratamento antiparasitário periódico, mesmo sem
confirmação laboratorial (exame
coproparasitológico), visando controle da
transmissão e reinfecção.
O tratamento empírico é considerado seguro e mais
econômico. É recomendado a partir dos 2 anos de idade, pois
a segurança e dosagem dos antiparasitários não estão
estabelecidas para menores de 2 anos, exigindo avaliação
individual.
Fármaco de escolha em ausência de dados locais: preferir
antiparasitário de amplo espectro.
Albendazol (uso a cada 4 meses): cobre ascaridíase,
enterobíase, ancilostomíase, estrongiloidíase e giardíase,
embora não seja a primeira escolha para giardíase,
principalmente se for avaliada sua baixa eficácia 21 dias após
o tratamento; porém é a opção mais abrangente (no caso de
se usar uma única medicação) visando ao controle das
parasitoses mais prevalentes em geral.
• Alta prevalência de giardíase: considerar associação
com tinidazol ou metronidazol.
Objetivo: controle individual e redução da prevalência
comunitária.
Efeitos adversos comuns e geralmente transitórios: gosto
metálico, náuseas, epigastralgia, cefaleia, tonturas e urticária.
Medicamentos com mais efeitos colaterais: imidazólicos,
cloroquina e praziquantel.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
124
Bibliografia
GUSSO, Gustavo; LOPES, José M C.; DIAS, Lêda C. Tratado de
medicina de família e comunidade - 2 volumes: princípios,
formação e prática. 2. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2019. E-
book. p.1495. ISBN 9788582715369. Disponível em:
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9788
582715369/. Acesso em: 06 jun. 2025.
SEMANA 17: ABORDAGEM
DAS INFECÇÕES DAS VIAS
AÉREAS SUPERIORES,
RESFRIADO COMUM E GRIPE
NA APS – DATA:
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
• .
Objetivos Específicos
• .
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
125
SEMANA 18: POLÍTICA
NACIONAL DE ATENÇÃO
INTEGRAL À SAÚDE DA
MULHER (PNAISM) – DATA:
21/04/2025
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
• Reconhecer Climatério e menopausa.
Objetivos Específicos
• Compreender os conceitos e discutir as mudanças
hormonais do climatério e menopausa.
• Reconhecer os aspectos clínicos e a abordagem da
mulher no climatério na APS.
• Compreender as condutas propostas, seus riscos e
benefícios.
• Identificar terapias alternativas.
Climatério e Menopausa
O climatério é definido pela Organização Mundial da Saúde
como uma fase biológica da vida e não como um processo
patológico. Com a expectativa de vida das mulheres chegando
aos 80 anos em vários países, calcula-se que, atualmente,
elas passem cerca de um terço de suas vidas no climatério.
O espectro clínico do climatério é amplo, incluindo desde
mulheres assintomáticas até aquelas com múltiplos sintomas.
A abordagem integral da mulher é indispensável, e
ferramentas como o método clínico centrado na pessoa e o
autocuidado apoiado devem ser incluídas na prática do
médico de família e comunidade. O atendimento individual
deve incluir o entendimento da sintomatologia, do momento
de vida, do contexto familiar e ocupacional da mulher, além da
pesquisa da presença de fatores de risco para doenças
comuns neste período.
Todas as mulheres nesse período de suas vidas devem ser
questionadas e receber orientação sobre as opções de
manejo dos sintomas indesejáveis. Além disso, devem receber
aconselhamento sobre os benefícios esperados e os riscos
potenciais do manejo escolhido no plano conjunto de
cuidados. Tradicionalmente, o climatério é dividido em pré e
pós-menopáusico.
A menopausa é definida por 12 meses de amenorreia após o
último período menstrual. Reflete uma depleção folicular
completa ou quase completa e deficiência extrema da
secreção ovariana de estrogênio. A menopausa ocorre em
torno dos 50 anos de idade e corresponde à data da última
menstruação em consequência da falência ovariana. Seu
diagnóstico é retrospectivo, após 12 meses de amenorreia. A
menopausa é classificada como natural ou artificial
(iatrogênica) e como precoce (antes dos 40 anos) ou tardia
(após os 55 anos).
A nomenclatura para as diferentes fases deste período foi
uniformizada pelo STRAW:
A transição menopáusica começa com variações na duração
do ciclo menstrual e elevação do FSH sérico e termina com o
último período menstrual, que só é reconhecido após 12
meses de amenorreia.
• Estágio –2 (precoce): é caracterizado por uma
duração variável do ciclo (com mais de 7 dias de
diferença da duração normal, que é de 21 a 35 dias).
FSH elevado.
• Estágio –1 (tardio): é caracterizado pela falha de
dois ou mais ciclos e um intervalo de amenorreia ≥
60 dias, sendo este um período no qual os fogachos
são comuns. FSH elevado.
• Perimenopausa: começa no estágio –2 da transição
menopáusica e termina 12 meses após o último
período menstrual. FSH elevado.
• Pós-menopausa divide-se em dois estágios:
o Estágio +1 (precoce): compreende os
primeiros 5 a 8 anos após a última
menstruação. É caracterizado por
decréscimo adicional e completo da função
ovariana e perda óssea acelerada, com
persistência frequente dos fogachos. FSH
elevado.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
126
o Estágio +2 (tardio): começa 5 a 8 anos
após o último período menstrual e termina
com a morte. FSH elevado.
Entre mulheres que apresentam sintomas vasomotores
frequentes (ou seja, fogachos e/ou sudorese noturna em 6 ou
mais dias nas últimas 2 semanas), observou-se que:
• Esses sintomas duram, em média, 7,4 anos no total.
• Mesmo após a menopausa, os sintomas ainda
persistem por cerca de 4,5 anos.
• A duração pode ser ainda maior em mulheres afro-
americanas, conforme mostram os estudos.
• Fatores emocionais e psicológicos, como: ansiedade,
estresse percebido e sintomas depressivos
estão associados à maior intensidade e duração dos
sintomas.
Manifestações Clínicas
Deve-se suspeitar de que uma mulher está no climatério
quando estiver na faixa dos 45-50 anos. Pode ser
assintomática ou buscar assistência por motivos não
relacionados ao climatério.
Quando sintomática, mais frequentemente se apresenta com
irregularidade menstrual, fogachos, alterações de humor,
distúrbios do sono e/ou outros sintomas inespecíficos.
Sintomas da Síndrome Urogenital (SUG) do climatério podem
estar presentes, como:
• Ressecamento vaginal e incontinência urinária;
• Ardor, prurido e dor na relação sexual (dispareunia);
• Urgência miccional e infecções urinárias recorrentes;
• Diminuição da lubrificação e da elasticidade vaginal;
• Redução da libido (pode estar relacionada ou não à
SUG).
Diagnóstico
Anamnese
É fundamental uma abordagem integral e multidisciplinar. A
atenção à mulher precisa abranger promoção da saúde,
prevenção de doenças, assistência aos sintomas
apresentados e manejo de possíveis dificuldades
apresentadas nessa fase da vida.
Principais queixas apresentadas:
• Fogachos
• Irritabilidade
• Alterações no padrão do sono
• Artralgias/mialgias
• Palpitações
• Diminuição da memória e do interesse pelas
atividades de rotina
• Diminuição da libido, dispareunia e sintomas
geniturinários (estes últimos devem ter sua presença
questionada, uma vez que ocasionalmente não se
apresentam como queixas iniciais da mulher, e
muitas questões deixando de ser feitas por vergonha
ou falta de informação).
A idade da menarca e a data da última menstruação são
importantes, assim como a presença de irregularidades
menstruais. Também é ocasião propícia para investigar o
método contraceptivo utilizado e exposição sexual de risco.
Antecedentes pessoais, situações familiares, alterações
menstruais, sexuais, dados obstétricos e orientaçãosexual da
mulher auxiliam no entendimento do momento vivenciado. Nos
antecedentes familiares, a investigação sobre a ocorrência de
doenças crônico-degenerativas, assim como de neoplasias
(mama, útero, ovários ou outros), indica a necessidade de
maior atenção quanto à investigação de tais patologias.
Dados sobre o trato gastrintestinal e ocorrência de sintomas
urinários, como infecções ou incontinência, são muito
importantes.
Na história social é imprescindível investigar os hábitos
alimentares, atividades físicas, existência de patologias e uso
de medicações. Nunca deve ser esquecida a presença de
fatores de risco, como fumo e álcool em excesso.
Exame Físico
Antropometria
A verificação do peso e da altura, para cálculo do índice de
massa corpórea (IMC), e a medida da circunferência
abdominal demonstram a necessidade de maior atenção com
a nutrição.
Pressão Arterial (PA)
A aferição da PA é uma oportunidade para rastreamento de
alterações: dependendo da sintomatologia, será importante
como abordagem investigativa diferencial.
Ausculta
Ausculta cardíaca e pulmonar.
Palpação
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
127
Palpação da tireoide, do abdome. Também pode ser útil a
avaliação das mamas, axilas e cadeia ganglionar.
A palpação abdominal e da pelve é direcionada à investigação
de anormalidades na parede e na cavidade, como dor ou
alterações nas características dos órgãos.
Inspeção
Observação dos membros inferiores. Deve-se proceder à
inspeção da vulva, com atenção para alterações do trofismo,
coloração ou adelgaçamento da pele e mucosa.
Na inspeção dinâmica, são comuns as distopias com
prolapsos genitais, sendo um bom momento para indicar
avaliação cirúrgica e/ou orientação da necessidade de
exercícios para melhora da tonicidade muscular da pelve.
Exame Especular
A avaliação da rugosidade da mucosa e da lubrificação do colo
e da vagina pode refletir a situação hormonal e indicar
necessidade de tratamento para melhorar o trofismo da
mucosa, para diminuir o desconforto urogenital ao coito e em
relação à predisposição a infecções.
Importante
Pode haver necessidade de estrogenização previamente à
coleta do exame citopatológico do colo uterino, tanto por
dificuldades na coleta quanto por prejuízo da amostra prévia
por atrofia e por colpite atrófica. Nesta situação, indica-se
creme vaginal de estriol 0,1% por 1 a 3 meses, o qual deve
ser utilizado por 21 dias seguidos com pausa de 7 dias, ou 2
vezes por semana, com pausa 48 horas antes da coleta. Por
se qualificar como mínima a absorção sistêmica do estrogênio
tópico, o Ministério da Saúde não considera que exista
contraindicação em caso de história de câncer de mama,
exceto em mulheres que utilizam inibidores da aromatase.
Exames Complementares
Na maioria das vezes, as dosagens hormonais são
desnecessárias, sendo o diagnóstico do climatério
essencialmente clínico.
Dosagem do FSH
Quando a menopausa for cirúrgica ou houver dúvida em
relação à situação hormonal, a dosagem do FSH é suficiente
para o diagnóstico de hipofunção/falência ovariana quando o
resultado for maior do que 40 mUI/mL.
Papel da equipe multiprofissional
Enfermeiro(a)/médico(a) e outros profissionais de nível
superior de acordo com as atribuições das categorias
• Cuidados não farmacológicos das queixas no
climatério.
• Práticas integrativas e complementares, em especial
a fitoterapia:
o Alguns fitoterápicos podem auxiliar no alívio
dos sintomas presentes no climatério,
particularmente os fogachos – alteração
transitória que pode comprometer a
qualidade de vida das mulheres nesse
período.
o Entre os fitoterápicos presentes na Relação
Nacional de Medicamentos Essenciais
(Rename), o único que está associado ao
tratamento dos sintomas do climatério é a
isoflavona da soja.
• Abordagem motivacional quanto ao estilo de vida
saudável (alimentação, atividade física, higiene do
sono) e elaboração de novos projetos e objetivos
para essa nova fase da vida.
• Atenção às redes de apoio social e familiar, relações
conflituosas e situações de violência.
• Realizar ações de prevenção de forma
individualizada, em especial quanto a doenças
crônico-degenerativas cardiovasculares, metabólicas
e neoplásicas, de acordo com faixa etária, história,
fatores de risco e comorbidades:
o Não há indicação da realização de exames
de rotina no climatério, eles devem ser
orientados de forma individualizada,
quando necessário.
o Não está indicado o rastreamento universal
da osteoporose com realização de
densitometria óssea.
Médico
• Terapias não hormonal e hormonal – em casos
selecionados.
• Avaliação de necessidade, indicações,
contraindicações absolutas e relativas.
• Uso racional de medicamentos.
• Acompanhamento clínico periódico das mulheres em
uso de terapia farmacológica, sobretudo a hormonal.
Equipe multiprofissional
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
128
Realizar orientação individual e coletiva para as mulheres
acerca de:
• Ressignificação do climatério:
o Abordar a vivência da mulher nessa fase, do
ponto de vista biopsicossocial. Enfatizar
que, como nas demais fases da vida, esta
também pode ser experimentada de forma
saudável, produtiva e feliz.
o Incentivar e promover a troca de
experiências entre as mulheres e a
realização de atividades prazerosas, de
lazer, de trabalho, de aprendizagem, de
convivência em grupo, de acordo com os
desejos, necessidades e oportunidades das
mulheres e coletivos.
• Queixas do climatério.
• Exercícios da musculatura perineal.
• Alimentação saudável.
o Estimular a alimentação rica em vitamina D
e em cálcio, por meio do consumo de leite,
iogurte, queijos (principais fontes), couve,
agrião, espinafre, taioba, brócolis, repolho,
sardinha e castanhas.
• Manutenção do peso normal.
• Prática de atividade física:
o Orientar a prática de 150 minutos de
atividade aeróbica de intensidade
moderada/semana (sejam ocupacionais ou
de lazer), sendo ao menos 10 minutos de
atividades físicas de forma contínua por
período.
o Promover a realização de atividades de
fortalecimento muscular duas ou mais vezes
por semana, além de práticas corporais que
envolvem lazer, relaxamento, coordenação
motora, manutenção do equilíbrio e
socialização, diariamente ou sempre que
possível.
• Alterações e medidas de promoção à saúde bucal.
• Infecções sexualmente transmissíveis, HIV, hepatites.
• Transtornos psicossociais.
• Prevenção primária da osteoporose e prevenção de
quedas:
o Informar sobre a prevenção primária da
osteoporose e o risco de fraturas
associadas.
o Orientar dieta rica em cálcio (1.200 mg/dia)
e vitamina D (800-1.000 mg/dia).
• Aconselhar exposição solar, sem fotoproteção, por
pelo menos 15 minutos, diariamente, antes das 10h
ou após as 16h.
o A suplementação de cálcio e vitamina D só
está recomendada se não houver aporte
dietético adequado desses elementos e/ou
exposição à luz solar.
o Recomendar exercícios físicos regulares
para fortalecimento muscular e ósseo,
melhora do equilíbrio e da flexibilidade.
o Aconselhar a cessação do tabagismo e a
redução do consumo de bebidas alcoólicas
e de cafeína.
o Avaliar fatores de risco para quedas:
ambiência doméstica, uso de psicotrópicos,
dosagem de medicamentos anti-
hipertensivos, distúrbios visuais e auditivos.
Conduta
As pacientes que apresentam sintomas vasomotores leves
devem ser orientadas quanto a mudanças de estilo de vida,
não sendo indicado inicialmente o tratamento farmacológico.
Resfriar o ambiente, vestir-se atenta ao clima, tomar banhos
frequentes, dieta saudável e controle do peso, prática de
exercícios físicos regulares e cessação do tabagismo podem
melhorar os sintomas de boa parcela das mulheres.
Terapia Hormonal (TH)
A TH permanece o tratamento mais eficaz para os sintomas
vasomotores (SVMs) e para a síndrome genitourinária da
menopausa (SGM) e, além disso, demonstrouprevenir a perda
e fratura óssea. Os riscos da TH diferem dependendo do tipo,
dose, duração do uso, via de administração, momento da
iniciação, bem como se um progestogênio é usado.
O tratamento deve ser individualizado para identificar o tipo
de TH, a dose, a formulação, a via de administração e duração
do uso, empregando a melhor evidência disponível para
maximizar os benefícios e minimizar os riscos, com reavaliação
periódica sobre continuar ou interromper a TH.
O conceito mais apropriado é a “dose, duração, regime e via
apropriada de administração”. Dado o perfil de segurança
mais favorável do estrogênio sozinho, durações mais longas
podem ser mais apropriadas. Estratificação de risco por idade
e tempo desde a menopausa é recomendada.
As doses transdérmicas ou menores de TH podem diminuir o
risco de tromboembolia venosa e acidentes vasculares
cerebrais.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
129
Para as mulheres com idade inferior a 60 anos ou que estão
dentro de 10 anos do início da menopausa e não têm contra-
indicações, a relação risco-benefício é mais favorável para o
tratamento dos SVMs incômodos e para aqueles com alto risco
de perda ou fratura óssea.
Mulheres que iniciam TH mais de 10 ou 20 anos após o início
da menopausa ou têm 60 anos ou mais apresentam maiores
riscos absolutos de doença cardíaca coronária, acidente
vascular cerebral (AVC), tromboembolia venosa e demência.
O início do tratamento neste grupo etário mais idoso deve,
consequentemente, ser abordado com cautela, embora uma
discussão sobre os benefícios e os riscos da TH em mulheres
mais velhas possa ser considerada para aquelas que optam
por iniciá-la ou reiniciá-la. Maiores durações da terapia devem
ser para indicações documentadas, como SVM persistente ou
perda óssea, com tomada de decisão compartilhada e
reavaliação periódica.
Para sintomas genitais de SGM não aliviados com medidas
conservadoras ou para quando sintomas genitourinários
isolados são causados pela menopausa, baixa dose de terapia
estrogênica (TE) tópica vaginal é recomendada sobre a TE
sistêmica como primeira escolha de tratamento.
Com a interrupção da TH, praticamente todas as mulheres
perderão densidade mineral óssea, com risco aumentado de
fraturas ósseas e excesso de mortalidade por fratura do
quadril. Além disso, não há evidências para apoiar a
interrupção de rotina da TH após a idade de 65 anos.
As decisões sobre uma duração mais longa da terapia devem
ser individualizadas e consideradas para indicações como
SVMs persistentes ou perda óssea, com tomada de decisão
compartilhada, documentação e reavaliação periódica. E os
riscos de um uso prolongado de TH podem ser minimizados
com o uso de doses mais baixas de estrogênio e
progestogênios, o uso de terapias transdérmicas para evitar
o efeito de primeira passagem hepática, ou a combinação de
estrogênio conjugado com o bazedoxifeno, que fornece
proteção endometrial sem necessidade de progesterona.
A TH pode ser inadequada para algumas mulheres, incluindo
aquelas com maior risco de doença cardiovascular, aumento
do risco de doença tromboembólica ou risco aumentado de
alguns tipos de câncer (câncer de mama, em mulheres com
útero). O risco de câncer de endométrio em mulheres com
útero que usam TH somente com estrogênio está bem
documentado.
TH não é indicada para a prevenção primária ou secundária
de doenças cardiovasculares ou demência, nem para a
prevenção da deterioração da função cognitiva em mulheres
pós-menopáusicas. Embora a TH seja considerada eficaz para
a prevenção da osteoporose pós-menopáusica, geralmente é
recomendada como opção apenas para mulheres com risco
significativo, para as quais as terapias não estrogênicas não
são adequadas.
Mulheres com insuficiência ovariana prematura (IOP), com
menopausa cirúrgica ou natural precoce têm maiores riscos
de perda óssea, doença cardíaca e demência ou distúrbios
afetivos associados à deficiência de estrogênio. Em estudos
observacionais, esse risco parece aproximar-se do normal se
TE é administrada até a idade mediana da menopausa,
momento em que as decisões de tratamento devem ser
reavaliadas.
Continuar a terapia permanece uma decisão individual em
mulheres selecionadas e bem aconselhadas com mais de 60
ou 65 anos. Não há dados para apoiar a interrupção da rotina
em mulheres com idade de 65 anos.
Apesar de existirem alternativas terapêuticas para o alívio de
SVMs, nenhuma tem se mostrado tão efetiva quanto o
estrogênio. O progestagênio sempre deve ser acrescentado
em mulheres que não são histerectomizadas. A
individualização com tomada de decisão compartilhada é
essencial, com reavaliação periódica para determinar um perfil
individual de risco-benefício para a mulher.
Benefícios da TH
Podem incluir alívio de SVMs incômodos, prevenção da perda
óssea para mulheres com alto risco de fratura, tratamento de
SGM e melhora do sono, bem-estar ou qualidade de vida.
Riscos atribuíveis absolutos
• Mulheres na faixa etária de 50 a 59 anos ou dentro
de 10 anos do início da menopausa: os riscos são
baixos.
• Mulheres a partir de 60 anos de idade com mais de
10 anos do aparecimento da menopausa: riscos
parecem ser maiores, particularmente para aquelas
idosas de 70 anos ou mais ou que estão com mais
de 20 anos de início da menopausa.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
130
Atrofia Urogenital
Estrogenioterapia tópica vaginal
Indicação: mulheres com sintomas exclusivamente urogenitais
(ex.: vaginite atrófica, síndrome uretral, incontinência
urinária).
Fármacos recomendados:
• Estriol ou promestriene: 2 cc (2 mL) do creme, 1–
2x/semana.
• Estrogênios equinos conjugados: indicado em casos
de atrofia intensa e necessidade de resposta rápida
(1–2 cc, 1–2x/semana).
Cuidados: risco de efeitos sistêmicos, como:
• Mastalgia
• Alterações endometriais (em mulheres idosas ou
sensíveis)
Evidências (Revisão Cochrane, 2016):
• Sem diferença de eficácia entre preparações
estrogênicas intravaginais.
• Comparado ao placebo: melhora dos sintomas de
atrofia vaginal.
• Espessamento endometrial: associado ao uso de
creme (possivelmente pela dose mais alta), em
comparação ao anel.
• Eventos adversos: sem diferenças relevantes entre
os tipos de preparações ou com placebo.
Tibolona
• Descrição: esteroide sintético com ação estrogênica,
androgênica e progestogênica.
• Indicação: tratamento dos sintomas
vasomotores e preservação da densidade mineral
óssea.
• Dose usual: 2,5 mg/dia.
Comparação com TH combinada:
• Menor eficácia no alívio dos sintomas da menopausa.
• Menor incidência de sangramento vaginal.
Segurança a longo prazo:
• Contraindicada em mulheres com histórico de câncer
de mama – aumenta o risco de recorrência.
• Maior risco de AVC em mulheres > 60 anos.
Contraindicações a TH
História de câncer de mama, câncer de endométrio,
sangramento genital não esclarecido, doença arterial
coronariana, porfiria, antecedentes de doença
tromboembólica ou AVC, doença hepática em atividade ou
aquelas pacientes de alto risco para o desenvolvimento de tais
complicações. Em mulheres saudáveis, o risco de um evento
adverso é baixo, sendo seguro para a maioria das pacientes.
Riscos e Benefícios
Em relação ao tromboembolia venosa, estudos observacionais
mostram que a terapia estrogênica aumenta o seu risco. Em
estudo realizado com aproximadamente 16.000 mulheres
mostrou que o regime combinado aumentou o risco de doença
arterial coronariana, câncer de mama, AVC e tromboembolia
venosa. O estudo também encontrou um risco diminuído de
câncer colorretal, fraturas de quadril e fraturas em geral com
TH combinada.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
131
Outro estudo apenas com estrogênio conjugado, em mulheres
sem útero, mostrou que aquelas que tomavam apenas
estrogênio não apresentaram alteração significativa no risco
de doença coronariana ou câncer de mama e,semelhante ao
estudo de estrogênio combinado e progesterona, aumento de
AVC e tromboembolia venosa.
Uma revisão de ambos os estudos, após um acompanhamento
médio de 13 anos, revelou que as mulheres em terapia
hormonal combinada tiveram aumento significativo no risco de
câncer de mama e tromboembolia venosa, e uma redução na
fração de fratura do quadril.
Em contraste, as mulheres que tomavam apenas estrogênio
tinham um risco reduzido de câncer de mama. A “hipótese do
tempo” sugere que a terapia hormonal no começo da
menopausa (em comparação com o início 10 anos ou mais
após o começo da menopausa) pode ser cardioprotetora
devido à aparente habilidade do estrogênio em diminuir a
progressão da aterosclerose em mulheres mais jovens. A TH
não deve ser iniciada, contudo, para prevenção de doença.
Quanto ao diabetes tipo 2 (DM2), o National Institute for
Health and Care Excellence (NICE) indica que se explique à
mulher que o uso de TH não está associado com aumento do
risco de desenvolver diabetes, e a NAMS destaca que a TH
reduz a incidência de DM2, mas que não está indicada para
esse propósito.
Terapia não hormonal para o tratamento dos sintomas
vasomotores do climatério
Existem tratamentos alternativos para as mulheres que não
desejam ou não podem usar hormônios.
Para mulheres com ondas de calor moderadas a severas
ocorrendo durante o dia e a noite, sugerem-se terapias não
hormonais, tais como:
• ISRN, ISRS ou gabapentina.
Para mulheres com sintomas moderados a graves e
predominantemente diurnos, sugere-se:
• Paroxetina ou citalopram como medicamentos de
primeira escolha.
Para mulheres com sintomas predominantemente noturnos,
sugere-se:
• Gabapentina (B): normalmente, usa-se uma dose
única para dormir (300 mg, ou até mesmo 100 mg,
se necessário, titulando até 900 mg, de acordo com
o alívio dos sintomas ou efeitos colaterais), o que
aproveita o efeito sedativo da gabapentina e
minimiza a sedação diurna.
OBS.: uma vez que os SVMs diminuem gradualmente sem
terapia na maioria das mulheres pós-menopáusicas, o
medicamento pode ser diminuído gradualmente após 1 a 2
anos de administração. As pacientes devem ser instruídas em
como diminuir os SSRIs e SNRIs para evitar sintomas de
abstinência.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
132
Para as mulheres em uso de tamoxifeno por qualquer
indicação, sugere-se:
• Citalopram, escitalopram ou venlafaxina para tratar
ondas de calor, pois apresentam efeitos mínimos
para bloquear a CYP2D6.
• Outra opção, com menor eficácia, é a clonidina
(podendo ser considerada no caso de pacientes
hipertensas).
• Quanto à sulpirida, não há evidências suficientes que
sustentem sua utilização.
Terapias Alternativas e Complementares
Saúde da mulher no climatério
Do ponto de vista populacional, é recomendado o
rastreamento de câncer de colo uterino e de mama. Há
destaque para a falta de evidências de rastreamento de
neoplasias de endométrio e de ovário e, também, para a
necessidade de se evitar o uso indiscriminado da
densitometria óssea.
Avaliação Endometrial
É indicada ultrassonografia transvaginal para avaliação
endometrial nas seguintes situações: mulheres, mesmo
assintomáticas, utilizando TH, moduladores seletivos dos
receptores de estrogênios (SERMs), tibolona, fitoterápicos e
qualquer outro tratamento que apresente ação estrogênica.
• É considerada normal na fase pós-menopáusica uma
espessura endometrial de até 5 mm (e até 8 mm nas
mulheres usuárias de TH).
• Nos casos de espessamento, é mandatória a
investigação por histeroscopia e biópsia endometrial.
É muito importante uma avaliação endometrial adequada
antes do início da TH, garantindo que um possível
sangramento irregular no início do tratamento não seja
atribuído à patologia orgânica.
Contracepção no Climatério
Gravidez é possível na perimenopausa → orientar
contracepção até:
• Ausência de menstruação por 12
meses consecutivos, ou
• FSH em níveis pós-menopausa.
Todos os métodos anticoncepcionais podem ser usados,
desde que:
• Não haja contraindicações clínicas individuais;
• Avaliem-se riscos e benefícios conforme o perfil da
paciente.
Métodos hormonais:
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
133
• Podem mascarar o diagnóstico de menopausa;
• TH deve ser iniciada após suspensão dos
anticoncepcionais hormonais.
Dupla proteção é recomendada:
• Uso de preservativo (masculino ou feminino)
associado a outro método contraceptivo (hormonal
ou não hormonal).
Quando Referenciar
Bibliografia
GUSSO, Gustavo; LOPES, José M C.; DIAS, Lêda C. Tratado de
medicina de família e comunidade - 2 volumes: princípios,
formação e prática. 2. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2019. E-
book. p.1154. ISBN 9788582715369. Disponível em:
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9788
582715369/. Acesso em: 18 mai. 2025.
SEMANA 19: DIAGNÓSTICO E
ACOMPANHAMENTO DO
CORRIMENTO
VAGINAL/URETRAL – DATA:
Objetivos da Semana
Objetivo Geral
• .
Objetivos Específicos
• .
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
134Os
benefícios da indução de cetose, que seriam
saciedade maior e bem-estar, não são comprovados
(B). Além disso, essa dieta por um período longo de
tempo leva à deficiência de micronutrientes, sendo
necessária a suplementação.
• Dieta balanceada: a grande vantagem dessa dieta
é a maior opção de substituição de alimentos, o que
facilita sua manutenção pela diversidade. Com a
escolha correta de alimentos, a dieta balanceada
não necessita de suplementação. Além disso, reduz
o colesterol lipoproteína de baixa densidade (LDL),
os triglicérides e os níveis de PA.
• Dieta pobre em gordura e dieta rica em vegetais:
com baixa quantidade de gorduras, açúcares e
farinhas, reduz o peso em longo prazo, se o balanço
energético for negativo. É importante salientar que
dietas muito pobres em gorduras podem ser
deficientes em vitaminas E, B12 e zinco.
• Substituição de refeições: substituir refeições por
shakes, barras de cereais ou sopas pode ser uma
estratégia interessante para perda de peso inicial ou
quando o objetivo individual é a redução de pouco
peso. Não há evidências de tratamentos por
grandes períodos de tempo (mais de cinco anos).
Atividade Física
O exercício físico promove benefícios antropométricos,
metabólicos, neuromusculares e psicológicos ao indivíduo
obeso. Quando realizado de forma regular, melhora a
resistência cardiorrespiratória, o perfil lipídico, o bem-estar
geral, a energia, promove a elevação da sensibilidade dos
tecidos à insulina, auxilia no controle do DM2, reduz riscos
cardiovasculares, mesmo quando não ocorre perda de peso.
Autoestima, imagem corporal, humor, redução da ansiedade
e depressão também são alterados de forma positiva.
O paciente deve ser estimulado a uma vida mais ativa,
reduzindo o tempo total gasto em atividades sedentárias e
intercalando sessões curtas de atividade física entre períodos
de atividade sedentária, independentemente do seu hábito
de exercício físico. A recomendação atual é a prática de
exercícios físicos de, no mínimo, 150 minutos de exercícios
moderados por semana para a manutenção do peso e da
saúde e mais de 150 minutos por semana para promover o
emagrecimento e evitar a recuperação do peso. Há uma
relação entre dose e resposta, ou seja, quanto maior a
duração, a frequência e a intensidade, maiores serão os
benefícios.
Tanto as sessões contínuas quanto múltiplas sessões de pelo
menos 10 minutos são aceitáveis para acumular a
quantidade desejada de exercício físico diário. Para os
indivíduos com níveis muito elevados de IMC, em função da
dificuldade da execução de exercícios físicos, estas metas
menores podem ser benéficas para a saúde, mesmo que não
apresentem impacto sobre o peso.
O hábito da prática de exercícios físicos deve ser gradual, e
o médico de família pode motivar o paciente auxiliando-o a
planejar sua atividade física.
Tratamento Comportamental
Baseia-se em análise e modificações de comportamentos
disfuncionais associados ao estilo de vida da pessoa. O
objetivo é implementar estratégias que auxiliem no controle
do peso, reforçando a motivação e ajudando a evitar a
recaída. As técnicas enfatizam a busca e a experimentação
de soluções que levem em conta as características do
indivíduo e estimulem mudanças globais em outras esferas
do comportamento, como aumento da autoestima, melhor
qualidade de relacionamentos, gerenciamento do estresse
associado à rotina de trabalho, atividade física, sono e lazer.
As principais técnicas comportamentais utilizadas são:
• Automonitoramento: registro por escrito realizado
pela própria pessoa sobre o tipo e a quantidade dos
alimentos ingeridos, incluindo horários, episódios
compulsivos, fatores desencadeantes, pensamentos
e sentimentos relacionados. Esses registros são
úteis para planejar mudanças na dieta e nas
atividades diárias para enfrentar as compulsões
alimentares. Além disso, quando associados ao
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
10
registro dos pensamentos e sentimentos
relacionados aos alimentos ingeridos, os registros
podem ser utilizados para identificar os
pensamentos disfuncionais e promover uma
reestruturação cognitiva.
• Controle dos estímulos: planejamento de
estratégias que favoreçam a modificação de
comportamentos disfuncionais. Exemplos da
aplicação dessas estratégias são planejar as
compras de alimentos, evitando ou reduzindo a
compra de itens que possam atrapalhar a dieta,
como doces, pães e bolos; aumentar a atividade
física utilizando escadas e usando menos o
automóvel; planejar atividades novas em horários
habituais de compulsão, evitando as atividades
associadas à compulsão, como comer assistindo à
televisão etc.
• Resolução de problemas: busca identificar
estratégias que auxiliem a resolver os problemas
diários relacionados ao peso e à adesão ao
tratamento. Essas técnicas envolvem desde como
lidar com situações estressantes até como participar
de reuniões com amigos, como festas e jantares. A
pessoa deve ser estimulada a testar e a discutir as
estratégias.
• Reestruturação cognitiva: consiste em identificar
crenças e pensamentos disfuncionais com relação
ao peso e à alimentação. Uma vez identificados os
pensamentos disfuncionais, deve-se questioná-los
para auxiliar a pessoa a examiná-los e reformulá-los
em uma base mais realista. Os pensamentos e
crenças costumam ser explorados por meio da
contestação dos pensamentos, verificando quais as
evidências os corroboram ou não. Essa técnica
remete ao questionamento socrático. A contestação
do pensamento busca estimular o exame, a
ponderação, a avaliação e a síntese de diversas
fontes de informação, objetivando uma avaliação
independente e racional dos problemas e de suas
soluções. Não se costuma corrigir respostas, pois,
em geral, não há “certo” e “errado”. Quando bem
utilizada, tem forte impacto sobre a organização
cognitiva da pessoa, mas é um processo que requer
paciência e tempo. Alguns exemplos de
pensamentos disfuncionais comumente
encontrados no obeso são:
1. Abstração seletiva: prestar atenção e dar mais
valor a informações que confirmem as suas
superstições, como, por exemplo: “Ter comido
este doce indica que eu não sou capaz de
exercer controle sobre o meu comportamento
alimentar e não tenho poder sobre a comida”.
2. Pensamento dicotômico: pensar em termos
extremos: “Ou eu sigo a dieta perfeitamente e
emagreço rápido ou não faço nada e sou um
fracasso” ou “Os alimentos são proibidos ou
permitidos”.
3. Pensamento supersticioso: acreditar que
existe relação entre situações não relacionadas:
“Se eu for ao shopping sairei da dieta”.
4. Idealizações: almejar resultados que não
dependem necessariamente de emagrecer, por
exemplo: “Acredito que, quando ficar magra,
saberei melhor o que quero”, “Quando ficar
magra, serei mais clara nas minhas relações”.
• Tratamento em grupo ou individual: não há
evidências de benefícios maiores com tratamentos
individuais ou em grupo. Nos tratamentos em
grupos, otimiza-se o suporte social, há maior
número de ensaios comportamentais, podendo ser
testadas, na prática, algumas estratégias para
solução de problemas, como realizar
confraternizações com alimentos pouco calóricos e
exercícios em grupo. Na estratégia de saúde da
família (ESF), em que atividades em grupo são
bastante empregadas, é importante não perder a
perspectiva dos objetivos terapêuticos e utilizar,
sempre que possível, as técnicas comportamentais,
estimulando sempre a realização da
automonitoração. Alguns estudos mostram que o
número de encontros com a equipe de atendimento
apresenta uma correlação positiva com a perda de
peso.
• Benefícios da terapia comportamental: em
estudos controlados, a perda de peso média em
terapia cognitivo-comportamental (TCC) é de 4,7 kg
(0,2-12,9 kg) e se dissipa após 3 anos de
seguimento. Não há evidência de benefícios de uma
técnica comportamental sobre as outras, sendo que
estratégias multimodais sãomais efetivas.
Medicamentos
É importante salientar para a pessoa que os medicamentos
são auxiliares na redução de peso e que seu uso não substitui
a reeducação alimentar associada à atividade física, assim
como a necessidade de visitas regulares à equipe de saúde.
A perda de peso associada à medicação é modesta, em torno
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
11
de 5 kg e não há evidências que comprovem que um fármaco
é mais eficaz que outro.
O uso de medicamentos para emagrecer é bem descrito em
indivíduos maiores de 18 anos e com IMC maior do que 30
kg/m2 ou com IMC entre 25 e 30 kg/m2 e comorbidades. Nas
pessoas com sobrepeso, o uso de medicamento deve ser
analisado individualmente.
Entre os medicamentos mais utilizados, estão:
• Orlistat: Inibidor da lipase gástrica e pancreática,
promove má absorção e reduz a absorção de
gorduras em aproximadamente 30%. Redução
média de peso em 2,7 a 2,9 kg. Não apresenta risco
cardiovascular, podendo ser usado em pacientes
cardiopatas, assim como em crianças obesas acima
de 12 anos como parte do manejo que inclui
educação alimentar, exercício físico, suporte
emocional. Como efeitos colaterais pode provocar
surgimento de gordura nas fezes, flatulência e
diarreia, o que, muitas vezes, faz o paciente
descontinuar o tratamento. Esses efeitos
indesejáveis podem ser controlados pela redução da
gordura na dieta. Dessa forma, tem papel no
treinamento comportamental do manejo da dieta. O
paciente mantém a perda de peso com a
continuidade do uso. Está contraindicado na
gestação e em pacientes com má absorção crônica.
É apresentado em comprimidos de 120 mg, que
devem ser utilizados com as refeições principais três
vezes por dia.
• Liraglutida: é um hipoglicemiante, agonista do
peptídeo 1 similar ao glucagon (GLP-1), que
provoca atraso no esvaziamento gástrico e reduz a
ingesta calórica por ação central. Reduz a glicemia
e hemoglobina glicada, sendo uma boa opção para
o uso em diabéticos, mas também pode ser utilizado
em pessoas não diabéticas, e geralmente não causa
hipoglicemia. A dose inicial é 0,6 mg em dose única
diária em injeção subcutânea. A dose pode ser
aumentada semanalmente até atingir 3 mg (dose
utilizada nos estudos para redução de peso). A
perda ponderal em média varia de 4,2 a 5,9 kg. O
uso em pessoas com pré-diabetes reduziu o
desenvolvimento de diabetes. Os efeitos colaterais
são náusea, vômitos, constipação, hipoglicemia,
diarreia, fadiga, tontura, dor abdominal e aumento
dos níveis de lipase. Tais efeitos colaterais
costumam ser transitórios. Seus principais
inconvenientes são a administração parenteral e o
alto custo.
• Semaglutida: age estimulando a produção de
insulina pelo pâncreas e diminuindo a produção de
glucagon. Com a utilização desse medicamento e
uma dieta saudável com prática de exercício físico,
haverá uma redução dos níveis de glicose na
corrente sanguínea. Pode ser indicada para
pacientes com obesidade (IMC ≥ 30 Kg/m2) ou
excesso de peso (IMC ≥ 27 acom DM na APS;
• Compreender o tratamento medicamentoso e não
medicamentoso da pessoa com DM na APS;
• Abordar a prevenção das complicações do DM na
APS.
Diabetes Mellitus (DM)
DM é uma síndrome caracterizada por hiperglicemia crônica,
resultante de defeitos na ação da insulina, na secreção de
insulina ou em ambas. A classificação proposta pela
Organização Mundial da Saúde e pela Associação Americana
de Diabetes (ADA), e recomendada pela Sociedade Brasileira
de Diabetes (SBD), inclui quatro classes clínicas: DM tipo 1
(DM1), DM tipo 2 (DM2), outros tipos específicos de DM e DM
gestacional (DMG). Há ainda duas condições, referidas como
pré-diabetes, que são a GJ alterada e a tolerância à glicose
diminuída, nomeadas atualmente como risco aumentado de
diabetes.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
15
Dos casos de diabetes melito (DM), 90 a 95% são do tipo 2
(DM2), e, destes, 80% estão relacionados a sobrepeso ou
obesidade. A busca ativa do diagnóstico do DM2 deve ser
orientada pela presença de fatores de risco, uma vez que
muitos indivíduos acometidos podem permanecer
assintomáticos durante muito tempo.
O DM2 é uma doença evolutiva, e, independentemente da
adesão adequada ao tratamento, com o tempo, muitas
pessoas precisarão de terapia combinada com ou sem
insulina. A recomendação terapêutica atual para o DM2 de
diagnóstico recente inclui o uso de metformina. O tratamento
do DM tipo 1 (DM1) é sempre insulinoterapia intensiva.
No plano terapêutico, deve-se enfatizar a diminuição do risco
cardiovascular global por meio de mudanças no estilo de vida
(MEVs), incluindo alimentação, aconselhamento sobre
tabagismo, uso de álcool e outras drogas e atividade física.
A abordagem centrada na pessoa e a participação em grupos
de suporte, reflexão e educação em saúde permitem a livre
expressão, pelos pacientes, de suas dúvidas, escolhas e
desafios em relação ao seu próprio cuidado.
Epidemiologia
Devido ao envelhecimento populacional, à crescente
prevalência de obesidade e ao sedentarismo e à maior
sobrevida dos pacientes, o diabetes está atingindo
proporções epidêmicas em todo o mundo. No Brasil, a
prevalência de DM foi estimada em 7,6%. Segundo dados da
Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças
Crônicas por Inquérito Telefônico realizado pelo Ministério da
Saúde (MS), na população com idade igual ou maior de 18
anos, no conjunto das 27 capitais, a frequência do diagnóstico
médico prévio de diabetes foi de 8,9%, sendo menor entre
homens (7,8%) do que entre mulheres (9,9%) e mais comum
com o avanço da idade para ambos os sexos. Esse percentual
pode ser utilizado pelas equipes da estratégia de saúde da
família para estimar o número de diabéticos do seu território
e comparar com o número de cadastrados, avaliando a
necessidade ou não de intensificar ações de busca ativa do
diagnóstico.
Etiologia
Classificação
Classe Pré
– Clínica
1. Intolerância a glicose.
2. Disglicemia: corresponde à alteração
glicêmica em outros tempos da curva
(exceto tempos 0 e 120 minutos).
Classes
Clínicas
1. DM1: doença autoimune órgão-
específica. Maioria de início na infância
ou na adolescência. Apresentação de
sintomas graves de cetoacidose. Pode
ocorrer em adultos.
2. DM2: doença metabólica, desencadeada
por resistência insulínica, tem evolução
insidiosa, frequentemente com
complicações instaladas já no
diagnóstico.
3. DM secundário a quadro clínico não DM1
e não DM2: uso exógeno de
glicocorticoides, pós pancreatite,
doenças endócrinas (como síndrome de
Cushing ou acromegalia), uso de
medicamentos (como antipsicóticos),
tumores pancreáticos.
4. Diabetes gestacional.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
16
Rastreamento
O U.S. Preventive Services Task Force recomenda
rastreamento apenas para pacientes assintomáticos que
tenham pressão arterial sistólica (PAS) maior do que 135 ou
pressão arterial diastólica (PAD) maior do que 80 mmHg,
ambas sustentadas.
É importante conhecer os critérios clínicos recomendados pela
ADA para orientar o rastreamento:
Critérios para rastreamento do diabetes em adultos
assintomáticos segundo a American Diabetes
Association*
IMC > 25 kg/m2 e
1. Sedentarismo
2. História familiar (1o grau) para diabetes
3. HAS
4. Dislipidemia (triglicérides ≥ 250 mg/dL ou HDL ≤
35 mg/dL)
5. História de DMG ou RN com mais de 4 kg
6. SOP
7. História prévia de alteração do nível glicêmico
8. Acantose nigricante
9. História de DCV
* Na ausência dos critérios anteriores, o rastreamento
deve ser iniciado a partir dos 45 anos.
Indicações para rastreamento de diabete melito tipo 2
em indivíduos assintomáticos, não gestantes, sem
diagnóstico prévio da doença. (Fonte: PCDT DM2 –
Ministério da Saúde)
Indivíduos com idade a partir de 45 anos – Sugestão de
exames anualmente
Indivíduos de qualquer idade com sobrepeso ou obesidade
e pelo menos um dos seguintes fatores de risco:
• Etnia negra, hispânico ou latina, asiática ou
indígena;
• História familiar de DM – Parente de 1º grau com
DM;
• Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS);
• Doença cardiovascular prévia;
• HDL-c 250 mg/dL;
• Síndrome de ovários policísticos;
• Sedentarismo;
• História prévia de diabete melito gestacional
(DMG);
• Pré-diabete;
• Presença de acantose nígricans;
• Apneia obstrutiva do sono;
• Indivíduos vivendo com HIV/AIDS;
• Indivíduos com fibrose cística;
• Indivíduos que realizaram transplante de órgão.
Outras condições associadas à resistência insulínica, como
obesidade grave e acantose nígricans.
Sugestão de exames: Glicemia de Jejum e se valores
normais repetir anualmente. Se alterada, seguir
protocolo.
Crianças ³ 10 anos, ou início da puberdade se ocorrer
antes dos 10 anos
IMC > percentil 85% associado a 1 ou 2 dos seguintes
fatores de risco:
• História familiar de DM2 em parentes de 1º. e 2º.
Grau;
• Sinais de resistência insulínica (acantose
nigricans, ovários policísticos, HDL baixo e/ou TG
alto, pequena para idade gestacional – PIG);
• História materna de DM ou DMG.
Exames e periodicidade: Glicemia de Jejum e se valores
normais repetir anualmente. Se alterada seguir
protocolo.
As seguintes apresentações, contudo, devem levantar a
suspeita de diabetes:
• 4 “P’s”: poliúria, polidpsia, polifagia com perda
ponderal não explicada. A hiperglicemia leva à
glicosúria, que é responsável pelos sintomas
clássicos.
• Cansaço, alteração visual (“visão embaçada”) ou
candidíase genital (vaginite ou balanopostite).
• No DM1, o início geralmente é abrupto, com
emagrecimento rápido e inexplicado, hiperglicemia
grave associada à desidratação, à cetonemia e à
cetonúria.
• A cetoacidose diabética (DM1) e o coma
hiperosmolar não cetótico (DM2) são formas de
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
17
apresentação mais graves, que podem exigir
remoção imediata para unidades de emergência.
Diagnóstico
Critérios Diagnósticos
O diagnóstico de DM é feito de acordo com o valor da GJ,
glicemia casual e glicemia 2 horas pós-sobrecarga de 75 g de
glicose (TOTG). Recentemente, a HbA1c (ou A1C) foi
recomendada como critério diagnóstico devido à correlação
bem estabelecida entre seus níveis e o risco para
complicações tardias do DM. Isso não quer dizer que a HbA1c
deva substituir os critérios por glicemia plasmática, pois,
apesar de ser um exame específico, é menos sensível que os
demais.
• Na presença de sintomas sugestivos, uma glicemia
casual acima de 200 mg/dL confirma o diagnóstico.
• Em indivíduos assintomáticos ou com sintomas leves,
são necessárias duas GJ acima de 126 mg/dL. É
importante orientar o usuário a não mudar sua
alimentação antes da realização dos exames
confirmatórios, a fim de evitar o mascaramento do
diagnóstico.
• Para indivíduos com forte suspeita clínica (presença
de dois ou mais fatoresde risco) de diabetes e GJ
alterada, entre 100 e 126 mg/dL, o TOTG está
indicado para complementar a investigação.
• Em algumas raras situações, em especial em adultos
jovens, é necessário solicitar anticorpos anti-ilhota
(ICA, do inglês islet-cell antibody), anti-insulina (IAA)
e antidescarboxilase do ácido glutâmico (anti-GAD)
para diferenciar DM1 e DM2 (presentes no tipo 1). É
preciso verificar, em cada realidade, quais dosagens
estão disponíveis.
Anamnese
A avaliação inicial deve englobar uma história completa para
classificação do diabetes, a identificação de comorbidades
(outros fatores de risco cardiovascular ou transtornos
mentais, como ansiedade e depressão, que interferem na
adesão) e de complicações crônicas, além da revisão de
tratamentos e controle glicêmico anterior (incluindo efeitos
colaterais ou episódios de hipoglicemia).
É essencial dar ênfase às dificuldades, expectativas e medos
em relação à doença e ao futuro e ampliar a escuta sobre o
exercício da sexualidade, visando à elaboração de um plano
terapêutico conjunto, que inclua abordagem familiar e/ou a
participação em grupos educativos.
Exame Físico
Deve ser orientado para a verificação da presença de outros
fatores de risco cardiovasculares e de complicações micro e
macrovasculares.
Frequentemente negligenciado na prática clínica, o exame dos
pés, que inclui avaliação da sensibilidade superficial
(monofilamentos de 10 g) e profunda (diapasão), palpação
de pulsos e avaliação sobre a presença de feridas, infecções,
deformidades e alterações de trofismo, deve ser realizado no
mínimo anualmente.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
18
Exames Complementares
Uma vez estabelecido o diagnóstico de diabetes, o controle
glicêmico é feito mediante a avaliação dos parâmetros
tradicionais:
• GJ, glicemia pós-prandial e HbA1c.
Os testes de glicemia refletem o nível glicêmico no momento
exato em que foram realizados, e a HbA1c revela a glicemia
média pregressa dos últimos 2 a 4 meses.
A HbA1c deve ser solicitada quando a GJ atinge as metas
desejáveis para um bom controle. Estima-se que, para a
HbA1c de 6%, corresponderia a uma glicemia média de 126
mg/dL e que, para cada 1 ponto percentual a mais de HbA1c,
haja uma elevação de 30 mg/dL na média das glicemias.
A glicemia média pode ser calculada por meio da
seguinte fórmula:
Glicemia média estimada: 28,7 x HbA1c – 46,7
Nos casos em que a GJ já normalizou e a HbA1c permanece
elevada, deve-se suspeitar de hiperglicemia pós-prandial,
que pode ser evidenciada pelo automonitoramento da
glicemia capilar (AMGC), quando disponível. A GJ e a HbA1c
devem ser pedidas a cada 3 meses para aqueles que precisam
de reavaliação do esquema terapêutico para o alcance das
metas de HbA1c.
Ainda que o MS recomende tiras de glicemia capilar apenas
para quem usa insulina, AMGC pode ser necessário eventual e
temporariamente para pacientes com DM2 que não usam
insulina, em casos de descompensação metabólica por
estresse clínico ou cirúrgico, uso de corticosteroides ou
hipoglicemias graves.
As metas do tratamento do DM envolvem, além da redução de
níveis glicêmicos e pressóricos, a adequação do peso e do
perfil lipídico, mas estas devem ser flexibilizadas conforme
cada pessoa, dependendo de uma série de fatores,
especialmente comorbidades.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
19
Como o nível de HbA1c se correlaciona com o risco
progressivamente maior de complicações crônicas, define-
se como 7% a meta de HbA1c para adultos com diabetes e
na ausência de gravidez, acima do qual está indicada a
revisão da terapia em vigor.
Para pessoas com diagnóstico recente, longa expectativa
de vida, sem doenças cardiovasculares (DCVs) e pouco
risco de hipoglicemias, pode-se ser mais rígido, com metas
de HbA1c entre 6,0 e 6,5%.
Entretanto, para crianças, adolescentes, idosos
fragilizados e pessoas com expectativa de vida limitada, um
controle mais flexível com HbA1c entre 7,5 e 8,5% pode
ser aceito.
Demonstrou-se que o controle metabólico muito rígido em
DM2 com comorbidades importantes e alto risco
cardiovascular pode aumentar a mortalidade e o número
de episódios de hipoglicemia grave.
Lipidograma: nos indivíduos estáveis, a GJ deve ser solicitada
a critério clínico, e a HbA1c, a cada 6 meses. Em relação ao
perfil lipídico, se estiver na faixa aceitável, deve ser
monitorado anualmente ou com mais frequência se tiver sido
instituído tratamento para dislipidemia.
Função Renal: exame qualitativo de urina, creatinina com
estimativa do clearance e pesquisa de microalbuminúria
devem ser avaliados anualmente a partir do diagnóstico do
DM2 e após 5 anos do diagnóstico do DM1.
Exame oftalmológico (fundo de olho): deve ser avaliado
anualmente a partir do diagnóstico do DM2 e após 5 anos do
diagnóstico do DM1.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
20
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
21
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
22
Tratamento
A caracterização do bom controle glicêmico requer a
normalização conjunta dos três parâmetros:
• Glicemia média semanal (GMS);
• Perfil glicêmico; e
• Variabilidade glicêmica (VG)
* O conceito de VG está mais comprovado em pacientes
com DM1 ou naqueles que utilizam insulina.
**GMS = 150 mg/dL é equivalente à HbA1c= 6,9%.
Os parâmetros de GMS, VG e perfil glicêmico são calculados
com o auxílio de softwares especiais equipando os
monitores de glicemia.
Fonte: Sociedade Brasileira de Diabetes.
O sucesso terapêutico depende da implicação da própria
pessoa no seu autocuidado. Para isso, tornam-se
fundamentais as intervenções de educação em saúde,
individuais ou em grupo, pela equipe de saúde.
Tratamento Não Farmacológico
As MEVs – incluindo dieta adequada, atividade física regular,
aconselhamento sobre o uso de álcool, cigarro e outras
drogas – têm efeito sobre o controle glicêmico, semelhante
aos antidiabéticos orais, além de reduzirem o risco
cardiovascular global. Um plano alimentar balanceado
combinado à prática regular de atividades físicas é
considerado terapia de primeira escolha para DM. O grau de
obesidade e a inatividade física afetam a sensibilidade
insulínica, podendo perpetuar um descontrole metabólico,
independentemente do tratamento farmacológico.
A alimentação indicada ao portador de diabetes deve ser
individualizada de acordo com sexo, idade, peso e gasto
calórico habitual. É importante ressaltar os meios de evitar
hipoglicemia ao usar secretagogos ou insulina, como
obedecer aos horários das refeições, evitar bebidas alcoólicas
e incluir uma ceia noturna antes de deitar-se.
A atividade física reduz a HbA1c, independentemente da
redução de peso, diminui o risco cardiovascular e melhora a
autoestima. O exercício físico, por mais de 150 minutos
semanais de intensidade moderada a vigorosa, é altamente
recomendado para prevenção e controle do DM2 e na
prevenção das DCVs em diabéticos. Preferencialmente, a
combinação de exercícios aeróbicos e de resistência é
recomendada tanto para a prevenção como para o controle
do DM. Há maior risco de hipoglicemia durante a atividade
física, principalmente naqueles que utilizam insulina, de modo
que ajustes na quantidade e tipo de carboidratos na
alimentação, bem como nas doses e locais de aplicação da
insulina, podem ser necessários. Retinopatia proliferativa e
neuropatia autonômica grave contraindicam exercícios
vigorosos, e alteração da sensibilidade ou lesões nos pés
requerem cuidados com o calçado e o tipo de atividade
realizada.
Para os indivíduos com risco aumentado para diabetes, a MEV
– redução de 5 a 10% de peso corporal caso apresentem
sobrepeso ou obesidade e aumento da atividade física, como
caminhadas, de pelo menos 150 minutos por semana – deve
ser recomendada, pois pode reduzir em até 58% o risco de
desenvolver DM. Além da MEV, o uso de metformina(indicação prioritária, sobretudo em portadores de
obesidade) pode ser considerado.
Tratamento Farmacológico
Diabetes Melito 2
O tratamento é feito em etapas, com complexidade crescente.
O tratamento inicial indicado é a MEV associada ao uso de
metformina. Caso o controle esteja inadequado, mesmo com
essas medidas, recomenda-se a introdução progressiva de
outros fármacos, evoluindo também para insulinoterapia.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
23
Figura 1: PROTOCOLO CLÍNICO E DIRETRIZES TERAPÊUTICAS DIABETE MELITO
TIPO 2 – Ministério da Saúde
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
24
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
25
Considerações Gerais:
• Metformina: pacientes com TFG menor do que 30
mL/min têm absoluta contraindicação para o uso da
metformina. Valores de TFG de 30 a 59 mL/min
precisam alertar sobre outros fatores de risco para
acidose láctica antes da prescrição ou da
continuidade do uso da metformina. Deve-se ter
cautela no pré e pós-operatório e em pacientes
submetidos a exames de imagem com contraste.
• Sulfonilureias: não é a primeira escolha em DM2 com
emagrecimento por estimular um aumento da
secreção pancreática de insulina e provocar ganho
de peso. Devem ser usadas com cautela em idosos
pelo risco de hipoglicemia (principalmente a
clorpropamida e a glibenclamida). Não devem ser
utilizados em pacientes com perda significativa de
função renal (TFG menor do que 30 mL/min), com
exceção da gliclazida, que pode ser usada com muita
cautela.
• Gliptinas: a sitagliptina, a vildagliptina, a saxagliptina
e a alogliptina requerem ajuste posológico na
insuficiência renal (IR), e a linagliptina é o único
agente desta classe que não requer redução de
dose. A utilização das gliptinas em monoterapia pode
promover redução modesta da HbA1c e são neutras
quanto a efeitos no peso. Esses medicamentos
podem ser usados associados a metformina,
glitazonas, sulfonilureias e, mais recentemente,
surgiram estudos com insulina.
• Agentes da classe de incretinas – exenatida,
liraglutida e lixisenatida: o primeiro, um mimético do
GLP-1; os dois últimos, análogos ao GLP-1. São
indicados como terapia adjunta para melhorar o
controle da glicose em pacientes com DM2 que estão
em tratamento com metformina, uma sulfonilureia, ou
na combinação com esses dois medicamentos,
quando não obtiveram resultados satisfatórios. O
diabético obeso em monoterapia ou combinação de
agentes orais com HbA1c > 7% é o melhor
candidato, em razão da possibilidade de obter
melhor controle com menor risco de hipoglicemia
acompanhado da perda de peso e possível redução
no risco cardiovascular. Embora o perfil desses três
agentes seja semelhante, a exenatida e a liraglutida
apresentam mais efeitos gastrintestinais, ao passo
que a lixisenatida oferece maior risco de hipoglicemia
sintomática. A liraglutida é a única da classe
aprovada para uso em monoterapia.
• Inibidores do SGLT2: promovem glicosúria, por
impedirem a reabsorção de glicose nos túbulos
renais. Apresentam baixo risco de hipoglicemia,
promovem perda de peso de 2 a 3 kg e redução da
PAS de 4 a 6 mmHg. Podem ser combinadas com
todos os agentes orais e insulina; por outro lado, têm
risco aumentado para infecções genitais e de trato
urinário. Apresentam ação diurética (glicosúria) e
podem levar à depleção de volume (no caso do
paciente específico com risco de depleção de volume,
reduzir a dose ou não usar). Tal classe não deve ser
indicada na IR moderada ou grave.
OBS.: a hiperglicemia pós-prandial é um fator independente
de risco para a doença macrovascular, impactando também
no risco das seguintes complicações: retinopatia, aumento da
espessura da camada íntima média da carótida, estresse
oxidativo, inflamação e disfunção endotelial, redução do fluxo
sanguíneo do miocárdio, aumento do risco de câncer e
comprometimento da função cognitiva em idosos com DM2.
Insulinoterapia
O declínio progressivo da função das células beta faz parte do
processo natural da doença, sendo a prescrição de insulina
reconhecida atualmente como necessária para a maioria dos
portadores de DM2. Seu uso é indicado ao diagnóstico,
quando a sintomatologia for proeminente, ou no curso do
tratamento, quando houver falha ou contraindicação aos
agentes orais, ou, ainda, em situações especiais, como na
gestação ou em intercorrências clínicas – infecção, cirurgia,
após infarto agudo do miocárdio ou acidente vascular
cerebral, IH e IR. Quando há o diagnóstico, nessa situação, a
insulinoterapia deve ser plena e pode ser temporária. Na
prática, contudo, observa-se que a insulinoterapia ainda é
pouco utilizada ou iniciada tardiamente devido ao receio por
parte de médicos e pacientes. A introdução da insulinoterapia
em dose única, antes de deitar-se (bed time), associada aos
antidiabéticos orais (terapia combinada), é considerada a
estratégia preferencial para início da terapia insulínica no
DM2, pois costuma ser bem recebida pelos usuários e tem o
benefício de requerer menores doses de insulina e reduzir o
risco de hipoglicemia.
Basicamente, existem quatro modalidades de apresentações
comerciais de insulinas no mercado brasileiro: humanas
isoladas; humanas em pré-mistura; análogos de insulina
humana isolados; e análogos bifásicos ou pré-mistura de
insulina humana.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
26
A insulinoterapia deve ser intensificada de forma progressiva
e adequada, para facilitar a adesão e evitar hipoglicemia, que
podem ser uma barreira para alcançar o bom controle
glicêmico. Ao se iniciar a terapia de combinação injetável, o
tratamento com metformina deve ser mantido, e os demais
tratamentos com agentes orais podem ser continuados
respeitando-se a individualização do tratamento, para evitar
esquemas complexos e de alto custo.
Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina
27
Considerações Gerais:
• A hipoglicemia pode ocorrer com o uso dos
antidiabéticos orais (sulfonilureias e glinidas) ou
insulina. Em geral, ocorre por omissão de refeição,
diminuição da quantidade de carboidratos da
refeição e/ou excesso de exercício físico. Palidez,
extremidades frias, sudorese, tremores, palpitações,
sensação de fome, dor abdominal, dor de cabeça,
tontura, fadiga, sonolência, alteração do humor
(irritabilidade) ou do comportamento são os sinais e
sintomas mais comuns.
• Usuários e familiares devem ser orientados a
reconhecer o quadro, realizar o pronto diagnóstico
por meio da glicemia capilar (