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I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado 1) Entender a formação da placa aterosclerótica 1) Introdução • A aterosclerose é caracterizada por lesões na camada íntima da artéria denominadas de ateromas, as quais levam ao endurecimento da artéria (espessamento e perda da elasticidade da parede arterial). • As placas consistem em lesões elevadas compostas por centro mole e grumoso de lipídeos, recobertas por uma capa fibrosa. Essas podem obstruir mecanicamente o lúmen e se romper, evoluindo para trombose catastrófica dos vasos, e, além disso, enfraquecem a parede do vaso, aumentando a predisposição para formação de aneurisma. • Existem alguns fatores de risco que predispõe a sua formação: o Genéticos: antecedente familiares o Idade: as lesões costumam se manifestar até que o indivíduo alcance a meia-idade ou mais tarde (40-60 anos) o Gênero: mulheres no período pré-menopausa apresentam menor probabilidade de ter placas (efeito protetor do estrógeno) o Hiperlipidemia: a hipercolesterolemia é o principal fator de risco envolvido na formação de placas, principalmente com LDL elevado (colesterol que se deposita nos tecidos periféricos; o HDL mobiliza as placas de colesterol para o fígado e excreção biliar) o Outros fatores: tabagismo, hipertensão e diabetes mellitus • Em ordem decrescente, os vasos mais cometidos são: aorta abdominal infrarrenal, coronárias, poplíteas, carótidas internas e os vasos do círculo de Willis. Isso explica a relação da doença com isquemia em coração, cérebro, rins e MMII. 2) Fisiopatologia • Atualmente, adota-se a teoria da hipótese da resposta à lesão, que considera a aterosclerose como uma resposta inflamatória crônica da parede arterial à lesão endotelial, cuja progressão envolve a interação de lipoproteínas modificadas, macrófagos e constituintes celulares. I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado • O processo segue a ordem a seguir: • O desequilíbrio hemodinâmico apresenta influência, pois áreas de fluxo sanguíneo turbulento (ramificações, áreas de bifurcação, óstio) são as que mais estão associadas a formação de placas. O fluxo laminar estimula a expressão de proteínas anti-ateroscleróticas. • Os lipídios são fatores essenciais para a formação da placa. São carreados por apoproteínas, formando complexos de lipoproteína transportados no sangue. Doenças que levam a danos no metabolismo lipídico (sd. nefrótica, alcoolismo, hipotireoidismo, DM) levam a dislipoproteinemias, as quais afetam negativamente esse processo. A hipercolesterolemia é um fator essencial para a formação de placas, pois: o Compromete diretamente a função endotelial, promovendo aumento da produção de radicais livres de oxigênio e reduzem a ação vasodilatadora do óxido nítrico o Quando de caráter crônico, acumula-se dentro da intima, produzindo cristais de colesterol e LDL oxidada, os quais são fagocitados por macrófagos, levando a formação de células espumosas. • A inflamação contribui diretamente para a iniciação, progressão e complicação dessas lesões, pois leva a expressão de moléculas de adesão que aumentam a migração de células inflamatórias para a íntima (englobam moléculas de LDL/cristais de colesterol) e de células T (que produzem citocinas inflamatórias, as quais podem estimular macrófago, células endoteliais e musculares lisas). Resumindo, o quadro inflamatório leva a proliferação de células do músculo liso e síntese de matriz extracelular! o A proliferação de células do músculo liso e a síntese de MEC convertem a estria gordurosa em um ateroma maduro. Além disso, a matriz é constituída predominantemente de colágeno, o que contribui para sua estabilidade. o ATENÇÃO! O processo inflamatório crônico pode levar a destruição de macrófagos e apoptose das células musculares lisas da íntima e desintegrar a matriz, formando placas instáveis. Lesão endotelial - Promove o espessamento da íntima, levando a disjunção endotelial e consequente aumento de permeabilidade e adesão plaquetária - Os dois principais fatores desencadeantes são a disturbios hemodinamicos e hipercolesterolemia Ativação de resposta inflamatória Macrófagos englobam lipídeos e há estimulaçao de prolfieração de músculo liso, colágeno, MEC e deposição lipídica I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado • Em geral, as placas continuam a mudar e aumentar progressivamente através da degeneração e morte celular, síntese e degradação da MEC (remodelamento) e organização de trombo. Além disso, os ateromas costumam sofrer calcificação. 3) Entender a fisiopatologia do infarto com supra de ST 1) Fisiologia da irrigação cardíaca • O tecido miocárdico é o tecido corporal que apresenta maior taxa de extração de O2 do organismo • No miocárdio, a taxa de extração do oxigênio é fixa! Logo, a única forma de aumentar o aporte de oxigênio para esse tecido é por meio de um aumento do fluxo de sangue pelo leito coronário, o que é feito através da reserva coronariana (vasodilatação de acordo com a necessidade de oxigênio). o As artérias são capazes de se dilatar frente a produção endotelial de óxido nítrico e outros agentes miorrelaxantes, sendo a produção desses diretamente proporcional a taxa metabólica do organismo. o A medida que surgem oclusões hemodinâmicas significativas nas coronárias, a reserva é progressivamente requisitada, a fim de manter em equilíbrio a relação entre oferta e consumo de oxigênio. Isso acaba limitando a capacidade de vasodilatação das artérias frente a um verdadeiro aumento de demanda. • Em caso de obstrução aguda e grave, mesmo com uma vasodilatação arteriolar máxima, o fluxo fica tão baixo que, mesmo uma vasodilatação intensa não é capaz de suprir a necessidade dee oxigênio do músculo, levando a isquemia miocárdica em repouso e posteriormente infarto (síndromes coronarianas agudas) o Quando há oclusão aguda total, o tempo que o miocárdio demora para entrar em necrose é de 20 minutos! I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado • Em caso de obstrução gradual e não tão grave, a reserva coronariana é utilizada apenas parcialmente em estado de repouso, sendo, portanto, desenvolvido um estágio de angina estável (a reserva coronariana residual não é capaz de suprir as necessidades de oxigênio do músculo) • Os fatores determinantes da demanda miocárdica de oxigênio são: o Frequencia cardíaca o Contratilidade o Tensão da parede ventricular • Os fatores determinantes do aporte miocárdico de oxigênio são: o Conteúdo arterial de oxigênio o Fluxo coronariano o “Função diastólica” à as coronárias são irrigadas durante a diástole! Durante a sístole a microcirculação é comprimida, o que dificulta a entrada do sangue e facilita sua saída pelo sistema venoso. • Portanto, o surgimento da isquemia depende de alterações desses fatores (como aumento da demanda de oxigênio, na taquicardia, ou fatores que limitam a oferta de oxigênio, como a anemia. o ATENÇÃO! Por vezes, o paciente pode ter isquemia sem sequer ter obstrução! São os casos em que há um aumento considerável na demanda miocárdica de oxigênio, como na hipertrofia ventricular esquerda, intoxicação por CO ou por cocaína. 2) Consequências da isquemia miocárdica • Os cardiomiócitos isquêmicos passam a ter mudanças que refletem o baixo aporte de oxigênio para essas células, o que prejudica suas funções mecânicas e elétricas. Em um primeiro momento há uma perda da função diastólica (o coração não relaxa corretamente), seguida de perda da capacidade contrátil (o coração não consegue se contrair). • Dependendo da extensão, localização e duração da isquemia, diferentes consequências clínicas podem ocorrer, como insuficiência cardíaca crônica e insuficiência mitral aguda. • Uma consequência de extrema importância é a instabilidade elétrica, visto que a região que sofre isquemia apresenta propriedades eletrofisiológicasdistintas das adjacentes, o que leva a um fenômeno Hipocinesia - Contração mais fraca do segmento isquêmico do que o restante Acinesia - O segmento isquêmico se torna imóvel em relação aos outros Discinesia - O segmento isquêmico não se contrai, apresentando um movimento paradoxal de "abaulamento" I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado de reentrada, fenômeno essencial para taquiarritmias fatais, como fibrilação ou taquicardia ventricular sem pulso. 3) Correlacionar os achados do eletrocardiograma com a anatomia coronariana • No ECG, o IAM se manifesta através da seguinte evolução: • Apesar disso, qualquer uma dessas alterações pode estar presente sem qualquer uma das outras (por exemplo, elevação de segmento ST sem presença de inversão da onda T). 1) A onda T no infarto • Podem se apresentar em dois estados: o Apiculadas – ondas T altas e estreitas o Invertidas – o nome é autoexplicativo • As alterações de onda T indicam isquemia miocárdica, fenômeno potencialmente reversível caso tratado precocemente. Entretanto, se ocorre a necrose miocárdica, as ondas T se tornam invertidas indeterminadamente. o Portanto, a inversão de onda T não diagnostica IAM. § ATENÇÃO! Esse fenômeno pode estar presente em outras condições, como bloqueio de ramo e hipertrofia ventricular. • A diferenciação pode ser feita pelo fato de as ondas T estarem invertidas simetricamente no infarto!! • ATENÇÃO! Em pacientes com a onda T invertida previamente, pode ocorrer a pseudonormalização, fenômeno em que a onda T se inverte normalmente, aparentando ser normal mesmo em condição de isquemia! Essa diferenciação só pode ser feita ao se comparar um ECG anterior. Onda T apiculada Onda T invertida Elevação de segmento ST Aparecimento de ondas Q I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado 2) O segmento ST no infarto • Reflete a lesão miocárdica, uma progressão do dano celular além da isquemia. • É um sinal confiável de que um infarto verdadeiro ocorreu, e que o ECG irá progredir conforme previamente estabelecido caso não ocorra uma intervenção precoce. • ATENÇÃO! Mesmo diante de um infarto verdadeiro, esses segmentos costumam retornar a linha de base após algumas horas. A presistencia dessa indica um aneurisma ventricular (enfraquecimento e abaulamento da parede) • ATENÇÃO! Esse segmento é arqueado para cima e tende a se mesclar de forma imperceptível com a onda T. 3) Ondas Q • Sua presença firma o diagnóstico de infarto agudo do miocárdio, visto que indica morte celular miocárdica irreversível! • As ondas Q geralmente aparecem dentro de algumas horas após o início do infarto, contudo, em alguns pacientes, podem levar vários dias para aparecer. • Essas ondas tendem a persistir por toda a vida do paciente. I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado • Mas... Por que elas se formam? Quando uma área do miocárdio morre, ela se torna eletricamente neutra, e, portanto, um eletrodo localizado em cima dessa área irá registrar um vetor elétrico que se afasta dele, portanto, levando a uma deflexão negativa no ECG. • ATENÇÃO! Derivações afastadas da área do infarto podem sofrer as chamadas alterações recíprocas, visto que há uma modificação na condução do vetor médio cardíaco. o Por exemplo, derivações opostas ao aparecimento de onda Q irão registrar ondas R MUITO elevadas! • Critérios de significância da onda Q: podem aparecer, representando uma despolarização precoce esquerda-direita do septo interventricular. o Duração > 0,04 segudo o Amplitude à no mínimo, 1/3 da altura da onda R no mesmo complexo QRS • ATENÇÃO! NUNCA CONSIDERAR AVR PARA AVALIAR INFARTO! o Como essa derivação é a única que visualiza câmara direita no ECG, geralmente apresenta ondas Q largas e profundas!! 4) Agora fodeu: como localizar o infarto através do ECG? • A região do miocárdio que sofre o infarto depende: o Da artéria coronária ocluída o Da extensão do fluxo sanguíneo colateral • Lembra da circulação coronária? Aposto que não. Mas como alguma pessoa me disse um dia desses: “relembrar é viver”. o Artéria Coronária Direita: fornece sangue para o lado direito do coração e fornece um ramo descendente que supre o nó AV. o Artéria coronária esquerda: fornece sangue para o lado esquerdo do coração, dividindo-se em artéria descendente anterior esquerda (ADA) e artéria circunflexa esquerda (ACX) § ADA à supre parte anterior do coração e a maior parte do septo interventricular § ACX à supre a parede lateral do VE Ondas Q largas e profundas! I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado • Agora, olha a bosta: é de extrema importância localizar um infarto, visto que essa apresenta correlação direta com o prognóstico do seu paciente!! Essas categorias podem ser agrupadas como: infartos inferiores, laterais, anteriores e posteriores (pensa um pouco e você vai descobrir o por que). o Aí você pensa: “carai, fudeu, como eu vou saber onde é?”. CALMA! As alterações do ECG características do infarto ocorrem apenas nas derivações que ficam sobre o local do infarto ou próximas a ele! Então é simples: basta tu lembrar da rosa dos ventos meu compatriota. • Bora dividir pra tentar entender a) Infartos inferiores • Resultam de uma oclusão da artéria coronária direita ou de seu ramo descendente • As alterações típicas do infarto ocorrem naquelas derivações que observam a parte inferior do coração! o DII o DIII o aVF • Dentro de seis meses, até 50% desses pacientes não apresentam mais critérios de ondas Q significantes. b) Infartos laterais • Geralmente resulta da oclusão do ramo circunflexo da artéria coronária esquerda. o Lembre! O ventrículo esquerdo está mais susceptível a lesão por suprimento sanguíneo inadequado, visto que é o que apresenta maior massa muscular. • As alterações típicas do infarto são vistas nas derivações que visualizam a parte esquerda do coração: I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado o DI o aVL o V5 o V6 c) Infarto anterior • Geralmente resulta da oclusão da artéria descendente anterior • Olha que coisa: nenhuma derivação frontal apresenta alteração! Mas por que? Ora, as derivações frontais não servem para olhar a porção anterior e posterior do coração! Para isso temos nossas derivações precordiais! Portanto, as alterações típicas são vistas nessas! • ATENÇÃO! OLHA A BAGACEIRA!11 Olha aí que a artéria descendente anterior e a artéria circunflexa são ramos da artéria coronária esquerda! Logo, se essa for obstruída na base, ocorrerá um infarto anterolateral, • ATENÇÃO! Um achado típico desse tipo de infarto é a progressão anômala da onda R, apesar de essa não ser patognomônica dessa condição. I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado d) Infarto posterior • Geralmente resulta de uma oclusão da artéria coronária direita o Como essa artéria acaba suprindo a parede inferior (artéria descendente posterior), frequentemente esse infarto é visto concomitantemente a esse. • Olha que bosta, como nenhuma das derivações convencionais está colocada sobre a parede posterior, o diagnóstico requer o achado das alterações recíprocas nas derivações anteriores. Logo, esse infarto é uma “imagem em espelho das alterações visíveis nos infartos anteriores”. o As alterações recíprocas são: depressão de ST, elevação de onda R, inversão da onda T • As alterações são visíveis predominantemente em V1: onda R alta e depressão do segmento ST I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado 4) Angina • Dor torácica associada a doença coronária, a qual pode permanecer estável durante anos ou evoluir para infarto. • Achados no ECG: depressão do ST ou inversão de onda T. • ATENÇÃO! Como diferenciar dos infartos sem onda Q? o O segmento ST geralmente retorna à linha de base logo após o episódio ter cedido. o No infarto o segmento ST permanecedeprimido por, no mínimo, 48 horas e as enzimas típicas encontram-se elevadas. • ATENÇÃO! A angina de Prinzmetal é um tipo de angina associada com a elevação do segmento ST. Pode ser devido a aterosclerose ou espasmo de artéria coronária (o ECG não consegue distinguir entre esses grupos) Infarto sem onda Q São aqueles em que as únicas alterações visíveis no ECG são a inversão de onda T e a depressão do segmento ST. São clinicamente importantes, pois apresentam maior risco de reinfarto e de mortalidade tardia (são uma espécie de “infartos incompletos”) I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado 5) Conhecer o quadro clínico e diagnóstico diferencial do IAM com supra de ST 1) Introdução • O infarto agudo do miocárdio é uma das maiores causas de morte no Brasil e no mundo, havendo 01 óbito a cada 5/7 casos por essa condição. A mortalidade ainda é alta, girando em torno de 30% no ambiente intra-hospitalar, sendo que metade desses óbitos ocorre na primeira hora após o início do evento. • A definição de infarto é necrose tecidual. O IAM é a necrose de uma porção do músculo cardíaco, sendo o IAMST causado pela oclusão total de uma artéria coronária, estando relacionada com os trombos ricos em fibrina. 2) Etiologia e fisiopatologia • O infarto é causado por oclusão aguda na artéria coronária epicárdica. • Na maioria dos casos, a causa é a aterotrombose, ou seja, a formação de um trombo sob a placa de ateroma que se rompeu. Geralmente no IAMST a ruptura é mais profunda, levando a ativação da cascata de coagulação quando o sangue entra em contato com o conteúdo lipídico contido em seu interior, sendo que a chance de ruptura dessa está relacionada a uma série de fatores: o Inflamação intraplaca o Conteúdo lipídico o Espessura da capa de colágeno • Em menos de 5% dos casos, a oclusão coronariana aguda pode ser causada por esses processos: o Espasmo coronariano (angina de Prinzmetal) o Cocaína o Embolia coronariana (endocardite, trombose de prótese valvar...) o Dissecção coronariana o SAF o Síndromes trombofílicas (anticoncepcionais + tabagismo, doenças hereditárias, síndrome nefrótica...) o Vasculite coronariana o Trauma coronariano (como angioplastia) o Aumento acentuado do MVO2 com doença coronariana grave • Frente a oclusão, o primeiro processo que ocorre é a discinesia (abaulamento da parede) ou acinesia (perda de movimento), sendo ambos fruto da isquemia miocárdica transmural. • ATENÇÃO! Dependendo da extensão da necrose, as seguintes complicações podem se desenvolver: o >25%: insuficiência ventricular esquerda e edema agudo de pulmão o > 40%: choque cardiogênico (baixo débito cardíaco) • ATENÇÃO! A disfunção diastólica é um quadro comum no IAM (ausculta de B4), e também pode acarretar em congestão pulmonar! Ocorrem em apenas 20% dos casos! I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado • Mesmo após reperfusão miocárdica adequada, o coração demora dias para voltar a bater normalmente, mesmo que não haja necrose associada. Esse fenômeno costuma ocorrer quando a reperfusão é tardia. o Portanto, alguns doentes podem permanecer com disfunção ventricular esquerda, contudo, o quadro tende a se reverter após alguns dias! o ATENÇÃO! A reperfusão (trombólise ou cirurgia) pode levar a lesão por reperfusão nas células infartadas, levando a um dano maior do que o já presente. Isso ocorre devido à disfunção mitocondrial (proteínas entram e ela se rompe – via de apoptose), hipercontratura dos miócitos (a reperfusão leva a contração descontrolada das miofibrilas devido a entrada maciça de cálcio, levando a danos no citoesqueleto e morte celular), produção de radicais livres, agregação de leucócitos (obstruem a microvasculatura). Portanto, a reperfusão salva células com lesão reversível, porém altera a morfologia das células com lesão irreversível. • O processo necrótico demora cerca de 12h para se completar, levando a necrose transmural. Geralmente se inicia em tecido subendocárdico, indo em direção à periferia. A evolução para necrose depende de: 1. Capacidade da rede de colaterais: ligam segmentos entre coronárias (heterocolaterais) e de uma mesma coronária (homocolaterais); tal rede é capaz de se hipertrofiar frente à isquemia, sendo capaz de reduzir a extensão da área de necrose. 2. MVO2 do miocárdio em sofrimento isquêmico: quanto maior o consumo de oxigênio miocárdico, pior será a lesão. 3. Reperfusão precoce: quanto mais precoce, menor será a área de necrose e melhor o prognóstico. • Em infartos extensos, pode ocorrer o remodelamento da região, devido ao deslizamento das fibras necróticas entre si, alterando a geometria ventricular. Em compensação, as áreas não infartadas tendem a se hipertrofiar na tentativa de manter a fração de ejeção constante. Portanto, as áreas que sofrem necrose tendem a sofrer um afinamento e aumento de sua parede, o que pode originar um aneurisma ventricular. O remodelamento tende a piorar a função sistólica e pode originar uma insuficiência cardíaca congestiva. Drogas como IECA e BRA inibem o remodelamento cardíaco por inibição da angiotensina II (tóxica) e redução de pós carga. O uso de corticosteroides e AINES nas primeiras semanas pós IAM prejudicam a cicatrização miocárdica e favorecem o remodelamento. I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado 3) Quadro Clínico • A dor torácica anginosa é a manifestação clínica típica do IAMST o Dor de forte intensidade, duração (>20 minutos) e que não se resolve por completo com repouso ou nitrato sublingual. Pode se irradiar para epigastro, dorso, membros superiores e pescoço/mandíbula (“sufocamento”). § A dor não irradia para baixo do umbigo e nem para o trapézio – dor de pericardite! o Sintomas autonômicos: dispneia, náuseas e vômitos, palidez, sudorese fria o Sensação de morte eminente. • Em alguns casos, a sintomatologia pode ser “atípica”, principalmente em idosos, mulheres e portadores de diabetes mellitus, ICC, marca passo definitivo e transplante cardíaco. o Dor torácica “em queimação”, “em facada” o Dispepsia (epigastralgia + náuseas e vômitos) o Exaustão, lipotimia ou síncope (baixo débito) o Défict neurológico focal (AVE) o Choque cardiogênico indolor o Edema agudo de pulmão o Morte súbita (fibrilação ventricular) • Cerca de 40-60% dos pacientes refere um fator desencadeante, como estresse físico ou emocional. • ATENÇÃO! A angina instável é um importante sintoma prodômico, podendo ter início 4-6 semanas antes do evento. o Na angina instável o paciente refere desconforto precordial acompanhado de pelo menos uma das seguintes características: § Surge em repouso/aos mínimos esforços § Duração prolongada (> 10-20 min) § Caráter intenso (descrito como dor) § Início recente § Intensidade crescente • O exame físico do paciente costuma ser inexpressivo, entretanto, alguns achados podem ser sugestivos de complicações: o Choque cardiogênico: sinais de hipoperfusão (hipotensão, pulsos finos, palidez...) o Insuficiencia ventricular esquerda: dispneia, ortopneia, estertoração pulmonar, B3 (pode evoluir para edema agudo de pulmão) • O escore de Killip relaciona o prognóstico do paciente com os achados clínicos. Quanto maior a classe, pior o prognóstico. I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado Killip I Sem dispneia, estertoração pulmonar ou B3 Killip II Dispneia e estertoração pulmonar discreta, B3 ou TJP Killip III Franco edema agudo de pulmão Killip IV Choque cardiogênico 4) Diagnóstico • Os principais diagnósticos diferenciais estão estabelecidos na tabela ao lado: o ATENÇÃO! É essencial a exclusão do diagnóstico de dissecção aórtica, através de avaliação de simetria dos pulsos. Em caso de suspeita, solicitar Raio- X/ECO transesofágico/angiotomografia. • O diagnóstico pode ser fechado através da análise de três dados principais:o História clínica o ECG o Curva de marcadores de necrose miocárdica • A definição diagnóstica de infarto agudo do miocárdio é: 1. Aumento e/ou queda dos marcadores de necrose miocárdica, na presença de pelo menos um dos achados: a. Sintomas de isquemia miocárdica b. Desenvolvimento de onda Q patológica no ECG c. Desnivelamento de ST ou BRE de 3º grau novo ou supostamente novo d. Imagem “nova” compatível com perda de miocárdio viável (acinesia/discinesia segmentar) 2. Evidências anatomopatológicas de IAM. a) Eletrocardiograma • Em todo paciente com suspeita de infarto um ECG deve ser obtido e interpretado em menos de dez minutos, visto que além de confirmar o diagnóstico, é capaz de influenciar no tratamento. • Deve-se lembrar que os primeiros ECGs observados podem ser normais, portanto, sendo imprescindível refazê-lo em intervalos curtos em todo paciente que permanece sintomático. • Os critérios diagnósticos para IAMST são: 1. Supradesnível de ST > 1mm em duas derivações contíguas no plano frontal ou > 2mm em duas ou mais derivações contíguas no precórdio o Derivações contíguas são aquelas que representam a mesma parede miocárdica 2. Bloqueio completo do ramo esquerdo novo ou supostamente novo Dor Torácica Angina instável, dissecção aórtica, pericardite aguda, pneumotórax, embolia pulmonar Dispneia Embolia pulmonar, edema agudo hipertensivo, crise asmática, ICC descompensada Choque Hipovolemia, embolia pulmonar, sepse, tamponamento cardíaco, pneumotórax hipertensivo, pneumomediastino Morte Súbita Isquemia miocárdica sem infarto, FV idiopática, FV associada a uma cardiopatia prévia. I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado • ATENÇÃO! Alterações de segmento ST e onda T fazem parte do quadro eletrocardiográfico dos bloqueios de ramo, confundindo-se com as alterações próprias do IAM. Portanto, um bloqueio de ramo esquerdo de 3º grau novo ou supostamente novo em paciente sintomático deve ser tomado como equivalente a “supra de ST”. o Os achados típicos de BRE são supradesnível de ST em V1 e V2 e infradesnível de ST em V5 e V6. Quando o supra é > 5 mm ou quando o infra é maior que > 1 mm, a hipótese de IAMST é favorecida nesses pacientes. b) Curva enzimática • A análise de níveis séricos de marcadores de necrose miocárdica são capazes de confirmar o diagnóstico e avaliar a ocorrência de reperfusão. Isso se deve ao fato de essas moléculas serem “limpadas” do sangue conforme a progressão do infarto, apresentando uma cinética característica (quando a reperfusão é efetiva, o clearence é mais rápido, e, portanto, apresentam um “clearence precoce” do sangue). • Dois marcadores são sugeridos para uso de rotina o Troponinas cardioespecíficas: isoformas cTnI e cTnT são muito específicas para o diagnóstico. Se elevam 4-8h após o início do sintomas, atingindo pico em 36-72h e normalizam-se após 5-14 dias. São superiores a CKMB para diagnóstico de pequenos infartos e são muito mais específicas do que essas (CKMB está em pequenas quantidades em outras células musculares). Além disso, são os marcadores de escolha para infarto tardio. § A SBC recomenda o seu uso para diagnóstico de reinfarto! Uma “nova” curva de troponina surge, sendo feita no momento dos novos sintomas e sendo repetitda de 3 a 6 horas depois. § Positiva quando > 0,1 ng/ml o CK-MB: pode ser dosada em dois métodos: § CK-MB atividade: altera-se em 4-6h após o início do evento, com pico em 18h e normalização após 48-72h. • Positivo quando > 15-20 U/L § CK-MB massa: altera-se em 3-6h após início do evento, com pico em 16-24h e normalização em 48-72h. É o método de escolha para dosagem! • Positivo quando > 5ng/ml o Mioglobina: útil para diagnóstico de exclusão de IAM, pois apresenta elevação precoce (1 a 2h após o início dos sintomas), apesar de se elevar em qualquer lesão muscular. c) Estratificação de risco • Todo paciente deve ser estratificado quanto ao risco de complicações cardíacas (apesar de o infarto em si já ser uma condição de risco elevado I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado • O mais empregado é o TIMI risk TIMI RISK para IAMST Variáveis Pontuação Idade > 75 anos: 3 65-74 anos: 2 DM, HAS ou angina prévia 1 Exame físico PAS 100: 2 KILLIP > II: 2 Peso 8 Alto risco d) Localização e quantificação do infarto • Ecocardiograma: é o melhor método para diagnóstico, pois fornece detalhes sobre a função dos segmentos, tamanho do infarto, déficit contrátil, função ventricular (fração de ejeção) e complicações mecânicas! • ECG: não é tão bom quanto o eco, porém dá uma orientação razoável da localização do IAM pelas derivações que apresentam supra de ST. 5) Tratamento a) Introdução • É uma emergência médica, sendo que as primeiras 12h são as mais importantes para o tratamento, pois são o período mais crítico para surgimento de arritmias malignas e são o intervalo de tempo em que uma reperfusão bem conduzida pode evitar ou reduzir a necrose miocárdica. • Pacientes com suspeita de IAM devem ter medidas terapêuticas tomadas o mais precocemente possível. o Solicitar: § Hemograma § Lipidograma § Glicose § Ureia § Creatinina I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado § Eletrólitos § TAP/PTT § Marcadores de necrose miocárdica § Rx de tórax (para diferenciação de dissecção de aorta, antes da infusão de antiplaquetários/trombolíticos) • Na vigência de supra de ST ou BRE de 3º grau novo ou supostamente novo, deve ser realizada a reperfusão coronariana emergencial!! o 30 minutos é o tempo ideal para tratamento trombolítico o 90 minutos é o tempo ideal para realização de angioplastia b) Oxigenoterapia • Mandatória quando SatO2 24h após o IAMST) o ATENÇÃO! A única indicação de uso tardio é a presença de fatores de risco para choque cardiogênico nas primeiras 24h! § FC > 110 bpm § Idade > 70 anos § PAS > 120 mmHg • O uso de pindolol deve ser evitado, pois apresenta efeito simpaticomimético! • A droga mais usada é o metoprolol VO. Reserva-se a via IVa casos refratários ou com crise hipertensiva/taquiarritmia • ATENÇÃO! Os pacientes devem manter essa medicação em uso por pelo menos um ano após o IAMST! Contraindicações para uso de BB - Bradicardia (FC 240 ms - BAV de 2º ou 3º grau - Asma ou DPOC grave - Doença arterial periférica grave - Disfunção de VE grave - Killip > II f) Antiplaquetários • O AAS deve ser administrado imediatamente, na dose de 200-300 mg inicial (“mastigar e engolir” 2-3 compirmidos), mantendo-se 100 mg/dia para o resto da vida do paciente! • Deve ser feita a dupla antiagregação, com a tienopiridina clopidogrel. o Alguns estudos indicam o ticagrelor como dupla antiagregação coadjuvante, visto que esse apresenta um início de ação mais rápido e maior potência de ação que o clopidogrel, sem provocar um aumento considerável na taxa de sangramentos. I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado • A tripla antiagregação pode ser realizada, com inibidores da glicoproteína IIb/IIIa, apenas em casos submetidos a angioplastia, com ou sem implante de stent com alta carga de trombos (lesão microvascular detectada por contraste), sneod introduzidos durante o procedimento. o NÃO DEVE SER REALIZADA EM PACIENTE SUBMETIDOS APENAS A TERAPIA FARMACOLÓGICA! Contraindicações ao uso de AAS - Alergia - Intolerância - Hemofilia - Sangramento ativo - Úlcera péptica em atividade - Hepatopatia grave g) Terapia de reperfusão • Existem duas modalidades principais: trombolíticos e angioplastia com balão (com ou sem implante de stent). • Está indicada quando: o Dor sugestiva de IAM > 20 minutos e 75 anos, a estreptoquinase é o trombolítico preferencial (tem maior risco de AVC hemorrágico) • É necessário associar os trombolíticos com anticoagulantes para eficácia máxima (preferencialmente enoxaparina ou heparina não fracionada) • Após o uso de trobolíticos, deve ser avaliado o grau de abertura da coronária responsável pelo IAM, por meio da angiografia. • ATENÇÃO! Caso ocorra uma reoclusão coronariana mesmo após uma reperfusão química efetiva, o tratamento deve ser feito através de angioplastia de resgate! Em locais onde essa não está disponível, a trombólise química pode ser repetida, contudo, deve-se ter em mente que o risco de hemorragia aumenta consideravelmente e o trombolítico não deve ser utilizado em período inferior a 24h desde a última administração. Contraindicações ao uso de trombolíticos Absolutas - Histórico de sangramento intracraniano - Dano ou neoplasias no SNC - AVC isquêmico nos últimos três meses - Trauma craniofacial importante nos últimos três meses - Hemorragia ativa (exceto menstruação) ou diátese hemorrágica - Qualquer lesão vascular cerebral conhecida - Dúvidas quanto ao diagnóstico de dissecção de aorta Relativas - AVC isquêmico há > 3 meses - Lesões intracranianas - Gestação - Uso de cumarínicos - Hemorragia interna nas últimas 2-4 semanas - RCP prolongada ou traumática - HAS não controlada - Punções vasculares não compressivas - HAS crônica sem controle adequado - Úlcera péptica em atividade - Exposição prévia a estreptoquinase há > 5 dias (risco de alergia) I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado 2. Angioplastia (intervenção coronariana percutânea) • Essa pode ser primária (sem uso de trombolítico), de resgate (após insucesso trombolítico) ou eletiva (após sucesso da trombólise) • Primária: é a estratégia mais eficaz, promovendo perfusão completa e rápida do contraste na maioria das vezes, devendo ser realizada idealmente em até 90 minutos após o diagnóstico de IAMST. Obviamente, é obrigatória em caso de contraindicação aos trombolíticos ou em pacientes com choque cardiogênico. A janela terapêutica é de 12h (período de início da necrose miocárdica). Deve sempre ser implantado um stent, pois esse impede que o vaso colapse. o ATENÇÃO! Frente a implantação de stent, é necessário a terapia com dupla antiagregação plaquetária até o processo de reepitelização (resposta do corpo ao material do stent – extremamente trombogênico), a qual pode ser mantida por até um ano após implantação, a depender do material do qual o stent é feito. • De resgate: é aquela realizada após falha da trombólise, a qual é verificada através dos seguintes critérios. A angioplastia de resgate deve ser feitacaptopril, enalapril, ramipril, lisinopril, trandolapril... o Os principais efeitos colaterais são: hipotensão arterial, azotemia, hipercalemia, tosse seca e, em raros casos, angioedema. o Seu uso deve ser contínuo, caso: § Disfunção sistólica de VE, diabetes e/ou insuficiência renal crônica § Mínimo de 05 anos caso idade > 55 anos e, no mínimo, uma das seguintes comorbidades: • HAS • Hipercolesterolemia • Redução do HDL-colesterol • Tabagismo • Microalbuminúria § Mínimo de 05 anos caso sintomas e fatores de risco bem controlados com tratamento clínico, ou procedimento de revascularização bem-sucedido. • Os BRA são medicamentos de segunda linha para esse tratamento, reservados para pacientes que não toleram bem os IECA. São indicados quando: o FE 1 mm, retificado ou descendente); a cintilografia e o ecocardiograma de estresse podem ser utilizados em pacientes que não podem realizar teste ergométrico. • Pacientes com complicações intra-hospitalares (isquemia, disfunção ventricular, taquiarrtimia ventricular...) devem ser submetidos à coronariografia antes da alta hospitalar, com indicação de revascularização miocárdica. 6) Entender as complicações mecânicas do IAM 1) Insuficiência Cardíaca e Choque Cardiogênico a) Insuficiência Ventricular Esquerda • O fator de maior importância prognóstica no IAM é a disfunção ventricular esquerda, que começa a ocorrer mesmo quando assintomática frente ao sofrimento isquêmico. o Esses pacientes (KILLIP III) devem ser tratados com diuréticos, nitrato e ionotrópicos. Os AINES (exceto o AAS) devem ser suspensos, pois acarretam um risco aumentado de morte e reinfarto, além de prejudicar o processo cicatricial em zonas perinecróticas. I Módulo 701 – Problema 08 I Thiago Almeida Hurtado • O choque cardiogênico é definido como PA sistólica