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UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 1 Notas de Aula de Álgebra II –Parte II Autores: Ricardo Camelier e Hernando Bedoya Aula 4: O Teorema de Lagrange Introdução Um problema muito importante, porém muito difícil, na teoria dos grupos é a determinação de todos os subgrupos de um grupo G. Uma forma de encarar este problema seria considerando todo os subconjuntos de G que contém o elemento neutro e, então, verificar se satisfazem as condições de subgrupo. No entanto, esta abordagem não é nada prática. Por exemplo, se um grupo G tem 6 elementos, então o número de subconjuntos contendo o elemento neutro é 3225 . Já se G tem 10 elementos, então o número de subconjuntos contendo o elemento neutro é 51629 . Se G é um grupo infinito, então teríamos que levar em consideração uma infinidade de subconjuntos de G. No entanto, quando o grupo G é finito, temos um importante resultado que permite reduzir enormemente o número de subconjuntos de G que podem ser subgrupos. Trata-se do Teorema de Lagrange, que afirma que se H é um subgrupo do grupo finito G então a ordem de H divide a ordem de G. No caso do grupo G ter 6 elementos, então basta considerar os subconjuntos contendo a unidade com 1, 2, 3 e 6 elementos, que são os divisores de 6. Como os subconjuntos de 1 e 6 elementos, nesse caso, são os subgrupos triviais, então basta considerar os subconjuntos contendo a unidade com 2 e 3 elementos. Dentre estes estarão os demais candidatos a subgrupos do grupo G. Veja que, assim, reduzimos enormemente a busca inicial. Teorema de Lagrange Sejam G um grupo finito e H um subgrupo de G. Então a ordem de H divide a ordem de G. Observações 1. Em linguagem mais simbólica, o Teorema de Lagrange afirma que se G é um grupo finito e GH , então GH . 2. Atenção, a recíproca do Teorema de Lagrange é falsa, ou seja, em geral não é verdade que se um inteiro m divide G então G tem um subgrupo H de G com mH . Exemplo 1 Sabemos que },,,,,{ 223 IS , com 132 321 e 231 321 , é um grupo de ordem 6 e, portanto, seus subgrupos só podem ter ordem 1, 2, 3 e 6. Atividade 1 Encontre subgrupos de S3 de ordem 2 e 3. Para demonstrar o Teorema de Lagrange precisaremos de um novo conceito, o de classe lateral. Futuramente, as classes laterais também serão fundamentais para a construção dos grupos quocientes. UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 2 Definição 1 (Classe Lateral) Sejam G um grupo e H um subgrupo de G. Dado Ga , chamamos de uma classe lateral (à esquerda) ao conjunto }{ HhhaaH . Observação 1. Se G é um grupo aditivo, então denotamos a classe lateral aH por }{ HhhaHa . 2. Se e é o elemento neutro do grupo G, então HeH . Mais ainda, aHa para todo Ga . 3. O conceito de classe lateral à direita é definido de modo análogo; é o subconjunto de G definido por }{ HhahHa , onde H é um subgrupo de G e Ga . No entanto, nesta aula, não trabalharemos com as classes laterais à direita. Sua primeira atividade desta aula será justificar a observação 2, anterior. Atividade 2 Seja e o elemento neutro do grupo G e seja H um subgrupo de G. Mostre que: a) HeH ; b) aHa para todo Ga . Exemplo 2 Vamos calcular as classes laterais do subgrupo },{ IH de },,,,,{ 223 IS . Estaremos usando a tabela de multiplicação de S3 I I I I I II I 222 22 22 222 22 22 22 vista na Aula 2. Temos: },{},{},{ 2 IIH ; },{},{},{ 22222 IIH ; HIIIH },{},{},{ 2 ; HIIH 22},{})(,){(},{ ; HIIH },{})(,){(},{ 22222 . UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 3 Observe que as classes laterais distintas, nesse caso, são H, H e H2 . Vamos provar, agora, algumas propriedades sobre as classes laterais. Estas propriedades tornarão a demonstração do Teorema de Lagrange extremamente simples. Proposição 1 (Propriedades das Classes Laterais) Sejam G um grupo finito, H um subgrupo de G e Gba , . 1. bHaH se, e somente se, Hab 1 . 2. Se bHaH , então bHaH . Ou, equivalentemente, se bHaH , então bHaH . 3. Todas as classes laterais têm H elementos, isto é, HaH para todo Ga . 4. Existem elementos Gaaa k ,,, 21 , com Gea 1 , tal que HaHaHaG k 21 , e a união é disjunta. Demonstração 1. () Vamos supor, primeiramente, que bHaH . Queremos provar que Hab 1 . Sabemos que bHaHa , logo, existe Hh tal que hba . Portanto, . )( pois;)( 1 11 Hh he hbb hbahbbab () Vamos, agora, supor que Hab 1 . Queremos provar que bHaH . Vamos provar, inicialmente, a inclusão bHaH . Como Hab 1 , então existe Hh 1 tal que 1 1 hab . Portanto, 1hba . Seja, agora, aHha , Hh , um elemento genérico de aH. Então, temos .)( pois;)( 1 11 hhb hbahhbha Como H é subgrupo e Hhh 1, , então Hhh 1 e, portanto, bHhhbha )( 1 . Daí, segue que bHha para todo Hh , ou seja, bHaH . A inclusão contrária, aHbH , é completamente análoga à anterior e será uma atividade para você. Portanto, segue que bHaH . Atividade 3 Prove que se Hab 1 , então aHbH . 2. Se bHaH , então existe bHaHg . Portanto, aHg e bHg . Daí, segue que existem Hhh 21, tais que 1hag e 2hbg , ou seja, 21 hbha . Assim, temos UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 4 . )( )( )()( 1 12 1 1 12 11 1 12 1 12 1 1121 hhab hhbbab hhba hhbhhahbha Como H é subgrupo e Hhh 21, , então Hhh 1 12 e, portanto, Hhhab 1 12 1 . Assim, pela propriedade 1 que acabamos de provar, segue que bHaH . 3. Lembre que para provar que dois conjuntos têm o mesmo número de elementos, precisamos mostrar que existe uma bijeção entre estes conjuntos. Considere a função aHHf : definida por hahf )( . Vamos provar que esta função é bijetora. Pela própria definição de aH, já vemos que aHf )Im( , ou seja, que f é sobrejetora. Para provar que f é injetora, sejam Hhh 21, tais que )()( 21 hfhf . Queremos concluir que 21 hh . Assim, temos , )()( )()( )()( 21 2 1 1 1 2 1 1 1 2121 hh haahaa haahaa hahahfhf o que prova que f é, de fato, injetora. Portanto, como f é uma bijeção, então aH e H têm o mesmo número de elementos, isto é, HaH . 4. Como aHa , existem elementos Gaaa k ,,, 21 , com Gea 1 , tal que HaHaHaG k 21 . E como cada duas classes laterais coincidem ou são disjuntas, a união HaHaHaG k 21 pode ser considerada uma união disjunta. Exemplo 3 Dado o subgrupo },{ IH de },,,,,{ 223 IS , vamos obter elementos },,,,,{,,, 22321 ISaaa k tal que HaHaHaS k 213 é uma união disjunta. Vimos, no Exemplo 2, que as classes laterais distintas, nesse caso, são: },{ IH , },{ 2 H e },{ 22 H . Então, podemos escolher Ia 1 , 2a e 2 3 a , e temos que HHHS 23 é uma união disjunta. Estamos, agora, em condições de completar a demonstração do Teorema de Lagrange. Demonstração do Teorema de Lagrange Pela proposição 1.4, sabemos que existem Gaaa k ,,, 21 , com Gea 1 , tal que UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 5 HaHaHaG k 21 e a união é disjunta. Como a união é disjunta, o número de elementosde G é igual à soma do número de elementos da cada classe lateral da união, ou seja, HaHaHaG k 21 . Agora, pela proposição 1.3, sabemos que HHai para todo ki ,,2,1 . Substituindo na equação anterior, temos . parcelas)(; 21 Hk kHHH HaHaHaG k Portanto, HkG com k um inteiro positivo, ou seja, H divide G . Observe como esta demonstração ficou extremamente simples. Isso não quer dizer que o Teorema de Lagrange é fácil de ser provado, significa, simplesmente, que todo o trabalho duro foi feio anteriormente, neste caso, na Proposição 1. Agora, o Teorema de Lagrange têm conseqüências importantes e muito elegantes. Vamos a elas! Corolário 1 Seja G um grupo finito e Ga , então a ordem de a divide a ordem de G, isto é, Ga)(ord . Demonstração O subgrupo gerado por a, a , é um subgrupo do grupo finito G. Logo, pelo Teorema de Lagrange, temos que Ga . Mas como, por definição, a ordem do elemento a é a ordem do subgrupo gerado por a, ou seja, aa)(ord , segue que Ga)(ord . Corolário 2 Seja G um grupo finito de ordem n e Ga , então G n ea . Demonstração Seja m a ordem do elemento a. Pelo Corolário 1, nm , ou seja, existe um inteiro k tal que kmn . Vimos, na aula passada, que a ordem m de a é o menor inteiro positivo tal que G m ea . Assim, G k G kmmkn eeaaa )()( . O próximo corolário do Teorema de Lagrange é especialmente elegante. Corolário 3 Todo grupo de ordem primo é cíclico. Demonstração UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 6 Seja G um grupo de ordem primo p. Como 1p , então existe Ga com Gea . Agora, como Gea , então 1)(ord a . Por outro lado, pelo Corolário 1, Ga)(ord , ou seja, pa)(ord . Mas como p é primo, então seus únicos divisores positivos são 1 e p e, como 1)(ord a , então só resta a possibilidade pa )(ord . Isto significa que o subgrupo a gerado por a tem o mesmo número de elementos que G e, como Ga , segue que Ga , ou seja, G é um grupo cíclico. Temos, agora uma demonstração muito simples do Pequeno Teorema de Fermat. Corolário 4 (Pequeno Teorema de Fermat) Seja p um número primo e a um inteiro tal que a não divide p. Então )(mod11 pa p . Demonstração Vimos, na Aula 1, que }1,,1{}1),({ ppkmdck pp ZZ é um grupo multiplicativo com 1 ppZ . Como a p e p é primo, então 1),( pamdc e, portanto, pa Z . Logo, pelo Corolário 2, 1)( 1 pa , o que significa que )(mod11 pa p . A demonstração anterior pode ser generaliza para obter, agora, uma demonstração extremamente simples do importante teorema de Euler. Lembre, da Aula 1, que }1),({ namdca nn ZZ é um grupo multiplicativo finito. Sua ordem é denotada por (n), onde }1),(1{)( nkmdcenkkn Z é a função de Euler, ou seja, (n) é o número de inteiros k tais que nk 1 e 1),( nkmdc . Veja que no caso de um número primo p, temos .1 }1,,2,1{ }1),(1{)( p p pkmdcepkkp Z Corolário 4 (Teorema de Euler) Seja 1n um número inteiro e a um inteiro tal que 1),( namdc . Então )(mod1)( na n . Observe que o Pequeno Teorema de Fermat é o caso particular do Teorema de Euler em que n é um primo p. A demonstração do Teorema de Euler será uma atividade final para você. UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 7 Atividades Finais 1. a) Calcule todas as classes laterais distintas do subgrupo },,{ 2IH de },,,,,{ 223 IS . b) Obtenha elementos },,,,,{,,, 22321 ISaaa k tal que HaHaHaS k 213 é uma união disjunta. 2. Prove o Teorema de Euler. Resumo Nesta aula vimos o importante Teorema de Lagrange, que afirma que se G é um grupo finito e GH , então GH . Para provar este teorema foi preciso introduzir o conceito de classe lateral (à esquerda), ou seja, o conjunto }{ HhhaaH , onde GH e Ga . Depois, vimos várias conseqüências do Teorema de Lagrange: 1. Se G é um grupo finito e Ga , então Ga)(ord . 2. Se G é um grupo finito com nG e Ga , então G n ea . 3. (Pequeno Teorema de Fermat) Se p é primo e a p, então )(mod11 pa p . 4. (Teorema de Euler) Se 1n é inteiro e 1),( namdc , então )(mod1)( na n . Aula 5: Classes Laterais e o Grupo Quociente Introdução Na aula anterior apresentamos e provamos o Teorema de Lagrange. Ele é um dos teoremas mais importantes da teoria dos grupos e afirma que a ordem de todo subgrupo divide a ordem do grupo finito. Para provar o Teorema de Lagrange foi preciso introduzir o conceito de classe lateral de um grupo. Mais precisamente, vimos os conceitos de classe lateral à esquerda e classe lateral à direita. Na demonstração do Teorema de Lagrange foi necessário trabalhar apenas com as classes laterais à esquerda. No entanto, um grande objetivo desta aula é a construção dos grupos quocientes que desempenham, em teoria dos grupos, um papel análogo aos anéis quocientes em teoria dos anéis. Na construção dos grupos quocientes será necessário lidar com subgrupos em que as classes laterais à esquerda e à direita são iguais. Estes subgrupos são chamados de subgrupos normais e serão nosso objeto de estudo na próxima aula. Vamos iniciar revendo os conceitos de classe lateral à esquerda e à direita. Definição 1 (Classe Lateral) Sejam G um grupo e H um subgrupo de G. Dado Ga , chamamos de uma classe lateral à esquerda de G com respeito a H ao conjunto }{ HhhaaH . De modo análogo, chamamos de classe lateral à direita de G com respeito a H ao conjunto UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 8 }{ HhahHa . Observações 1. Se G é um grupo aditivo, então denotamos a classes laterais aH e Ha por }{ HhhaHa e }{ HhahaH , respectivamente. 2. Se e é o elemento neutro do grupo G, vimos que HHeeH . Mais ainda, aHa e Haa para todo Ga . Exemplo 1 Seja G o grupo aditivo dos números inteiros, ou seja o grupo (Z, ). Considere, agora, o subgrupo }4{4 ZZ ttH dos múltiplos de 4. Vamos calcular todas as classes laterais à esquerda de H. Já sabemos, pela Observação 2, que HHH 00 . Agora, veja que }41{}1{1 Z ttHhhH consiste de todos os inteiros que deixam resto 1 na divisão por 4. Da mesma forma, }42{}2{2 Z ttHhhH consiste de todos os inteiros que deixam resto 2 na divisão por 4, e }43{}3{3 Z ttHhhH consiste de todos os inteiros que deixam resto 3 na divisão por 4. Pelo Algoritmo da Divisão em Z, o resto da divisão de qualquer inteiro por 4 só pode ser 0, 1, 2 ou 3. Assim todo inteiro pertence a uma das classes laterais HH 0 , H1 , H2 ou H3 . Portanto, HH 0 , H1 , H2 e H3 são as únicas classes laterais à esquerda de Z4H em Z. Atividade 1 Mostre que 0 HH , 1H , 2H e 3H são as únicas classes laterais à direita de Z4H em (Z, ). Como você observou na Atividade 1, 1H consiste dos inteiros que deixam resto 1 na divisão por 4, 2H consiste dos inteiros que deixam resto 2 na divisão por 4 e 3H consiste dos inteiros que deixam resto 3 na divisão por 4, segue que HHH 00 ; 11 HH ; 22 HH e 33 HH . UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 9 Ou seja, as classes laterais à esquerda e à direita são iguais, sempre que obtidas com o mesmo elemento, aHHa para todo Za . No entanto, nem sempre isto acontece, como veremos no próximo exemplo. Exemplo 2 Seja G o grupo },,,,,{ 223 IS das permutações de 3 elementos, onde 132 321 e 231 321 , e seja },{ IH . Para fins de consulta, lembre que a tabela de multiplicação do grupo S3 é dada por II I I I II I 222 22 22 222 22 22 22 No Exemplo 2 da aula 4, vimos que apenas três classes laterais à esquerda com respeito a H, que são: HIIH },{ ; },{ 2 H ; },{ 22 H ; pois, as demais são cópias das já obtidas: HIH },{ ; HH 22},{ ; HH },{ 22 . Observe que temos três classes laterais à esquerda distintas: H, H e H2 . Na próxima atividade você vai calcular as classes laterais à direita com respeito à H. Atividade 2 Mostre que as classes laterais à direita com respeito a },{ IH , em S3, são HIHI },{ ; },{ H ; },{ 222 H ; Observe que temos três classes laterais à esquerda distintas: H, H e 2H . Comparando as classes laterais à esquerda com as classes laterais à direita, temos 22},{ HH e HH },{ 22 . Portanto, temos que HH e 22 HH , diferente do que ocorreu no exemplo anterior, ou seja, encontramos elementos 3Sa tais que HaaH . Nas seguintes proposições vamos relembrar algumas propriedades fundamentais das classes laterais. Estas propriedades já foram estudadas na aula passada. UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 10 Proposição 1 (Propriedades das Classes Laterais à Esquerda) Sejam G um grupo, H um subgrupo de G e Gba , . 1. bHaH se, e somente se, Hba 1 . 2. Se bHaH , então bHaH . Ou, equivalentemente, se bHaH , então bHaH . 3. Se G é um grupo finito, então todas as classes laterais têm H elementos, isto é, HaH para todo Ga . Em outras palavras, todas as classes laterais à esquerda têm o mesmo número de elementos. 4. Se G é um grupo finito, então existem elementos Gaaa k ,,, 21 , com Gea 1 , tal que HaHaHaG k 21 , e a união é disjunta. Uma propriedade idêntica, com uma demonstração análoga, vale para as classes laterais à direita. Proposição 2 (Propriedades das Classes Laterais à Direita) Sejam G um grupo, H um subgrupo de G e Gba , . 1. HbHa se, e somente se, Hba 1 . 2. Se HbHa , então HbHa . Ou, equivalentemente, se HbHa , então HbHa . 3. Se G é um grupo finito, então todas as classes laterais têm H elementos, isto é, HHa para todo Ga . Em outras palavras, todas as classes laterais à direita têm o mesmo número de elementos. 4. Se G é um grupo finito, então existem elementos Gaaa k ,,, 21 , com Gea 1 , tal que kHaHaHaG 21 , e a união é disjunta. Uma conseqüência destas propriedades é que existem o mesmo número de classes laterais à esquerda e à direita, mesmo que não sejam iguais, no sentido de que existam elementos Ga tais que HaaH . No entanto, um caso especial e muito importante é quando elas coincidem, ou seja, quando HaaH para todo Ga . Neste caso, poderemos fazer a construção dos chamados grupos quocientes que são semelhantes aos anéis quocientes já estudados anteriormente. Na verdade, veremos que a condição HaaH , para todo Ga , permitirá a definir uma operação binária no conjunto }{ GaaHHG das classes laterais que fará deste conjunto um grupo, chamado grupo quociente. Mas isto é uma longa história que só terminará na próxima aula. Definição 2 (Conjunto das Classes Laterais) Sejam G um grupo e H um subgrupo de G. Denotamos por }{ GaaHHG UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 11 o conjunto das classes laterais à esquerda com respeito a H. Exemplo 3 Seja G o grupo (Z, ) e }4{4 ZZ ttH . Pelo que vimos no Exemplo 1, as únicas classes laterais à esquerda com respeito a Z4H são HH 0 , H1 , H2 e H3 . Logo, }3,2,1,{ HHHHHG ou ainda, particularizando a notação para este exemplo, temos }43,42,41,4{4 ZZZZZZ . Exemplo 4 Seja G o grupo },,,,,{ 223 IS das permutações de 3 elementos, onde 132 321 e 231 321 , e seja o subgrupo },,{ 2IH . Usando a tabela de multiplicação de S3, contida no Exemplo 2, temos que HIIIIIIIIH },,{},,{},,{ 222 ; HIIIH },,{},,{},,{ 222 ; HIIIH },,{},,{},,{ 2222222 ; },,{},,{},,{ 222 IIH ; HIIH },,{},,{},,){()( 222 ; HIIH },,{},,{},,){()( 22222222 . Portanto, },{ HHHG . Atividade 3 Mostre que as classes laterais à direita com respeito a },,{ 2IH , em S3, são iguais às respectivas classes laterais à esquerda, calculadas no Exemplo 4. Nosso projeto, agora, é construir uma operação binária no conjunto das classes laterais }{ GaaHHG de modo a torná-lo um grupo. A forma natural de definirmos uma operação binária em G/H, será reproduzir o que foi feito para os anéis quocientes. Vamos formalizar estas idéias. Definição 2 (Operação em G/H) Sejam G um grupo e H um subgrupo de G. Definimos a seguinte operação no conjunto das classes laterais }{ GaaHHG : HabbHaH )( para todo HGbHaH , . UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 12 No entanto, precisamos saber se esta operação está bem definida, ou seja, se ela independe da escolha dos representantes a e b das classes laterais aH e bH, respectivamente. Nesta primeira etapa, vamos provar que se as classes laterais à esquerda e à direita coincidem, isto é, se HaaH para todo Ga , então a operação binária acima estará, de fato, bem definida em G/H. Proposição 3 Sejam G um grupo e H um subgrupo de G tal que HaaH para todo Ga . Se HaaH 1 e HbbH 1 , com Gbbaa 11 ,,, , então HbHabHaH 11 , ou, equivalentemente, HbaHab )()( 11 . Isto significa que a operação em G/H não depende dos representantes a e b escolhidos nas classes laterais aH e bH. Demonstração Pela Proposição 1, teremos HbaHab )()( 11 se, e somente se, Hbaab )()( 11 1 . Como HaaH 1 e HbbH 1 então, pela Proposição 1, Haah 1 1 1 e Hbbh 1 1 2 . Agora, pela hipótese, como HbHb 11 e Hh 1 , então existe Hh 3 tal que 3111 hbbh . Juntando tudo isto, temos subgrupo.ée,pois; pois; aassociativleipela;)( quejápois;)( aassociativleipelaepois;)( aassociativleipela;)( inversoelementodoedadepor propri;))(()()( 3232 21 1 32 31 1 11311131 1 11 1 11 1 11 11 11 11 11 1 HHhhHhh hbbhh hbb HbHbhbbhhbb haabhb baab baabbaab Portanto, concluímos que Hbaab )()( 11 1 e, conseqüentemente, que HbaHab )()( 11 . Exemplo 5 Seja G o grupo (Z, ) e }4{4 ZZ ttH . Pelo que vimos no Exemplo 3, }43,42,41,4{4 ZZZZZZ HG . Lembre, do curso de Álgebra I, que 0404 ZZ ; 141 Z ; 242 Z , 343 Z . Logo, }3,2,1,0{4 ZZ . UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 13 Como aa ZZ 44 para todo Za , então, pela Proposição 3, a operação binária está bem definida em ZZ 4 . Mais precisamente, temos que ZZZ 4)()4()4( baba para todo Zba, , ou, equivalentemente, baba para todo Zba, . A tabela desta operação, em ZZ 4 , é dada por 3210 2303 1032 0321 3210 3 2 1 0 Podemos, agora, concluir a construção do grupo quociente. Teorema 1 (O Grupo Quociente) Sejam G um grupo e H um subgrupo de G tal que HaaH para todo Ga . Então G/H, munido da operação definida em G/H, é um grupo. Chamamos este grupo de grupo quociente de G com respeito à H. Em particular, HeH é o elemento neutro do grupo e Ha 1 é o elemento inverso de aH. Denotamos isto por HHee GHG e HaaH 11)( . Demonstração Como HaaH para todo Ga , então,pela Proposição 3, a operação de G/H está bem definida. Vamos verificar os axiomas de grupo para ),( HG . G1. A operação é associativa: .)( )( emidadeassociativpela;))(( ))(( )()( cHbHaH cHHab GHcab Hbca HbcaHcHbHaH G2. O elemento neutro é HeH com e o elemento neutro de G: aHHaeeHaH )( e aHHeaaHeH )( . Denotamos este elemento por HHee GHG . G3. O elemento inverso de HGaH é Ha 1 : eHHaaHaaH )( 11 e eHHaaaHHa )( 11 . UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 14 Denotamos este elemento por HaaH 11)( . Exemplo 6 Seja G o grupo (Z, ) e }4{4 ZZ ttH . Como vimos no Exemplo 5, }3,2,1,0{4 ZZHG é um grupo quociente cujo elemento neutro é 040 ZHGe . Observe que ele coincide com o grupo (Z4, ) das classes residuais módulo 4. Atividades Finais 1. Seja G o grupo },,,,,{ 223 IS das permutações de 3 elementos, onde 132 321 e 231 321 , e seja o subgrupo },,{ 2IH . Conclua que a operação em G/H está bem definida e monte a tabela de operação do grupo quociente. 2. Sejam G um grupo, H um subgrupo de G e Gba , . Mostre que HbHa se, e somente se, Hba 1 . 3. Sejam G um grupo e H um subgrupo de G tal que HaaH para todo Ga . Se HaaH 1 e HbbH 1 , com Gbbaa 11 ,,, , então prove que HabHba )()( 11 . Resumo Nesta aula revimos os conceitos de classe lateral à esquerda e classe lateral à direita: }{ HhhaaH e }{ HhahHa . Em seguida, vimos as propriedades das classes laterais à esquerda e das classes laterais à direita: 1. bHaH se, e somente se, Hab 1 . 2. Se bHaH , então bHaH . Ou, equivalentemente, se bHaH , então bHaH . 3. Se G é um grupo finito, então todas as classes laterais têm H elementos, isto é, HaH para todo Ga . 4. Se G é um grupo finito, então existem elementos Gaaa k ,,, 21 , com Gea 1 , tal que HaHaHaG k 21 , e a união é disjunta. 5. HbHa se, e somente se, Hba 1 . 6. Se HbHa , então HbHa . Ou, equivalentemente, se HbHa , então HbHa . 7. Se G é um grupo finito, então todas as classes laterais têm H elementos, isto é, HHa para todo Ga . 8. Se G é um grupo finito, então existem elementos Gaaa k ,,, 21 , com Gea 1 , tal que UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 15 kHaHaHaG 21 , e a união é disjunta. Depois, vimos no conjunto das classes laterais à esquerda, }{ GaaHHG , podemos definir a operação HabbHaH )( para todo HGbHaH , . Em seguida, vimos que esta operação está bem definida sempre que HaaH para todo Ga , isto é, se as classes laterais à esquerda e à direita coincidem. Neste caso, construímos o grupo quociente G/H. Aula 6: Subgrupos Normais Introdução Na aula anterior encontramos uma classe de subgrupos especiais N de um grupo G que satisfaz a condição NggN para todo Gg . Estes subgrupos são especiais porque, nesse caso, podemos definir uma operação binária no conjunto das classes laterais }{ GggNNG , definida por NabbNaN )( , tornando o conjunto G/N num grupo, chamado grupo quociente. A necessidade da condição NggN , para todo Gg , apareceu para que pudéssemos resolver o problema da ambigüidade da representação das classes laterais. O problema consiste no fato que existem muitas formas de se escrever a classe lateral aN. Por exemplo, uma outra forma de se escrever esta classe lateral é axN para qualquer Nx . Aliás, você pode provar isto como uma primeira atividade. Atividade 1 Sejam G um grupo e N um subgrupo de G. Prove que axNaN para todo Nx . Analogamente, para a classe lateral bN, podemos escrever byNbN para todo Ny . Assim, o nosso problema é saber se a definição da operação binária em G/N, NabbNaN )( , depende ou não da forma como representamos as classes laterais, isto é, se depende de representarmos a classe lateral aN por aN mesmo ou por axN para algum Nx . É isto o que queremos dizer quando UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 16 afirmamos que a operação binária está bem definida em G/N. Na aula passada provamos que se NggN para todo Gg , então, de fato, a operação binária em G/N está bem definida. Mais precisamente, provamos a seguinte propriedade. Proposição 1 Sejam G um grupo e N um subgrupo de G tal que NggN para todo Gg . Se NaaN 1 e NbbN 1 , com Gbbaa 11 ,,, , então NbNabNaN 11 , ou, equivalentemente, NbaNab )()( 11 . Os subgrupos N para os quais a operação binária em G/N está bem definida recebe uma denominação especial. Definição 1 (Subgrupo Normal) Um subgrupo N de um grupo G é chamado de um subgrupo normal de G se NggN para todo Gg . Existe outra caracterização de subgrupo normal muito usada. Para descrevê-la precisamos considerar o seguinte conjunto. Sejam H um subconjunto do grupo G e Ga . Definimos o subconjunto 1aHa de G por }{ 11 HhahaaHa . Daí, temos a seguinte propriedade. Proposição 2 Sejam G um grupo, H um subgrupo de G e Ga . 1. 1aHa é um subgrupo de G. 2. HaaH se, e somente se, HaHa 1 . Demonstração 1. Lembre que, pelo critério do subgrupo visto na Aula 3, basta provar que 11 aHaxy para todo 1, aHayx . Como 1, aHayx , então existem Hhh 21, tais que 1 1 aahx e 12 aahy . E também, como H é subgrupo de G, então Hhhh 1213 . Juntando tudo, temos UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 17 .pois; neutroelementodoedadepor propri;)( inversoelementodoedadepor propri; aassociativleipela;)( inversoelementodoedadepor propri;))(( epois;))(( 1 213 11 3 11 21 11 21 11 2 1 1 11 2 1 1 1 2 1 1 11 2 1 1 1 HhhhaHaaah ahha aheah ahaaah aahaah aahyaahxaahaahxy G Portanto, 1aHa é um subgrupo de G. 2. () Vamos supor que HaaH . Queremos provar que HaHa 1 . Vamos começar provando a inclusão HaHa 1 . Dado 1 aHax , existe Hh 1 tal que 1 1 aahx . Como HaaH , existe Hh 2 tal que ahah 21 . Assim, temos . neutroelementodoedadepor propri; aassociativleipela;)( pois;)( aassociativleipela;)( pois; 2 2 1 2 21 1 2 1 1 1 1 1 1 Hh eh aah ahahaah aah aahxaahx G Portanto, provamos que HaHa 1 . A inclusão 1 aHaH será uma atividade para você. () Vamos supor, agora, que HaHa 1 e vamos provar a inclusão HaaH . Dado aHx , existe Hh tal que ahx . Como HaHaahaxa 11 , então existe Hh 1 tal que 1 1 hxa e, portanto, Haahx 1 . Assim, temos HaaH . A inclusão contrária, aHHa , é feita de forma análoga. Dado Hax , existe Hh tal que hax . Como aHaHhaahahaxa )()( 111 , então existe Hh 1 tal que 1 1 1 aahxa e, portanto, aHahaaahaaahaxax 1 1 1 1 1 1 ))(()()( . Assim, temos aHHa . Atividade 2 Sejam G um grupo e H um subgrupo de G que satisfaz HaaH . Prove que 1 aHaH . Portanto, pela parte 2 da Proposição 2, a outra caracterização de subgrupo normal fica clara. Definição 2 (Subgrupo Normal) Um subgrupo N de um grupo G é chamado de um subgrupo normal de G se NgNg 1 para todo Gg . A próxima propriedade fornece um critério que facilita verificar se um subgrupo N é um subgrupo normal de G. Esta propriedade mostra que basta verificar a inclusão NgNg 1 para todo Gg . UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 18 Proposição 3 (Critério do Subgrupo Normal) Sejam G um grupo e N um subgrupo de G. Então N é um subgrupo normal de G se, e somente se, NgNg 1 para todo Gg . Demonstração () Se N é um subgrupo normal de G, então, pela Definição 2, NgNg 1 para todo Gg . Portanto, segue imediatamente que NgNg 1 para todo Gg . () Temos de provar que NgNg 1 para todo Gg . Como já sabemos, por hipótese, que NgNg 1 , então basta provar que 1 gNgN para todo Gg . Seja Na um elemento qualquer. Como N é subgrupo, então Na 1 . Logo, Ngggag 111 e como, por hipótese, NNgg 1 , segue que Ngag 11 . Novamente, como N é subgrupo, então Ngag 111 )( , ou seja, Ngagaggb 1111 )( . De bagg 1 segue imediatamente que 11 gNggbga . Portanto, provamos que 1 gNgN , o que termina a demonstração de que N é um subgrupo normal de G. Observação O critério do subgrupo normal pode ser reescrito da seguinte forma: N é um subgrupo normal de G se, e somente se, Ngxg 1 para todo Nx e para todo Gg . Vamos, agora, ver alguns exemplos. Exemplo 1 Seja G um grupo. Então os subgrupos triviais de G, }{1 GeN e GN 2 , são subgrupos normais de G. De fato, para }{1 eN , como e é o único elemento de N1, então 1 11 Neggegg , e, portanto, temos 1 1 1 NggN para todo Gg . Pela Proposição 3, isto prova que }{1 GeN é um subgrupo normal de G. A prova de que GN 2 é um subgrupo normal de G faz parte da próxima atividade desta aula. Atividade 3 Seja G um grupo. Mostre que G é um subgrupo normal de G Exemplo 2 Seja G um grupo abeliano, então todo subgrupo N de G é normal. De fato, para quaisquer Nx e Gg temos que . abelianoépois,11 Nx Ggxgxgg UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 19 Portanto, temos NgNg 1 para todo Gg , o que prova que N é subgrupo normal de G. Exemplo 3 Seja G o grupo },,,,,{ 223 IS das permutações de 3 elementos, onde 132 321 e 231 321 , e seja o subgrupo },,{ 2IN . Vimos, no Exemplo 4 e na Atividade 3 da Aula 5, que NggN para todo 3Sg . Portanto, N é um subgrupo normal de S3. Exemplo 4 Seja o subgrupo },{ IH de S3. Como },{},{},{ 2 IIH , onde 2 , e HIIH },{},{},{ , segue que },{ IH não é subgrupo normal de S3. Voltando à nossa discussão inicial, vimos que se N é um subgrupo normal, então a operação binária definida em G/N está bem definida. Na verdade, a condição NgNg 1 , para todo Gg , é não só suficiente como é também necessária para que a operação binária em G/N esteja bem definida. Vejamos a discussão a seguir. Dados Gba , e Nyx , arbitrários, então ax e a representam a mesma classe lateral aN, isto é, axNaN e, similarmente, para a classe lateral Nb 1 , temos que yNbNb 11 . Assim, a operação acima está bem definida em G/N se, e somente se, NybaxNab ))(( 11 para todo Gba , e para todo Nyx , . Veja que esta igualdade vale se, e somente se yNaxbbaNabba 1111 para todo Gba , e Nyx , , e, portanto, NbxbyNbxbN 11 para todo Gb e Nx , Assim, a operação binária em G/H está bem definida se, e somente, se Nbxb 1 para todo Gb e Nx . Resumindo, temos que os subgrupos N do grupo G que satisfazem a propriedade Nbxb 1 para todo Gb e para todo Nx são os subgrupos para os quais o conjunto quociente G/N é um grupo. Estes grupos são muito importantes e são os grupos quocientes vistos no final da aula passada. Vamos retomar as definições com a nova nomenclatura de subgrupo normal. Teorema 1 (O Grupo Quociente) UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 20 Sejam G um grupo e N um subgrupo normal de G. Então G/N, munido da operação definida em G/N, é um grupo. Chamamos este grupo de grupo quociente de G módulo N. Em particular, NeN é o elemento neutro do grupo e Na 1 é o elemento inverso de aN. Denotamos isto por NNee GNG e NaaN 11)( . Vamos apresentar outros exemplos sobre subgrupos normais. Exemplo 5 Retornando ao subgrupo },,{ 2IN de },,,,,{ 223 IS , vimos no Exemplo 3, que N é um subgrupo normal de S3. No Exemplo 4 da Aula 5, vimos que o grupo quociente NS3 é dado por },{3 NNNS . A seguinte atividade é muito importante para entendermos a noção de subgrupo normal. Atividade 4 Calcule todos os subgrupos normais de S3. Apresentaremos agora alguns resultados sobre o grupo quociente. Proposição 4 Sejam G um grupo e N um subgrupo normal de G. Então: 1. Se G é um grupo abeliano, então o grupo quociente G/N é um grupo abeliano. 2. Se G é um grupo cíclico, então o grupo quociente G/N é um grupo cíclico. Demonstração 1. Sejam aN e bN duas classes laterais em G/N. Temos que .)()( abelianoépois, emoperaçãodadefiniçãopela,)()( aNbN GbaN NGabNbNaN Concluímos, assim, que G/N é um grupo abeliano também. 2. Suponhamos, agora, que G é um grupo cíclico gerado pelo elemento Gx . Isto é, qualquer elemento de G é uma potência de x. Afirmamos que a classe lateral xN é gerador do grupo G/N. De fato, seja NGaN com Ga , então podemos escrever kxa para algum Zk . Assim, kk xNNxaN )( para algum Zk , o que mostra que G/N é um grupo cíclico. Vejamos mais alguns exemplos de grupos quocientes. Exemplo 6 Como Z é um grupo aditivo abeliano, então o subgrupo Z4N , dos inteiros múltiplos de 4, é um grupo normal de Z. Assim, o grupo quociente Z/4Z é formado pelos quatro elementos ZZ 404 , Z41 , Z42 e Z43 . UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 21 Não é difícil ver que Z/4Z é um grupo cíclico gerado por Z41 . Assim, Z/4Z é um grupo isomorfo com Z4. O exemplo anterior é um caso particular do seguinte exemplo. Exemplo 7 Sabemos que se Zn , então o subgrupo }{ ZZ tntn é um subgrupo normal do grupo aditivo Z. Sabemos também que existem n classes laterais de nZ em Z, a saber, ZZ nn 0 , Zn1 , Zn2 ,..., Znn )1( . Como o grupo aditivo Z é cíclico, gerado pelo elemento 1, temos que o grupo quociente Z/nZ também é cíclico e é gerado pela classe lateral Zn1 . Sendo um grupo cíclico de ordem n, temos que Z/nZ é isomorfo a Zn. Num abuso de notação, muitas vezes escrevemos nn Z Z Z . Exemplo 8 Considere o grupo abeliano }e),{( 6464 ZZZZ yxyx . Com a operação definida por ),(),(),( dbcadcba para todo 4, Zca e 6, Zdb . Seja N o subgrupo cíclico de 64 ZZ gerado pelo elemento )1,0( , isto é, })1,0({ Z kkN . Atenção para não se confundir com a notação: observe que a primeira componente de )1,0( é 40 Z e que a segunda componente de )1,0( é 61 Z . Assim, temos )0,0()1,0(0 64 ZZe ; )1,0()1,0(1 ; )2,0()11,00()1,0()1,0()1,0(2 ; )3,0()12,00()1,0()2,0()1,0()1,0(2)1,0(3 ; )4,0()13,00()1,0()3,0()1,0()1,0(3)1,0(4 ; )5,0()14,00()1,0()4,0()1,0()1,0(4)1,0(5 ; )0,0()6,0()15,00()1,0()5,0()1,0()1,0(5)1,0(6 . Logo, UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 22 .)}6,0(),4,0(),3,0(),2,0(),1,0(),0,0{( })1,0({ ZkkN Sendo 64 ZZ abeliano, temos que N é um subgrupo normal e N)( 64 ZZ é um grupo abeliano. Sabemos que todas as classes laterais de N são disjuntas, possuem a mesma cardinalidade de N, no caso, 6 elementos cada, e sua união é todo o grupo G, de ordem 24. Logo, existem somente 4 classes laterais de N, ou seja, o grupo quociente N)( 64 ZZ tem ordem 4. Assim, os 4 elementos de N)( 64 ZZ são NN )0,0( ; N)0,1( ; N)0,2( e N)0,3( . Na próxima atividade desta aula, você estará encarregado deverificar que N)( 64 ZZ é um grupo cíclico gerado por N)0,1( . Podemos, assim, concluir que N)( 64 ZZ é um grupo isomorfo ao grupo Z4. Atividades Finais. 1. Verifique que N)0,1( é gerador do grupo N)( 64 ZZ . Apresente o elemento inverso de cada elemento do grupo. 2. Sejam KH subgrupos normais de um grupo G. Verifique que: a) H é um subgrupo normal de K. b) O grupo HK N G é um subgrupo normal do grupo HG . Resumo Nesta aula estudamos uma classe especial de subgrupos de um grupo G, são os chamados subgrupos normais, mais precisamente, dizemos que um um subgrupo N é normal em G se NgNg 1 para todo Gg , ou, equivalentemente, se NggN para todo Gg . Estes subgrupos são importantes pois, nesse caso, o conjunto das classes laterais de N em G é um grupo, chamado do grupo quociente de H e que foi denotado por HG . Aula 7: Homomorfismos de Grupos Introdução Apresentaremos nesta aula o conceito de homomorfismo de grupos. Lembre que numa aula anterior estudamos o conceito de homomorfismo de anéis e muitas de suas propriedades. Como aconteceu naquela aula, em que vimos também o conceito de isomorfismo de anéis, veremos aqui o conceito de isomorfismo de grupos. Os isomorfismos são muito importantes porque eles permitem a identificação entre grupos aparentemente muito diferentes. Lembre que um homomorfismo de anéis é uma função entre dois anéis que preserva as operações destes anéis. Analogamente, um homomorfismo de grupos é uma função entre dois grupos que preserva a operação destes grupos. Vamos às definições. UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 23 Definição 1 (Homomorfismo de Grupos) Dados dois grupos G e H, uma função HGf : é chamada de um homomorfismo (de grupos) se )()()( bfafbaf para todo Gba , . Observações 1. Observe que a operação que aparece em )( baf é a do grupo G, enquanto a operação que aparece em )()( bfaf é a operação do grupo H. 2. Lembre que a condição )()()( bfafbaf para todo Gba , significa que f preserva as operações dos grupos G e H. Para simplificar a notação, muitas vezes escrevemos esta condição sem denotar explicitamente a operação: )()()( bfafabf para todo Gba , . Definição 2 (Isomorfismo de Grupos) Um homomorfismo de grupos HGf : é chamado de um isomorfismo (de grupos) se for, também, uma bijeção. Nesse caso, dizemos que os grupos G e H são isomorfos e denotamos HG . Se GGf : é um isomorfismo do grupo G nele mesmo, dizemos que f é um automorfismo de G. Observação Lembre que dois conjuntos G e H têm o mesmo número de elementos, ou seja, eles têm a mesma cardinalidade, se existe uma bijeção entre G e H. Assim, se G e H são grupos isomorfos, então eles têm exatamente o mesmo número de elementos. Isso acontece porque se HGf : é um isomorfismo, então, em particular, f é uma bijeção entre G e H. Definição 3 (Núcleo de um Homomorfismo) O núcleo de um homomorfismo de grupos HGf : é o conjunto })({)( HexfGxfN , onde He é o elemento neutro do grupo H. Vejamos, agora, dois dos exemplos mais simples de homomorfismos de grupos. Exemplo 1 Dados os grupos G e H, consideremos a função constante HGf : dada por Hexf )( para todo Gx , onde He é o elemento neutro do grupo H. É fácil verificar que f é um homomorfismo grupos, pois ,)()( )( bfaf ee ebaf HH H UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 24 para todo Gba , . Podemos, também, facilmente calcular o seu núcleo. Como Hexf )( para todo Gx , então GexfGxfN H })({)( . Portanto o núcleo de f é todo o grupo G, o maior subgrupo possível de G. Exemplo 2 Dado um grupo G, o homomorfismo identidade de G é definido pela função identidade em G, ou seja, GGid : , aaid )( para todo Ga . É fácil verificar que a identidade é, de fato, um homomorfismo de grupos. Temos que ,)()()( bidaidbabaid para todo Gba , , o que prova facilmente o que queríamos. Como a identidade é uma bijeção em G, então GGid : é, na verdade, um isomorfismo do grupo G. Seu núcleo também pode ser calculado simplesmente. Observe que GG exexid )( , logo, }{})({)( GG eexfGxfN . Portanto, o núcleo do homomorfismo identidade id é o subgrupo trivial }{ Ge , o menor subgrupo possível de G. Exemplo 3 Sejam ),( RG o grupo aditivo dos números reais e ),( RH o grupo multiplicativo dos números reais positivos. Considere a função HGf : definida por xxf 2)( para todo Rx . Vamos verificar que f é um homomorfismo de grupos. Dados Ryx, , temos )()(222)( yfxfyxf yxyx . Assim, temos que f preserva as operações dos grupos e, portanto, é um homomorfismo. Como a função exponencial xxf 2)( é uma bijeção entre R e R , então f é um isomorfismo de grupos. Vamos calcular seu núcleo. Como 1He , temos que G x exxf 0121)( . Portanto, o núcleo de f é o subgrupo trivial }0{)( fN . Vamos à nossa primeira atividade. UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 25 Atividade 1 Sejam ),( ZG o grupo aditivo dos números inteiros e ),( nH Z o grupo aditivo dos inteiros módulo n. Considere a função HGf : definida por aaf )( para todo Za . Mostre que f é um homomorfismo sobrejetor e calcule o seu núcleo. Vamos, agora, estudar algumas propriedades dos homomorfismos. Proposição 1 Seja HGf : um homomorfismo de grupos. Então, 1. HG eef )( 2. )()( 11 afaf 3. Se N é um subgrupo de G, então f(N) é um subgrupo de H. Em particular, )()Im( Gff é um subgrupo de H. 4. N(f) é um subgrupo normal de G. 5. f é injetora se, e somente se, }{)( GefN . 6. Se f é bijetora, então GHf :1 é um homomorfismo de grupos. Demonstração 1. Temos que smo.homomorfiépois;)()( pois;)()( fefef eeeeefef GG GGGGGG Multiplicando ambos os lados da equação )()()( GGG efefef por 1)( Gef , obtemos 11 )()()())()(( GGGGG efefefefef , e como, HGG eefef 1)()( , temos HG eef )( . 2. Vemos que anterior.depropriedapela; pois;)( smohomomorfiépois;)()()( 1 11 H GG e eaaef faafafaf Analogamente, Heafaf )()( 1 . Logo, pela unicidade do elemento inverso, segue que )()( 11 afaf . UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 26 3. Sejam )(, Nfyx . Vamos provar que )(1 Nfyx . Como )(Nfx , existe Na tal que xaf )( e de )(Nfy , existe Nb tal que ybf )( . E como N é subgrupo, então Nba 1 . Assim, temos que .pois;)()( smohomomorfiépois;)( )()(pois;)()( )(e)(pois;)()( 11 1 111 11 NbaNfbaf fbaf bfbfbfaf bfyafxbfafyx Portanto, pelo critério do subgrupo, temos que f(N) é subgrupo de H. Em particular, como )()Im( Gff , então Im(f) é um subgrupo de H. 4. Vamos, primeiramente, provar que N(f) é um subgrupo de G. Dados )(, fNba , queremos mostrar que )(1 fNba . Como )(, fNba , então Hebfaf )()( . Assim, . )()(pois; )()(pois;)()( smohomomorfiépois;)()()( 1 111 11 H HHH e ebfafee bfbfbfaf fbfafbaf De Hebaf )( 1 , temos que )(1 fNba , o que prova que N(f) é um subgrupo de G. Para provar que N(f) é um subgrupo normal de G, sejam )( fNa e Gg . Vamos mostrar que )(1 fNgag . Como )( fNa , então Heaf )( . Assim, . )()( )()(e)(pois;)()( smohomomorfiépois;)()()()( 1 111 11 H HH e gfgf gfgfeafgfegf fgfafgfgagf Portanto, de Hegagf )( 1 , temos que )(1 fNgag . Logo, pelo critério do subgrupo normal, segueque N(f) é um subgrupo normal de G. 5.() Vamos supor que f seja injetora. Queremos provar que }{)( GefN . Dado )( fNa , então )()( GH efeaf , e, como f é injetora, segue que Gea . Daí, concluímos que }{)( GefN . () Vamos supor, agora, que }{)( GefN . Queremos provar que f é injetora. Dados Gba , tais que )()( bfaf , vamos mostrar que ba . Temos . )()(pois;)()( )()(pois;)()( smohomomorfiépois;)()()( 1 111 11 He afbfafaf bfbfbfaf fbfafbaf UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 27 De Hebaf )( 1 temos que )(1 fNba . Como }{)( GefN , então Geba 1 e, multiplicando por b dos dois lados, temos ba , de onde concluímos que f é injetora. 6. Sejam Hyx , . Vamos mostrar que )()()( 111 yfxfyxf . Sejam )(1 xfa e )(1 yfb , então xaf )( e ybf )( . Assim, .)(e)(pois;)()( pois; smohomomorfiépois;))(( )(e)(pois;))()(()( 1111 1 1 11 yfbxfayfxf idffba fbaff bfyafxbfaffyxf Logo, 1f é um homomorfismo de grupos. O próximo exemplo formaliza uma identificação entre os grupos S3 e D3, observada na aula 2. Exemplo 4 Seja o grupo },,,,,{ 223 IS das permutações de 3 elementos, onde 132 321 e 231 321 , e seja o grupo },,,,,{ 223 FRFRFRRID das simetrias do triângulo eqüilátero, visto na aula 2, y x A B C O Figura 23.1 onde 32RR é a rotação de 32 radianos em torno da origem e F é a reflexão com respeito ao eixo-x. Observe a semelhança nas tabelas de multiplicação destes dois grupos. A menos de uma diferença de notação, as duas tabelas são idênticas! I I I I I II I 222 22 22 222 22 22 22 IRRFRFFRFR RIRFFRFRFR RRIFRFRFF FFRFRRIRR FRFFRIRRR FRFRFRRII FRFRFRRI 222 22 22 222 22 22 22 UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 28 Portanto, é natural definirmos a seguinte bijeção entre S3 e D3: 33: DSf , onde 2222 )(;)(;)(;)(;)(;)( FRfFRfFfRfRfIIf . Assim, pelas semelhanças entre as tabelas acima, é fácil ver que )()()( bfafbaf para todo 3, Sba . Logo, f é um homomorfismo bijetor e, portanto, um isomorfismo entre S3 e D3, o que denotamos por 33 DS . Vamos à nossa próxima atividade. Este é um importante exemplo de automorfismo de grupo. Atividade 2 Sejam G um grupo e Gg . Considere a aplicação GGig : definida por 1)( gxgxig . Mostre que gi é um isomorfismo do grupo G nele mesmo, ou seja, um automorfismo do grupo G. Vamos finalizar esta aula apresentando um dos exemplos mais importantes de homomorfismo de grupos. Graças a ele temos o importante teorema do homomorfismo para grupos. Exemplo 5 (O homomorfismo canônico) Sejam G um grupo e H um subgrupo normal de G. Considere a aplicação entre G e o grupo quociente G/H, HGG : , definida por aHa )( . Vamos verificar que é um homomorfismo de grupo. Dados Gba , , temos .)()( )()( ba bHaH Hbaba Portanto, é um homomorfismo de grupos, chamado homomorfismo canônico. Proposição 2 Sejam G um grupo e H um subgrupo normal de G. Seja HGG : , aHa )( , o homomorfismo canônico. Então, 1. é um homomorfismo sobrejetor; 2. HN )( . Demonstração 1. Seja HGaH , Ga , um elemento arbitrário do grupo quociente G/H. Então, da própria definição do homomorfismo canônico, temos que aHa )( , donde concluímos que é, de fato, sobrejetor. 2. Temos que UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 29 . )(pois; pois;)( )()( Ha aHaHaH HHeeHa eaNa GHG HG E isso prova que HN )( . Observação 1. É importante ressaltar que o homomorfismo canônico é uma função sobrejetora mas, em geral, não é injetora. Pois, se H é um subgrupo normal do grupo G, diferente do subgrupo trivial }{ Ge , então dada qualquer classe lateral HGaH , existe Gb , ab , tal que aHbH . Assim, temos )()( aaHbHb . E isso prova que o homomorfismo canônico HGG : não é uma função injetora. 2. O homomorfismo da Atividade 1, nf ZZ : , definido por aaf )( para todo Za , é um importante exemplo de homomorfismo canônico. 3. Na próxima aula provaremos o teorema do homomorfismo para grupos que tem o seguinte enunciado. Teorema do Homomorfismo para Grupos Dado um homomorfismo de grupos HGf : , então existe um isomorfismo de grupos )()(: GffNG que satisfaz f , onde )(: fNGG é o homomorfismo canônico. Representamos esse resultado pelo seguinte esquema. G HGf )( )( fNG f )()( GffNG Atividades Finais 1. a) Sejam ),( Z o grupo aditivo dos números inteiros e ZZ :f um homomorfismo de Z em Z. Mostre que nfnf )1()( para todo Zn . b) Mostre que todo automorfismo do grupo aditivo Z é da forma xx ou xx , para todo Zx . 2. a) Sejam ),( nZ o grupo aditivo dos inteiros módulo n e nnf ZZ : um homomorfismo de Zn em Zn. Mostre que afaf )1()( para todo na Z . b) Mostre que todo automorfismo de nZ é da forma xax , com na Z . UERJ 2011 CURSO DE ÁLGEBRA II 30 Resumo Nesta aula vimos o conceito de homomorfismo de grupos onde, dados dois grupos G e H, uma função HGf : é chamada de um homomorfismo (de grupos) se )()()( bfafbaf para todo Gba , . Se, ainda, f é uma bijeção, então dizemos que HGf : é um isomorfismo dos grupos G e H e denotamos HG . Para HGf : um homomorfismo de grupos, vimos as seguintes propriedades: 1. HG eef )( 2. )()( 11 afaf 3. Se N é um subgrupo de G, então f(N) é um subgrupo de H. Em particular, )()Im( Gff é um subgrupo de H. 4. N(f) é um subgrupo normal de G. 5. f é injetora se, e somente se, }{)( GefN . 6. Se f é bijetora, então GHf :1 é um homomorfismo de grupos. Por fim, vimos o importante exemplo do homomorfismo canônico. Dados G um grupo e H um subgrupo normal de G, o homomorfismo canônico é definido por HGG : com aHa )( . Referências 1. Introdução à Álgebra de Adilson Gonçalves (Projeto Euclides –IMPA). 2. Álgebra: Um curso introdutório de Arnaldo Garcia e Yves Lequain (Projeto Euclides –IMPA).
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