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Anemia falciforme Conceito: A doença foi descrita pela primeira vez em 1910, sendo caracterizada por um jovem negro, com histórico recorrente de dor, anemia crônica e hemácias “afoiçadas” no esfregaço de sangue periférico. Anos depois, descobriu que era uma condição hereditária de transmissão autossômica recessiva, e foi somente em 1957 em que foi descoberta a causa base da doença que seria a substituição do ácido glutâmico pela valina na posição 6 da cadeia B-globina que dá origem a uma molécula de hemoglobina com comportamento anormal, que seria a hemoglobina S com formato de foice, o que dificulta a circulação e a chegada de oxigênio aos tecidos. Essa doença não se trata somente do afoiçamento de hemácias que levam a hemólise e à oclusão microvascular, mas também a um comprometimento sistêmico com disfunção endotelial crônica que afeta vasos de todos os calibres, além de hipercoagulabilidade que justificam a vasculopatia macroscópica que podem provocar AVE e hipertensão pulmonar. Epidemiologia: A anemia falciforme é uma doença genética de condição hereditária mais predominante no Brasil e no mundo. Por ser de origem africana, a doença falciforme é mais prevalente (mas não é exclusiva) em pretos e pardos. Estima-se que no Brasil existam cerca de 60.000 pessoas com anemia falciforme. Herança genética: Padrão normal: A constituição genética humana é determinada pela expressão de pares de genes alelos, herdados um alelo do pai e outro da mãe. No caso da hemoglobina A (HB A) considerada normal, os genes que codificam as frações beta da hemoglobina, herdados dos pais, estão em homozigose e resultam no padrão Hb AA Traço falciforme: A presença de apenas um alelo da globina beta A, combinado com outro alelo da globina beta S, apresenta um padrão genético AS (heterozigose) que não produz manifestações da doença falciforme, sendo o indivíduo caracterizado como portador de traço falciforme (TF).A identificação da condição de portador de traço falciforme é importante para sua orientação genética e de sua família.Quando um dos pais for portador de TF, em cada gestação o casal terá 50% de probabilidade de ter filho com o gene Hb AA (normal) e 50% de ter filho com o gene Hb AS (portador de TF). Doença falciforme: O padrão da herança genética da doença falciforme é autossômico recessivo.A doença falciforme é um termo utilizado para denominar um grupo de alterações genéticas caracterizadas pela presença do gene da globina beta S em homozigose (SS), em heterozigose com outras variantes (SC, SD, SE) ou em interação com a talassemia beta. Para o nascimento de uma criança com a doença falciforme é necessário que ela tenha recebido do pai e da mãe a herança do gene alterado. A cada gestação, um casal com traço falcêmico terá 25% de probabilidade de ter filho com o gene normal (Hb AA), 50% com o gene Hb AS (traço falciforme) e 25% com o gene Hb SS (doença falciforme) maite Highlight maite Highlight maite Highlight maite Highlight maite Highlight maite Highlight Fisiopatologia: As hemoglobinas humanas são compostas por quatro cadeias de aminoácidos conhecidas por globina. Essas 4 subunidades formam uma estrutura globular tetramérica com duas cadeias do tipo alfa globina e duas do tipo beta globina. Na anemia falciforme o gene estrutural que codifica a cadeia beta da hemoglobina apresenta uma mutação que é responsável pela codificação de HB S - que é uma hemoglobina com alteração estrutural da cadeia globina beta. Essa alteração ocorre pela substituição de uma base nitrogenada, a adenina (A) pela timina (T) causando uma alteração fenotípica. Assim a sequência guanina - adenina- guanina (G-A-G) passa a ser guanina- timina - guanina (G-T-G). Dessa forma, a valina será codificada ao invés do ácido glutâmico, na posição 6 da cadeia B-globina produzindo a hemoglobina S (HbS). Essa pequena modificação estrutural é responsável por profundas alterações nas propriedades físico-químicas da molécula da hemoglobina no estado desoxigenado. Elas levam a falcização que seria a mudança da forma normal da hemácia para a forma de foice. O processo primário desse evento é a polimerização (aglomeração de pequenas moléculas) . A troca do ácido glutâmico pela valina resulta na perda de eletronegatividade e ganho de hidrofobicidade, nesse caso a menor carga elétrica da cadeia Bs aliada a repulsa pela água gera uma tendência a autoagregação que culmina na formação de polímeros de hemoglobina S no interior do citoplasma, esses polímeros alteram o formato da célula e prejudicam sua deformabilidade. A falcização dos eritrócitos ocorre pela polimerização reversível da Hb S dentro da célula em condição de desoxigenação. Quando em completa desoxigenação formam-se células em forma de foice, clássicas da doença falciforme. Este fenômeno é reversível com a oxigenação, desde que a membrana da célula não esteja definitivamente alterada. Quando isto ocorre formam-se os eritrócitos irreversivelmente falcizados, que permanecem deformados independentemente do estado da Hb S intracelular. Esses eritrócitos falciformes são rígidos e com menor capacidade de deformidade, dificultando a circulação sanguínea, provocando vaso-oclusão e infarto na área afetada (isquemia, dor, necrose e disfunções do órgão).Após a reoxigenação, o polímero se desfaz, e a célula volta ao normal, contudo, após vários processos de falcização, as hemácias tornam-se definitivamente lesadas. Vários processos podem influenciar na falcização: ● Desoxigenação ● Temperatura ● Desidratação ● Acidose ● Concentração de HBs intraeritrocitária Obs: O HbF (hemoglobina fetal) possui um efeito sobre a polimerização da HbS, pois ela age bloqueando a polimerização da HbS. Isso acontece pois o HbF possui alta afinidade pelo oxigênio, logo quanto mais HbF dentro das hemácias, maior a quantidade de oxigênio. Porque essa hemoglobina é formada por duas cadeias alfa e duas cadeias gama. maite Highlight maite Highlight maite Highlight maite Highlight maite Highlight maite Highlight maite Highlight Hemólise crônica: Os drepanócitos também são responsáveis pela hemólise crônica, devido às alterações estruturais, ocorre retirada da circulação pelo sistema macrofágico. Com isso, o corpo entende que aquelas alterações são defeitos e procura destruir as hemácias , gerando a hemólise. Manifestações clínicas: As manifestações clínicas da doença falciforme podem variar entre as pessoas com a doença e na própria pessoa. Os sintomas podem começar a aparecer ainda no primeiro ano de vida, mostrando a importância do diagnóstico precoce como uma medida protetiva na vida dessas pessoas. Sendo uma doença crônica ela possui sinais e sintomas que comprometem a vida de pessoa com a doença. Os sintomas mais comuns de uma pessoa com anemia falciforme são anemias, crises de dor, as infecções recorrentes e a icterícia. Anemia: Causada pela redução do número de eritrócitos, alterações do seu formato e na sua função e diminuição da hemoglobina e hematócrito. É identificada por, cansaço, fraqueza, indisposição, palidez. Crises de dor: São causadas pelo processo de vaso-oclusão costumam durar de 4 a 6 dias, e ocorrem nos braços, pernas, articulações entre outros locais. Alguns fatores são desencadeantes, como: ● diminuição dos níveis de oxigênio no sangue (hipóxia); ● infecções; ● febre; ● desidratação; ● perda de temperatura corporal; ● exposição prolongada ao frio; ● atividade física extenuante; ● estresse emocional Na maioria das crianças a primeira manifestação de dor decorre de um processo inflamatório que provoca inchaço nos tornozelos, nos punhos, nos dedos ou nas articulações. Esses sinais são conhecidos como síndrome mão-pé ou dactilite. Infecções recorrentes: Na doença falciforme, os episódios frequentes de vaso-oclusão lesionam o baço, levando à atrofia e à diminuição da sua funcionalidade (asplenia funcional). Isso faz com que o organismo da pessoa com a doença fique mais sujeito às infecções. Pneumonias,infecções renais e osteomielites também ocorrem com muita frequência, tanto em crianças quanto em adultos com doença falciforme. Em crianças com doença falciforme, a ocorrência de infecção disseminada maite Highlight maite Highlight maite Highlight maite Highlight (septicemia ou sepse) é mais frequente. Os episódios de febre devem, portanto, ser encarados como situações de risco, nas quais os procedimentos diagnósticos precisam ser aprofundados e a terapia deve ter início imediato. Icterícia: Ocorre em função do aumento da hemólise e do consequente excesso de bilirrubina na circulação, aumentando a pigmentação amarelada da pele e da parte branca dos olhos (esclerótica) Sequestro esplênico: Trata-se de um quadro agudo decorrente do aumento da funcionalidade do baço (na tentativa de eliminar o excesso de células falcizadas), da hemólise acentuada e da quantidade de sangue que o órgão retira de circulação. Isso faz com que o baço aumente rapidamente de volume e ocorra queda súbita do nível de hemoglobina, além de diminuição do volume de sangue circulante, com risco de choque hipovolêmico e morte. Síndrome torácica aguda: • É uma das complicações mais graves da doença. • Manifesta-se com um quadro de febre alta, taquipneia, dor torácica, leucocitose e infiltrado pulmonar. • Sua gênese é multifatorial, predominando a infecção pulmonar na criança e o infarto pulmonar no adulto. • Classicamente, o agente infeccioso mais comum é o S. pneumoniae. • O paciente pode evoluir de forma grave, com hipoxemia e insuficiência respiratória. • Além do fenómeno vaso-oclusivo propriamente dito e da infecção bacteriana, outros mecanismos de dor torácica e taquidispnéia súbitos podem ser a embolia gordurosa (decorrente do infarto ósseo), o tromboembolismo pulmonar e o infarto costal. Tto: analgesia, sumplementaçção de O2 (paciente falcêmico com febre = interna), antibioticoterapia empírica e transfusão de troca parcial (Ht>25 – Ht3 crises vaso-oclusivas, STA, priapismo, anemia grande sintomática). Aumenta a HbF, diminui morbidade e proporciona aumento da sobrevida. Profilaxia: Vacinação contra pneumococo + Uso profilático de Penicilina V oral (2-3 meses pelo menos até os 5 anos), Hidratação, dieta adequada, oxigenoterapia, analgesia - crises vaso-oclusivas. Tratamento das crises álgicas vaso oclusivas com hidratação vigorosa (3 a 4 litros por dia), de preferência, por via parenteral, associada à opiáceos. Hemotransfusão: A transfusão de concentrados de hemácias tem como objetivo diminuir o percentual de hemácias com HbS parahiperplasia adrenal congênita, hipotireoidismo e fibrose acústica. Em casos de realização do teste do pezinho que funciona como um pré-diagnóstico e identifica a presença de HbS, pede-se a eletroforese de hemoglobina para verificar anemia falciforme ou traço. Vantagens: • Diagnóstico precoce; • Tratamento; • Acompanhamento das crianças diagnosticadas com doença falciforme; • Oferta de informação e orientação genética; • Oferta de aconselhamento genético. Referências: Doenças falciforme conhecer para cuidadar - Ministério da saúde Manual de diagnóstico e tratamento de doença falciforme agência nacional de vigilancia sanitária Tratado de hematologia Manual de hematologia