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Apontamentos em ana´lise complexa Lu´ıs V. Pessoa 1 de Maio de 2008 1 O pensamento e´ forma particular da liberdade. O autor dedica o decorrente texto aos indiv´ıduos empenhados na protecc¸a˜o dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais. Conteu´do Prefa´cio 5 1 Nu´meros complexos 7 1.1 Estrutura alge´brica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 1.2 Coordenadas polares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10 1.3 Radiciac¸a˜o e polino´mios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 1.4 Me´trica do plano complexo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 2 Func¸o˜es anal´ıticas 21 2.1 Se´ries nume´ricas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 2.2 Se´ries de poteˆncias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 2.3 Func¸o˜es trigonome´tricas e exponencial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44 2.4 Func¸o˜es inversas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 3 Holomorfia 51 3.1 Func¸o˜es C-diferencia´veis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51 3.2 Integrais de linha e func¸a˜o I´ndice . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64 3.3 Fo´rmula de Pompieu . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72 3.4 Fo´rmulas integrais de Cauchy e fo´rmula de Taylor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77 4 O teorema dos res´ıduos 91 4.1 Se´ries de Laurent e teorema dos res´ıduos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91 4.2 Zeros e singularidades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 98 4.3 Integrais de varia´vel real. Integrais impro´prios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102 4.4 Transformada de Laplace . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109 Resoluc¸o˜es, Sugesto˜es e Soluc¸o˜es 115 5 Func¸o˜es Harmo´nicas 117 I´ndice . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 124 I´ndice de s´ımbolos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 126 Prefa´cio A preparac¸a˜o do decorrente texto motivou-se na intenc¸a˜o de fornecer apontamentos de apoio aos alu- nos da disciplina de Ana´lise Complexa e Equac¸o˜es Diferenciais, inclusa nos diversos planos curriculares dos cursos de licenciatura ou mestrado integrado po´s-Bolonha do Instituto Superior Te´cnico e sobre alc¸ada da responsabilidade do autor. Na˜o obstante, optou-se por exposic¸a˜o de forma a prever adi- tamentos futuros e ta˜o simplesmente o seu actual conteu´do resume-se ao conteu´do programa´tico de ana´lise complexa da disciplina mencionada. O desenvolvimento de esforc¸os na redacc¸a˜o do actual texto razoa-se na grande parte em inabilidade do autor em encontrar textos de ana´lise complexa elementar abrangendo o conteu´do programa´tico acima referido e com discorrer semelhante ao abaixo, ta˜o bem quanto na profunda crenc¸a que manteˆm nas vantagens cient´ıfico-pedago´gicas em apresentar as func¸o˜es anal´ıticas enquanto elementos com a regularidade induzida da ana´lise real e no nu´cleo do operador de derivac¸a˜o em ordem a z. Apo´s uma ine´rcia inicial por parte do aluno, com facilidade entende que as regras de derivac¸a˜o dos operadores ∂z e ∂z sa˜o em todo ana´logas a`s que aprendeu a utilizar na ana´lise real e encarando as varia´veis z e z como varia´veis independentes. Em tal contexto a holomorfia apresenta-se aos alunos na forma de independeˆncia da varia´vel conjugada. O autor na˜o assume conhecimentos pre´vios em se´ries nume´ricas ou se´ries de poteˆncias. Assume- se o conhecimento das derivadas das func¸o˜es trigonome´tricas e func¸a˜o exponencial de varia´vel real, eventualmente introduzidas por interme´dio de integrais indefinidos. Em consequeˆncia da definic¸a˜o de exponencial de varia´vel complexa deduz-se tratar-se de generalizac¸a˜o da exponencial de varia´vel real e obteˆm-se os desenvolvimentos em se´rie de poteˆncias das func¸o˜es de varia´vel real. Excluindo o desenvolvimento de func¸o˜es de va´rias varia´veis reais em fo´rmula de Taylor ou em se´rie de Taylor, assumem-se conhecidas as te´cnicas de ca´lculo diferencial e integral de func¸o˜es dependentes de varia´veis reais e normalmente inclusas nos cursos de ca´lculo em engenharia. Os exerc´ıcios propostos servem a intenc¸a˜o em facilitar ao leitor o acompanhamento das diversas mate´rias. Pretende-se distribuir os diversos problemas em diversos graus de dificuldades de resoluc¸a˜o. Da frase anterior na˜o se deve inferir qualquer algoritmo ou habilidade do autor na seriac¸a˜o dos ditos problemas em distintos graus de dificuldade. Em contra´rio, confessa inabilidade em com seriedade propor alguma poss´ıvel seriac¸a˜o, tanto quanto profunda crenc¸a de que o reconhecimento do grau de dificuldade de determinado problema constitui per si um problema que o leitor devera´ assumir, com evi- dentes vantagens pedago´gicas, razoam a auseˆncia de sinalizac¸a˜o de quaisquer das poss´ıveis ordenac¸o˜es referidas. Tal como qualquer outro problema, certamente que o anterior revelara´ distintas soluc¸o˜es e em cada uma encontrar-se-a´ o preza´vel cunho pessoal. A notac¸a˜o utilizada e´ a normalmente aceite no discorrer dos conteu´dos comuns a`s disciplinas de ana´lise elementar. Cumpre no entanto as seguintes observac¸o˜es. Com frequeˆncia considera´vel utilizamos a simbologia ”:=”com objectivos em indicar que em sua utilizac¸a˜o procede-se a uma definic¸a˜o, precisa- mente define-se o lado esquerdo do sinal ”:=”atrave´s do respectivo lado direito. Inclu´ımos o nu´mero real ”zero”no conjunto dos nu´meros naturais e que denotamos por N, i.e. N = {0, 1, · · · } . Para indicar o conjunto dos naturais superior ou iguais a um dado natural fixo j usamos o s´ımbolo Nj , i.e. Nj = {j, j + 1, · · · }. Quaisquer outros comenta´rios acerca questo˜es de notac¸a˜o e considerados necessa´rios ao discorrer objectivo do texto, encontrar-se-a˜o nas secc¸o˜es sequentes. 5 Cap´ıtulo 1 Nu´meros complexos 1.1 Estrutura alge´brica Identificamos o conjunto dos nu´meros complexos C com o conjunto dos pares ordenados de nu´meros reais R2 = {(x, y) : x, y ∈ R} , munido com a soma vectorial usual e o produto introduzido abaixo, i.e. C = (R2,+, .) aonde (x1, y1) + (x2, y2) = (x1 + x2, y1 + y2) , xj , yj ∈ R, j = 1, 2 (x1, y1).(x2, y2) = (x1x2 − y1y2, x2y1 + x1y2) , xj , yj ∈ R, j = 1, 2 . (1) O conjunto dos nu´meros reais R e´ identificado, por interme´dio da aplicac¸a˜o R ∋ x → (x, 0) ∈ C, com o subconjunto de R2 dado por {(x, 0) : x ∈ R} . Sem dificuldades, das definic¸o˜es em (1) obte´m-se x1 + x2 → (x1, 0) + (x2, 0) e x1x2 → (x1, 0)(x2, 0) quaisquer que sejam x1, x2 ∈ R. Logo, as tabuadas de multiplicac¸a˜o e adic¸a˜o de nu´meros reais deduzem-se, por interme´dio da aplicac¸a˜o atra´s definida, das tabuadas das operac¸o˜es introduzidas em (1). A unidade para o produto de nu´meros reais e´ uma unidade para o produto de nu´meros complexos, i.e. 1.(x, y) = (1, 0).(x, y) = (x, y) , x, y ∈ R. (2) Os elementos do conjunto {(0, y) : y ∈ R} ⊂ C sa˜o designados nu´meros complexos imagina´rios puros. Definindo a unidade imagina´ria i := (0, 1) obtemos iy = (0, 1)(y, 0) = (0, y), y ∈ R e logo o conjunto dos imagina´rios puros e´ dado por iR e os nu´meros complexos sa˜o representados atrave´s de x+ iy := (x, y) , x, y ∈ R. Se z ∈ C definimos respectivamente Re z e Im z, a parte real e imagina´ria de z, como os u´nicos nu´meros reais x ∈ R e y ∈ R tais que z = x+ iy. As operac¸o˜es definidas em (1) sa˜o reescritas da forma zw = (Re zRew − Im z Imw) + i(Im zRew + Re z Imw) , z, w ∈ C z + w = (Re z + Rew) + i(Im z + Imw), z, w ∈ C . Como sabemos do estudo de espac¸os vectoriais elementares, o conjunto C munido com a soma de vectores em R2 teˆm a estrutura de grupo comutativo, i.e. ∀zj∈C, j=1,2,3 (z1 + z2) + z3 = z1 + (z2 + z3) associatividade; ∀zj∈C, j=1,2 z1 + z2 = z2 + z1 comutatividade; ∃0∈C ∀z∈C z + 0 = z existeˆncia de elemento neutro; ∀z∈C ∃w∈C z + w = 0 existeˆncia de sime´trico. (3) 8 1.1. Estrutura alge´brica Da definic¸a˜o (1) e sem dificuldades conclui-se ∀zj∈C, j=1,2,3 (z1z2)z3 = z1(z2z3) associatividade; ∀zj∈C, j=1,2 z1z2 = z2z1 comutatividade; ∀zj∈C, j=1,2,3 (z1 + z2)z3 = (z1z3) + (z2z3) distributividade. (4) Considerando o grupo comutativo C munido com a multiplicac¸a˜o por escalares R× C ∋ (x, z) → x.z definida em (1), obtemos que C e´ um espac¸o vectorial sobre R de dimensa˜o 2 e a multiplicac¸a˜o por escalares em C coincide com a multiplicac¸a˜o por escalares induzida de R2. E´ usual representar os espac¸os vectoriais bi-dimensionais sobre R por interme´dio do conjunto dos ponto do plano, munido com as operac¸o˜es usuais de soma de vectores e multiplicac¸a˜o de vectores por escalares. Designamos o referido plano por plano complexo. R iR - 6 z ¢ ¢ ¢¸ ©© © ©© ©* w¢ ¢ ¢ ¡ ¡ ¡ ¡¡µ z + w Figura 1.1: Adic¸a˜o de vectores E´ portanto legitimo considerar em C a estrutura me´trica induzida da norma euclidiana em R2, i.e. consideramos a distaˆncia a` origem de z ∈ C dada por |z| := √ (Re z)2 + (Im z)2 , z ∈ C. Tendo em conta as propriedades (4) e a igualdade i2 = i.i = (0, 1)(0, 1) = (−1, 0) = −1 e´ imediato verificar que (Re z + i Im z)(Re z − i Im z) = (Re z)2 − (i Im z)2 = |z|2. (5) O nu´mero complexo Re z − i Im z e´ designado por conjugado de z e e´ denotado por z. No plano complexo, z coincide com a reflexa˜o de z no eixo real e e´ evidente que z = z, z ∈ C. - 6 R iR z ¡ ¡ ¡µ z @ @ @R Figura 1.2: Conjugac¸a˜o Como |z| e´ a distaˆncia euclidiana do vector (Re z, Im z) a` origem enta˜o |z| = 0 sse Re z = Im z = 0 sse z = 0, (6) Lu´ıs V. Pessoa Nu´meros complexos 9 e segue, tendo em conta (5), que z z |z|2 = 1 e logo zw = 1, aonde w = z |z|2 , z ∈ C, z 6= 0. Considerando (2) obtivemos ∀z∈C, z 6=0 z.1 = z existeˆncia de unidade; ∀z∈C, z 6=0 ∃w∈C zw = 1 existeˆncia de inverso. (7) Por analogia com a ana´lise real, o inverso multiplicativo dum nu´mero complexo z na˜o nulo, e´ denotado por 1/z. Porque (C,+, .) verifica as propriedades (3), (4) e (7) diz-se um corpo, usualmente designado por corpo dos nu´meros complexos. Resumimos algumas propriedades importantes da operac¸a˜o de conjugac¸a˜o z = Re z − i Im z , Re z = z + z 2 , Im z = z − z 2i , zz = |z|2 e 1 z = z |z|2 . A operac¸a˜o de conjugac¸a˜o e´ aditiva, i.e. z + w = z + w. Em relac¸a˜o ao conjugado do produto, e´ evidente que xz = xz , x ∈ R, z ∈ C e iz = −iRe z − Im z = −iz , z ∈ C, e, porque o conjugado da soma e´ a soma dos conjugados, obte´m-se zw = z w , z, w ∈ C. Da equac¸a˜o anterior infere-se |zw|2 = (zw)(zw) = (zw)(z w) = (zz)(ww) = |z|2|w|2 , z, w ∈ C, e logo |zw| = |z||w| e |z| = |z|. (8) 1.1 Problemas 1. Considere nu´meros complexos z, w ∈ C nas condic¸o˜es indicadas e demonstre as seguintes igualdades i) Re(xz) = xRe z , x ∈ R ; ii) Im(xz) = x Im z , x ∈ R ; iii) Re z = Im(iz) ; iv) Im z = Re( z i ) ; v) 2zRe z = |z|2 + z2 ; vi) i 2z Im z = z2 − |z|2 ; vii) Re 1 + z 1− z = 1− |z|2 |1− z|2 , z 6= 1 ; viii) Im 1 + z 1− z = 2 Im z |1− z|2 , z 6= 1 ; ix) |z − w|2 = |z|2 + |w|2 − 2Re(zw) ; x) 2 Im z Imw = Re(zw)− Re(zw) ; xi) 2 Re zRew = Re(zw) + Re(zw) ; xii) 2 Re z Imw = Im(zw) + Im(zw) . 2. Verifique a seguinte igualdade in = 1 + (−1)n 2 (−1)n2 + i1− (−1) n 2 (−1)n−12 , n ∈ N. Lu´ıs V. Pessoa 10 1.2. Coordenadas polares 3. Estabelec¸a uma prova das seguintes desigualdades i) ||z| − |w|| ≤ |z − w| ; ii) |Re z| ≤ |z| ≤ |Re z|+ | Im z| ; iii) |z − w|2 ≤ (1 + |z|2)(1 + |w|2) ; iv) 2| Im z| ≤ |1− z2| ; v) 2|Re z| ≤ |1 + z2| ; vi) 2|z| ≤ |1 + z2|+ |1− z2| . para quaisquer que sejam z, w ∈ C. 1.2 Coordenadas polares Se z e´ um nu´mero complexo no circulo unita´rio, enta˜o existe θ ∈ R tal que z = cos θ+ i sin θ. Definimos E(iθ) = cos θ + i sin θ , θ ∈ R. Das seguintes fo´rmulas para func¸o˜es trigonome´tricas de varia´vel real cos (θ + ϕ) = cos θ cosϕ− sin θ sinϕ sin (θ + ϕ) = sin θ cosϕ+ cos θ sinϕ , obtem-se E(iθ) E(iϕ) = (cos θ + i sin θ)(cosϕ+ i sinϕ) = (cos θ cosϕ− sin θ sinϕ) + i(sin θ cosϕ+ cos θ sinϕ) = cos (θ + ϕ) + i sin (θ + ϕ) = E(i(θ + ϕ)) , i.e. E(iθ) E(iϕ) = E(i(θ + ϕ)) , θ, ϕ ∈ R. (1) Em particular E(ikθ) = E(i(k − 1)θ) E(iθ) , k ∈ N1. Por induc¸a˜o matema´tica infere-se que E(ikθ) = Ek(iθ) , k ∈ N. (2) Tendo em linha de conta a identidade fundamental da trigonometria cos2 θ + sin2 θ = 1 i.e. |E(iθ) | = 1 , θ ∈ R obte´m-se E(iθ) = E−1(iθ) = E(−iθ) . (3) Em consequeˆncias, (2) e´ va´lido para k ∈ Z, i.e. sa˜o va´lidas as fo´rmulas de Moivre E(ikθ) = Ek(iθ) , k ∈ Z. (4) A func¸a˜o polivalente Arg z = { θ ∈ R : E(iθ) = z|z|−1} , z ∈ C\ {0} , diz-se a func¸a˜o argumento. Atentando a (1) e (3), o leitor na˜o encontrara´ dificuldade em verificar as seguintes propriedades Arg (zw) = Arg z + Argw , Arg 1 z = −Arg z , Arg z = −Arg z , z, w ∈ C\ {0} . Da igualdade (1) e de |E(iθ) | = 1 , θ ∈ R segue que |E(iθ) − E(iϕ) | = ∣∣∣∣E(iθ + ϕ2 ) ( E(i θ − ϕ 2 ) − E(iϕ− θ 2 ) )∣∣∣∣ = 2∣∣∣∣sin θ − ϕ2 ∣∣∣∣ . Lu´ıs V. Pessoa Nu´meros complexos 11 Como sin(x) = 0, x ∈ R sse x = kπ, k ∈ Z e da igualdade anterior deduz-se que as func¸o˜es tri- gonome´tricas de varia´vel real sa˜o perio´dicas de per´ıodo 2π (facto bem conhecido) e que a func¸a˜o θ → E(iθ) e´ injectiva em qualquer intervalo semi-aberto de comprimento inferior ou igual a 2π. Em particular, se θ, ϕ ∈ Arg z , z 6= 0 enta˜o existe k ∈ Z que verifica θ − ϕ = 2kπ. Logo Arg z = {θ + 2kπ : k ∈ Z} , qualquer que seja θ ∈ Arg z. Conclui-se que a func¸a˜o argumento principal arg : C\ {0} → ]− π, π ] , arg z = θ se Arg z ∩ ]− π, π ] = {θ} , esta´ bem definida e Arg z = { arg z + 2kπ : k ∈ Z} , z 6= 0. Cada nu´mero complexo na˜o nulo z ∈ C\ {0} tem uma representac¸a˜o polar u´nica, i.e. existem u´nicos r > 0 e θ ∈ ] − π, π ] tais que z = rE(iθ) , precisamente r = |z| e θ = arg z. Diz-se que o par ordenado (r, θ) sa˜o as coordenadas polares do nu´mero complexo z. Para terminar, anotamos a arbitrariedade da escolha do intervalo ] − π, π ] , para definir a func¸a˜o argumento principal e que qualquer outro intervalo de R semi-aberto de comprimentos 2π serviria a` boa definic¸a˜o de argumento principal e a` unicidade da representac¸a˜o polar. R iR z - 6 ¡ ¡ ¡µ ¡ ¡ ¡µ θ I Figura 1.3: Representac¸a˜o polar As coordenadas polares permitem estabelecer uma interpretac¸a˜o geome´trica da multiplicac¸a˜o de nu´meros complexos. De facto, a multiplicac¸a˜o do nu´mero complexo z, por determinado complexo unita´rio ξ, corresponde no plano complexo, a` rotac¸a˜o de aˆngulo arg ξ, do vector correspondente ao nu´mero complexo z. Ξ z z Ξ Θ Θ 1 Figura 1.4: Multiplicac¸a˜o por nu´meros complexos unita´rios Lu´ıs V. Pessoa 12 1.2. Coordenadas polares 1.2 Problemas 1. Mostre as seguintes igualdades: i) [ E(−iθ) − E(iθ) ]2 = −|1− E(i2θ) |2 ; ii) [ E(−iθ) + E(iθ) ]2 = |1 + E(i2θ) |2 ; iii) 1 + E(i2θ) = 2 cos(θ) E(iθ) ; iv) |1− E(i2θ) |2 = 4 sin2(θ) ; v) E(iθ) + E(iϕ) = 2 cos( ϕ− θ 2 ) E(i θ + ϕ 2 ) ; vi) |z − E(iθ) | = |1− z E(iθ) | . para quaisquer que sejam θ, ϕ ∈ R. 2. Mostre a seguinte desigualdade |1− E(iθ) | θ ≥ 2 π , θ ∈ ] 0, π ] . e fornec¸a uma interpretac¸a˜o geome´trica no plano complexo. Sugesta˜o: Note que a asserc¸a˜o e´ equivalente a sin θ2 ≥ θ π ; 0 < θ ≤ π, e em seguida estude o sinal de f ′(θ) aonde f(θ) = sin θ 2 − θ π ; 0 < θ ≤ π . 3. Tendo em conta que 1 + · · ·+ zn−1 = 1− z n 1− z , z 6= 1, n ∈ N1 demonstre as seguintes igualdades: i) n∑ j=0 E(−ijθ) 1− E(iθ) + n∑ j=0 E(ijθ) 1− E(−iθ) = [ sin (n + 1) θ 2 sin θ 2 ]2 ; ii) n∑ j=−n E(−ijθ) 1− E(iθ) + n∑ j=−n E(ijθ) 1− E(−iθ) = sin (2n + 1) θ 2 sin θ 2 ; para θ ∈ R tal que θ 6= 2kπ, k ∈ Z. 4. Tendo em conta as fo´rmulas de Moivre, mostre que: i) cosnθ = cosn θ − (n 2 ) cosn−2 θ sin2 θ + · · · ii) sinnθ = n cosn−1 θ sin θ − (n 3 ) cosn−3 θ sin3 θ + · · · 5. Calcule os argumentos principais dos seguintes nu´meros complexos: i) (√ 3 + i )17 ; ii) (1 + i)12 ; iii) (1 + i)13 ; iv) (2− i√12)31 ; v) − (2i +√12)31 ; vi) (i√3− 1)17(2− i√12)31 ; vii) (1 + i)13 (i− 1)12 ; viii) (√ 3 + i 1 + i )12(√ 3 + i )5 . 6. Seja z = |z|E(iθ) , θ ∈ R e suponha θ/π = p/d, aonde p, d ∈ N1 sa˜o primos entre si. Se q e r sa˜o respectivamente o cociente e o resto da divisa˜o de p por d i.e. p = qd+ r com q, r ∈ N e r = 0, · · · , d− 1 enta˜o arg z = π r d − (1− (−1)q)π 2 , z 6= 0 . 7. i) Verifique as seguintes igualdades entre conjuntos Arg (zw) = Arg z + Argw , Arg 1 z = −Arg z , Arg z = −Arg z , z, w ∈ C\ {0} . Lu´ıs V. Pessoa Nu´meros complexos 13 ii) Encontre exemplos de nu´meros complexos z e w tais que arg (zw) 6= arg z + argw , arg 1 z 6= − arg z , arg z 6= − arg z , z, w ∈ C\ {0} . 8. Considere a func¸a˜o sinal sgn : R\ {0} → {−1, 0, 1} definida por sgn (x) = { 1 , x > 0 −1 , x < 0 . Verifique a validade da seguinte igualdade arg (xz) = arg z − π 2 sgn ( arg z)(1− sgnx) , x ∈ R\{0}, z ∈ C\R+0 . Finalmente mostre que arg z 6= − arg z sse arg 1 z 6= − arg z sse z ∈ R−. 9. Seja arctanx a inversa da restric¸a˜o da func¸a˜o tan x ao intervalo ]− π/2, π/2 [ . Verifique que arg z = arctan y x + π 2 (1− sgnx) sgn y para z = x + iy, x, y ∈ R e x 6= 0. 1.3 Radiciac¸a˜o e polino´mios Estudamos de seguida a operac¸a˜o de radiciac¸a˜o, i.e. fixos n ∈ N2 e w ∈ C\ {0} procuramos as soluc¸o˜es da equac¸a˜o zn − w = 0. Tendo em conta as fo´rmulas de Moivre e as representac¸o˜es z = rE(iθ) e w = ρE(iϕ) , obtemos rn E(inθ) = ρE(iϕ) e´ equivalente a r = n √ ρ θ = ϕ n + k 2π n , k ∈ Z . (1) Em (1) obtivemos as ra´ızes de ordem n de w indexadas em Z, precisamente as ra´ızes de ordem n de w = ρE(iϕ) sa˜o dados por zk = n √ ρE(iθk) aonde θk = ϕ n + k 2π n e k ∈ Z. (2) De seguida mostramos que existem n ra´ızes distintas. Da igualdade zk+n = n √ ρE(iθk+n) = zk E(i2π) = zk, obte´m-se que a sucessa˜o bilateral zk , k ∈ Z e´ perio´dica de per´ıodo n, i.e. zk+n = zk, para qualquer que seja k ∈ Z. Embora de caracter elementar, demonstra-se abaixo que o conjunto dos termos de qualquer sucessa˜o bilateral zk , k ∈ Z perio´dica com per´ıodo n, e´ um conjunto finito com no ma´ximo n elementos. Lema 1 Seja zk, k ∈ Z uma sucessa˜o bilateral com per´ıodo n. Enta˜o, o conjunto dos seus termos verifica {zk : k ∈ Z} = {zl, zl+1, · · · , zl+n−1} , para qualquer que seja l ∈ Z . Lu´ıs V. Pessoa 14 1.3. Radiciac¸a˜o e polino´mios Demonstrac¸a˜o: Para k ∈ Z e m ∈ N1 e´ sucessivamente evidente que zk+mn = zk+(m−1)n = · · · = zk e zk−mn = z(k−mn)+mn = zk . Com objectivo em considerar exclusivamente o algoritmo de divisa˜o de nu´meros naturais, consideramos separadamente os casos k ≥ 0 e k < 0, para demonstrar que para qualquer k ∈ Z o termo zk coincide com algum dos nu´meros z0, · · · , zn−1. Se k ∈ N e´ tal que k ≥ n, enta˜o existem naturais m ∈ N e 0 ≤ j < n tais que k = mn + j. Logo zk = zmn+j = zj com 0 ≤ j < n. Se −k ∈ N1 enta˜o −k = mn + j = (m + 1)n + (j − n), para determinados naturais m e 0 ≤ j < n. Conclui-se que zk = z−(m+1)n+(n−j) = zn−j e 0 < n − j ≤ n. Se j = 0 enta˜o zk = zn = z0. Em quaisquer dos casos zk , k ∈ Z coincide com algum dos nu´meros z0, · · · , zn−1. De novo considerando a periodicidade da sucessa˜o zk , k ∈ Z infere-se que o conjunto dos seus termos coincide com o conjunto de quaisquer n termos consecutivos. Se zk , k ∈ Z e´ a sucessa˜o bilateral das ra´ızes de ordem n de w, dada por (2), enta˜o verifica-se que θ0 < θ1 < · · · < θn−1 e θn−1 − θ0 < 2π . Tendo em conta a injectividade, em qualquer intervalo semi-aberto de comprimento 2π, da func¸a˜o θ → E(iθ) , infere-se que a sucessa˜o bilateral perio´dica zk, k ∈ Z possui n termos consecutivos dis- tintos. Logo, do Lema 1 deduz-se que o conjunto das ra´ızes de ordem n de w e´ um conjunto finito com exactamente n elementos, e que pode ser enumerado variando o ı´ndice k em (2), num conjunto arbitra´rio de n inteiros consecutivos. Escolhendo os n primeiros naturais, as ra´ızes de ordem n ∈ N2 sa˜o representadas por zk = n √ |w|E(iθk) aonde θk = argw n + k 2π n e k = 0, · · · , n− 1 . Anotamos que de seguida tornar-se-a´ evidente que um polino´mio de grau n teˆm no ma´ximo n zeros, asserc¸a˜o que se considerada acima reduziria os argumentos usados. Π 4 1 Figura 1.5: Ra´ızes oitavas da unidade Um polino´mio na varia´vel z e´ uma combinac¸a˜o linear finita de poteˆncias de z, i.e. p(z) diz-se um polino´mio, se existe n ∈ N e coeficientes ak ∈ C, k = 0, · · · , n tais que p(z) = n∑ k=0 akz k . Se an 6= 0, enta˜o o polino´mio p(z) diz-se um polino´mio de grau n, e o nu´mero natural n diz-se o grau de p(z). Lu´ıs V. Pessoa Nu´meros complexos 15 Dois polino´mios p(z) e q(z) sa˜o ideˆnticos se para qualquer que seja o nu´mero complexo z, verifica-se p(z) = q(z). De seguida demonstramos que p(z) = q(z) sse teˆm o mesmo grau e os coeficientes das respectivas poteˆncias de z sa˜o iguais, asserc¸a˜o usualmente designada por princ´ıpio de identidade entre polino´mios. Proposic¸a˜o 2 (Identidade de polino´mios) Considerem-se naturais n e m, e polino´mios p(z) e q(z) respectivamente dados por p(z) = n∑ k=0 akz k , a0, · · · , an ∈ C e q(z) = m∑ k=0 bkz k , b0, · · · , bm ∈ C. Enta˜o p(z) = q(z) sse n = m e a0 = b0, · · · , an = bn . Demonstrac¸a˜o: Mostramos por induc¸a˜o na soma graus dos polino´mios p e q, que n = m e an = bn, · · · , a0 = b0. Se n+m = 0 enta˜o p(z) e q(z) sa˜o polino´mios constantes e a asserc¸a˜o e´ evidente. Supomos como hipo´tese de induc¸a˜o que se dois polino´mios c(z) e d(z) verificam c(z) = d(z), e a soma dos seus graus e´ inferior ou igual a n+m− 1 enta˜o os graus e os respectivos coeficientes de c(z) e d(z) coincidem. Porque p(0) = q(0) enta˜o a0 = b0 e consequentemente z(anz n−1 + · · ·+ a1) = z(bmzm−1 + · · ·+ b1). Logo anz n−1+· · ·+a1 = bmzm−1+· · ·+b1 e por hipo´tese de induc¸a˜o n−1 = m−1 e an = bn, · · · , a1 = b1. Expo˜e-se de seguida um resultado assegurando a possibilidade de divisa˜o de polino´mios. O leitor devera´ atentar a que a demonstrac¸a˜o conte´m um algoritmo de ca´lculo dos polino´mios cociente e resto. Proposic¸a˜o 3 (Divisa˜o de polino´mios) Sejam p(z) e d(z) polino´mios, d(z) polino´mio na˜o constante. Enta˜o existem u´nicos polino´mios q(z) e r(z) tais que r(z) tem grau estritamente inferior ao grau de d(z) e p(z) = q(z)d(z) + r(z). Demonstrac¸a˜o: Iniciamos mostrando a unicidade dos polino´mios cociente e resto. Suponha-se p(z) = q1(z)d(z) + r1(z) = q2(z)d(z) + r2(z), aonde r1(z) e r2(z) sa˜o polino´mios de grau estritamente inferior ao grau de d(z). Enta˜o r1(z)− r2(z) = (q2(z)− q1(z))d(z). (3) Se q1 6= q2, infere-se de (3) que r1(z) − r2(z) e´ polino´mio de grau superior ou igual ao grau de d(z), o que e´ contradito´rio com as hipo´teses. Enta˜o q2(z) − q1(z) e´ o polino´mio nulo e em consequeˆncia r1(z) = r2(z), como quer´ıamos demonstrar. Se o grau de d(z) e´ superior ao grau de p(z) enta˜o considere-se q(z) = 0 e r(z) = p(z).Logo, sem perda de generalidade supomos p(z) = amz m + · · ·+ a0 e d(z) = bnzn + · · ·+ b0 , am 6= 0 6= bn ,m ≥ n , e procedemos por induc¸a˜o matema´tica no grau do polino´mio p(z). O polino´mio p1(z) = p(z)− am bn zm−nd(z) = (am−1 − ambn−1 bn ) zm−1 + · · · e´ bem definido e tem grau inferior a m. Por hipo´tese de induc¸a˜o existem polino´mios q1(z) e r1(z) tais que p1(z) = q1(z)d(z) + r1(z), Lu´ıs V. Pessoa 16 1.3. Radiciac¸a˜o e polino´mios e r1(z) teˆm grau inferior ao grau de d(z). Logo p(z) = (q1(z) + am bn zm−n)d(z) + r1(z). Terminamos a prova anotando a evideˆncia da asserc¸a˜o para o caso em que p(z) e´ polino´mio de grau 1. Os polino´mios q(z) e r(z) no enunciado da proposic¸a˜o anterior dizem-se respectivamente os po- lino´mios cociente e resto da divisa˜o de p(z) por d(z). Exemplos 1. Consideramos a divisa˜o do polino´mio p(z) = z4 − 1 por d(z) = z2 − i. E´ evidente que p(z) = (z2 + i)(z2 − i)− 2 . Logo q(z) = z2 + i e r(z) = −2 sa˜o respectivamente o cociente e o resto da divisa˜o de p(z) por d(z). No entanto, exemplificamos de seguida como o algoritmo apresentado na demonstrac¸a˜o da proposic¸a˜o 3 pode ser utilizado para calcular q(z) e r(z). Esquematicamente obtemos z4 − 1 | z2 − i−−−−− −(z4 − iz2) z2 −−−−−− iz2 − 1 e finalmente z4 − 1 | z2 − i−−−−− −(z4 − iz2) z2 + i −−−−−− iz2 − 1 −(iz2 + 1) −−−−−− −2 Se p(z) e´ polino´mio na˜o constante enta˜o qualquer que seja z1 ∈ C tem-se p(z) = (z − z1)p1(z) + r , aonde r = p(z1) e´ polino´mio constante. Conclui-se que p(z1) = 0 sse o polino´mio p factoriza-se na forma p(z) = (z − z1)p1(z). O nu´mero complexo z1 diz-se um zero do polino´mio p(z) com multiplicidade m, m ∈ N1 se p(z) = (z−z1)mq(z), aonde q(z) e´ polino´mio e q(z1) 6= 0. Do princ´ıpio de identidade entre polino´mios, deduz-se que um polino´mio de grau n teˆm no ma´ximo n zeros, contados de acordo com a sua multiplicidade. Defronte demonstraremos o teorema fundamental da a´lgebra (ver corola´rio [5 sec. 4.1]), de acordo com o qual todo o polino´mio na˜o constante admite um zero. Repetindo o argumento para o polino´mio p1 e assim sucessivamente, conclui-se que o teorema fundamental da a´lgebra e´ equivalente a` existeˆncia de nu´meros complexos z1, · · · , zk distintos dois a dois e naturais n1, · · · , nk tais que n1 + · · ·+ nk = n e p(z) = c(z − z1)n1 · · · (z − zk)nk , c ∈ C\(0), aonde n e´ o grau do polino´mio na˜o nulo p e o natural nj e´ a multiplicidade do zero zj , j = 1, · · · , k. E´ usual enunciar o teorema fundamental da a´lgebra dizendo que todo o polino´mio de grau n ∈ N1, tem n zeros contados de acordo com sua multiplicidade. Um polino´mio com coeficientes complexos p(z) diz-se redut´ıvel se e´ factorizado no produto de polino´mios na˜o constantes, i.e. se existem polino´mios na˜o constantes, com coeficientes complexos q1(z), q2(z) tais que p(z) = q1(z)q2(z). Se p(z) na˜o e´ redut´ıvel enta˜o diz-se irredut´ıvel. Do teorema fundamental a´lgebra e´ evidente que os polino´mios irredut´ıveis sa˜o precisamente os polino´mios de grau inferior ou igual a` unidade. Em analogia, introduzimos o conceito de redutibilidade nos polino´mios com coeficientes reais. Um polino´mio com coeficientes reais diz-se irredut´ıvel sobre R se na˜o e´ factorizado em polino´mios na˜o constantes com coeficientes reais, Lu´ıs V. Pessoa Nu´meros complexos 17 i.e. p(z) = anz n + · · · + a0, aj ∈ R, j = 0, · · · , n e´ irredut´ıvel sobre R se na˜o existem polino´mios na˜o constantes com coeficientes reais q1, q2 tais que p(z) = q1(z)q2(z). Mostra-se de seguida que o teorema fundamental da a´lgebra permitir classificar os polino´mios com coeficientes reais e irredut´ıveis sobre R. Suponha-se que p(z) e´ polino´mio de coeficientes reais e p(z1) = 0, z1 ∈ C. Das igualdades 0 = p(z1) = n∑ k=0 akz k 1 = p(z1), conclui-se que o conjunto dos seus zeros e´ invariante para conjugac¸a˜o, i.e. p(z1) = 0 sse p(z1) = 0. Logo, se p(z1) = 0, z1 = a+ ib, a, b ∈ R, b 6= 0 obte´m-se p(z) = (z − z1)(z − z1)q(z) = (z2 − 2az + a2 + b2)q(z) = [ (z − a)2 + b2] q(z). Dado que q(z) e´ polino´mio com coeficientes reais, aplicamos o mesmo procedimento ao polino´mio q(z), e assim sucessivamente, para obter que existem nu´meros reais a1, · · · , ak, b1, · · · , bk, bj 6= 0, j = 1, · · · , k e naturais n1, · · · , nk tais que p(z) = [ (z − a1)2 + b21 ]n1 · · · [(z − ak)2 + b2k]nk q0(z), (4) aonde q0(z) e´ um polino´mio so´ com zeros reais. Em particular, se p(z) e´ polino´mio de grau n com coeficientes reais e sem zeros reais enta˜o p(z) = [ (z − a1)2 + b21 ]n1 · · · [(z − ak)2 + b2k]nk . De (4), e´ imediato que os polino´mios com coeficientes reais e irredut´ıveis sobre R sa˜o os polino´mios de grau 1 com coeficientes reais e os polino´mios de graus 2 da forma (z − a)2 + b2 , a, b ∈ R aonde b 6= 0. Tambe´m de (4) infere-se que qualquer polino´mio de coeficientes reais na˜o constante, e´ o produto de poteˆncias naturais de polino´mios irredut´ıveis sobre R, i.e. se p(z) e´ polino´mio de coeficientes reais enta˜o existem a1, · · · , ak b1, · · · , bk e nu´meros reais x1, · · · , xj tais que p(z) = c [ (z − a1)2 + b21 ]n1 · · · [(z − ak)2 + b2k]nk (x− x1)m1 · · · (x− xj)mj , aonde k, j ∈ N , c ∈ C e b1 6= 0, · · · , bk 6= 0. 1.3 Problemas 1. Encontre as soluc¸o˜es das seguintes equac¸o˜es e represente-as no plano complexo: i) z3 = −i ; ii) z4 = −16 ; iii) z2 = 2 + i √ 12 ; iv) 2z4 = i √ 3− 1 ; v) z4 − (9 + 4i)z2 + 36i = 0 ; vi) 1 + iz − z2 − iz3 = 0 ; vii) 1− z + z2 − z3 + z4 − z5 = 0 ; viii) z2 + z2 − 2z + 1 = 0 ; ix) z3z2 − 5z2z + 6z = 0 ; x) z − zz2 + z2z3 − z3z4 = 0. 2. Diz-se que um nu´mero complexo ξ e´ uma ra´ız de ordem n , n ∈ N1 da unidade se ξn = 1. Denote o conjunto das ra´ızes de ordem n da unidade por Tn, i.e Tn := { E(ik 2π n ) : k = 0, · · · , n− 1 } . Verifique que fixo w ∈ C\ {0} , o conjunto das ra´ızes de ordem n de w e´ dado por n √ |w|E(i argw/n) Tn, i.e. e´ a dilatac¸a˜o de raza˜o n √ |w| da rotac¸a˜o de aˆngulo argw/n do conjunto Tn. Lu´ıs V. Pessoa 18 1.4. Me´trica do plano complexo 3. Mostre que o polino´mio 1 + z + · · · + zn na˜o teˆm ra´ızes reais, caso n seja par, e z = −1 e´ a u´nica ra´ız real (com multiplicidade 1) se n e´ ı´mpar. Ademais, e´ va´lida a seguinte factorizac¸a˜o 1 + z + · · ·+ zn = ( z2 − 2z cos ( 2π n + 1 ) + 1 )( z2 − 2z cos ( 2 2π n + 1 ) + 1 ) · · · ( z2 − 2z cos ( n 2π n + 1 ) + 1 ) . 4. Encontre os factores irredut´ıveis sobre R dos seguintes polino´mios: i) z3 − 3z2 + 4z − 2 ; ii) 4z4 − 2z2 − 6 ; iii) 4z4 + 6z2 + 3 ; iv) z4 + 16 ; v) z8 − 1 ; vi) 1− z2 + z4 − z6 . 5. Considere um polino´mio p(z) = anz n + · · · + a0 de grau n ∈ N1 e com coeficientes complexos tais que an−k = ak , k = 0, · · · , n. Mostre que p(0) 6= 0 e p(z) = zn p(1 z ). Em particular, p(z) = 0 sse p( 1 z ) = 0. 1.4 Me´trica do plano complexo A identificac¸a˜o natural das estruturas vectoriais de R2 e C, permite introduzir no corpo dos nu´meros complexos a me´trica induzida da distaˆncia euclidiana em R2. Se ‖(x, y)‖ , x, y ∈ R denota a norma euclidiana do vector (x, y) em R2, enta˜o consideramos o mo´dulo |z|, da u´nica forma tal que a aplicac¸a˜o R 2 ∋ (x, y) → x+ iy ∈ C e´ linear e isome´trica. Necessariamente, tem-se que |z| := ‖(x, y)‖ = √ x2 + y2 , z = x+ iy, (x, y) ∈ R2 . A distaˆncia entre complexos arbitra´rios C ∋ z = x+ iy ≡ (x, y) ∈ R2 e C ∋ w = u+ iv ≡ (u, v) ∈ R2, por definic¸a˜o e´ a distaˆncia do complexo z − w a` origem, i.e. |z − w| = ‖(x, y)− (u, v)‖ = √ (x− u)2 + (y − v)2 . Em consequeˆncia deduz-se da teoria dos espac¸os normados de dimensa˜o finita, subentendida de entre os domı´nios do leitor, que i) |z + w| ≤ |z|+ |w| , z, w ∈ C ; ii) |xz| = |x||z| , z ∈ C , x ∈ R ; iii) |z| = 0 sse z = 0 , z ∈C . No entanto, e incitando ao desenvolvimento de te´cnicas de ana´lise complexa, apresentamos de seguida argumentos distintos dos usuais em espac¸os de dimensa˜o finita. A propriedade ii) e´ uma caso particular de [8 sec. 1.1] e iii) e´ [6 sec. 1.1]. Quanto a i), tendo em conta a desigualdade |Re z| ≤ |z|, z ∈ C obte´m-se |z + w|2 = (z + w)(z + w) = |z|2 + |w|2 + 2 Re(zw) ≤ |z|2 + 2|z||w|+ |w|2 = (|z|+ |w|)2, e logo e´ va´lida a desigualdade triangular |z + w| ≤ |z|+ |w|, z, w ∈ C. Da desigualdade triangular deduz-se |z| = |(z − w) + w| ≤ |z − w|+ |w| e |w| = |(w − z) + z| ≤ |z − w|+ |z| e logo ||z| − |w|| ≤ |z − w|. Lu´ıs V. Pessoa Nu´meros complexos 19 De seguida discutimos em ligeireza algumas noc¸o˜es sobre rectas e semi-planos, na linguagem da ana´lise complexa. Se Rξ e´ a recta que passa por a origem e por o ponto ξ = |ξ|E(iθ) enta˜o rodada de −θ ira´ coincidir com o eixo real, i.e. E(−iθ)Rξ = R. De forma equivalente Rξ = ξR = { z : ξz ∈ R} = {z : Im(z ξ ) = 0 } . Se Rξ,η denota a recta euclidiana que passa por os nu´meros complexos distintos ξ e η enta˜o z ∈ Rξ,η sse z − η ∈ Rξ−η i.e Rξ,η = { z : Im( z − η ξ − η ) = 0 } . Definimos o semi-plano superior por interme´dio de Π = {z : Im z > 0} , e em geral o semi-plano definido por nu´meros complexos ξ, η, ξ 6= η e´ dado por Πξ,η := { z : Im( z − η ξ − η ) > 0 } . Anotamos que o semi-plano Πξ,η resulta da translac¸a˜o de η do semi-plano superior Π rodado com aˆngulo arg (ξ − η). O disco aberto centrado em w ∈ C e de raio r > 0 e´ definido como o conjunto dos nu´meros complexos cuja distaˆncia a w e´ inferior a r, i.e. D(w, r) := {z ∈ C : |z − w| < r} , 0 < r < +∞. O conceito de disco e´ essencial para introduzir as definic¸o˜es topolo´gicas elementares do corpo dos w r Figura 1.6: O disco aberto D(w, r) nu´meros complexos. Tais definic¸o˜es coincidem com as induzidas de R2, i.e. um subconjunto U ⊂ C, diz-se aberto, fechado, compacto e conexo sse a sua natural identificac¸a˜o com o subconjunto de R 2 correspondente e´ respectivamente aberto, fechado, compacto e conexo. Assume-se que o leitor domina as te´cnicas necessa´rias ao manejo da noc¸a˜o de convergeˆncia em espac¸os vectoriais de dimensa˜o 2 sobre R, tal como as definic¸o˜es topolo´gicas elementares. No entanto, na˜o evitamos introduzir as respectivas definic¸o˜es e notac¸a˜o. Precisamente, um conjunto U ⊂ C diz-se aberto se coincide com uma unia˜o, possivelmente vazia, de discos abertos, e diz-se fechado se o seu conjunto complementar e´ um conjunto aberto. Se U ⊂ C e´ um subconjunto de algum disco, enta˜o U diz-se um conjunto limitado. Os conjuntos compactos sa˜o precisamente os conjuntos limitados e fechados. O subconjunto U ⊂ C diz-se desconexo se existem conjuntos abertos Ω1 e Ω2 tais que Ω1 ∩ U 6= ∅ 6= Ω2 ∩ U e Ω1 ∩ Ω2 = ∅ e U = (Ω1 ∩ U) ∪ (Ω2 ∩ U) , e U diz-se conexo se na˜o e´ desconexo. Lu´ıs V. Pessoa 20 1.4. Me´trica do plano complexo Os conjuntos interior, exterior e fronteira de U, respectivamente denotados por intU, extU e ∂U sa˜o definidos de forma semelhante, i.e. confundindo o conjunto U com um subconjunto de R 2 e usando as definic¸o˜es conhecidas em espac¸os vectoriais de dimensa˜o finita. Tal como conhecido em R2 resulta que intU e´ a unia˜o de todos os conjuntos abertos contidos em U, extU = intU c e ∂U = (intU ∪ extU)c. O fecho dum conjunto U ⊂ C coincide com a unia˜o U ∪ ∂U e e´ denotado por clU. Assim, a circunfereˆncia centrada em w de raio r > 0 e´ dada por ∂D(w, r) = {z ∈ C : |z − w| = r} , 0 < r < +∞, e o disco fechado por clD(w, r) = D(w, r) ∪ ∂D(w, r) = {z ∈ C : |z − w| ≤ r} , 0 < r < +∞. Tal como as definic¸a˜o topolo´gicas elementares, as sucesso˜es convergentes de termos complexos esta˜o em correspondeˆncia com as sucesso˜es convergentes de termos em R2, i.e. diz-se que a sucessa˜o zn, n ∈ N e´ convergente ao nu´mero complexo z sse a sucessa˜o (Re zn, Im zn), n ∈ N e´ convergente em R 2 ao par ordenado (Re z, Im z) ∈ R2, i.e. a sucessa˜o de termos complexos zn, n ∈ N e´ convergente sse ∀ǫ>0 ∃p∈N (n ≥ p) ⇒ |zn − z| < ǫ. 1.4 Problemas 1. Represente no plano complexo as seguintes regio˜es: i) { z : | √ 2 + i √ 2− 2z| > 2 } ; ii) { z : ( |z| − 1 )( | √ 2 + i √ 2− 2z| − 2 ) < 0 } ; iii) {z : |z|Re(iz) ≥ Re(iz)} ; iv) {z : |z|Re(iz2) ≥ Re(iz2)} ; vi) { z : Im[ ( √ 3 + i)z ] Im[ (i− √ 3)z ] > 0 } ; vi) { z : Im[ (1− i)z3] + |z|2 Im[ (1 + i)z ] < 0} ; v) {z : |z − 1|+ |z + 1| = 4} . 2. Mostre sucessivamente que: i) se Rξ e´ a recta que passa por a origem e por o ponto ξ enta˜o Rξ = { z : ξz − ξz = 0} ; ii) se Rξ,η e´ a recta que passa por os nu´meros complexos distintos ξ e η enta˜o Rξ,η = { z : (ξ − η)z − (ξ − η)z = 2i Im(ηξ)} . 3. Considere a reflexa˜o αξ : C → C em relac¸a˜o a` recta Rξ que passa pela origem e intercepta a circunfereˆncia unita´ria no ponto ξ. i) Mostre que αξ(z) = ξ 2z. ii) Se Rξ = {xzm : x ∈ R} , aonde zm = (1 + im) e m ∈ R enta˜o αξ(z) = zm zm z = (1−m2) + i2m 1 + m2 z. 4. Considere um nu´mero natural k e uma sucessa˜o complexa an, n ∈ N tal que lim n (an + · · ·+ an+k) existe. i) Mostre que limn (an+k − an) = 0 ; ii) Fixo k ∈ N1, considere θk = 2π/(k+1) e an = En(iθk) , n ∈ N. Mostre que a sucessa˜o an, n ∈ N verifica as condic¸o˜es do enunciado e limn an na˜o existe. 5. Considere uma sucessa˜o an, n ∈ N de termos reais positivos. Mostre que lim sup a−1n = (lim inf an) −1. Lu´ıs V. Pessoa Cap´ıtulo 2 Func¸o˜es anal´ıticas 2.1 Se´ries nume´ricas Dada uma sucessa˜o an, n ∈ N de termos complexos, definimos a sucessa˜o das somas parciais Sn, n ∈ N1, cujo termo de ordem n e´ a soma dos n primeiros termos da sucessa˜o an, n ∈ N, i.e. Sn = a0 + · · ·+ an−1 , n ∈ N1. Exemplos 1. [Se´rie telesco´pica] Considere-se a sucessa˜o telesco´pica an = cn − cn+1, n ∈ N, aonde cn, n ∈ N e´ uma sucessa˜o de termos complexos. Tendo em conta que n−1∑ k=0 ak = n−1∑ k=0 (ck − ck+1) = n−1∑ k=0 ck − n−1∑ k=0 ck+1 = n−1∑ k=0 ck − n∑ k=1 ck = c0 − cn , n ∈ N1 , obtemos Sn = c0 − cn , n ∈ N1 . De forma semelhante, fixo um natural j ∈ N2 considere-se bn = cn − cn+j , ;∈ N. Enta˜o n−1∑ k=0 bk = n−1∑ k=0 (ck − ck+j) = n−1∑ k=0 ck − n+j−1∑ k=j ck = j−1∑ k=0 ck − n+j−1∑ k=n ck , n ≥ j . 2. [Se´rie geome´trica] Seja an, n ∈ N a progressa˜o geome´trica de raza˜o z ∈ C, i.e. an = zn, n ∈ N. Em conta das igualdades (1− z)(1 + z · · ·+ zn−1) = (1 + z · · ·+ zn−1)− (z + · · ·+ zn) = 1− zn, deduz-se Sn = 1− zn 1− z , z 6= 1 n , z = 1 , para n ∈ N1. 3. Fixa um sucessa˜o de termos complexos an, n ∈ N e um natural k, k ∈ N1 , consideramos a sucessa˜o das somas parciais Sn(j) = n∑ k=1 kj(ak − ak+1) , n ∈ N1. 22 2.1. Se´ries nume´ricas Pretendemos obter uma fo´rmula de recorreˆncia em j para as somas Sn(j) , j ∈ N. Tendo em linha de conta o bino´mio de Newton, obte´m-se Sn(j) = n∑ k=1 kj(ak − ak+1) = n∑ k=1 [ kjak − (k + 1)jak+1 ] + n∑ k=1 [ (k + 1)j − kj] ak+1 = n∑ k=1 [ kjak − (k + 1)jak+1 ] + j−1∑ l=0 ( j l ) n∑ k=1 klak+1 = a1 − (n+ 1)jan+1 + j−1∑ l=0 ( j l ) n∑ k=1 klak+1 . i.e. e´ va´lida a seguinte fo´rmula Sn(j) = a1 − (n+ 1)jan+1 + j−1∑ l=0 ( j l ) n∑ k=1 klak+1. (1) Suponha-se que a sucessa˜o an, n ∈ N e´ uma progressa˜o geome´trica, i.e. an = zn , n ∈ N, e para j ∈ N fixo, denote-se por Tn(j) o termo de ordem n da sucessa˜o das somas parciais z + 2jz2 + · · ·+ njzn , n ∈ N1 . Para quaisquer que sejam j ∈ N e n ∈ N1 verifica-se Sn(j) = n∑ k=1 kj(zk − zk+1) = (1− z) n∑ k=1 kjzk = (1− z)Tn(j) . Consequentemente, de (1) infere-se Tn(j) = 1 1− z Sn(j) = z − (n+ 1)jzn+1 1− z + z 1− zj−1∑ l=0 ( j l ) n∑ k=1 klzk = z − (n+ 1)jzn+1 1− z + z 1− z j−1∑ l=0 ( j l ) Tn(l). Mostra´mos que e´ poss´ıvel calcular as somas parciais Tn(j) por interme´dio de combinac¸o˜es lineares das somas parciais Tn(l) , l = 0, · · · , j − 1, i.e. e´ va´lida a seguinte fo´rmula de recorreˆncia Tn(j) = z − (n+ 1)jzn+1 1− z + z 1− z j−1∑ l=0 ( j l ) Tn(l) , j ∈ N , n ∈ N1 . (2) Determinamos Tn(1) por interme´dio de aplicac¸a˜o da fo´rmula (2). Como Tn(0) e´ a sucessa˜o das somas parciais da progressa˜o geome´trica, obtemos sucessivamente Tn(1) = z + 2z 2 + · · ·+ nzn = z − (n+ 1)z n+1 1− z + z2 − zn+2 (1− z)2 = z − (n+ 1)zn+1 + nzn+2 (1− z)2 , z 6= 1. Definic¸a˜o 1 Fixa uma sucessa˜o an, n ∈ N de termos complexos, diz-se que a se´rie ∑ n=0 an e´ conver- gente se a sucessa˜o das somas parciais tem limite finito , i.e. se lim n Sn = lim n→+∞ n−1∑ k=0 ak existe em C. A se´rie ∑ n=0 an diz-se divergente no caso contra´rio. Se ∑ n=0 an converge, a sua soma e´ o nu´mero complexo s := limn Sn e denotamo-lo por ∑∞ n=0 an. Lu´ıs V. Pessoa Func¸o˜es anal´ıticas 23 Exemplos 4. Suponha-se que ∑ n=0 an e ∑ n=0 bn sa˜o duas se´ries convergentes. Mostraremos de seguida que a se´rie ∑ n=0(an + bn) e´ convergente. Se Sn, Tn e Un denotam respectivamente os termos de ordem n das sucesso˜es das somas parciais das se´ries ∑ n=0 an, ∑ n=0 bn e ∑ n=0(an + bn) enta˜o Un = (a0 + b0) + · · ·+ (an−1 + bn−1) = (a0 + · · · an−1) + (b0 + · · · bn−1) = Sn + Tn , n ∈ N1. Como as sucesso˜es de termo geral Sn e Tn sa˜o sucesso˜es convergentes enta˜o Un, n ∈ N1 e´ uma sucessa˜o convergente e ∞∑ n=0 (an + bn) = lim n Un = lim n (Sn + Tn) = lim n Sn + lim n Tn = ∞∑ n=0 an + ∞∑ n=0 bn. De forma semelhante mostra-se que ∑ n=0 αan, α ∈ C e´ uma se´rie convergente e e´ va´lida a seguinte igualdade ∞∑ n=0 αan = α ∞∑ n=0 an , α ∈ C. 5. Considere-se a sucessa˜o an = (−1)n, n ∈ N e Sn o termo geral da sucessa˜o das somas parciais da se´rie ∑ n=0 an. Tendo em conta que S2n = (a0 + a1) + · · ·+ (a2n−2 + a2n−1) = 0 e S2n+1 = S2n + a2n = 1 , conclui-se que as subsucesso˜es dos termos pares e dos termos ı´mpares de Sn , n ∈ N1 convergem a limites distintos. Logo a se´rie ∑ n=0(−1)n diverge. Em alternativa a` notac¸a˜o ∑ n=0 an, utilizamos ∑ n an ou ∑ an, de acordo com crite´rios de simpli- cidade e consoante a adequac¸a˜o gra´fica. A simbologia ∑ n=k an denota a se´rie ∑ n=0 an+k. A omissa˜o do ı´ndice inferior no s´ımbolo ∑ an na˜o devera´ causar confusa˜o, e em considerac¸a˜o das observac¸o˜es seguintes. Mostramos abaixo que a convergeˆncia ou divergeˆncia duma se´rie na˜o depende em que ı´ndice iniciamos a ”soma”. Ao que respeita a` soma de se´ries convergentes, facilmente se obteˆm a igualdade ∞∑ n=0 an = (a0 + · · ·+ ak−1) + ∞∑ n=k an. Frequentemente confundem-se se´ries ∑ n=0 an convergentes com a sua soma ∑∞ n=0 an. A imprecisa˜o mencionada na˜o ofende os objectivos do decorrente texto. Proposic¸a˜o 2 A natureza duma se´rie na˜o depende dum nu´mero finito de termos, i.e. se an, n ∈ N e bn, n ∈ N sa˜o duas sucesso˜es tais que o conjunto {n ∈ N : an 6= bn} e´ finito enta˜o as se´ries ∑ an e∑ bn tem a mesma natureza. Demonstrac¸a˜o: Como an = bn, n ∈ N excepto num nu´mero finito de termos, enta˜o esta´ bem definido o nu´mero natural m := max {n ∈ N : an 6= bn} . Se Sn e Tn denotam respectivamente as sucesso˜es das somas parciais das se´ries ∑ n=0 an e ∑ n=0 bn, enta˜o Sn = (a0 + · · ·+ am) + (am+1 + · · ·+ an) = Tn + Sm+1 − Tm+1 , n ≥ m. Tendo em conta que Sm+1−Tm+1 e´ uma constante independente de n, da igualdade anterior e´ imediato que limn Sn existe sse limn Tn existe. Lu´ıs V. Pessoa 24 2.1. Se´ries nume´ricas Proposic¸a˜o 3 (Condic¸a˜o necessa´ria) Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos complexos. Se a se´rie ∑ an e´ convergente enta˜o limn an = 0. Demonstrac¸a˜o: Seja Sn a sucessa˜o das somas parciais Sn = a0+· · ·+an−1, n ∈ N1.A convergeˆncia da se´rie ∑ an equivale a` existeˆncia em C do limite da sucessa˜o Sn , n ∈ N1. Tendo em conta que subsucesso˜es de sucesso˜es convergentes convergem ao mesmo limite, obte´m-se an = Sn+1 − Sn −−→ n→∞ lim n Sn − lim n Sn = 0. Exemplos 6. [Se´rie telesco´pica] No exemplo 1 obteve-se n−1∑ k=0 (ck − ck+1) = c0 − cn , n ≥ 1. Consequentemente a se´rie ∑ (ck − ck+1) converge sse lim cn existe. Em caso afirmativo verifica-se ∞∑ k=0 (ck − ck+1) = c0 − lim n cn . De novo do exemplo 1 infere-se que a se´rie ∑ (ck − ck+j), j ∈ N2 converge sse limn (cn + · · ·+ cn+j−1) existe em R e em caso afirmativo tem-se ∞∑ k=0 (ck − ck+j) = j−1∑ k=0 ck − lim n n+j−1∑ k=n ck . Anote-se que a existeˆncia de limite finito da sucessa˜o cn, n ∈ N na˜o e´ condic¸a˜o necessa´ria a` convergeˆncia da se´rie ∑ (ck − ck+j), j ∈ N2. Como exemplo considere-se θj = 2π/j, j ∈ N2 e cn = En(iθj) , n ∈ N. De cn+j = E(inθj) E(ijθj) = E(inθj) , e´ evidente que a se´rie ∑ (ck − ck+j) = ∑ 0 converge. No entanto, a sucessa˜o cn, n ∈ N e´ perio´dica com per´ıodo j e teˆm j termos distintos, precisamente as ra´ızes de ordem j da unidade. Consequentemente cn , n ∈ N na˜o e´ convergente. 7. [Se´rie geome´trica] No exemplo 2 obteve-se n−1∑ k=0 zk = 1− zn 1− z , z 6= 1 n , z = 1 , para n ∈ N1. Se |z| ≥ 1 enta˜o zn, n ∈ N na˜o e´ infinite´simo e consequentemente a se´rie ∑ zn diverge. Caso |z| < 1 enta˜o limn |z|n = 0 e logo ∞∑ n=0 zn = 1 1− z , |z| < 1. 8. No exemplo 3 obteve-se uma fo´rmula de recorreˆncia em j para a sucessa˜o das somas parciais da se´rie ∑ njzn. Se |z| ≥ 1 enta˜o o termo geral na˜o e´ um infinite´simo e consequentemente a se´rie diverge. Tendo em conta que limn n jzn = 0, |z| < 1, j ∈ N e (2), deixamos ao ligeiro cuidado do leitor mostrar por induc¸a˜o matema´tica que a se´rie ∑ njzn, |z| < 1 e´ convergente, qualquer que seja j ∈ N. Definindo T (j) = ∞∑ n=1 njzn , |z| < 1 Lu´ıs V. Pessoa Func¸o˜es anal´ıticas 25 de (2) obteˆm-se a relac¸a˜o de recorreˆncia T (j) = z 1− z + z 1− z j−1∑ l=0 ( j l ) T (l) , j ∈ N1, |z| < 1. Em particular T (1) = z + 2z2 + · · ·+ nzn + · · · = z 1− z + z2 (1− z)2 = z (1− z)2 , |z| < 1. 9. Suponha-se que ∑ an e ∑ bn sa˜o duas se´ries convergentes e considere-se a sucessa˜o cn, n ∈ N cujos termos pares sa˜o dados por c2n = an, n ∈ N e os termos ı´mpares definidos por c2n+1 = bn, n ∈ N. Se os termos gerais das sucesso˜es das somas parciais das se´ries ∑ an, ∑ bn e ∑ cn sa˜o respectivamente denotados por Sn, Tn e Un enta˜o U2n =(a0 + b0) + · · ·+ (an−1 + bn−1)=(a0 + · · · an−1) + (b0 + · · · bn−1)=Sn + Tn U2n+1 =(a0 + b0) + · · ·+ (an−1 + bn−1) + an=(a0 + · · · an−1) + (b0 + · · · bn−1) + an=Sn + Tn + an. Porque as se´ries ∑ an e ∑ bn sa˜o convergentes enta˜o limn Sn, limn Tn existem e limn an = 0. Logo limn U2n = limn U2n+1 e em consequeˆncia limn Un existe e ∞∑ n=0 cn = lim n Un = lim n (Sn + Tn) = ∞∑ n=0 (an + bn). Proposic¸a˜o 4 Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos reais na˜o negativos. Enta˜o a se´rie ∑ an e´ convergente sse a sucessa˜o das somas parciais Sn = a0 + · · ·+ an−1, n ∈ N1 e´ majorada. Demonstrac¸a˜o: De an ≥ 0, n ∈ N obteˆm-se Sn+1 = Sn + an ≥ Sn, n ∈ N1, i.e. a sucessa˜o Sn e´ mono´tona crescente. Conclui-se que limn Sn e´ finito sse Sn e´ majorada. Exemplos 10. Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos reais na˜o negativos e suponha-se que existe uma constante C > 0 tal que n−1∑ k=0 akr k ≤ C , para qualquer n ∈ N1 e 0 ≤ r < 1. (3) Da proposic¸a˜o 4 deduz-se que a se´rie ∑ anr n converge, qualquer que seja r ∈ [ 0, 1 [ e de (3) infere-se∞∑ n=0 anr n ≤ C , 0 ≤ r < 1. (4) Se rn = n √ 1/2, n ∈ N1 enta˜o 0 < rn < 1 e r k n = ( 1 2 )k/n ≥ 1 2 , k = 1, · · · , n . Consequentemente 0 ≤ a0 + a1 + · · ·+ an−1 ≤ 2 ( a0 + a1rn + · · · an−1rn−1n ) ≤ 2 ∞∑ j=0 ajr j n ≤ 2C. Lu´ıs V. Pessoa 26 2.1. Se´ries nume´ricas De novo a proposic¸a˜o 4 permite afirmar que a se´rie ∑ an e´ convergente. E´ evidente que se ∑ an e´ uma se´rie convergente de termos reais na˜o negativos enta˜o a condic¸a˜o (3) e´ verificada. Portanto, uma se´rie ∑ an, de termos na˜o negativos converge sse verifica a condic¸a˜o (3), usualmente designada por condic¸a˜o de Abel. 11. Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos reais na˜o negativos, Sn, n ∈ N1 a sucessa˜o das somas parciais Sn = a0 + · · ·+ an−1 e considere-se a me´dia aritme´tica dos n primeiros termos da sucessa˜o de termo geral Sn, i.e. σn = S1 + · · ·+ Sn n = a0 + ( 1− 1 n ) a1 + ( 1− 2 n ) a2 + · · ·+ 1 n an−1 , n ∈ N1. Suponha-se que a sucessa˜o σn , n ∈ N1 e´ convergente (em C). Enta˜o Sn+1 = [ a0 + ( 1− 1 n3 ) a1 + · · ·+ ( 1− n n3 ) an ] + [ 1 n3 a1 + · · ·+ n n3 an ] ≤ σn3 + 1 n Sn+1 . Logo, para ordens suficientemente grandes, verifica-se 0 ≤ Sn+1 ≤ n n− 1 σn3 . Segue que a sucessa˜o das somas parciais Sn, n ∈ N1 e´ majorada e consequentemente convergente. No caso geral em que an, n ∈ N e´ uma sucessa˜o de termos complexos, a sucessa˜o σn , n ∈ N1 encontrasse bem definida . Mostramos de seguida que se a se´rie ∑ n=0 an e´ convergente enta˜o a sucessa˜o σn , n ∈ N1 converge e verifica-se limn σn = ∑∞ n=0 an. Denote-se a soma da se´rie ∑ n=0 an por s, e dado ǫ > 0 considere-se uma ordem p ∈ N tal que (j > p) ⇒ |Sj − s| ≤ ǫ. Enta˜o 0 ≤ |σn − s| = |(S1 − s) + · · ·+ (Sp − s) + · · · (Sn − s)| n ≤ |S1 − s | n + · · ·+ |Sp − s | n + n− p n ǫ −−→ n→∞ ǫ . Da arbitrariedade de ǫ > 0 deduz-se que limn σn = s. Do para´grafo anterior conclui-se que uma se´rie de termos reais na˜o negativos e´ convergente sse a sucessa˜o σn , n ∈ N1 e´ convergente e em caso afirmativo ∞∑ n=0 an = lim n σn . Terminamos o exemplo anotando a importaˆncia em se considerar sucesso˜es de termos reais na˜o nega- tivos. De facto, se an = (−1)n , n ∈ N e considerando o exemplo 5, o leitor sem dificuldades de maior deduz que σ2n = 1 2 e σ2n+1 = n+ 1 2n+ 1 −−→ n→∞ 1 2 . Logo a sucessa˜o σn , n ∈ N1 e´ convergente e no entanto a se´rie ∑ (−1)n e´ divergente. E´ usual dizer que a soma de Cesa`ro da se´rie ∑ n=0(−1)n e´ 1/2. 12. [Se´rie Harmo´nica] A se´rie ∑ n=1 1/n e´ usualmente designada por se´rie harmo´nica. Mostraremos que a se´rie harmo´nica e´ divergente, na˜o obstante o termo geral 1/n, n ∈ N1 ser um infinite´simo. Considere-se Sn = 1 + 1/2 + · · ·+ 1/n a sucessa˜o das somas parciais da se´rie harmo´nica. Em conta de S2n − Sn = 1 n+ 1 + 1 n+ 2 + · · ·+ 1 2n ≥ n 1 2n = 1 2 , (5) Lu´ıs V. Pessoa Func¸o˜es anal´ıticas 27 obtemos S2n − 1 = n−1∑ j=0 (S2j+1 − S2j ) ≥ n12 −−→n→∞ +∞. Logo, a sucessa˜o Sn, n ∈ N1 na˜o e´ majorada e consequentemente na˜o e´ convergente (em R) e a se´rie harmo´nica e´ divergente. Uma sucessa˜o an, n ∈ N diz-se uma sucessa˜o de Cauchy se verifica a seguinte condic¸a˜o ∀ǫ>0 ∃j∈N ∀m,n∈N (m,n ≥ j) ⇒ |an − am| < ǫ . Como sabemos da ana´lise real elementar em espac¸os euclidianos de dimensa˜o finita, as sucesso˜es de Cauchy sa˜o precisamente as sucesso˜es convergente. Anotamos que os argumentos na demonstrac¸a˜o da divergeˆncia da se´rie harmo´nica, exposta no exemplo 12 , poder-se-iam resumir a` observac¸a˜o de que de (5) infere-se que a sucessa˜o Sn, n ∈ N na˜o e´ sucessa˜o de Cauchy e portanto e´ divergente. No seguinte resultado expomos genericamente os argumentos em questa˜o. Proposic¸a˜o 5 (Cauchy) Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de nu´meros complexos. Enta˜o a se´rie ∑ an e´ convergente sse ∀ǫ>0 ∃j∈N ∀m,n∈N (m ≥ n ≥ j) ⇒ |an + · · ·+ am−1| < ǫ . Demonstrac¸a˜o: A demonstrac¸a˜o resume-se a` observac¸a˜o de que as sucesso˜es convergentes sa˜o precisamente as sucesso˜es de Cauchy. Por definic¸a˜o sabemos que a se´rie ∑ an e´ convergente sse a sucessa˜o das somas parciais Sn = a0 + · · · + an−1, n ∈ N1 e´ convergente. Porque as sucesso˜es convergentes sa˜o precisamente as sucesso˜es de Cauchy enta˜o ∑ an e´ convergente sse Sn e´ uma sucessa˜o de Cauchy, i.e. se para qualquer que seja ǫ > 0 existe uma ordem j ∈ N tal que a condic¸a˜o |Sm−Sn| < ǫ e´ verificada para quaisquer n,m ≥ j. Para verificar |Sm − Sn| < ǫ e´ poss´ıvel supor m > n e logo tendo em conta que |Sm − Sn| = |(a0 + · · ·+ am−1)− (a0 + · · ·+ an−1)| = |an + · · ·+ am−1| , m > n , terminamos a prova. Uma se´rie ∑ an de termos complexos diz-se absolutamente convergente se a se´rie dos mo´dulos∑ |an| e´ convergente. Proposic¸a˜o 6 Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos complexos. Suponha-se que a se´rie ∑ an e´ absolutamente convergente. Enta˜o a se´rie ∑ an e´ convergente e verifica-se a seguinte desigualdade∣∣∣∣∣ ∞∑ n=0 an ∣∣∣∣∣ ≤ ∞∑ n=0 |an| . Demonstrac¸a˜o: Sejam Sn,Mn, n ∈ N1 respectivamente as sucesso˜es das somas parciais das se´ries∑ an e ∑ |an|. Por hipo´tese, a sucessa˜o Mn, n ∈ N1 e´ convergente, i.e. e´ uma sucessa˜o de Cauchy. Logo, dado ǫ > 0 existe uma ordem p ∈ N tal que m ≥ n ≥ p⇒ |Mm+1 −Mn| < ǫ. Tendo em conta a seguinte desigualdade |Sm+1 − Sn| = |an + · · ·+ am| ≤ |an|+ · · ·+ |am| = |Mm+1 −Mn| , m ≥ n, conclui-se que Sn, n ∈ N1 e´ sucessa˜o de Cauchy e consequentemente converge. Para demonstrar a desigualdade entre somas e´ suficiente considerar que 0 ≤ |Sn| = |a0 + · · ·+ an−1| ≤ |a0|+ · · ·+ |an−1| ≤ ∞∑ n=0 |an| . Lu´ıs V. Pessoa 28 2.1. Se´ries nume´ricas Uma se´rie de termos complexos ∑ an diz-se simplesmente convergente se e´ convergente e na˜o e´ absolutamente convergente. Exemplos 13. Seja γn, n ∈ N um infinite´simo de termos complexos e considere-se a se´rie ∑ γnξ n, |ξ| = 1. Cla- ramente ∑ γnξ n e´ absolutamente convergente sse ∑ |γn| converge. De seguida procuramos condic¸o˜es mais gerais que garantam a convergeˆncia da se´rie ∑ γnξ n, caso |ξ| = 1 e ξ /∈ R. Precisamente mostra- mos que se ∑ |γn+2 − γn| converge enta˜o a se´rie ∑ γnξn converge. Como ξ /∈ R, a natureza da se´rie e´ inalterada multiplicando todos os termos por (ξ−ξ). Designando por Sn a sucessa˜o das somas parciais da se´rie (ξ − ξ)∑ γnξn, obtemos Sn = n−1∑ k=0 γk ( ξ − ξ)ξk = n−1∑ k=0 γk ( ξk+1 − ξk−1) = n−1∑ k=0 ( γk+2ξ k+1 − γkξk−1 ) + n−1∑ k=0 ξk+1(γk − γk+2). Porque lim γnξ n+1 = 0 enta˜o a se´rie telesco´pica ∞∑ n=0 ( γn+2ξ n+1 − γnξn−1 ) e´ convergente e em consequeˆncia ∑ γnξ n converge sse converge a seguinte se´rie ∞∑ n=0 ξn+1(γn − γn+2). (6) Como por hipo´tese a se´rie ∑ |γn − γn+2| e´ convergente enta˜o a se´rie em (6) e´ absolutamente conver- gente e a prova da asserc¸a˜o inicial esta´ terminada, i.e. ∑ γnξ n e´ absolutamente convergente sse ∑ |γn| converge e ∑ γnξ n e´ simplesmente convergente sempre que as se´ries ∑ |γn − γn+2| e ∑ |γn| sa˜o res- pectivamente convergentes e divergentes. Como exemplo concreto da convergeˆncia simples da se´rie∑ γnξ n , |ξ| = 1 , ξ /∈ R considere-se a sucessa˜o γn = 1 n+ (−1)n , n ∈ N . Porque γn ≥ 1/(n− 1) e a sucessa˜o das somas parciais da se´rie harmo´nica converge a +∞, enta˜o∑ |γn| diverge. No entanto γn − γn+2 ≥ 0 e logo a se´rie ∑ |γn − γn+2| = ∑ (γn − γn+2) e´ uma se´rie telesco´pica. De lim γn = 0 segue que lim (γn + γn+1) = 0 e consequentemente a se´rie telesco´pica∑ (γn − γn+2) e´ convergente. Em diante e no exemplo 21 sa˜o apresentadas algumas aplicac¸o˜es das asserc¸o˜es atra´s. Proposic¸a˜o 7 (Crite´riogeral de comparac¸a˜o) Sejam ∑ an e ∑ bn se´ries de termos reais na˜o negativos, tais que a partir de certa ordem verifica-se an ≤ bn. Se ∑ bn converge enta˜o ∑ an tambe´m converge. Demonstrac¸a˜o: A proposic¸a˜o 2 permite supor sem perda de generalidade que an ≤ bn, n ∈ N. Denotem-se respectivamente as sucesso˜es das somas parciais das se´ries ∑ n=0 an e ∑ n=0 bn por Sn e Tn. Segue sem dificuldade que Sn = a0 + · · ·+ an−1 ≤ b0 + · · ·+ bn−1 = Tn , n ∈ N1. Lu´ıs V. Pessoa Func¸o˜es anal´ıticas 29 Como a sucessa˜o Tn, n ∈ N1 e´ convergente enta˜o e´ majorada e consequentemente tambe´m Sn, n ∈ N1 e´ majorada. Em conta da proposic¸a˜o 4 terminamos a demonstrac¸a˜o. Corola´rio 8 Considerem-se sucesso˜es an, bn, n ∈ N de termos reais na˜o negativos. Suponha-se que a partir de certa ordem bn > 0 e λ1bn ≤ an ≤ λ2bn , aonde λj > 0, j = 1, 2. Enta˜o as se´ries ∑ an e ∑ bn sa˜o da mesma natureza. Demonstrac¸a˜o: Supondo a convergeˆncia da se´rie ∑ bn infere-se a convergeˆncia de ∑ λ2bn. Do crite´rio geral de comparac¸a˜o conclui-se que a se´rie ∑ an converge. Reciprocamente, se ∑ an converge enta˜o ∑ λ−11 an converge e de novo o crite´rio geral de comparac¸a˜o permite concluir a convergeˆncia da se´rie ∑ bn. Corola´rio 9 Considerem-se sucesso˜es an, bn, n ∈ N de termos na˜o negativos e suponha-se que o limite lim an/bn := l existe. Conclui-se que: i) se l ∈ R+ enta˜o as se´ries ∑ an e ∑ bn sa˜o da mesma natureza; ii) se l = 0 enta˜o da convergeˆncia de ∑ bn infere-se a convergeˆncia de ∑ an; iii) se l = +∞ enta˜o da convergeˆncia de ∑ an infere-se a convergeˆncia de ∑ bn. Exemplos 14. Da seguinte desigualdade 1 nα ≥ 1 n , n ∈ N1 , para qualquer que seja α < 1 , e da divergeˆncia da se´rie harmo´nica, conclui-se a divergeˆncia das seguintes se´ries∑ 1 nα , α < 1 . 15. Tendo em conta que a se´rie ∑ n=1 1 n(n+ 1) = ∑ n=1 ( 1 n − 1 n+ 1 ) e´ uma se´rie telesco´pica convergente, do crite´rio geral de comparac¸a˜o e de 0 ≤ 1 (n+ 1)2 ≤ 1 n(n+ 1) = 1 n − 1 n+ 1 conclui-se que a se´rie ∑ n=1 1 n2 = ∑ n=0 1 (n+ 1)2 e´ absolutamente convergente. Consequentemente, o crite´rio geral de comparac¸a˜o assegura que as se´ries∑ 1 nα , α > 2 sa˜o convergentes. Se p(z) = ckz k + · · ·+ c0 e q(z) = djzj + · · ·+ d0 sa˜o polino´mios em z respectivamente de graus k ∈ N e j ∈ N, mostramos de seguida que a se´rie ∑ p(n)/q(n) converge absolutamente sse j− k ≥ 2. O leitor podera´ confirmar sem dificuldades que lim n→+∞ ∣∣∣∣ p(n)q(n)nk−j ∣∣∣∣ = | ckdj | 6= 0. Lu´ıs V. Pessoa 30 2.1. Se´ries nume´ricas Do corola´rio 9 infere-se que as se´ries ∑ | p(n)/q(n) | e ∑ 1/nj−k teˆm a mesma natureza. A prova da asserc¸a˜o termina considerando o crite´rio geral de comparac¸a˜o, as seguintes desigualdades 1 nj−k ≤ 1 n2 , j − k ≥ 2 1 nj−k ≥ 1 n , j − k ≤ 1 , n ∈ N1, a convergeˆncia de ∑ 1/n2 e a divergeˆncia da se´rie harmo´nica. 16. Considere-se a sucessa˜o de termos positivos dada por an = 2n− 1 2n [ 2n+ 1 2n+ 2 ]2 · · · [ 4n− 3 4n− 2 ]n , n ∈ N1. E´ evidente que an = [ 1− 1 2n ] [ 1− 1 2n+ 2 ]2 · · · [ 1− 1 4n− 2 ]n ≤ [ 1− 1 4n− 2 ]∑n j=1 j = [ 1− 1 4n− 2 ]n(n+1) 2 . Fixe-se um nu´mero real r nas condic¸o˜es 1/ 8 √ e < r < 1. Porque lim n ( 1− 1 4n− 2 )n 2 = 1 8 √ e , enta˜o a partir de certa ordem verifica-se 0 ≤ an ≤ [ 1− 1 4n− 2 ]n(n+1) 2 ≤ rn+1 . A se´rie ∑ rn+1 e´ convergente. Do crite´rio geral de comparac¸a˜o conclui-se a convergeˆncia da se´rie ∑ an. O seguinte resultado e´ usualmente designado por crite´rio da raiz. Proposic¸a˜o 10 Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos complexos e considere-se γ := lim sup n √|an|. i) Se γ < 1 enta˜o ∑ an e´ absolutamente converge. ii) Se γ > 1 enta˜o ∑ an diverge. Demonstrac¸a˜o: Iniciamos mostrando i). Suponha-se γ < 1 e determine-se ǫ > 0 tal que γ+ǫ < 1. Da definic¸a˜o de limite superior, retira-se a existeˆncia duma ordem j ∈ N tal que k√|ak| < (γ + ǫ) < 1, para k ≥ j. Consequentemente k ≥ j ⇒ |ak| ≤ (γ + ǫ)k. Como r := |γ + ǫ| < 1 enta˜o a se´rie ∑k rk e´ convergente e do crite´rio geral de comparac¸a˜o conclui-se que ∑ k |ak| e´ convergente, i.e. ∑ ak e´ absolutamente convergente. De seguida demonstramos ii). Se γ > 1 enta˜o existe r > 1 e uma subsucessa˜o ank , k ∈ N verificando |ank | 1 nk ≥ r > 1 e logo |ank | ≥ rnk −−→ k→∞ ∞ Porque |an| tem subsucesso˜es convergentes a ∞ enta˜o an, n ∈ N na˜o e´ infinite´simo e logo a se´rie ∑ an diverge. Para determinadas sucesso˜es an, n ∈ N e´ laborioso lidar com o limite lim n √|an|. O seguinte resul- tado oferece-se alternativas a tal proceder. Lu´ıs V. Pessoa Func¸o˜es anal´ıticas 31 Proposic¸a˜o 11 Seja an, n ∈ N tal que para n suficientemente grande verifica-se an 6= 0. Enta˜o lim inf |an+1/an| ≤ lim inf n √ |an| ≤ lim sup n √ |an| ≤ lim sup |an+1/an| . Demonstrac¸a˜o: Seja r := lim sup |an+1/an| e ǫ > 0. Para n suficientemente grande tem-se |an+1/an| < r + ǫ e logo∣∣∣∣anaj ∣∣∣∣ = ∣∣∣∣aj+1aj ∣∣∣∣× · · · × ∣∣∣∣an−1an−2 ∣∣∣∣× ∣∣∣∣ anan−1 ∣∣∣∣ ≤ (r + ǫ)n−j , n ≥ j . Atentando a` monotonia da func¸a˜o R+0 ∋ x→ n √ x ∈ R, n ∈ N deduz-se que 0 ≤ n √ |an| ≤ n √ |aj | (r + ǫ)1−j/n −−→ n→∞ r + ǫ . Da arbitrariedade de ǫ > 0 conclui-se que lim sup n √ |an| ≤ lim sup |an+1/an| . Resta mostrar a desigualdade lim inf |an+1/an| ≤ lim inf n √|an|. Se an, n ∈ N e´ uma sucessa˜o nas condic¸o˜es do enunciado, e de acordo com as convenc¸o˜es usuais 1/0+ = +∞ e 1/(+∞) = 0, abandona- se ao cuidado do leitor a prova da seguinte asserc¸a˜o lim sup 1 |an| = 1 lim inf |an| . Considerando a sucessa˜o bn = a −1 n , n ∈ N, bem definida a partir de certa ordem, obtemos da primeira parte da prova que 1 lim inf n √|an| = lim sup 1n√|an| ≤ lim sup ∣∣∣∣ anan+1 ∣∣∣∣ = 1lim inf |an+1/an| , o que termina a demonstrac¸a˜o. Corola´rio 12 (Crite´rio da raza˜o) Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos complexos na˜o nulos. i) Se lim sup |an+1/an| < 1 enta˜o ∑ an e´ absolutamente converge; ii) Se lim inf |an+1/an| > 1 enta˜o ∑ an diverge. Demonstrac¸a˜o: Da proposic¸a˜o 11 deduz-se que se lim sup |an+1/an| < 1 ou lim inf |an+1/an| > 1 enta˜o respectivamente lim sup n √|an| < 1 e lim inf n√|an| > 1.As concluso˜es sa˜o portanto consequeˆncias imediatas da proposic¸a˜o 10. Exemplos 17. Considere-se uma sucessa˜o an, n ∈ N nas condic¸o˜es do corola´rio 12 e tal que existe o limite lim |an+1/an| := γ. Logo lim sup |an+1/an| = lim inf |an+1/an| = lim |an+1/an| = γ e conclui-se que: i) se γ < 1 enta˜o ∑ an e´ absolutamente converge; ii) se γ > 1 enta˜o ∑ an diverge. Lu´ıs V. Pessoa 32 2.1. Se´ries nume´ricas 18. Anotamos que existem sucesso˜es an, n ∈ N e cn, n ∈ N nas condic¸o˜es do corola´rio 12 tais que lim inf an+1/an < 1 e lim sup cn+1/cn > 1 e as se´ries ∑ an e ∑ cn divergem e convergem, respectiva- mente. Como exemplos considerem-se an = 2 + (−1)n+1 e cn = 2−nan , n ∈ N. De facto, de a2n/a2n−1 = 1/3 , n ∈ N1 deduz-se lim inf an+1/an ≤ 1/3 < 1 e de |an| ≥ 1 segue que a se´rie ∑ an diverge. Finalmente, se bn = nan − (n+ 1)an+1 enta˜o cn+1 cn = 2bn = 1 4 2[(−1) n+1(2n+1)] retira-se que lim sup cn+1/cn = +∞. No entanto 0 < cn ≤ 2−n e do crite´rio geral de comparac¸a˜o infere-se a convergeˆncia de ∑ cn. Proposic¸a˜o 13 (Crite´rio integral) Seja f : [ 0,+∞ [ → R+ uma func¸a˜o decrescente. Enta˜o a se´rie∑ f(n) e´ convergente sse o limite limr→+∞ ∫ r 0 f(x) dx existe e e´ finito. Se ∑ f(n) diverge enta˜o n∑ k=0 f(k) ∼ ∫ n 0 f(x) dx , n→ +∞ . (7) Demonstrac¸a˜o: Tendo em conta que a func¸a˜of e´ mono´tona decrescente, conclui-se n−1∑ j=0 f(j + 1) ≤ ∫ n 0 f(x) dx = n−1∑ j=0 ∫ j+1 j f(x) dx ≤ n−1∑ j=0 f(j) . (8) Como f(x) ≥ 0, x ≥ 0 enta˜o as sucesso˜es ∑n−1j=0 f(j) e ∫ n0 f(x) dx sa˜o mono´tonas crescentes e logo convergem para limite finito sse sa˜o majoradas. Portanto de (8) resulta que a se´rie ∑ f(n) converge sse limn ∫ n 0 f(x) dx e´ finito. Porque a func¸a˜o de varia´vel real R+0 ∋ r → ∫ r 0 f(x) dx e´ crescente enta˜o limr→+∞ ∫ r 0 f(x) dx (r ∈ R+) e´ finito sse limn ∫ n 0 f(x) dx (n ∈ N) e´ finito. Para terminar, suponha-se que a se´rie ∑ f(n) e´ divergente. Dado tratar-se duma se´rie de termos positivos enta˜o limn ∑n−1 k=0 f(n) = +∞. Em particular, a partir de certa ordem ∑n−1 k=0 f(n) > 0, o que permite dividir os membros das inequac¸o˜es (8) para obter 1 + f(n)− f(0)∑n−1 k=0 f(n) ≤ ∫ n 0 f(x) dx∑n−1 k=0 f(n) ≤ 1. Como lim n f(n)− f(0)∑n−1 k=0 f(n) = 0 , do teorema das sucesso˜es enquadradas deduz-se (7). Exemplos 19. [Se´ries de Dirichlet] A func¸a˜o fα : [ 0,+∞ [ → R+ , fα(x) = (x+ 1)−α, α > 0 encontra-se nas condic¸o˜es da proposic¸a˜o 13. Logo ∞∑ n=0 1 (n+ 1) α converge sse lim r→+∞ ∫ r 0 1 (x+ 1) α dx e´ finito. Lu´ıs V. Pessoa Func¸o˜es anal´ıticas 33 Porque lim r→+∞ ∫ r 0 1 (x+ 1) α dx = lim r→+∞ 1 1− α [ (r + 1) 1−α − 1 ] , α 6= 1 ln (r + 1) , α = 1 = +∞ , α ≤ 1 1 α− 1 , α > 1 , conclui-se que ∞∑ n=1 1 nα = ∞∑ n=0 1 (n+ 1)α converge sse α > 1. Se 0 < α ≤ 1 enta˜o 1 + 1 2α + · · ·+ 1 nα ∼ 1 1− α [ (n+ 1) 1−α − 1 ] , α < 1 ln (n+ 1) , α = 1 . Introduzimos de seguida uma te´cnica elementar, por semelhanc¸a com a primitivac¸a˜o por partes do ca´lculo integral, usualmente nomeada de soma por partes . A soma por partes sera´ a ferramenta essencial para demonstrar os resultados que finalizam a secc¸a˜o e que constituem as u´nicas proposic¸o˜es apresentadas no decorrente texto e adequadas ao estudo de se´ries simplesmente convergentes. Se un, vn, n ∈ N sa˜o sucesso˜es de termos complexos e Un, n ∈ N1 e´ a sucessa˜o das somas parciais Un = u0 + · · ·+ un−1 enta˜o e´ va´lida a seguinte fo´rmula n∑ j=0 ujvj = Un+1vn+1 + n∑ j=0 Uj+1(vj − vj+1). Embora a fo´rmula anterior seja de natureza elementar, apresentamos de seguida uma prova baseada em manipulac¸o˜es alge´bricas do s´ımbolo de somato´rio: n∑ j=0 Uj+1(vj − vj+1) = n∑ j=0 Uj+1vj − n∑ j=0 Uj+1vj+1 = n∑ j=0 Uj+1vj − n+1∑ j=1 Ujvj = U1v0 − Un+1vn+1 + n∑ j=1 (Uj+1 − Uj)vj = ( n∑ j=0 ujvj )− Un+1vn+1. Proposic¸a˜o 14 (Crite´rio de Dirichlet) Considerem-se sucesso˜es un, vn, n ∈ N de termos com- plexos e Un, n ∈ N1 a sucessa˜o das somas parciais Un = u0 + · · · + un−1. Se a sucessa˜o vn, n ∈ N e´ decrescente a zero e Un e´ limitada enta˜o a se´rie ∑ unvn e´ convergente. Demonstrac¸a˜o: Seja Sn, n ∈ N1 a sucessa˜o das somas parciais da se´rie ∑ n=0 unvn. Da soma por partes, para m ≥ n; n,m ∈ N verifica-se |Sm+1 − Sn| = | ∑m j=n ujvj | ≤ |Um+1vm+1|+ |Unvn|+ ∑m j=n |Uj+1|(vj − vj+1) ≤ M( vm+1 + vn + ∑m j=n (vj − vj+1) ) = 2Mvn. (9) Porque limn vn = 0, dado ǫ > 0 existe uma ordem p ∈ N tal que se n ≥ p enta˜o 0 < vn < ǫ/(2M). Tendo em conta (9) obtemos m ≥ n ≥ p⇒ |Sm+1 − Sn| < ǫ e portanto Sn e´ sucessa˜o de Cauchy. Lu´ıs V. Pessoa 34 2.1. Se´ries nume´ricas Corola´rio 15 (Crite´rio de Abel) Sejam un, n ∈ N e vn, n ∈ N sucesso˜es respectivamente de ter- mos complexos e de termos reais, tais que a sucessa˜o das somas parciais Un = u0 + · · · + un−1 e´ convergente e a sucessa˜o vn, n ∈ N e´ decrescente e limitada. Enta˜o a se´rie ∑ unvn e´ convergente. Demonstrac¸a˜o: Como a sucessa˜o vn, n ∈ N e´ decrescente e limitada enta˜o e´ convergente em R. Seja v := lim vn e considere-se a sucessa˜o v˜n, n ∈ N aonde v˜n = vn−c. Enta˜o v˜n, n ∈ N e´ uma sucessa˜o decrescente a zero e do crite´rio de Dirichlet infere-se que ∑ n(vn − c)un e´ uma se´rie convergente. Se S˜n e Sn designam respectivamente as sucesso˜es das somas parciais das se´rie ∑ v˜nun e ∑ vnun, enta˜o Sn = S˜n + cUn , e logo Sn, n ∈ N e´ convergente. Exemplos 20. Considere-se a sucessa˜o das somas parciais da progressa˜o geome´trica de raza˜o ξ ∈ C Un = 1 + ξ + · · ·+ ξn−1 , n ∈ N1. Supondo |ξ| = 1 e ξ 6= 1, do exemplo 2 obte´m-se |Un| = | n−1∑ k=0 ξk | = ∣∣∣∣1− ξn1− ξ ∣∣∣∣ ≤ 1| sin θ/2| , aonde ξ = E(iθ) , θ 6= 2kπ, k ∈ Z. Porque a sucessa˜o Un, n ∈ N1 e´ limitada, em conta do Crite´rio de Dirichlet, conclui-se que se γn, n ∈ N e´ uma sucessa˜o de termos positivos decrescentes a zero enta˜o a se´rie ∑ γnξ n e´ convergente. No entanto ∑ γnξ n na˜o e´ necessariamente absolutamente convergente. Por exemplo, considerando γn = n −α, 0 < α ≤ 1 temos que ∞∑ n=1 ∣∣∣∣ ξnnα ∣∣∣∣ = ∞∑ n=1 1 nα , 0 < α ≤ 1 diverge. 21. Consideramos de seguida a sucessa˜o γn = 1√ n + (−1)n n , n ∈ N1. E´ evidente que γn, n ∈ N e´ uma sucessa˜o de termos positivos. Porque a sucessa˜o 1/n, n ∈ N1 e´ decrescente a zero enta˜o do exemplo 20 deduz-se a convergeˆncia da se´rie ∑ (−1)n1/√n. Como ∑ 1/n diverge enta˜o a se´rie ∑ γn e´ a soma duma se´rie divergente com outra convergente. Logo ∑ γn e´ divergente. Porque a sucessa˜o γn na˜o e´ decrescente, o crite´rio de Dirichlet na˜o permite obter resultados acerca da convergeˆncia da se´rie ∑ γnξ n, |ξ| = 1, ξ 6= ±1. Na˜o obstante, mostraremos de seguida a sua convergeˆncia. Em conta que |γn − γn+2| = | √ n+ 2−√n√ n √ n+ 2 + (−1)n √ n+ 2−√n√ n √ n+ 2 | ≤ 4√ n √ n+ 2 (√ n+ 2 + √ n ) ≤ 2 n √ n infere-se a convergeˆncia da se´rie ∑ |γn− γn+2|, e do exemplo 13 retira-se que ∑ γnξn, |ξ| = 1, ξ 6= ±1 converge simplesmente. Terminamos anotando que a sucessa˜o γn tambe´m exemplifica a importaˆncia da hipo´tese ξ 6= −1 no exemplo 13. De facto, a se´rie∑ (−1)nγn = ∑ (−1)n√ n + ∑ 1 n e´ a soma duma se´rie convergente com outra divergente e portanto e´ uma se´rie divergente. Lu´ıs V. Pessoa Func¸o˜es anal´ıticas 35 2.1 Problemas 1. Averigue se as seguintes se´ries sa˜o absolutamente convergentes, simplesmente convergentes ou divergentes: i) ∑ n 2(−1) nn ; ii) ∑ n e− √ n ; iii) ∑ n (√ nj + 1− √ nj ) , j ∈ N1 ; iv) ∑ n 1 ( lnn)j , j ∈ N1 ; v) ∑ n ln ( 1 + 1 nj ) , j ∈ N1 ; vi) ∑ n sin ( nπ + (−1)n nj ) , j ∈ N1 ; vii) ∑ n n32n + n n23n + 1 ; viii) ∑ n ( 1− 1 n )n ; ix) ∑ n ( 1 + 2(−1)n − 3 n )n2 ; x) ∑ n 1 + √ n ξn n2 + 1 , |ξ| = 1 ; xi) ∑ n 1 + √ n ξn n− 1 , |ξ| = 1 ; xii) ∑ n 1 + n ξn n2 − 1 , |ξ| = 1 ; xiii) ∑ n sin ( nπ + 1 n ) , xiv) ∑ n E ( i(nπ + 1 n ) ) ; xv) ∑ n 1 n( lnn)j , j ∈ N1 ; xvi) ∑ n 1 lnn! ; xvii) ∑ n 1 ln (jn)! , j ∈ N1 ; xviii) ∑ n 1 2n √ nn+2 ξn , |ξ| = 1 ; xvix) ∑ n 1 n + (−1)nnα ξ n , α < 1 ; xx) ∑ n 1 n + (−1)n , j ∈ N1 ; xxi) ∑ n (−1)n 1 n + (−1)n , j ∈ N1 . 2. Calcule a soma das seguintes se´ries ou justifique a sua divergeˆncia: i) ∞∑ n=k zn , z ∈ C , k ∈ N ; ii) ∞∑ n=1 (1− z)n+1 (1 + z)n−1 , z ∈ C ; iii) ∞∑ n=0 nzn , z ∈ C ; iv) ∞∑ n=1 1 n(n + p) , p ∈ N1 ; v) ∞∑ n=0 1 (n + 1) · · · (n + j) , j ∈ N2 ; vi) ∞∑ n=1 n (n + 1)! ; vii) ∞∑ n=2 ln (1 + 1 n ) lnn ln (n + 1) ; viii) ∞∑ n=2 n 2n + 1 (n2 − 1)(n2 + 2n) . 3. Calcule os limites superior e inferior das sucesso˜es an+1/an e n √ an e averigue da convergeˆncia da se´rie ∑ an, nos diferentes casos em que os termos da sucessa˜oan, n ∈ N sa˜o definidos por: i) np n! , p ∈ N ; ii) a n np , a > 0, p ∈ N ; iii) n n n! ; iv) nn (2n)! ; v) anbn an + bn , a, b ∈ R+ ; vi) ( 1 + 1 n + 2 )n ; vii) ( 1 + 1 n )n! ; viii) e √ n n2 ; ix) n2e− √ n ; x) nrrn , r > 0 ; xi) r(−1) nn2 , r > 0 ; xii) r(n n) , r > 0 ; xiii) 2 + (−1)n ; xiv) 2−n(2+(−1)n) ; xv) 1 1 + (−1)nn . 4. Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o decrescente tal que a se´rie ∑ an converge. Mostre que an ≥ 0 , n ∈ N. 5. Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos positivos e considere a sucessa˜o das somas parciais dada por Sn = a0 + · · ·+ an−1. Mostre que a se´rie ∑ n ξ nSn diverge, qualquer que seja ξ ∈ C, |ξ| = 1. 6. Considere δ > 0 fixo e mostre que a se´rie ∑ rn diverge, para qualquer que seja a sucessa˜o rn, n ∈ N cujo conjuntos dos termos verifica {rn : n ∈ N} ⊃ Q ∩ [−δ, δ] . Lu´ıs V. Pessoa 36 2.1. Se´ries nume´ricas 7. Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos complexos e defina-se a sucessa˜o de termo geral αn = an + · · ·+ a2n−1 , n ∈ N1. i) Mostre que se a se´rie convergente ∑ an converge enta˜o limn αn = 0. ii) Fornec¸a exemplo duma sucessa˜o an, n ∈ N tal que a se´rie ∑ an diverge e limn αn = 0. 8. Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o decrescente de termos positivos. i) Mostre que se a se´rie ∑ an <∞ converge enta˜o limn nan = 0. ii) Fornec¸a exemplo duma sucessa˜o an, n ∈ N decrescente de termos positivos tal que a se´rie ∑ an diverge e limn nan = 0. 9. Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos complexos e Sn = a0 + · · · + an−1 a sucessa˜o das somas parciais da se´rie ∑ an. Demonstre que: i) a se´rie ∑ an converge sse a sucessa˜o S2n , n ∈ N e´ convergente e lim an = 0 ; ii) se an = (−1)n , n ∈ N enta˜o S2n e´ convergente e ∑ an diverge. 10. Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos complexos. i) Mostre que a se´rie ∑∞ n=0(−1)n(an + an+1) converge sse lim an = 0, e em caso afirmativo a sua soma verifica ∑∞ n=0(−1)n(an + an+1) = a0. ii) Mostre atrave´s de exemplo que e´ poss´ıvel as se´ries ∑ (−1)nan e ∑ (−1)n(an + an+1) serem respectiva- mente divergente e convergente. iii) Suponha que a sucessa˜o de termos complexos an, n ∈ N e´ limitada e mostre que a seguinte se´rie ∞∑ n=1 (−1)n 1 n (an + an+1) converge. 11. Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos complexos. Mostre sucessivamente que: i) se as se´ries ∑ a2n e ∑ a2n+1 sa˜o convergentes enta˜o ∑ an converge; ii) Deˆ um exemplo duma sucessa˜o an, n ∈ N de termos complexos tal que as se´rie ∑ an converge e no entanto ∑ a2n e ∑ a2n+1 divergem. 12. Considere uma sucessa˜o an, n ∈ N de termos na˜o negativos. i) Mostre que se ∑ an converge enta˜o ∑ a2n converge. ii) Encontre um exemplo duma sucessa˜o nas condic¸o˜es do enunciado tal que ∑ a2n converge e ∑ an diverge. iii) Justifique que retirando a hipo´tese an ≥ 0, n ∈ N, a asserc¸a˜o em i) na˜o e´ va´lida. 13. Considere uma sucessa˜o an, n ∈ N de termos na˜o negativos. i) Mostre que se a se´rie ∑ a2n converge enta˜o ∑ a2na2n+1 converge. Sugesta˜o: Considere a desigualdade (a− b)2 ≥ 0 , a, b ∈ R. ii) Deˆ exemplo duma sucessa˜o an, n ∈ N nas condic¸o˜es do enunciado, tal que ∑ a2na2n+1 converge e ∑ a2n diverge. iii) Suponha adicionalmente que a sucessa˜o an, n ∈ N e´ mono´tona. Mostre que se a se´rie ∑ a2na2n+1 converge enta˜o ∑ a2n tambe´m converge. 14. Considere uma sucessa˜o an, n ∈ N de termos na˜o negativos. i) Mostre que se a se´rie ∑ a2n converge enta˜o ∑ an nα converge para α > 1 2 . ii) Deˆ exemplo duma sucessa˜o an, n ∈ N de termos na˜o negativos tal que ∑ a2n converge e ∑ an√ n diverge. Sugesta˜o: Para a al´ınea i) considere a desigualdade (an − 1nα )2 ≥ 0 , n ∈ N1. Lu´ıs V. Pessoa Func¸o˜es anal´ıticas 37 15. Uma sucessa˜o αj , j ∈ N diz-se convexa se a sucessa˜o an = αn − αn+1 , n ∈ N e´ decrescente. i) Verifique a seguinte igualdade αn − αm = m−1∑ j=n aj , m > n, e conclua que se existe an < 0 enta˜o limn αn = +∞. ii) Suponha que αj , j ∈ N e´ convexa e limitada e conclua que αj , j ∈ N e´ decrescente a zero e limnan = 0. Sugesta˜o: A monotonia e´ consequeˆncia imediata de i). Para mostrar que limαn = 0 tenha em conta que ∑ an converge e o problema 8. iii) Nas condic¸o˜es da al´ınea ii) conclua que ∑∞ n=0 n(an − an+1) = α1 − limn αn. 16. Considere uma sucessa˜o de termos complexos an, n ∈ N. Demonstre sucessivamente que: i) se o limite limn n 2an existe, enta˜o as se´ries ∑ n(an − an+1) e ∑ an sa˜o convergentes e as suas somas verificam ∞∑ n=1 n(an − an+1) = a1 − ∞∑ n=1 an+1 . ii) se o limite limn n k+1an existe, enta˜o as se´ries ∑ n n k(an − an+1) e ∑ n n jan+1 , j = 0, · · · , k − 1 sa˜o convergentes e as suas somas verificam ∞∑ n=1 nk(an − an+1) = a1 − k−1∑ j=0 ( k j ) ∞∑ n=1 njan+1 . iii) Fixos j ∈ N e p ∈ N2 , considere a sucessa˜o de termo geral an = 1 (n + j)(n + j + 1) · · · (n + j + p) e aplique as asserc¸o˜es em i) e ii) para calcular a soma ∑ n=1 n2(an − an+1). 17. Seja f : [ 0,+∞ [ → R+ uma func¸a˜o decrescente e ∑ f(n) uma se´rie convergente. Mostre que lim r→+∞ ∫ r 0 f(x) dx ≤ ∞∑ n=0 f(n) ≤ f(0) + lim r→+∞ ∫ r 0 f(x) dx. 18. Fixo 0 ≤ α ≤ 1, considere as sucesso˜es de termos gerais an = n−1( lnn)−α , n ∈ N2 e sn = a2 + · · · + an. Mostre que sn ∼ ln 1−αn 1− α α < 1 ln lnn α = 1 . 19. Mostre que se existe j ∈ N1 tal que γn − γn+2j e´ uma sucessa˜o de termos reais decrescentes enta˜o a se´rie∑ n ξ nγn e´ convergente para ξ = E(iθ) , θ 6= kπ/j , k ∈ Z . 20. Mostre que se existe j ∈ N1 tal que ∑ n |γn − γn+2j | e´ convergente enta˜o a se´rie ∑ ξnγn e´ convergente para ξ = E(iθ) , θ 6= kπ/j , k ∈ Z . Lu´ıs V. Pessoa 38 2.2. Se´ries de poteˆncias 2.2 Se´ries de poteˆncias Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos complexos. Uma se´rie de poteˆncias de z e´ uma se´rie indexada no paraˆmetro complexo z, da forma ∞∑ n=0 anz n. (1) O termo an diz-se o coeficiente da poteˆncia z n. As regio˜es de convergeˆncia e de convergeˆncia absoluta da se´rie de poteˆncias (1) sa˜o respectivamente os subconjuntos de C definidos por {z ∈ C : ∑ anz n converge} e {z ∈ C : ∑ anz n converge absolutamente}. Se f : U → C e´ uma func¸a˜o definida no conjunto aberto na˜o vazio U ⊂ C, enta˜o f diz-se anal´ıtica em U se para qualquer w ∈ U existe ǫ > 0 e uma sucessa˜o an, n ∈ N de termos complexos, tais que f(z) = ∞∑ n=0 an(z − w)n , para qualquer z ∈ D(w, ǫ) , (2) i.e. se numa vizinhanc¸a de w, a func¸a˜o f coincide com a soma duma se´rie de poteˆncias. Nas condic¸o˜es de (2), diz-se que no disco D(w, ǫ), a func¸a˜o f e´ representada por a se´rie de poteˆncias ∑ an(z−w)n. A func¸a˜o f diz-se anal´ıtica no ponto w ∈ C se e´ anal´ıtica numa vizinhanc¸a de w e diz-se uma func¸a˜o inteira se e´ representada por uma se´rie de poteˆncias com raio de convergeˆncia +∞. Proposic¸a˜o 1 Seja an, n ∈ N uma sucessa˜o de termos complexos e w ∈ C. De acordo com as convenc¸o˜es 1/0+ = +∞ e 1/(+∞) = 0, considere-se r := 1 lim supn n √|an| ∈ [0,+∞] . (3) Se 0 < r < +∞, enta˜o a se´rie de poteˆncias ∑ an(z − w)n converge absolutamente no disco aberto D(w, r) e diverge em C\clD(w, r). Se r = 0 ou r = +∞ , enta˜o ∑ an(z − w)n converge absolutamente no conjunto {w} ou C , e diverge no complementar, respectivamente. Demonstrac¸a˜o: Suponha-se inicialmente que 0 < r < +∞. Atentando a lim sup n n √ |an(z − w)n| = |z − w| lim sup n n √ |an| , (4) sabemos da proposic¸a˜o [10 sec. 2.1] que a se´rie ∑ an(z − w)n converge absolutamente se |z − w| < r e diverge se |z − w| > r. Se r = 0+ ou r = +∞ enta˜o respectivamente lim supn n √|an| = +∞ e lim supn n √|an| = 0. Consequentemente,
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