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Documentário "Juízo" - Análise de Especialistas

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Prévia do material em texto

JUÍZO
MARIA AUGUSTA RAMOS
U
M
 F
IL
M
E
 D
E
PETROBRAS, DILER & ASSOCIADOS, NOFOCO FILMES e 
FILMES DO ESTAÇÃO apresentam
www.juizoofilme.com.br
JUÍZO �
SUMÁRIO
ECA – 18 anos 6
Os dois corpos do réu ou as duas faces da imagem 8
3 perguntas, 3 juízes 10
Penalização em dobro 1�
Aceitar ou reagir 16
O abismo – sobre o documentário Juízo 20
“Não é apenas sobre a justiça” 22
A câmera lúcida 26
Glossário 28
Sobre a diretora 30
Ficha técnica 31
SINOPSE
Juízo acompanha a trajetória de jovens com menos de 18 anos de idade diante da lei. Meninas e 
meninos pobres entre o instante da prisão e o do julgamento por roubo, tráfico, homicídio.
Como a identificação de jovens infratores é vedada por lei, eles são representados no filme por 
jovens não-infratores que vivem em condições sociais similares. 
Todos os demais personagens de Juízo – juízes, promotores, defensores, agentes do DEGASE, 
familiares – são pessoas reais filmadas durante as audiências na II Vara da Justiça do Rio de 
Janeiro e durante visitas ao Instituto Padre Severino, local de reclusão dos menores infratores. 
Juízo atravessa os mesmos corredores sem saída e as mesmas pilhas de processos vistos no 
filme anterior de Maria Augusta Ramos, o premiado Justiça, e conduz o espectador ao instante 
do julgamento para desmontar os juízos fáceis sobre a questão dos menores infratores. Quem 
sabe o que fazer? 
As cenas finais de Juízo revelam as conseqüências de uma sociedade que recomenda “juízo” a 
seus filhos, mas não o pratica.
JUÍZO �
6 JUÍZO JUÍZO 
No ano em que o Estatuto da Criança e do Adolescente chega à maioridade, a 
Juíza Cristiana Cordeiro analisa o que é ser um menor frente à justiça brasileira
Nasci no dia 13 de julho de 1990 sob o olhar atento de todos. Dentre tantas esperanças em mim depo-
sitadas, uma das principais dizia respeito ao status que eu passaria a ostentar. Desejavam que fossem 
abandonadas as anteriores categorizações de menores vadios, libertinos ou em situação irregular, para 
que crianças e adolescentes passassem a ter reconhecida a sua condição de pessoas humanas em 
processo de desenvolvimento e sujeitos de direitos civis.
Com o passar dos anos, tenho percebido o enorme abismo que separa o que foi sonhado para mim e a 
realidade. A prioridade absoluta que eu deveria receber é letra morta, e continuo sendo visto como uma 
questão de menor importância. Sob o argumento de que me é garantido o direito de ir e vir, me deixaram 
sozinho, à noite, com fome e frio. Dali para o fumo, a droga, a bebida e o roubo, não custou muito. 
Ignoram que quando dois direitos parecem colidir, prevalece o mais relevante, e para mim teria sido tão 
importante meus direitos à vida, à saúde, à educação, à convivência familiar.
Não demorou muito, “rodei”. No dia em que fui preso, tinha acordado com fome de liberdade. Pensei 
numa moto bem bonita, com o vento batendo no meu rosto. Cheguei a levar um tiro do homem que eu 
assaltei. Na delegacia, fiquei 24 horas sem beber ou comer e minha família demorou a saber o que tinha 
acontecido. Durante dois dias, um dos outros 70 presos que estavam na mesma cela me ajudou com 
meus ferimentos. Soube de uma adolescente no Pará – também indevidamente colocada na companhia 
de presos adultos – que recebeu dos colegas tratamento de natureza bem diversa.
Saí da delegacia para conversar com um rapaz muito novo, de terno e óculos, que vim a saber ser o 
promotor de justiça. Fiquei um pouco surpreso com as suas perguntas, mas entendi melhor quando 
ECA: 18 ANOS
JUÍZO JUÍZO �
soube que, na faculdade, ele não estudou nada sobre direitos de crianças e adolescentes. Ele pediu mi-
nha internação provisória e saí dali para o Instituto Padre Severino, onde passei 45 dias sendo chamado 
de demônio, levando tapas nas orelhas, comendo com colher. Dividi um beliche sem colchão com um 
colega muito assustado, que vinha do interior do estado porque tinha roubado uma galinha. Não recebi 
visita. Minha família não teria o dinheiro das passagens.
No dia em que fui levado ao Juiz, tomei banho e vesti uma roupa limpa. O Juiz também era jovem como 
o promotor. Ele leu uns papéis que eu não entendi muito bem, mas que deviam ser como o promotor 
contou a história do roubo da moto, na língua dele. O Juiz apontava para mim e para minha mãe e 
perguntava se eu não tinha vergonha de decepcioná-la. Fiquei tentando imaginar que técnica de abor-
dagem era aquela, mas logo me lembrei que o Juiz fez aquela mesma faculdade, onde nada estudou 
sobre mim. Tive certa compaixão por aquela gente sem noção exata do que estava fazendo e passei 
quase toda a audiência pensando que eu poderia estar ali sentado na cadeira do Juiz, se tivesse tido as 
mesmas chances.
Da sentença que o Juiz me deu, só entendi a parte dos três anos. Eles passaram lenta e dolorosamente, 
e tanta coisa aconteceu, e tantas histórias ouvi, que quando a porta se abriu e me liberaram (segundo 
o Juiz, “só mesmo porque o tempo máximo de internação foi atingido”), nem sabia mais quem eu era. 
Só que eu era “ex-menor”.
Foi assim que o jornal se referiu a mim quando fui preso. Agora, também podem divulgar meu nome. 
Chamo-me Estatuto da Criança e do Adolescente.
A Juíza Cristiana Cordeiro é titular da II Vara Regional da Infância, da Juventude e do Idoso do Tribunal 
de Justiça do Rio de Janeiro.
8 JUÍZO 
Ao dar voz a atores de comunidades carentes, Juízo exibe uma 
fronteira tensa entre ator e personagem
Andréa França
O que os últimos filmes de Maria Augusta Ramos lêem e capturam nas representações da Justiça brasi-
leira? Grosso modo, que elas são feitas por uma lógica de escolhas, códigos de posturas, articulações, 
disposições espaciais dos atores envolvidos, gestos... Mas dizer isso é certamente dizer pouco. O que 
Justiça e Juízo evidenciam é o sentido da Lei para os réus - vazio, incompreensível, oco - e as relações 
de poder aí implicadas. Ao mostrar o teatro social e o funcionamento do sistema judiciário, estas ima-
gens nos fazem ver a própria forma das lutas sociais e políticas hoje no Brasil, impotente e frágil. 
Como em seus documentários anteriores, também em Juízo a documentarista mantém-se na invisibili-
dade, recusando comentários ou perguntas, sem fazer intervenções, buscando um tratamento “justo” 
através de uma câmera discreta, imperceptível, sóbria. Em se tratando de exibir as representações da 
Lei, tanto em Justiça como em Juízo, a diretora acerta em cheio ao optar por esse procedimento técni-
co/estético: na medida em que diretora e equipe não podem intervir no curso daquilo que acontece nas 
salas do fórum (estamos longe do Irã de Abbas Kiarostami, em Close Up), que aqueles que são filmados 
encenam papéis exteriores ao filme, mais vale se ater ao fluxo dessas representações, a um poder que 
se expõe para uma câmera e que o registra tal como ele se mostra (portanto, naquilo que oculta). Daí 
a necessidade e o gosto da documentarista pela “cena” dentro do quadro cinematográfico. Como em 
Raymond Depardon, o teatro das instâncias de poder é tão ou mais importante do que suas engrena-
gens (caso de Frederick Wiseman). Se o próprio teatro da justiça já implica em uma cena para uma sala, 
um ator para um espectador, uma imagem para uma coisa, personagens (réu, defensor, juiz...) para 
sujeitos singulares (“essa” ou “aquela” mãe), cabe à câmera de Maria Augusta Ramos se ater a essa 
cena sem julgar, sem criar suspense, mas procurando propor ao espectador uma visão sintomática da 
sociedade, dos jogos de poder, de violência e de impotência que ela agencia. 
OS DOIS CORPOS DO RÉU OU 
AS DUAS FACES DA IMAGEM
JUÍZO 
JUÍZO 
Se em Justiça importam os papéis exigidos pela Lei - dentro e fora 
do tribunal, em Juízo, o que está em jogo são os papéis dos réus 
que os atores devem representar, ou melhor,dublar, duplicar. Porque 
a escolha é explicitada desde a abertura: já nos créditos iniciais, so-
mos informados que a lei brasileira não permite fotografar ou filmar 
o rosto de menores infratores, de modo que o filme contratou atores 
em substituição aos acusados. Em função de uma impossibilidade 
real, a cineasta inventa um procedimento estético que, longe de nos 
distanciar do que é mostrado (afinal, expõe o artifício), dá um passo 
importante para a aliança entre nós e o filme: oscilamos permanen-
temente entre a dúvida e a crença, entre o distanciamento e a identi-
ficação, entre o artifício e a “impressão de realidade”. 
Está claro que a montagem fluente dos contra-planos garante em larga 
medida essa impressão. Mas a força de Juízo advém de outro lugar: 
Ramos opta por atores de comunidades carentes do Rio de Janeiro, 
rostos anônimos e quaisquer, em situação - econômica, social, de fil-
magem - mais ou menos próximas àquela dos réus; opta uma direção 
rigorosa, que exigiu, na reconstituição dos processos, que os mem-
bros da equipe também desempenhassem papéis (Maria Ramos no 
lugar do Juiz, claro!). Ou seja, em Juízo, a potência social do cinema 
grita, é visível e comanda as relações, os sentimentos, o real. 
Ao dar voz e corpo a atores de comunidades carentes, o filme exibe 
uma fronteira tensa, precária e obscura entre ator e personagem. 
Alessandro Jardim, Daniele Almeida, Guilherme de Carvalho, entre 
outros, são menos atores do que uma espécie de duplo, dublês, 
repetições ad infinitum da precariedade dos meios no Brasil, da es-
cassez de possibilidades, de um passado que pode se repetir, por-
tanto presente, de um futuro misturado em um espelhamento social 
indiscernível. Os dois corpos do réu expõem de modo perturbador 
a natureza dupla da imagem da Lei e do cinema. Afinal, estamos 
diante de simulacros ou da realidade? O que é justo e o que não 
é? O menor, que matou o pai a facadas enquanto este dormia, 
é culpado ou inocente? Questões indecidíveis, pois é da natureza 
dos dublês (cinema) e dos duplos (Lei) serem atravessados pelo 
mistério do insondável.
Andrea França é professora do departamento de comunicação 
da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio. 
É autora de Terras e fronteiras no cinema político contemporâneo 
e vice-presidente da Socine - Sociedade Brasileira de Estudos de 
Cinema e Audiovisual.
JUÍZO �
3 PERGUNTAS, 3 JUÍZES
JUÍZO 
O despreparo do sistema
Juiz Sergio Mazina
Entre as causas que conduzem crianças e adolescentes à criminalidade, quais são 
as mais fortes, do seu ponto de vista?
Há um complexo de fatores que são importantes para a produção da violência. De um lado, temos a ex-
clusão de parcelas cada vez maiores da população dos processos econômicos, sociais e culturais. Isso 
acarreta em condições de vida excessivamente degradantes, o que implica no aumento da violência. 
Do outro lado, temos um Poder Público historicamente orientado para atender interesses particulares e 
privados. É claro que, nesse sentido, a desorganização da polícia, da justiça e do Ministério Público é 
um fator altamente criminógeno. No que toca a delinqüência infanto-juvenil, acrescem-se outros fato-
res específicos, como a degradação das redes de educação pública no Brasil e a inexistência de uma 
rede de serviços públicos de apoio, acompanhamento e orientação da população mais vulnerável (tais 
como creches, serviços de assistência social e de saúde etc.). Por outro lado, e atravessando todos os 
segmentos da sociedade, temos uma profunda crise: é como se os adultos não tivessem autoridade 
sequer sobre si próprios e, por conseqüência, também já não sabem exercê-la sobre seus filhos. Mas o 
que a infância e a adolescência mais precisam é de adultos diferentes, que estejam abertos a um olhar 
que as entenda como indivíduos diferenciados, vivendo uma situação de vida muito peculiar. Eles ainda 
estão em formação e precisam de muita atenção, muito respeito e muito amor, que é o que nós adultos 
estamos negando cada vez mais.
Como definiria sua experiência de enfrentamento diário com as questões do me-
nor delinqüente?
Eu diria que o menor dos problemas é o adolescente infrator. Essa talvez tenha sido a primeira grande 
lição que tive como operador deste sistema de justiça. Os adolescentes são indivíduos diferenciados 
JUÍZO 10
Três questões foram propostas aos juízes Sergio Mazina, Cristiana Cordeiro e 
Luciana Fiala a respeito de Juízo
JUÍZO 11
dos adultos que cometem crimes - e para os quais eu voltava, até então, minha formação profissional. 
Em segundo lugar, a constatação da necessidade - e da dificuldade - de conversar com os responsáveis 
pelos adolescentes. Na sua gigantesca maioria, são pessoas acostumadas a um Estado que se define por 
apenas três verbos: cobrar, expulsar e prender. O grande desafio é o de realizar um Estado que acrescente 
um quarto exercício, que realmente converse com essas pessoas. Curioso, no entanto, é que nossa for-
mação profissional não está minimamente voltada a esse exercício da conversa, dessa troca. Finalmente, 
há de se reservar o maior de todos os desafios que consiste em lidar com um sistema de justiça que, 
à revelia do próprio direito existente hoje no Brasil, é ainda eminentemente punitivo, não tolerando uma 
percepção mais ampla daquela realidade e sempre buscando uma simplificação grosseira e massificada 
de suas rotinas. As grandes resistências às mudanças são dos próprios operadores do sistema de justiça, 
que não toleram abrir mão de papéis seletivos e punitivos que há muito invocaram para si.
Como lhe parece que Juízo retrata a questão e participa do esforço para reduzir a 
dimensão do problema?
É aquela idéia de iluminar alguma coisa que estava escurecida. Esse é o principal trabalho realizado pelo 
filme e o centro de sua importância documental. O filme Juízo se debruça sobre o imenso despreparo 
que atinge todos os operadores desse sistema de justiça, desde administradores das instituições priva-
tivas de liberdade - que não percebem o absurdo de disciplinar crianças como se fossem adultos - até, 
e principalmente, juízes, promotores de justiça e advogados. Desde os trajes grotescos que vestem 
até a linguagem estridente que empregam, tudo é feito para não conversar, para não dialogar, para não 
entender e para não ser entendido. Estamos diante de uma certa nobreza descoroada. Ninguém percebe 
a dimensão mais ampla do serviço público. Se essa é a justiça, então a vida corre à distância dela e 
sensibilizar-nos para isso foi certamente a maior maestria do filme.
O Juiz Sergio Mazina é vice-presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais.
Como um soco no estômago
Juíza Cristiana Cordeiro
Entre as causas que conduzem crianças e adolescentes à criminalidade, quais são 
as mais fortes, do seu ponto de vista?
A falta de perspectiva de futuro; a estrutura familiar desorganizada, sem imposição clara de limites, 
em geral com ausência da figura paterna, que representa a lei; a sociedade de consumo, onde bens 
materiais são supervalorizados em detrimento de outros bens, como ética, moral, amizade e respeito; 
a ausência ou precariedade dos serviços essenciais oferecidos pelo Estado, em especial saúde e edu-
cação de qualidade; o tempo ocioso, sem possibilidade, de preenchimento com atividades de lazer ou 
ensino; e a facilidade de acesso a armas e drogas (lícitas e ilícitas).
Como definiria sua experiência de enfrentamento diário com as questões do me-
nor delinqüente?
Quando se trabalha com um número reduzido de crianças e adolescentes em conflito com a lei, é pos-
sível estabelecer um vínculo com eles e implicá-los no processo de ressocialização, traçando um plano 
de trabalho individualizado. Tive experiências bem sucedidas com diversos adolescentes em Nilópolis 
por ter encontrado lá estes ingredientes. Percebo que nos grandes centros urbanos talsucesso é mais 
raro, especialmente quando há uma grande quantidade de adolescentes atendidos por uma mesma 
Vara. Um bom exemplo disso é a quantidade diária de audiências de apresentação (primeira audiência 
– e, às vezes, única) realizadas. Se o Juiz dispõe de uma hora ou de 15 minutos para cada audiência, 
obviamente na segunda hipótese fará uma audiência de pior qualidade. 
Como lhe parece que Juízo retrata a questão e participa do esforço para reduzir a 
dimensão do problema?
Enquanto Juíza, não tenho vergonha de dizer que o filme de Maria Augusta Ramos me prendeu à cadeira 
e me socou o estômago. O filme revela o quanto os que lidam diariamente com a questão do adolescen-
te infrator estão despreparados para fazê-lo e o quanto sequer se dão conta disso. Como se o conteúdo 
do filme não bastasse, Maria Augusta ainda nos deixa o lembrete emblemático do título. Espero que os 
que têm o poder de promover mudanças recobrem o JUÍZO em breve.
A Juíza Cristiana Cordeiro é titular da II Vara Regional da Infância, da Juventude e do Idoso do Tribunal 
de Justiça do Rio de Janeiro.
JUÍZO 12
Um convite à reflexão
Juíza Luciana Fiala
Entre as causas que conduzem crianças e adolescentes à criminalidade, quais são 
as mais fortes, do seu ponto de vista?
Não há dúvidas de que o contexto sócio-econômico em que os adolescentes vivem influi na ida para a 
criminalidade. No entanto, o que mais interfere é a formação da criança, a educação recebida dos pais, 
o ambiente familiar e o estímulo aliado à cobrança e à fiscalização do empenho nos estudos e do cum-
primento de regras de conduta e convívio social. Não é porque é pobre que tem que ser bandido. Mas 
tudo depende do que é visto e aprendido em casa, de noções de dignidade e caráter e a necessidade de 
estar sempre em busca de um objetivo. Infelizmente, estes ensinamentos cada vez mais escassos são 
pontos decisivos na formação do caráter. Nos adolescentes infratores, ocorre um desvio na personali-
dade que, depois de certa idade, é difícil de ser contornado.
Como definiria sua experiência de enfrentamento diário com as questões do me-
nor delinqüente?
Bastante desgastante. Principalmente por saber que a chance de recuperação daqueles jovens era re-
mota, já que exigiria uma ação conjunta dos poderes executivo, legislativo e judiciário, além de suporte 
médico e psicológico, e reformas e melhorias das instituições nas quais cumprem as medidas sócio-
educativas. Ou seja, aquilo que chamam de “vontade política”. Sem isso, as medidas aplicadas caem 
no vazio. Mas eu, como Juíza, não tenho autorização legal para não aplicar a medida necessária. Para 
mim, era uma sensação de impotência que eu não podia deixar prevalecer. Então, procurava fazer o que 
estava a meu alcance para alertar, procurava de todas as formas chamar à consciência os adolescentes 
para o que estavam fazendo e exigia que percebessem as implicações de seus atos.
Como lhe parece que Juízo retrata a questão e participa do esforço para reduzir a 
dimensão do problema?
O filme trata de um tema árido com muita leveza. Não vi ninguém sair com uma sensação ruim. O mais 
interessante é que retrata a vida como ela é nos dias atuais. Nada ali deixou de acontecer, foi ensaiado 
ou treinado. A meu ver, o seu grande mérito é “fazer do limão uma limonada”. As adversidades existem 
na vida e devemos ultrapassá-las, tendo esperança de que muitos venham a pensar assim, o que incu-
tirá na mentalidade dos jovens noções de dignidade, respeito e perseverança. O filme chama atenção 
para a situação real dos adolescentes infratores e convida à reflexão toda a sociedade. E isso é um 
excelente começo.
A Juíza Luciana Fiala é Juíza de direito do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e no momento atua na 
Comarca de Paracambi. Algumas audiências julgadas por ela estão incluídas em Juízo.
JUÍZO 13
1� JUÍZO JUÍZO 
O Estado deve garantir proteção integral à criança e ao adolescente. 
No entanto, constatamos a ociosidade do jovem, sem escola, sem esporte, 
sem lazer, sem respeito
Luiz Flávio Borges D’Urso
Os jovens infratores passam pelos mesmos descaminhos de um Judiciário sobrecarregado de pro-
cessos e de um Poder Público que não tem respostas efetivas para os problemas da sociedade. Juízo 
concentra-se nos julgamentos e na rotina de adolescentes infratores, evidenciando o trabalho real dos 
operadores do Direito – magistrados, advogados e membros do Ministério Público – nas audiências, 
defendendo, acusando e julgando esses adolescentes acusados de roubo, tentativa de seqüestro, tráfi-
co de drogas, homicídios, entre outros delitos.
Em Juízo, temos a Justiça sendo aplicada por juízes que querem saber se o adolescente gostou de 
roubar, se o amigo, que lhe deu a faca ou o revólver, é quem o comanda, se ele pertence a gangues, se 
pensou nas conseqüências de seu ato. No contraponto, temos os advogados, buscando assegurar os 
direitos dos jovens, querendo saber se o adolescente foi coagido a praticar o delito, apontando moti-
vações e atenuantes, além de propor medida justa, prevista pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, 
menos drástica do que a internação. É o caso do adolescente que matou o pai alcoólatra que o surrava. 
Enquanto o Ministério Público pedia a internação, a advogada considerava o ato grave, mas ressalvava 
que na Vara da Infância e Juventude deve-se buscar a ressocialização. Para ela, a internação não iria 
 PENALIZAÇÃO EM 
 DOBRO
JUÍZO JUÍZO 1�
resolver o problema, que era de ordem emocional, uma vez que aquele pai só agia com agressão. O Juiz 
optou pela internação durante a semana e visita à mãe nos finais de semana.
Pelo ECA, o Estado deve garantir proteção integral à criança e ao adolescente, sendo a internação 
medida extrema, profilática, com o fim de reavaliar sua conduta e garantir meios para sua recuperação 
e retorno à sociedade. No dia-a-dia de instituições que têm essa finalidade, no entanto, tudo o que 
constatamos é a ociosidade dos jovens, sem escola, sem esporte, sem lazer, sem respeito, comendo 
em quentinhas e dormindo em quartos coletivos superlotados e em condições precárias.
A realidade desses adolescentes nos choca – detenção, algemas, camburão, grades, violência. A falta 
de perspectiva também. É o caso da adolescente a quem o Ministério Público concede a remissão 
diante da baixa gravidade do delito. Cabe a ela aceitar o perdão ou deixar que o processo prossiga. Ela 
reluta em ser libertada, para voltar para casa, porque “lá é pior”.
Sem dúvida, essa não é a ressocialização de jovens infratores com que sonhamos. O filme até mostra 
agentes do Estado que vão à instituição para saber se os adolescentes têm camisas, shorts, chinelos 
e colchonetes, como se isso fosse resolver a omissão do Estado na recuperação desses jovens, cuja 
reinserção deveria passar, obrigatoriamente, pela educação, saúde e tratamento digno, durante o cum-
primento de medida privativa de liberdade. O filme deixa, pelo menos, duas perguntas: Será que não falta 
juízo à sociedade? O jovem infrator não está sendo penalizado duplamente?
Flávio Borges D’Urso é advogado e presidente da Secção São Paulo da OAB - Ordem dos Advogados 
do Brasil, cargo para o qual foi eleito em 2003 e reeleito em 2006.
16 JUÍZO JUÍZO 
Quais são as chances reais do jovem melhorar sua vida, com tantas 
desvantagens? Quando teremos o juízo que recomendamos?
Maria Helena Zamora
Juízo precisa ser visto. Como em seu documentário anterior, Justiça, Maria Augusta Ramos economiza 
na denúncia, nas situações que provocariam sentimentos exacerbados. Aqui, ela também não apela, 
mas fica à distância com sua câmera seca. Nada de drama, mas o cotidiano banal, a burocracia. Ela 
deixa conosco a tarefa de entender, elaborar e aceitar o que se vê. Ou a não aceitar e reagir. 
O filme mostra a pantomima de uma Justiça moralizadora, que repete “recomendações salutares” 
aos jovens- de bom comportamento, de boas escolhas e, no trocadilho que dá nome ao filme, 
de juízo! Os juízes, diante dos jovens, mostravam exageradamente sua preocupação social, mas o 
que ficava latente era a enorme distância e incompreensão entre os jovens e quem julgava e inva-
riavelmente condenava. É um sistema que não sai da tradição penal de concentrar nessas vidas 
pobres e em suas famílias toda a culpa não apenas do ato infracional, mas da própria situação 
em que se encontram. Culpados por não estudarem, por não trabalharem, por serem rebeldes, por 
serem pobres, por quererem consumir... E a sociedade? Presumivelmente harmônica, igualitária? 
E o Estado? Cer tamente assegurador dos direitos, cumpridor das próprias leis? E as instituições 
do sistema sócio-educativo? Seriam lugares onde retomar uma cidadania ameaçada e se respon-
 
 REAGIR
ACEITAR OUACEITAR OU
JUÍZO JUÍZO 1�
sabilizar por seus atos? Ambientes de estudo e de relacionamento saudável? 
No Brasil, temos cerca de 14 mil adolescentes em cumprimento de medida sócio-educativa de privação 
de liberdade. Destes, cerca de 90% são meninos; 76% têm entre 16 e 18 anos; 63% não são brancos 
e destes, 97% negros; 51% deles não freqüentam mais a escola; 90% sequer concluíram o Ensino 
Fundamental e quase 86% são usuários de drogas. A maioria está em condições precárias, como a 
que o filme tem o mérito de mostrar, onde a brutalidade mal se disfarça, além de serem desprovidas de 
programas pedagógicos adequados. Quais são as chances reais dos jovens de melhorarem suas vidas 
e ressignificarem seus atos nocivos em tais condições e com tanta desvantagem? Quando teremos o 
juízo que recomendamos e cobraremos os devidos e prometidos direitos sociais?
Os adolescentes infratores têm aparecido de forma endemonizada na mídia. Parte-se do pressuposto 
que eles são os que mais cometem crimes – noção que é falsa. As propostas repressivas como 
soluções para a violência estão disseminadas – redução da maioridade penal, aumento do tempo de 
privação de liberdade. Tais propostas, bem como um Estado omisso e certas práticas de “justiça”, 
têm em comum apenas sua inoperância e a facilidade com que se pisa nos miseráveis. Veja Juízo e 
ouse pensar.
Maria Helena Zamora é doutora em psicologia e vice-coordenadora do Laboratório Interdisciplinar de 
Pesquisa e Intervenção Social - LIPIS da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio, 
onde também leciona.
JUÍZO 18
“Ele me chamou pra fazer isso (um assalto). Eu fiquei até meio assim, mas ele 
falou ‘Vamos logo!’, aí eu fui.” 
Menor infrator, acusado de roubar uma bicicleta
“Eu só apontei a arma pro moço.” 
Menor infrator, acusado de tentativa de assalto à mão armada
“Isso não é normal, você querer ficar internada numa instituição. 
É a primeira vez que eu vejo isso.” 
Alexandra Carvalho Feres, promotora pública, sobre a recusa da menor infratora em aceitar a remissão
“O meu filho estava sem leite e eu não tinha dinheiro pra comprar.” 
Menor infrator, respondendo por que assaltou, com faca, um turista austríaco
“Eu fico espantada porque é 
um menino com saúde, podia 
estar fazendo uma coisa lícita, 
lavando um carro, vendendo 
uma bala. Mas não, está 
roubando os outros.” 
Juíza Luciana Fiala para menor infrator, 
acusado de roubar uma bicicleta
JUÍZO 1�
“É o seguinte: você ia sair em liberdade no dia seguinte, só que você fugiu.” 
Juíza Luciana Fiala, sobre a fuga de um adolescente um dia antes de ser solto por não ter entendido o 
significado da expressão “liberdade assistida”
“Se ele ficar lá, a senhora vai perder o controle ou então vão matar ele. 
Infelizmente, eu estou sendo sincera com a senhora.” 
Juíza Luciana Fiala, para a mãe de um menor acusado de tráfico de cocaína
“Saindo daqui, eu quero comprar um tênis de 
��0 reais. Tô trabalhando, só ganhando 3�0, vou 
comprar como? Tem que voltar a vender droga.” 
Interno do Instituto Padre Severino
“Ninguém dorme, não. Passa um montão de rato.” 
Interno do Instituto Padre Severino quando perguntado sobre quem dormia 
nas camas que não tinham colchão
“O resto da tua vida você vai se lembrar 
que esfaqueou o teu pai. Se você devia 
efetivamente fazer isso ou não, eu vou deixar 
com a tua consciência. E isso, por mais que 
você se sinta aliviado de não ter mais alguém 
te surrando, não tem como apagar.” 
Juíza Luciana Fiala ao menor infrator, acusado de matar 
o pai a facadas
20 JUÍZO JUÍZO 
É no fato de os réus terem sido substituídos por outros 
garotos que está o desconcerto provocado pelo filme
Vera da Silva Telles
Desconcerto. É esse o impacto imediato. E é esse o ponto de partida para se falar de Juízo. A câmara 
fixa de Maria Augusta Ramos encena o teatro social no qual se desenrolam os rituais da justiça e os 
dramas cotidianos que ali, na II Vara da Infância e Adolescência do Rio de Janeiro, comparecem sob 
a tipificação jurídica (e moral) da infração. No entanto, ao mostrar os atores em cena, ela nos faz ver, 
no mesmo ato, o absurdo exposto no brutal abismo entre os operadores da justiça e os adolescentes. 
Abismo de códigos, de linguagem, de mundos que não se comunicam, ou melhor, que só se encon-
tram sob a lógica punitiva que comanda toda a encenação. Abismo da situação do garoto que foge da 
instituição no dia em que lhe foi concedida a liberdade, porque ele não entendeu e ninguém se deu ao 
trabalho de explicar o sentido da expressão “liberdade assistida”. Abismo da situação recorrente da lei-
tura ritualizada do documento de acusação, sempre seguida de um enfático sermão moral da Juíza e, de 
outro lado, a resposta constrangida do garoto instado a confirmar os atos praticados, sem compreender 
aquilo que está sendo dito. Não porque não reconheça a verdade das infrações das quais está sendo 
acusado, mas porque a linguagem cifrada do auto e os termos do discurso moral aparecem sempre 
em descompasso com as situações e sofrimentos que perpassam as existências ali transfiguradas na 
tipificação da infração. 
Os garotos são infratores da lei - é fato. As histórias encenadas tratam de pequenos furtos, de envol-
vimento no tráfico de drogas e até mesmo de um parricídio. Porém, conforme os personagens entram 
O ABISMO: 
 SOBRE O DOCUMENTÁRIO JUÍZO
JUÍZO JUÍZO 21
em cena para os depoimentos perante a Juíza – acusados, testemunhas, policiais, parentes – vão se 
perfilando os contornos de vidas que se estruturam no fio da navalha. Histórias de sofrimentos e infelici-
dades, percursos atravessados pelos acasos da vida. Vistos sob esse prisma, os termos do julgamento 
moral também ficam incertos, embaralhados, pois tudo parece transbordar por todos os lados a certeza 
de fronteiras entre o lado certo e o lado errado da vida. É isso que dá a sensação de que há algo (ou 
muito) de absurdo naquilo que é encenado ali, no lugar em que o juízo é exercitado. É isso que faz com 
que o discurso moral da Juíza, proferido sempre com ênfase e performance, apareça como algo de 
tal maneira descolado do real que termina por expor a própria impotência do discurso que mobiliza as 
noções de arrependimento e culpa. 
O fato de os réus terem sido substituídos por garotos que fazem a encenação em seu lugar é mais do 
que um artifício engenhoso da diretora. Como se esclarece logo de partida, foram escolhidos meninos 
que poderiam estar na mesma situação dos réus verdadeiros. Pois então, por isso mesmo, esse artifício 
de ficção confere ainda maior densidade ao descompasso. 
E é justamente nisso que se aloja o desconcerto provocado por esse documentário notável. A câmara 
bem posicionada da diretora desloca o terreno que poderia alimentar a denúncia fácil ou os lugares 
comuns sobre as mazelas da sociedade brasileira. Claro, poderíamos traçar muitas linhas sobre o 
feixe de causalidades das abissais desigualdades da sociedade brasileira, dos dramas da pobreza, da 
criminalidadejuvenil, das distorções do sistema de justiça no país etc. Porém, nada disso responderia 
às questões que nos são suscitadas pelas situações encenadas em Juízo.
Vera da Silva Telles é socióloga, leciona na Universidade de São Paulo - USP e é pesquisadora do 
Centro de Estudos dos Direitos da Cidadania – Cenedic.
22 JUÍZO JUÍZO 
Em entrevista aos críticos José Carlos Avellar e Pedro Butcher, a diretora de 
Juízo, Maria Augusta Ramos, discute como passar a vida de crianças infratoras 
para uma tela de cinema
O filme tem uma solução inusitada para o problema do rosto dos menores: o campo 
é documental e o contra-campo, ficcional. Como você chegou a essa solução? 
Você já tinha tomado esta decisão quando começou o filme ou isso apareceu no 
processo?
Logo no início do projeto, quando fiquei sabendo que os menores não poderiam ser identificados, 
me veio essa idéia. Mas tive medo que isso (substituir menores infratores por outros menores) não 
funcionasse, que parecesse falso, que perdesse o realismo que eu queria. Eu tinha que justificar para 
mim a função daquilo. “Por que não colocar uma venda? Qual a conseqüência para a narrativa, para a 
percepção do filme?”. Porque o fato de substituir aquele menino por outro, em si, também é significativo. 
Se não fosse aquele menino, seriam outros mil meninos. O que não está sentado ali poderia estar 
sentado ali. Queria dar um rosto, humanizar essas pessoas. O menor passou a ser muito desumanizado 
pela mídia. Eu queria olhar esses jovens de frente: a carência, a apatia, a falta de perspectiva pregada 
no rosto, a desilusão com as instituições, com o país e ao mesmo tempo, sedentos, cheios de energia. 
Antes de começar a ficção, filmei e editei toda a parte documental, com os menores de costas. Foram 
cerca de 50 audiências filmadas em quatro dias. Creio que mais ou menos 40 em três dias, e depois, a 
continuação dos casos escolhidos. Na época, a Juíza fazia quase 20 audiências por dia. Escolhíamos o 
caso que parecia interessante em termos de delito. Era impossível filmar tudo. 
“NÃO É APENAS SOBRE A 
 JUSTIÇA”
JUÍZO JUÍZO 23
E como foi a seleção dos garotos para a parte de ficção? Eles conheciam ou 
chegaram a conhecer os que estavam sendo julgados?
Para a escolha dos meninos substitutos contamos com a ajuda de duas comunidades, Bangu e 
Cidade de Deus. Eu não queria meninos atores, então não fomos, por exemplo, ao Nós do Morro 
(escola de atores de teatro e cinema que atua em comunidades carentes). A idéia era ‘serem’ eles 
mesmos, em vez de atuarem. Fomos a procura de garotos de comunidades que tivessem algum 
conhecimento do que é passar pelo juizado ou pelo Instituto Padre Severino, algum conhecimento 
da presença do tráfico. Foram selecionados os que tinham contato com essa realidade e que 
tivessem ‘personalidade’. Eles trazem a personalidade deles, o que é importante para o filme. 
Vi muitas crianças. Eu e minha assistente íamos nessas comunidades fazer casting. Apareciam 
meninos até de nove anos! Eu via, tirava foto, conversava com eles. Creio que vi uns cem meninos. 
Esse contato foi muito bacana.
A parte de ficção foi feita em estúdio ou no próprio tribunal? E os diálogos, foram 
refeitos? Alteram a história? Foram improvisados?
Foi tudo filmado na mesma sala de audiências. Os textos que eles falam são exatamente aqueles ditos 
nas audiências, com alterações mínimas. Por exemplo, um dos meninos na audiência responde: “não”; 
o nosso diz: “não, senhora”. O importante era que eles se sentissem à vontade com o texto para falar 
como se estivessem contracenando com a Juíza. Haviam questões técnicas: tinha um timing, era uma 
pergunta atrás da outra. Esta questão da utilização de meninos para serem filmados de frente no lugar 
dos menores infratores, veja: Bresson (Robert Bresson, cineasta francês) falava que o verdadeiro você 
não imita e o falso você não transforma. É o mesmo caso dos meninos: alguns mais, outros menos, 
todos eles sentem que poderiam estar ali de verdade. A maneira como eles dizem aqueles textos é muito 
crível. A gente tem que ter muito cuidado em deixar claro que estes meninos fazem parte de comunidades 
carentes, que convivem com a violência. Não estou dizendo que eles já passaram por ali, que já foram 
menores infratores. Mesmo sabendo que os meninos foram substituídos, tem a personalidade deles ali, 
a personalidade dos que mostram o rosto para a câmera, a verdade desses rostos. E isso torna o filme 
autêntico. O filme é também sobre esses meninos, esses rostos. 
As cenas no Padre Severino são uma outra história, porque existem os menores que estão cumprindo 
medida lá. Na sala de audiências estávamos sozinhos. No Padre Severino, na maioria das cenas, como 
a do pátio ou do almoço, os nossos meninos não estão lá. Não queríamos misturá-los com os outros 
por uma questão de segurança. E nem era preciso. No momento da chegada, quando eles entram e 
fazem a revista, o agente é realmente o agente. A coisa é feita daquele jeito mesmo, nada foi escrito 
previamente. As cenas dentro do dormitório, é tudo baseado no que os internos fazem. Deixei nossos 
meninos interagirem naquele espaço, serem eles mesmos. Filmamos duas vezes no dormitório, cada 
vez durante uma hora e meia. Era o que era possível. Era uma tensão constante. Nossos meninos 
encontravam conhecidos, queriam cumprimentar, mesmo que nós tivéssemos avisado que não podiam 
falar com os internos, havia disputas. Pensamos em alguns momentos que o making of do filme poderia 
ser melhor do que o filme, porque a história destes meninos que representaram os outros, a história de 
cada um desses meninos, dava outro filme. 
2� JUÍZO JUÍZO 
No processo de trabalho, primeiro você filmou as audiências e depois montou 
todas elas, antes de filmar os trechos de ficção que seriam inseridos?
Montei tudo antes. Montei no tempo quase real das audiências. Elas são muito rápidas. O tempo da 
tela é próximo do tempo real. Com exceção da audiência do parricida, que foi bastante longa devido à 
complexidade do caso. Cada juiz tem muitos processos por dia, não dá para demorar. O interessante é 
que há uma relação com o teatro. A Juíza faz um teatro. Ela não atua para a câmera, faz um teatro nas 
audiências. O acusado também, ele quer sensibilizar a Juíza que representa a lei, a pátria, a mãe. Todos 
desempenham papéis inclusive o promotor e o defensor. É o teatro da justiça. O que a Juíza pode fazer 
a não ser dramatizar? A lei é fixa, ela vai mandar os meninos para uma instituição onde eles não serão 
socializados porque os recursos são precários, ínfimos. E se ela mandar de volta para a comunidade, 
eles podem morrer. Eu não queria estar no lugar dela. 
Você escolheu a figura da Juíza?
Não. Quando eu a vi, fiquei encantada, é uma pessoa excepcionalmente carismática. Mas não está 
mais lá. Existe um titular da Vara e um juiz auxiliar que faz grande parte das audiências diárias e que, na 
época, era a Luciana Fiala. Em geral esses juízes auxiliares são juízes novos que ainda não são titulares 
de uma Vara. Alguns ficam seis meses, um ano, o que é pouco para adquirir a experiência necessária 
para lidar com esses meninos. Durante a pesquisa, vimos um outro Juiz bastante carismático e teatral: 
perguntava se os meninos estavam arrependidos, mandava ajoelhar na frente da mãe, olhar no olho dela 
e dizer que estava arrependido. Os meninos ajoelhavam, choravam, os pais choravam e eu também, é 
claro. Mas quando eu voltei para começar as filmagens, a Luciana estava no lugar dele. 
Então você montou as audiências e foi conversar com eles (atores)? Como você 
abordou esses meninos?
Eu escolhi uns vinte. A gente fez um laboratório em Bangu onde eles contavam as experiências deles 
e falavam das audiências. Nós assistimos juntos todos as audiências que fariam parte do filme já pré-
editadas. Achavam a Juíza muito perversa. Todos têm um olhar muito apático, como os meninosreais 
que eles representam. Eu procurei isso. A maioria não tem nenhuma perspectiva de futuro, são muito 
conscientes da miséria em que estão. Um menino me pediu 50 reais pra comprar um chinelo de marca. 
Eu perguntei por que ele queria tanto aquele. Ele respondeu “A gente não tem nada, já vive numa favela, 
e nem isso a gente pode ter?”. É a coisa da marca, do nome. Eles têm noção da injustiça social, mas 
ao mesmo tempo compram a imagem do “outro”. Fazem parte de um sonho que eles jamais poderão 
realizar, o sonho da máquina consumista. Estão ali naquele barraco que não tem nada, mas têm o tênis 
de marca, o que dá um status dentro da comunidade.
As audiências documentadas: depois de montadas foram exibidas para esses 
meninos para que eles soubessem o que teriam que representar? Como você 
trabalhou os diálogos? O texto original foi transcrito e levado até eles?
Eles viram as audiências montadas e, sim, tinham em mãos uma transcrição das falas. Um dava conta, 
chegava com tudo decorado, outro não conseguia ler e memorizar o texto sozinho. Eu trabalhei o texto 
com eles pessoalmente. Minha assistente Alice Lanari me ajudava. Eu fazia a Juíza e ela falava a parte 
JUÍZO JUÍZO 2�
do defensor ou da promotora. Todos os meninos são muito talentosos. Tenho muito orgulho deles. 
Problema real foi selecionar entre as quarenta audiências filmadas as dez que seriam usadas no filme. 
Tínhamos um material muito bom. Audiências como a do menino preso dentro de uma casa. Ele tinha 
pulado o muro. A Juíza perguntou o que ele estava fazendo ali e ele disse: “eu pulei o muro para vir para 
cá”; e ela: “como?!”; “para a senhora me mandar para o Padre Severino”. A história que ele conta é que 
ele queria estudar e não tinha escola, a mãe não cuidava dele. A Juíza enlouquece: “Nunca mais apareça 
aqui!”. Ele jura que está falando a verdade, enfrenta a Juíza. Vamos colocá-la como extra no DVD. 
Depois que viu as imagens de ficção, algo mudou no que você tinha planejado?
O trabalho de edição foi absolutamente fundamental. Eu tinha uma idéia, sabia para onde estava indo, 
mas a estrutura final só foi decidida na edição. Eu tinha selecionado previamente dez audiências 
e sabia que não poderia usar todas elas, era muita coisa, ia ficar cansativo. Além das audiências, 
tínhamos também as cenas filmadas no Padre Severino. Eu fiz uma ordem na edição. Porque, por 
mais carismática que a Juíza fosse, era necessário encontrar um equilíbrio entre ela e os meninos, 
para que não se tornasse um filme sobre ela. E ainda temos os pais, que quando presentes nas 
audiências eram questionados: “o que está acontecendo?”. Muitos meninos não têm mais pai e mãe, 
não têm controle nenhum. Nenhum, porque o Estado não tem poder na área onde eles moram. Foi o 
caso do menino que morreu. Eu nem ia usar aquela audiência. Quando eu soube, liguei para a mãe 
que tinha muito medo de falar. Ao rever a audiência, percebi que a Juíza dizia para ele: “você vai 
morrer se continuar assim”. Foi muito simbólico. Acho que a questão política e social fala mais alto 
no filme. Sente-se a impossibilidade de diálogo entre esses dois mundos: o do campo e o do contra-
campo. Juízo não é um filme apenas sobre a justiça. 
José Carlos Avellar é crítico de cinema e autor de O chão da palavra. Uma coleção de notas e ensaios 
seus se encontra em www.escrevercinema.com.
Pedro Butcher é crítico de cinema da Folha de São Paulo e editor do site Filme B.
26 JUÍZO JUÍZO 
Os meninos que vemos de frente para a câmera pertencem ao mesmo fora 
do quadro dos meninos que vemos de frente para juízes e promotores
José Carlos Avellar
Mãe severa (“chamam para roubar e você vai?”), a Juíza fala como quem repreende o filho que se 
portou mal (“podia estar lavando um carro, podia estar vendendo uma bala. Mas, não. Está roubando 
os outros”). Madrasta (“vocês não têm idade para ser mãe. Agora, arrumaram? Segurem o pepino!”), 
a Juíza repete com ar severo: nada justifica o roubo (“não tem justificativa. Está sem serviço? Vai 
procurar.”). Perdeu a paciência com o filho (“teu pai te educou com muita dificuldade e não foi para ser 
ladrão”). Perdeu a paciência com o filho que perdeu o juízo (“um cara que você nem conhece manda 
você segura uma arma e você segura”) e sua fala zangada aponta para o pior (“quer morrer? Na hora 
do pipoco quem vai levar tiro da polícia é você”). 
O menor (“sim senhora”), franzino, encolhido, baixa a voz (“nós só puxamos e corremos”), engole 
o que diz (“foi na hora do nervoso”), fala mais com reticências e silêncio que com palavras (“aí... eu 
encontrei ele nesse lugar.... aí ele me chamou para fazer isso... eu fiquei até meio assim... mas aí, ele 
falou: ‘vam’bora logo’... aí eu fui”). 
A cena assim como se vê ensina primeiro a ouvir. Ouvir não só o que se fala na sala de audiências da 
II Vara da Justiça do Rio de Janeiro, ouvir também os não ditos, as reticências e os silêncios. A cena, 
assim como se ouve, ensina a ver a sociedade como uma fusão de duas imagens, uma dentro da outra, 
uma presa na outra, no mesmo espaço e no mesmo tempo mas como universos distintos, distantes 
entre si assim como a favela que está dentro da cidade e simultaneamente fora dela. 
A CÂMERA LÚCIDA
JUÍZO JUÍZO 2�
A Juíza pergunta ao jovem infrator se valeu a pena abandonar a família e a escola e ser preso; ele não 
entende a pergunta e diz que sim, que valeu a pena. 
O menor beneficiado com L.A. não entende que a Justiça lhe concedeu Liberdade Assistida, foge do 
Instituto antes de ser libertado e volta a ser preso como fugitivo.
O promotor quer saber a idade do menor (“nasceu quando?”) e a resposta absurda vem num tom banal 
(“não sei”); ele não entende que alguém não saiba o dia de seu aniversário e repete a pergunta (“não 
sabe sua idade? não sabe o dia de seu aniversário?”). O menor não sabe nem quer saber (“não sei não. 
14? 15 anos?”). 
O jovem diz que pulou o muro da casa para ser preso, não queria roubar nada; a Juíza não entende o 
que ele diz, e o menor explica: queria ser preso porque na prisão poderia ir à escola.
Num canto da cela, fora de quadro, conversa a meia voz, dois internos do Instituto Padre Severino se 
entendem: “Aí, Filipinho, como é que eu faço? Vou sair daqui. Eu quero comprar um tênis, 450 reais. Eu 
trabalhando, ganho 350. Vou comprar como? Vou voltar a vender droga. Ou então...”
O que se passa na sala de audiências da Vara da Infância e da Juventude (e também o que se vê no Insti-
tuto Padre Severino e na favela, mas especialmente o que se passa na sala de audiências) sintetiza num 
teatro vivo o mecanismo social que produz o menor infrator. Na audiência – isto é: na audiência assim 
como vista pela câmera – é possível perceber não apenas a infração em julgamento como também a 
desigualdade social que conduz à vontade de roubar qualquer coisa ou de vender drogas para comprar 
o tênis que custa mais que o salário mínimo. Firme e atenta por trás do menor acusado, de frente para 
a Juíza e para o promotor, ao lado do defensor público, a câmera não perde de vista o que de fato a 
audiência documenta: a impossibilidade de diálogo; a língua parece a mesma, mas as palavras se refe-
rem a realidades e experiências diferentes. Promotor, réu, defensor, juiz, inspetor, ninguém tem certeza 
28 JUÍZO JUÍZO 
de entender o que acabou de entender. Que fazer? Como segurar o pepino? Que fazer com o infrator 
que fugiu do instituto depois de ser declarado em liberdade e trabalha como engraxate para sustentar 
o filho? Que fazer com o menor que na casa pobre da favela voltará a se envolver com o tráfico? Que 
fazer com a menor que prefere permanecer internada a voltar para casa? Que fazer com o menino que 
roubou uma bicicleta ou com a menina-mãe que roubou uma câmera fotográfica? Que fazer? – sugere 
o filme – primeiro olhar de frente, encarar a questão assim como faz a câmera.
Na sala, cena teatral, espelho da sociedade,a Juíza aparece como uma imagem-síntese das diversas 
mães que passam pelas audiências. Existe nela um pedaço da mãe que chora diante da filha que 
não quer voltar para casa (“é muita função em cima de mim sozinha, eu tenho que fazer o papel de 
mãe e de pai, dar carinho, dar amor e corrigir”). Existe nela um pedaço daquela outra mãe que diz só 
com um leve aceno de cabeça que não tem como sair com o filho da favela em que mora. E ainda, 
da mãe que conta que o filho era surrado pelo pai todo dia (“ele batia de cinto nele, todo dia, chegou 
a quebrar a fivela, ele até desmaiou, por duas vezes ele desmaiou”). Ela é também um pedaço das 
muitas mães que no Instituto Padre Severino abraçam os filhos num silêncio triste arranhado pelo 
barulho abafado do galpão em que todos se reúnem nos dias de visita. A Juíza é a autoridade que 
fala de modo claro e absolutamente firme, que perde a paciência com a menina muito mimada e com 
a outra que se tornou mãe antes de deixar de ser menina, e também é a que quase se cala diante do 
menor que matou o pai a facadas. 
A cena na sala de audiências ensina a ouvir as entrelinhas e silêncios e a ver o fragmento de realidade 
documentado como cena de cinema – imagem que se refere não só ao que está ali visível: como todo 
quadro de cinema, a cena assim como se ouve e se vê ensina a ver o fora-de-quadro. De repente, a 
câmera toma o ponto de vista da Juíza e o espectador se vê diante do menor interrogado – o que roubou 
uma bicicleta, o que puxou a máquina do turista, o que não quer voltar para casa, o que participou de um 
assalto a mão armada, o que pulou o muro para ir à escola, o que matou o pai. É como se a metade que 
somos na fusão que nos compõe saísse de dentro de si mesma para ver a outra metade cara a cara. 
O que Juízo, de Maria Augusta Ramos, propõe ao espectador é exatamente isso.
A solução é aparentemente simples: a identificação de menores infratores é vedada por lei e por isso 
eles são representados por jovens não-infratores. Eles repetem para a câmera o que os jovens infratores 
disseram na audiência em resposta às perguntas de juízes e promotores. Intérpretes, mas não exata-
mente atores: são jovens que vivem em condições sociais semelhantes àquelas dos que vemos julga-
dos e internados no Instituto Padre Severino. Estes jovens intérpretes recitam os textos e reconstituem 
a cena a partir da direta experiência de vida de cada um deles e não de um metódico trabalho de ator. 
Diante deles, o espectador é solicitado a estabelecer uma outra relação com a imagem: juízes, procu-
radores, defensores, inspetores, familiares, as pessoas reais filmadas na Justiça e no Padre Severino, 
são percebidos como fragmentos de realidade usados, digamos assim, para montar uma ficção que 
ultrapassa o simples reconhecimento da ação e de registro do real se transforma em representação, em 
composição cinematográfica, em última análise, em ficção. Os menores que repetem as respostas do 
julgamento de frente para a câmera são percebidos como um fragmento de ficção usado para, digamos 
assim, perder toda a carga de ficção que possui para se transformar num registro vivo, para documentar 
a realidade do jovem que interpreta. Na imagem, eles são os jovens infratores que interpretam e tam-
bém, e principalmente, são eles mesmos. 
JUÍZO JUÍZO 2�
Uma coincidência feliz traz aos cinemas quase ao mesmo tempo dois documentários que alternam 
depoimentos das pessoas que viveram de verdade os fatos narrados com a reconstituição ou repetição 
de todo o depoimento ou de parte dele por intérpretes: pouco antes de Juízo, tivemos Jogo de cena, de 
Eduardo Coutinho. Coincidência feliz para o melhor entendimento de um e de outro filme e para o enten-
dimento da expressão cinematográfica além das questões particulares que cada um discute. No filme de 
Coutinho, atrizes. De quando em quando elas representam, de quando em quando falam delas mesmas, 
como as demais mulheres filmadas pelo diretor. Contam uma história. Aqui e ali contam como uma atriz 
constrói seu personagem. Com um certo exagero talvez seja possível dizer que o filme de Coutinho é 
principalmente sobre as atrizes, sobre a representação. As pessoas reais filmadas são a matéria bruta 
elaborada adiante pelas atrizes ou são exemplos de representações espontâneas.
No filme de Maria Augusta Ramos, ao contrário, os intérpretes não são atores ou atrizes e também com 
um certo exagero talvez seja possível dizer que o filme é mais um documentário sobre eles do que sobre 
os jovens infratores de verdade vistos de costas na sala de audiências, no refeitório e na sala de visitas 
do Instituto Padre Severino. Os meninos e meninas que vemos de frente para a câmera pertencem ao 
mesmo fora do quadro das meninas e meninos que vemos de frente para juízes e promotores. Os jo-
vens intérpretes vivem tão confinados, tão à margem da sociedade quanto os que de fato são julgados 
nas audiências. Isto é o que revelam enquanto encenam, reconstituem, contam (esta, talvez a palavra 
exata: contam) o que outros meninos e meninas iguais a eles viveram na sala de audiência ou nas celas 
do instituto. Contam para uma câmera discreta e firme, toda ouvidos, olhos nos olhos deles, como os 
juízes recomendam que eles tenham juízo (“Você não tem direito de roubar bicicleta de ninguém. Nem 
bicicleta, nem nada de ninguém”), como os inspetores dizem que eles devem andar na linha (“Baixa a 
cabeça! Todo mundo. Em linha. Acabou de comer, baixa a cabeça!”).
José Carlos Avellar é crítico de cinema, autor de O chão da palavra. Uma coleção de notas e ensaios 
se encontra em www.escrevercinema.com.
30 JUÍZO JUÍZO 
GLOSSÁRIO
CRIAM – Centros de Recurso Integrado de Atendimento ao Menor
Unidades vinculadas ao DEGASE onde os adolescentes cumprem a medida sócio-educativa de semi-
liberdade. Eventualmente, diante da falta de investimento municipal, os adolescentes cumprem este tipo 
de medida no CRIAM, ou seja, o Executivo estadual absorve uma tarefa que cabia ao Executivo munici-
pal. Em razão do caráter da medida, a proximidade com a família e a comunidade do adolescente deveria 
servir de critério para a indicação do CRIAM no qual deverá cumprir sua medida. Contudo, muitas vezes, 
ainda que não admitido pela administração das unidades, problemas de facções criminosas inviabilizam 
que isso aconteça. No estado do Rio de Janeiro, há poucas unidades no interior, com concentração 
maior na capital, o que é alvo constante de críticas.
CTR – Centro de Triagem e Recepção
Setor do DEGASE responsável pela recepção dos adolescentes e seu encaminhamento à unidade em 
que cumprirá medida.
DEGASE – Departamento Geral de Ações Sócio-Educativas
Departamento ligado à Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos responsável 
pelas unidades sócio-educativas em que são cumpridas as medidas de internação provisória, interna-
ção e semi-liberdade.
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
Lei número 8.069/90, em que estão previstas as medidas sócio-educativas e o procedimento judicial 
para que estas possam ser aplicadas.
JUÍZO JUÍZO 31
ESD – Educandário Santos Dumont
Unidade feminina para cumprimento de medida sócio-educativa de internação, única no Estado do Rio 
de Janeiro, localizada no bairro da Ilha do Governador.
IPS – Instituto Padre Severino
Unidade para cumprimento de internação provisória. O ECA prevê que, em caso de extrema necessidade 
e havendo ‘indícios suficientes de autoria’ (forte indicativo de que o adolescente foi o autor do ato) e 
‘materialidade’ (comprovação de que o ato infracional existiu), o Juiz poderá determinar a internação do 
adolescente, antes da sentença, pelo prazo máximo de 45 dias.
Liberdade assistida (LA)
Medida sócio-educativa que consiste em acompanhamento e orientação do adolescente, extensiva a 
sua família. Tem prazo mínimo de seis meses e não tem duração máxima. Pode ser, a qualquer tempo, 
prorrogada,revogada, ou substituída por outra medida. Só é aplicável até os 18 anos.
 
Semi-liberdade
Medida sócio-educativa em que há parcial restrição da liberdade. Em geral, o adolescente tem ativi-
dades externas durante o dia e retorna à unidade para dormir. Nos fins de semana, há liberação para o 
adolescente permanecer com a família. Só é aplicável até os 18 anos.
Termos compilados com a ajuda da Juíza Cristiana Cordeiro, titular da II Vara Regional da Infância, da 
Juventude e do Idoso do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
32 JUÍZO JUÍZO 
SOBRE A DIRETORA
Maria Augusta Ramos nasceu em Brasília em 1964. Depois de se graduar em mú-
sica pela UNB - Universidade de Brasília, mudou-se para a Europa onde estudou 
Musicologia e Música Eletroacústica em Paris, no Groupe de Recherche Musicale 
(Radio France) e, logo depois, em Londres, na City University. Em 1990, mudou-se 
para a Holanda onde ingressou na The Netherlands Film and Television Academy, 
especializando-se em direção e edição. 
Seu primeiro longa-metragem, BRASÍLIA, UM DIA EM FEVEREIRO recebeu o Prêmio 
do Júri no Festival de Documentários ‘É Tudo Verdade’ e participou de vários festi-
vais internacionais. DESI, realizado em 2000, recebeu o ‘Bezerro de Ouro’, prêmio 
mais importante do cinema holandês. Foi também vencedor do Prêmio de Público 
no Festival Internacional de Documentários de Amsterdã de 2000, considerado Can-
nes do cinema não-ficcional. RIO, UM DIA EM AGOSTO, realizado no Rio de Janeiro 
em 2002, para a TV HOS holandesa, recebeu o ‘Prêmio GNT’ no Festival ‘É Tudo Verdade’.
Seu longa-metragem JUSTIÇA, de 2004, recebeu nove prêmios internacionais, entre eles o ‘Grand 
Prix’ de melhor filme no Festival Internacional de Cinema ‘Visions du Réel’, na Suíça; ‘La Vague d’Or’ 
de melhor filme no Festival Internacional de Cinema de Bordeaux, França; o ‘Grand Prize’ de melhor 
filme no Festival Internacional de Documentários de Taiwan e o ‘Prêmio da Anistia Internacional’ no 
Festival Internacional de Documentários de Copenhagen, Dinamarca. Em 2008, lança nos cinemas 
JUÍZO, seu mais recente longa-metragem.
FILMOGRAFIA
Juízo (2007)
Justiça (2004) 
Rio, um dia em agosto (2002) – média
Desi (2000)
The Secret of The Vibrato (1999) – média
Butterflies in Your Stomach (1998) - série de 6 curtas para TV
Two Times at Home (1996) – curta
Brasília, um dia em fevereiro (1995)
Boy e Aleid (1994) – média
“Eu acho que eu quero dizer é…” (1993) – média
JUÍZO JUÍZO 33
JUÍZO
FICHA TÉCNICA
Produção DILER & ASSOCIADOS e NOFOCO FILMES
Distribuição FILMES DO ESTAÇÃO
Direção e Roteiro MARIA AUGUSTA RAMOS 
Produzido por DILER TRINDADE
Produtora Associada MARIA AUGUSTA RAMOS
Produtor Executivo TELMO MAIA
Produtor Delegado GERALDO SILVA DE CARVALHO
Direção de Fotografia GUY GONÇALVES
Som Direto PEDRO SÁ EARP e JOSÉ MOREAU LOUZEIRO
Montagem MARIA AUGUSTA RAMOS e JOANA COLLIER
Edição de Som e Mixagem DENILSON CAMPOS
Direção de Produção HENRIQUE CASTELO BRANCO e MARIANA VIANNA
Brasil - 2007 - 90 min - cor - 35mm
JUÍZES
Guaraci de Campos Vianna
Luciana Fiala de Siqueira Carvalho
PROMOTORES
Alexandra Carvalho Feres
Eliane de Lima Pereira
Renato Lisboa Teixeira Pinto
DEFENSORES
Patrícia Vilela
Tadeu Valverde
ELENCO ADOLESCENTE
Alessandro Jardim
Daniele Almeida
Guilherme de Carvalho
Ighor dos Santos Villela
Isabela Cristina Durães
Karina Lopes
Maicon da Silva Singh
Marco Aurélio Sant’ana
Wilson dos Santos
Festival Internacional de Cinema de Locarno
Mostra Cineastas do Presente
VIENNALE – Festival Internacional de Cinema de Viena
DOK Leipzig – Festival Internacional de Documentário e Animação 
Prêmio FIPRESCI – Federação Internacional da Imprensa Cinematográfica
Festival Internacional de Cinema de Rotterdam
Human Rights Watch International Film Festival – Londres
Festival do Rio 
Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
 
One World Human Rights Documentary Film Festival – Praga 
Festival Internacional de Cine en Guadalajara – México 
IndieLisboa – Festival Internacional de Cinema Independente - Portugal
Festival Int. de Documentários Thessaloniki – Grécia 
Festival Internacional de Cinema Jeonju – Coréia
Todos os textos contidos neste livreto podem ser encontrados
na íntegra no site do filme (www.juizoofilme.com.br)
Contato: 
juizo@diler.com.br
distribuidora@grupoestacao.com.br
 
ESTE FILME FOI SELECIONADO PELO PROGRAMA PETROBRAS CULTURAL
““...um documentário que descortina sem refresco estético o arrepiante retrato de um sistema tão
sobrecarregado que oferece poucas chances de seguimento aos casos que julga... A solução encontrada 
para o problema da exposição dos menores foi brilhante. O que poderia ter sido um fracasso funciona 
maravilhosamente bem.” 
Jay Weissberg - Variety
“Maria Auguta Ramos ocupa um lugar singular no cinema brasileiro... Sua câmera não arreda pé, não 
dá trégua, até deslindar as dimensões humana, social e política da realidade que foi buscar. “
Dorrit Harazim - Revista Piauí
“Um registro sóbrio, esclarecedor e preocupante do sistema judiciário brasileiro.”
Silvana Arantes - Folha de São Paulo
“Nenhum outro diretor ou diretora, seja no documentário ou na ficção, filma hoje, no Brasil, como Maria 
Augusta, o indivíduo e sua relação com as instituições.”
“Juízo lida com a falta de juízo da sociedade e das instituições brasileiras.”
Luiz Carlos Merten - O Estado de São Paulo
“Uma narrativa contundente e realista, mesmo com o uso da dramaticidade.”
Flávia Guerra - O Estado de São Paulo
“Em Juízo, a potência social do cinema grita, é visível e comanda as relações, os sentimentos, o real.” 
Andrea França - Socine
 
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