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Controle Químico IV

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ENTOMOLOGIA FLORESTAL/2002 pg. 47 
4.7.9. TOXICOLOGIA 
 
Toxicologia é o ramo da ciência médica que trata da natureza, 
propriedades, efeitos e a detecção de venenos. Ela compreende estudos sobre: 
metabolismo e excreção dos venenos, ações e tratamentos dos envenenamentos e 
análises químicas, físicas e diagnósticos. Atualmente, a toxicologia ambiental tem 
crescido muito em decorrência dos movimentos em prol da ecologia. No sub-item 
presente serão abordados os aspectos mais importantes da toxicologia. 
 
 
4.7.9.1. CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO DE INSETICIDAS 
 
Os inseticidas são tóxicos ao homem e aos animais. O processo de 
envenenamento pode ser por ingestão (via oral); absorção (via cutânea) e inalação (via 
respiratória). O envenenamento é mais rápido quando o inseticida penetra no organismo 
por via oral, através da pele o processo é mais lento e mais lento, ainda, por inalações 
(exceções para gases muito tóxicos). 
O envenenamento por via oral, normalmente, é intencional e não 
acidental. Portanto, o perigo maior está na absorção cutânea para quem manipula e 
aplica inseticidas, justamente pelo fato de não acreditarem que isto aconteça. 
As intoxicações são mais comuns em zonas atrasadas e com menor 
frequência em zonas mais desenvolvidas, embora existam. O grande problema reside na 
pessoa não alfabetizada, não desconsiderando a falta de orientação, por parte do 
profissional do ramo. Uma das causas da intoxicação está na desobediência do operador 
em seguir as normas recomendadas e a venda sem receituário agronômico de 
agrotóxicos. 
As interações tóxicas estão correlacionadas com as doses. Normalmente, a 
toxicidade de um inseticida para um organismo é expressa através da DL50 ou LD50 (Letal 
Dose = Dose Letal), ou seja, a quantidade de ingrediente ativo por peso, expressa em 
mg/Kg de peso vivo, capaz de matar 50% dos animais empregados no teste. A DL50 tem 
importância como fator comparativo da toxicidade dos inseticidas. A sua aplicação para o 
homem é muito imprecisa, pois os testes são realizados em animais. O seu emprego é 
universal, mesmo levando-se em consideração as imprecisões ocorridas na sua 
determinação. Os fatores que podem afetar a sua exata determinação são: espécie do 
animal, idade, estado nutricional, condições patológicas, sexo, tipo de teste e de 
formulações, vias de penetração etc. 
A falta de informações, com relação aos casos de envenenamento com 
inseticidas no Brasil, é bastante elevada. Os fatores que levam a essa desinformação são 
devidos a ausência de notificação compulsória. Geralmente, os casos de envenenamento 
por ingestão são poucos, ocorrendo intencionalmente na tentativa de suicídio. Durante o 
período de l955 a 1956, o Instituto Biológico de São Paulo foi informado sobre a 
ocorrência, no estado de São Paulo, de 240 casos de intoxicações com mortes. 
Há a necessidade de se distinguir toxicidade aguda de toxicidade crônica. 
A primeira é produzida por uma única dose e por qualquer via; a segunda é resultante da 
exposição contínua ao agrotóxico, não causando a toxicidade aguda devido à baixa 
concentração ou devido às precauções tomadas pelo operador ou, ainda, porque o 
ambiente de trabalho não favoreceu a intoxicação; esses três fatores e outros menos 
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importantes podem atuar conjuntamente. Nos casos de intoxicações agudas os 
fosforados ocupam posições destacadas, já para os casos de intoxicações crônicas os 
clorados foi o principal grupo em relação aos demais organo-sintéticos sem, contudo 
descartar a possibilidade de uma intoxicação aguda. 
Os envenenamentos por intoxicação aguda, geralmente, apresentam uma 
sintomatologia típica e com quantidades relativamente grandes de produtos no corpo, 
facilitando sobremaneira a detecção de resíduos no sangue ou urina. Já para intoxicação 
crônica, em alguns casos os sintomas clínicos muitas vezes não permitem um diagnóstico 
seguro em casos isolados. Estudos feitos com operários de depósitos de grãos 
armazenados, que apresentavam alguns sintomas clínicos leves e esporádicos, 
possibilitaram estabelecer uma correlação dos sintomas com o uso do brometo de metila. 
 
4.7.9.2. PROBLEMAS DECORRENTES DO USO DE INSETICIDAS 
 
Os inseticidas mesmo quando utilizados de forma correta causam 
problemas que são difíceis de serem evitados. Dentre os problemas decorrentes do seu 
uso tem-se: 
 Desequilíbrios biológicos promovendo o aparecimento de pragas tidas 
anteriormente como de importância secundária, cujas populações estavam sob 
equilíbrio, mantidas pelos inimigos naturais; 
 Mortalidade de insetos polinizadores como abelhas, mamangavas etc., 
devendo-se sempre evitar aplicações por ocasião do florescimento e quando 
isso não for possível usar produtos menos tóxicos para os polinizadores (vide 
Tabela 4) e procurar realizar as aplicações no final da tarde; 
 Contaminação ambiental em áreas adjacentes ou mesmo distantes do local de 
aplicação. A deriva, problema decorrente da aplicação aérea ou de ventos 
fortes, é um dos principais problemas da contaminação ambiental provocando 
a mortalidade de peixes, aves, mamíferos etc., além, da bioacumulação nas 
cadeias tróficas; 
 Resíduos nos alimentos devido à persistência podem causar problemas de 
saúde pública ou de comércio exterior, quando os resíduos se encontram acima 
dos limites permitidos internacionalmente. Isto pode acarretar na proibição de 
uso do produto; 
 Resistência da praga ao inseticida exigindo um maior número de aplicações em 
concentrações mais elevadas e até mesmo a troca do produto por outro. 
 
4.7.9.3. CONSIDERAÇÕES SOBRE A TOXICIDADE DOS INSETICIDAS 
 
A legislação brasileira estabelece que os inseticidas apresentem rótulos 
com tarjas coloridas, indicativas da classe toxicológica na qual os produtos estão 
incluídos. As cores são estabelecidas de acordo com a formulação, modo de ação e DL50 
(Tabela 5, Quadro 2). 
 
 
 
 
 
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TABELA 5 - CLASSIFICAÇÃO DE INSETICIDAS BASEADA NA INTOXICAÇÃO AGUDA (IN: GALLO Et al., 1988). 
 
Classe DL50 oral (mg/Kg) DL50 dérmica (mg/Kg) Cor da faixa 
Toxicológica Pó Líquido Pó Líquido no rótulo 
I 100 200 200 400 Vermelha 
II 100-500 200-2.000 200-1.000 400-4.000 Amarela 
III 500-2.000 2.000-6.000 1.000-4.000 4.000-12.000 Azul 
IV >2.000 >6.000 >4.000 >12.000 Verde 
 
QUADRO 2 - CLASSIFICAÇÃO TOXICOLÓGICA DE AGROTÓXICOS. (MUDAR A FIGURA) 
 
 
 
A DL50 apresenta uma grande utilidade como fator comparativo da 
toxicidade entre inseticidas, contudo a sua aplicabilidade torna-se restrita quando se 
estende a sua significação toxicológica ao homem. No entanto, como medida de 
segurança os inseticidas são agrupados de acordo com a DL50 nos seguintes grupos 
expressos na tabela 5. 
 
TABELA 5 - CLASSIFICAÇÃO DOS INSETICIDAS QUANTO A TOXICIDADE (IN: GALLO ET ALII, 1988). 
 
Classificação DL50 (mg/Kg)/Aguda oral Dose letal provável para um 
homem adulto 
Extremamente tóxicos Menor que 5 Algumas gotas 
Muito tóxicos 5 a 50 1 colher de chá 
Moderadamente tóxicos 50 a 500 Até 2 colheres de sopa 
Pouco tóxicos 500 a 5.000 Até 2 copos 
Praticamente não tóxicos Acima de 5.000 Até 1 litro 
 
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4.7.9.4. MODO DE AÇÃO DOS INSETICIDAS 
 
Os inseticidas, em sua maioria, são neurotóxicos. Os únicos componentes 
bem conhecidos do sistema nervoso são os neurônios (células nervosas), que são 
constituídas por um filamento compridodenominado axônio e outro curto denominado 
dendrito. O axônio conduz os impulsos para fora da célula e o dendrito recebe os 
impulsos. 
Com relação aos impulsos nervosos há dois tipos: 
A) Transmissão axônica - o impulso é transmitido ao longo do axônio até 
atingir outra célula (nervosa, muscular ou glandular). A transmissão axônica é elétrica. No 
interior de uma célula em repouso a concentração de Na+ é baixa e a de K+ é alta; quando 
ocorre um estímulo na membrana acontece um aumento na permeabilidade, 
possibilitando a entrada de íons de Na+, a parte ativa torna-se polarizada gerando uma 
pequena corrente elétrica, provocando os impulsos (Figura 20). 
 
FIGURA 20 – NEURÔNIO MOSTRANDO AS CONCENTRAÇÕES DE IÔNS K+ E N+. 
 
 
B) Transmissão sináptica - o impulso é transmitido entre diferentes 
neurônios e entre neurônios e ligamentos terminais. 
A transmissão sináptica ocorre em seqüência a transmissão axônica (Figura 
21). O impulso elétrico ao chegar a sinapse desaparece e aparece o transmissor, 
composto químico, produzido por esse impulso elétrico. O transmissor é responsável pela 
transmissão do impulso para outra célula; são conhecidos dois tipos de transmissores a 
acetilcolina e norapinefrina ou norepinefrina. As sinapses precisam voltar ao normal, 
após a transmissão do impulso e para que isso aconteça surgem às enzimas colinesterase 
(sinapses colinérgicas) e monoamino oxidase (sinapses adrenérgicas) que executam essa 
função. 
 
 
 
 
 
 
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FIGURA 21 - DESENHO ESQUEMÁTICO DA TRANSMISSÃO SINÁPTICA. 
 
 
 
 
Nos mamíferos sabe-se que a enzima colinesterase ou acetilcolinesterase é 
de importância vital. Os inseticidas clorofosforados, fosforados e carbamatos são 
inibidores da colinesterase. Dessa forma, eles provocam um acúmulo de acetilcolina que 
não irá se desdobrar em ácido acético e colina, como na reação seguinte: 
 
 O O 
 ║ Colinesterase ║ 
CH3COCH2 CH2 N
+ (CH3)3 + H20 CH3 COH+HOCH2 CH2 N
+ (CH3 )3 
Acetilcolina Ác. Acético Colina 
 
O acúmulo de acetilcolina nas junções neuromusculares pode acarretar 
inicialmente uma atividade excessiva nos músculos voluntários e posteriormente o seu 
bloqueio (inclusive os músculos respiratórios). Os principais sintomas de envenenamento 
por esses grupos de inseticidas inibidores da colinesterase são defecação, 
lacrimejamento, contração da pupila, fasciculação, ataxia, bradicardia e queda da pressão 
arterial, podendo levar ao estado de coma. Os antídotos são sulfato de atropina e 
Contrathion (exceto para carbamatos). 
Com relação aos organoclorados sabe-se que atuam no sistema nervoso, 
porém não se sabe exatamente como possa ocorrer. Porém, admite-se que os efeitos 
ocorrem principalmente no axônio; no caso do DDT admite-se a alteração na 
permeabilidade da membrana interferindo na passagem dos íons K+ e Na+. Os casos de 
intoxicações agudas no campo são muito difíceis de serem observados com clorados, pois 
a sua penetração cutânea é muito baixa (lipofílicos). No caso de intoxicação é indicado o 
uso de sedativos e calmantes para tratamentos sintomáticos. O quadro clínico de 
intoxicação com clorados pode ser observado na figura 22. 
 
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FIGURA 22 - SINTOMAS DE INTOXICAÇÃO POR CLORADOS. 
 
 
 
Os piretróides são neurotóxicos que atuam no sistema nervoso central do 
inseto, agindo na transmissão do impulso (nervo) e não na sinapse. São poucos tóxicos 
para mamíferos e aves, porém se ingeridos em quantidades significativas apresentam 
sintomas de irritabilidade, descoordenação, paralisia muscular, podendo se suceder a 
morte por insuficiência respiratória. Os piretróides podem provocar reações alérgicas, 
principalmente, na pele. Os antídotos são os anti-histamínicos. 
 
 
4.7.9.5. RESISTÊNCIA DOS INSETOS AOS INSETICIDAS 
 
Quando uma população de insetos torna-se mais tolerante a dose de um 
inseticida considerado eficiente, diz-se que essa população tornou-se resistente. Há 
populações que nunca foram suscetíveis aos níveis dos inseticidas empregados, elas são 
chamadas de tolerantes. 
O uso frequente de inseticidas elimina os indivíduos geneticamente mais 
fracos de uma população. Isso permite a reprodução entre os indivíduos mais tolerantes 
aos inseticidas e após diversas gerações ocorrerá, por meio desse processo seletivo, uma 
população constituída por indivíduo com uma alta frequência de genes que controlam a 
resistência. Fica claro, portanto que a resistência é ao nível de população e não é 
aumentada individualmente, mas sim um processo seletivo que pode ser maximizado 
com os aumentos do número de aplicações e da dose dos inseticidas. 
O aumento da resistência é um processo lento de uma geração para a 
outra e a resistência não se aumenta para todos os insetos com a mesma rapidez. Uma 
população de inseto quando submetida a um determinado inseticida podem também 
apresentar resistência a outros inseticidas não empregados no teste, a esse fato dá-se o 
nome de resistência cruzada. Quando a resistência ocorre entre inseticidas de classes 
diferentes dá-se preferência para o termo resistência múltipla. 
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Os mecanismos de resistência manifestam-se de formas diferentes e entre 
as principais tem-se: 
 Comportamento: relacionado com as características hereditárias do 
comportamento, como no caso dos pernilongos que não pousam em paredes 
de casas, anteriormente tratadas com inseticidas. Dessa forma, haverá um 
aumento de indivíduos, nas gerações sucessivas, que não pousarão nas 
paredes, isto é, se o comportamento for controlado geneticamente; 
 Absorção reduzida: absorção menor devido as características do tegumento; 
 Armazenamento em locais não críticos: a substância tóxica é armazenada em 
local não sensível, como tecido adiposo para os clorados; 
 Aumento da excreção: eliminação rápida do tóxico evitando o seu acúmulo em 
pontos críticos; 
 Aumento na degradação: o tóxico é rapidamente metabolizado em produtos 
não tóxicos; é o mecanismo mais comum de resistência; 
 Diminuição da sensibilidade: é um mecanismo muito comum ocorrendo uma 
diminuição da sensibilidade do sistema sensível. 
 
4.7.9.6. SELETIVIDADE DE INSETICIDAS 
 
 
Apesar dos inevitáveis desequilíbrios biológicos provocados pelos 
inseticidas, o uso adequado pode diminuir os efeitos negativos sobre as populações de 
inimigos naturais das pragas. Além da aplicação na dose correta e somente quando for 
necessário, os inseticidas devem ser utilizados verificando-se a sua seletividade sobre 
para os insetos úteis, como abelhas, predadores e parasitóides. Todavia, nem sempre é 
possível conseguir inseticidas seletivos devido às características do produto, que pode 
agir tanto para as pragas como para os inimigos naturais. 
A seletividade pode ser classificada em fisiológica e ecológica. A 
seletividade fisiológica é aquela que devido a característica própria do inseticida pode 
resultar em uma menor absorção do tegumento ou aumento da degradação da molécula 
tóxica pelo próprio sistema enzimático do inseto útil. 
Quando se aplica um inseticida sistêmico no solo e que irá circular na seiva, 
devido à característica do inseticida e na sua forma de aplicar, irá atingir somente os 
insetos pragas sugadores e não afetando os seus inimigos naturais.Essa característica é 
conhecida como seletividade ecológica. O uso de inseticidas em reboleiras para as pragas 
de pouca mobilidade (cochonilhas, ácaros etc.) ou em faixas alternadas pode resultar em 
uma seletividade ecológica para muitos inimigos úteis presentes neste local. 
Há diversos trabalhos científicos e recomendações da Embrapa de 
inseticidas seletivos para benefício dos insetos úteis.

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